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É hora de casar!
Lysa, a Cão-guia Robô, oferece facilidades para melhorar a qualidade de vida
Noivas cadeirantes enfrentam barreiras arquitetônicas e sociais
Neide Sellin
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NÚME RO 1 • PR EÇ O R$ 13,90 ISSN 2359-5620
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Práticas na Educação Inclusiva Projetos didáticos: uma estratégia que ainda desafia os professores
Cometida de muitas formas, a violência humilha, traumatiza, deixa marcas profundas e deteriora a dignidade humana. Aprenda, denuncie, proteja IMPLANTE COCLEAR A possibilidade de recuperar a audição
MULHER DO PAI
O filme que traz a cegueira para o centro da relação
AUTISMO
A família faz toda a diferença
REATECH
A maior feira de tecnologia inclusiva
NA REDE
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“A Revista D+, mídia segmentada em inclusão social com foco na pessoa com deficiência, é uma das poucas no Brasil capazes de transmitir o conceito inclusivo com qualidade e seriedade. Apresenta um nível de representatividade para as pessoas com deficiência totalmente significativo e ímpar. A página do Facebook merece cinco estrelas! O site também é um exemplo de mídia virtual consciente e de fato inclusiva. Conteúdo incrível! Parabéns! Sou admiradora e seguidora da Revista D+!” Geane Poteriko
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Conexão Você vai encontrar um link no final de algumas reportagens. Ele lhe dará acesso a um conteúdo especial, com mais informações e fotos sobre aquele assunto. Alguns trazem até vídeos! Aproveite!
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Todos os dias, a Equipe D+ traz para o site novidades importantes e curiosidades na área da inclusão social. Em nossa temporada de Carnaval, fomos agraciados pelo engajamento dos curtidores na cobertura do Bloco VibraMão no festejo paulistano. O vídeo atingiu 58 mil visualizações ao mostrar o discurso de abertura do primeiro bloco de surdos de São Paulo. Obrigado, gente!
MÚSICA PARA TODOS Em nosso site, você fica sabendo sobre o que tem de melhor na agenda cultural do país. O Centro de Reabilitação Lucy Montoro Lapa, localizado na zona oeste da capital paulista, promove uma oficina musical para pessoas com restrições físicas e intelectuais distintas. As aulas, ministradas pelo professor de música Carlos Henrique Peixoto, têm o objetivo de auxiliar na descoberta de novas habilidades e potencialidades através de instrumentos musicais.
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EDITORIAL
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PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA Projetos didáticos: protagonismo dentro da sala de aula
É HORA DE CASAR!
Noivas cadeirantes enfrentam barreiras arquitetônicas e sociais
Lysa, a Cão-guia Robô, oferece facilidades para melhorar a qualidade de vida
Cometida de muitas formas, a violência humilha, traumatiza, deixa marcas profundas e deteriora a dignidade humana. Aprenda, denuncie, proteja IMPLANTE COCLEAR A possibilidade de recuperar a audição
MULHER DO PAI
O filme que traz a cegueira para o centro da relação
AUTISMO
A família faz toda a diferença
Edição nº 14: Foto de capa por Shutterstock
REATECH
A maior feira de tecnologia inclusiva
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NÚME RO 1 • PR EÇ O R$ 13,90 ISSN 2359-5620
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Neide Sellin
A realidade dura não pode ser, também, invisível
P
ara nós não foi fácil escolher a imagem da capa desta edição. “Flores murchas e secas?”. Sim, flores murchas e secas. A subjetividade da imagem reflete uma realidade que não tem nada de abstrato: as pessoas com deficiência sofrem violências de diversos níveis de crueldade. E não tem nada de bonito nisso.
Em nossa reportagem de capa desta edição você verá números alarmantes e conhecerá histórias que precisam sair da invisibilidade. Só assim é possível tomar providências, aprender a proteger, denunciar rapidamente, cobrar o poder público e parar de “esconder” os fatos debaixo do tapete. Confira a partir da página 44. Apostamos que você não conhece nem um terço das frutas que trouxemos no texto de Perfil. Fomos para Campina de Monte Alegre, a pouco mais de três horas da capital, para conhecer o maior colecionador de frutas do país. Helton Josué Teodoro Muniz tem deficiência neuromotora e uma fazenda com mais de 1.400 espécies de frutíferas! Lá na página 24. Se você ainda não sabe, a Revista D+ foi escolhida para ser a imprensa oficial de uma das maiores expressões dos setores de reabilitação, inclusão e acessibilidade, a feira de tecnologia assistiva Reatech. Na página 70 você confere o que vem por aí, de 1º a 4 de junho, no São Paulo Expo. Falando em evento, qual poderia ser maior do que o próprio casamento? Fizemos uma reportagem com noivas cadeirantes: na página 38, as experiências – boas e ruins – de quem precisa encarar o preconceito e as barreiras. Também falamos sobre o envelhecimento das pessoas com deficiência intelectual na página 76. Em educação, discutimos a importância dos projetos didáticos como meio para transformar as práticas docentes na sala de aula e na escola. Já em Saúde, trazemos uma matéria a respeito do implante coclear para a pessoa surda (a repórter Brenda foi para Embu das Artes, em São Paulo, fotografar o Rodrigo, primeiro bebê de nove meses no Brasil – hoje com 10 anos – a receber implante coclear unilateral). Há tantas coisas nesta edição que só lhe resta... ler com calma! E a gente pode combinar assim: tudo o que você ler e gostar, informe outros, repasse o conhecimento. Todos os esforços para tornar o segmento da pessoa com deficiência visível – e respeitado – são bem-vindos! Até a próxima edição! Rúbem Soares Diretor Executivo
DO LADO DE CÁ
Nos bastidores Vem ver um pouco do que e de quem a gente traz para você nessa edição!
Foram seis horas de entrevistas com os profissionais da 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência no intuito de trazer as melhores informações para a reportagem de capa. Confira tudo a partir da página 42
Nossa editora-chefe, Taís Lambert, viajou quase 300 km para tomar suco de guabiroba laranja. Opa, não foi isso, não! Em Campina de Monte Alegre, entrevistou Helton, o maior colecionador de frutas do Brasil (com deficiência motora) e sua linda esposa, Emilene
As repórteres Mayra Ribeiro, Brenda Cruz e Audrey Scheiner na coletiva de imprensa (e matando a saudade da infância!) do Rá-Tim-Bum, O Castelo. A exposição, que oferece acessibilidade, está no Memorial da América Latina (SP)
Se você ainda não viu esses dois em ação, não sabe o que está per-den-do! Carolina Gomes de Souza Silva e Marco Antonio Batista Ramos são intérpretes de Libras e estão em nossos vídeos exclusivos no portal www.revistadmais.com.br. Clica lá!
Estamos com gente nova, novinha em casa! Mayra Ribeiro é nossa estagiária de Jornalismo, Bárbara R. Jorge e Valter Ferro são estagiários de Marketing e Luciano César Guastaferro é diretor comercial. Bem-vindos!
Taís Lambert entrevista o ator Antonio Fagundes na pré-estreia da peça Baixa Terapia, inclusiva para pessoas surdas e cegas em todo último sábado do mês
A gente não poderia perder esse dia LINDO! 3º Caminha Down no Parque Villa-Lobos: teve sol, teve alegria e muita foto!
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www.revistadmais.com.br DIRETOR EXECUTIVO Rúbem da S. Soares rsoares@revistadmais.com.br REDAÇÃO Editora-Chefe Taís Lambert taislambert@revistadmais.com.br Equipe de Jornalismo Audrey Scheiner Brenda Cruz Mayra Ribeiro jornalismo@revistadmais.com.br Revisora Eliza Padilha Diagramação Estúdio Dupla Ideia Departamento de Arte Fernanda Grecco Samuel Ávila arte@revistadmais.com.br Ilustrador Luis Filipe Rosa Colaboradores nesta edição Rosa Buccino DIRETOR DE PUBLICIDADE Denilson G. Nalin denilsonnalin@revistadmais.com.br (11) 5581.1739 e 9-4771.7622 DIRETOR COMERCIAL Luciano Cesar Guastaferro lucianocesar@revistadmais.com.br (11) 5581.1739 e 9-4771.7621 COMUNICAÇÃO E MARKETING Rúbem S. Soares Equipe Bárbara R. Jorge Valter Ferro mkt@revistadmais.com.br RH E FINANCEIRO Coordenação Flávia Garcia Dias Equipe David Gomes de Souza Raquel Vidal de Lima Contratos e licitações Luiz F. Mazieri Nicolini mais@revistadmais.com.br TI Herick Palazzin Ivanilson Oliveira de Almeida Jonathan Vinicius DIRETOR ARTÍSTICO Dílson Nery PROJETOS DE MÍDIA INCLUSIVA Coordenação Rafaella Sessenta CONSULTORES DE LIBRAS (SURDOS) Célio da Conceição Santana Joice Alves de Sá INTÉRPRETES DE LIBRAS Carlos Silvério Carolina Gomes de Souza Silva Marco Antonio Batista Ramos Rafaela Prado Siqueira Rafaella Sessenta EQUIPE AUDIOVISUAL Conteúdo do portal Jéssica Aline Carecho Verônica Honorato de Souza ATENDIMENTO AO ASSINANTE E CIRCULAÇÃO Alessandra Rodrigues dos Santos assinaturas@revistadmais.com.br (11) 5581-3182 / 5583-0298 RECEPÇÃO Jennyfer Alves (11) 5581-3182 / 5583-0298 APOIO Arianna Hermana da Silva (19) 3306-9990 Edição número 14 – Março/Abril de 2017 REVISTA D+, ISSN 2359-5620, é uma publicação bimestral da MAIS Editora CNPJ n° 03.354.003/0001-11 Rua da Contagem, 201 – Saúde - São Paulo/SP - CEP 04146-100 Associada a:
Distribuída em bancas pela DINAP-DISTRIBUIDORA NACIONAL DE PUBLICAÇÕES LTDA. Rua Dr. Kenkiti Shimomoto, 1678 CEP 06045-390 - Osasco - SP PARCERIA: A Revista D+ não se responsabiliza por opiniões e conceitos emitidos em artigos assinados ou por qualquer conteúdo publicitário e comercial, sendo este de inteira responsabilidade dos anunciantes
Associação para Desenvolvimento Social, Educacional, Cultural e de Apoio à Inclusão, Acessibilidade e Diferença
NOSSA CAPA 42 A violência contra a pessoa com deficiência é cometida de muitas formas. Seja como for, humilha, traumatiza, deixa marcas profundas e deteriora a dignidade humana 03 Na Rede 06 Editorial 08 Do Lado de Cá 10 Expediente & Aqui na D+ 12 Ponto de Vista Autismo: a família faz a diferença projetando expectativas positivas para seus filhos 14 Misto Quente As novidades dignas de nota 24 Perfil Conheça a história de Helton Josué Teodoro Muniz, considerado o maior frutólogo do Brasil 30 Saúde Especialistas e usuários de implante coclear contam como o aparelho auxilia na recuperação da audição 38 Comportamento Noivas cadeirantes ainda enfrentam barreiras arquitetônicas, sociais e atitudinais na hora de casar 56 Entrevista Lysa, a Cão-guia Robô identifica e avisa ao usuário sobre objetos frontais, aéreos e dificuldades durante o trajeto 62 Acontece Dispositivo criado por jovem com deficiência auditiva e amigos ganha prêmio em competição global e participa da Febrace 64 Acontece Abril Marrom contra a cegueira: campanha oferece acuidades e palestras durante todo o mês 66 Misto Frio 3º Caminha Down e 3º Bike Down lotaram o Parque Villa-Lobos, em São Paulo, numa linda festa 68 Psique Psicologia da reabilitação: uma viagem interna Por: Ana Clara Portela Hara 70 Tecnologia Assistiva Reatech 2017: a maior feira de tecnologia inclusiva trará atividades sociais, culturais, test drive e muito mais 76 Terceira Idade Apae de São Paulo se debruça sobre o envelhecimento de pessoas com deficiência intelectual 78 Práticas na Educação Inclusiva O trabalho com projetos didáticos 82 Aprenda Libras Aprenda sinais de profissões e ensine seus colegas 84 Espaço do Tils Para estabelecer uma boa dinâmica de tradução/ interpretação 86 Universo Cultural Filme Mulher do Pai aborda questões sobre deficiência visual a partir da construção de relação familiar 90 Cereja! Curso de automaquiagem na Associação Laramara proporciona bem estar e eleva, autoestima das alunas
Março/Abril 2017 – Ano III – nº 14
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PONTO DE VISTA
Autismo: a família faz a diferença Aquelas que conseguiram superar as adversidades sempre projetaram expectativas positivas para seus filhos
Eugênio Cunha
Doutor em Educação e professor. Autor dos livros Afeto e aprendizagem, Autismo e Inclusão e Autismo na escola, publicados pela WAK Editora
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uitas vezes o autismo traz a carga do isolamento social, da dor familiar e da exclusão. É normal que os pais se preocupem, porque há relevantes alterações no meio familiar e nem sempre é possível encontrar maneiras adequadas para lidar com as dificuldades que aparecem. Apesar de casos de extrema severidade, famílias que conseguiram superar as adversidades sempre projetaram expectativas positivas para seus filhos. Esse é um aspecto essencial. A atuação dos pais deve começar já no diagnóstico, quando é possível fazer uma intervenção para um desenvolvimento melhor das habilidades da criança, visando a vencer suas dificuldades. Bem cedo, a família pode estabelecer uma frutífera parceria com a escola. Uma grande ajuda vem dessa relação, em razão do enfoque na comunicação, na interação social e no afeto. Escola e família precisam ser concordes nas ações e intervenções quanto a aprendizagem, principalmente, porque há grande suporte na educação comportamental. Significa dizer que, a maneira como o menino ou menina come, veste-se, banha-se, escova os dentes, manuseia objetos e os diversos estímulos que recebe para o seu contato social precisa ser consoantes nos dois ambientes. Se na escola, durante as refeições, utiliza-se os utensílios sem ajuda, assim deverá ser feito em casa. Se em casa, os pais deixam a criança se vestir sozinha, na escola far-se-á o mesmo. Esses ambientes, apesar de diferentes fisicamente, devem ser similares em objetivos e práticas educativas. Este é um grande desafio para o sucesso das intervenções e da educação da criança com Transtorno do Espectro Autista (TEA). É preciso projetar coisas positivas para o filho e, no caso da escola, para o aluno. É preciso trabalhar para a inclusão social. Ensinar a família é fortalecê-la como núcleo básico das ações inclusivas e de cidadania. No espaço familiar, os afazeres e a rotina podem ser ferramentas eficazes para gerar a autonomia. Normalmente, há uma tendência do autista de se fixar em rotinas. Essa tendência pode ser manipulada a seu favor quando os pais a usam como reforço comportamental na organização do dia, fixando horários de café, almoço, jantar e banho. Todavia, as rotinas precisam ser quebradas quando facilitam atitudes prejudiciais. O ideal, em qualquer contexto educacional, é a liberdade mediada pela responsabilidade e os limites estabelecidos pela tolerância. A disciplina sem amor e o amor sem disciplina são inócuos. É necessário, então, desenvolver o desejo pela disciplina em razão da segurança que os limites produzem. A disciplina com amor
compreende uma imersão espontânea à harmonia interior do indivíduo. Crianças ou adolescentes com autismo nem sempre sabem estabelecer um divisor comportamental entre a família e a escola. Normalmente, têm a mesma conduta nos dois ambientes. O que a escola e a família necessitam fazer é criar momentos afetivos que estimulem o comportamento adequado, com atividades lúdicas e prazerosas, despertando o interesse. A participação da família na educação da pessoa com autismo tem sido fundamental também nas políticas públicas. Não é por acaso que a Lei 12.764/12, que garante direitos fundamentais à pessoa com TEA, ganhou o nome de uma mãe: Berenice Piana. Nos últimos anos, os debates acerca do autismo ganharam visibilidade. A exposição do tema na mídia e nas redes sociais disseminou informações que têm aclarado um pouco mais esse campo de estudos, ainda desconhecido para a maioria das pessoas. A luta pelos direitos da pessoa com o transtorno obteve relevantes vitórias.
No espaço familiar, os afazeres e a rotina podem ser ferramentas eficazes para gerar a autonomia Há ainda grandes desafios em razão de muitos casos de exclusão social e escolar, que comumente seguem contra as esperanças dos pais. Entretanto, quando não desistimos, nossos sonhos e desejos florescem e descortinam os processos de resiliência. Quanto mais nos tornamos suscetíveis a esses processos, mais ficamos motivados a prosseguir e a construir interações com o nosso entorno, independentemente das dificuldades. Decerto, a inclusão começa na família, que pode fazer a diferença na construção de uma sociedade mais justa e mais cidadã. D+
MISTO QUENTE
O pulo da gata Atriz, cantora e modelo, essas são as multifaces de Caitin Stickels, 29 anos, que se divide entre as carreiras em Seattle, nos Estados Unidos. Agora, ela também é símbolo da diversidade e inclusão na indústria da moda. Detentora de uma beleza exótica – de cabelos vermelhos e muitas tatuagens –, traz minimalismo, leveza e ousadia em um belíssimo editorial de moda em uma das revistas mais importantes do segmento nos Estados Unidos, a V Magazine. A modelo nasceu com uma condição rara, chamada “síndrome do olho de gato”, que afeta o cromossomo 22, caracterizando-se pela ausência da íris, parte colorida dos olhos ao redor das pupilas, daí a semelhança com um felino. Além disso, a condição também traz algumas deformações no rosto e problemas em órgãos internos. Caitin nunca imaginou que poderia participar de um editorial de moda por estar fora dos padrões de beleza tradicionais das passarelas, no entanto, a revista V Magazine abriu as portas para a jovem ser clicada pelo famoso fotógrafo Nick Knight, que já participou de campanhas publicitárias com clientes famosos em todo o mundo, como Christian Dior, Lancôme, Swarovski, Tom Ford, Calvin Klein e Yves Saint Laurent, além de realizar premiados editoriais para a W, Vogue britânica, Vogue francesa e muitas outras. “Trabalhar com ele superou todas as minhas expectativas e sonhos, sendo bem honesta. Eu nunca imaginei que poderia participar de algo semelhante ou fazer parte da indústria da moda. Esse trabalho é a reviravolta mais linda e especial da minha vida”, declarou Caitin para a V Magazine. No Instagram, Caitin conta com mais de 15 mil seguidores e publica diversas fotos incríveis de seus trabalhos. Vale muito conferir: www.instagram.com/caitinkitten
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MISTO QUENTE por Audrey Scheiner
“Quem não tem mão, faz com o pé” É com esse inusitado ditado que Diogo Alvez da Silva, 21, e seu melhor amigo, Henrique Mattos, 21, batizaram seu canal no YouTube. Nascido sem os dois braços, o principal desejo do universitário de Ciência da Computação do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca, do Rio de Janeiro (Cefet/RJ), é incentivar as pessoas com deficiência a terem força de vontade e resolverem seus problemas, sem desistir deles, sempre os encarando com bom humor. Segundo Diogo Alves, falar sobre sua rotina nos vídeos é o ponto forte do canal. “Procuro postar vídeos sobre o meu dia a dia, contando histórias engraçadas e mostrando como faço as coisas, desde o básico até algo mais complexo, como jogar videogame. Procuro, também, pautar assuntos que infelizmente são comuns hoje em dia, como a falta de acessibilidade e o preconceito para com as pessoas que têm deficiência física ou intelectual”, afirma o universitário.
