Revista ASAS - Edição 84

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Ano XIV – Número 84 – Abril/Maio 2015

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ISSN 1413-1218

R$ 17,90

O Caça que virou a guerra no Leste

+ LAAD 2015 + SEAKING NO BRASIL + AERO INDIA 2015 + BALTIC AIR POLICING

HELIBRAS

Alta Tecnologia em Asas Rotativas


CORES DA AVIAÇÃO MILITAR BRASILEIRA

Por Aparecido Camazano Alamino

O Sikorsky SH-3 Seaking na Aviação Naval Brasileira

ARQUIVOS DE MAURO LINS DE BARROS, VIA AUTOR

HISTÓRICO E DESENVOLVIMENTO DA AERONAVE

No final da década de 50, a aviação da US Navy (USN, Marinha norte-americana) carecia de um novo helicóptero para substituir os já veteranos e desgastados Sikorsky H-34J, designados anteriormente como HSS-1N no âmbito de sua aviação de guerra antissubmarino (ASW), e assim, em 24 de dezembro de 1957, a USN contratou a Sikorsky para projetar esse novo aparelho. Tal contrato previa o desenvolvimento de um protótipo e de seis aeronaves de pré-produção. O protótipo (BuNº 147137), designado pela Sikorsky como S-61 e pela USN como XHSS-2, fez o seu primeiro voo em 11 de março de 1959 em Stratford, Connecticut, ultrapassando os requisitos estabelecidos. Era o primeiro helicóptero bimotor desenvolvido pela Sikorsky, bem como o de maior porte. Tinha motorização de duas turbinas General Electric T-58-GE-6, de 1.050shp, possuindo excelente manobrabilidade na água, pois sua superfície

inferior tinha um leiaute de casco de embarcação. Posteriormente, as primeiras unidades produzidas tiveram as suas turbinas substituídas pelas GE de 1.250shp e de 1.400shp, entre outras, dependendo da variante. A aeronave passou por um complexo período de testes e, em fevereiro de 1961, foi batizada de Seaking (Rei do Mar). O HSS-2 foi designado pela USN como SH-3 e as primeiras unidades de série foram entregues em setembro de 1961 para o VHS10 (no Oceano Pacífico) e para o VHS-3 (no Atlântico), dando início à sua profícua operação na aviação da USN. Além das tarefas ASW, o Seaking também foi projetado para

PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO SIKORSKY SH-3D SEA KING Emprego

Antissubmarino, SAR, transporte, etc.

Características

Helicóptero biturbina, anfíbio, rotor com cinco pás, cauda dobrável

DiÂmetro do Rotor Comprimento Altura Largura

22,15m 6,13m 3,96m² Vazio: 5.387kg Máximo: 9.534kg

Pesos Velocidade Máxima Razão de Subida Teto Máximo Alcance Autonomia

267km/h 671m/min 4.481m 1.005km 5h

Motor

Duas turbinas General Electric T58GE-10, de 1.400shp

Armamento

350kg bombas ou torpedos, dois mísseis AM39 Exocet, etc.

Tripulação

Dois pilotos e dois operadores de sistemas

FONTES: SIKORSKY, HS-1, ARQUIVOS DO AUTOR.

Desembarque de um SH-3A do navio Barroso Pereira, em 1984, no Rio de Janeiro.

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18,90m

ser utilizado em tarefas secundárias, como transporte de tropas, busca e resgate (SAR) e ataque antissuperfície. E viria a ser também fabricado, sob licença, pela United Aircraft (Canadá), Mitsubishi (Japão), Agusta (Itália) e pela Westland Helicopters (Reino Unido). O modelo foi ainda selecionado como helicóptero oficial para o transporte do presidente dos EUA, atuando nessa tarefa desde 1961, na variante VH-3A, substituído em 1976 pelos VH-3D, utilizados até os dias atuais, dotando o HMX-1 da Aviação do Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA. Tais aparelhos tiveram o seu interior adaptado para efetuar o transporte de autoridades (VIP).


taque para Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Egito, Espanha, Índia, Reino Unido, Itália, Irã, Iraque, Japão, Malásia, Noruega, Pa- quistão, Peru, Qatar, Tailândia e Venezuela. Foi produzido um total de 850 unidades de todas as variantes pela Si-

MÁRIO R. VAZ CARNEIRO, VIA AUTOR

Os SH-3D N-3007 e N-3010 no NAeL Minas Gerais em 1992.

korsky, 344 aeronaves pela Westland, 167 pela Mitsubishi, 146 pela Agusta e 37 foram montadas pela United Aircraft. O último aparelho fabricado foi um Seaking Mk.43B, produzido pela Westland Helicopters, em junho de 1992, para a Força Aérea da Noruega. O número total de Seaking produzido atinge cerca de 1.544 unidades, em mais de 30 variantes.

