Revista D + edição 21

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Referência em Inclusão e Acessibilidade

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NÚMERO 21 • PR EÇ O R$ 13,90 ISSN 2359-5620

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Rogerinho, 38 anos, astro da Seleção Brasileira de Futebol para Amputados

PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Alguns desafios sobre ensino de leitura e escrita para alunos surdos

DENÚNCIA

Relatório da Human Rights Watch denuncia maus tratos a pessoas com deficiência em abrigos

SURDEZ E EDUCAÇÃO As concepções sobre os surdos influenciam as políticas públicas para a sua educação

O BRASIL É UMA POTÊNCIA NO FUTEBOL CONVENCIONAL E NO PARADESPORTO






NA REDE

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PSIQUE

Meu filho tem deficiência. Devo superprotegê-lo? por Michele Joia *

A

s crianças com deficiências, sejam físicas ou intelectuais, hoje não estão mais escondidas... convivem na sociedade e muitas pessoas ainda não sabem lidar com a dificuldade comunicativa que elas têm. Quando falamos dos pequenos com deficiência, precisamos entender que o ambiente não será facilitador para eles, que as trocas sociais não serão as mesmas que realizamos em casa, que o mundo lá fora não é tão aceitável para as condutas determinantes de um comportamento além do esperado e não suporta uma frustração. Frequentemente ouvimos de pessoas desinformadas sobre o assunto, ou até familiares que não entendem como a vivência em sociedade fará bem à criança, dizerem: “Não faz isso com ele, não, o menino tem problema!” Mal sabem essas pessoas que a superproteção acaba por dificultar a autonomia e a interação com seus pares. Quando um responsável superprotege seu filho, está inibindo questões emocionais diversas, que serão necessárias para o desenvolvimento pessoal da criança, tais como: aceitar frustrações de maneira adequada, ter autonomia para atos pessoais, saber diferenciar dor, medo, ciúme entre outros sentimentos, entender o outro, aprender a se defender e muito mais. A superproteção não é a melhor das soluções em nenhuma situação! O nascimento de um filho com deficiência cria muitas expectativas negativas, que não existiam antes do nascimento, pois o filho desejado está longe disso. Após o momento do luto de um filho desejado e o nascimento de um filho com deficiência, a mãe, principalmente, necessita

quebrar os laços com tudo aquilo que desenhou em sua mente. Mas aí é que está a mágica das coisas, quando os pais entendem as limitações e capacidades de seu filho, respeitam e colocam em prática uma formação de valores, em que ele aprenda por meio da prática e consiga criar mecanismos para ter autonomia. Isso vai muito além do que esperamos. É importante citar que criança com deficiência não é sinônimo de desqualificação, apenas uma característica que impõe certas limitações. Mas nossas crianças chegarão onde desejarem, basta entender até onde podemos guiá-las, que o mundo não será tão cor-de-rosa como a nossa casa e que lá fora as pessoas podem não ser tão legais. Basta acreditar e ter coragem de enfrentar. Quando a superproteção toma conta da criação de uma criança, ali naquele ambiente não há só pena do indivíduo, mas há também medo do que vão pensar, medo de como agir de maneira correta. Lembrem-se, pais: não há manual para criar filhos, sejam com deficiência ou não. Existe, sim, a forma mais correta de educar: com afeto, a partir dessa atuação, até o “não” fica fácil de ouvir, até quando cair e chorar, a facilidade de se levantar será maior. Ou seja, o carinho é melhor que a superproteção. Isso levará o seu filho a agir como um cidadão que faz parte da sociedade ativamente e cria vínculos sadios, além de conseguir passar por situações inesperadas e/ou negativas. Prepará-lo para lidar com o mundo não é impossível, é necessário.

*Michele Joia é autora do livro A Inclusão de Crianças na Escola (Wak Editora). Educadora Especial, Pedagoga e Psicopedagoga.

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PONTO DE VISTA

Mobilidade Urbana e Cidade Acessível: uma questão de atitude

Monica Lupatin Cavenaghi

Monica Lupatin Cavenaghi é administradora de empresas e empresária, diretora comercial da Cavenaghi e Vice-presidente da Abridef, Associação Brasileira da Indústria, Comércio e Serviço de Tecnologia Assistiva.

“Era um ensolarado dia de verão quando Marina conheceu Fernando. Homem lindo, dono de um largo sorriso e absolutamente gentil e delicado, Fernando conquistou rapidamente o coração de Marina, que havia tempos não batia assim por alguém. Foram necessários poucos dias para que o desejo de se encontrarem mais e mais crescesse, como tinha de ser. Afinal, assim são as coisas do coração. Insondáveis e incompreensíveis. Intensas e avassaladoras.”

Q

ual a sua expectativa para a continuidade desse conto? O que você deseja à Marina e Fernando? Imagino que, assim como eu, você almeja que se encontrem mais e mais e, se encontrando, deparem com tudo aquilo que o amor traz de extraordinário. Mas, e se considerarmos que Fernando é paraplégico, o que muda? “Nada”, provavelmente você dirá! Sim, de fato nada muda entre o amor e as possibilidades de felicidade deste casal. Contudo, há de se considerar que eles poderão ser privados de várias experiências se a sociedade não lhes for generosa e se a cidade onde vivem não for acessível. É nesse contexto inclusivo e completo que precisamos pensar em mobilidade urbana. Antes de mais nada é preciso entender o conceito: mobilidade urbana é a reunião das formas e meios utilizados pela população para se deslocar dentro do espaço urbano. E aqui, para que a história de Marina e Fernando se desenrole como imaginamos, há dois fatores importantíssimos a serem superados. O primeiro deles é a inclusão do tema mobilidade nas políticas públicas, englobando aí o planejamento e a implementação de ações que melhorem a acessibilidade e a mobilidade de pessoas e cargas nas cidades e, com isso, integrem diferentes meios de transporte. Notem que, por enquanto, não estamos falando de acessibilidade para pessoas com deficiências. Embora sem muitos resultados práticos, o Brasil tem desde 2012 uma Política Nacional de Mobilidade Urbana, cuja aplicabilidade deveria ser obrigatória para cidades com mais de 20 mil habitantes. A determinação inicial era que, até 2015, todas as cidades com esse perfil deveriam contar com um plano de acessibilidade urbana que melhorasse o deslocamento das pessoas, integrasse diferentes meios de transporte e estabelecesse um preço acessível para as tarifas destes. Acontece que, até o final de 2015, apenas 5% das prefeituras brasileiras prepararam seus planos e o prazo foi prorrogado para 2018. Ou seja, para que a história de Marina e Fernando continue


Monica Cavenaghi: “pensar em mobilidade urbana é pensar, antes de tudo, em todos.”

como imaginamos, é preciso, primeiro, que essa lei seja cumprida. Falando em lei, se levarmos em conta que Fernando é paraplégico, é preciso que outra também seja cumprida. O artigo 46 da Lei Brasileira de Inclusão (LBI), promulgada em 2015, prevê que “o direito ao transporte e à mobilidade da pessoa com deficiência será assegurado em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, por meio da identificação e eliminação de obstáculos e barreiras ao seu acesso”. E não se trata apenas de garantir a oferta de veículos adaptados. Em São Paulo, por exemplo, a SPTrans informa que mais de 50% de sua frota de ônibus e micro-ônibus é adaptada para cadeirantes. Se vivesse em São Paulo, Fernando teria transporte público, mas enfrentaria uma dificuldade enorme para conseguir chegar a um ponto de ônibus, isso por conta de calçadas esburacadas, meio-fio sem rampas, postes mal colocados e uma série de outras barreiras e obstáculos que, ao contrário do que prevê a LBI, não foram identificados e eliminados. Enfim, pensar em mobilidade é pensar, antes de mais nada, em todos. Temos que ter vagas acessíveis, mas também garantir o acesso a elas, como passo inicial. Mais que leis, é preciso que compreendamos a beleza do conceito “desenho universal”, em que tudo é desenhado para todos, incluindo aí o passeio público, as vias, os semáforos, o transporte coletivo, os táxis, os estabelecimentos comerciais etc. Muito mais inteligente do que uma escada

com uma rampinha ao lado é pensar numa rampa espaçosa, por onde todos passem; é pensar em calçadas sem meio-fio; é pensar em portas amplas e banheiros acessíveis. Tudo mais inclusivo, mais inteligente e mais racional. Planejar nossas cidades dessa forma seria bom para a Marina, para o Fernando e para toda a sociedade. Claro que há conquistas e que avançamos muito nos últimos 30 anos, mas ainda há uma distância enorme entre o existente e o ideal. Para cumprir esse trajeto, é preciso buscar o que entendemos ser justo e necessário para todos e isso exige uma nova atitude, mais positiva. De todos. Acredito muito mais num bar que provê acesso a partir do desejo genuíno de atender melhor a seus simpáticos e festivos clientes cadeirantes, do que em comerciantes que providenciam uma rampa “de mau jeito” apenas porque a legislação determina. Com mais atitudes como essa, a história de Marina e Fernando poderia terminar assim, da forma como todos desejamos: “Marina e Fernando encontraram-se muitas e muitas vezes. Almoços apressados em meio à exaustiva rotina de trabalho, em busca de um beijo roubado. Passeios de mãos dadas pelo parque. Sessões de cinema sem assistir ao filme. Tudo era motivo de encantamento. Tudo os fazia felizes, desde uma pizza na casa dos tantos amigos, até um jantar à luz de velas no melhor restaurante da cidade, afinal, Fernando e Marina haviam encontrado um ao outro. Haviam encontrado o amor.” D+ Revista D+ número 21


MISTO QUENTE por Paulo Kehdi fotos Divulgação

NO TOPO! “Alpinistas encontram condições climáticas severas em algumas escaladas”

“Xia Boyu durante escalada. Sonho de alcançar o topo do Everest virou realidade”

Após várias tentativas, o alpinista chinês Xia Boyu, 69 anos, amputado das duas pernas, completou no dia 14 de maio seu sonho de alcançar o cume do Everest, localizado a 8.848 metros de altitude. A primeira das tentativas, em 1975, foi responsável pela amputação das pernas. Xia fez parte da equipe chinesa que, naquele ano, sofreu uma tempestade no topo. Faltando oxigênio e exposto a temperaturas polares, o alpinista sofreu um congelamento severo e perdeu os pés.

Suas duas pernas tiveram de ser amputadas em 1996, logo abaixo do joelho, depois que os médicos descobriram um linfoma, uma espécie de câncer encontrado no sangue. Em 2017, o Nepal proibiu a escalada da montanha por pessoas duplamente amputadas e cegas, pondo em risco seu sonho. Mas a decisão foi revertida e Boyu se torna o segundo duplo amputado a conseguir tal feito. Antes dele, apenas o neozelandês Mark Inglis, em 2006, conseguiu a façanha. D+


EXEMPLO

Desde maio, o canal Futura começou a exibir, semanalmente, uma prática de educação física inclusiva adotada por escolas públicas brasileiras participantes do projeto “Portas abertas para a inclusão”. O projeto nasceu graças à parceria entre o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a Fundação FC Barcelona e o Instituto Rodrigo Mendes (IRM) com o objetivo de promover a inclusão de meninos e meninas com deficiência na escola regular por meio de práticas esportivas seguras. Os 24 vídeos da coleção estão sendo exibidos pelo Futura, sendo um diferente a cada semana, até 30 de julho. Todos possuem recursos de acessibilidade com audiodescrição, legenda e janela com tradução em Língua Brasileira de Sinais (Libras). D+

“Crianças na escola. Inclusão por meio de práticas esportivas”

Revista D+ número 21


MISTO QUENTE por Brenda Cruz fotos Arquivo Pessoal

SONHO E OPORTUNIDADE Apaixonado por games, o estudante de Desenvolvimento de Sistemas Diogo Alves da Silva, de 22 anos, já esteve nas páginas da Revista D+, edição 14, contando um pouquinho da sua história e seu amor pelos games. Ele volta agora com novidades. O jovem, que nasceu sem os dois braços, além de manter seu canal no Youtube, chamado Quem não tem mão, faz com o pé, também joga pelo canal exclusivo para games na Plataforma Twitch, chamado Jogo Com Pé Oficial. “São vários jogos lá no canal, mas meu foco principal é o Fifa 18, um simulador de futebol”, conta. Diogo está fazendo uma vaquinha online para participar da BGS, maior feira de games da América Latina, que acontecerá de 10 a 14 de outubro desse ano em São Paulo. Ele, que mora no Rio de Janeiro, precisa custear passagem

e hospedagem em São Paulo nos dias da feira. “Além de ser uma excelente oportunidade para aprender novas tecnologias e conhecer um pouco dos bastidores dos atuais lançamentos no mundo dos games, a feira pode abrir portas para o meu futuro profissional, já que sou da área de desenvolvimento de sistemas em geral”, explica. Sobre as expectativas da edição que acontecerá em outubro, Diogo quer conhecer as novidades nas plataformas de computador, console, móbile, realidade virtual (VR). “Na verdade, estou na expectativa, principalmente, de conhecer mais de perto os games em realidade virtual/ realidade aumentada. Acho uma tecnologia espetacular que, sem sombra de dúvidas, tomará conta dos games em várias plataformas em um futuro breve”, aposta. A presença de uma figura tão li-

gada a essa área, com deficiência, é uma ótima oportunidade para que novas demandas de acessibilidade sejam pensadas. “Acho que posso colaborar com as minhas experiências e com as formas como faço as coisas. Por exemplo, jogar vídeo-game. Felizmente, estamos vivendo um momento em que a inclusão da pessoa com deficiência está cada vez mais latente na sociedade. Temos vários exemplos de empresas que pensam na inclusão, como a Microsoft, que lançou um controle específico do seu console Xbox para pessoas que têm deficiência”, ressalta o gamer. Para doar, as pessoas podem acessar o link da vaquinha online no link: streamlabs.com/jogocompeoficial ou enviando um e-mail para diogoalvespecontato@gmail.com, pelo qual serão disponibilizados os dados de conta bancária. D+


