Revista D+ edição 8

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O AUTISMO  Novo Caderno de Educação estreia com as melhores experiências de ensino

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MICROCEFALIA X ABORTO Você é contra ou a favor? O feto com deficiência no epicentro da discussão

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RESPEITO ÀS DIFERENÇAS Visitamos a multinacional Novartis para conferir a acessibilidade e as práticas inclusivas

NÚMERO 08 • PREÇO R$ 13,90 ISSN 2359-5620

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A mulher com deficiência numa sociedade preconceituosa: conheça a história de sete mulheres que tomaram as rédeas de suas próprias vidas

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NA REDE

::::::revistadmais.com.br:::::::::::::::::::::::::: INCLUSÃO Todo dia é dia Todos os dias, a Equipe D+ traz para o site novidades importantes e curiosidades na área da inclusão social. Na página da Revista D+, na web, você fica por dentro de serviços, agenda cultural, lançamento de produtos nacionais e internacionais em benefício da pessoa com deficiência, leis e muitas outras informações úteis.

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“Linda a revista impressa, de excelente material. Site acessível a todos os públicos. Parabéns!” Carlos Silvério - São Paulo, SP

MAIS ACESSIBILIDADE Conteúdo em Libras No site, você conta com vários recursos para tornar sua interação com a revista cada vez mais possível e prazerosa. Além de alternar o alto contraste de cores e o tamanho da fonte, você também pode assistir às matérias em Libras.

CONEXÃO Você vai encontrar em algumas reportagens o símbolo acima, o QR Code. É muito simples: baixe um leitor de QR Code em seu celular. Daí é só passar o visor sobre o código e, automaticamente, você será direcionado a uma página com conteúdo especial. Este aí de cima levará você a uma matéria exclusiva sobre a inclusão social no Carnaval. Aproveite! ESCREVA PRA GENTE::::::::::::::::: Se você quer muito ler sobre determinado assunto na Revista D+, escreva-nos e dê suas sugestões. A redação está disponível em jornalismo@revistadmais.com.br.

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INSPIRAÇÃO Boas dicas para você! No site você sempre encontrará sugestões de viagens e lugares acessíveis para um bom passeio, como o Museu de Arte Moderna (MAM), de São Paulo. Sua ampla arquitetura adaptada permite que pessoas com deficiências físicas, pessoas cegas e surdas participem das atividades culturais, como cinema com legenda e audiodescrição, acervo tátil entre outros.

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número 8 - março/abril


EDITORIAL

Elas e nós

C Edição nº 8: fotos de capa e reportagem por Marcelo Spatafora e edição de fotos por Manoel Araújo

ada vez que uma delas chegava para o ensaio fotográfico, era uma festa! Foram dois dias recebendo pessoas ricas em histórias e batalhas. E sorrisos, muitos deles. As sete mulheres selecionadas para a especialíssima reportagem de capa são, caro leitor, grandes personagens da vida real: sem máscaras, sem artifícios nem vaidade travestida de heroísmo. São mulheres muito verdadeiras diante de suas próprias tragédias pessoais, assim como em suas lutas diárias, nas pequenas e imensas vitórias. Como diria Caetano em Dom de Iludir, “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Em edição tão especial para nós – nosso aniversário de 1 ano! –, não poderia haver companhias melhores. Já que se trata de um número especial, a revista deste mês vem com muitas novidades. O Caderno de Educação, que estará presente em todas as edições a partir de agora e trará um tema em cada uma delas, estreia abordando o autismo. Neste novo espaço, de 12 páginas, você encontrará tudo sobre o assunto e as melhores práticas educativas para crianças e jovens nessa condição. Também pela primeira vez na Revista D+, uma reportagem sobre gastronomia, na editoria Garfo & Faca e a seção Psique, em que traremos um psicólogo por edição abordando temas importantes para as pessoas com deficiência e para quem com elas convive. Outra novidade é a Por dentro das grandes: visitaremos uma grande empresa a cada vez para conferirmos de perto quais são suas práticas de acessibilidade e respeito para com as pessoas com deficiência. Nossa primeira experiência foi na multinacional farmacêutica Novartis. Você confere a partir da página 22. É com enorme prazer que apresentamos os Super Normais, na página 48: um grupo de amigos que traduz em autênticas histórias em quadrinhos questões importantes da inclusão social. Eles serão nossos parceiros a partir de já! Nas próximas edições da revista, você poderá conferir estas tirinhas super inteligentes. Uma de nossas entrevistadas da matéria de capa, a advogada e cega Thays Martinez, nos contou a seguinte passagem de sua história de vida: “Eu brincava de esconde-esconde na praia! Escondia-me onde desse: entrava nas casas, pulava muro... É claro que eu não ia correr sozinha, mas eu dava a mão para outra criança e ia junto. Isso foi tão importante, porque me deu a clara ideia de que eu posso fazer tudo o que as outras pessoas fazem desde que tenha algum tipo de adaptação. E às vezes é muito simples: é só dar a mão para outra pessoa”. A revista se identifica muito com essas palavras. Sozinhos, os passos seriam claudicantes. É por isso que agradecemos profundamente a todos aqueles que, de diversas maneiras, de acordo com suas próprias condições, correram e pularam muros com a gente ao longo deste primeiro ano. Estender a mão para o outro é a nossa grande saída como seres humanos. Ótima leitura! Rúbem Soares


