Asas 73

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Ano XIII – Número 73 – Junho/Julho 2013

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A NOVA GERAÇÃO DO FLANKER

9 771519 559006

ISSN 1413-1218

R$ 16,90

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MÁQUINA MORTÍFERA + FRANÇA, 1940 + ARADO AR-234B BLITZ + TASK FORCE MUSKETEER + NATIONAL AIR & SPACE MUSEUM

AIRBUS A300B A história do jato que fez renascer a indústria aeronáutica comercial da Europa


TODAS AS FOTOS DO AUTOR

Virginia Arts Festival

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Grumman FM-2 Wildcat.

SINFONIA AÉREA Por Claudio Lucchesi

Sopwith 1 ½ Strutter.

Fokker Dr.

I Dreidecke

Q

ue eventos aeronáuticos incluam apresentações de música, como bandas de rock, e performances de artistas, não há surpresa ou novidade alguma. Mas que um grande evento de artes tenha um show aéreo em sua programação – aí sim se tem alguma coisa que quebra paradigmas e traz algo de genuinamente novo. Por isso, não resisti à tentação de ir conferir pessoalmente o Flying Proms – Symphonic Airshow Spectacular, realizado em 1º de junho último, no Military Aviation Museum, em Virginia Beach (EUA), e que marcava o gran finale da 17ª edição anual do Virginia Arts Festival. Falando comigo, o diretor deste, Robert W. Cross, comentou que a ideia veio do fundador e presidente do Military Aviation Museum, Gerald Yagen (ver ASAS 67), que assistira a eventos no Rei-

no Unido que uniam música e aviação. “Achei a ideia espetacular assim que ouvi. Afinal, aquelas aeronaves históricas, restauradas, são em si obras de arte! E a arte e o espírito do Festival também passam pela história. Então, achei a ideia perfeita para, inclusive, colocar as novas gerações mais próximas desses aviões, de seu legado e do que representam.” Cross, que é ele próprio músico clássico, percussionista principal da Orquestra Sinfônica da Virginia desde 1987, disse-me ainda que ficou muito feliz, após o show, por ter visto muitos jovens e crianças no público e porque “os fãs da aviação que compareceram puderam se emocionar com a música; e o público de música pôde descobrir e conhecer aqueles maravilhosos aviões e sua história”. (Não deu para evitar uma ponta de inveja, ouvindo isso, e pensando na visão estreita e medí-

r.

ocre dos ditos “produtores culturais” no Brasil, quando se trata de história... e aviação!) A parte musical ficou por conta da Orquestra Sinfônica da Virgínia, conduzida por Benjamin Rous, com um repertório “escolhido a dedo”, com peças sendo tocadas junto aos voos de aviões aos quais se relacionavam, criando de fato uma atmosfera muito especial. Assim, o Junkers Ju-52/3m abriu o programa, voando ao som de Where Eagles Dare (de Goodwin, do clássico filme Desafio das Águias, de 1968), sendo seguido por duas réplicas de aviões da 1ª Guerra Mundial, o Sopwith 1 ½ Strutter e o Fokker Dr.I Dreidecker (com The Great Waldo Pepper March, de Mancini) e por dois veteranos dos combates no Pacífico, os Grumman TBM-3E

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CORES DA AVIAÇÃO MILITAR BRASILEIRA Por Aparecido Camazano Alamino

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HISTÓRICO E DESENVOLVIMENTO DA AERONAVE No início da década de 30, a Luftwaffe (Força Aérea alemã) necessitava de um avião de treinamento primário para reiniciar as suas atividades de formação de pilotos militares, apesar dos vetos impostos pelo Tratado de Versalhes, ao final da 1ª Guerra Mundial, que a proibia de possuir uma força aérea com aparelhos ofensivos. A estratégia adotada foi informar que tais aparelhos destinavam-se ao treinamento de pilotos civis e para uso esportivo, atividades que não estavam proibidas. De acordo com os requisitos de economia e simplicidade, a empresa Focke-Wulf Flugzeugbau Gmbh solicitou ao então jovem projetista Kurt Tank que concebesse um pequeno aparelho biplano, com assentos em tandem (um atrás do outro), para ser apresentado à Luftwaffe. O projeto foi rápido, sendo designado como Fw-44 e batizado de Stieglitz (Pintassilgo), que acabou sendo o esco-