ELEITA A deputada federal Mara Gabrilli será um dos novos integrantes do Comitê da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), no período 2019/2022. A votação ocorreu no dia 12 de junho, durante a 11ª Conferência dos Estados Partes da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, em Nova Iorque (EUA). É a primeira vez que um representante brasileiro integrará o CDPD. Responsável por monitorar a implementação da Convenção, o Comitê reúne 18 membros de diferentes países, peritos na temática da pessoa com deficiência. “Poderemos fazer um trabalho enriquecedor, com o intercâmbio de experiências em políticas públicas para pessoas com deficiência, trazendo para o Brasil o que foi bem sucedido lá fora e levando para outros países as conquistas que já tivemos por aqui”, diz Mara. D+

“Mara Gabrilli fará parte do Comitê entre 2019 e 2022”

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MISTO QUENTE por Paulo Kehdi fotos Divulgação

ORGULHO AUTISTA

“Caminhada do grupo “Acolhe Autismo”, realizada em abril último, em Santos (SP)

“Chacur com Lucelmo Lacerda, doutor em educação, ativista e pai de garoto com autismo”

“Antônio e Helena frequentam espaços públicos, para ajudar na inclusão social”


“Família Chacur reunida. Carinho e atenção são essenciais no tratamento”

“Helena com a avó materna, Salma, muito presente no dia a dia das crianças”

“O I Simpósio de Autismo contou com especialistas de vários estados. Ao lado, Helena, Ana Paula e a fonoaudióloga Eliza”

Comemorado no dia 18 de junho, no mundo todo, o Dia do Orgulho Autista foi criado para celebrar o sucesso terapêutico na intervenção das pessoas com o Transtorno do Espectro Autista, conhecido como TEA. O tema foi dissecado de forma abrangente na edição 20 da D+. A verdade é que não temos muito o que comemorar, exceto pela Lei Berenice Piana (Lei Federal 12.764), que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com TEA, estabelecendo diversas diretrizes nesse sentido; e pela militância de alguns pais desbravadores, que lutam contra o cenário desolador no

Brasil, onde 90% das famílias que têm filhos com TEA não têm tratamento adequado. Nesse quadro de militância se encontra Ana Paula Chacur, 38 anos, mãe de Helena, 9, e Antônio, 7, ambos, em graus diferentes, com sintomas do TEA. “Meus filhos foram tratados, no início, por uma equipe particular de intervenção. Mas chegou um momento que ficou impossível pagar por esse serviço e procurei o sistema público. Descobri uma carência enorme nas famílias usuárias e passei a me dedicar voluntariamente, direcionando e elucidando os direitos dessas famílias”. Desde então, Chacur vem promovendo

ações em órgãos públicos, como a Câmara Municipal de Santos, onde mora desde 2014. Em 2016, estruturou a Chacur & Chacur Educação e Diversidade para promover eventos voltados ao tema na Baixada Santista e no interior de São Paulo. “Busco ajudar a todos que me procuram, assim como direciono para outras instituições preparadas para receber o autista. É importante as pessoas não se sentirem desamparadas diante de um quadro que já é crítico por si só.”, diz Chacur. Para saber mais, acesse o site www. chacurechacur.com.br, ou e pelo e-mail educachacur@gmail.com. D+ Revista D+ número 21


MISTO QUENTE por Brenda Cruz fotos Divulgação

“O documentário traz à tona problemas de relacionamentos envolvendo pessoas com deficiência, com sensibilidade”

VAMOS PENSAR SOBRE RELACIONAMENTOS? O desejo de namorar é algo legítimo de todas as pessoas que vivem em sociedade. Mas, você já parou para pensar que nem todas as pessoas têm a “facilidade” de se relacionar? Timidez, inseguranças, problemas de cunho emocional, todos nós ou já passamos, ou estamos sujeitos a passar. Mas, e quando isso está relacionado a uma deficiência? Seja qual for a razão, medo, vergonha, incompreensão ou julgamentos distorcidos, avaliando a pessoa pela deficiência, sem nem mesmo conhecê-la, muitos indivíduos colocam as pessoas com deficiência na redoma da invisibilidade amorosa, como se fossem seres que

não querem, ou pior, não podem se relacionar. Recentemente a Netflix, serviço de filmes e séries de televisão via streaming, atualizou seu catálogo de produtos e disponibilizou um documentário britânico chamado The Undateables – em tradução livre: Os Inamoráveis. A produção conta em forma de série, as dificuldades de pessoas com diversos tipos de deficiência em enfrentar essa batalha de encontrar sua cara-metade. O documentário também revela como esse assunto é delicado, trazendo, pela voz das pessoas com deficiência, seus medos e anseios em busca de uma companhia. O documentário é válido para todos. D+


Tecnologia avançada A Microsoft acaba de lançar um aplicativo para usuários que têm deficiência visual. O Soundscape é uma plataforma gratuita que ajuda as pessoas a se localizarem nas cidades com dicas sonoras a respeito de locais variados, como, lojas, cruzamentos e pontos de interesse em geral. O destaque vai para a utilização de uma tecnologia de áudio 3D, que informa os usuários de maneira espacial, ou seja: ao ouvir uma direção, você consegue perceber de onde veio o som. Apenas com um smartphone e um fone de ouvido é possível se localizar e se informar nas cidades. Por enquanto, o Microsoft Soundscape é exclusivo para iOS, e apenas para os Estados Unidos e Reino Unido. Mas em breve teremos a novidade por aqui! D+

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UNIVERSO CULTURAL

Estar no palco e mostrar o talento para o público é a maior realização para quem é artista. A companhia de teatro Olhos de Dentro promove essa realização para atores com e sem deficiência texto: Audrey Scheiner

fotos: divulgação


L

iberdade de expressão! Esse clamor, que está relacionado ao apelo de ir contra a censura da sociedade, pode ser usado em diversos segmentos da vida de uma pessoa, incluindo o ato de fazer o que se tem vontade, de seguir o próprio sonho. Todos têm o direito à liberdade e isso inclui as pessoas com deficiência. Se querem ter um lugar na arte, esse direito é garantido. Encontramos importante paralelo na história da Companhia de Teatro Olhos de Dentro, que há 16 anos vem dando possibilidades a pessoas com deficiência de atuar num palco. Esse trabalho vem num momento em que se promove a inclusão de pessoas com deficiência nas escolas, mercado de trabalho e nos mais variados segmentos. Uma sociedade cada vez mais consciente, e que chamou para si a responsabilidade de criar caminhos para que indivíduos com qualquer tipo de deficiência possam atingir graus de desenvolvimento inimagináveis. E a Companhia está totalmente inserida nesse contexto. A instituição, que atua na cidade de São Paulo, tem a coordenação da diretora de teatro e psicopedagoga Nina Mancin, 46, e mantém parceria com o ator e preparador corporal Geraldo Pereira. O grupo promove a formação e inclusão teatral de pessoas com deficiências diversas: visual, síndrome de Down, paralisia cerebral e autismo, juntamente com pessoas sem deficiência, idosos e crianças. Tornou-se, dessa forma, uma das primeiras companhias que realmente promove a inclusão no sentido mais puro da palavra. DOAR AMOR AO PRÓXIMO Ensinando a arte teatral para pessoas sem deficiências desde 1995, um incrível desafio pousou na vida de Mancin em 2002, quando alunos com deficiência física e visual apareceram em suas aulas. “Confesso que no início tive medo. Mas, logo no primeiro dia que dei aula para alunos com deficiência, esse medo se tornou amor e estou até hoje nessa caminhada”, afirma a diretora. “Depois, fui agregando pessoas com síndrome de Down, surdez, deficiências intelectuais, entre outras. Alguns anos depois, formamos a Olhos de Dentro, um exercício de multiplicidade na inclusão”. Nina comenta que as pessoas com deficiência encontram algumas dificuldades de acessibilidade e aceitação por grande parte da sociedade. E é na área teatral, da atuação, onde elas são muitas vezes rejeitadas. “É comum a procura de pessoas que não encontraram aceitação e compreensão nos cursos e companhias tradicionais de teatro, por terem sofrido algum tipo de constrangimento e exclusão, além, é claro, dos altos custos que muitos cursos têm. Por isso, além das pessoas com deficiência, a Olhos de Dentro também é muito procurada por pessoas com baixo poder aquisitivo”, explica.

Durante a trajetória da Companhia, já passaram pela trupe mais de 750 alunos. São exatamente dezesseis peças apresentadas. Dentre elas, estão: Eterno, Cidade Cheia de Graça, Tempo de Despertar, SuperAtos, Ensaio Sobre a Vida, Girassol, Retalhos, TudoJunto&Misturado e Shakespeare aos Pedaços. Atualmente, o grupo é formado por dezesseis integrantes, sendo que dez deles têm deficiência. Para Nina, trabalhar com uma ação dessas é um presente que levará para toda a vida. Segundo ela, a preparação dos atores nos ensaios e a estruturação de cada peça não exige nenhum método específico para os atores com deficiência. “Alguns exercícios são adaptados, mas o principal objetivo é que um ajude o outro, o que acaba se tornando parte do exercício. Todos participam de tudo, sem diferença. Quanto ao posicionamento, os exercícios e ensaios são realizados no palco, então durante esse período as pessoas vão se adaptando, conhecendo seu espaço”, enfatiza. Nina diz que o maior aprendizado na sua experiência de vida é doar amor ao próximo, sem esperar nada em troca. “Espontaneamente, sou totalmente livre de expectativas e cobranças. Quero proporcionar cada vez mais a inclusão por meio da arte”.

AGENDA CIA TEATRAL OLHOS DE DENTRO • Aulas todos os domingos das 9h às 12h – Teatro Ruth Escobar • Apresentação na Universidade Metodista de SP – semana da pessoa com deficiência/Setembro • Apresentações no Teatro Ruth Escobar em Novembro • Participação Virada Cultural Inclusiva 2018 – Dezembro.

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UNIVERSO CULTURAL

“O grupo unido após ensaio: celebração da verdadeira inclusão”

“Glaucia Del Valle não tem deficiência e comemora a diversidade da Olhos de Dentro” “A diretora teatral Nina Mancin: promovendo a verdadeira inclusão”

“O ator Geraldo Ferreira. Transformando sonhos em realidade”

SONHO QUE VEIO DA TV Desde criança, o paulistano contabilista e ator Geraldo Ferreira, 56, assistia novelas e ficava encantado em ver seu ídolo maior atuando, o consagrado ator Tarcísio Meira. “Sonhava em fazer a mesma coisa: emprestar a minha voz e meu corpo para um personagem. Isso para mim era fascinante. Ainda é”, diz ele, que nasceu com anomalia congênita no membro superior direito. Por meio de uma pesquisa na internet, conheceu a companhia Olhos de Dentro e correu atrás do sonho. Segundo ele, sua primeira atuação foi fantástica, não só por estar atuando, mas também por ter participado de todo o processo de montagem do espetáculo: discussão, opinião, construção de cenário, figurinos, trilha sonora e iluminação. “No grupo é permitido opinar sobre diversas questões a respeito das peças. Isso é um enorme aprendizado para mim, uma grande realização pessoal”, relata. Para Ferreira, atuar entre pessoas com e sem deficiência é uma oportunidade sensacional. “É maravilhoso! Na Olhos de Dentro não há distinção. Todos são iguais, ninguém é tratado de forma diferente por ter ou não deficiência. Esse é o diferencial, a verdadeira Inclusão Social”, diz. Ferreira diz que a mudança de vida que a Companhia proporcionou para ele só gerou benefícios. “Ajudou muito


“Pessoas com e sem deficiência convivem e aprendem com as diferenças na Olhos de Dentro”

na minha personalidade, timidez, comunicabilidade e felicidade por fazer algo prazeroso. Mas o maior ganho foi poder aprender a trabalhar e lidar com pessoas iguais a mim, com deficiências diferentes. Foi e tem sido um crescimento pessoal, como ser humano, que não tem preço e que será levado para o resto da vida”. Dentre as peças que mais amou atuar, estão: Cidade Cheia de Graça e Tempo de Despertar. “Eram textos que falavam do ser humano, que levavam a refletir sobre nós mesmos e nossas atitudes com o outro”, enfatiza o ator.