Adaptação: base de tudo Adaptar-se a fazer tarefas diárias foi fácil para Diogo, que aprendeu rápido a utilizar os pés para tudo. “Passei por dois grandes centros de reabilitação: a Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação (ABBR) e o Sarah Kubitschek. Nesses dois locais, aprendi a fazer as principais atividades do cotidiano, como escovar os dentes e limpar meus ouvidos. Após a minha alta, quando tinha 12 anos, passei a aprender formas de fazer o que até então não conseguia”. O estudante comenta que os vídeos são gravados na casa do amigo de infância, Henrique Mattos, por meio de um celular. “Pretendemos aumentar a frequência de postagens de nossos vídeos. Temos novas ideias surgindo a cada dia, como fazer esquetes – cenas simulando situações do cotidiano – e fazer mais desafios interativos com os fãs, sem esquecer das gameplays, vídeos que faço jogando videogame”, enfatiza Diogo. Acesse: https://goo.gl/22nhEq imagens divulgação
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MISTO QUENTE por Audrey Scheiner
Brasileiros na Surdolimpíada: uma luta diária
O time de futebol: alegria em participar
Vôlei feminino: união e determinação
À procura de mais incentivo Segundo Mariana, o Ministério do Esporte reconhece a CBDS como administradora do esporte para surdos, mas ainda faltam auxílios. “Estamos excluídos do repasse de recursos das loterias federais para as entidades desportivas [COB, CPB, e outras], determinadas pela Lei Pelé. Também não temos representante no Conselho Nacional de Esporte [CNE]. Nossos atletas só podem solicitar Bolsa Atleta na categoria de modalidades não-olímpicas”. Guilherme Westermann, 50, joga vôlei desde os 10 anos. Para ele, participar da Surdolimpíada era o que faltava para completar seu sonho de garoto. “A sensação de participar de um evento esportivo como esse, com surdos, é maravilhosa! Vou fazer 51 anos e não sei até quando poderei continuar em quadra. Peço a Deus muita saúde física e emocional”, finaliza Westermann. Boa sorte a todos!
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Atletas surdos que já fizeram bonito nos jogos
Desde outubro do ano passado, a Confederação Brasileira de Desportos de Surdos (CBDS) deu início aos preparativos para a participação do Brasil nos jogos da Surdolimpíada, ou Olimpíadas para Surdos, conhecida também como Summer Deaflympics. A 23ª edição, que acontecerá de 8 a 30 de julho, em Samsun, na Turquia, contará com 155 surdoatletas, em 16 modalidades esportivas. Por meio do financiamento coletivo feito pelo site Kickante, encerrado em fevereiro com R$ 5.440 arrecadados, a CBDS usará os recursos arrecadados para pagar o kit uniforme e as taxas de inscrição/participação de membros das comissões técnicas e voluntários de apoio, que trabalharão com a Delegação Brasileira em Samsun. É importante ressaltar que mesmo recebendo essas doações e a renda da venda das camisetas, os voluntários e membros técnicos ainda precisam buscar recursos para pagar a passagem aérea, a hospedagem e alimentação, o que somará cerca de R$ 8.700 por pessoa. De acordo com a CBDS, a delegação pretendia arrecadar um total de R$ 220 mil. “Mas infelizmente, pelo ritmo das doações que recebemos, a previsão é que a gente consiga em torno de R$ 25 mil, somando doações e a venda de camisetas”, afirma Mariana Hora, chefe da delegação surdolímpica. Até o fechamento da revista, o total de doações foi de R$ 6.316,60.
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Revista D+ número 11
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MISTO QUENTE por Brenda Cruz
Médico na sua casa
Já imaginou como seria bom um aplicativo em que você encontrasse diversos profissionais de saúde com apenas um clique no celular? A EveryCare é uma plataforma que conecta profissionais de saúde a famílias que queiram um atendimento especializado para idosos. A startup está há pouco mais de seis meses no mercado e vem facilitando o contato entre profissionais e clientes. Por meio do aplicativo, o usuário pode procurar a especialidade de sua necessidade e agendar a visita do profissional em seu domicílio. Já são 14 especialidades disponíveis e mais de 1.300 profissionais cadastrados que atendem 23 estados. Conheça o site: www. everycare.com.br
Comédia inclusiva em São Paulo
crédito: divulgação
No último sábado dos meses de abril, maio e junho, a comédia Baixa Terapia traz sessões inclusivas para pessoas cegas e surdas no teatro Tuca, na PUC de São Paulo. Três casais vão para suas sessões de terapia e descobrem que esta será em grupo e, ainda, que a psicóloga não estará presente. Ela deixou a sala preparada para recebê-los com um pequeno bar e uma mesa, onde há envelopes numerados com instruções passo a passo de como devem conduzir essa sessão. O objetivo é que todas as questões sejam resolvidas em grupo. A partir daí vêm à tona queixas, confissões, suspeitas, revelações, verdades e mentiras da maneira mais escrachada para eles e divertidíssima para o público. As sessões inclusivas serão nos dias 27/05, 24/06 e 29/07, às 21h. Os ingressos podem ser adquiridos pelo site: www.ingressorapido.com.br
Cartilhas para brincar e aprender
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA
B.C. STUART
A cartilha para crianças e adultos, sobre incontinência urinária, foi lançada recentemente pela Associação Brasileira pela Continência B. C. Stuart. para as Crianças, A aventura de Berta pelo sistema urinário explica que não é normal o xixi escapar. Berta tem um amigo, o Joca, que nasceu com uma deficiência na coluna e usa cadeira de rodas, mas ele não consegue fazer xixi sozinho. Além disso, há desenhos para colorir que divertem as crianças. A cartilha para adultos conta o que é a doença, quais os tipos, diferenças de incontinência entre homens, mulheres, idosos e tratamentos. Segundo a secretária executiva da entidade, Ana Claudia C. Delmaschio, a ideia é disseminar informação sobre a doença de uma forma simples. A cartilha será distribuída em hospitais públicos. www.incontinenciaurinariabcs.org
PELA CONTINÊNCIA
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Revista D+ nĂşmero 11
MISTO QUENTE
Castelo de portas abertas Serviço Rá-Tim-Bum, O Castelo Visitações: de terça à sexta-feira, das 9h às 20h. Sábados, domingos e feriados, das 9h às 22h Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada) Bilheteria: Espaço Gabo www.ratimbumocastelo.com.br Memorial da América Latina Av. Auro Soares de Moura Andrade, 664, Metrô Barra Funda
“Morcego, ratazana, baratinha e companhia, está na hora da... feitiçaria!” Quem não conhece de cor e salteado essa chamada icônica do personagem Relógio do Castelo Rá-Tim-Bum? O programa da TV Cultura foi febre nos anos 1990 e volta este ano no Memorial da América Latina com a exposição Rá-Tim-Bum, O Castelo. A megaprodução que ocupa uma área de 700 m² promete ser grande destaque nas atrações do calendário cultural e de entretenimento de São Paulo. A mostra conta com um sistema de audiodescrição para pessoas com deficiência visual, traduções para Libras e auxílio tecnológico pelo sistema QR Code, além de ser acessível para cadeirantes. “O Castelo está com uma fachada mais realista. No total, foram 150 pessoas trabalhando diretamente na construção do projeto. A exposição foi construída com o intuito de criar um contato íntimo com o público. É muito mais do que uma exposição, é uma vivência”, conta Marcelo Jacó, cenógrafo da Caselúdico, empresa responsável pela cenografia do castelo. Ele ainda aponta que o público encontra uma exposição diferente da primeira mostra no Museu da Imagem e do Som (MIS), em 2014. A tecnologia QR Code está disponível para o público no processo de interação com a mostra. “Vamos sentir a tecnologia. Algumas pessoas querem consumir mais informações, então, colocamos no nosso site um código para o público sentir mais o Castelo. É uma parceria com a Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, fazer com que a pessoa leve a experiência da produção para casa”, enfatiza Felipe Pinheiro, diretor administrativo do Memorial da América Latina. O presidente da Fundação Padre Anchieta, Marcos Mendonça, acrescenta: “A TV Cultura e o Memorial da América Latina, instituições que têm sua trajetória marcada pela disseminação da cultura e pelo entretenimento, unem-se nessa exposição que fará as pessoas viajarem por um universo lúdico que, há duas décadas, encanta adultos e crianças”.
fotos Brenda Cruz
por Brenda Cruz
PERFIL
Helton Josué Teodoro Muniz
Sentado à beira da água corrente que brotou da terra depois do seu trabalho de reflorestamento: Helton vive para a natureza
Frutos do suor
e( do a mor)
Conheça a história de Helton Josué Teodoro Muniz, considerado o maior frutólogo do Brasil, que deu de ombros para a deficiência neuromotora e se lançou em uma linda jornada com a natureza texto e fotos Taís Lambert
colaboração Wagner Nunes
A
s mãos estavam tingidas pela cor viva das jabuticabas, cujas sementes ele segurava com certa dificuldade enquanto empurrava-as terra adentro, em pequenos saquinhos pretos em cima da bancada. Os cabelos em desalinho, a camisa polo azul claro, a calça jeans e as galochas brancas, todos manchados da lida diária, refletiam o que Helton Josué Teodoro Muniz é na essência: um trabalhador da terra, um amante humilde da natureza. Aos 36 anos, ele é um frutólogo autodidata e recordista: em seu Viveiro de Mudas Saputá, no Sítio Frutas Raras, em Campina de Monte Alegre, no interior de São Paulo, há nada menos do que 1.400 espécies de frutíferas, entre nativas e de várias partes do mundo, exóticas e raras. Helton nasceu em Piracicaba (SP), mudou-se para Angatuba aos dois anos e, aos 15, para a fazenda – que era dos avós – onde vive e cultiva seu sonho e sustento até hoje. A deficiência é um comprometimento neuromotor causado por atraso de parto e lhe rendeu muitos anos de fisioterapia e calçados ortopédicos. O andar e a fala, assim como a capacidade motora fina, trazem os resquícios dessa condição.
Ciências, preferências e preconceito “Minha mãe tem fotos minhas, de quando eu era neném, pegando plantinha assim, com delicadeza. Criança pega e vai rasgando, mas eu já tinha esse amor”. Helton andou com cinco anos, foi para a escola comum e lá gostava mais das aulas de Ciências, como não poderia deixar de ser. Sofreu preconceito por causa de suas dificuldades. “Na escola tem todo tipo de pessoa. Tem aquele bobo que caçoa de todo mundo, que tudo é graça, e tem aquelas pessoas que são mais amorosas. É questão de você identificar o engraçadinho, o inteligente, o bobo... Eles existem em todo lugar, na vida inteira, no mundo inteiro. Para a gente viver bem, tem que entender isso. Não precisa ficar brigando Revista D+ número 14
PERFIL
Helton Josué Teodoro Muniz
O mini jambo rosa é da Austrália. Por lá, o nome da fruta é lilly pili
Abacaxi vermelho do mato: espécie nativa que enche os olhos
As mudas de Helton: tudo começou com sementes plantadas em saquinhos de leite
por causa do que uma pessoa diz ou pensa. Existem bilhões de pessoas no mundo, não se pode considerar a opinião de uma só. Nunca. Eu tenho isso em mente”. Ele estudou até a oitava série. “Na escola, o que foi mais difícil para mim não foi os alunos, mas sim alguns professores. Porque eu sou lerdo para escrever, daí eles davam ditado e eu não acompanhava, escreviam na lousa e não dava tempo de eu copiar. Havia muita impaciência e despreparo da parte deles”. Um dia, saputá O garoto curioso que caminhava à beira do Rio Paranapanema descobriu uma frutinha intrigante, usada pelos pescadores como isca. “Encontrei um senhor de idade que me disse que a fruta se chamava saputá. Era tão saborosa! Fui pesquisar para saber se o nome existia mesmo ou se era conversa de pescador! Olhei em um dicionário antigo, da coleção de vários volumes que minha avó tinha. [Ela faleceu há cinco meses, faltando 26 dias para completar 100 anos]. E lá falava: ‘Saputá, uma frutífera silvestre’. Então, pensei: ‘É verdade, existe mesmo!’”, recorda-se Helton. O senhor pescador em questão, seu Xavier, está com 97 anos hoje. A partir desse momento, Helton viu florescer um interesse cada vez maior por frutas desconhecidas. “Lia no dicionário o nome de um monte delas que eu nunca tinha ouvido falar na vida. Só conhecia banana, maçã, mamão, laranja... Daí comecei a me perguntar: por que ninguém planta, cultiva ou conhece essas coisas? Fiquei com aquilo na cabeça e resolvi começar por algum lugar”. Por onde andava, Helton mantinha o olhar atento para qualquer novidade. Tal como criança, apanhava e punha na boca. Foi então que passou a plantar as sementes em saquinhos de leite, “Pois não tinha nada naquela
época. Não tinha condição de nada”. Folheando a Revista Globo Rural, lá pelos anos de 1998, o rapaz descobriu a seção Balaio, através da qual os leitores trocavam sementes entre si. “Conheci pessoas de todo o país e trocávamos sementes por carta”. Há 12 anos, quando Helton foi tema de sua primeira reportagem na TV, muitas pessoas se interessaram e o procuraram. “Como eu já tinha bastante muda, comecei a vender. Devagar, fui comprando livros, conhecendo mais, estudando, aprendendo. Fui conhecendo a parte de identificação, de botânica, que planta pertence a que família, que gênero e espécie. Hoje olho para uma planta e sei dizer se é frutífera ou não”. O nome da fruta é... São mais ou menos cinco hectares plantados. As espécies estão no solo aleatoriamente, sem divisão. “É o sistema agroflorestal de pomar: tudo misturado, não tem separação”. Helton atende pessoas do Brasil inteiro. Recebe visita dos compradores, envia por transportadora ou entrega pessoalmente, se for por perto. Prefere atender em seu viveiro apenas quem pretende plantar, começar um pomar. Então, deixou de abrir as portas para visitantes pontuais que só queriam conhecer o local. Na caminhada que fizemos juntos, entre árvores frutíferas de todo tipo, conheci sua esposa, a simpática Emilene Martins dos Santos Muniz, 37. Eles são casados há dez anos. “O primeiro presente que ele me deu foi um calendário com fotos de frutas! Como quem diz: ‘vai se acostumando!’”, diverte-se ela. A cada passo, uma surpresa. “Essa é a peludinha, uma frutinha pequena e aveludada, do Rio Grande do Sul. Essa aqui é a guaticuruzú, com polpa preta, que lembra chocolate com café. Este é o cambuci redondo, espécie nova, não está nem
Helton segura uma de suas frutas preferidas, a bacuri-pari, da Amazônia. Sua esposa, Emilene, o conheceu em um Congresso das Testemunhas de Jeová. Atrás, um lindo pé de figo-da-Índia
A esfregadinha, ou cereja de Cametá, amarra na boca como caqui verde se você não esfregá-la antes de comer
catalogada cientificamente ainda. O fruto mede uns 8 cm”. Sigo com eles debaixo de um sol intenso, apontando, perguntando. “Os araticuns dão frutas grandes, o marolo é o maior deles. O mamei é bem grande também. O zilo ou ucuva, que é uma fruta africana, é bem exótica, já colhi uma de 24 kg aqui. Nativo do Brasil, o cruá ou melão caboclo, é um fruto enorme, de uns 40 cm, mas ele não dá em árvore, é no cipó, igual abóbora. Esse é o tucum, que dá em palmeira, difícil de achar. Já esse figo da Índia tem polpa branca e o outro, roxa. A gumi, ou alegria dos pássaros, é do Japão. A jabuticaba de cipó dá um cachinho em ramo, não no tronco. O nome correto é ibatirama. Também tem a manga banana, da Índia, que você descasca como banana, e esse aqui é o mixiú, fruta bem rara, nativa da região, que só se come verde, cozido como legume”. Dá até uma tontura, tamanha novidade. Helton se encaminha maroto
para uma árvore repleta do que pareciam cerejas, pronto para me surpreender novamente, e diz: “Essa é a esfregadinha ou cereja de Cametá, que é o nome de uma cidade do Pará. Tem que esfregar para poder comer”. Levanto uma sobrancelha como quem não entende nada. “Se você comer sem esfregar ela fica amarga, marrenta igual a caqui verde. A maioria das pessoas não sabe disso”. Tal como ele ensinou, foi só esfregar que a frutinha ficou doce, tenra e saborosa. Emilene emendou outra: “A fruta-do-milagre também parece um segredo da natureza. É pequenininha, africana, que deixa tudo doce. Qualquer coisa que você comer depois de chupar a fruta-do-milagre terá um sabor doce, até limonada sem açúcar!”. Em meio a pouco mais de 1.400 frutíferas, qual é a preferida de Helton? “É difícil! Pois cada uma tem suas características especiais, mas uma das que eu mais gosto é essa aqui, a bacuri-pari, da Amazônia”.