O SH-3 SEAKING NA AVIAÇÃO NAVAL DA MARINHA DO BRASIL

O 1º Esquadrão de Helicópteros Antissubmarino (HS-1), “Esquadrão Guerreiro”, da Aviação Naval da Marinha do Brasil (AN-MB), sediado na Base Aérea Naval de São Pedro da Aldeia (BAeNSPA, Rio de Janeiro), foi ativado em 28 de maio de 1965 com a tarefa principal de detectar, localizar e atacar submarinos. Também tem o encargo secundário de atuar em missões de transporte de tropas, SAR e evacuação aeromédica. No início, o HS-1 foi dotado com os Sikorsky SH-34J Sea Bat, que foram recebidos da Força Aérea Brasileira (FAB)

O SH-3D N-3007 realiza voo de adestramento assim que foi recebido em 1970. Notar o primeiro emblema do HS-1 pintado na cabina.

ARQUIVOS DE MAURO LINS DE BARROS, VIA AUTOR

A USN desativou os seus últimos SH-3 em 2006, sendo substituídos pelos Sikorsky SH-60 Seahawk, que, apesar de sua modernidade, não estão aptos a pousar na água como seu antecessor. Por outro lado, o Seaking foi utilizado por inúmeros outros países, em missões ASW, antissuperfície, transporte, SAR e transporte VIP, com des-

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Aproximando continentes Por Daniel R. Carneiro

O CONCORDE EM SERVIÇO

O Brasil e, em especial, o Rio de Janeiro tiveram a primazia de ser o destino final do primeiro voo comercial de um Concorde da Air France. Em 21 de janeiro de 1976, a aeronave de C/n 205, F-BVFA, decolou de Paris com destino à Cidade Maravilhosa, com uma escala em Dacar para reabastecimento. Simultaneamente à partida do Concorde francês de Paris, o avião de C/n 206, G-BOAA, da British Airways, decolou de Londres com destino a Bahrein. Os voos entre Paris e Rio de Janeiro eram operados às quartas-feiras e do-

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mingos, com chegada ao Aeroporto Internacional do Galeão às 16h00 e partida de volta a Paris às 19h40. Sua chegada ao Rio de Janeiro era sempre um acontecimento, lotando o terraço (na época aberto) de curiosos para ver de perto o jato comercial mais revolucionário de todos os tempos. O último voo regular entre Paris e Rio de Janeiro aconteceu em 1º de abril de 1982, mas depois disso o Galeão e outros aeroportos brasileiros, como Guarulhos e Foz do Iguaçu, foram visitados pelos supersônicos em voos charter (não regulares).

Os da British Airways, que nunca operaram regularmente no Brasil, chegaram a visitar o Rio de Janeiro pelo menos duas vezes nos anos 80. Em 10 de abril de 1976, a Air France iniciou voos para Caracas, com escala nos Açores. Tanto a Air France como a British Airways planejavam voar com o Concorde para os EUA, mas um forte lobby de ambientalistas e moradores das cidades que seriam servidas pelo supersônico e da própria indústria aeronáutica local (a Boeing vira fracassar o seu projeto próprio de supersônico comercial), com a argumentação de temer


a Mach 2!

VIA BRITISH AIRWAYS

PARTE II

danos causados pelo estrondo sônico ou mesmo o ruído produzido pelo avião em velocidades subsônicas, adiou suas operações no Atlântico Norte. Após longas discussões, o Secretário de Transportes dos EUA concedeu a permissão para a operação no aeroporto de Washington Dulles e os voos para a capital dos EUA tiveram início em 24 de maio de 1976. Os voos para Nova Iorque demorariam mais um pouco e a permissão só foi finalmente concedida quando se conseguiu provar que o Concorde produzia, em voo subsônico, menos ruído que os Boeing 707 – o que incluía o Air Force

One, na época ainda um VC-137 (versão militar VIP do 707). Acusações de que as emissões de gases pelo Concorde causariam danos à camada de ozônio também foram refutadas pela National Oceanic & Atmospheric Administration (NOAA, agência responsável pelo monitoramento da atmosfera e oceanos), que afirmava que seria preciso uma frota de 500 Concorde para que houvesse algum impacto significativo. Resolvidas essas questões, os voos de Paris e Londres para o Aeroporto Internacional John F. Kennedy tiveram início em 22 de novembro de 1977.