“Os exercícios de palco são para todos, não há distinção”

RESPEITO AO PRÓXIMO Atuando na Olhos de Dentro há dez anos, Glaucia Del Valle, 44 anos, atendente do Sistema Único de Saúde (SUS) e atriz em São Paulo, afirma que conviver com as diferenças é um exercício para ter mais respeito às pessoas. E que a existência de um grupo de teatro assim é um ganho enorme para a sociedade. “Temos que ver que todos têm espaço e que as mensagens passadas por essas pessoas são de muito valor. Existem grupos para cegos, para pessoas com síndrome de Down, entre outros, mas que recebe e inclui realmente todos, sem discriminação, só tem um: a nossa Companhia”, comenta. Segundo ela, para que a inclusão social de pessoas com deficiência na sociedade se torne mais efetiva, é preciso que as pessoas parem de discriminar. “É preciso mais apoio da iniciativa privada e governamental para que mais pessoas tenham acesso às artes e possam espalhar esse amor entre os lugares e os corações”, diz.

DO TOMBO AO APRENDIZADO Durante toda sua vida, a radialista e atriz paulistana Verônica Trindade, 28, sonhava em ser bailarina. Mas foi só quando entrou para a Olhos de Dentro, em 2008, que reconheceu sua grande vocação para atuar num palco. Com baixa visão congênita, sua primeira experiência na instituição foi regada de muitas amizades. Mas nem tudo estava indo perfeitamente bem. “Minha primeira atuação em um dos espetáculos foi horrível! Caí no meio do palco, na frente da plateia, não sabia onde enfiar a cabeça, além de saber que minha atuação estava muito precária... mas tudo tem um começo, não é mesmo? Fui me aprimorando ao longo do tempo”, conta Verônica, aos risos. Ela passou por muitas dificuldades para aprender a encenar, pois o medo a atrapalhava muito no início. “Esse medo refletia na minha falta de envolvimento com o grupo, receio de me expor, e a minha insegurança comigo mesma era visível. Isso persistiu por dois anos, quase quis desistir. Foi quando uma amiga me revelou que a nossa diretora, Nina Mancin, confessou enxergar algo em mim. Enfim, eu estava desabrochando no palco. Isso me deu forças para continuar”, revela. A jovem afirma que quando começou a crescer artisticamente como atriz, conseguiu mais conhecimento, organização pessoal, além de consciência do próprio corpo e mente, que ficou mais aberta. “Os meus planos para o futuro são de me aprimorar cada vez mais na profissão, atuar em outros veículos, como TV e cinema, e criar uma produtora de eventos e viagens para pessoas com deficiência”, finaliza, orgulhosa. Para a diretora Nina Mancin, é preciso que a sociedade melhore os editais de cultura, para abrir margens a mais espetáculos teatrais e inclusivos. “Precisamos de oportunidades, mas não com valores reduzidos por se tratar de projetos para pessoas com deficiência, e sim que seja justo, como os editais de pessoas sem deficiência”. E, claro, o olhar das pessoas ajuda no respeito e na igualdade. “Precisamos deixar de ser hipócritas e preconceituosos e aprender a olhar para o outro com olhos de dentro”. D+ Revista D+ número 21


NOSSA CAPA


Com a Copa do Mundo da Rússia a pleno vapor, entrevistamos ídolos do futebol no paradesporto para conhecer suas trajetórias de vida e a expectativa com relação ao evento texto Paulo Kehdi colaboração CPB fotos Arquivo Pessoal e Shutterstock

O

Brasil é o país do futebol! Lugar comum maior que esse, difícil de achar. Mas, mesmo sendo um clichê, a verdade é que ele traduz a realidade do brasileiro. Basta ver a atmosfera na rua durante a realização da Copa, que está acontecendo do outro lado do mundo, na Rússia. São bandeiras espalhadas por todos os cantos, ruas e muros pintados de verde e amarelo... e durante os jogos do Brasil, então? Os olhos da nação abertos, prestando atenção em cada jogada, cada gol dos nossos craques. Ruas vazias que só voltarão a ter vida quando do apito final. Talvez o que muitos não saibam é que não é apenas do futebol convencional que o Brasil vive. O Futebol de 5, destinado a atletas cegos ou com baixa visão, é o maior exemplo de sucesso que podemos mostrar. A modalidade é tetracampeã paralímpica, conquistou o ouro nos jogos paralímpicos de 2004 (Atenas), 2008 (Pequim), 2012 (Londres) e 2016 (Rio). Além disso, o Brasil é pentacampeão mundial: Madri (2018), Tóquio (2014), Hereford (2010), Jerez de la Frontera (2000) e Paulínia (1998) e ficou 11 anos seguidos sem perder uma única competição! O título em Madri veio durante o desenvolvimento dessa matéria, em 17 de junho, quando ganhamos da Argentina na final, por 2 a 0. Difícil encontrar paralelo de sucesso maior que esse, seja qual for o país, seja qual for a modalidade praticada. A força do Futebol de 5 é traduzida na quantidade de times pelo país. São 35 equipes, que disputam campeonatos nacionais (Copa do Brasil), regionais (Nordeste, Sul-sudeste e Centro-norte) e estaduais, com atletas espalhados por todos os estados brasileiros. No Futebol para Paralisados Cerebrais (chamado até pouco tempo atrás de Futebol de 7), as conquistas também são muito expressivas. Temos três medalhas paralímpicas no currículo, duas de bronze (Sidney, 2000 e Rio, 2016) e uma prata (Atenas, 2004). Infelizmente, porém, uma notícia ruim, mas de certa forma compreensível: o Comitê Paralímpico Internacional (IPC, em inglês), por conta de uma tendência a valorizar

modalidades que contemplem os gêneros feminino e masculino, retirou o Futebol para Paralisados Cerebrais do programa dos Jogos Paralímpicos de Tóquio, em 2020. Não só isso, mas também pela classificação funcional que existia até o ano passado, muitos atletas do Futebol de Paralisados Cerebrais apresentavam pouquíssimo comprometimento motor, e a paralisia cerebral era quase imperceptível. A modalidade recebia duras críticas, com afirmações de que os atletas “nem pareciam pessoas com deficiência”. Para voltar em Paris, 2024, a International Federation of Cerebral Phalsy Football (IFCPF), que é quem regulamenta a modalidade no mundo, alterou todo o sistema de classificação, o que acabará refletindo na exclusão de muitos jogadores, sem falar no já mencionado forte apelo para a introdução das mulheres na modalidade, coisa que já vem acontecendo em alguns países. Outro esporte que vem se desenvolvendo de forma relevante no país, com conquistas magníficas, é o Futebol para Amputados. A modalidade nunca fez parte dos Jogos Paralímpicos, mas existe uma forte pressão para que seja incluída em Paris, 2024. O primeiro time brasileiro foi formado em 1986 pela Associação Niteroiense de Deficientes Físicos, a ANDEF. Um ano depois, aconteceu o primeiro mundial da modalidade, concebido pela Ampute Soccer Internacional e realizado em Seattle (EUA). Nessa primeira competição não participamos, mas no mundial seguinte, em 1990, na mesma Seattle, já alcançamos um brilhante terceiro lugar. A partir de 1999, nos tornamos protagonistas, com cinco títulos: Kiev (1999), Seattle (2000), Niterói (2001 e 2005) e Crespo (2009). A Associação Brasileira de Desportos para Deficientes Fisicos (ABDDF) foi fundada em 1990, com o objetivo de representar e dirigir as atividades do segmento. Desde então, passou a organizar o Campeonato Brasileiro da categoria e os campeonatos regionais. Hoje, o Brasil tem vinte equipes de futebol de amputados em atividade, com quase 500 atletas participando de diversos campeonatos. O Brasil, assim como no futebol convencional, é uma potência futebolística no paradesporto. Revista D+ número 21


NOSSA CAPA

Jeferson da Conceição Gonçalves, 28 anos, o Jefinho, concedeu entrevista para a Revista D+ às vésperas da final do Mundial de Futebol de 5, que acontecia na Espanha. O adversário seria a Argentina e o Brasil trouxe o título, conquistando mais um mundial na categoria. A história de sucesso dessa modalidade se confunde com a trajetória de vida de Jefinho. Nascido em Candeias (BA), perdeu a visão aos sete anos, por conta de um glaucoma. “Já nasci com o glaucoma, então todos em casa, meus pais e meus irmãos, sabiam que eu perderia a visão. Mesmo assim, para mim, foi um baque. Enxergava pouco nos primeiros anos de vida, mas enxergava. Tive que parar com os estudos, porque não havia nenhuma preparação para cegos nas escolas de Candeias. Mas o que não parei de fazer foi jogar bola! Jogava antes com meus amigos, depois da perda, adaptamos uma bola com saco plástico para que eu pudesse ouvi-la e participar das brincadeiras”, lembra Jefinho. Os estudos, porém, seriam retomados logo depois, aos nove anos, quando se mudou para Salvador (BA), onde passou a frequentar o Instituto de Cegos da Bahia (ICB). Lá não só voltou a estudar, como passou a ter contato com o paradesporto. Suas primeiras atividades foram no atletismo e na natação. Até que, quando tinha 11 anos, o Instituto resolveu montar um time de futebol de 5. “A gente já brincava no Instituto, jogava bola, mas de maneira precária. Fui conhecer a bola de guizo só quando o ICB montou o time para campeonatos. Os professores observavam a gente nas brincadeiras e chamaram para compor o time aqueles que achavam serem os mais talentosos, eu estava entre esses”. Na primeira competição nacional, aos 14 anos, foi considerado a revelação do torneio, realizado no Rio de Janeiro. Já sendo treinado por Gerson Coutinho, seu técnico até hoje (o ICB é a única instituição que Jefinho defendeu na carreira), o evento abriu as portas e foi decisivo para a primeira convocação para a Seleção Brasileira. “Era o ano de 2004, mas essa convocação serviria apenas para uma adaptação. Afinal de contas eu tinha apenas 14 anos, era muito jovem. Serviu para que eu conhecesse o ambiente e jogadores já consagrados na modalidade”. Em 2006, veio o que ele considera a sua primeira “verdadeira” convocação. E desde então nunca mais deixou de ser convocado, sendo parte de uma história fantástica, onde o Brasil ganhou todas as competições que participou, por 11 anos seguidos! “Demorei um pouco para conquistar meu espaço no grupo titular. Por quatro anos fui reserva, entrava e saia dos jogos. Em 2010, finalmente conquistei lugar no time. São muitos jogadores talentosos,

nos respeitamos mutuamente, formamos um grupo realmente forte”. Nesse período Jefinho foi tricampeão dos Jogos Paralímpicos (2008, 2012 e 2016), tricampeão mundial (2010, 2014 e 2018) da International Blind Sports Federation (IBSA), que comanda a modalidade no mundo, tricampeão dos Jogos Parapanamericanos: Rio (2007), Guadalajara (2011) e Toronto (2015) e bicampeão da Copa América IBSA (2009 e 2013, ambas na Argentina). Não bastasse esse fantástico currículo com a seleção, Jefinho tem sete campeonatos da Copa do Brasil e seis regionais Nordeste pelo IBC. Acostumado com competições internacionais, foi surpreendente na sua análise sobre a participação do Brasil na Copa da Rússia. “Primeiro quero dizer que época de Copa é tudo de bom, vou ficar o dia inteiro vendo os jogos (risos)! Mas, apesar de considerar o grupo do Brasil muito forte e o comando de Tite correto, acredito que uma seleção europeia irá conquistar esse Mundial”. Tendo terminado o Ensino Médio, Jefinho se preocupa com seu futuro. “Nesses anos todos em que defendo o ICB e o Brasil, tive uma rotina muito intensa de treinos, jogos e viagens. Então não pude me dedicar a uma faculdade. Mas sei que a carreira de jogador de futebol é curta. Minha ideia é fazer faculdade ou curso profissionalizante. As áreas que mais gosto são informática e economia, certamente seguirei um desses caminhos. Sempre tive apoio financeiro do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), mas quando parar de jogar tenho que estar preparado para os anos que estão por vir. Também gostaria de ressaltar que sempre tive apoio de meus pais, Gildo (já falecido) e Agripina, para tudo. Minha mãe, especialmente, soube conduzir minha educação desde os primeiros anos. Assim, consegui, sem uma superproteção, galgar degraus na vida”.


“Jefinho em ação pela Seleção Brasileira. Ao lado, com o fisioterapeuta Halekson Barbosa”.

“Com a delegação brasileira, no último Mundial, em Madri”

“À esquerda, colocando a venda. E conduzindo a bola para mais um ataque do Brasil.” Revista D+ número 21


NOSSA CAPA

“Em sentido horário: Marcão treinando os atuais goleiros da seleção brasileira; em Teresópolis, como auxiliar da Comissão Técnica; e fazendo o que mais sabe, uma defesa”.