Tucum é uma palmeira cujas frutinhas doces, de casca fibrosa, possuem grande quantidade de antioxidante. É nativa da região
O zilo ou ucuva, que é uma fruta africana, é bem exótica, já colhi uma de 24 kg aqui Helton Revista D+ número 14
PERFIL
Helton Josué Teodoro Muniz
Com todo o trabalho e a dedicação de anos a fio, Helton recuperou dois lagos dentro da propriedade. “Aqui tinham poucas árvores, era tudo pasto e foi recuperado. Com essa floresta e o manejo, acabou brotando água pura de novo. Esse lago, por exemplo, ficou muito tempo sem verter água. Agora ela é pura, pronta para tomar”, conta, abaixando-se para beber água direto do pequeno córrego cintilante, que cortava o solo em meio a folhas de todos os tons e tamanhos. Gumi ou alegria-dos-pássaros vem do Japão. Surpresas são comuns no Sítio Frutas Raras
O mixiú é uma fruta nativa raríssima e dá como maracujá, em ramas. Só é comestível verde e cozido como legume
Jaracatiás: pequenos mamõezinhos que cabem no centro da mão. Nativo da Mata Atlântica, perfeito para comer assado
Preservação, legado e fé Como Helton diz, ele descobriu esse mundo das plantas e se encantou. “Vem do coração, faço aquilo que gosto. Tenho claro que a deficiência é uma limitação numa coisa. Gostaria de subir em árvores, por exemplo, mas não consigo. No entanto, a vida da gente não é resultado de uma coisa só: existem várias opções, vários caminhos que a pessoa pode observar e conseguir realizar muitas outras coisas”. Além do cuidado com a terra, Helton e a esposa se dedicam à pregação de casa em casa. Testemunhas de Jeová, caminham buscando pessoas a quem falar sobre Deus e suas promessas para o presente e o futuro, conforme suas crenças baseadas na Bíblia. “É outro tipo de pensar: você pensa de acordo com a vontade de Deus. Não é muito fácil! Pois é preciso fazer mudanças, mas estudei muito, não escolhi essa religião por tradição, sem questionamento. Foi consciente e vivo de acordo com isso”. Com sua escolha de vida, Helton preserva espécies frutíferas e as torna uma realidade possível para quem nunca sequer pensou em conhecer tantas coisas diferentes. “A maioria das pessoas foi ensinada a buscar o alimento no supermercado, mas o alimento não vem de lá, vem das matas, das florestas e de alguém que está cultivando. No Brasil existem quatro
Helton abraça o pé de jatobá: “Minha mãe tem fotos minhas, de quando eu era neném, pegando plantinha com delicadeza. Eu já tinha esse amor”.
mil espécies de frutas comestíveis. É bom a gente parar um pouco para pensar que qualidade na alimentação também é diversidade. E para tê-la, é preciso cuidar, cultivar e preservar”. No fim da entrevista, entro na casa. Emilene oferece suco de guabiroba laranja e biscoitos com geleia de uvaia. Helton não pode porque é diabético. Aproveitamos para comer também o figo da Índia apanhado no pomar, com casca repleta de espinhos e polpa doce e macia. Em seu livro Colecionando Frutas Volume 1 (o volume 2 já está pronto a espera de patrocínio), Helton apresenta 100 espécies nativas e exóticas, além de trazer a história e memória das comunidades e seu relacionamento com as frutas. Nele, o frutólogo sugere aplicar as palavras de um provérbio chinês: “Se você faz planos para daqui um ano, plante sementes. Se você faz planos para daqui 10 anos, plante árvores. Se faz planos para os próximos 100 anos, eduque as pessoas”. Com suor e amor, as mãos e roupas sempre tingidas pela terra – e os bolsos cheios de sementes, Helton faz brotar o essencial: a valorização da natureza, que, cultivada, pode criar raízes e, certamente, dar bons frutos. D+
Serviço: Viveiro de Mudas Saputá Rodovia Raposo Tavares, km 215 (próximo a Itapetininga-SP) www.colecionandofrutas.org Facebook: @colecionandofrutas
Assista ao vídeo com o Helton em www.revistadmais.com.br/ed14_perfilexclusivo
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saúde
Rodrigo usa implantes nos dois ouvidos e faz aula de artes e música na escola. Cheio de habilidades, o garoto toca flauta e está aprendendo a tocar piano também
No mundo dos sons Especialistas e usuários de implante coclear contam como o aparelho auxilia na recuperação da audição texto Brenda Cruz fotos Brenda Cruz e arquivo pessoal
M
inha deficiência auditiva foi adquirida aos 37 anos, em abril de 2012, na reta final da minha segunda gravidez. Eu tive meningite bacteriana decorrente de uma sinusite. Meu parto foi feito às pressas, pois meu estado era grave e, além disso, tive eclampsia no parto [convulsões associadas à hipertensão arterial]. Graças a Deus e por um milagre, sobrevivemos eu e minha filha. A sequela que ficou foi uma surdez bilateral profunda”, conta Adriana Steiner de Melo, 42 anos, que mora em Belo Horizonte, Minas Gerais. Após um mês internada, longe dos filhos, e com um novo desafio para lidar, Adriana recebeu alta e foi para casa. A alegria da volta para o lar também foi banhada com a tristeza de não ouvir mais nada. “Foi um dia de muita alegria, mas, ao mesmo tempo, confuso e triste, porque já não podia mais ouvir a voz do meu filho, que começava a falar, nem os sonzinhos da minha filha recém-nascida”, revela. Com a ajuda da até hoje “fiel escudeira”, a leitura labial, Adriana entendia o que as outras pessoas lhe diziam. Após várias consultas a otorrinos em Belo Horizonte e exames de audiometria, Adriana foi para São Paulo em busca de uma possível alternativa. “Não havia outra solução e precisávamos agir com muita rapidez, pois pelo fato de minha surdez ter decorrido de meningite, havia o risco de calcificação da cóclea, o que inviabilizaria o implante coclear”, contou. Revista D+ número 14
saúde
Recomendação, cirurgia e ativação O implante coclear é um dispositivo eletrônico que tem o objetivo de substituir as funções das células do ouvido interno de pessoas com surdez profunda, caso em que aparelhos auditivos já não surtem resultados. É um equipamento implantado na orelha cirurgicamente – com anestesia geral –, que tem a função de estimular o nervo auditivo e recriar as sensações sonoras. O médico otorrinolaringologista e foniatra Prof. Dr. Ariovaldo Armando da Silva, 65 anos, da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, explica que o implante é o único método capaz de trazer sons para o ouvido totalmente surdo. “O implante coclear é capaz de trazer experiências sonoras únicas e impossíveis de serem alcançadas por outros métodos. Ele permite a audição em níveis equivalentes à normalidade. Não é o mesmo som que um ouvinte comum percebe, mas abrange várias frequências auditivas, capacitando a ouvir sons de baixa intensidade”, explica. Entretanto, ele enfatiza que a reabilitação da pessoa surda não depende unicamente desse recurso auditivo e que há fatores, como a integridade neurológica, aspectos da personalidade da criança, atuação dos pais, facilidades sociais, econômicas e culturais igualmente importantes e precisam ser considerados. O médico ainda ressalta que
A ativação do implante de Adriana foi um misto de alegria e decepção, mas com a reabilitação, ela garante: “Hoje considero minha audição muito boa!”
todo caso deve ser avaliado individualmente, pois cada paciente apresenta diferentes características ou outras deficiências que podem interferir no resultado. Composto de dois sistemas principais – um externo e um interno –, o implante coclear funciona por radiofrequência, o mesmo meio usado para transmitir informações à unidade interna. A parte externa é composta por um processador de fala, uma antena transmissora e um microfone. Essa é a parte que fica aparente. E foi esse dispositivo que auxiliou Adriana, que após a cirurgia se viu novamente “no mundo dos sons”. A perda auditiva aconteceu no mês de abril e em setembro o implante foi realizado. Um mês depois, o implante foi ativado. “A sensação foi um misto de alegria e tristeza, pois os primeiros sons foram ‘estranhos’ para mim. Fiquei muito confusa, porque as vozes que ouvia (da fonoaudióloga e do meu marido) eram metálicas, parecia que estava ouvindo dois robôs. Como tenho memória auditiva, fiquei desesperada, porque a voz do meu marido estava completamente diferente da que eu estava acostumada. Mas hoje considero minha audição muito boa!”.
Lugar com informação e interação Andrea Cortez Alvarez, mãe do Rodrigo, desenvolveu o Caoic – Centro de apoio e orientação sobre implante coclear, página no Facebook, onde pessoas implantadas, familiares e interessadas na área podem trocar informações e experiências. Além disso, ela promove, uma vez por ano, um grande encontro para reunir especialistas da área médica e pessoas implantadas para que essa interação possa ser ainda mais pessoal e esclarecedora. Acesse: www. facebook.com/caoic.orientacaosobreimplantecoclear
O valor da reabilitação A Profa. Dra. Brasília Maria Chiari, titular do Departamento de Fonoaudiologia da Unifesp e membro da equipe de implantes cocleares do Centro do Deficiente Auditivo da Escola Paulista de Medicina – Unifesp ressalta a importância da fonoaudiologia na reabilitação dos implantados. “É a fono que planeja a intervenção em conformidade com
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os resultados do implante. O planejamento não é só de audição, também é de linguagem, pois juntas garantem a agilidade do pensar, da solução de problemas e ajudam na cognição”, aponta a professora. Para a Dra. Brasília, o implante representa um grande avanço na reabilitação da surdez e o fono é o membro da equipe que fala sobre o desenvolvimento de linguagem que pode predizer o sucesso do processo. “É ele que faz os exames audiológicos, ativa o implante e, principalmente, tem atuação na reabilitação. O implante resgata a audição da criança e do adulto quando ela preexiste”, enfatiza.
Implante Coclear x Libras Daniela Cury, 40 anos, é professora de Libras e surda congênita devido à rubéola em sua gestação. É a primeira e única surda em sua família. Ela acredita que o implante coclear é uma tecnologia que pode sim auxiliar crianças e adultos. “Quanto mais cedo a criança surda (grau profunda) for implantada e tiver acesso a Libras, melhor, pois a criança poderá adquirir tanto a língua de sinais quanto a língua oral, isto é, com o tratamento fonoaudiólogo a longo prazo. Caso contrário, não vai funcionar. Além disso, o que interfere é o fato de não permitir o uso de Libras.” Daniela ainda aponta que o implante coclear é visto como o “curador de surdez”. “A surdez não é uma doença, caso contrário eu seria uma doente há 40 anos! Uma afirmação como essa causa um impacto enorme na comunidade surda, que não quer nem saber a respeito, principalmente sobre os argumentos vindos dos médicos, que só se preocupam com a questão da patologia sem se ocupar com as peculiaridades dos sujeitos surdos”, explica. Já Elvira Santos, 30 anos, também surda congênita e a única surda em sua família, acredita que o implante na infância prejudica o uso da Língua Brasileira de Sinais para a criança surda, pois o direito de escolha fica prejudicado, pois quem decide são os pais.
A surdez não é uma doença, caso contrário eu seria uma doente há 40 anos! Uma afirmação como essa causa um impacto enorme na comunidade surda Daniela Cury, professora de Libras e surda congênita
“Percebo que os médicos não favorecem a cultura surda, na verdade, o implante coclear não cura, mas é só uma prótese. Conheci várias pessoas surdas que têm implantes cocleares, para elas a dificuldade é a adaptação.” Foi o que aconteceu com Renato de Queiroz Tele Gomes, 49 anos. Ele nasceu ouvinte e, com menos de uma semana de vida, ficou surdo por conta da eritroblastose fetal [doença hemolítica por incompatibilidade do fator Rh ou doença hemolítica do recémnascido]. Em 2014 Renato fez o implante, no entanto, não atingiu o resultado esperado. “Quando a fono fez o reajuste do IC pela primeira vez, eu escutava barulhos agudos e depois me deu dores de cabeça. Eu queria tirar e não usar mais. Ela pediu para não tirar e fez outro reajuste, abaixou muito os agudos e melhorou”, contou. Hoje, Renato usa o aparelho convencional em um lado e, do outro, o implante. “Eu queria ouvir melhor, mas o meu cérebro ainda não se acostumou, pois a vida inteira eu usei o aparelho normal e como só pegava os sons graves, o cérebro não conseguiu se adaptar aos outros sons”. Ele ainda aponta que o custo da manutenção do aparelho, com baterias, por exemplo, chega a R$ 1.500. Dr. Ariovaldo aponta os motivos de certa separação entre surdos implantados e usuários de Libras. “É natural que os iguais se agrupem. Claro que isso cria o conceito de nós e eles. Daí a segregação é consequência natural. Cabe aos profissionais de saúde trabalhem para que não incorra em prejuízos para as duas partes.”
A família veste a camisa para divulgar informações e proporcionar troca de experiência sobre o implante coclear
O implante coclear é capaz de trazer experiências sonoras únicas e impossíveis de serem alcançadas por outros métodos. Ele permite a audição em níveis equivalentes à normalidade Dr. Ariovaldo Armando da Silva, médico otorrinolaringologista e foniatra
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saúde É a fono que planeja a intervenção em conformidade com os resultados do implante. O planejamento não é só de audição, também é de linguagem. Juntas garantem a agilidade do pensar Dra. Brasília Maria Chiari, titular do Departamento de Fonoaudiologia da Unifesp A fonoaudióloga ainda define os critérios que precisam ser seguidos para a realização do implante. “Há critérios médicos, que são mais orgânicos; há os critérios audiológico, social e psicológico. Então, se todos os membros da equipe dão o seu aval, essa pessoa é um candidato ao implante coclear e este é feito o mais cedo possível. Claro que o prognóstico depende da idade, da etiologia e da reabilitação, entre outros fatores. Eu preciso, além da equipe, de uma família atuante e uma escola participante”. O consenso médico é que o implante seja realizado o mais cedo possível se a pessoa preencher os critérios. No caso das crianças, hoje o implante é recomendado a partir dos seis meses de vida. Foi o que aconteceu com Rodrigo Cortez Alvarez, 10 anos. A surdez foi diagnosticada após o nascimento, no teste da orelhinha, e a partir disso, outros testes completariam, meses depois, o resultado da surdez bilateral profunda. “O Rodrigo foi o primeiro bebê no Brasil a colocar o implante coclear com nove meses de um lado. A outra cirurgia foi aos dois anos”, contou Andrea Cortez Alvarez, mãe do garoto. Andrea conta que a ativação do primeiro aparelho foi muito emocionante para a família. “Ele estava mamando no meu seio, a fono fez um barulho atrás da cabeça dele e ele virou para olhar”, conta a mãe. A reabilitação, segundo Andrea, foi um período intenso e de bastante entrega. “Esse período foi fundamental para a vida equilibrada de audição que meu filho tem hoje. A fonoaudióloga dele é uma pessoa muito dedicada, foi ela que nos ensinou tudo. A família inteira se uniu para aprender a lidar com ele”, comenta Andreia. Rodrigo tem um irmão mais velho com dois anos de diferença, Murilo, que foi um dos grandes responsáveis, segundo a mãe, pelo desenvolvimento do irmão surdo. “Eu falo que o Murilo foi o professor do Rodrigo, pois ele, mesmo sendo muito pequeno, sabia que tinha algo diferente acontecendo na família e sempre foi ele que, mesmo nas brincadeiras, orientou e ajudou o desenvolvimento do irmão. Eles são muito parceiros!”. D+
Cochlear Day No mês de fevereiro aconteceu no Parque Ibirapuera o maior evento de pessoas implantadas do mundo, promovido pela empresa australiana Cochlear, que é pioneira no mercado de implantes. Jim Patrick, engenheiro que desenvolveu o implante com Ian Forster, esteve presente. O Cochlear Day reuniu cerca de duas mil pessoas de todo o Brasil, adultos e crianças implantadas, para todos trocarem informações e experiências sobre o implante, além de profissionais da saúde, como otorrinolaringologistas e fonoaudiólogos. No local, pessoas interessadas em informações sobre o implante tiraram as suas dúvidas e viram as novidades tecnológicas dos últimos lançamentos da empresa, como o processador Kanso. No Brasil o Sistema Único de Saúde (SUS) e os convênios médicos cobrem os custos do implante coclear. Acesse a página www.queroescutar.com.br
Comportamento
Aline Adams ao lado do marido, Vicente Andrade, no ensaio de prĂŠ-casamento
Deixa ela entrar Em pleno século XXI noivas cadeirantes ainda enfrentam barreiras arquitetônicas, sociais e atitudinais no momento do casamento. Conheça a história de quem precisa lutar para entrar no vestido de noiva, no salão de beleza, no cartório, na igreja, na própria festa... texto Audrey Scheiner e Mayra Ribeiro fotos Arquivo pessoal
V
ocê sabia que noivas cadeirantes abandonam o sonho de casar por descaso do mercado? “É só trocar a porta por uma de correr, não é um problema muito difícil de resolver. Se vocês conseguirem fazer essa adaptação, me liguem”, disse Aline Adams, 25 anos, ao pessoal de um salão de beleza de Cascavel, no Paraná. Ela está esperando o retorno há um ano. E era só uma porta... Em um dia de chuva de 2012, a advogada sofreu um acidente de carro enquanto dormia no banco de trás sem cinto de segurança. A partir disso, passou a ter dificuldades de acessibilidade e inclusão, e agora, durante os preparativos do casamento com data marcada para abril, não tem sido diferente. Michelle Balderama, 29, e Leia Sales, 42, também enfrentaram situações parecidas na época dos preparativos. Felizmente, não se abalaram e concretizaram o sonho do grande dia. A paulistana Michelle, que hoje trabalha como bancária, perdeu a sensibilidade das pernas há 11 anos, quando se envolveu em um acidente de moto. Já a carioca e auxiliar de Recursos Humanos Leia teve paralisia infantil aos três. A Revista D+ conversou com essas mulheres e detectou que vestido, igreja, salão de beleza e festa são preparativos trabalhosos, mas, para quem tem mobilidade reduzida, esses esforços são em maior proporção. Além desses fatores, percebemos que o mercado inclusivo está longe de ganhar espaço. Venha conhecer conosco essa realidade ainda pouco discutida.
Onde tudo começou Aline, Michelle e Leia são três mulheres que encontraram pessoas capazes de arrancar-lhes o famoso “Sim”. “Ele falava que eu era perfeita, que queria casar. Então, eu disse: ‘Se quer casar comigo, quero uma aliança!’. Ganhei!”. O pedido do Pedro Henrique, 33, para a Michelle ocorreu em 2010. Marcar um encontro com a família da noiva é um acontecimento tradicional. Este foi o caso de Leia, pedida em noivado no ano de 2012. Nesse dia, Paulo Sérgio, 49, até levou um bolo para comemorar. Em um jantar num restaurante de São Paulo, para celebrar o Dia dos Namorados em 2013, Aline notou que Vicente, 34, agia com nervosismo. Durante o encontro, o rapaz resolveu fazer uma surpresa. “Era um pedido de casamento, ganhei um anel de noivado!”, revela. Para as três, então, estava dado o início de uma verdadeira maratona.