Nesse mesmo ano, a British Airways e a Singapore Airlines assinaram um acordo de compartilhamento de um Concorde para realizar voos entre Londres e Singapura, via Bahrein. A aeronave de C/n 210, G-BOAD, foi pintada nas cores da Singapore Airlines no lado esquerdo da fuselagem. Entretanto, a proibição pelas autoridades da Malásia e da Índia do sobrevoo do Concorde em velocidade supersônica tornou a operação inviável e os voos para a Ásia foram suspensos. Entre setembro de 1978 e novembro de 1982, dois dos voos semanais de Paris a Nova Ior-

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Helibras

Renovação e Alta Tecnologia para o Mercado Civil de Asas Rotativas

O H225 em operação pela Bristow, configurado para missões de busca e resgate.

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esmo de longe, a silhueta é singular e fora do comum entre tantos tipos vistos no Campo de Marte. O helicóptero de nariz afilado e com grande área envidraçada estava com as portas laterais e as traseiras abertas, dando destaque para as dimensões da cabine de passageiros. O rotor de cauda carenado, solução para garantir menor emissão sonora e trazer maior segurança de voo, era o que mais se destacava. Naquela tarde com céu nublado em São Paulo (SP) estávamos na presença do H145 (nova designação do EC.145T2), um dos mais novos modelos da Airbus Helicopters que pela primeira vez fazia o seu tour de demonstração no

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Brasil, através da Helibras. Hoje, São Paulo possui a maior frota de helicópteros do mundo, sendo mais de 500 exemplares registrados apenas na capital paulista. Sobrevoar seus arranhacéus de helicóptero requer cada vez mais o emprego de aeronaves modernas, mais seguras e com maior eficiência em termos de emissão de ruído e gases na atmosfera. A presença dos helicópteros da Airbus Helicopters no Brasil não vem de hoje, mas desde 1978, quando a Helibras foi criada em 14 de abril daquele ano e instalada inicialmente no famoso hangar X-10 do Centro Técnico Aeroespacial (CTA). Seu primeiro cliente foi a Marinha do

Brasil, que em 1979 adquiriu seis HB-350 Esquilo, estes lançados no mercado internacional apenas três anos antes. Assim, a Helibras foi a pioneira no desenvolvimento da indústria e do polo de asas rotativas nacional, apoiando a partir daquele contrato os clientes com suporte pós-venda e modificações necessárias nos helicópteros para atender às demandas do mercado brasileiro. “A Helibras é um caso único na atividade de helicópteros do grupo. Nas cadeias de montagem, não temos em nenhum outro lugar, senão no Brasil, atividades completas de fabricação de helicópteros. As fábricas que temos jun-


A. PECCHI, VIA HELIBRAS

Ligada à Airbus Helicopters, a Helibras tem nos últimos anos renovado a sua linha de modelos civis, com a introdução de tipos genuinamente novos, sempre na busca de maior segurança, conforto e eficiência, para satisfazer os mais diferentes segmentos e requerimentos do mercado civil. Nesta reportagem, João Paulo Moralez mostra um panorama completa desta atual linha de produtos, que coloca o Brasil também na vanguarda da indústria aeronáutica de asas rotativas.

to à Helibras são as mesmas que as nossas fábricas europeias. A Helibras é tão importante para o grupo quanto a nossa sede em Marignane. Com uma base tão importante quanto a Helibras, podemos confiar a ela atividades muito mais desenvolvidas, importantes e determinantes que a simples montagem e manutenção”, disse em entrevista à nossa reportagem Marwan Lahoud, diretor geral delegado à Estratégia e à Área Internacional da Airbus Group, presidente da Airbus Group SAS e presidente da Groupement des Industries Françaises Aéronautiques et Spatiales (GIFAS, Associação das Indústrias Aeroespaciais Francesas).

Esquilo

Montado no Brasil, o Esquilo tornou-se um dos modelos mais operados no País devido às suas características de versatilidade, robustez, baixo custo de aquisição e operação e fácil adaptação às mais variadas missões do mercado executivo, táxi aéreo, defesa civil, resgate aeromédico, parapúblico e cobertura de acontecimentos das grandes cidades pelas emissoras de rádio e TV. Equipado com uma turbina Turbomeca Arriel 1D1 de 732shp de potência na decolagem, o AS.350B2 pode transportar um piloto mais seis passageiros ou um piloto, dois médicos e uma maca. A

cabine possui um volume de até 3m³, sendo que o Esquilo pode transportar 136kg no guincho lateral e até 1.160kg de carga externa. Mais de 22 milhões de horas foram voadas em todo o mundo com essa família. Já o H125 (ex-AS.350B3e) possui desempenho extraordinário, com uma Turbomeca Arriel 2D com FADEC em duplo canal e 847shp de potência, podendo transportar a mesma quantidade de passageiros que o AS.350B2. Para missões aeromédicas, um kit especial contendo equipamentos dedicados a essa tarefa foi exclusivamente desenvolvido pela Helibras com capacitação e profissionais