“Ao lado, com a camisa da seleção. E com o uniforme do Arouca Barra Clube, do Rio de Janeiro, clube que defendeu”


O apelido já é uma referência. Marcos dos Santos Ferreira, 39 anos, foi goleiro da seleção brasileira de Futebol para Paralisados Cerebrais por seis paralimpíadas, desde Atlanta, em 1996, até o Rio, em 2016. Chamado pelos amigos de Marcão, lembra muito, pelas defesas milagrosas, seu colega famoso que fez história no Palmeiras e foi Campeão do Mundo do futebol convencional em 2002. Nascido em Dourados (MS), o “nosso” Marcão teve problemas no lado direito do corpo, tudo por conta de um atraso no seu parto. “Não dá para saber se foi erro médico, o fato é que eu deveria ter nascido antes. Tenho então, desde sempre, uma dificuldade maior de força e velocidade nos membros do lado direito”, explica. Isso nunca o inibiu em nada. “Quando tinha 5 anos, mudamos para Campo Grande (MS). Desde pequeno frequentei escolas e sempre fui um apaixonado por futebol. Jogava nas ruas com meus colegas. Quando tinha uns 10 anos, formamos um time do bairro para disputar campeonatos contra equipes de outros bairros. Como eu carecia de velocidade e força, especialmente na perna direita, fui para o gol. Não queria ficar fora de jeito nenhum (risos)”. E assim caminhou sua infância e adolescência, revezando-se entre os estudos e as partidas de futebol pelos quatro cantos de Campo Grande. Um amigo, todavia, iria mudar a vida de Marcão para sempre. “Foi esse colega que me falou do Centro de Educação Multidisciplinar ao Portador de Deficiência Física (Cendef). Eu tinha 17 anos na época, nunca tinha ouvido falar de paradesporto, para mim aquilo tudo era um universo novo”. Lá ele conheceu o professor Dovair Castelli, que treinava a equipe de Futebol para Paralisados Cerebrais na instituição. No primeiro treino, Castelli profetizou: ‘você vai ser goleiro da seleção brasileira’. “Eu achei tudo aquilo uma loucura. Nem conhecia a modalidade e o professor me dizendo que ia chegar na seleção”. Castelli, porém, estava certo. O ano era

1996, o Brasil se preparava para a paralimpíada de Atlanta (EUA). O Cendef participava de um campeonato em Mato Grosso do Sul, que era acompanhado pelo pessoal da Associação Nacional de Desporto para Deficientes (ANDE), entidade responsável pela modalidade no Brasil. Primeiro, Marcão passou pela avaliação funcional (é T2 na classificação atual, de comprometimento intermediário). Mais importante que isso, entretanto, foi seu desempenho no gol, com grandes defesas. Um mês depois do torneio, veio a convocação! “Aquilo parecia um sonho para mim, tudo aconteceu muito rápido. Foram chamados três goleiros e eu não só permaneci, como fui titular. Mas o time não era muito bom, não tivemos um bom desempenho”, conta. Quatro anos depois, porém, Marcão teria o que considera a maior alegria de sua vida no paradesporto. Desacreditado, o time de futebol de 7 (antiga denominação da modalidade) foi para Sidney em 2000 e trouxe de lá a primeira medalha da modalidade, um bronze, após derrotarem Portugal na disputa do terceiro lugar por 2 a 1. “Foi incrível, uma emoção impossível de descrever. Ninguém dava nada por nós e voltamos com a medalha. As outras colocações honrosas que tivemos, na verdade vieram com um gosto amargo. Em 2004, uma confusão generalizada na semifinal com a Argentina acabou com três jogadores nossos expulsos, um deles, o Leandro Marinho, artilheiro e considerado o melhor jogador do mundo no ano anterior. Perdemos a final para a Ucrânia por 4 a 1, ficamos bem chateados apesar da prata. E no Rio, em 2016, a expectativa era enorme, jogávamos em casa. Mas na semifinal contra o Irã deu tudo errado, fomos goleados por 5 a 0, não gosto nem de lembrar. Conquistamos o bronze, mas queríamos o ouro”. Depois da paralimpíada do Rio, Marcão foi convidado a compor a comissão técnica da seleção, como preparador de goleiros. Atualmente se divide entre essa atividade, as aulas na Faculdade Estácio de Sá, onde faz o curso de Educação Física, à noite, e a pizzaria que abriu em 2001, logo depois de trabalhar na Brasil Telecom como telefonista, de 1996 até 2000. Aliás, esse foi seu primeiro emprego e por demais importante na sua vida. “Foi lá que conheci a Sandra, minha esposa. Temos três filhos, o Leonardo, com 19 anos, o Gustavo, com 15 e a Yasmin, com 12. O Leonardo, inclusive, me ajuda na pizzaria porque estou com a rotina bem intensa”, diz Marcão, um batalhador na vida, com uma história fantástica no paradesporto. Sobre a Copa do Mundo da Rússia, diz que tem certeza do título. “Estamos resgatando nossa história novamente, dignidade, esquecendo o fiasco da última copa. O Brasil está bem servido com o Tite”. Revista D+ número 21


NOSSA CAPA

Rogério Rodrigues de Almeida, 38 anos, o Rogerinho, é sem dúvida o jogador do futebol de amputados mais conhecido e com maior sucesso no Brasil. Nascido sem a perna esquerda por conta de uma má formação congênita, Rogerinho gostava tanto de futebol que aos sete anos já jogava com os amigos da rua. “Não me deixei abater pela falta da perna, ia para a rua e jogava com colegas, jamais me escondi atrás da deficiência”, conta. Natural de Mogi das Cruzes (SP), foi convidado, por conta da habilidade que já apresentava naquela época, a jogar numa escolinha de futebol, chamada Campestre Clube, sendo o único a ter uma deficiência na instituição. “O problema no Campestre é que eu treinava com os outros garotos, mas na hora do campeonato ficava no banco o tempo inteiro”. Até que, quando tinha 10 anos, o Campestre resolveu organizar um campeonato interno, justamente para permitir que Rogerinho jogasse partidas de competição. “O engraçado é que por dó, pena, sei lá, os outros garotos não me marcavam. Eu recebia a bola e me deixavam livre. Poxa, eu não parava de fazer gols! (risos)”. Entretanto, foi somente quando tinha 18 anos, em 2001, que foi conhecer o universo do paradesporto. Um dirigente do Sesi Mogi das Cruzes, Ronaldo Oliveira, o chamou para conhecer um projeto esportivo voltado a pessoas com deficiência. Lá, passou não só a jogar futebol com outros amputados, como também começou a praticar o vôlei sentado, outra modalidade paralímpica que começava a crescer no Brasil. “O problema é que tinha duas horas de treino e eu jogava vôlei por uma hora e cinquenta minutos e futebol por dez minutos”, explica Rogerinho, frustrado. Em 2006, depois de ganhar diversos títulos com o vôlei sentado do Sesi, soube que havia em São Vicente (SP), um time de futebol de amputados, o Numec São Vicente. “Apesar do time não ser muito bom, eu e o goleiro Wagner fomos nos destacando. Depois de termos disputado campeonatos em 2007 e 2008, em 2009 o sonho se realizou. Eu e Wagner fomos convocados pela primeira vez para defender o Brasil, uma sensação única, já que fomos campeões da Copa América daquele ano, na Argentina, e eu fui o artilheiro da competição”. Desde então, Rogerinho nunca mais deixou de ser convocado. Na esteira desse sucesso, no mesmo ano criou o projeto “Mogi Futebol de Amputados”. Era o filho talentoso voltando às origens. Em 2011, concebeu e ajudou a criar o campeonato paulista, na época com quatro times. Hoje, o torneio já está na nona edição e conta com sete equipes. Ainda com a intenção de fomentar a modalidade pelo país, em 2014 foi eleito vice-presidente da ABDDF. “Sempre que ia para a seleção eram as mesmas caras, queria mudar isso, dar oportunidade a mais amputados. Organizamos um calendário

fixo, criamos torneios como o Open Nordeste, para expandir a modalidade para aquela região do país. Posso dizer que os objetivos estão sendo alcançados, gradativamente”, diz Rogerinho, que é casado com Juliana desde os 20 anos de idade e tem três filhos: Gustavo, 17 anos, Emanuelly, com 11 e Lorenzo, com 5. Com 480 gols na carreira, é o atleta com mais gols na modalidade, no mundo. Esse sucesso o fez ser convidado para participar dos tradicionais Jogos das Estrelas e ter o prazer de conhecer Ronaldinho Gaúcho, Neymar e Cafu, entre tantos outros. “Conheci o Tite também. Além de muito gente boa, ele é preparado demais, tenho certeza que o Brasil vai ser campeão na Rússia!”. Rogerinho não é só campeão nos gramados, mas fora dele também. Além de ter constituído bela família, é formado em Gestão Financeira pela Universidade de Mogi e atua como gestor de empresa no ramo da engenharia elétrica, carreira construída em mais de vinte anos de atividade. D+

“Rogerinho mostrando toda sua habilidade em um voleio perfeito”


COMO FUNCIONAM AS MODALIDADES

“Acima, em partida do Campeonato Paulista, contra a Ponte Preta. Com a bola e as muletas, ferramentas de trabalho. Abaixo, com o time do Corinthians-Mogi, supercampeão na modalidade”

FUTEBOL DE 5 - É exclusivo para cegos ou deficientes visuais. As partidas, normalmente, são em uma quadra de futsal adaptada, mas, desde os Jogos Paralímpicos de Atenas, em 2004, também têm sido praticadas em campos de grama sintética. O goleiro tem visão total e não pode ter participado de competições oficiais da FIFA nos últimos cinco anos. Junto às linhas laterais, são colocadas bandas que impedem que a bola saia do campo. Cada time é formado por cinco jogadores – um goleiro e quatro na linha. Diferentemente de um estádio convencional, as partidas são silenciosas, em locais sem eco. O jogo tem dois tempos de 25 minutos e intervalo de 10. A bola tem guizos internos para que os atletas consigam localizá-la. A torcida só pode se manifestar na hora do gol. Os jogadores usam uma venda nos olhos e, se tocá-la, cometerão uma falta. Com cinco infrações, o atleta é expulso e pode ser substituído por outro jogador. Há, ainda, um guia (chamador) que fica atrás do gol adversário para orientar os atletas do seu time. Ele diz onde os jogadores devem se posicionar e para onde devem chutar. O técnico e o goleiro também auxiliam em quadra. Fonte: CPB FUTEBOL PARA PCS - O futebol para Paralisados Cerebrais é praticado por atletas com essa deficiência, decorrente de sequelas de traumatismo crânio-encefálico ou de acidentes vasculares cerebrais. As regras são da FIFA, mas com algumas adaptações feitas pela Associação Internacional de Esporte e Recreação para Paralisados Cerebrais (CP-ISRA). O campo tem, no máximo, 75m x 55m, com balizas de 5m x 2m. A marca do pênalti fica a 9,20m do centro da linha de gol. Cada time tem sete jogadores (incluindo o goleiro) e cinco reservas. A partida dura 60 minutos, divididos em dois tempos de 30, com um intervalo de 10. Não existe regra para impedimento e a cobrança lateral pode ser feita com apenas uma das mãos, rolando a bola no chão. Fonte: CPB FUTEBOL PARA AMPUTADOS - É disputado em campo de futebol society, com dimensões mínimas de 60m x 38m. Cada equipe tem sete jogadores, sendo que o goleiro é amputado de um dos braços e todos os atletas de linha são amputados de uma das pernas. As partidas são divididas em dois tempos de 25 minutos com intervalo de 10 minutos e os técnicos podem pedir um tempo de um minuto a cada etapa da partida. A muleta não pode tocar na bola de forma intencional e o goleiro não pode sair da área. O tiro de meta não pode ultrapassar o meio campo, o lateral é cobrado com o pé e não há limite para substituições. Os jogadores substituídos podem, inclusive, voltar ao jogo. As demais regras não diferem das utilizadas pelo futebol tradicional. Fonte: site da ABDDF Revista D+ número 21


SURDEZ E EDUCAÇÃO

A CONCEPÇÃO MÉDICO-PATOLÓGICA E A SOCIOCULTURAL SOBRE OS SURDOS Por onde se enveredam as políticas educacionais para esses alunos? texto Rúbem da S. Soares* colaboração Samuel Ávila fotos Divulgação e Shutterstock

“Na visão psico-socioantropológica, o surdo é reconhecido como sujeito inserido em um universo próprio, marcado também pelo uso da língua de sinais”

A

aceitação do estranho, do diferente, do deficiente sempre foi um problema para a sociedade ao longo dos séculos. No início da história da humanidade, verificaram-se duas maneiras de tratar as pessoas com deficiência: algumas civilizações as exterminavam, por considerá-las grave empecilho à sobrevivência do grupo. Outras as protegiam e as sustentavam, buscando a simpatia dos deuses, ou mesmo como gratidão pelos esforços dos que se mutilavam nas guerras. Em algumas culturas primitivas, as crianças com deficiência podiam ser mortas, já que eram consideradas um estorvo, principalmente no caso dos povos nômades. Na

Grécia antiga, Platão (429-347 a.C.), na obra A República, propõe a morte das crianças de corpo “mal organizado”. Na mesma linha, Aristóteles (384-322 a.C.), em sua obra Política, sugere a proibição de alimentar toda criança “disforme”. No século VIII a.C., as leis espartanas previam que todos os bebês do sexo masculino deveriam ser propriedade do Estado. Portanto, os recém-nascidos eram cuidadosamente examinados por um conselho de anciãos e, caso se verificasse qualquer anormalidade física ou mental – ou, simplesmente, se fossem magrinhos, raquíticos – eram encaminhados ao Apotetas (local de abandono) para serem lançados de cima do monte Taigeto, rumo a um abismo de mais de