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DO LADO DE CÁ

Nos bastidores da D+ Conheça os profissionais que colaboraram para deixar esta edição de aniversário ainda mais incrível (e para completar, três de nossas personagens de capa naquele “momento fofura”) Manoel Araújo, Diretor de Arte

Brenda Cruz, da equipe de Jornalismo

Cintia Alves, da equipe de Jornalismo As bem-humoradas irmãs Adriana e Mila Poci Cabral retocando o batom!

Em pé: Ilka Rehder, estagiária; Andrezza Silva, assistente de fotografia e Marcelo Spatafora, fotógrafo. Sentada: Taís Lambert, Editora-Chefe

Renata Lins, da equipe de Jornalismo Rosa Buccino, Editora do Caderno de Educação Claudine Davids, Assessora de Projetos Pedagógicos

Denílson G. Nalin, da Publicidade

Letícia Karoline da Conceição, da equipe de Revisão

Nathalia Henrique, da equipe de Audiovisual

Mariana Santos, jornalista; Taís Lambert, Monanelly Silva, assistente; Marcelo Spatafora, Thays Martinez, uma de nossas personagens de capa e seu cão guia, o adorável Diesel

Eliza Padilha, da equipe de Revisão

Jéssica Aline Carecho, da equipe de Audiovisual



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NOSSA CAPA 38

DIRETOR Rúbem da S. Soares rsoares@revistadmais.com.br Assistente Larissa Gomes de Souza REDAÇÃO Editora-Chefe Taís Lambert taislambert@revistadmais.com.br Diretor de Arte Manoel Araújo manoelaraujo@revistadmais.com.br Equipe de Jornalismo Brenda Cruz Cintia Alves Renata Lins

Sete mulheres com deficiência e seu protagonismo diante da vida: nem uma sociedade preconceituosa segura essas meninas

Faça parte desta campanha. Use:

Equipe de Revisão Eliza Padilha Letícia Karoline da Conceição Ilustrador Luis Filipe Rosa Colaboradores nesta edição Marcelo Spatafora (ensaio fotográfico de capa) Mariana Santos (texto) CONSELHO EDITORIAL Denílson G. Nalin Dilson Nery Rafaella Sessenta Silvana Zajac Tiago Matos Coutinho PUBLICIDADE Denilson G. Nalin denilsonnalin@revistadmais.com.br (11) 5581.1739 e 9-4771.7622 COMUNICAÇÃO E MARKETING Tiago Matos Coutinho tiagocoutinho@revistadmais.com.br (11) 9-4771.7621 / (19) 3306.9990 RH E FINANCEIRO Coordenação Flávia Garcia Dias Equipe David Gomes de Souza Raquel Vidal de Lima TI Herick Palazzin Ivanilson Oliveira de Almeida CONSULTORES DE LIBRAS (SURDOS) Célio da Conceição Santana Joice Alves de Sá PROJETOS DE MÍDIA INCLUSIVA Coordenadora Rafaella Sessenta INTÉRPRETES DE LIBRAS Carlos Silvério Marco Antonio Batista Ramos Rafaela Prado Siqueira Rafaella Sessenta EQUIPE AUDIOVISUAL Fotografia e conteúdo do portal Jéssica Aline Carecho Nathalia Henrique Nathan Ezahya Henrique Tacila Saldanha Lira Verônica Honorato de Souza ATENDIMENTO AO ASSINANTE E CIRCULAÇÃO Alessandra Rodrigues dos Santos assinaturas@revistadmais.com.br (11) 5581-3182 / 5583-0298 EQUIPE DE APOIO Davisson Eduardo Elias Cruz Samuel Fernando Rodrigues Edição número 8 – Março/Abril de 2016 REVISTA D+, ISSN 2359-5620, é uma publicação bimestral da MAIS Editora CNPJ n° 03.354.003/0001-11 Rua da Contagem, 201 – Saúde São Paulo/SP - CEP 04146-100 APOIO: A Revista D+ não se responsabiliza por opiniões e conceitos emitidos em artigos assinados ou por qualquer conteúdo publicitário e comercial, sendo este de inteira responsabilidade dos anunciantes

Instituto de Apoio às Pessoas com Deficiência e à Inclusão Social

03 Na Rede 04 Editorial 06 Do Lado de Cá 08 Expediente & Aqui na D+ 12 Misto Quente As novidades dignas de nota 17 Saúde Aborto no caso de microcefalia: você é contra ou a favor? Veja as opiniões de duas especialistas 20 Psique Ter deficiência e ser feliz: isso é possível? Por Rogério Andreolli 22 Por Dentro das Grandes Nossa repórter visitou a Novartis e revela as melhores práticas de acessibilidade 28 Entrevista O especialista José Geraldo Silveira Bueno fala sobre educação inclusiva 34 Políticas Públicas Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência: o que mudou e melhorou 48 Comportamento Super Normais e suas historinhas em quadrinhos para lá de inteligentes 51 Caderno de Educação A estreia do novo caderno traz o autismo e as melhores práticas educativas 64 Resenha Organismo e Sujeito: uma diferença sensível nas paralisias cerebrais 66 Aprenda Libras Aprenda os sinais de tempo 68 Garfo & Faca Esteio Grill & Gourmet: carne no ponto e ambiente acessível 70 Universo Cultural Judite quer chorar mas não consegue! completa 10 anos e artista baiano traz novidades 72 Espaço do Tils Tempo escolar: a melhor maneira de usufruí-lo 74 Cereja! Nathália da Silva, a maquiadora surda com milhares de seguidores no Youtube


Março/Abril 2016 – Ano II – Nº 8

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UM AMOR DE CENOURA Com a panela no fogo, receita na cabeça e muita animação eles começam a gravar mais um vídeo. Os gaúchos Débora e Felipe Dable apresentam o Chef Cenoura, que dentre vários canais de culinária no Youtube, destaca-se pela preocupação com a acessibilidade. Enquanto o psicólogo clínico explica o modo de preparo dos alimentos para os ouvintes, a professora de Libras na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) traduz para a Língua Brasileira de Sinais. Tudo começou com uma mudança de hábito alimentar do casal, que há 15 anos decidiu não comer carne. O pai de Felipe, carinhosamente, apelidou-o de “cenoura” (daí a ideia do nome Chef Cenoura). Os amigos sempre questionavam a dupla sobre que tipos de alimentos consumiam, já que agora eram vegetarianos. “Vocês só comem salada?”, perguntavam. E para mostrar que era possível variar as refeições, criaram um blog, em 2014, e posteriormente, em 2015, o canal no Youtube com a produção de Lucas Costa e seu inseparável cão. Foi de Débora a ideia de tornar os vídeos acessíveis, porque desde criança conviveu com sua irmã,

surda, traduzindo os desenhos para ela. “Como vivi a inclusão de forma tão natural em casa, tão leve e descontraída, pensamos em dividir isso com mais pessoas, cozinhando e dando amor”, afirma Débora. Hoje o canal conta com mais de 40 mil visualizações e quase 3 mil inscritos. Todas as quartas-feiras novos vídeos são gravados com receitas quentinhas e não para por aí, não! Segundo Débora, novos projetos estão saindo do forno, mas dependem de parcerias para serem concretizados.