ram a concessão de licença para a sua fabricação, como foi o caso da Argentina, Brasil e Espa- nha. Os aparelhos de série começaram a ser entregues em 1934. Como os grandes shows aéreos eram moda nos anos 30, inúmeros pilotos alemães, normalmente antigos ases da 1ª Guerra Mundial, se apresentavam nesses shows de acrobacias utilizando o Stieglitz, com destaque para Ernst Udet, Emil Kopf e Gerd Achgelis. Nesse cenário, o Fw-44 foi logo adotado por escolas de pilotagem, clubes desporO Fw-44J 1-I-4 da Escola de Aviação Naval tivos e entusiastas do voo, torem voo sobre o Rio de Janeiro em 1938. O Pão de Açúcar é visível à esquerda. nando-se um grande sucesso na Alemanha. O Stieglitz teve inúmeras valhido pela Luftwaffe. O primeiro protótipo voou no verão de 1932 e teve que riantes, de acordo com os seguintes passar por algumas modificações, co- dados: Fw-44B: conhecido como “Série B”, mo o aumento da envergadura das asas, para melhorar a sua manobrabilidade e tinha um motor de quatro cilindros em aerodinâmica. O governo alemão efe- linha refrigerado a ar invertido Argus tuou uma encomenda inicial de alguns AS8, de 120hp. A carenagem desse moaparelhos, que foi ampliada posterior- tor deu ao avião um “nariz” mais fino e mente em decorrência de seu excelente aerodinâmico. Fw-44C: principal variante de prodesempenho. A simplicidade e as qualidades do dução, com alterações de diversos equiFw-44 despertaram o interesse de ou- pamentos. Era dotado com um motor tros países, que o adquiriram ou obtive- a pistão radial Siemens SH 14A de sete Arquivos do Autor

Arquivos Autor viA MAuro L. BArros

Focke-Wulf Fw-44J no Brasil

Um dos primeiros Fw-44J fabricados no Brasil, antes da aplicação da pintura padrão da Escola de Aviação Naval em 1937.


Fw-44J 3-I-8 - 3ª Esquadrilha 1ª DAVT - Galeão, 1940.

Dois Fw-44J da Aviação Naval em voo de espelho sobre o Grajaú, no Rio de Janeiro, em 1938.

Arquivos Autor viA AFFoNso CELso PArrEirAs HortA

cilindros. Fw-44D, E e F: variantes intermediárias. Fw-44J: foi a última variante do aparelho, que foi vendida ou construída sob licença em vários países em todo o mundo. Possuía um motor a pistão radial Siemens SH 14A, de 150hp, com sete cilindros. A Alemanha utilizou o Stieglitz de 1934 até o final da 2ª Guerra Mundial, sendo um dos principais aparelhos empregados para a formação de seus pilotos militares. Também foi adotado por 20 países, sendo que na América Latina foi utilizado pela Argentina, Bolívia, Brasil, Chile e Colômbia. Em decorrência da 2ª Guerra Mundial, não existe um número preciso de quantos aviões foram construídos, porém estima-se que passaram das 3 mil unidades.

Linha de Fw-44J da Escola de Aviação Naval no Galeão em 1939, com o motor acionado para mais uma missão de voo.

No Brasil, os Fw-44J foram utilizados pela Aviação Naval, Aviação Militar, Força Aérea Brasileira e aeroclubes na tarefa de instrução de voo primária, sendo um aparelho de atuação relevante pelas suas características, manobrabilidade, simplicidade de manutenção e robustez.