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Baltic Air Policing 2015 TODAS AS FOTOS DOS AUTORES

Por Johan Franken e Frank Van Der Avoort

Numa cinzenta manhã, em 9 de fevereiro último, dois caças Eurofighter italianos decolaram da base aérea lituana de Šiauliai, iniciando sua rotina diária de voo sobre a paisagem desolada e nevada. Então, de súbito, o controle aéreo detectou uma aeronave não identificada em voo na direção do espaço aéreo do Báltico. Em segundos a missão rotineira tornou-se “quente”. Voando sempre armados, os jatos foram vetorados, seguindo em pós-combustão, até o ponto planejado de interceptação. Em paralelo, em Šiauliai, um terceiro Eurofighter decolou em emergência operacional, caso um dos dois já em voo tivesse limitação de combustível. Em minutos, os três Eurofighter alcançaram uma solitária aeronave militar russa, que voava sem transponder, bem no limite do espaço aéreo da nação báltica. O aparelho foi identificado como um Ilyushin Il-20M (Coot-A no código da OTAN), uma aeronave de Inteligência Eletrônica (ELINT), cujas marcações e características externas foram então informadas ao Centro de Operações Aéreas Combinadas da OTAN, em Uedem, Alemanha. Ali, tomou-se a decisão de que os caças Eurofighter não deviam tomar nenhuma outra ação que não a de escoltar o avião russo, mantendo-o fora do espaço aéreo lituano.

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Dois dos Eurofighter Typhoon da AMI baseados em Šiauliai, sendo um do 36º Stormo (em primeiro plano) e o outro do 4º Stormo.

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m 29 de março de 2004, as estrategicamente localizadas nações bálticas, Estônia, Letônia e Lituânia, se uniram à OTAN e um dos requerimentos desta a todos os seus membros é que cada um seja capaz de proteger seu próprio espaço aéreo contra qualquer possível invasor. Porém, especialmente no caso da Estônia e da Letônia, havia absolu-

ta falta de recursos para isso, enquanto tudo de que dispunha a Lituânia era de um punhado de jatos de instrução militar L-39, totalmente inadequados à tarefa nos três países. Em função da estratégia, liderada pelos EUA, de incrementar a presença militar da OTAN junto às fronteiras da Rússia, porém, tomou-se a decisão inédita de que ou-

tros países da aliança militar proveriam defesa aérea às nações bálticas. Hoje, passados dez anos e com uma nova escalada da presença militar dos EUA e da OTAN no Leste Europeu e a consequente instabilidade provocada por isso na região, fomos conferir como funciona a chamada missão Baltic Air Policing, aproveitando a temporada em

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O primeiro Ele foi o primeiro aviador do Exército Brasileiro, pioneiro da aviação civil nacional e o primeiro em todo o continente americano a combater utilizando o avião como máquina de guerra. E 100 anos atrás, em 1º de março de 1915, o Tenente Ricardo João Kirk morreu realizando uma missão durante a Guerra do Contestado. Conheça a trajetória deste aviador nesta matéria de João Paulo Moralez.

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estas e encontros aviatórios eram febre no início da década de 1910. Pilotos estrangeiros chegavam a todo o instante com as suas máquinas, fazendo demonstrações, rasantes e reides aéreos ligando as principais cidades brasileiras da época. Multidões se aglomeravam para ver aqueles ícaros destemidos se lançarem aos ares. E foi nesse ambiente que a aviação começou a prosperar no Brasil, “convocando” pelo coração seguidores que dedicaram as suas vidas às atividades aéreas. Entre tantos exemplos, o Tenente Ricardo João Kirk, oficial de Infantaria do Exército Brasileiro (EB), arriscou-se num ousado “voo de fantasia e altitude”, como eram chamadas tais exibições, voando com ninguém menos que o mítico aviador francês Roland Gar-

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ros, num voo decolando do Jockey Club do Rio de Janeiro durante a Semana de Aviação, em 18 de janeiro de 1912. Bastou aquele episódio para que o Tenente Kirk se engajasse profundamente na aviação a partir de então, tendo ingressado por conta própria no Aero-Club Brasileiro, fundado em 14 de outubro de 1911. Nascido na cidade de Campos (RJ) em 23 de março de 1874, Kirk ingressou na Escola Militar em 1891, sendo promovido a alferes em 3 de novembro de 1893 e a primeiro-tenente em 9 de março de 1898. No auge dos seus 38 anos e depois da Semana de Aviação, Kirk contatou o piloto italiano Ernesto Darioli e começou a ter, ainda em 1912, aulas de pilotagem em Santa Cruz (RJ), local onde o piloto man-