Quem quiser saber mais sobre o canal e colaborar, entre em contato através do e-mail: chefcenoura@gmail.com www.chefcenoura.com.br Youtube: Chef Cenoura: cozinhar é dar amor

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MISTO QUENTE


Programa DeloitteInclui Conviver com as diferenças é um grande aprendizado! A força da diversidade é um dos nossos valores compartilhados que guia a forma como construímos um impacto positivo e sustentável para os clientes, nossas pessoas e sociedade. Venha fazer parte do nosso time! Inscreva-se em diversidade@deloitte.com. Foto em destaque: Raul Silva, profissional da Deloitte. ©2016. Deloitte Touche Tohmatsu. Todos os direitos reservados.


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MISTO QUENTE

O sorriso, a pose e os olhares marcantes desbravam um mar de preconceitos a cada clique. A cicatriz na coluna é motivo de orgulho para Maria Eugênia, que perdeu o movimento das pernas após uma queda em 2013. No ensaio fotográfico do projeto Dália, Maria mostra que sua condição (com o uso de cadeira de rodas e muletas) não a impede de ser e estar atraente. O nome Dália foi escolhido como referência à mãe da fotógrafa Carol Lopes, idealizadora do ensaio no

Signs Restaurant & Bar é o primeiro estabelecimento composto por garçons e cozinheiros surdos do Canadá. Sua política de funcionamento é baseada na promoção de interatividade entre ouvintes e surdos, que usam a língua norte-americana de

sinais (ASL). Com isso, proporcionam a oportunidade de crescimento na carreira de pessoas com deficiência. O ambiente inclusivo desperta nos visitantes a vontade de aprender a se comunicar em ASL, fazendo seus pedidos através de um cardápio instrutivo. O Restaurante Sinais fica

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SINAL VERDE

estado de Pernambuco, em 2015. Acidália teve a perna amputada dois anos antes de falecer com um câncer. “Esse projeto é algo que minha mãe gostaria que fosse feito para estimular outras mulheres”, afirma Carol. Cansada de ouvir frases como: “É tão bonitinha, mas está na cadeira de rodas”, Maria Eugênia, Elisangela Czekalski e outras “Dálias” decidiram participar de uma sessão de fotos para quebrar a barreira entre sensualidade e deficiência, e mostrar que podiam, sim, sentir-se bem com seu corpo.

localizado no cruzamento da Younge Street e Wellesley Street Sul Bloor Street, no centro de Toronto. Se for para lá, não deixe de visitar. Para os brasileiros empreendedores, fica aqui uma ótima ideia! www.signsrestaurant.ca

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SENSUALIDADE E DEFICIÊNCIA



MISTO QUENTE MUITO MAIS QUE UM GIBI Para os fãs de histórias em quadrinhos, uma novidade! O primeiro projeto em HQ para pessoas com deficiência visual no Brasil será lançado no segundo semestre deste ano. A produção independente da Top Comics, com iniciativa do Allan Albuquerque, idealizador do projeto, pretende desenvolver um formato na web que permite ao cego saber o que acontece nas cenas através de uma linguagem sequencial típica da revista em quadrinhos. A história intitulada Volkan, estreia com um prólogo já disponível no site e de leitura gratuita. O usuário só precisa ter um software em seu computador, utilizado por pessoas que não enxergam. Quem quiser saber mais sobre o assunto, aproveite para comparecer ao evento Quadrinhos para Todos, no Centro Cultural de São Paulo, no dia 30 de abril, às 11h. A palestra Volkan – Da criação ao roteiro trará especialistas em acessibilidade e os produtores dos quadrinhos.