A FABRICAÇÃO DO FW-44J PELA MARINHA DO BRASIL A Aviação Naval Brasileira, em meados da década de 30, carecia de uma aeronave de treinamento primário para atender às necessidades de formação de seus pilotos e substituir os aviões De Havilland Tiger Moth, já bem desgastados. Nesse cenário, foi decidido que

Arquivos Autor viA MAuro L. BArros

O FOCKE-WULF FW-44J PINTASSILGO NO BRASIL

o mais viável seria a fabricação de uma série de aviões, incluindo um treinador primário, um treinador básico e um aparelho mais sofisticado bimotor, para suprir as suas necessidades à época. Assim, em 1935, uma delegação da Aviação Naval, sob a chefia do Comandante Raymundo Vasconcellos de Aboim, via-

jou para os EUA e Alemanha, visitando diversas fábricas de aviões. O “pacote” que mais atendeu às pretensões da Marinha foi o oferecido pela Focke-Wulf, sendo firmado um acordo para a produção seriada de aeronaves militares de projeto alemão no Brasil. Este incluía o Fw-44 Stieglitz como treinador primá-

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Marina Lystseva

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Comprimento Envergadura Altura Empuxo dos motores Peso de decolagem padrão Peso máximo de decolagem Máximo de combustível interno Máximo de carga bélica externa Velocidade máxima (nível do mar) Velocidade máxima (em Mach, a 11.000m) Teto operacional Limite G Alcance máximo (combustível interno)

Su-30MKI

Su-35

21,93m 14,70m 6,40m 2x 12.500kgf 24.900kg 34.500kg 9.640kg 8.000kg 1.350km/h 1,8 17.300m 9 3.000km

21,90m 15,30m (com pods de EW nas pontas das asas) 5,90m 2x 14.500kgf 25.300kg 34.500kg 11.500kg 8.000kg 1.400km/h 2,25 18.000m 9 3.600km


a Nova geração do FlaNKer Por Piotr Butowski

N

esta edição do Salão de Paris, em Le Bourget, o caça multifuncional Su-35 fez sua estreia fora da Rússia e é interessante que isto tenha sido feito com um exemplar de produção, da versão Su-35S, totalmente equipado, “emprestado” da Força Aérea russa; e não com um dos protótipos, “901” e “902”, pertencentes à Sukhoi e já tantas vezes exibidos no Salão de Moscou, o MAKS, em Zhukovsky. Externamente, o Su-35 é até fácil de ser confundido com os antigos Su-27 da geração inicial, mas que ninguém se deixe enganar por tal aparência – o Su-35 é realmente uma plataforma nova, com novos sensores e armas. Aliás, as diferenças visuais externas em relação ao Su-27 são de natureza quase que “cosmética” – os estabilizadores verticais são um pouco mais baixos que os do velho Flanker (designação dada pela OTAN), enquanto os lemes em si são mais largos e o “ferrão” protuberante entre as saídas das turbinas é menor. Foi retirado o grande freio aerodinâmico do dorso – a sua ação de frenagem passa a ser feita pela deflexão

diferencial dos lemes. Já a perna do trem de pouso no nariz agora tem duas rodas, em vez de uma – e a isso se resumem praticamente as diferenças externas. Porém, por dentro, tudo é novo. Novos materiais estruturais foram usados, havendo mais partes de composites, e obteve-se espaço adicional interno para 11.500kg de combustível (22% a mais que no Su-27). Também é totalmente novo o sistema digital de comando de voo FBW (Fly-By-Wire, assistido por computador), de redundância quádrupla; e um sistema de geração de oxigênio de bordo (OBOGS) substituiu o anterior sistema convencional de provisão de oxigênio. E uma das mais importantes melhorias no Su-35 foi a implementação de um sistema de manutenção “on condition” (os componentes são submetidos a inspeção, teste ou verificação, em intervalos de tempo, mas sem a necessidade de sua remoção da aeronave; e a manutenção só é feita quando este apresenta alguma não conformidade em relação ao funcionamento ou estado físico), menos oneroso que

a antiga manutenção com períodos fixos de revisões. O tempo de serviço da célula foi ampliado diversas vezes em relação ao do Su-27, estando agora em 6.000 horas de voo (o mesmo de um F/A-18E Super Hornet, basicamente), e o dos motores, em 4.000 horas. Os motores do Su-35 são as turbinas AL-41F1S (Izdeliye 117S), projetadas pela NPO Saturn e produzidas pela UMPO, em Ufa. Trata-se de uma versão modernizada das AL-31F usadas nos Su-27, que incorpora, entre outras coisas, um novo Fadec (controle/monitoramento por computador). O empuxo máximo foi incrementado em 16%, atingindo 14.990kgf, e a turbina possui bocais vetoráveis de saída, com 15º para cima ou para baixo (similar à vetoração dos motores AL-31FP dos Su-30MKI). Já a unidade auxiliar de força (APU) é também nova, a TA14-130-35. E totalmente novos são também o sistema de computador de bordo, assim como a apresentação de dados ao piloto no cockpit.