tinha uma pequena estrutura com hangar para instrução de voo, provavelmente “herdada” do pioneiro francês Edmond Plauchut, que conduzira ali as suas atividades aeronáuticas. Vale recordar que na época o jornalista Irineu Marinho, por meio do seu periódico A Noite, incentivava muito o desenvolvimento da aviação brasileira, civil e militar. Em maio de 1912, o vespertino publicou a carta do aluno Aliathar Martins, da Escola de Guerra, ressaltando a importância que o avião ganhara, antes mesmo da 1ª Guerra Mundial, em vários países na Europa, como fundamental meio de combate para os exércitos. Assim, observando a já relevante importância de trazer a aviação para o âmbito militar, o ministro da Guer-

Os três hangares erguidos no campo de aviação em União da Vitória.


ra, General Vespasiano Gonçalves de Albuquerque e Silva, decidiu enviar à França o Tenente Kirk para realizar o curso completo de pilotagem, pois o militar já dispunha de razoável experiência na aviação devido às aulas que tivera com Darioli e pelo seu envolvimento na direção do Aero-Club Brasileiro. O embarque para a Europa ocorreu em 27 de julho, sendo que finalmente em 22 de outubro de 1912 o Tenente Kirk tornou-se o primeiro aviador do EB, ao conquistar o brevê internacional de Nº 1089, emitido pela École d’Aviation d’Etampes, na França. Nesse país, além das aulas, Kirk iniciou o processo de filiação do Aero-Club Brasileiro junto à Fédération Aéronautique Internationale (FAI, Federação Aeronáutica Internacional), para que os brevês emitidos pela instituição brasileira tivessem validade e reconhecimento internacional. Retornando ao Brasil em abril de 1913, Kirk continuou empenhado em divulgar e fortalecer a aviação no Brasil, além de trabalhar intensamente para que as obras da pista e dos hangares no Campo dos Afonsos, onde seriam concentradas as instruções práticas do Aero-Club, fossem concluídas. Graças à campanha Deem Asas ao Brasil do jornal A Noite, com a qual uma grande quantidade de dinheiro foi levantada através de subscrições públicas em todo o Brasil, Kirk retornou à França em setembro de 1913 para adquirir dois Morane-Saulnier, hélices e peças de reposição para a operação das aeronaves, retornando apenas em 6 de abril de 1914. Ao chegar com todo o equipamento, o aviador tomou conhecimento de que a verba para preparar o campo de aviação e a infraestrutura de apoio na Fazenda dos Afonsos (que depois passou a ser conhecida como Campo dos Afonsos) estava atrasada. Contando com Darioli, ele então iniciou um trabalho de divulgação do Aero-Club, disputando com o seu antigo instrutor uma prova de velocidade num trajeto de 200km de distância sobre o Rio de Janeiro, que terminou sem vencedores, já

que ambos não concluíram a etapa. Também protagonizaram o que ficou conhecida como a primeira reportagem aérea do País ao levarem os repórteres Paulo Cleto e Freitas Pitombo, de A Noite, a bordo dos seus aviões a 750m de altitude sobre o Rio de Janeiro. Entretanto, nos meses seguintes, Kirk tomou um caminho completamente inesperado, com a eclosão da Guerra do Contestado, na região de divisa entre os Estados do Paraná e Santa Catarina, compreendida entre os rios Santo Antônio e Peperi-Guazu, a oeste, margeando ao sul o Rio Uruguai, ao norte o Rio Iguaçu e, terminando a leste, nos rios Canoas, Marombas e Preto. Por aquele local fora construída pela Brazil Railway Company a estrada de ferro São Paulo-Rio Grande, ligando Itararé (SP) a Santa Maria (RS) num trajeto de 1.400km. Ao término das obras em dezembro de 1910, a empresa recebeu um trecho de 15km de cada lado da estrada de ferro, totalizando uma área de mais de 6.600km². As terras foram declaradas devolutas e os residentes foram obrigados a deixar o local. Aliado a isso, o fim da construção da estrada gerou uma verdadeira massa de desempregados que, assim como as pessoas que tiveram as suas terras desapropriadas, estavam vivendo em situação de miséria. Naquele cenário de crise social surgiu o Monge José Maria de Santo Agostinho, uma figura religiosa que começou a exercer profunda influência na população miserável. Sua verdadeira identidade era Miguel Lucena de Boaventura, um exsoldado do EB e ex-cabo da Força Pública do Paraná. O monge ganhou seguidores e tornou-se um líder político e militar, que possuía estandarte próprio e também um grupo de fiéis que andava armado para defendê-lo em casos especiais.