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Comportamento Projeto dos sonhos “No dia do meu casamento, me recuso a ser carregada pelas escadas!”, bradou Aline referindo-se ao salão de cabelereiros no Shopping West Side, em Cascavel. O local era a primeira opção para a realização do Dia da Noiva. Mas, o salão oferece a sala da noiva apenas no segundo andar. Por sua vez, Michelle teve dificuldades para encontrar, além do salão ideal para o dia de beleza da noiva, um espaço acessível para cerimônia e festa. A bancária visitou diversos sites em busca de acessibilidade de qualidade no Rio de Janeiro, estado natal do noivo. Por meio de uma dica no Facebook, escolheu o Village Vip Festas. “É pequeno, mas o casamento não era para muitos convidados. Em questão de acessibilidade, o espaço tem um ótimo banheiro. A rampa fica na lateral, mas o buffet disponibilizou uma na entrada do salão”, relata Michelle. “Quando a noiva escolhe o local, fazemos uma visita técnica para verificar a viabilidade de acesso aos cadeirantes em todo o trajeto que será percorrido pelos convidados”, afirma Denise Guterres, publicitária e cerimonialista, formada em Marketing e Cerimonial Profissional, que trabalhou para Michelle. “Hoje posso afirmar que 90% dos locais no Rio de Janeiro estão acessíveis”, completa. A igreja evangélica que Leia frequenta passou por adaptações para cadeirantes meses antes dos preparativos de seu casamento. Foi colocada uma rampa de acesso na entrada e o banheiro ficou mais acessível, com facilidade para passagem de cadeiras de rodas e barras de segurança na parede. Portanto, ela não teve dúvidas: a cerimônia e a festa seriam em espaços conjugados na igreja. Ao fantasiar o grande dia, o vestido de noiva aparece impecável. Para uma mulher cadeirante, é a parte mais difícil dos preparativos. Michelle e Leia passaram por isso. “O vestido me deu muito trabalho. Passei três semanas
Nós, cadeirantes, enfrentamos um gigante por dia. Um desafio a cada acordar. Se o gigante é meu, eu tenho que enfrentar Leia
escolhendo entre diversos modelos. O problema de todos era a calda muito grande. Quando andava com a cadeira, ele enroscava na roda e o véu agarrava nos raios”, afirma Leia. A solução foi dada por uma das madrinhas: tinha que cortar o vestido e o véu. Michelle não quis se preocupar em correr atrás de lojas e experimentar diversos modelos. Por essa razão, mandou fazer um vestido sob medida. Mesmo assim, não saiu da maneira planejada. “Sobrava muito tecido na parte da barriga, que é onde a gente dobra para sentar. Muitos ajustes foram feitos, mas o tecido ainda sobrava na parte do tronco”, diz a bancária. De acordo com Drika Valério, 29, designer de moda especializada em vestidos de noiva para mulheres cadeirantes e andantes, não tem diferença na confecção das peças. Mas, alguns estilos não são adaptáveis para noivas cadeirantes, como a peça tomara que caia. “Muitas noivas têm escoliose, então, o corpete não para direito no busto”. Ao tentar encontrar patrocínio para seu projeto, em 2011, Drika deparou com um preconceito descarado. “‘Por que está fazendo desfile para cadeirante? Por acaso deficiente casa?’. Nunca me esqueci dessa frase”. A designer começou a trabalhar com moda inclusiva em 2011 e desde então tem muita visibilidade. “Percebi que são poucos os profissionais que trabalham com moda inclusiva voltada para noivas”.
Quando a nossa realidade muda, nossos sonhos não precisam mudar. O que a gente precisa fazer é buscar alternativas, outros caminhos. Não tem acessibilidade, dê um jeito. Brigue com quem precisa brigar Michelle O grande dia Após o estresse dos preparativos, é chegada a hora das borboletas no estômago, que costumam aparecer no grande dia. Aline não consegue segurar a ansiedade para a cerimônia. “É engraçado eu estar assim, nunca tive o sonho de casar na igreja porque sempre achei perda de tempo e desperdício de dinheiro, mas não é! Mesmo estando com medo que algo dê errado, estou curtindo esse momento tão especial na vida da mulher”. Apesar de alguns contratempos, Leia revela que ficou satisfeita com o casamento. “Deu trabalho, mas, valeu a pena”. Durante o dia da cerimônia, a auxiliar de escritório
Ju Rezende, 35, é maquiadora e criadora do #PARAnoivas. O projeto social inclusivo auxilia noivas com deficiência a realizarem o sonho do casamento. O trabalho, além da maquiagem, conta com serviços de estilista, cinegrafista, fotógrafo e cerimonialista. A única parceria ainda não alcançada é a de um salão de festas. “Eu sempre fazia fotos em um, mas quando fui falar do #PARAnoivas tive as portas fechadas. Os responsáveis pelo estabelecimento disseram que para ensaios com pessoas deficientes seria necessário o pagamento de R$ 15.000”, revela. André Monteiro, conhecido como Deco, é parceiro do projeto. O fotógrafo explica que a maior técnica para registrar noivas com deficiência é o olhar, mas não o técnico e sim um sem preconceito. “Ao fazer a foto não podemos ver com pena, e precisamos entender que somos todos iguais independentemente da nossa condição física”. O #PARAnoivas surgiu durante a última Olimpíada e Paralimpíada e, até então, duas mulheres amputadas e uma cadeirante participaram. “Muitas noivas com deficiência casam apenas no civil por conta das dificuldades enfrentadas nos preparativos do casamento. Hoje, o mercado não está preparado para atender esse público e existe um grande preconceito”, afirma. A maquiadora conta que no momento de vender o projeto para um possível parceiro, chegou a ouvir que o trabalho desenvolvido é lindo, mas que a empresa não quer o nome da marca ligada ao público da pessoa com deficiência. De acordo com Ju, o projeto deve mudar de nome em agosto deste ano e passar de #PARAnoivas para #paraTODASasnoivas, pois é uma maneira de abranger não apenas mulheres com deficiência, mas também pessoas com baixa renda independentemente de cor, etnia e religião.
Liliana Costa participou do s #PAR Anoiva
Revista D+ número 14
Fotos: Deco Monteiro
Fada Madrinha
Comportamento
Acredito que tudo vale a pena quando o objetivo é realizar um sonho Aline gostaria de ter descansado no hotel, porém a falta de acessibilidade nos hotéis cariocas fez a noiva abrir mão. “Não tinha espaço para a cadeira de rodas no quarto, havia escadaria na entrada e não tinha elevador acessível que saía da garagem”. Dessa forma, Leia se arrumou em casa com o auxílio de uma amiga. Porém, a casa é no segundo andar, então, ela teve que ser carregada até o carro. Paulo Sérgio, noivo de Leia, animado com a realização do casamento, auxiliou na decoração da igreja e apenas parou de trabalhar para se arrumar. A cerimônia e a festa aconteceram no quintal da igreja. Depois do casamento, a noiva quis fugir do tradicional e dançou o ritmo charme (coreografia com músicas americanas dos anos 1980) em vez da valsa. “Primeiro apareceram os padrinhos, depois as damas e por último os noivos. Descemos a rampa dançando”, lembra. Michelle foi assertiva ao fazer a cerimônia e a festa no mesmo local. “Foi mais fácil por causa do vestido e por não precisar fazer transferência de carro. A sensação que eu tive foi de felicidade. Até hoje tenho a impressão de que foi o dia mais feliz da minha vida!”. A preparação da noiva aconteceu em cima do buffet. Michelle foi carregada pelo noivo para um espaço com hidro em um banheiro espaçoso, onde passou o dia de beleza com a sogra e a prima. Para ficar pronta, Michelle teve o auxílio de três profissionais: cabelereira, maquiadora e massagista. A ideia da valsa foi por conta da noiva. “Eu que adaptei a dança. Fiz as partes que tinham movimentos de braços e deixei a movimentação do corpo com o meu noivo”. A “valsa” foi eclética começando de forma tradicional e em seguida, com Tropa de Elite, Macarena, Vai Ter que Rebolar e Kuduro. Apesar de Michelle e Leia terem enfrentado as barreiras e de Aline estar conseguindo concluir os preparativos do casamento, ainda há muitas Leias a procura do vestido perfeito, Michelles buscando igrejas acessíveis e Alines lutando por salões de beleza onde não precisem ser carregadas. E muitas, muitas outras noivas tentando entrar com digniD+ dade em suas próprias festas... Confira mais em: www.revistadmais.com.br/Ed14_ comportamentoexclusivo
“Não vou desistir de casar na igreja” Renata Luz, 27, tem mielite transversa viral, é nutricionista e católica. Para realizar seu sonho, notificou a Igreja Matriz, localizada na cidade de Mauá (SP), em janeiro deste ano. O motivo da notificação seria a solicitação de acessibilidade na igreja devido às escadarias e aos degraus em frente ao altar. Quando chegou à secretaria da paróquia para discutir como seria o processo de colocar rampas na escadaria, não foi bem recebida pelo padre. “Não consegui falar a respeito dos problemas que eu via. Senti na conversa que o padre queria logo encerrar o assunto”, revela Renata. Descontente com a situação, a noiva decidiu ter uma audiência com o bispo da região de Mauá, Dom Pedro Carlos Cipolini, em que expôs todo o ocorrido com o padre. “Eu não estava questionando só o meu ponto de vista, mas o de outras pessoas com deficiência que deixam de casar e de argumentar por falta de coragem. Sou católica e faço questão de casar na igreja. Se fosse outra pessoa teria desistido de casar diante da rispidez do padre”. Como resposta, o bispo ficou de marcar uma reunião com o padre da Matriz. Mas não especificou nenhum prazo de retorno. O casamento de Renata está previsto para novembro deste ano.
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Precisamos falar
que secam A violência contra a pessoa com deficiência é cometida de muitas formas. Seja como for, humilha, traumatiza, deixa marcas profundas e deteriora a dignidade humana texto Taís Lambert fotos Taís Lambert e Shutterstock colaboração Audrey Scheiner, Brenda Cruz e Mayra Ribeiro
“ Conheci-o na escola, quando cursava o ensino médio. Estudávamos em salas próximas e nos paquerávamos. Eu trabalhava o dia inteiro e estudava à noite. Cheguei na escola em um dia de muita chuva, toda molhada, e ele ofereceu ajuda para secar meu cabelo. Começamos a ter amizade, ele era militar e muito bonito, ficamos juntos... ... Sentia muito medo, mas criava expectativas de melhoras, acreditando que um dia ele mudaria o comportamento... ... Eu estava grávida, era uma gravidez de risco. Tive que ficar 15 dias na cama, de repouso. Ele me deixava trancada, com sangramento, e as horas de comer e tomar banho passavam. Eu ia até a janela, gritava minha vizinha e ela vinha me ajudar... ... O casamento durou 13 anos. Ele me fazia ameaças. Já foi na casa dos meus pais e mirou revólver na cabeça deles, dizia que ia matar minha família. Mas eu tive uma criação em que mulher divorciada não prestava, e eu tinha que ser mulher de um homem só. Alimentava aquilo e esperava que, com o tempo, ele mudasse...” Rosa Maria Batista Santos, 56 anos, com focomelia, síndrome caracterizada pela aproximação ou encurtamento dos membros junto ao tronco, devido à ingestão de Talidomida por sua mãe, durante a gestação. De Corumbá, Mato Grosso do Sul
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e acordo com o Relatório Mundial sobre a Deficiência, elaborado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pelo Banco Mundial, em 2011 – cujos dados e recomendações permanecem válidos até 2021 segundo o documento –, pessoas com deficiência estão mais sujeitas a sofrer violência do que as pessoas sem deficiência. Essa população tem 1,5 vezes mais chances de ser vítima de abuso sexual e 4 a 10 vezes maior probabilidade de ter vivenciado maus tratos quando criança, segundo alertam os dados internacionais da Organização das Nações Unidas (ONU). De maio de 2014 até março deste ano, foram registrados no estado de São Paulo 40.726 boletins de ocorrência envolvendo 41.311 vítimas com deficiência. Computados pela Secretaria de Segurança Pública (SSP) e pela 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência/SP (DPPD), os meses de janeiro, fevereiro e março de 2017 revelam 3.218 boletins de ocorrência com 3.259 vítimas. Como você bem sabe, o que chega às estatísticas é só a ponta do iceberg. Revista D+ número 14
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Antes de mais nada, o que é violência? Não precisa sangrar nem estar quebrado. Não precisa de hematoma, olho roxo ou dente faltando. Nem precisa ser físico, aliás. Isso porque nem sempre uma marca física indica a prática de violência e nem toda violência deixa marcas físicas. Negligência, agressão psicológica, física, sexual e patrimonial são formas de violência. Dra. Lúcia Cavalcanti de Albuquerque Williams, 66 anos, é Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar/SP), e fundadora do Laboratório de Análise e Prevenção da Violência (Laprev), da UFSCar. Ela explica: “A violência psicológica, por exemplo, é caracterizada por agressões verbais, humilhações e ameaças, é muito danosa para a saúde mental. Um exemplo disso é dizer: ‘Eu não queria que você tivesse nascido’”. A violência pode acontecer por omissão ou por ação, como detalha Dra. Samanta Rihbani Conti, 45 anos, delegada da 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência. “Por ação, é quando você agride fisicamente uma pessoa, quando você xinga ou ameaça. Mas quando se deixa de fazer alguma coisa que deveria fazer, é violência por omissão. Por exemplo, a família que deixa de levar a pessoa ao médico ou de alimentá-la em casa está cometendo atos de violência. Isso é negligência”. Recusar-se a contratar uma pessoa porque ela tem deficiência ou discriminar alguém no ambiente de trabalho, excluindo-o, são outras formas de violentar. Até pouquíssimo tempo, a invisibilidade da violência contra a pessoa com deficiência no Brasil tornava tudo ainda mais obscuro. A maior parte dos atos de violência era “guardada” – como acontece muito ainda hoje –, mantida em segredo no ambiente em que ocorrem. Portanto, se as violações de direitos não são externadas – tampouco punidas – acontece o pior: duram. Muitas vezes, até a morte. Por que a pessoa com deficiência sofre mais? O relato da sul-mato-grossense Rosa Maria, no início desta reportagem, funde-se a muitas outras histórias, talhadas por crueldade e desrespeito. Rosa perdeu duas gestações: hipertensa, passava por muito estresse e isso prejudicava bastante a saúde; além das agressões propriamente ditas, que aconteciam inclusive nos períodos de gravidez. O fato é que o(a) agressor(a) não age assim por acaso quando se trata de uma pessoa com deficiência: a relação de poder entre as partes é determinante para a extensão e profundidade do estrago. “A violência tem mais chance de ocorrer quando há desigualdade de poder entre agressor e vítima – como, por exemplo, em função do tamanho, status social, da força física, idade (adulto x criança) e gênero (homem x mulher)”, explica Dra. Lúcia Williams, do Laprev.
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A violência psicológica é caracterizada por agressões verbais, humilhações e ameaças, é muito danosa para a saúde mental. Um exemplo disso é dizer: ‘Eu não queria que você tivesse nascido’ Dra. Lúcia Williams, do Laprev (UFSCar)
Fonte: Centro de Serviços de Apoio Técnico da 1ª DPPD
41.311 vítimas com
deficiência De maio de 2014 a março de 2017
No estado de São Paulo, foram 1.216 vítimas com algum tipo de deficiência só no mês de março de 2017 Fonte: Centro de Serviços de Apoio Técnico da 1ª DPPD
violência A vulnerabilidade não é uma característica da pessoa com deficiência, mas um fenômeno relacionado à maneira como a sociedade enxerga essas pessoas. Em outras palavras, a pessoa com deficiência não deveria ser tratada ou entendida como alguém mais frágil e, portanto, alvo fácil para a violência. Não deveria, mas é. Ivone de Oliveira, 48 anos, cadeirante, já sofreu assédio por diversas vezes. Em uma das ocasiões mais marcantes, dentro do metrô, um homem se fez de “bêbado”, caindo e se esfregando nela por todo o trajeto. “Ele me espremia na vaga de deficiente, jogava o corpo inteiro em cima de mim. A violência era notória para os outros usuários, que acabaram por chamar os seguranças do metrô”, conta Ivone.
Para quem agride, a pessoa com deficiência é incapaz. Seja de se defender, seja de denunciar. “A vulnerabilidade pode decorrer de vários fatores, como maior dependência de cuidados de outras pessoas, o agressor perceber que terá menos riscos de a agressão ser descoberta, dificuldade da vítima de notificar a violência ou mesmo de acreditarem no que ela está tentando dizer”, detalha a fundadora do Laprev, ela mesma com um histórico de violência na família: nos anos 1980, Dra. Lúcia perdeu uma irmã assassinada pelo pai de seus filhos. A pessoa com deficiência no papel da vítima pode não entender que o que houve foi um ato de violência. Outros fatores que colaboram para que sejam os alvos preferidos de atos violentos têm a ver com o isolamento, a
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NOSSA CAPA maior possibilidade de ser manipulado ou enganado pelas pessoas, a ausência de conhecimento sobre prevenção e habilidades de autoproteção. Rosa Maria, por exemplo, que sofreu violência por mais de uma década, acredita que à medida do possível, as mulheres precisam buscar conhecimento na Lei Maria da Penha, conhecer direitos e recursos que possam ser acionados no caso de violência. “Na época, eu não tinha informação nenhuma. Todos viam e sabiam o que acontecia, mas ninguém me tirava daquela situação e eu também não tinha forças para sair”. O fim do martírio veio com a ajuda de um casal de amigos em uma situação limite. “Num almoço com eles, meu ex-marido começou a brigar comigo. Sacou a arma e deu um tiro que me passou de raspão. Nesse dia, meus amigos insistiram para que eu pedisse divórcio. Colocaram o agressor dentro de um carro e o levaram para a cidade dos pais dele. Casei novamente e ele não aceitou, tentou reconciliação, mas não aconteceu”, relata Rosa. Muitas vezes, por problemas de comunicação ou locomoção, as pessoas com deficiência enfrentam mais dificuldades em acessar serviços e conseguir ajuda. E infelizmente, a violência mais acontece onde menos deveria.
Família: a maior parte dos agressores está lá Calma. Não vá pensando que você, que cuida com tanto carinho de um ente querido com deficiência, e se dedica o tempo todo – abrindo mão, inclusive, das próprias necessidades – está sendo acusado(a) de violar direitos Vamos com cautela. Estudo desenvolvido pela Coordenadoria de Programas da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SEDPcD), com base nos dados do Disque 100 entre 2011 e 2013, revelou que em 72% dos casos o agressor era familiar da vítima. Dra. Lúcia Williams afirma: “Os autores mais frequentes são, infelizmente, familiares ou pessoas com fácil acesso à pessoa com deficiência, como cuidadores, vizinhos e parentes”. Os casos analisados no estudo apontam três fatores de tensão entre o cuidador – geralmente membro da família – e a pessoa com deficiência: o estresse decorrente de atenção ininterrupta; a dependência física, psicológica e econômica e dificuldades financeiras. O Programa Estadual de Prevenção e Combate à Violência contra Pessoas com Deficiência, oficializado por meio do decreto 59.316, de 21 de junho de 2013, nasceu com o intuito de olhar para essa realidade, criando meios para coletar dados, capacitar profissionais e aperfeiçoar a rede de serviços, além de trabalhar a prevenção da violência. “Sabemos que esse público tem sofrido violência dentro de casa. Essa violência é relacionada à condição social da família. Sob estresse e sobrecarga, os cuidadores
Quem sofre, quem denuncia Porcentagem de pessoas por tipo de deficiência
52% Auditiva 21% Física 14% Intelectual 2,6% Múltipla Fonte: Centro de Serviços de Apoio Técnico da 1ª DPPD
estão mais suscetíveis à violência contra as pessoas com deficiência”, afirma Marcos Alexandre Schwerz, 45 anos, executivo público, que participou da coordenação do Programa ao lado de Luiz Carlos Lopes, hoje Secretário de Estado Adjunto da SEDPcD. A delegada Samanta Rihbani Conti endossa o que já está comprovado, inclusive em sua rotina de denúncias e crimes. “Tirando os casos de crime patrimonial, como furto e roubo na rua, os abusos começam sempre na família. Os casos de maus tratos contra a pessoa com deficiência, abandono material, abandono de incapaz, lesão corporal, ameaça e injúria acontecem no seio familiar”. Cada situação tem suas especificidades, como a delegada deixou claro. Em alguns casos, diálogo, informação e orientação resolvem. Em outros, já não se trata mais de estresse ou tensão: é crime e barbárie e a punição da justiça é a resposta.