2.400 metros de profundidade, perto da cidade-estado de Esparta. Podemos dizer que tais políticas consideram os recém-nascidos como uma “coisa”, um “bem” – que poderia ser aproveitado ou descartado – e não um ser humano. De modo semelhante, na Roma antiga, a Lei das XII tábuas autorizava os patriarcas a matarem seus filhos “defeituosos”. Somente com o conjunto de ideias renascentistas – no apogeu do Iluminismo e no bojo da Revolução Francesa – é que se percebe o início da mudança da visão sobre a pessoa com deficiência. Esta começa a conquistar o direito de existir enquanto ser humano, embora continuasse a sofrer discriminação. Após a metade do século XX é que a sociedade começa a reconhecer os direitos da pessoa com deficiência. No caso dos indivíduos surdos, durante a Antiguidade e até o início da Idade Média, pensava-se que eles não eram educáveis. Eram rotulados como “imbecis”, “idiotas”, vistos como incapacitados para aprender. Foram subjugados e obrigados a comunicar-se por meio de uma língua que lhes é estranha, a língua oral. A partir daí, temos uma longa (e triste) história sobre os surdos, que já foi exaustivamente relatada por brilhantes autores como Carlos M. Sànchez, Oliver W. Sacks, dentre outros. Mais recentemente e até os nossos dias, o debate sobre o indivíduo surdo apresenta duas posições antagônicas: a visão médico-patológica (ou médico-organicista) e a psico-socioantropológica (também conhecida como visão sociocultural). Vejamos, resumidamente, a posição de cada uma dessas visões, com o consequente impacto na área da educação dos surdos. A VISÃO MÉDICO-PATOLÓGICA (OU ORGANICISTA) DA SURDEZ Desde o início de sua história, a educação dos surdos sujeitou-se à orientação de um profissional da área médica (o médico Jerônimo Cardan). Tal influência médica foi se consolidando, estando presente, inclusive, no Instituto de Surdos de Paris, primeira escola especial de surdos – fundada pelo abade francês Charles Michel de L’Epèe (17121789) – cuja administração posteriormente ficaria sob responsabilidade do médico Jean Itard. Talvez aqui tenha se dado o início do que viria a se consolidar como uma visão médico-patológica da surdez, predominante por longos anos no campo da educação de surdos. Comungam dessa visão a corrente de autores que focaliza a surdez apenas no âmbito clínico-patológico ou médico-organicista. Nela, o surdo é visto como um deficiente que precisa da reabilitação para alcançar uma condição fisiológica semelhante à dos ouvintes. Tal visão prioriza o problema biológico da falta de audição e da dificuldade (ou até ausência) da fala oral. Os defensores dessa visão,

geralmente, estão interessados nos aspectos neurossensoriais sobretudo no tocante à capacidade/incapacidade de audição e fala oral do surdo. Desse modo, indicam aos surdos, prioritariamente, o caminho da educação/reeducação (ou reabilitação) da audição/fala oral. Entendem eles que, sem tal reabilitação, dificilmente esses indivíduos integrariam a sociedade majoritária, que é de ouvintes. Assim, nessa corrente, os autores defendem que a “reabilitação” da surdez, o que pode se efetivar por meio de treino fonoarticulatório (terapia que possibilite a fala oral), a leitura labial e pela amplificação do resíduo auditivo. Para isso, é imprescindível a utilização de aparelhos de amplificação sonora, próteses auditivas, implante coclear, dentre outras técnicas/instrumentos modernos na linha das tecnologias assistivas. Um indivíduo que é considerado hábil dentro do padrão esperado pela medicina é aquele que consegue captar ondas sonoras em várias frequências diferentes, passando pelo processo completo, da detecção à decodificação do som. O American National Standards Institute (ANSI – 1989) define uma escala em decibéis (dB): 0 dB corresponde ao zero audiométrico, e agrega várias frequências comuns em Hertz (hz). A faixa de 0 a aproximadamente 20 a 24 decibéis (ou 24dB) corresponde ao nível natural de audição nos humanos, sendo que limiares de perda acima de 25dB (em algumas frequências, conforme testes com audiogramas de 250, 500, 1.000, 2.000, 3.000, 4.000, 6.000 e 8.000 hz), já pode ser considerada uma deficiência de audição. Os níveis da deficiência são classificados de acordo com as diferenças no limiar de detecção em dB. Geralmente, o indivíduo é classificado com perda leve, moderada, severa e profunda. Nesse sentido, os indivíduos com perda auditiva em níveis leve, moderado e severo são chamados de deficientes auditivos. Os com nível profundo são chamados surdos. Luis Behares é um dos autores que criticam o uso de expressões como deficiente auditivo, por remeter à visão médico-organicista. Para ele, principalmente na escolarização do surdo, o grau de perda auditiva indicado pelo diagnóstico médico e/ou paramédico tem sido decisivo no encaminhamento educacional, configurando-se como o mais importante indicador para a previsão do desenvolvimento de linguagem. Isso porque, na visão médico-organicista, é imprescindível conhecer os aspectos patológicos e fisiológicos da surdez a fim de que se possa desenvolver um trabalho educativo com esse indivíduo. Tal visão pretende aproximar o surdo o máximo possível do ouvinte, que é o “modelo-padrão”. Assim, resiste-se a aceitar a diferença desse indivíduo, já que ele destoa da norma socialmente estabelecida. Na visão médico-patológica, os padrões classificatórios não são apenas indícios. São considerados os mais Revista D+ número 21


ENTREVISTA SURDEZ E EDUCAÇÃO

“A visão médico-patológica focaliza a surdez apenas no âmbito clínico-patológico ou médico-organicista, priorizando, dessa forma, a questão biológica da falta da audição “

“Na Grécia Antiga, defendia-se a eliminação (morte) de recém-nascidos com algum tipo de deficiência. Permaneciam vivos apenas os “saudáveis”

importantes indicadores para a previsão de desenvolvimento da criança surda, tanto em termos linguísticos quanto educacionais. Assim, despreza-se, ou se coloca em segundo plano, outros fatores que não se refiram ao tipo e grau de perda auditiva. A VISÃO PSICO-SOCIOANTROPOLÓGICA OU SOCIOCULTURAL DA SURDEZ Contrariamente à visão médico-patológica, a sociocultural entende que a surdez deve ser compreendida a partir de um olhar socioantropológico, como diferença linguística. Isso porque, afirmam os defensores dessa visão, a surdez é assumida pelo próprio surdo como uma posição política, estando tal sujeito consciente de que tem uma diferença linguística e, portanto, faz parte de uma minoria linguística. Um dos principais defensores dessa visão, Carlos Skliar, define a surdez com base em quatro diferentes níveis: como diferença política, como experiência visual, como caracterização de múltiplas identidades e como deficiência. Assim, esse indivíduo deixa de ser visto apenas como um “deficiente auditivo”, passando a ser reconhecido como um “surdo”. Esse é o termo preferido por defensores dessa visão, já que deixa transparecer subjacente uma concepção sociocultural da surdez.

As atuais investigações têm chamado atenção para a multideterminação da surdez e para a adequação do emprego do termo “surdo”, até porque é essa a expressão utilizada e preferida por esse indivíduo para referir-se a si mesmo (autoidentificar-se) e aos seus iguais. Desse modo, é fundamental considerar que o surdo difere do ouvinte, não meramente porque não ouve, mas porque desenvolve potencialidades psico-culturais próprias. Ele precisa ser compreendido, portanto, na sua dimensão psico-socioantropológica, enquanto um sujeito, um ator social, um senhor de sua história e não apenas como um portador de uma patologia, a surdez (que precisa ser “tratada”, “curada”, “superada”). A aceitação do termo “surdo” como o mais apropriado representaria, também, uma tentativa de minimizar o processo de estigmatização desses indivíduos pela sociedade ouvinte. Sabemos que a falta da audição pode ser um fator que reduz o indivíduo ao atributo gerador do descrédito social. A expressão “surdo”, como vem sendo empregada, poderia facilitar a identificação desse indivíduo na sua diferença. Em defesa dessa tese, Maria Cecília Moura propõe que esse indivíduo seja conhecido não apenas como “surdo”, mas como “Surdo” (com letra maiúscula). Segundo ela, isso favoreceria a identificação dessa pessoa como diferente, sendo essa diferença particularizada por ser decisiva para o seu desempenho. O uso do termo “deficiente auditivo”, ao contrário, tem contribuído com a utilização de procedimentos que visam a ajustar os surdos aos padrões linguísticos mais aceitos e valorizados na sociedade, envolvendo tratamentos e/ou atendimentos sistemáticos de fala oral. Em contrapartida, os estudos que usam a referência “surdo” têm procurado abrir um espaço social para essas pessoas, respeitando suas especificidades. Buscam a identidade social entre o seu grupo, sua legitimação como comunidade linguística diferenciada. Claro que devemos admitir que a limitação auditiva é inegável como um dos fatores para a identificação das diferenças individuais. É igualmente inegável, que a necessidade de aquisição de um sistema linguístico próprio (gestual-visual), acarreta consequências de ordem social, emocional e psicológica que vão além da perda auditiva.


Charles Michel de L’Epée criou o Instituto de Surdos de Paris no século XVIII, primeira escola especial de surdos no mundo

Seria um tremendo equívoco negar a condição desse indivíduo no tocante à sua limitação física. Contudo, os surdos são possuidores de nomes próprios que os identificam como pessoas pertencentes a uma determinada classe social, gênero, religião, clube de futebol, etc. Mas, por apresentarem uma forma particular de apreensão de mundo e de externalização, devem ser identificados e designados como grupo. É preciso entender que a surdez deve estar no contexto de vida da pessoa surda, sem ocupar uma posição tão significativa para o seu desenvolvimento individual e social. Isso se opõe à ideia de identificação dos surdos simplesmente por padrões classificatórios de perda auditiva, levado a cabo, até recentemente, por grande parte dos pesquisadores da surdez e de professores de surdos. Desse modo, o uso dos termos surdo e deficiente auditivo por esses indivíduos não está relacionado ao grau de perda auditiva, mas, sim a uma posição política de autoafirmação ou não de sua condição de surdo e todo o seu significado político-social. No que impacta a educação de surdos, lembramos que, no Brasil, as políticas do setor devem adotar, por força da Lei 10.436/2002, regulamentada pelo Decreto 5.626/2005, práticas de educação bilíngue. Tais práticas, necessariamente, devem estar coerentes com a visão sociocultural da

surdez. Isso contempla, obrigatoriamente, a Libras (Língua Brasileira de Sinais ) como língua materna dos surdos (L1) e a língua portuguesa como segunda língua (L2). A Lei também impõe que o Poder Público (federal, estadual e municipal) promova ações para a difusão da Libras. Portanto, desde abril de 2002, com a publicação dessa lei, práticas educativas que não considerem a situação de bilinguismo dos surdos (rejeitando a Libras como L1, por exemplo) podem estar incorrendo numa flagrante ilegalidade, sujeitando-se à ação do Ministério Público Federal. Os movimentos surdos brasileiros historicamente vêm lutando pelo reconhecimento e implementação de uma educação bilíngue. Tal luta teve seu apogeu entre a metade da década de 1980 e meados da de 2000, culminando na aprovação da Lei da Libras a que nos referimos neste parágrafo. Desde então, diversas ações de políticas públicas têm sido pensadas para atender às especificidades desta população no âmbito educacional. Necessário reconhecer que a origem desses movimentos no Brasil se deve também ao trabalho de William Stokoe, linguista americano e pesquisador da Gallaudet University, instituição de ensino superior destinada apenas a pessoas surdas. Na década de 1960, ele empreendeu pesquisas nas quais concluiu serem os sinais usados pelos surdos uma verdadeira língua (leia a sessão Resenha da próxima edição da D+, onde publicaremos a primeira parte de uma resenha sobre a principal obra de Stokoe, um material inédito no Brasil). Voltando à realidade brasileira, atualmente continua recrudescendo os descontentamentos das comunidades surdas. Há uma tensão permanente entre o desejo dos surdos e as reais intenções do sistema educacional brasileiro. Enquanto os surdos querem uma educação exclusiva, as políticas públicas nacionais propõem-lhe a educação inclusiva. Não parece fácil a conciliação de ambas as propostas, entre si antagônicas. Fato é que, de 20 a 24 de abril de 1999, realizou-se o pré-congresso ao V Congresso Latino Americano de Educação Bilingue para Surdos. O evento aconteceu na UFRGS, em Porto Alegre, de onde a comunidade surda presente elaborou um documento intitulado A educação que nós, surdos, queremos. Esse manifesto espalhou-se Brasil afora, sendo divulgado nos meios acadêmicos, em eventos sobre surdez e ganhou até espaço na mídia, o que serviu também como pressão para a aprovação da Lei da Libras, em 2002, Revista D+ número 21


ENTREVISTA SURDEZ E EDUCAÇÃO

“Na visão psico-socioantropológica, defende-se a tese de que o indivíduo com problemas auditivos é surdo, e não deficiente auditivo. Estando inserido, dessa forma, em um universo de minoria linguística” PARA SABER MAIS, RECOMENDO ALGUMAS LEITURAS: BEHARES, L. E. Nuevas corrientes en la education del sordo: de los enfoques clínicos a los culturales. In: Cadernos de Educação Especial, p.20-39, 1993. BRASIL. Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Acessibilidade. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2005.