Em meados de 1912, o Coronel Francisco de Albuquerque pediu apoio ao governo federal para expulsar centenas de fiéis reunidos em Taquaruçu (SC), sendo imediatamente atendido pelo então presidente da República, Marechal Hermes Rodrigues da Fonseca, que enviou tropas para aquela região. José Maria fugiu com os seus fiéis para Palmas (PR), mas acabou despertando a atenção do governo paranaense, que enviou um efetivo do Regimento de Segurança do Paraná para expulsar o bando invasor de volta às terras catarinenses. Mesmo não dispondo de treinamento militar e equipamentos modernos, os rebeldes eram numericamente superiores às tropas estaduais e federais, conheciam muito bem a região e conquistavam significativas vitórias utilizando técnicas de guerrilha e emboscadas em plena mata fechada. Essa situação começou a mudar em 12 de setembro de 1914, com a nomea-

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TODAS AS FOTOS DE ARQUIVOS DO AUTOR, EXCETO QUANDO CITADO

22 de setembro de 19 44 O Exército Vermelho avança contra as po sições alemãs nos países bálticos. Já um ás, Ivan Kozh edub, está em patrulh a sobre território ocupado pe lo inimigo, ao sul do Lago Burtnieki. Por azar, seu veterano ala, Titarenko, está ai nda afastado de voo, recuperandose de uma doença, e as sim acompanha é um pi quem o loto jovem, Sharapov . Avistam então oito caças-bombardeir os Focke-Wulf Fw-1 90, em curso para cruzar o Rio Se da, na região de Dak sty. Os alemães parecem sequer se pr eocupar com a presen ça de inimigos no ar. Não veem os do is Lavochkin. Mantê m calmamente seu curso. Kozhedub se aproxim a por trás da formaç ão. A artilharia antiaér ea alemã, porém, ab re fogo. O veterano ás não perc ebe, atrás de si, mas o caça de Sharapov é atingido. Cai. Kozhedub está sozinho. Mas ele segue e enquadra um dos Fw-190 na re taguarda do grupo. Abre fogo. O caça gira sobre sua as a e despenca para a terra. A form ação alemã se quebra . Alguns se retiram. Jogam aleato riamente suas bomba s sobre as próprias tropas e mer gulham, fugindo em baixa altitude. Com a concentração de artilharia inimiga , Kozhedub não os persegue. Sobe, ga nhando altitude. E pr ocura por seu ala. Não tem resposta no rádio. Não o vê. Mas então aparecem outros seis Focke-Wul f, também

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com bombas. També m estão na rota da tra vessia do Seda. Decidido, o pi loto soviético sobe, ap ro ximando-se por cima, com o sol por trás. Mas o líder inimigo percebe aquele solitário Lavo chkin. O Fw-190 larg a sua bomba e tenta ganhar altitud e. Kozhedub, porém , o alcança primeiro. Abre fogo e o Focke-Wulf desp en ca em chamas. O quinteto alemão re stante, de novo em m ergulho, se afasta para oeste. O soviético aproveita para de novo procur ar por seu ala, mas não tem m uito tempo. Surgem do is pares de outros Fw-190. Estes não têm bombas. Sã o caças “puros”, provavelmente cham ados por rádio. Kozhedub tem a vant agem da altitude – e não é afeito a evitar um combate. Logo o Lavochkin es tá num feroz dogfigh t com três dos Fw-190. O quarto, pr ovavelmente o líder, se afasta e busca ganhar altitude, para dar cabo de vez daqu ele inimigo intrometido. Mas Ko zhedub percebe e se la nç a contra ele. Abre fogo. O alemão se mantém no ar, m as mergulha, retirando-se na dire ção de Riga. Atordoados, os três re stantes logo também se afastam. Apesar da vitória du pla, Kozhedub se afas ta preocupado com seu jovem ala. So mente bem mais tard e, com seu regimento aéreo já operando sobre Be rlim, é que reencontrará Sharap ov, libertado então de um campo de prisioneiros.


Por Claudio Lucchesi

Bela foto em voo de um La-5F operado pelo 145 ou 147.GIAP da Defesa Aérea soviética (PVO).