Casos de polícia O Programa Estadual de Prevenção e Combate à Violência contra Pessoas com Deficiência deu origem à primeira e única Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência do Brasil (DPPD), que fica localizada no centro da cidade de São Paulo, e completará três anos de funcionamento no início de junho. Criada pela Secretaria de Segurança Pública e Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, a 1ª DPPD conta com duas frentes de trabalho: a equipe policial, composta por uma delegada, três investigadores e duas escrivãs; e a equipe multidisciplinar, do Centro de Apoio Técnico (gerido também pela Organização Social Casa de Isabel), com duas psicólogas, duas assistentes sociais, uma socióloga, três intérpretes de Libras e uma coordenadora. “A delegacia tem acessibilidade para pessoas com qualquer tipo de deficiência. Quando um surdo chega, é atendido pelo intérprete de Libras, o cego conta com piso tátil e tecnologia assistiva, o cadeirante tem a rampa e circulação garantida. As psicólogas podem atender as pessoas com deficiência intelectual, como, por exemplo, síndrome de Down e autismo. Aqui tudo é adaptado”, afirma Dra. Samanta, que trabalha como delegada há 20 anos e há quase dois está à frente da 1ª DPPD.
Identificando casos de violência Mudanças bruscas no comportamento, isolamento, medo, entristecimento, baixa autoestima, recusa a ir a um determinado local associado ao ato violento, surgimento de comportamentos sexualizados (no caso do abuso sexual). Marcas no corpo, como hematomas, sobretudo se a fala da pessoa for dificultada
Todos viam e sabiam o que acontecia, mas ninguém me tirava daquela situação e eu também não tinha forças para sair Rosa Maria, vítima de violência
Fonte: Dra. Lúcia Williams, do Laprev (UFSCar)
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NOSSA CAPA Moacir Batista de Albuquerque, 52 anos, é investigador chefe na delegacia e está há 25 anos na polícia civil. Formado em Direito, Teologia e Ciência Política, é também professor de Direitos Humanos na Associação de Funcionários da Polícia Civil do Estado de São Paulo, no curso preparatório de formação para as carreiras policiais. A qualificação, naturalmente, o levou para a 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência. “Quando saímos para uma visita, porque recebemos uma denúncia anônima pelo Disque 100, por exemplo, tentamos uma abordagem mais social para quebrar o gelo. Precisamos entrar na casa, avistar a pessoa, buscar sinais de violência, ver se a pessoa pode falar conosco ou se está sendo privada da liberdade”, detalha o chefe dos investigadores. O que acontece, muitas vezes, é que a pessoa com deficiência é “escondida” ou coagida. Nesses casos, a polícia intima a pessoa a comparecer na delegacia e, no atendimento privado, sem a presença do agressor, ela pode falar a verdade. “Sempre procuramos ver se o ambiente está sujo, se é insalubre, se a pessoa com deficiência está com alimentação adequada ou recebendo água. Pois, às vezes, nem água elas recebem”. Clara Akie Yoshino, 27 anos, é a socióloga responsável pelas estatísticas dos boletins de ocorrência envolvendo pessoas com deficiência em todo o estado de São Paulo. Até maio de 2014, esse tipo de apuração não era realizado pela Secretaria de Segurança Pública no Registro Digital de Ocorrência (RDO), o que tornava impossível saber qual era a dimensão da violência contra a pessoa com deficiência. “A maior procura aqui na delegacia é de pessoas surdas. Não simplesmente por causa da violência, mas porque sabem que encontrarão intérpretes de Libras e serão orientados em suas variadas necessidades”, conta Clara. Um dos casos mais marcantes para a socióloga foi o de um garoto com síndrome de Down. “Ele era quase adolescente e estava sendo estuprado pelo pai. Foi uma denúncia anônima, e a mãe apaziguava”, revela. Pelos dados de boletins de ocorrência levantados mensalmente, é possível observar que a maior parte dos crimes sexuais ocorre contra as pessoas com deficiência intelectual. A delegada incentiva as pessoas a denunciarem em todos os órgãos: Disque 100, Disque 180, para o 190 e para a ouvidoria da Secretaria da Pessoa com Deficiência. “Usem todos os canais. Tivemos uma denúncia anônima, mas não chegamos a tempo: a mãe deixou o filho adulto, com paralisia cerebral, sem alimentação por sonda definhar na cama até morrer. Quanto antes a denúncia chegar, mais chances temos. Não precisa ter certeza dos maus tratos, se você desconfiar, faça a denúncia que alguém vai checar”, orienta. Para fazer florescer o respeito Uma das assistentes sociais que acompanha os policiais em visitas, Edleia Barreto Nascimento, 36 anos, fala de uma mudança social necessária: “Em primeiro lugar, é preciso ver o outro como ser humano. Enxergá-lo como alguém importante,
No primeiro trimestre do ano, foram 3.218 boletins de ocorrência com 3.259 vítimas Fonte: Centro de Serviços de Apoio Técnico da 1ª DPPD
que merece respeito. A partir do momento que uma pessoa se empodera, ela consegue romper alguns ciclos de violência”. O caminho é longo e acontece a passos de formiga. Visto por certos ângulos, a amarga impressão é a de que a violência não tem fim. A psicóloga Miriam Monteiro Ribeiro Vicente, 48 anos, também é parte do Centro de Apoio Técnico na 1ª DPPD e chama atenção para as crianças com deficiência: “Geralmente elas têm entre cinco e seis anos e são abusadas sexualmente. Chegam aqui e desenham a violência que sofrem”. Rosália Peres Gonçalves, 35 anos, é assistente social e coordenadora do Centro de Apoio Técnico na delegacia, faz a ressalva do quanto é difícil entenderem que há direitos assegurados para a pessoa com deficiência. “Nós temos a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) que nos auxilia muito no direcionamento dos casos. As famílias acham que ter uma pessoa com deficiência é alimentar, dar banho e deixar guardada, como se fosse um animal de estimação no quartinho. Porque ela faz barulho, porque ela incomoda. Alguns familiares ainda não entendem que ela pode trabalhar, namorar, ir para a escola, viver”, desabafa. Como já foi dito, muitas são as formas de violência. Outra delas, tão cruel quanto as que foram abordadas, é a violência do próprio Estado e da sociedade como um todo. Quando o poder público não oferece os serviços mínimos necessários, que são de direito da pessoa com deficiência, ele também comete uma violência. Quando um restaurante abre suas portas sem sequer pensar na rampa, o bê-a-bá da acessibilidade, a sociedade também comete uma violência. Quando uma pessoa surda não consegue se comunicar em nenhum local de sua necessidade, outra vez ela está sendo violada.
Samanta Rihbani Conti, delegada
Moacir Batista de Albuquerque, investigador chefe de polícia
Edleia Barreto Nascimento, assistente social
Os casos de maus tratos contra a pessoa com deficiência, abandono material, abandono de incapaz, lesão corporal, ameaça e injúria acontecem na família, infelizmente Dra. Samanta Rihbani Conti, delegada
Rosália Peres Gonçalves, assistente social e coordenadora do Centro de Apoio Técnico
Miriam Monteiro Ribeiro Vicente, psicóloga
Clara Akie Yoshino, socióloga
Fernando de Paula Lino, intérprete de Libras
Parte do time da 1ª DPPD, no centro de São Paulo: o acolhimento na delegacia acessível conta com equipe multidisciplinar
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NOSSA CAPA Na opinião de Marcos Alexandre Schwerz, as famílias têm pouco apoio do Estado. “Não se pode mudar as leis que apoiam a figura do cuidador. O Benefício de Prestação Continuada (BPC), por exemplo, está sendo alterado no Congresso agora. É um problema gravíssimo, porque esses benefícios, para determinadas famílias, são o que garante minimamente a subexistência. Afinal, se a pessoa tem que cuidar de alguém, ela não pode trabalhar. Muitos dos benefícios estão sendo cortados”, alerta. Outra realidade que não se cumpre é a das residências inclusivas, os centros para as pessoas com deficiência. “Existe muito pouco desses serviços e a carência é enorme. As pessoas estão envelhecendo, muitas delas com deficiência intelectual estão ficando sozinhas. Quem é que vai cuidar dessas pessoas? A grande pergunta é essa. O Estado tem um papel importante nisso. Os serviços existem como um ideal, mas o governo ainda não financia”, aponta Schwerz.
O surdo e a ineficiência da sociedade Segundo a compilação de 2016 dos boletins de ocorrência registrados na 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência, elaborado pela socióloga Clara Akie Yoshino, os surdos são os que mais vão à 1ª DPPD. São 52% de pessoas surdas, 20,9% de pessoas com deficiência física e, em terceiro lugar, as pessoas com deficiência intelectual (13,8%). “As ocorrências familiares são muitas, e na maior parte das vezes é por causa da falta de comunicação. Também recebemos muitos surdos que foram demitidos e vêm para falar que receberam pouco, que não havia intérprete e se sentiram lesados”, conta Fernando de Paula Lino, 28 anos, intérprete da Língua Brasileira de Sinais (Libras) na 1ª DPPD. O alto número de surdos na delegacia não significa, apenas, boletins de ocorrência. Boa parte deles procura o local justamente porque carecem de intérpretes de Libras em suas necessidades de rotina e sabem que, lá, encontrarão ajuda. “Muitos surdos contam que não conseguem, por exemplo, receber o Benefício de Prestação Continuada e não sabem a razão, porque não conseguem se comunicar nos locais”, revela a delegada Dra. Samanta. Desde o dia 13 de março, a Central de Interpretação de Libras (CIL), da Prefeitura de São Paulo, está com os serviços suspensos. De acordo com a assessoria de comunicação, “A Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência (SMPED) esclarece que está tomando as providências necessárias para a regularização e o aperfeiçoamento do serviço de mediação na comunicação entre pessoas com deficiência auditiva, surdos e surdocegos e os serviços públicos na cidade de São Paulo”. Tudo o que existe é para o ouvinte: a TV, o rádio, as informações no geral. De acordo com Fernando – cujo pai é surdo e ele, então, cresceu aprendendo a cultura surda e suas especificidades, “O surdo fica à parte por causa da deficiência que a sociedade tem de não saber se comunicar com ele. Geralmente não há crimes, mas desinformação”. Célio Santana, 37 anos, surdo, viveu uma experiência fruto do despreparo social. Consultor de Libras, seria o último a sair de seu local
QUE SEJA SEM DEMORA Ensinar e humanizar parece ser o caminho na opinião dos entrevistados. “Desde a tenra infância, é preciso aprender que as pessoas têm direitos. É necessário ensinar empatia e outros comportamentos morais, respeito ao gênero oposto, técnicas de resolução de conflito não violentas com base no diálogo e no entendimento, oferecer Direitos Humanos na escola. Isso também ajuda a pessoa a não reproduzir o padrão violento que aprendeu na infância, o que chamamos de intergeracionalidade da violência”, aponta a psicóloga Dra. Lúcia Williams. Rosa Maria casou-se novamente e tem duas filhas: Letícia Santos, 25 anos, está na faculdade de História; e Sarah Santos, 19 anos, que também nasceu com uma deficiência nos braços, cursa Jornalismo. “Resgatei minha dignidade e meu empoderamento. Depois que minha filha caçula entrou para a faculdade e se tornou independente, ela me
de trabalho, à noite, mas foi impossibilitado porque a chave ficou presa dentro do escritório e ele, do lado de fora, não tinha como abrir o portão de saída para a rua. Pediu ajuda para um passante, que não o entendeu. Depois de uma difícil conversa, Célio conseguiu pedir que o homem chamasse a polícia para ajudá-lo. Chegaram quatro viaturas: “Fiquei assustado. Os policiais até sacaram armas”, relembra ele. “Tentei explicar a situação por meio da oralização e da Libras enquanto os policiais, que não entendiam, gritavam: ‘O que você está fazendo aí?’, ‘Para onde você vai?’”, explica Célio, sobre os policiais que achavam que ele estava tentando entrar furtivamente no local. A conversa aconteceu com muita dificuldade, mas um dos policiais entendeu o ocorrido e sugeriu que Célio tentasse ligar para alguém da empresa, mas o funcionário estava com o celular descarregado. A sorte foi que um diretor da empresa, por acaso, passou em frente ao prédio e, ao notar a grande movimentação policial, parou para averiguar. Ao conversar com Célio em Libras, traduziu para os policiais o ocorrido e, finalmente, o problema foi resolvido. Por causa de situações como essa, cuja ineficiência na comunicação é bem comum, o intérprete de Libras Fernando participa de cursos dados na Academia de Polícia de São Paulo (Acadepol) a fim de reciclar policiais veteranos e ensinar as novas turmas. “Nas palestras eu falo sobre as deficiências visual e auditiva. Dou dicas de como abordar essa pessoa. A ideia é que eles tenham um pouco mais de cuidado no atendimento”. A delegada Samanta explica que os profissionais da 1ª DPPD ministram essas palestras na Academia de Polícia na disciplina de Direitos Humanos. “Oferecemos uma noção teórica, falamos da LBI e da delegacia, muitas vezes desconhecida pelos próprios policiais. O nosso objetivo é tirar as deficiências da invisibilidade e sensibilizá-los para um atendimento mais humanizado”, finaliza.
incentivou a sair de casa e trabalhar. Fui a primeira mulher com deficiência a trabalhar na Casa da Mulher Brasileira de Campo Grande”, diz Rosa. Todos os anos, Rosa fazia o Enem para acompanhar as filhas e incentivá-las a fazer curso superior. Foi assim que ela tomou gosto pelo estudo, até que Sarah lhe disse: “Mãe, esse ano a senhora vai para a faculdade!”. A moça cuidou de todo o processo e Rosa Maria passou no curso de Turismo, na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. “Eu não acreditei! Gosto de ter contato com outras culturas, conhecer lugares, viajar. Este é um dos melhores momentos da minha vida. Hoje sou feliz, meu marido tem muito orgulho de mim e me apoia em minhas decisões”, conta. A violência é favorecida por fatores estruturais, como as desigualdades de todos os tipos, o preconceito, a discriminação e a corrupção. Por outro lado, há meios de estruturar redes de serviços competentes, que cumpram
9,3 de pessoas com deficiência no estado de São Paulo Censo IBGE/2010
Cidades violentas Em 2016, de 645 municípios de São Paulo, 563 registraram boletins de ocorrência
2.888
São Paulo
Dra. Lúcia Williams, do Laprev (UFSCar): “A violência tem mais chance de ocorrer quando há desigualdade de poder entre agressor e vítima”
Maior registro em números totais 24 B.O. / 100 mil habitantes
Ribeirão Preto
304
Maior registro em números per capita 45 B.O. / 100 mil habitantes
Fonte: Centro de Serviços de Apoio Técnico da 1ª DPPD
Em primeiro lugar, é preciso ver o outro como ser humano. Enxergá-lo como alguém importante, que merece respeito
Edleia Barreto Nascimento, assistente social
direitos
NOSSA CAPA
As marcas da agressão Depressão, baixa autoestima, ansiedade, Transtorno de Estresse Pós-Traumático, problemas de relacionamento, dificuldades de aprendizagem ou concentração, risco de aprender a se comportar de modo violento e reproduzir a violência sofrida. Se a pessoa com deficiência tiver dificuldades de comunicação, não tiver amigos ou rede de apoio há o risco de sofrer em silêncio, sem compartilhar o ocorrido, aumentando o potencial traumático da experiência sofrida Fonte: Dra. Lúcia Williams, do Laprev (UFSCar)
seus papéis, educando, prevenindo e dando suporte. A justiça, por sua vez, tem em mãos a pena: que não é um castigo, mas uma justa punição pelos crimes cometidos. Promover a dignidade do ser humano é um dever do Estado, da sociedade, da escola, da família, meu e seu. Se cada um fizer sua parte por um padrão de vida digno para as pessoas com deficiência, as flores param de secar e muitas outras Rosas florescerão. D+
Foto: Antonio Arguello
Rosa Maria e sua filha, Sarah: no lugar da violência, um casamento feliz e uma nova etapa ao entrar para a Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul
Serviço: 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência Rua Brigadeiro Tobias, 527, Centro, São Paulo De segunda à sexta-feira, das 9h às 18h Telefones: (11) 3311-3380 e 3311-3383 violenciaedeficiencia@sedpcd.sp.gov.br Para denúncias anônimas: Disque 100
ENTREVISTA
Neide Sellin
Lysa, a Cão-guia Robô Por meio de sensores, a criação de Neide Sellin identifica objetos frontais, aéreos e dificuldades durante o trajeto, avisa o usuário por comando de voz sobre o obstáculo e procura um caminho mais fácil para seguir. Enfim, uma resposta para a realidade pouco ouvida texto Mayra Ribeiro fotos Divulgação
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ão passe por aquele local”, “Tem um objeto à frente”. Você já imaginou as mudanças que aconteceriam na vida de uma pessoa cega se o cão-guia pudesse falar? Talvez, os trajetos do cotidiano seriam com menos preocupação e mais facilidade. Essa já é uma realidade que está ao alcance das nossas mãos. Neide Sellin, 37 anos, fundadora da empresa Vixsystem, localizada em Vitória, no Espírito Santo, desenvolveu o projeto de um robô-guia. Formada em Ciência da Computação, Neide lecionou em oficinas de robótica em uma escola pública de Ensino Médio por oito anos, na região da Serra, no Espírito Santo. “Sempre acreditei que a inovação tem que contribuir de alguma forma com a sociedade”, diz ela. Por isso, Neide resolveu conversar com uma aluna cega que passava por dificuldades no dia a dia, como, buracos, obstáculos terrestres e aéreos. “A partir dessas descobertas, resolvi construir um projeto que auxiliasse as pessoas com deficiência visual”. Foi assim que nasceu Lysa, a Cão-guia Robô, que estará no mercado ainda no primeiro semestre de 2017. Segundo Neide, este é um primeiro passo: “A Vixsystem pretende se especializar em Tecnologia Assistiva e desenvolver projetos para casos de reabilitação”. Acompanhe a entrevista exclusiva que a Revista D+ fez com a idealizadora.