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Task Force Por Erwan de Cherisey

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ECPAd

Tropas francesas do 92ème Régiment d’Infanterie, parte do Battle Group Wild Geese, deslocadas para a área de Surobi até julho de 2012. São vistas aqui aguardando embarque num AS.532, o qual as levaria para Cabul.

B

ase Avançada Operacional (FOB, Forward Operational Base) de Nijrab, 26 de agosto de 2012, pouco menos de 18h00. O sol está quase desaparecendo no horizonte, pois a noite chega cedo no Afeganistão nessa época. Parados no pequeno estacionamento de cascalho da base estão um par de SA.342 Gazelle, um de EC.665 Tiger e um solitário EC.725 Caracal. Com o silvo de sua turbina Turbomeca Astazou, um Gazelle lentamente decola, fazendo uma curva súbita e desaparecendo além dos muros da base, na escuridão das montanhas ao redor. Um Tiger o segue, segundos depois, levantando uma nuvem de poeira parda. E ao longo de toda a noite, os helicópteros vêm e vão, perturbando o meu sono. Nesses dias, quatro dessas aeronaves francesas estão permanentemente baseadas em Nijrab, fazendo transporte, reconhecimento e escolta, em apoio aos comboios de suprimentos que atravessam o Vale do Kapisa, dentro das operações de retirada das forças da

França do território afegão. Tais aeronaves são parte do Bathelico, a unidade responsável pelas operações de todos os helicópteros da França naquele país.

os heLiCóPteros e o aFeGaNistão

Já nos tempos da luta entre as forças soviéticas e os mujahedeen, os helicópteros eram componente-chave das operações militares, com os Mi-24 e Mi-8/-17 sendo os cavalos de batalha de todas as ações de combate conduzidas pelos soviéticos naquele conflito. Mais de uma década depois deste, em fins dos anos 90, o Comandante Massoud empregaria um punhado dessas mesmas máquinas na luta contra o Taleban, com estes dando apoio aéreo crítico e suporte logístico nas principais ofensivas. Quando Taloqan caiu, em 2000, um par de calejados e velhos veteranos Mi-17 era tudo o que restara às forças de Massoud para prover suprimento e fazer evacuações médicas. Agora, depois de mais de 11 anos

de presença ocidental no Afeganistão, a situação dificilmente é comparável. Todas as principais estradas foram reconstruídas, permitindo um bom tráfego terrestre; mas esses caminhos permanecem desafiadores e perigosos, pois as forças insurgentes conduzem frequentes ataques em todos os principais eixos de transporte, de modo que as forças da International Security Assistance Force (ISAF, designação das forças da OTAN no Afeganistão) trafegam apenas em comboios, em veículos blindados, e nunca sem os caminhos terem sido previamente “limpos” de ameaças. E tais comboios também exigem que forças de reação rápida estejam disponíveis para agir no caso de emboscadas, com aeronaves dando apoio aéreo. Por outro lado, chegar à FOB Nijrab por terra leva cerca de cinco horas, enquanto um helicóptero faz em menos de 20 minutos, de modo que essas aeronaves permanecem essenciais também para o transporte, além das outras missões.

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França, 1940 A

o se encerrar a 1ª Guerra Mundial (1914-18), a Aéronautique Militaire francesa tinha mais de 3.200 aeronaves de combate apenas no chamado Front Ocidental, sendo a mais poderosa força aérea do planeta – mas não só por uma questão quantitativa. Forjada nos ferozes combates do conflito, havia uma invejável geração de experientes e habilidosos pilotos, então entre os melhores do mundo. Durante a guerra, esses homens haviam reivindicado a destruição de 2.049 aeronaves inimigas, além de 357 balões; com não menos de 182 atingindo o ambicionado status de “ases”

Caças antiquados como estes Morane-Saulnier MS.225, cujo armamento era composto por apenas duas metralhadoras de 7,7mm, ainda estavam em serviço na Armée de l’Air em 1937.