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aviam ficado no passado os massacres aéreos do verão de 1941, no Fronte Leste, quando tudo o que havia diante das hordas de Bf-109 da poderosa Luftwaffe (a Força Aérea alemã) eram antigos e ultrapassados caças I-16 e os ainda mais obsoletos biplanos I-15. Então, no verão de 1943, chegaram aqueles caças robustos, com seus estrondeantes motores radiais, capazes de desafiar não apenas os onipresentes Bf-109, mas mesmo os mais ágeis e avançados Focke-Wulf Fw-190. Eles iam arran-

car da Luftwaffe a supremacia aérea no Leste – e assim abrir os céus para a derrota final do 3º Reich de Adolf Hitler. Mas que caças eram esses? No final da década de 1930, a direção da indústria aeronáutica (NKAP) e o Alto-Comando da VVS (Força Aérea soviética) emitiram requerimentos para uma nova geração de aeronaves de combate, incluindo para um novo caça monomotor, baseado numa proposta de Vladimir Gorbunov, que viria a ser desenvolvido sob supervisão deste, por

uma equipe liderada pelo projetista Semyon Lavochkin, com Mikhail Gudkov sendo responsável pela motorização. Com estrutura quase toda em madeira e linhas aerodinâmicas elegantes e limpas, o protótipo I-301 voou em 30 de março de 1940 e logo mostrou ser capaz de atingir 614km/h a 4.950m de altitude. Aprovado para produção como LaGG-1, sofreria diversas modificações e a primeira versão a ser de fato produzida em quantidade foi o LaGG-3, o primeiro dos quais saiu da linha de

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Fruto de uma joint venture indo-russa, o Brahmos-A é uma das mais avançadas e letais armas de sua categoria, logo sendo operacional na versão lançada de aeronaves.

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O Sukhoi Su-30MKI da FAI, exibido na mostra estática com o míssil Brahmos-A.


Aero India 2015, Bangalore, 18-22 de fevereiro Por Piotr Butowski SP-1 (Series Production). Seu primeiro voo foi em 1º de outubro de 2014 e o aparelho foi oficialmente entregue à FAI em 17 de janeiro deste ano. Entretanto, na conferência para a imprensa durante a Aero India 2015, o Marechal Raha precisou que o SP-1 e o subsequente SP2 ainda não atendem aos requerimentos IOC-2 da FAI e que “apenas do SP3 em diante o Tejas será produzido na requerida especificação” e então estará pronto para entrar em serviço. É bom lembrar que o jato havia recebido sua Initial Operational Clearance (IOC, autorização de operação inicial) já em 10 de janeiro de 2011, mas posteriormente os requerimentos foram elevados, passando a considerar uma “verdadeira” autorização a IOC-2, recebida em 20 de dezembro de 2013. A autorização final (FOC, Final Operational Clearance) deveria ser obtida em dezembro deste ano. Muitos testes já foram completados, mas os de reabastecimento em voo, do canhão, de integração do tanque externo supersônico, de bombas de baixo arrasto e alta velocidade, de combates próximos e BVR, assim como de expansão do envelope em altos ângulos de ataque e dos limites G, ainda precisam ser certificados para se chegar à FOC. Hoje, a FAI possui uma encomen-

TEJAS, FINALMENTE EM PRODUÇÃO EM SÉRIE Em Bangalore, fez sua estreia o exemplar do LA-5001 do Tejas, o primeiro de série do modelo,

Maquete do Brahmos-NG, nova versão do míssil, em desenvolvimento.

da para 40 Tejas, todos na versão Mk.1. O Tejas Mk.2 será dotado de sensores mais modernos, incluindo um radar de varredura eletrônica ativa (AESA), e nova suíte de contramedidas eletrônicas (ECM). Também possibilitará novas opções de armas e os sistemas de navegação e o cockpit serão modernizados, além da instalação de sonda de reabastecimento em voo e outras melhorias. Com tudo isso, a fuselagem será encompridada em 50cm, ficando com 13,70m, e por fim a motorização atual (a GE F404-IN20, com 8.600kgf de empuxo) será substituída pela mais potente GE F414-INS6, de 10.000kgf. Prevê-se o seu primeiro voo em 2017-18.

O TEJAS NAVAL

Uma segunda estreia foi a do NP-2, o segundo protótipo da versão naval, embarcada, do Tejas, que fez seu primeiro voo pouco antes, em 7 de fevereiro, em Bangalore. O primeiro protótipo, o biplace NP-1, voou em 27 de abril de 2012. O Tejas naval é um aparelho de categoria Short Take-Off But Arrested Recovery (STOBAR, decolagem curta sem catapulta e pouso com gancho) e uma parte importante dos testes serão exatamente os pousos e decolagens, usando um convoo simulado de