Revista D+ nĂşmero 14
ENTREVISTA ENTREVISTA
Neide Sellin
sabemos as melhorias a serem realizadas no projeto, que atualmente é desenvolvido por seis pessoas – três engenheiros mecatrônicos e três profissionais de ciência da computação. Até o momento, entre investimentos próprios e das instituições (Sebrae e CNPq), foram gastos R$ 400 mil. Como funcionam os testes realizados durante o desenvolvimento do robô? Nós trabalhamos com um grupo de 75 pessoas com deficiência visual de praticamente todas as regiões do Brasil no WhatsApp, no qual lançamos desafios, fazemos perguntas e escutamos as reclamações. A partir dessas informações discutidas no aplicativo, fazemos as alterações necessárias e entregamos o projeto para a verificação de três cegos que residem na região de Vitória, de faixas etárias e gêneros diferentes. Outra ação de teste desenvolvida pela empresa é a promoção de eventos para a apresentação do cão-guia robô.
A primeira versão de Lysa: o processo de construção começou em 2011 durante as aulas de robótica lecionadas por Neide
Revista D+: Como o projeto do robô-guia se desenvolveu? Neide Sellin: Os desafios que faziam parte do cotidiano dessa aluna eram de fácil resolução diante do que já tínhamos feito em sala de aula. Como havíamos participado de muitos campeonatos e olimpíadas de robótica, sabíamos fazer o robô identificar e desviar dos obstáculos. Desenvolvi o projeto, testei e recebi um retorno positivo da comunidade. Em seguida, fiz uma apresentação do cão-guia robô para um grupo de 20 cegos que viram nele uma possibilidade de melhoria na qualidade de vida. Então, há três anos, deixei a escola para abrir uma empresa focada em desenvolver esse projeto.
Como foi o processo de implantação do projeto? Comecei o processo de construção da Lysa, a Cão-guia Robô, em 2011 durante as aulas de robótica que lecionava. Em seguida, quando decidi abrir a startup, foquei os esforços na captação de recursos. Infelizmente, não consegui empresas investidoras, mas contei com o apoio das instituições Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Após essa busca inicial por recursos, começamos a realizar diversos testes. Como eu e ninguém da minha equipe temos deficiência visual, é por meio dessas avaliações que
Quais são as reclamações mais ouvidas durante os testes? Eu pensei que as reclamações mais constantes seriam sobre os buracos, mas não, pois com a bengala é possível identificá-los. Na verdade, as identificações mais requisitadas são sobre objetos aéreos e poças de água. 90% das pessoas do meu grupo de pesquisa têm cicatrizes no pescoço e testa devido a objetos como orelhões e lixeiras. Enquanto que a chuva gera uma grande dificuldade no trajeto dos cegos porque atrapalha sentir o retorno do eco da bengala. Quais são as funcionalidades de Lysa? Você pretende expandi-las? A Lysa fica no chão, à frente da pessoa com deficiência visual. Por meio dos sensores consegue identificar um objeto frontal, aéreo e dificuldades durante o trajeto, avisando
o usuário por comando de voz sobre o obstáculo e automaticamente procurando um caminho mais fácil para seguir. Sim, pensamos e já estamos trabalhando em uma expansão das funcionalidades com a inserção do GPS para que seja possível a criação de uma rota. Outra atualização que também queremos realizar é a inteligência artificial para que não apenas os obstáculos do trajeto sejam identificados como também tenha a explicação detalhada dos objetos. E as características? O robô tem 33 centímetros de comprimento, 26 de largura, 15 de altura e pesa dois quilos e 700 gramas. O sistema tem um funcionamento diário de oito horas e uma vida útil de um ano e meio a dois. No formato comercial, ao contrário da primeira versão do projeto, que foi criada com impressora 3D, será feito de fibra, o que o torna mais leve e resistente. Um sistema de sensoriamento periférico auxilia na locomoção, ele possui motores responsáveis pela movimentação, algoritmos que detectam e informam os
obstáculos e uma alça dupla similar a uma rédea de um cão-guia tradicional. O projeto também conta com botões de ligar/desligar e de controle de velocidade. O projeto do cão-guia robô foi inspirado em um modelo japonês. Quais são as diferenças dessa versão para a brasileira? As diferenças estão no tamanho. Enquanto a brasileira não passa de dois quilos e 700 gramas e tem 15 centímetros de altura, a japonesa tem em média 15 quilos e 50 centímetros de altura. Ou seja, o formato é diferente, mas as funcionalidades são as mesmas. Acredito que o modelo brasileiro também seja mais em conta do que o japonês. Quais as principais dificuldades encontradas no processo de criação da Lysa? A principal dificuldade foi a captação de recursos. Os investidores normalmente pensam apenas em números e, além de acharem o mercado da pessoa com deficiência visual pequeno, acreditam que o perfil do cego é alguém de baixa renda e que
depende de INSS. Então, como comprariam um robô? Outras dificuldades foram as calçadas e o clima. Cada região tem a sua particularidade e estamos trabalhando para que não seja necessário realizar diferentes modelos do projeto por causa das zonas climáticas, mas que apenas um seja resistente às mudanças de clima. Quais são as vantagens do robô-guia em relação aos demais formatos de auxílio para os cegos? As vantagens em relação à bengala, é que o robô identifica os objetos aéreos e guia a pessoa. Não é necessário tatear a todo instante para se proteger porque o sistema realiza essa função. Enquanto que comparado com um cão-guia tradicional, o projeto tem mais benefícios no custo. Um cão tradicional custa em média R$ 50 mil e o treinamento é demorado, de dois a quatro anos. Outra questão não tão vantajosa dos cães-guias tradicionais é o espaço. Muitas pessoas vivem em pequenos ambientes e um cão tradicional tem um porte grande. A higiene também é uma vantagem,
O projeto é desenvolvido por três engenheiros mecatrônicos e três profissionais de ciência da computação. Já foram investidos R$ 400 mil
A Cão-guia Robô possui sensores capazes de identificar objetos frontais e aéreos, além de dificuldades no trajeto. A haste, que está recolhida, é regulável
ENTREVISTA Neide Sellin pois nos cães tradicionais é o próprio cego que tem cuidados de limpeza com o animal. É certo que o cão-guia robô nunca substituirá o carinho entre cachorro e dono, mas oferece certas facilidades que proporcionam melhor qualidade de vida. Qual o valor comercial de Lysa e como os interessados podem comprá-la? O valor atual é de R$ 6.950. Por enquanto, em um período de dois meses, tivemos 127 pessoas dispostas a pagar esse preço, mas a meta da empresa é chegar em R$ 3.500. Para as primeiras unidades de entrega, que variam entre cinco e dez, estão incluídos treinamentos presenciais, enquanto que as demais unidades terão tutoriais disponíveis. Uma ação que está sendo realizada pela Vixsystem é a tentativa de viabilizar o pagamento por meio de financiamentos bancários. Descobrimos que existem algumas linhas que já proporcionam esse benefício aos clientes com deficiência. A empresa tem intenção de doar as primeiras unidades do cão-guia robô? Sim. Abrimos uma campanha de doação no site Kickante, na qual a meta era atingir o valor de R$ 50 mil para desenvolver dez unidades para doação. Mas por enquanto atingimos R$ 18 mil, o que nos permite criar de dois a três modelos para doar. Para os interessados em auxiliar, basta acessar o site da empresa (www.vixsystem.com.br). O valor mínimo para doação é de R$ 10. Você acredita que o robô-guia criará atrito com quem está à frente do treinamento de cães-guias tradicionais? Acredito que não. O robô-guia é mais uma ferramenta para o trabalho desses treinadores e não um concorrente. Não queremos substituir nenhum formato existente, mas sim expandir as possibilidades.
João, com deficiência visual, testa a robô-guia em sua primeira versão
Em que o desenvolvimento de Lysa mudou sua forma de percepção da realidade dos cegos? Com o projeto, pude entrar em contato com as dificuldades constantes que as pessoas com deficiência visual passam no cotidiano. Percebi que as questões dos cegos são esquecidas e reclusas. Hoje temos quase seis milhões de cegos no Brasil e vemos pouquíssimos nas ruas. Tem pessoas que me ligam dizendo que não estão estudando ou indo ao trabalho porque não confiam na bengala. D+
É certo que o cão-guia robô nunca substituirá o carinho entre cachorro e dono, mas oferece certas facilidades que proporcionam melhor qualidade de vida
ACONTECE
Luiz Cortez, João Barreto e Carlos Brito: a parceria dos garotos fez surgir o detector de som através de vibrações, para deficientes auditivos
Qual é a sensação da música? Dispositivo desenvolvido por jovem com deficiência auditiva e amigos ganha prêmio em competição global e também participa da Febrace Texto Mayra Ribeiro fotos Divulgação
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arlos Brito, 15 anos, natural de Campinas, interior de São Paulo, mas que atualmente mora em Hortolândia-SP, é um bom aluno. Entre as matérias da grade curricular da EEEI Prof. José Claret Dionisio, apenas duas não o agradam: matemática e inglês. Carlos não gosta de aprender o idioma, pois tem dificuldades. “O inglês é uma terceira língua, além de ser praticada oralmente. Não combina com surdos que vivem no Brasil”, afirma o jovem.
Porém, ao ser indagado sobre as aulas com as quais tem afinidade, ele cita mais opções, sendo robótica a preferida. O interesse pelo tema surgiu na infância, quando aprendeu a montar e desmontar objetos com o pai. Em 2016, o garoto levou esse gosto para frente ao entrar na aula de robótica da escola. Nesse momento, uma questão se fez na mente do adolescente: Qual é a sensação de escutar música? A resposta veio em forma de um projeto
desenvolvido durante as aulas com o auxílio dos orientadores do curso e dos amigos ouvintes João Barreto e Luiz Cortez. Carlos, Luiz e João criaram o detector de som através de vibrações para deficientes auditivos. O dispositivo que detecta o som ambiente e o reflete por meio de vibrações foi montado em um suporte de celular capaz de fixar-se ao braço do surdo. Um microfone ultrassensível capta o som e envia os dados capturados para a placa microprocessadora. Em seguida, a placa analisa e encaminha os comandos necessários para o funcionamento dos dois servos motores. O sistema, que é alimentado por uma bateria recarregável, teve um investimento de R$ 175,40. Em novembro do ano passado, o dispositivo ficou em terceiro lugar na Invent a New Future Challenge, competição global de soluções inovadoras. A partir dessa conquista, o grupo motivou-se a patentear a criação e a participar da 15ª edição da Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace). Infelizmente, os meninos não foram premiados nesse evento, mas o projeto mostrou todo o seu valor ao ser um dos 30 selecionados para a feira entre dois mil inscritos.
O dispositivo ficou em terceiro lugar na Invent a New Future Challenge, competição global de soluções inovadoras De acordo com Roseli Lopes, coordenadora geral da Febrace, o evento anual foi criado com o intuito de mudar as práticas pedagógicas existentes. “Além de querermos uma ampliação nos espaços da grade curricular, também desejamos que os estudantes passem a ser mais ativos”, explica. A coordenadora ainda afirma que a participação na feira contribui para uma observação mais aguçada, aumento da capacidade de estruturar e documentar ideias e maior respeito à ética. Realizada pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), a Febrace é voltada para estudantes matriculados no Ensino Fundamental (8º e 9º ano), Médio e Técnico de instituições públicas e privadas. Para mais informações, acesse: www.febrace.org.br. D+
Revista D+ número 14
MISTO QUENTE ACONTECE
Abra os olhos para a prevenção texto Audrey Scheiner
A
tualmente há mais de 1,2 milhão de cegos no Brasil, com visão corrigida igual ou inferior a 20%. Por isso, o Projeto Abril Marrom – Prevenção e combate às diversas espécies de cegueira (www.abrilmarrom.com. br) deu início ao segundo ano de campanha no dia 3 de abril, na Câmara Municipal de São Paulo. A iniciativa é fruto da Proposta de Lei 14.485 /07, do engenheiro civil e ex-vereador Aníbal de Freitas. Com o intuito de conscientizar a população sobre a prevenção da a cegueira, o projeto Abril Marrom desenvolve, durante o mês de abril, testes de acuidade para a população e palestras ministradas por médicos especialistas em diversas áreas da oftalmologia. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que entre 60% e 80% dos casos de cegueira poderiam ser evitados ou tratados. Isso significa que aproximadamente 700 mil brasileiros com cegueira poderiam estar enxergando se tivessem recebido tratamento adequado e em tempo adequado. Mas para que isso aconteça o acesso ao atendimento médico oftalmológico é decisivo na alteração as condições de saúde ocular. Segundo pesquisa do IBGE, 80% dos 24,6 milhões de pessoas que possuem alguma deficiência, no Brasil, são cegas ou possuem baixa visão. Procedimentos como exames clínicos e aferição de pressão intraocular podem detectar eventuais alterações da visão. “Nós temos que nos apegar à prevenção. 90% da causa da cegueira vem de doenças graves como catarata e glaucoma”, finaliza Aníbal de Freitas. D+
Programação Confira a programação das palestras, que acontecerão na Câmara Municipal de São Paulo. Viaduto Jacareí, 100, 1º subsolo, sala A - Vieira de Melo. Sempre das 15h às 17h: Dia 10 de abril - Prevenção • Orientações básicas sobre a situação atual da saúde ocular no Brasil – Dr. Suel Abujamra • Como prevenir as doenças oculares? – Dr. Pedro Durães Serracarbassa Dia 17 de abril - Combate • Ações públicas de saúde no combate à cegueira – Dr. Suel Abujamra • Como tratar as principais doenças oculares? – Dr. Pedro Durães Serracarbassa Dia 24 de abril - Reabilitação • Reabilitação visual no Brasil – Eliana Cunha, assessora de Serviços de Apoio à Inclusão, da Fundação Dorina Nowill, • Projeto Bengala Verde – Maria Julia Araujo, Retina São Paulo Programação Encerramento Audiência Pública no dia 2 de maio, na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Av. Pedro Álvares Cabral, 201 – Ibirapuera, Auditório Franco Montoro, às 18h.
MISTO FRIO A Revista D+ foi e cobriu texto Mayra Ribeiro fotos Brenda Cruz
3º Caminha Down e Bike Down: alegria
e inclusão
Suzana Barbosa da Silva ao lado do marido Josemar, o filho mais velho, Gustavo, e a pequena Lorena, de apenas 11 meses, pela primeira vez no Caminha Down
F
oi em um domingo ensolarado (26/03) no Parque Estadual Villa-Lobos de São Paulo, que o 3º Caminha Down aconteceu. Alegria, entretenimento e inclusão formaram o cenário desse evento feito em comemoração ao Dia da Conscientização da Síndrome de Down, que uniu ONGs, coletivos e famílias com o objetivo de sensibilizar a população pela causa e facilitar a troca de informações. O 3º Caminha Down teve início às 9h com uma apresentação das crianças do grupo de capoeira Gunga-ie. Em seguida, atrações de canto e de diversas danças deram continuidade à abertura. Ao longo do dia, os participantes também puderam conhecer projetos e trabalhos de ONGs que foram expostos em pequenas tendas. Enquanto isso, brinquedos, livros, personagens de filmes infantis e os doutores da alegria fizeram o dia da criançada que acompanhava os pais. Paralelo ao Caminha Down, acontecia o 3º Bike Down. “A partir do entretenimento, queremos mostrar que a pessoa com Down é capaz de trazer alegria”, explica Rosana Bignami, 52, coordenadora geral do evento. O Caminha Down encerrou as atrações às 14h, horário que iniciou a caminhada pelo parque. Apesar de essa última edição ter conseguido alcançar um público maior, Rosana aponta que a sociedade ainda está um pouco fechada para a causa. “Nós temos leis, mas isso não garante a inclusão. Na verdade, a interação social efetiva vai acontecer quando não precisarmos de regras”. Uma das famílias que estavam presentes no evento era a de Suzana Barbosa da Silva. Com o marido Josemar, o filho mais velho, Gustavo, e a caçula Lorena, de 11 meses, que tem síndrome de Down, ela foi conhecer o evento pela primeira vez. “Agora sou apaixonada, fã número um!”. D+
As palhacinhas do Sopro de Alegria encantaram e divertiram a todos
A caminhada contou com batucada e muitas faixas que pediam, entre muitas coisas, mais respeito, amor e diretos para a pessoa com síndrome de Down
PSIQUE
Psicologia da reabilitação: uma viagem interna por Ana Clara Portela Hara *
D
iariamente, mães e pais de crianças com deficiência ou atrasos no desenvolvimento e adultos com doenças vasculares, tumores, doenças degenerativas ou que sofreram acidentes automobilísticos, chegam aos Centros de Reabilitação cheios de expectativas, ansiedade, medo, angústias, depressão e esperança, muita esperança... O desejo que grande parte dos pacientes tem ao iniciar a reabilitação é o de voltar a sua condição física anterior, como, por exemplo, a andar e/ou movimentar os braços. Somos formados de corpo, mente e espiritualidade, e cuidar das emoções, dos sentimentos e comportamentos são vitais dentro do processo, tanto quanto a reabilitação dos aspectos físicos e funcionais. Considerando que a reabilitação é um processo interativo, cujo principal objetivo é o de conduzir a pessoa com deficiência a atingir suas melhores condições físicas, psicológicas, sociais e profissionais; é essencial torná-la capaz de integrar e participar do meio social. Dessa forma, os resultados esperados com a reabilitação são a melhora e modificações na funcionalidade, de modo que haja participação da pessoa nas diversas áreas da sua vida, como, autocuidado, mobilidade, comunicação, interrelacionamentos, educação, trabalho, lazer e qualidade de vida. Não se pode considerar uma pessoa totalmente reabilitada se não conseguir retornar à sociedade e atingir seu potencial máximo de possibilidades. Embora esses sejam os principais resultados esperados com o final do tratamento, o caminho a ser percorrido ao longo desse processo é árduo e permeado por altos e baixos. Nas últimas décadas, paciente, família e equipe tornaramse cada vez mais presentes e envolvidos na participação e tomada de decisão do processo de reabilitação. Essa tríade é fundamental para traçar os objetivos, bem como todo o plano de tratamento.