“Na concepção médico-patológica da surdez, usa-se, na reabilitação, tecnologias assistivas, como o implante coclear”

como citamos anteriormente neste artigo. Desde aquela época, as comunidades de surdos vêm pressionando o MEC/Secadi, o que resultou na recente criação de um Grupo de Trabalho (GT) designado pelas Portarias nº 1.060/2013 e nº 91/2013. Esse GT gerou o Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue – Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa. O documento afirma: “diante desse planejamento linguístico relativo ao uso e difusão da Libras no Brasil, torna-se necessário viabilizar a educação bilíngue de Surdos”. No demais, reafirma a importância de documentos e estudos que defendam o bilinguismo e a educação bilíngue para surdos, apontando alguns caminhos para se implementar tal proposta, finalizando com diversas recomendações. Portanto, esse Relatório, embora não tenha poder de impor nenhuma norma, é um dos documentos mais recentes, que integra as ações do Estado brasileiro no processo de planejamento linguístico para os surdos. Não podemos nos esquecer, porém, que todas as recomendações do referido Relatório – que convalida as determinações legais e alinha-se aos estudos do campo da surdez sobre educação bilíngue – somente serão implementadas em sua plenitude na medida em que o Brasil pensar uma

_____. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Relatório do Grupo de Trabalho designado pelas Portarias nº 1.060/2013 e nº 91/2013. Subsídios para a Política Linguística de Educação Bilíngue Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa - a ser implementada no Brasil, 2014. PUYUELO, M.; RONDAL, J. A. Manual de desenvolvimento e alterações da linguagem na criança e no adulto. Porto Alegre: Artmed, 2007. SÁNCHEZ, C.M. La increible y triste historia de la sordera. Caracas: Editorial Ceprosord, 1990. SACKS, O.W. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. SOARES, R. S. Educação bilíngue de surdos: desafios para a http://www.pucsp.br/pos/lael/lael-inf/teses/ Norma%20Wolffowitz-Sanchez_mestrado.pdf” formação de professores. 2013. 137 f. Dissertação (Mestrado). Faculdade de Educação da Usp, 2013. ZAJAC, S. O ensino de língua portuguesa para surdos: novos olhares, novas perspectivas. 2011. 144f. Tese (Doutorado). Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2011.


“A Lei 10.436, de 2002, estipula a Libras como a língua materna dos surdos e a língua portuguesa como segunda língua”

política de formação de professores que também contemple o ensino de língua portuguesa como segunda língua. Lembro, também, que a visão da surdez como deficiência pela área da educação ocorre na medida em que as estratégias pedagógicas se firmam sob a tutela das orientações da medicina. E, para finalizar, ressalto que o uso do termo deficiente auditivo não é inadequado, quando se pretende uma intervenção de (re)habilitação da audição do indivíduo, o que é competência dos profissionais da medicina e da fonoaudiologia. Entretanto, esse termo tem sido largamente utilizado por profissionais das mais diversas áreas, sobretudo os da educação, inclusive usando apenas a expressão “D.A.” (abreviatura de deficiente auditivo). Isso é uma das evidências da forte influência que a área médica tem exercido sobre a educação de surdos por anos, situação que, a duras penas, vem sendo vencida com a emergência da visão sociocultural, que a ela se contrapõe. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este ensaio teve como objetivo fazer uma breve revisão teórica sobre os pressupostos filosóficos relativos à surdez, que implicam nos olhares sobre a educação de surdos. Inicialmente, vimos como a pessoa com deficiência foi tratada nos primórdios da história da humanidade até o início da Idade Média. Esse foi um período sombrio, de não aceitação do diferente, o que culminava até na extirpação da vida dessa pessoa, por não ser considerada humana. Em relação à surdez, vimos que a literatura registra dois pressupostos teórico-filosóficos: o médico-organicista e o socioantropológico. Ambos, com suas variantes, têm definido os diferentes olhares sobre a educação de surdos ao longo da história. O pressuposto médico-organicista está interessado nos aspectos neurofisiológicos no que se refere

à capacidade/incapacidade de audição do indivíduo, indicando-lhe, prioritariamente, o caminho da reabilitação. Tal processo, nesse pressuposto, pode se dar por meio de treino fonoterápico que possibilite a fala oral, a leitura labial e pela amplificação do resto auditivo utilizando aparelhos, implante coclear e outras técnicas/instrumentos modernos na linha das tecnologias assistivas. Já no pressuposto socioantropológico, a surdez é compreendida como diferença linguística. Os autores dessa corrente afirmam que a surdez é assumida pelo próprio surdo como uma posição política, estando tal sujeito consciente de que tem uma diferença linguística e, portanto, faz parte de uma minoria linguística. Nesse pressuposto, já que a surdez é definida com base em quatro diferentes níveis: como diferença política, como experiência visual, como caracterização de múltiplas identidades e como deficiência, esse indivíduo deixa de ser visto apenas como um “deficiente auditivo”, passando a ser reconhecido como um “surdo”. Conforme vimos, tais pressupostos vêm orientando a educação de surdos ao longo dos últimos dois séculos. Concluímos, portanto, que os olhares subjacentes na educação de surdos e, consequentemente, as abordagens e práticas pedagógicas nessa área, estão diretamente vinculados a um ou outro pressuposto teórico-filosófico sobre a surdez, adotado pelas políticas educacionais para esses indivíduos. E, por último, vimos que, no Brasil, as políticas para a educação de surdos devem adotar, por força da Lei 10.436/2002, regulamentada pelo Decreto 5626/2005, práticas de educação bilíngue que estão fundamentadas no pressuposto sócio-antropológico da surdez. Nessas práticas, a Libras (Língua Brasileira de Sinais) deve transitar como língua materna dos surdos (L1) e a língua portuguesa como segunda língua (L2). Dessa forma, atualmente, a inserção da Libras como instrumento de comunicação nas práticas educacionais para os surdos não é uma questão de escolha da escola ou de um ou outro grupo. Pelo contrário, é uma questão legal e, se tal não ocorrer, configura-se numa flagrante ilegalidade, sendo passível de arguição pelo Ministério Público Federal. O Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue – Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa reconhece a necessidade da viabilização de uma educação bilíngue de Surdos. E é o que a maioria das comunidades de surdos espera há anos. Mas, quando e como será possível se efetivar essa política? D+ *Psicólogo, doutorando e mestre em educação, pela Faculdade de Educação da USP, pesquisador na área de educação inclusiva de surdos. É diretor da Revista D+. Revista D+ número 21


POLITICAS PÚBLICAS

CONDIÇÕES DEPLORÁVEIS A Human Rights Watch (HRW) divulgou relatório sobre as pessoas com deficiência em instituições brasileiras que depõem contra a dignidade humana. Milhares de crianças e adultos estão segregados nos abrigos em situações de isolamento e negligência Texto André Kuchar Fotos HRW

“Neiva e Carlos Eduardo com as filhas Silvana e Sofia. Segundo eles, o desenvolvimento das duas só começou quando elas retornaram para casa”


“Flagrante de isolamento em abrigo destinado a crianças com deficiência”

M

uitos até desconfiavam, mas não tinham conhecimento de evidências documentais. Há pouco tempo, porém, a triste realidade veio à tona. No fim de maio, a Human Rights Watch (HRW) – respeitado organismo internacional que atua na defesa dos direitos humanos – divulgou relatório sobre as condições das pessoas com deficiência no Brasil. O documento, fruto de pesquisas em instituições nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, revelou situações que depõem contra a dignidade humana e transgridem leis internacionais e a legislação do país. Milhares de crianças e adultos estão segregados nos abrigos, enfrentando situações de negligência e abusos. O relatório, de 86 páginas, vai além: imagens denunciam que muitas das 19 entidades pesquisadas se assemelham a centros de detenção, com grades nas portas e janelas. Esse cenário de opressão submete as pessoas

SER HUMANO TEM O INERENTE DIREITO À VIDA

“São inúmeras as crianças vítimas de negligência e confinamento”

Governos devem respeitar a dignidade inerente às pessoas com deficiência, reconhecendo-as como pessoas em igualdade de condições com as demais. Isso é o que determina a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo Brasil no Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. “Isso inclui garantir que pessoas com deficiência possam viver de forma independente na comunidade, e não segregadas e confinadas em instituições”, afirma a HRW. Aprovada há três anos, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (nº 13.146/15) tornou crime a discriminação de uma pessoa por sua deficiência. O Artigo 14, que versa sobre liberdade e segurança, estabelece que as pessoas “não sejam privadas ilegal ou arbitrariamente de sua liberdade e que toda privação de liberdade esteja em conformidade com a lei”. O mesmo artigo ainda ressalta que “a existência de deficiência não justifica a privação de liberdade”. E que se as pessoas com deficiência forem privadas de liberdade mediante algum processo, os “Estados-Partes devem dar garantias”, conforme estabelece o Direito Internacional dos Direitos Humanos. Já o Artigo 10, reafirma que “todo ser humano tem o inerente direito à vida e os Estados Partes tomarão as medidas necessárias para garanti-la”.


POLITICAS PÚBLICAS

“Condições desumanas foram observadas pela Human Rights Watch”

com deficiência a condições deploráveis. O cenário encontrado é de cômodos lotados com camas enfileiradas e pessoas isoladas. Algumas entram nas casas de acolhida ainda crianças e lá permanecem até o fim da vida. Trata-se de um processo de institucionalização das pessoas com deficiência. A reportagem da Revista D+ contatou algumas instituições do estado de São Paulo e até mesmo pessoas que passaram longos períodos de suas existências em entidades. Apenas uma delas se pronunciou, a Casa de David (ver nota a seguir). A partir dos 171 depoimentos colhidos pela HRW entre pessoas com deficiência, familiares, funcionários das unidades assistenciais e autoridades governamentais de vários escalões, as conclusões são preocupantes. “Esses cidadãos não têm controle sobre as próprias vidas. O governo brasileiro precisa garantir apoio para que pessoas com deficiência possam viver em sociedade”, escreve Carlos Rios-Espinosa, autor do trabalho e diretor da Human Rights Watch. O documento afirma que na maioria das instituições, são oferecidas apenas condições básicas de alimentação e higiene. “A maioria dos adultos e crianças com deficiência tinha poucos itens pessoais ou nenhum. Em alguns casos, os residentes compartilham roupas e até escovas de dente. Muitas pessoas estão confinadas em suas camas ou quartos durante as 24 horas do dia”, informa Rios-Espinosa. “Há poucas oportunidades de contato relevante com a comunidade e desenvolvimento pessoal. Situações críticas são enfrentadas, algumas pessoas são amarradas nas camas após receber sedativos para controle de comportamento, algo inadmissível”, acrescenta.

“Menino em abrigo na Bahia. Ambientes precários foram observados no Rio e em São Paulo também”

“Situações que ferem a dignidade humana são frequentes”


Em outro trecho, o relatório reconhece a gravidade da situação e faz uma recomendação. “Embora o Brasil conte com programas de adoção e acolhimento familiar, essas opções devem ser melhor desenvolvidas para incluir crianças com deficiência”, propõe. Para Rios-Espinosa, a visão que predomina na sociedade colabora para essa situação. “Existe uma crença enraizada de que algumas pessoas com deficiência precisam viver em instituições”, comenta. “Trancar pessoas é uma das piores formas de exclusão social e discriminação. É ato desumano.”. Em relação ao isolamento, o diretor da HRW analisa o procedimento previsto para certos casos. “No Brasil, juízes determinam a institucionalização de uma criança em casos excepcionais: quando ela está em risco de abandono, negligência ou violência. E não há soluções alternativas possíveis. Crianças com deficiência acabam em instituições por muito mais tempo que o limite legal, de 18 meses, ou indefinidamente”, complementa. D+

“Menino com deficiência se encolhe por conta do frio. Muitas vezes faltam peças básicas, como roupas e cobertores”

“Existe uma crença enraizada de que algumas pessoas com deficiência precisam viver em instituições. Trancar pessoas é uma das piores formas de exclusão social e discriminação” Carlos Rios-Espinosa, diretor da Human Right Watch.

CASA DE DAVID SE PRONUNCIA

“Na maioria dos casos, a melhora veio com a volta ao ambiente familiar”

A coordenadoria de Comunicação da Casa de David encaminhou a seguinte nota: “A instituição não tem nenhuma comparação com o que foi divulgado na mídia. O trabalho aqui realizado, além de muito profissional, é estabelecido também com base no amor, no respeito e na dignidade das pessoas que estão sob nossos cuidados. Afinal já vieram com grandes histórias de abandono e descaso familiar. Nosso atendimento é totalmente humanizado. O trabalho que realizamos está distribuído entre uma equipe de 520 funcionários, composta por médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, psicólogos, dentistas, nutricionistas, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, educadores físicos, assistentes sociais, além de área de apoio e administrativa. As atividades são realizadas diariamente por meio dessas equipes, com aproveitamento máximo das potencialidades de cada assistido.