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Aeronautics Ltd (HAL), com componentes supridos pela Dassault. Como no programa do Su-30MKI, os Rafale de produção local seriam montados em “fases”, com contribuição crescente da HAL na produção das aeronaves. Mas, enfim, surgiu uma decisão concreta, com a visita de Narendra Modi à França, no início de abril. No dia 10, em Paris, foi anunciada a assinatura de um contrato para a aquisição de 36 Rafale pela FAI, produzidos e entregues diretamente pela Dassault. Segundo uma fonte do Ministério da Defesa francês, citada pela agência de notícias Reuters, “o novo contrato anunciado pelo primeiro-ministro Narendra Modi em Paris é separado das negociações originais” (ou seja, dos termos do MMRCA, incluindo a produção licenciada e transferência de tecnologia). Já o ministro da Defesa indiano, Manohar Parrikar, declarou no dia seguinte à assinatura que o primeiro dos Rafale, entretanto, só será entregue à Índia por volta do início de 2018. Fim da “novela” do Rafale na Índia? Não! A tinta mal havia secado no contrato assinado e já se levantaram vozes na própria Índia contra o acordo. Um proeminente membro do próprio partido de Modi, Subramanian Swamy, declarou a intenção de bloquear o contrato, recorrendo, inclusive, à Suprema Corte do país: “se o primeiro-ministro, por uma compulsão de qualquer ordem, decidir ir adiante com esta negociação, então eu não vou ter opção senão recorrer à Corte”, declarou, citado pela Reuters.

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Academia de

Artes

Por Claudio Lucchesi

Greg Hildebrand t

O

universo mágico de J. R. R. Tolkien, a saga interestelar de Star Wars, as aventuras em quadrinhos dos super-heróis da Marvel e da DC Comics, e até o heavy metal de Black Sabbath e as fantasias de Harry Potter têm a marca de sua arte! Num bate-papo exclusivo para os leitores de ASAS, Claudio Lucchesi conversou com um dos maiores

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artistas vivos da cultura pop norte-americana sobre sua arte, seu processo criativo, pin-ups... e aviões. ASAS – Como foi que surgiu The Brothers Hildebrandt (Os Irmãos Hindebrandt)? GREG HILDEBRANDT – Este nome, The Brothers Hildebrandt, surgiu em 1976, quando a Ballantine (famosa

companhia editora norte-americana) publicou o primeiro calendário de Lord of the Rings (O Senhor dos Anéis, de J. R. R. Tolkien), ilustrado por nós. Isso criou o apelido, The Brothers Hildebrandt, com o qual passamos a ser conhecidos desde então. Porém, veja bem, eu e meu irmão Tim (falecido em 11 de junho de 2006) somos gêmeos idênticos. Passamos toda a nossa vi-


da juntos, criando uma coisa ou outra desde que tínhamos 3 anos de idade! ASAS – A sua carreira profissional começou em 1959, mas apenas em 1999 é que você voltou a sua atenção (e sua arte) ao tema das pin-ups. O que o levou às pin-ups? GH – Passei a maior parte da minha carreira dedicando-me à ficção cientí-

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De autoria de David Landau, ex-editor chefe do mais antigo diário de Israel, Haaretz, este livro é a primeira biografia completa de Ariel Sharon, o mais dramático e marcante líder militar e político de Israel nos últimos 40 anos. Sua vida, de fato, espelha muito a própria história moderna de Israel. Comandante do Exército israelense desde a criação deste, em 1948, Sharon tomou parte não apenas na Guerra de Independência, mas também na Crise de Suez (1956) e nas Guerras dos Seis Dias (1967) e do Yom Kippur (1973). Após deixar a carreira militar, tornou-se um destacado líder político. Tendo apoiado os assentamentos judeus na Cisjordânia e Gaza ocupadas, ao se tornar primeiro-ministro, liderou uma histórica mudança da política israelense, incluindo a retirada da Faixa de Gaza. Esta biografia mostra como a liderança de Sharon transformou Israel e como as suas opiniões foram moldadas pela natureza mutável da sociedade israelense.

EM BRE

VE!

Ivan N. Kozhedub foi o maior de todos os ases dos Aliados na 2ª Guerra Mundial, com mais de 60 vitórias confirmadas em combates aéreos – incluindo um caça a jato alemão Me-262. Apesar disso, sua autobiografia não tem edição disponível no Ocidente, nunca tendo sido publicada em língua portuguesa. Nascido numa família camponesa, participou da luta da Força Aérea soviética para se impor diante da toda-poderosa Luftwaffe e, enfim, sobrepujá-la, abrindo caminho para o fim do regime de terror nazista de Adolf Hitler. Um dos dois únicos pilotos soviéticos a serem agraciados três vezes com a maior comenda militar de seu país, a medalha de Herói da União Soviética, Kozhedub participaria, após o conflito mundial, da Guerra da Coreia. Esta obra resgata sua história, sendo de valor inquestionável para todo leitor de aviação e de sua história, permitindo uma visão pessoal e íntima de uma das forças determinantes da 2ª Guerra Mundial, a Força Aérea soviética.


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