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www.volkan.com.br www.quadrinhosparatodos.com.br

ACESSIBILIDADE A UM TOQUE Não é fácil sair para tomar um café na padaria e ser impedido pela falta de acessibilidade do local. Pensando nessas e outras situações cotidianas, Bruno Mahfuz, que é cadeirante há 15 anos, desenvolveu o aplicativo guiaderodas. O intuito do software, lançado em fevereiro, é permitir que o visitante atribua uma nota aos estabelecimentos comerciais, sinalizando se o ambiente é acessível ou não. Pode ser usado por pessoas com deficiência, mães com carrinhos de bebê, idosos ou pessoas com alguma condição de mobilidade reduzida temporária. Assim, antes de marcar aquele almoço com a família, é possível saber, através de pessoas que já

frequentaram o lugar, se há rampas, banheiros adaptados, portas com largura adequada... O aplicativo utiliza dados do Foursquare (que já tinha a função de guiar estabelecimentos favoritos) e pode ser baixado gratuitamente no sistema IOS e Android.

TOYOTA A FAVOR DA INCLUSÃO Pensando em proporcionar um pouco mais de conforto às pessoas com deficiência visual, a multinacional Toyota anunciou que está produzindo, com a Toyota Partner Robot Group, um dispositivo que oferecerá maior

segurança na locomoção em ambientes fechados. BLAID, como é chamada a criação, possui formato de arco e foi projetada para ser usada em volta do pescoço, assim, poderá emitir o som ao

identificar placas de sinalização como a de um banheiro ou escada, por exemplo. Como ainda é um protótipo, não existe data de lançamento e nem valor de mercado, no entanto, a empresa prevê estreia em breve.


Microcefalia X aborto: drama e polêmica Convidamos duas especialistas – uma antropóloga e uma bióloga – para discutirem o direito ao aborto no caso de microcefalia. Uma é favor e a outra, contra. O debate é denso e tem um longo caminho pela frente texto renata lins

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á muito tempo o assunto provoca discussões morais e éticas no Brasil e no mundo, trazendo à superfície do debate a saúde e os direitos da mulher. A polêmica descriminalização do aborto sobe novamente ao palco, agora ao lado de outra não menos polêmica protagonista: a microcefalia. O Ministério da Saúde e grupos interinstitucionais, como o Fiocruz, têm investigado a possível relação entre o vírus da zica, transmitido pelo mosquito Aedes Aegypti (também transmissor da dengue e chicungunha) com a microcefalia. A epidemia alarmou autoridades em maio de 2015, quando o primeiro caso foi diagnosticado; desde então, já existem 4.291 casos suspeitos no Brasil e 944 confirmações de grávidas infectadas, com maior incidência no Nordeste. Microcefalia é definida, segundo a Organização Mundial da Saúde, como a má-formação craniana do bebê (não prematuro), com perímetro cefálico igual ou menor que 32 cm. O desenvolvimento motor e intelectual do indivíduo pode ser afetado ao longo do tempo, porém especialistas afirmam que, se a criança receber estímulos desde os primeiros anos, poderá ter melhor qualidade de vida.

INIMIGO VELHO, SITUAÇÃO NOVA A doença não é novidade no país, mas como se trata de um surto, tem sido alvo de muitos estudos e volta e meia aparecem declarações e opiniões polêmicas sobre essa questão, como a do diretor do departamento de Vigilância de Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, Cláudio Maierovitch, que endereçou às mulheres: “Não engravidem agora. Esse é o conselho mais sóbrio que pode ser dado”. O “conselho” foi contestado pelo próprio Ministério, que orienta mulheres a buscarem acompanhamento médico antecipado e não adiarem a gravidez. De um lado, ativistas do Instituto de Bioética Anis, advogados e acadêmicos que articularam a discussão sobre aborto de fetos anencéfalos em 2012 preparam, novamente, uma ação para levar ao Supremo Tribunal Federal, que visa a garantir o direito ao aborto em casos de microcefalia. A defesa é que a interrupção dessas gestações é um dos pontos de uma ação maior: a intenção é garantir os direitos da mulher, independentemente da doença. Do outro lado, existem instituições, médicos e boa parte da população conservadora que reprime ações