De modo geral, somos dotados de sonhos, ideias, vontades e desejos. Porém, quando ocorre a deficiência, tudo isso é interrompido (pelo menos por um período) e o primeiro momento é traumático e, muitas vezes, paralisante. A pessoa pode pensar e dizer coisas como: “Não sirvo mais para nada”, “Minha vida acabou”, ou até mesmo “Deveria ter morrido”. Essa fase requer suporte, apoio e orientações, e nesse momento começa a nossa intervenção como profissionais da psicologia. Lidar com as consequências geradas pela deficiência dependerá de fatores internos, como, crenças, valores, histórico de vida e estratégias de enfrentamento; e fatores externos, como, suporte familiar, social e rede de apoio. O ajuste psicológico inicial envolve questões ligadas à perda das mais diversas funções, como, físicas, além de mudanças de papéis sociais, compreensão de uma nova identidade, entre outros. A maneira como cada um irá se adaptar dependerá das formas como a pessoa enfrentará sua nova condição. O trabalho psicoterapêutico será o de facilitar a utilização de estratégias de enfrentamento baseada nos recursos internos (emoções, intelecto e comportamento) que são normalmente utilizados pelas pessoas diante das mais diversas situações de estresse. O papel do psicólogo na reabilitação é o de conduzir a pessoa com deficiência a entender as perdas a partir de uma nova perspectiva de construção de significado. É como se ambos, psicólogo e pessoa assistida, dessem um novo colorido à vida atual e buscassem, juntos, o equilíbrio interno em face do meio externo. Cabe aos psicólogos possibilitar à pessoa com deficiência redescobrir suas reais potencialidades, conhecer a si mesma e lidar com suas limitações, além de resgatar a autoestima, desenvolvendo a confiança em sua capacidade de encarar os desafios do dia a dia. D+
*Ana Clara Portela Hara é Coordenadora do Serviço de Psicologia do Instituto de Reabilitação Lucy Montoro – Unidade Morumbi. Psicóloga e neuropsicóloga, mestra em Distúrbios
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tecnologia assistiva
Reatech 2017: inovação, tecnologia e humanização
Os quatro dias do evento estarão repletos de atividades sociais e culturais. Test drive em carros adaptados, dicas de isenções, seminários, lançamento de produtos e até pet terapia em fazendinha prometem ganhar o público texto Audrey Scheiner
A
Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação, Inclusão e Acessibilidade, a Reatech, organizada e promovida pela empresa especializada em eventos Cipa Fiera Milano, é considerada a principal feira de tecnologia inclusiva da América Latina. Em 2017, acontecerá entre os dias 1º e 4 de junho (1º e 2 das 13h às 20h, 3 e 4 das 10h às 19h). A 15ª edição da Reatech ocorrerá nos novos pavilhões do São Paulo Expo Exhibition & Convention Center, na Rodovia dos Imigrantes, no Parque do Estado. Serão 300 expositores para um público estimado de 52 mil pessoas entre profissionais da área da saúde e educação, e também consumidores finais, que irão conferir as diversas novidades de produtos e serviços apresentados por entidades públicas e privadas, como cadeiras de rodas elétricas, aparelhos auditivos, adaptações veiculares, próteses e órteses, aparelhos ortopédicos, entre outros. Para atender às necessidades dos visitantes a Reatech 2017, terá manual em braile, piso podotátil, maior quantidade de banheiros adaptados e corredores mais largos, facilitando a visitação de todos que frequentarem o evento. Um dos maiores destaques da Reatech será a gama de palestras, debates e seminários a serem ministrados durante a feira. De acordo com Rimantas Sipas, diretor comercial da Cipa Fiera Milano, no Seminário de Tecnologia de Reabilitação e Inclusão (Reasem), serão abordados, no dia 1º de junho, os aspectos práticos da acessibilidade, inovação em tecnologia assistiva e inclusão. Já no dia 2, será apresentada a importância da tecnologia para agilizar a reabilitação. Nos dias
fotos Divulgação
3 e 4, acontece o Congresso Brasileiro de Medicina Física e Reabilitação (Reamed), que trará temas da medicina tradicional combinados com terapias complementares, focando na qualidade de vida e socialização. O Seminário de Tecnologias Avançadas em Fisioterapia (Tecfisio), no dia 3 de junho, reunirá diversos especialistas que abordarão técnicas para auxiliar no tratamento de doenças e lesões, visando a restaurar e manter as capacidades física e funcional do paciente. Com temas de interesse para o desenvolvimento de todo o mercado através de ciclo de palestras e oficinas gratuitas, representantes de empresas que trabalham a inclusão da pessoa com deficiência integram o Seminário dos Expositores (Reashow). Já as questões da terapia assistida por animais na área psicomotora serão debatidas durante o Workshop Equoterapia e Curso Pet, respectivamente nos dias 2 e 4 de junho. Qualidade ao longo dos anos Rimantas Sipas é diretor comercial da Cipa Fiera Milano desde 2014 e promove sua primeira Reatech. Ao acompanhar as mudanças do evento ao longo dos anos, o diretor enxerga um grande engajamento em relação ao público e às empresas participantes. Segundo Sipas, a consolidação da Reatech tem como principais focos a geração de negócios para o setor e ser ponto de encontro dos profissionais e visitantes de todo o país; a busca contínua pelo desenvolvimento, pela capacitação e profissionalização do setor e a crescente expansão em números de visitantes e expositores.
“A feira – que era muito pequena em sua 1ª edição – acompanhou a evolução do mercado. O aumento progressivo do número de pessoas que compram e investem em acessibilidade resultou no crescimento do evento”, afirma. Sipas também diz que a Reatech se transformou na grande vitrine da reabilitação, inclusão e acessibilidade e, a cada ano, apresenta inovações e soluções em produtos, equipamentos e serviços que refletem na melhoria da qualidade de vida e na integração social e econômica das pessoas com deficiência e mobilidade reduzida. Igualmente, o número de empresas parceiras só tem aumentado. São inúmeros os expositores que têm como objetivo receber currículos para a inserção no mercado de trabalho durante o evento, desde bancos a empresas do segmento do varejo. “A presença das pessoas com deficiência e reabilitadas no mercado de trabalho tem crescido ano a ano, recuperando a dignidade e o poder de consumo. Segundo as informações da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), em 2015, o número de empregos para
O aumento progressivo do número de pessoas que compram e investem em acessibilidade resultou no crescimento do evento Rimantas Sipas, diretor Revista D+ número 14
tecnologia assistiva
as pessoas com deficiência cresceu 5,75% em relação ao ano de 2014. Nesse aspecto, a Reatech muito contribuiu para que isso se tornasse realidade”, afirma Sipas. De acordo com o diretor da feira, sua magnitude mostrou à indústria, ao comércio e a todos os segmentos da sociedade que pessoas com deficiência são consumidoras tanto quanto ou até mais que quaisquer outras. “Isso estimulou o mercado de produtos e serviços, pois todos passaram a vê-las como potenciais consumidores, que trabalham, dirigem bons automóveis, vão ao shopping, viajam, fazem compras, pagam impostos, enfim, são consumidores plenos”. Quanto à expectativa de como será a feira, Rimantas Sipas diz que a Reatech se reafirma com o propósito de trabalhar de forma focada e objetiva pela promoção do setor, incentivando a integração, a disseminação de conhecimento e aporte de novos equipamentos e tecnologias assistivas. O grande sucesso mostra que estão no caminho certo. “A feira tem um caráter próprio, prestando um serviço à sociedade, fomentando projetos e iniciativas que promovem a inclusão social e econômica de todos. Não por acaso, se tornou o principal evento da América Latina e referência no mundo para o setor, sem precedentes no Brasil”, finaliza Sipas. A seguir, veja alguns destaques da Reatech que você poderá conhecer. Tecnologia para o mercado automotivo Reforçando a relevância do evento para o mercado automotivo e com o objetivo de ampliar e promover a acessibilidade, as mais importantes montadoras e fabricantes como Volkswagen do Brasil, GM, Honda, Ford, Fiat, Hyundai, Toyota, Nissan e Renault estarão na Reatech 2017. As marcas apresentam as tecnologias que podem ser utilizadas em prol da autonomia,
segurança e conforto da pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida. Durante todo o período, a feira contará também com espaço para test drive, em pista externa, onde as marcas promoverão seus modelos através de cadastro pré-realizado pelos visitantes. Dicas de isenções de impostos automotivos A Inova Isenções é uma empresa especializada na assessoria e elaboração de processos para órgãos públicos a fim de agilizar aquisição de veículos com as isenções de impostos destinadas às pessoas com deficiência, de acordo com o que está previsto em lei. Na feira, eles terão um estande para sanar todas as dúvidas do público. “Estamos nos preparando, com uma grande equipe envolvida em constantes treinamentos e em busca de atualizações”, diz Eder Santos, 35, diretor da empresa. Acessibilidade na cultura A Laramara, organização que visa a apoiar a inclusão educacional e social da pessoa com deficiência visual, levará para a feira produtos para leitura, como vídeo ampliadores com qualidade HD (de baixo custo) e
A magnitude da feira mostrou à indústria, ao comércio e a todos os segmentos da sociedade que pessoas com deficiência são consumidoras tanto quanto ou até mais que quaisquer outras
Reamed – Medicina Tradicional Combinada com Terapias Complementares em Prol da Qualidade de Vida e Socialização Nos dias 3 (das 10h às 19h30) e 4 de junho (das 10h às 19h) entram em debate temas como: O uso de tecnologia assistiva por idosos no Brasil; Reabilitação de pacientes pós-cirurgias ortopédicas e Recomendações aos pacientes com síndrome de Alzheimer. Reasem – Seminário de Tecnologia de Reabilitação e Inclusão No dia 1º de junho, das 9h às 18h45, o seminário reunirá especialistas com foco nos Aspectos Práticos da Acessibilidade, Inovação em Tecnologia Assistiva e Inclusão, debatendo questões como a mobilidade nas grandes cidades e a Lei da Inclusão, além de como as escolas, a família e as empresas participam desse processo. No dia 2 de junho, das 9h às 18h10, entra em pauta Por que a tecnologia é fundamental para agilizar a reabilitação?, levando ao público exemplos de inclusão de pessoas com deficiência física no mundo digital e os benefícios de outras tecnologias inovadoras, como o Dosvox e o cão-guia robô.
reprodutores de livros eletrônicos de vários formatos, como epub (abreviação de electronic publication, publicação eletrônica em formato de arquivo digital padrão específico para ebooks), Daisy, PDF, entre outros. Serão mostrados também novos projetos de desenvolvimento de tecnologia em parceria com o Instituto Tecnológico Impacta, como por exemplo, um aplicativo para ajudar no atendimento às pessoas com deficiência visual no transporte público e um leitor tátil de baixo custo. De acordo com Robert Mortimer, gestor de tecnologia assistiva da Laramara, a empresa espera mais engajamento com as pessoas na Reatech. “Esperamos um grande público, após o hiato do ano passado. Temos certeza de que as pessoas estarão ávidas por novidades. Teremos diversos produtos à venda durante a feira, com descontos. Também antecipamos que a Reatech será muito acessível a todos”. Fisioterapia Neurológica A Fundação Selma, que tem como intuito reabilitar pacientes com deficiências físicas e motoras de todas as faixas etárias, irá expor na feira as atividades da fundação, voltadas integralmente para a reabilitação e inclusão Revista D+ número 14
tecnologia assistiva
social, como, por exemplo, a fisioterapia neurológica. Para Selma Betânia Rodeguero Gonçalves, 42, diretora da organização, a feira trará “manutenção de espírito”. “Esperamos um evento em que pessoas com certas necessidades e pessoas que trabalham e se dedicam a esse setor possam encontrar semelhantes, produtos e soluções. Além disso, que as oportunidades de intercâmbio, congraçamento, novas amizades e troca de ideias sejam cada vez mais incentivadas e consolidadas”, enfatiza. Equoterapia Liana Pires Santos, 52, psicopedagoga e diretora do Gati Equoterapia e Clínica Especializada e também do Projeto Caminhar, focados na equoterapia, apresentará um seminário sobre o quanto os animais são importantes na recuperação emocional (pet terapia) e física de uma pessoa com deficiência, e sobre tecnologia assistiva. “A feira possui dois espaços interativos, um para a equoterapia, onde costumamos realizar, em três dias, de 1300 a 1400 montarias; e a fazendinha, onde apresentarei a pet terapia, que receberá um público estimado de 2000 pessoas para realizar vivências com cães, pássaros, coelhos e jabutis”, afirma a psicopedagoga. Informação Motivacional O Instituto Mara Gabrilli (IMG) abordará em sua palestra, com a Deputada Mara Gabrilli, a Lei Brasileira de Inclusão – LBI (Lei 13.146/2015), em vigor desde janeiro de 2016, considerando o Estatuto da Pessoa com Deficiência, do qual ela é relatora. Jéssica, atleta do IMG, com paraplegia, fará palestra motivacional, a exemplo do que costuma realizar no mundo corporativo, em grandes
empresas, pois a feira também é visitada por pessoas que estão deparando com uma nova realidade: a de quem adquiriu uma deficiência. Mercado de trabalho A marca Mc Donald’s terá um ambiente para tratar de assuntos relacionados ao mercado de trabalho dentro da Arcos Dourados. “Em nosso estande, teremos a chance de mostrar a imagem de melhor empregador, expandir contatos e parcerias com outras organizações que lidam com o tema. A Reatech também será uma fonte de captação de currículos para as nossas operações, dando maior visibilidade das oportunidades que temos dentro da Arcos Dourados”, afirma Vera Teixeira, consultora de Recursos Humanos da organização. D+
Revista D+ será a imprensa oficial! A Reatech escolheu a Revista D+ para fazer a cobertura oficial da feira em seus quatro dias. O portal e as mídias sociais da Revista D+ estarão repletos de reportagens, fotos e vídeos com todas as novidades da feira. Acompanhe! www.revistadmais.com.br
Serviço 15ª Reatech | Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação, Inclusão e Acessibilidade www.reatech.tmp.br Data: de 1º a 4 de junho de 2017. Quinta e sexta, das 13h às 20h e sábado e domingo, das 10h às 19h Local: São Paulo Expo Exhibition & Convention Center Endereço: Rodovia dos Imigrantes, Km 1,5 – São Paulo Transporte gratuito: Rua Nelson Fernandes, 450 – Acesso pelo Terminal Rodoviário Jabaquara * Evento gratuito para profissionais do setor
Terceira Idade
Envelhecimento:
um olhar para a pessoa com deficiência intelectual Departamento especializado na Apae de São Paulo se debruça sobre o tema que, além de real e urgente, demanda um novo comportamento da sociedade texto Rosa Buccino fotos Divulgação
A
s pessoas com deficiência intelectual estão preparadas para envelhecer? Esse questionamento, entre tantos outros que afloram na sociedade brasileira, também conquistam mais espaço na área acadêmica, abrindo um novo ciclo de reflexões e discussões acerca da longevidade. Sobre esse momento, Valquíria Ribeiro Barbosa, gerente de serviços socioassistenciais da Associação de Pais Amigos dos Excepcionais (Apae) de São Paulo, afirma que, há uma década, quando ainda se falava pouco sobre o envelhecimento populacional no Brasil, a associação já estava atenta a essa temática através de estudos realizados pelo Instituto de Ensino e Pesquisa Apae de São Paulo, nas áreas científica e educacional. O Departamento de Envelhecimento atende, hoje, 134 idosos inseridos no Projeto Terapêutico Singular (PTS), com a promoção de oficinas pela interação e desenvolvimento cognitivo dos participantes. Em 2015, por exemplo, foram atendidas 121 pessoas com deficiência intelectual, sendo
que 80% delas obtiveram ganhos ou mantiveram a avaliação de suas funcionalidades. Leila Castro, supervisora do Departamento de Envelhecimento, durante a I Jornada Científica, organizada na sede da Apae de São Paulo, no final de 2016, apresentou Contribuições Científicas para o Envelhecimento da Pessoa com Deficiência Intelectual, destacando que muitas questões antes deixadas de lado, até por falta de conhecimento, condições e acessibilidade, estão chamando atenção da sociedade, inclusive dos familiares dos idosos com deficiência intelectual. Nesse contexto, segundo ela, o PTS tem papel fundamental, pois realiza a chamada Avaliação Multidimensional ou Avaliação Geriátrica Ampla (AGA), que é um instrumento que identifica os problemas mais prevalentes na população idosa, de ordem física, social e funcional, através da aplicação de escalas e avaliação multiprofissional. A AGA também permite a elaboração do planejamento de vida mais direcionado e com o objetivo de amenizar
Pessoas idosas com deficiência intelectual nas diversas atividades da Apae
incapacidades de ordem de saúde, ampliar seu repertório social e melhorar a qualidade de vida. Claudia Lopes, fonoaudióloga do Departamento de Envelhecimento, apresentou Projeto Terapêutico Singular (PTS) no Envelhecimento da Pessoa com Deficiência Intelectual: a Efetividade de uma equipe Multidisciplinar, onde mencionou etapas do PTS, como diagnóstico, definição de metas, divisão de responsabilidade e monitoramento de ações. Destacou também a importância do planejamento de vida, que propõe orientações e acompanhamento de saúde, questões familiares e inclusão. Vale ressaltar que essas ações têm caráter de curto, médio e longo prazo, são construídas e discutidas com o familiar e/ou cuidador, a pessoa com deficiência intelectual atendida e toda a equipe que, inclusive, se incumbe do monitoramento realizado periodicamente.
Envolvimento que gera resultado Por esse comprometimento, é fato que o instituto tem colhido resultados positivos. A disseminação de conteúdo em palestras ou bibliografia específica, a participação em congressos estaduais de relevância e o comprometimento de educadores, pesquisadores e profissionais que abraçam essa causa também integram os avanços do Departamento de Envelhecimento. Falando em conteúdo, o livro
Envelhecimento e Deficiência Intelectual: Uma Emergência Silenciosa, com coordenação editorial de Cynthia Helena Merlin e organização de Laura Maria de Figueiredo Ferreira Guilhoto, assessora científica do mesmo instituto, é referencial de peso para quem busca esclarecer dúvidas e compreender que o momento é igualmente oportuno para que órgãos públicos, instituições, empresas, familiares e a sociedade em geral despertem e se manifestem em favor dessas pessoas assistidas pelo Departamento de Envelhecimento. Segundo o livro, “Um número significativo de pessoas com deficiência intelectual tem envelhecido e a expectativa de vida para elas, que era de 20 anos em 1930, é, hoje, quase a mesma que o restante da população, em torno de 75 anos. Assim, os profissionais envolvidos no cuidado desses idosos precisam visionar o futuro, pensando em ações sólidas”. Outra questão importantíssima diz respeito ao fato dessa população apresentar dupla vulnerabilidade, fazendo com que necessitem de cuidados especiais e sistemáticos. Respeito e garantia do direito à cidadania são outras abordagens no livro. Nesse contexto, surpreende o fato de que a pessoa idosa com deficiência intelectual desconheça que tem direitos adquiridos nas áreas de educação, saúde, transporte e empregabilidade. D+
Práticas na Educação Inclusiva
O trabalho com projetos didáticos Para que eles cumpram a sua finalidade é fundamental que sejam contextualizados e significativos para a turma texto Silvana Zajac* fotos Shutterstock
Planejamento: alguns aspectos importantes Existem alguns aspectos importantes que não podem deixar de ser levados em consideração no momento do seu planejamento. São eles: Objetivos: devem ser definidos para atender às necessidades de aprendizagem da turma, podem ter um cunho mais geral e/ou mais específico e devem contemplar os propósitos comunicativos e sociais do projeto. Conteúdos: precisam ser escolhidos de acordo com o tempo e os objetivos de aprendizagem traçados para o projeto. Tema: precisa ser delimitado de forma que alie os propósitos didáticos, comunicativos e sociais. Para isso, é importante que o professor conheça bem o assunto que será estudado e desenvolvido no projeto. Tempo: é importante que seja organizado um cronograma com prazos estimados para cada etapa e atividade que compõe o trabalho.