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(com cinco ou mais vitórias aéreas). Como podia ser então que, apenas 22 anos depois, a mesma França pudesse ser vencida de forma avassaladora por aquela mesma Alemanha, que colocara de joelhos em 1918, e numa campanha na qual as forças desta não precisariam de mais de seis semanas para conseguir uma total e inquestionável vitória? O que acontecera com o orgulhoso poderio e a capacidade da aviação militar francesa, para que tal vitória alemã se consumasse de modo tão completo e fulminante? Este trabalho busca estas respostas,

numa análise do que se passou com a aviação militar francesa, especificamente a sua arma de caça (aquela de que mais se precisou quando da invasão germânica), antes daquele terrível verão de 1940, o poderio e a situação desta às vésperas do conflito e o modo como se portou a caça francesa na luta contra a Luftwaffe (Força Aérea alemã). Este último ponto, aliás, rompendo certos paradigmas e mesmo injustos (pre)conceitos que, para o autor, não fazem jus à coragem e habilidade com que se lançaram à luta os pilotos de caça da França.


ANUNCIADA

Por Claudio Lucchesi

Um caรงa Morane-Saulnier MS.406 do GC II/3 prepara-se para decolar, na regiรฃo de Conantre (Marne), em abril de 1940.

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D

VOADOR

Mas, apesar das excepcionais características do Mi-8, reveladas já durante a fase de testes, foi somente a partir do início das suas operações em 1967 que o mundo conheceu a sua real versatilidade e robustez. Graças à genialidade do projeto, em pouco tempo outras variantes surgiram, dando ao helicóptero funções cada vez mais especializadas e complexas, incluindo as de guerra eletrônica, ataque, busca e resgate, evacuação e transporte aeromédico, transporte de autoridades, comunicações, escolta, observação, fotorreconhecimento, apoio aéreo aproximado e combate a incêndios, entre outros. Diferentemente de qualquer outro modelo ocidental, por ter sido projetado para operar em qualExcelente campo de visão, simplicidade e robustez. Esses três atributos quer ponto e ambiente tornam os Mil uma excelente opção para operação em ambientes com do vasto território soviéclima e cenário hostil. Aqui, uma tripulação mista, de norte-americao escritório de projetos (OKB) da Mil, fundado pelo brilhante engenheiro aeronáutico Mikhail Leontyevich Mil, nascia no final da década de 50 um projeto que se tornaria a espinha dorsal da força de helicópteros de transporte utilitário médio nas Forças Armadas soviéticas e em dezenas de países sob a égide da então Cortina de Ferro, na África, Ásia e no Oriente Médio. Criado para substituir o Mil Mi-4, helicóptero utilitário equipado com um motor a pistão Shvetsov ASh-82, o Mi-8 (ver ASAS 20) tornou-se um dos modelos mais construídos no mundo, superando 17 mil exemplares fabricados, que entraram em serviço nos segmentos civil e militar em mais de 60 países.

uSaF, Tech. SgT. JeroMy K. croSS

nos e afegãos, realiza uma missão de evacuação aeromédica. Note o fuzil apoiado ao lado do painel direito da aeronave.

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tico, o Mi-8 teve de atender a um requerimento de ser capaz de operar desde no frio extremo da Sibéria (chegando a -50°C!) até nas áreas montanhosas e de grande altitude no Cáucaso e de elevada temperatura, como no Cazaquistão (acima de 30ºC no verão), sem que houvesse grandes degradações na potência ou até mesmo restrições operacionais. Mas, ao contrário de outras aeronaves soviéticas, também concebidas para atender às demandas e necessidades operacionais da Guerra Fria, o término do “conflito” entre o Bloco Ocidental (liderado pelos EUA) e o Oriental (sob o comando da então União Soviética) em 1991, com o desaparecimento do império soviético, não resultou no fim deste helicóptero polivalente. Pelo contrário. Com a globalização vivida a partir da primeira metade dos anos 90, o acesso à família Mi-8/-17/-171 por países que antes se encontravam fora da esfera de influência soviética, acabou por dar uma nova vida ao helicóptero, que nos últimos tempos vem tendo, inclusive, o desenvolvimento de novas e mais avançadas versões, destacando-se a recém-lançada Mi-171A2. Hoje, as fábricas de Kazan (KHP) e Ulan-Ude (UUAZ) são as responsáveis pela fabricação de seis variantes distintas. Localizada na Sibéria Oriental e a aproximadamente 100km do Lago Baikal, da UUAZ saem hoje os Mi-171 (versão de exportação do Mi-8AMT para emprego civil em missões de transporte utilitário de passageiros e cargas, combate a incêndio e busca e resgate),