Revista D+ número 21


DIREITO E CIDADANIA

CONFRONTO DE VARIEDADES

Montadoras têm oferecido muitas opções de carros adaptados. Pesquisar o mercado e checar o tempo de entrega do produto são condições indispensáveis para um bom negócio. Texto Márcio Gonçalez

A

nova gama de veículos oferecidos pelas montadoras vem deixando o público de pessoas com deficiência, que tem direito e faz jus aos seus benefícios fiscais, com grande indecisão na escolha do próximo automóvel. Isso se deve ao fato de diferentes marcas oferecerem vantagens diversas de produtos. Além disso, o consumidor não consegue distinguir o preço dos produtos oferecidos. Com isso, as vantagens ficam escondidas, causando grande conflito na escolha. Analisamos abaixo algumas marcas e veículos, com a intenção de ajudar e facilitar na sua escolha: Vejamos por exemplo os veículos SUVs (do inglês Sport Utility Vehicle, veículo utilitário esportivo) pretendido pela maioria do público. Nesse quesito, deparamos com algumas dificuldades. A marca Hyundai Creta, que tem grande procura, está programando a entrega em média em quatro meses, e o produto pode vir sem alguns opcionais. Outro detalhe é que só oferecem as cores preto e branco na versão adaptada; outra oferta interessante é o Kicks, da Nissan, com as suas cores variadas, um pouco mais de opcionais e que também está demorando em média quatro meses para entrega. Outras opções atraentes são os SUVs da montadora Renault, com seu carro chefe Duster, que passou a ser substituído pela Captur. A montadora, como nos casos supracitados, tem sentido grande dificuldade nas

entregas ultimamente. É preciso checar nas concessionárias qual seria o prazo prometido pela montadora. Podemos dizer que entre os SUVs, a Duster é a que tem o melhor preço, embora os opcionais não sejam tão completos como em outros modelos. Não podemos deixar de citar o Jeep Renegade, veículo bem aceito pelo segmento, com a sua motorização 1.8 e opcionais à altura de todos da categoria. Porém, o porta-malas é pequeno. Fato a favor: a entrega pela montadora, estipulando um prazo de 45 a 90 dias para o cliente ter acesso ao produto. Recentemente, recebemos um e-mail sugerindo a inclusão de mais um SUV na lista dos mais procurados, o famoso Ecosport da Ford, com o seu valor na faixa dos demais concorrentes. O quadro é parecido com a do Jeep Renegade. Seu porta-malas é um pouco menor, mas a montadora aposta na agilidade da entrega. Segundo informações, o prazo aproximado é de 30 dias, sendo uma ótima opção para quem tem pressa. Outros carros também procurados são as versões Sedans, dentre as quais podemos citar: o Versa, da Nissan, e os modelos Spin, Prisma, Cobalt, estes da montadora GM. Temos que falar também dos últimos lançamentos da Fiat: Cronos 1.3 automatizado e a versão 1.8 automático. A montadora aposta nos dois veículos, tanto para a economia (versão com motor 1.3), quanto para uma versão mais sport (versão com motor 1.8).

Não podemos esquecer de citar a marca Honda, pioneira em oferecer os benefícios fiscais para o público com deficiência. Dentre seus modelos, podemos destacar o SUV HR-V que, apesar de ter preço acima dos R$ 70 mil (acima do teto, perdendo a isenção de ICMS e do IPVA), nunca deixou de atender às expectativas de seu público. Podemos, ainda, citar os seus Sedans, City e Fit, esses, sim, com todos os benefícios fiscais inclusos. Para finalizar, além de todos os veículos mencionados, existe o tão esperado e muito desejado lançamento da montadora Toyota, o Yaris, lançado no dia 28 de junho deste ano em todas as lojas da marca. Vale a pena conferir. Mais informações sobre o assunto para aquisição de veículos com benefícios fiscais acessemwww.cnhdeficientesp.com.br ou www.novaflexisencao. com.br – 11 9 7768 4060.

Márcio Gonçalez Lopes é Diretor da NovaFlex Isenções e Assessoria, especializado em isenções para pessoas com deficiência e taxistas, há 12 anos.



PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA SURDOS: DESAFIOS E POSSIBILIDADES texto Silvana Zajac* colaboração: Samuel Ávila fotos Divulgação e Shutterstock

“No Brasil, sob o aspecto visual,o registro escrito faz parte da vida do sujeito Surdo desde a infância”


A

discussão sobre surdez, educação e o ensino de língua portuguesa vem sendo ampliada nos últimos anos por profissionais envolvidos com a educação de surdos, como também pela própria comunidade surda. Assim, a educação e inserção social dos surdos constituem um dos sérios problemas enfrentados por essa comunidade, para os quais muitos caminhos têm sido seguidos na busca de soluções. A oficialização da Libras - Língua Brasileira de Sinais pela Lei n. 10.436, de 24 de abril de 2002, começa a abrir alguns caminhos. Nesse sentido, o pesquisador Carlos Skliar diz que a língua de sinais constitui o elemento identificatório dos surdos, e o fato de se constituir em comunidade significa que compartilham e conhecem os usos e normas da mesma língua, já que interagem cotidianamente em um processo comunicativo eficaz e eficiente. Isto é, desenvolveram as competências linguísticas, comunicativa e cognitiva por meio do uso da língua de sinais própria de cada comunidade de surdos. No entanto, a oficialização da Libras e o uso desta língua pela comunidade Surda ainda não garante o acesso à informação, tampouco a constituição de um sujeito cidadão, agente de transformação social. Isso será possibilitado por uma educação de qualidade que desenvolva habilidades e competências que mobilizem o indivíduo para conquistar uma “posição social” não atrelada à condição econômica, mas, sim, ao papel que o indivíduo desempenha dentro de uma organização social. Nesses termos, o letramento traz uma ideia muito interessante, pois, vai muito além do processo de alfabetização. Ele não se limita somente ao ensino da leitura e da escrita, mas dá condição ao indivíduo de se relacionar de maneira diferente com seu meio social e cultural. A pessoa passa a se apropriar dos diversos gêneros e tipos de leitura e escrita e usa-os a seu favor. Nesse sentido, Magda Soares define Letramento como um “estado ou condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e exerce as práticas sociais que usam a escrita.” Assim, podemos afirmar que o ensino da leitura e da escrita não são tarefas apenas do professor de língua portuguesa, mas sim, devem ser ensinadas em todas as disciplinas, pois, cada área do conhecimento utiliza gêneros e tipologias textuais distintas e a leitura e escrita destes textos precisam ser ensinadas pelos professores dessas áreas. Desta maneira, é de suma importância que todos os professores, além de conhecerem a singularidades dos seus alunos, tenham conhecimentos acerca dos conteúdos, comportamentos e estratégias de leitura e escrita. Contudo, essa não é tarefa fácil e alguns desafios, de diferentes naturezas, precisam ser enfrentados: A falta de conteúdos produzidos em Libras coloca o Surdo em uma condição de acesso ao conhecimento

desigual em relação ao ouvinte. Esse fato o coloca também em uma desvantagem de significados linguísticos. Nesse caso, é importante salientar que esse não é um problema originado na língua de sinais, mas sim, na posição de desvalorização que ela ocupa na sociedade. Os materiais para o ensino de português para estrangeiros, na sua maioria, são elaborados pautados em abordagens com ênfase na forma, com memorização de vocábulos e manuseio de estruturas gramaticais. Há uma grande carência de atividades que estejam voltadas para uma abordagem comunicativa, com ênfase no uso da língua e tarefas com textos autênticos, como por exemplo, revistas, jornais, encartes de propagandas, bilhetes etc. A falta de materiais e pesquisas para o ensino de língua portuguesa para Surdos exige do professor um esforço muito maior para o planejamento das aulas e para a criação de materiais inteligentes, dinâmicos, criativos e interativos. A tradição voltada para a valorização do ensino da gramática desenvolveu uma cultura escolar, levando professores a reproduzir um ensino que gera uma falta de sentido para a “língua” apreendida pelos alunos Surdos. Desconstruir essa tradição não é tarefa fácil. O trauma do aprendizado da língua portuguesa oral, por Surdos, em ambientes clínicos, com métodos fonoarticulatórios, produzem uma rejeição a essa língua. O fato de elencar os desafios no ensino e na aprendizagem da língua portuguesa para Surdos nos permite a reflexão sobre as possibilidades de transpor os limites nesse processo. Além disso, é preciso compreender que os recursos tecnológicos podem ser grandes aliados do professor. Diferentemente de aprendizes estrangeiros, os Surdos brasileiros nascem e convivem em uma cultura construída na língua portuguesa e essa é a língua de circulação na comunidade em que vivem, ou seja, do ponto de vista visual o registro escrito faz parte da vida do sujeito Surdo desde a infância.

“A oficialização da Libras não garante o acesso à informação da comunidade Surda. Isso será possibilitado por uma educação de qualidade, que desenvolva habilidades e competências” Revista D+ número 21


ENTREVISTA PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

“As tecnologias assistivas, como o Tablet, podem e devem ser usadas”

“A leitura possibilita ao Surdo utilizar conhecimentos de forma funcional e crítica, nos diversos contextos sociais”

SAIBA MAIS: SCHNEUWLY, B.; DOLZ, J. Gêneros orais e escritos na escola. [Tradução e organização Roxane Rojo e Glais Sales Cordeiro] Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004, p. 95 – 128. SKLIAR, C. Surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre/RS: Mediação, 1998. SOARES, Magda. Linguagem e Escola – uma perspectiva Social. 17 ed. São Paulo: Ática, 2005. SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

Essas e outras possibilidades e desafios nos levam a uma perspectiva diferente no ensino e aprendizado da língua portuguesa por Surdos. Perspectiva que extrapola as estruturas formais da linguagem e orienta o trabalho da sala de aula em torno do uso da língua, ou seja, do ensino da leitura, da escrita, do discurso e da gramática, compreendida como uma prática de reflexão sobre a língua e seus usos. Isso levará à instrumentalização dos alunos, possibilitando-os a utilizar esses conhecimentos de forma funcional e crítica nos diversos contextos sociais. D+

* Silvana Zajac é professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Depto. Ciências Exatas e da Terra, doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (Lael/PUCSP) e mestra em Educação (Unimep).


Revista D+ nĂşmero 21


BELEZA

Cuidado e proteção

POR UMA PELE LINDA E RELUZENTE Texto Brenda Cruz

Fotos Arquivo pessoal e divulgação

“A professora Lara Santana tem rotina de cuidados e proteção com a pele constantes, começando pelo banho”

DICA DO ESPECIALISTA “No inverno, a tendência é tomarmos banhos mais quentes e demorados, além de diminuirmos a ingestão de água. Também transpiramos menos. Tudo isso contribui para uma pele mais ressecada. Algumas regiões do corpo são mais críticas na questão do ressecamento, são elas as axilas, genitais e pés. Já que o banho é mais quente nessa época do ano, o ideal é fazer com que ele seja mais rápido. Sempre, sem exceção, escolher um hidratante sem muito cheiro e cor para hidratar da pele; além da hidratação externa, também é importante não esquecer o protetor solar, mesmo nos dias sem sol. É fundamental manter a ingestão de água diariamente. Outra recomendação valiosa é extinguir buchas, principalmente a vegetal, nas quais há uma grande proliferação de germes. Não se esquecer de tirar a maquiagem no final do dia, com produtos não abrasivos. Evitar esfregar muito a toalha para secar corpo e rosto. Todos esses cuidados manterão sua pele saudável e bonita”, indica a dermatologista, doutora Íris Flório.

L

ara Souto Santana tem 32 anos, é formada em Letras, fez especialização na área de humanidades com foco em pedagogia, educação e arte. Atua hoje como professora da rede pública e também como coordenadora de desenvolvimento de programas na Secretaria Estadual da Pessoa com Deficiência. Com baixa visão, por ocorrência do nascimento prematuro,, Lara conta que adora ler, viajar, ir em exposições e teatros. Seu mais novo hobby é a corrida e está sempre em movimento. Sua rotina de cuidados e proteção com a pele já começa no banho, com uma esfoliação, depois a hidratação do corpo. Ela, que usa muita maquiagem, conta que não abre mão do protetor solar, hidrante e da água termal. “A importância da hidratação, para a gente que tem deficiência visual, é essa coisa do toque, que é super importante. Sempre é bom sentir a pele lisinha”, conta Lara. D+


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1. Guerlain traz seu Orchidée Impériale Eye And Lip Contour. Durante o dia: O creme hidrata, suaviza e melhora lindamente a área dos olhos e da boca. Durante a noite: Cheia de ingredientes ativos ultrapoderosos, desintoxica a área particularmente sensível. Sinais de cansaço desaparecem e a região do olhar fica com aparência descansada. Ele também visa às pequenas manchas localizadas em torno dos olhos, melhorando o aspecto da pele. R$990 2. O Hidratante Corporal Amêndoas da Mahogany promove uma envolvente e deliciosa hidratação perfumada. O óleo de amêndoas doces, rico em colágeno e elastina, é responsável por conferir firmeza e maciez à pele. R$48 (350ml)

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3. Manjericão apimentado e tomilho branco aromatizado dão um toque surpreendente ao aroma de limões em uma brisa caribenha. Esse é o Lime Basil & Mandarin Body Crème da Jo Malone. Um clássico moderno. Body Creme tem como seus ingredientes condicionantes óleos de semente de jojoba, de cacau e amêndoa doce, que ajudam a hidratar, nutrir e proteger a pele. R$140 (50ml) 4. Nivea Creme, o tradicional creme da latinha azul contém fórmula com alto teor de Glicerina e Eucerit®, um exclusivo ingrediente hidratante natural para a pele, que proporciona uma hidratação completa. O produto pode ser utilizado em diversas partes do corpo. R$ 18,50 (56g)

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5. O Creme Facial Suave Karité da L’OCCITANE tem textura fina e não gordurosa. É formulado com 5% de manteiga de karité para atender às necessidades essenciais de peles normais a mistas, mesmo as sensíveis. Com hidratação duradoura, a pele fica flexível e macia. Protegida contra agressões externas, mantém-se confortável o dia todo. R$212 (50ml)