O
trabalho com projetos é uma estratégia que ainda desafia muito os professores. Contudo, é um excelente meio para transformar as práticas educativas na sala de aula e na escola. Para que eles cumpram a sua finalidade é fundamental que sejam contextualizados e significativos para a turma, ou seja, precisam possibilitar maior envolvimento dos alunos nas atividades, dar mais sentido às tarefas realizadas na sala de aula, propor desafios, orientar as formas de avaliação, entre outros. A autora e pesquisadora Delia Lerner diz que o projeto é uma modalidade organizativa do tempo e conteúdos escolares, que articula propósitos didáticos, comunicativos e sociais em torno de um produto final com o objetivo de que os conhecimentos escolares adquiram maior sentido, tendo como perspectiva a função social do ensino e as práticas sociais. Assim, flexibilidade quanto à forma, forte protagonismo e desafios colocados aos professores e alunos na construção de um produto final compartilhado por todos são características elementares na hora de eleger o projeto como uma modalidade organizativa que contribui no planejamento, nas intervenções didáticas, na organização dos conteúdos de aprendizagem e principalmente na reflexão sobre eles. Dentre as diversas modalidades organizativas (atividades permanentes, planos de aula, sequências didáticas, oficinas), os projetos possuem uma estrutura que pode ser organizada de diferentes maneiras.
Materiais: devem ser elencados previamente para que a dinâmica do processo não seja afetada pela falta de recursos. Planejamento: para que o projeto seja desafiador e produza aprendizagem, suas etapas precisam ser organizadas de uma forma que se relacionem e desenvolvam uma complexidade progressiva sobre o objeto de aprendizagem. Produto final: é o resultado da articulação dos propósitos didáticos, comunicativos e sociais. Ele norteará o projeto, será a alavanca propulsora e o “combustível” para que os protagonistas desenvolvam conhecimentos contextualizados e significativos. Avaliação: precisa ser realizada no processo de desenvolvimento do projeto e no seu final. Para isso, há necessidade de se prever critérios que avaliem não só a participação e a aprendizagem dos alunos, mas também, a ação de todos os envolvidos no trabalho. A criação de atividades que sirvam de instrumentos de avaliação e o registro das observações do professor são imprescindíveis para analisar os benefícios e as fragilidades da proposta.
Revista D+ nĂşmero 14
ENTREVISTA Práticas na Educação Inclusiva BOAS SITUAÇÕES DE APRENDIZAGEM É importante que a proposta seja apresentada aos alunos de forma clara, deixando explícito os objetivos sociais do trabalho, as etapas a serem seguidas e qual será o produto final. A cada etapa finalizada é importante retomar o cronograma do projeto com os alunos, situá-los e rever as atividades da etapa seguinte. O professor deve planejar antecipadamente quais perguntas fará para encaminhar as atividades, lembrando que estas devem ser desafiadoras para que o aluno seja beneficiado com uma maior possibilidade de aprendizagem, bem como que se propicie o levantamento de conhecimentos prévios sobre o conteúdo a ser trabalhado. É fundamental lembrar que atividades em grupo são muito bem vindas no decorrer das etapas do projeto. Contudo, os agrupamentos devem contemplar alunos com diferentes níveis de aprendizagem para que as interações sejam produtivas. Isso não significa que em alguns momentos não poderão ser realizadas atividades em duplas ou individualmente. Para que o projeto didático ofereça boas situações de aprendizagem, Telma Weisz propõe alguns princípios didáticos que precisam ser observados no momento do planejamento
das atividades desenvolvidas em cada etapa. São eles: • Os alunos precisam pôr em jogo tudo o que sabem e pensam sobre o conteúdo que se quer ensinar; • Os alunos têm problemas a resolver e decisões a tomar em função do que se propõem produzir; • A organização da tarefa pelo professor garante a máxima circulação de informação possível; • O conteúdo trabalhado mantém as suas características de objeto sociocultural real, sem se transformar em objeto escolar vazio de significado social. Concluindo, é importante frisar que na escola que também atende alunos com necessidades educativas especiais é premente que o trabalho com projetos seja intensificado. Isso porque essa modalidade facilita a interação com os diversos alunos, podendo potencializar a aprendizagem de todo o grupo. Nas próximas edições da Revista D+ continuaremos abordando temas relacionados ao trabalho com projetos na educação inclusiva. D+ * Silvana Zajac é professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Depto. Ciências Exatas e da Terra, doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (LAEL/PUCSP) e mestra em Educação (Unimep)
Saiba mais: WEISZ, Telma. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. São Paulo: Ática, 1999. Lerner, Delia. Ler e escrever na escola – O real, o possível e o necessário. Porto Alegre: Editora Artmed; 2002.
aprenda libras
T
por Célio da Conceição Santana e Joice Alves de Sá ilustrações Luis Filipe Rosa
Aprenda os sinais de profissões
er uma profissão é uma realização pessoal, pois muitas vezes é um sonho que vem da infância. Trabalhar com o que se gosta é algo muito importante para conseguir desenvolver bons resultados e assim levar uma vida mais leve e feliz dentro e fora do ambiente de trabalho. Nesta edição, trazemos sinais de várias profissões. A sua está representada aqui? Então compartilhe em Libras e ensine também seus colegas de trabalho. D+
enfermeira
policial
juiz
médico
enfermeiro
jornalista
pintor
motorista
professor
piscicólogo
diretor
secretária
vendedor
Erramos Na edição 13, as ilustrações dos sinais de apontador e de lápis foram publicados com pequeno erro. Abaixo, publicamos as ilustrações corretas:
apontador
lápis
Revista D+ número 11
ESPAÇO DO TILS (Tradutor/intérprete de Língua de Sinais)
Competência interpretativa
J
Silvana Zajac
Professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (LAEL/ PUCSP), mestra em Educação (Unimep) e bacharelada em Letras/Libras (UFSC/Unicamp)
* Para participar com perguntas e sugestões, escreva para silzajac@revistadmais.com.br
á vimos, em diversas edições da Revista D+, o quão importante é o desenvolvimento de competências para o exercício da profissão de tradutor/intérprete de língua de sinais. Das várias habilidades exigidas de um Tils, há uma essencial: o conhecimento que o tradutor/intérprete precisa ter sobre as línguas envolvidas no ato da tradução/interpretação, chamada competência linguística. Contudo, para se estabelecer uma boa dinâmica de tradução/interpretação entre duas línguas é necessário compreender a ideia do texto de forma mais clara e completa possível, tendo um entendimento objetivo dos fatos que a compõem. Para isso, é preciso recriar e reestruturar as ideias nas formas que a língua para a qual se traduz/interpreta oferece, levando também em consideração, a ótica da cultura ligada a essa língua e suas especificidades. O escritor e tradutor José Francisco Botelho diz que a “tradução pega o que há de estranho e único em determinada língua e tenta recriar essa estranheza em outra; assim o estranho se torna familiar e o familiar, estranho; nesse jogo de estranhamento e reconhecimento, as línguas se contaminam e se enriquecem mutuamente”. No entanto, muitas vezes, a
dificuldade que se tem no ato da tradução/interpretação não está na limitação do Tradutor/intérprete, mas sim na falta de clareza do texto fonte. Nesses casos, cabe ao Tils interpretar aquilo que o autor teve a intenção de expressar. E isso não é tarefa fácil! É aqui que surge o que vou chamar de competência interpretativa. Esta requer um maior grau de intervenção do tradutor/intérprete e, consequentemente, exige maiores qualificações desse profissional, cujo papel passa a ter maior carga de responsabilidade. Não obstante, o grau de intervenção do Tils pode surtir diferentes resultados. Por um lado pode se tornar perigoso, no sentido de produzir interpretações equivocadas, por outro, pode trazer bons resultados, no sentido de ter a liberdade de fazer um diagnóstico do texto original, podendo reparar as possíveis falhas de produção. Isso porque as dificuldades encontradas pelo Tils poderão ser as mesmas encontradas pelos interlocutores do texto original. Assim, pensando no contexto exposto acima, no aprofundamento de conteúdos e conceitos da área e buscando maior amplitude e alcance dos textos, a partir das próximas edições da Revista D+, traremos novidades em relação ao conteúdo e articulista desta seção. D+
Universo Cultural Os atores Marat Descartes e Maria Galant nos papéis de Ruben e Nalu: relação de pai e filha interrompida pela cegueira repentina e pelos cuidados excessivos da mãe
Ruben redescobre o contato com o mundo à sua volta a partir das experiências com sua filha adolescente
Toque e pele: limite de espaços Longa-metragem Mulher do Pai aborda questões de deficiência visual a partir da construção de relação familiar entrevistas e texto: Mayra Ribeiro
D
elicadeza, sensibilidade e descobrimento de novos horizontes são características marcantes no enredo de Mulher do Pai. O longa-metragem, criado pela diretora Cristiane Oliveira e que estará nas telas de cinema no primeiro semestre de 2017, aborda o cotidiano de uma pessoa com deficiência visual que de repente depara com a necessidade de construir uma relação familiar de confiança até então inexistente, mas, cuidadosa para não exceder limites. Nos últimos anos, a relação de Ruben e Nalu - os atores Marat Descartes e Maria Galant - não tem sido como deveria: de pai e filha. Em sua juventude, o desenhista, que adorava pintar e desenhar, perde totalmente a visão de forma repentina. A partir desse acontecimento, Ruben passa a receber cuidados da mãe, que também exerce um papel materno sobre Nalu. Essa relação prejudicada entre pai e filha acaba ganhando uma reviravolta com a morte da mãe do deficiente visual. Nesse momento, Nalu e Ruben percebem a necessidade do desenvolvimento de uma relação mais próxima inicialmente regada à dependência, o que gera na adolescente de 16 anos o conflito de desejar sair da vila interiorana dos Pampas para conhecer o mundo e, ao mesmo tempo, precisar permanecer no local para dar assistência ao pai. Ao longo da trama, o público pode esperar o aparecimento de uma terceira pessoa que ganhará espaço no cotidiano de ambos, transformando-se em motivo de conflitos. Outro aspecto presente no drama são as barreiras. A produção que retrata um limite geográfico ao se passar entre a divisão territorial do Brasil com o Uruguai também aborda barreiras entre o espaço interno e externo. “Em um filme que fala sobre toque, a pele apresenta-se como uma fronteira entre o interior e o exterior, o que faz surgir um limite de imposição entre duas pessoas. A história trata de fronteiras reais e das que construímos para nós mesmos”, afirma Cristiane Oliveira, diretora de Mulher do Pai.
“Em Mulher do Pai, a intimidade forçada que surge de forma repentina, transforma-se em interesse quando, a partir das experiências de Nalu, Ruben redescobre o contato com o mundo à sua volta. A partir de então, pai e filha deverão aprender a ter uma relação que respeite os limites de espaço do outro”, explica Cristiane. A ficção foi inspirada na vida da diretora, que durante a adolescência teve uma reconciliação com o pai. Por sua vez, os personagens ganharam forma em 2004 a partir do primeiro curta-metragem dirigido por Cristiane. Messalina retrata uma jovem com deficiência visual. Esse contato com o universo dos cegos despertou o interesse da diretora para essa realidade. Ao ser indagada sobre a influência do filme na maneira em que enxerga uma pessoa com deficiência visual, Cristiane diz que passou a prestar mais atenção em todos os outros sentidos e aprendeu a não se levar tanto pela visão. “No caso específico do filme, vejo Ruben como aquele que fica mais em casa, com alguém da família. Esse personagem representa o que eu já ouvi chamarem de ‘cego guardado’. Mas, percebi que não é um problema pessoal, e sim político e social. As cidades do interior não recebem tantos cuidados de acessibilidade e inclusão quanto as capitais”. Mulher do Pai tem classificação indicativa para maiores de 14 anos, sendo uma coprodução Brasil-Uruguai com equipe fixa de aproximadamente 35 colaboradores e um investimento em torno de um milhão e seiscentos mil reais.
As cidades do interior não recebem tantos cuidados de acessibilidade e inclusão quanto as capitais Cristiane Oliveira, diretora do filme Revista D+ número 14
Universo Cultural
Cidadão sim, invisível não! “Eu estava descendo a rua e no caminho tinha uma criança com uma bengala. De repente, uma jovem que estava passando soltou sem querer: Nossa, o que é isso? Quer dizer, é uma menina que talvez nunca tenha visto alguém com deficiência visual. Não soube nem identificar que o objeto que estava com a criança era uma bengala”. Esse é o relato de um fato cotidiano de Cecília Oka, coordenadora do Programa do Jovem e Adulto e membro da gestão técnica do Instituto Laramara. De acordo com Cecília, o movimento da pessoa com deficiência visual propaga o ato de sair da invisibilidade social para tornar-se cidadão. Nessa causa, o auxílio da arte e da cultura é de extrema importância. “Os projetos artísticos e culturais conseguem alcançar um número maior de pessoas. Então, podem ser um recurso para levar informações educativas sobre o cego. Outra questão é que ao abrir um espaço para a discussão do tema, a arte e a cultura permitem o surgimento da empatia. Às vezes, quando entramos em contato com uma realidade, é mais fácil de nos colocarmos no lugar dela”. Além de comentar sobre a falta de sensibilidade da sociedade perante os cegos, a coordenadora também destaca um fator que precisa de atenção: as barreiras. “Buracos e falta de rampas existem, mas, não são os únicos obstáculos enfrentados pelo deficiente visual. Na verdade, as primeiras barreiras encontradas são as de atitudes. É necessária uma modificação, pois essa situação pode ser um impedimento para a mudança social”. Voltado para o desenvolvimento integral da pessoa com deficiência visual, o Instituto atualmente tem 293 colaboradores e atua gratuitamente na capital paulista há 25 anos com projetos que vão desde recém-nascidos a idosos. Mais informações podem ser encontradas em www.laramara.org.br.
Cristiane Oliveira nos bastidores: a diretora, que teve uma reconciliação com o pai na adolescência, inspirou-se em sua própria vida para compor o longa-metragem
Sou cego. E agora? Tato e audição foram os grandes aliados de Marat Descartes durante um ano e cinco meses de filmagens em que o ator enfrentou o desafio de interpretar uma pessoa com deficiência visual tendo ele o sentido da visão em perfeito estado. “Minha maior dificuldade foi a questão do olhar, eu queria passar veracidade. Entretanto, essa preocupação se resolveu ao longo das filmagens com o auxílio do posicionamento das câmeras e às vezes de um pequeno método no qual eu me concentrava em pontinhos do meu globo ocular”, revela Descartes. No processo de construção do personagem, o ator primeiramente usou venda nas ruas e em atividades do cotidiano. Em seguida, fez aulas de cerâmica com olhos tampados com um escultor de baixa visão do Instituto Laramara, localizado em São Paulo. D+
Os projetos artísticos e culturais são um recurso para levar informações educativas sobre o cego e permitem o surgimento da empatia Cecília Oka, membro da gestão técnica do Instituto Laramara
CEREJA!
Make do bem texto Brenda Cruz
“A
fotos: Celina Germer
maquiagem deixa a mulher mais bonita, mais realizada. Me deu uma autoestima muito grande! Eu me senti mais sensual, mais mulher, mais amada, as pessoas me olham diferente. Agora eu uso para causar impacto, pois as pessoas estavam acostumadas a me ver somente de óculos escuros, e com a maquiagem eu fico diferente. Sou muito mais feliz depois do curso”, revelou Geisa Sousa Santos, 38 anos, massoterapeuta, há 11 anos na Laramara – Associação Brasileira de Assistência à Pessoa com Deficiência Visual, onde faz aulas de musicalização e cidadania, além do voluntariado. Geisa conta que antes não achava a maquiagem importante, mas depois do curso percebeu que faz, sim, diferença. O curso de automaquiagem na Laramara está indo para sua terceira turma no mês de maio, partiu dos pedidos das próprias usuárias da associação, que convidou Chloé Gaya, maquiadora e consultora de imagem do salão de beleza Jacques Janine, para ministrar o curso para as mulheres com deficiência visual. “Além da dificuldade delas em encontrarem aulas na área, a ideia surgiu como uma oportunidade de elevar a autoestima dessas mulheres e proporcionar autonomia suficiente para se maquiarem sozinhas no dia a dia”, conta Chloé. Arlete Reis de Santana, 42 anos, é professora aposentada, participa da associação há três anos e também fez o curso ministrado por Chloé. “Foi muito significativo, através do curso voltamos a nos sentir belas, pois a partir do momento que se perde a visão, você se sente um patinho
feio, uma pessoa que ninguém vai olhar. Depois dele, eu me tornei uma nova mulher, eu não enxergo os detalhes do meu rosto, mas eu sento na frente do espelho e me maquio. O curso faz as mulheres renascerem, aprenderem a se valorizar, pois só assim a vida se torna melhor”, conta a aluna. Durante os cinco encontros, de duas horas cada, Chloé e sua equipe de maquiadoras ensinam técnicas desde o preparo da pele até uma maquiagem completa. “Levo comigo uma equipe de maquiadoras, para que a cada dupla tenha uma monitora. Esse formato é muito importante, já que elas têm dificuldades e vivências diferentes com a maquiagem. O meu objetivo é que saiam com dicas especiais para valorizarem as suas principais características e que se sintam confiantes para reproduzirem sozinhas”, conta a maquiadora. Todas as alunas, ao final do curso, recebem um kit de maquiagem da marca Vult, que desde o início se colocou à frente como parceira do projeto. “Ao formatar a didática do curso, percebemos que seria interessante que todas as alunas tivessem o mesmo material, dessa forma seria mais fácil descrever cada produto e como aplicá-los. Nesse momento a Vult entrou como colaboradora, fornecendo kits de maquiagem para que elas usassem tanto durante as aulas quanto em casa.” As interessadas podem procurar a instituição e deixar o nome na lista de espera para a formação de futuras turmas. A Laramara fica na Rua Conselheiro Brotero, 341, Barra Funda, São Paulo. Conheça mais em: www.laramara.org.br. D+
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