NOVO MI-171A2 DÁ CONTINUIDADE À DINASTIA MIL uSaF, caPT. roBerT leeSe

Por João Paulo Moralez

MIL MI-171A2 Comprimento

o Mi-171E (otimizado para operações no Oriente Médio e Ásia) e o Mi-171A1 (versão certificada em 2005 que teve 87 itens adaptados para atender exclusivamente às exigências das autoridades aeronáuticas brasileiras). Já da KHP saem os Mi-8MTV-5 e Mi-17V-5, que podem atender tanto à gama civil quanto à militar em missões de transporte utilitário de pessoas e cargas, busca e resgate, combate a incêndios, evacuação aeromédica, ataque ao solo e apoio aéreo aproximado; e o Mi-172, variante com modificações especiais para a realização de transporte VIP com interior em acabamento de luxo e melhor revestimento acústico. Paradoxalmente, se durante a Guerra Fria a propaganda ocidental clamava a indústria aeronáutica russa como um segmento inferior e de baixa qualidade, no mundo “pós-conflito” a situação se inverteu, e um dos exemplos mais elucidativos vem exatamente dos EUA, com a insistência do Pentágono em adquirir quantidades cada vez maiores de Mi-17V-5 para equipar as Forças Armadas do Afeganistão nas missões de transporte humanitário e combate. Em maio de 2011, foi feita uma primeira compra, de 21 Mi-17V-5, seguida por outros dois contratos, em fevereiro de 2012 (duas aeronaves) e o mais recente, de 12 aparelhos, para entregas até o final deste ano. A justificativa para adquirir um produto de fabricação russa, ao invés de helicópteros militares fabricados nos próprios EUA (ou de outra origem oci-

18,8m

Altura 4,75m Largura 4,51m Diâmetro do rotor principal

21,29m

Diâmetro do rotor de cauda

3,9m

Peso máximo de decolagem

13.000kg

Teto operacional

6.000m

Alcance com tanques internos

800km

Velocidade máxima

280km/h

Motores

duas turbinas VK-2500PS-3 de 2.700hp

Capacidade

24 passageiros em assentos com sistema de absorção de choque ou 12 macas para evacuação aeromédica

Compartimento de carga

comprimento 6,36m, largura 2,34m e altura 1,8m

Um Mil Mi-8MTV-1 do Afeganistão cumprindo missão de transporte de carga em gancho externo. O clima seco, quente e de grande altitude daquele país é um obstáculo para a operação da maior parte dos helicópteros militares, mas não para estes robustos e polivalentes russos.

dental), foram as características da aeronave e a experiência que os próprios militares norte-americanos têm com esses helicópteros desde março de 2009. Naquele ano, a empresa colombiana Vertical de Aviación foi contratada pelo Departamento de Defesa dos EUA para realizar voos de transporte logístico em todo o Afeganistão. As operações, que serão mantidas até 2018, são realizadas por uma frota de 14 Mi-8MTV e Mi171, além de três aviões BAe Jetstream.

“A aeronave é extremamente robusta, fácil de manter e com sistemas simplificados e analógicos, que tornam a sua operação mais confiável e segura. Podemos operar em frio ou calor extremo, em ambiente com muita umidade e grande altitude, sem o risco de enfrentar problemas com os motores ou com as transmissões”, declarou Fernando J. Lopez, CEO da Vertical de Aviación, sobre as operações dos Mi-8/-171 no Afeganistão.