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6. Aquapele Máscara Quinoa e Amaranto da Árago é uma máscara facial com ação restauradora e hidratante, indicada para peles desidratadas. Mantém a hidratação da pele por muito mais tempo por meio da ativação dos canais de Aquaporinas. R$ 154. (100g)

7

7. Com textura leve e absorção imediata, a Loção Hidratante Corporal da Eudora, proporciona hidratação por 30 horas, deixando a pele macia e levemente perfumada. R$31,99 (200ml) 8. Creme Hidratante Pele Extra Seca Uréia da Mohda possui fórmula com o poder emoliente dos Óleos de Amêndoas e de Girassol, aliado a ação nutritiva da Vitamina E, e ao efeito altamente hidratante da Ureia. Ideal para uso diário, o produto auxilia no cuidado com a pele, mantendo-a saudável, nutrida e suave ao toque. R$6 (100g)

8 Revista D+ número 21


BELEZA

Sempre na moda

No inverno, aposte na mescla de cores neutras com vibrantes e listras Texto Brenda Cruz

“Haliton Vieira é modelo e trabalha com eventos: “minha deficiência não me limita em praticamente nada”

Fotos Editorial Aria Modas e divulgação

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modelo e Mister cadeirante de Asa Sul, Haliton Rodrigues Vieira, de 21 anos, conta que tem um estilo um tanto complexo. E prazer em se vestir bem com a peça escolhida. “Gosto de calças jeans e camisas, de preferência apertadas. Roupas claras sempre, e uma queda por blazers com calça jeans clara”, conta o modelo. Há quatro anos, no interior de Minas Gerais, Haliton sofreu um acidente de moto e teve lesão medular, que o tornou paraplégico. Após o ocorrido, deixou o interior de Minas rumo a São Paulo e hoje mora em Brasília – DF. “Minha deficiência não me limita de fazer praticamente nada, trabalho com moda, com eventos, viajo muito, me divirto, e amo tudo isso que faço. Ser modelo e trabalhar com eventos é maravilhoso, minha deficiência me dá mais força de vontade para correr atrás disso”. Para os looks de inverno aposta em cachecóis. “Acho muito chique”, revela, e ainda complementa o look. “Uma peça que também acho interessante são as jaquetas. São simples e descoladas ao mesmo tempo, fácil de vestir, te protegem bem e fica super bonito.” DICA DO ESPECIALISTA “O xadrez tem sido muito utilizado em camisas, casacos, calças de alfaiataria. Principalmente aquele xadrez maior. Listra e camuflado também estão super em alta. Os homens estão mais ousados. Antes eles usavam pouca estampa, mas hoje, acabam aderindo bastante até em cachecóis e sapatos. A blusa de gola alta mesclada com outras peças ou em sobreposição com camisas e jaquetas também é uma tendência para esse inverno. Tons mais sóbrios fazem sucesso nessa época, mas recentemente a intervenção de tons mais vibrantes, como o vermelho, mesclado com cinza ou preto, tem sido muito usada. O blazer pode ser considerado coringa na composição dos looks, pois é uma peça de inverno bastante versátil, já que vai bem tanto com uma T-shirt branca e um jeans, quanto com uma calça social em um look mais formal”, indica Lilian Marrul, estilista da marca Evidence Ballet. D+ Haliton veste Aria Modas, empresa que cria e fabrica peças adaptadas para pessoas com deficiência. Confira os looks em: www.ariamodainlcusiva.com.br


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1. Tênis casual Iódice. R$298,00 2. Camisa xadrez, Docthos. R$299,90 3. Casaco Riachuelo. R$99,90 4. Moleton Fechado Simpsons, Piticas. R$ 149,90 5. Sapato Timberland. R$399,99 6. Cachecol, VIKO. R$59,90 7. Parka Riachuelo. R$ 299,90 8. Moleton BLUE STEEL, Renner. R$159,90

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Revista D+ número 21


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VAMOS COMPLETAR?

A Revista D+ traz uma novidade nesta edição: uma cruzadinha com o alfabeto da Língua Brasileira de Sinais (Libras). O desafio está lançado! Ilustração Luis Filipe Rosa



ESPAÇO DA LIBRAS LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS

Uma Língua tão expressiva: A função das Expressões Não-Manuais na Libras

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Parâmetro da Libras que, talvez, exija mais desinibição do sinalizante é a Expressão Não-Manual (ENM). Apresentando diversas funções na Língua, a expressão permeia a comunicação, quer por razões gramaticais, quer por razões afetivas. É muito comum que, na observação de surdos se comunicando, ouvintes estranhem as expressões que parecem de intensidade maior do que se tem como padrão. A afirmação “eles são muito expressivos” e a suposição “acho que estavam discutindo” não são raras. Para se compreender como esse Parâmetro ocorre durante a sinalização, será preciso que se entenda alguns de seus papéis. As expressões usadas na Libras costumam ser divididas em expressões feitas pela face (Expressões Faciais) e expressões feitas pelo corpo (Expressões Corporais). Uma das funções da ENM é apresentar distinção. O sinal “CANSADO” (figura 1), por exemplo, apresenta uma Expressão Facial de alguém que se encontra exausto, ao mesmo tempo em que a Expressão Corporal demonstra fraqueza. Diferente do sinal de “CANSADO”, o sinal de “MAGOADO/CHATEADO” (figura 2) apresenta uma expressão de tristeza, mantendo todos os demais Parâmetros. Há, ainda, algumas expressões peculiares que, normalmente, são tratadas como Expressões Faciais. Serão chamadas, aqui, de “Expressões Cranianas” para que não se confunda a contração dos músculos da face com os

Especialista em Dialética da Língua Portuguesa (UnG), Bacharel em Letras/Libras (UFSC/Unicamp), Graduado em Letras-Português/Inglês (UnG), Professor e Orientador de cursos (IST) e Intérprete de Libras (FIRB)

* Para participar com perguntas e sugestões, escreva para contato@revistadmais.com.br

Figura 1

Ilustrações Luis Filipe Rosa

André dos Santos Silva


movimentos feitos pelo crânio. Na Libras, quando se faz uma pergunta para a qual a resposta pode ser afirmativa ou negativa como “SIM” ou “NÃO”, a região da testa é levada levemente para frente, como se pode observar no sinal “GOSTA?” (figura 3). No caso de uma pergunta cuja resposta seja diferente de uma afirmação ou uma negação (como uma explicação, por exemplo), o queixo é levado levemente para frente, como se pode notar no sinal “POR QUÊ?” (figura 4). Em ambos os casos, as sobrancelhas exprimem o questionamento, ao mesmo tempo que o crânio se movimenta de acordo com o tipo de pergunta. Entre os ouvintes e os surdos brasileiros, as negações com o crânio costumam ser feitas com um movimento horizontal, fazendo com que a face vire para ambos os lados alternadamente, enquanto que as afirmações com o crânio costumam ser feitas com o movimento vertical para cima e para baixo, alternadamente. Essa convenção cultural não acontece da mesma maneira em todos os lugares. Em 2013, uma surda chamada Evelina Gaina publicou em seu canal um vídeo chamado “Bulgaria’s Headshake Meaning”, em Gestuno (Língua de Sinais Internacional) contando sua experiência em um restaurante búlgaro. Ela relata que o movimento horizontal que usamos para “sim” significa “não” lá na Bulgária e que o movimento que os búlgaros fazem para o “sim”, chacoalhando a cabeça, é um tanto distinto. Esse movimento

Figura 2

não é usado aqui no Brasil. O significado de uma “Expressão Craniana” pode ser, então, não só de determinada Língua de Sinais, mas também da comunidade em que os usuários dessa Língua se encontram. Pode-se notar, então, que as expressões estão presentes na comunicação todo o tempo. Na língua portuguesa a entonação pode afirmar ou questionar em Orações como “Você conhece bem o caminho!” e “Você conhece bem o caminho?”. Essa propriedade da entonação, no caso das Línguas de Sinais, é percebida nas expressões. Por elas, pode-se exprimir ordem, ironia, surpresa etc. Elas ainda podem mostrar quantidade, forma, intensidade, tempo de duração (aspecto) entre outros. Assim, percebe-se outras funções das expressões e, como vimos, diversas delas podem acontecer simultaneamente. Os autores Weil e Tompakow (2011) têm um interessante trabalho, explorando as mensagens que o corpo pode externar por meio da linguagem corporal. Eles mostram como diversas partes do corpo podem trabalhar isoladas ou em conjunto, produzindo significados. Nas Línguas de Sinais, essa linguagem é bastante explícita e as expressões têm uma parte fundamental na comunicação. Saber utilizar esse Parâmetro em diferentes contextos, como na poesia, música, contação de história ou no teatro, pode garantir melhor comunicação da mensagem que se pretende levar ao surdo. D+

Figura 3

Figura 4 Revista D+ número 21


APRENDA LIBRAS por Flaviana Borges da Silveira Saruta e Joice Alves de Sá ilustrações Luis Filipe Rosa Colaboração Carolina Gomes de Souza Silva

A Copa do Mundo É AQUI!

O evento da Rússia está movimentando o país de norte a sul, de leste a oeste. Nesta edição, exploramos algumas expressões relacionadas à Copa, além dos nomes dos países que foram adversários do Brasil na fase de grupos. Divirtam-se e comuniquem-se!

Jogadores

Copa do Mundo


Troféu da Copa do Mundo

Costa Rica

Futebol

Suíça

Rússia

Sérvia

Brasil Revista D+ número 21


CEREJA! Camilla Asanuma comanda a discotecagem em um evento. Ao lado, com o marido Anderson e outro amigo DJ cego, Emerson

NO RITMO!

Anderson Farias não só pratica a discotecagem, como também ensina outros cegos a se formarem DJs

texto Brenda Cruz fotos Arquivo pessoal

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que seria de nós em uma festa se não fossem os DJs? Os donos do ritmo e das mixagens, que fazem qualquer um, mesmo aqueles menos habilidosos, balançar o corpo para lá e para cá. Anderson Farias tem esse talento desenvolvido, desde muito jovem. Anderson nasceu com glaucoma e teve baixa visão até os oito anos, quando acabou por perdê-la totalmente. Hoje, aos 40, é formado em Gestão de Eventos e atua em algumas frentes dentro desse nicho, como captação de recursos, organização de festas e palestras. Atua nesse mercado desde 2005 e em 2013, com a intenção de disseminar o conhecimento sobre o mundo DJ, lançou o primeiro curso de discotecagem voltado para cegos. “Formei 31 alunos, alguns vieram até de fora de São Paulo. Pessoas de Goiânia, Curitiba, Campinas e Jundiaí”, conta. Seu maior feito, segundo ele, foi ter participado do Tour da Tocha Paralímpica na Rio 2016, no qual era o DJ contratado de uma grande marca, responsável por encerrar cada dia do revezamento. Anderson considera um dos maiores desafios na formação de um DJ a dedicação. “Diferente de um aluno com visão, o aluno cego nunca pode ver os equipamentos pela internet ou pela televisão, ou seja, tudo funciona no tato. É preciso pegar a mão do aluno e ir explicando para que serve cada botão (controle) no mixer, no CDJ. Depois é que passamos para a parte técnica, também imprescindível”, explica. PARCEIRA Camilla Harumi Asanuma, 39 anos, é cega devido ao nascimento pré-maturo. Ela, que é formada em assistência social, psicologia e gestão de eventos, trabalha como DJ há 10 anos, mas começou sua formação duas décadas atrás. Um

sonho adolescente que só virou realidade quando conseguiu, após completar 18 anos e entrar na faculdade, fazer o curso que a tornaria, em 1997, a primeira DJ cega do Brasil. Sua formação não foi fácil, faltavam adaptações necessárias, havia desconfianças de terceiros. Mas, ao ouvir do professor que se ela não conseguisse acompanhar o curso, devolveriam o dinheiro, terminar virou questão de honra. “Mesmo sem material adaptado, mesmo sem um lugar pra treinar. Os colegas de sala não se aproximavam de mim pra conversar, para trocar ideias. Então eu não tinha ninguém por mim. Consegui a formação, apesar de tudo”, conta Camilla. Em 2007, Anderson e Camilla se conheceram. E ela, que estava fora desse mundo desde o término do curso, começou a trabalhar com Anderson, criando a dupla DJ’S Unidos, os primeiros DJs cegos do Brasil. Ora trabalham juntos, ora em dupla, ou ainda individualmente. Casados há nove anos, a dupla já deixa no pequeno Gabriel, de 5, a paixão pelo universo da música. Obstáculos e preconceitos por vezes acontecem, ressalta Anderson. Em uma determinada situação, uma dona de bufê disse a eles que não teriam capacidade de comandar uma festa em seu salão.“O mundo dá voltas, aconteceu de um outro DJ deixá-la na mão, e fomos chamados às pressas para cobrir um buraco”, revela. Anderson ainda fala sobre acessibilidade nesse meio. “É importante divulgar também o projeto de tecnologia assistiva, chamado BlinDJ, que consiste em uma ferramenta de acessibilidade para que nós possamos utilizar um software de mixagem, marcando de vez a nossa entrada no mundo da discotecagem digital”, finaliza. Acompanhe Anderson, Camilla e sua equipe em: facebook.com/cafeventos1 e youtube.com/cafeventos. D+



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