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O primeiro prot贸tipo do A300B1 j谩 com a pintura aplicada, asas e fuselagem montadas e motores instalados, no hangar da Airbus em Toulouse, dias antes do voo inaugural.

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O DESAFIO DA EUROPA

TODAS AS FOTOS VIA AIRBUS, EXCETO QUANDO CITADO

Por João Paulo Moralez

U

m dos períodos de maior crescimento e desenvolvimento vivenciados pela aviação comercial mundial, talvez sem precedentes em toda a história do transporte aéreo até então, foi durante a década de 60, num momento em que as principais companhias aéreas expandiram suas malhas e capacidade de transporte de passageiros. Aproveitando essa fase de efervescência, as empresas europeias

já previam a necessidade urgente de dispor de um novo avião de pequeno-médio alcance, para transportar até 250 passageiros, visando à demanda regional. Mas, em termos de mercado mundial, havia uma quase total hegemonia, com os grandes fornecedores que se mantinham constantemente na liderança sendo todos dos EUA, por disporem de uma variada gama de jatos comerciais, aptos a atenderem às

mais diversas demandas, das rotas de curto às de longo alcance, num amplo espectro de densidade de tráfego. Diante destes, os fabricantes europeus disputavam entre si (e contra aqueles dos EUA) apenas uma pequena parcela do segmento, sem alcançar grandes resultados com os seus produtos. Se nada fosse feito, o cenário do futuro acenava para um provável monopólio absoluto norte-americano.

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HanGar de P

ossuidor da maior coleção de aeronaves e espaçonaves do mundo, com uma visitação média anual de 9 milhões de pessoas, o National Air & Space Museum (NASM) do Smithsonian Institute, em Washington DC, ganhou um “anexo” (se é que se pode chamar assim o magnífico conjunto arquitetônico construído junto ao Washington Dulles International Airport!) de 71.000m2, aberto ao público em 15 de dezembro de 2003, fruto de uma doação de US$ 65 milhões feita pelo imigrante húngaro Steven F. Udvar-Hazy, cofundador de uma das maiores empresas de leasing de aeronaves do mundo, a International Lease Finance Corporation (ILFC). A coleção colocada nesta nova unidade do NASM está acima de adjetivos que a qualifiquem adequadamente, incluindo não apenas aeronaves realmente únicas no mundo, mas mísseis, foguetes, espaçonaves e diversos outros itens ligados à história da aviação e da conquista do espaço. Aqui, portanto, oferecemos ao leitor de ASAS “apenas” um aperitivo. Um crème de la crème deste acervo absolutamente estonteante...4

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São pouquíssimas as aeronaves que com certeza têm um lugar de destaque na história da humanidade. E o Boeing B-29A Superfortress “Enola Gay” certamente é uma destas, tendo protagonizado o primeiro ataque com arma nuclear, a bomba atômica “Little Boy”, em 6 de agosto de 1945, contra a cidade japonesa de Hiroshima, com a morte imediata de 80 mil pessoas (a radiação e ferimentos elevariam posteriormente o número de vítimas fatais a mais de 100 mil). O mundo nunca mais seria o mesmo... Não por acaso, a preservação e (sobretudo) a exibição pública do “Enola Gay” sempre foram um assunto delicado, com o aparelho tendo permanecido estocado, mas não restaurado, por anos. E sua primeira apresentação pública, ainda não totalmente restaurado, na unidade original do NASM em Washington DC, foi motivo de acalorada polêmica, em 1995. Enfim, hoje ele pode ser visto inteiro no Steven F. Udvar-Hazy Center e não se pode deixar de mencionar que, à parte a atuação específica do “Enola Gay”, o B-29A foi em si uma aeronave revolucionária, o mais sofisticado e avançado bombardeiro pesado da 2ª Guerra Mundial, estabelecendo novos parâmetros e tendo sido usado em ação pelos EUA até mais tarde, na Guerra da Coreia (1950-53).


teSoUroS

TODAS AS FOTOS DO AUTOR

Steven F. Udvar-Hazy Center do SmitHSonian national air & SpaCe mUSeUm - WaSHinGton dC, eUa

Por Claudio Lucchesi

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