como a defendida acima. Apoiam-se na lei vigente do país (entre os artigos 124 e 126 do Código Penal), que categoriza o aborto como um crime contra a vida. No Brasil, o aborto é legalizado apenas em três circunstâncias: risco à vida da gestante, estupro ou anencefalia. Para fomentar esse debate sob perspectivas distintas, trouxemos, nesta edição, artigos de ativistas contra e pró-aborto, a fim de esclarecer um pouco mais esse assunto tão delicado e polêmico. Para falar sobre o direito à interrupção da gravidez, a antropóloga Anahi Guedes de Mello, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), escreve exclusivamente à Revista D+. Ela desenvolve pesquisas nos campos dos Estudos sobre Deficiência (Disability Studies) e Estudos Feministas. Em contrapartida, a doutora em Microbiologia, Lenise Garcia, também professora do Instituto de Biologia da Universidade de Brasília e presidente do Movimento Nacional da Cidadania pela Vida – Brasil sem Aborto, defende outro ponto de vista. Veja nas próximas páginas. número 8 - março / abril


SAÚDE

A FAVOR DO ABORTO

Sobre aborto, deficiência e escolha Por Anahi Guedes de Mello*

O ANÚNCIO DO AUMENTO DE casos de crianças nascidas com a condição clínica de microcefalia no Nordeste, uma das singularidades associadas à síndrome neurológica do vírus da zica, levou o Ministério da Saúde a decretar, em novembro de 2015, estado de emergência nacional em saúde pública. A Anis – Instituto de Bioética, atenta aos desdobramentos da epidemia do vírus da zica, anunciou na mídia uma proposta de ação judicial para o Supremo Tribunal Federal, a ser apresentada por grupos acadêmicos e ativistas engajados em saúde pública. Uma das medidas da ação propõe que as mulheres grávidas infectadas pelo vírus da zica possam escolher interromper ou não a gestação. A mesma ação também apresenta medidas de proteção social e de cuidados específicos para mães e suas crianças com essa singularidade. Apoio essa ação judicial porque ser feminista e pessoa com deficiência não é algo incompatível. Antes de ser pessoa com deficiência, sou mulher. As pessoas com deficiência mostraram que as barreiras sociais enfrentadas cotidianamente não estão em seus corpos, mas na estrutura social incapaz de acolher as demandas por acessibilidade. Deslocar a compreensão da deficiência para o contexto, apontando

para as barreiras sociais, desestabiliza a noção de deficiência como “problema médico” e passa a ser uma possibilidade digna e constituinte da condição humana. Em 2003, fui apresentada ao Movimento de Vida Independente no Brasil, atraída pelo mote da “vida independente”, cerne do empoderamento das pessoas com deficiência. Nossa busca não é por não depender da ajuda de outros nas tarefas cotidianas, até porque, reconhecemos que as relações humanas são de dependência. O conceito consiste em tomar nossas próprias decisões. Um tetraplégico pode não ser capaz de se vestir sozinho (por restrição de autonomia), mas ele tem independência para decidir que tipo de roupa quer vestir. A autonomia (controle sobre o próprio corpo e sobre o ambiente mais próximo) e a independência (faculdade de decidir por si mesmo) são os dois lados da mesma moeda. É por isso que “vida independente” tem o sentido de “direito de escolha”. Para muitas mulheres, o direito de escolha ao aborto é uma premissa feminista. Homens batem, estupram e matam mulheres porque desde cedo foram socializados dentro de uma cultura machista e misógina que os ensinou que mulheres são sua

propriedade. Por isso, a urgência de proteger as mulheres deve prescindir do domínio masculino para dar lugar ao direito de escolha sobre seu corpo em qualquer situação. A zombaria em torno do argumento da escolha pelo aborto desconsidera a distinção entre feto e pessoa, bem como o momento político da luta pela descriminalização do aborto no país. Não se trata de escolher entre o feto x ou y, mas em garantir às mulheres o exercício de sua autonomia reprodutiva, independentemente de qualquer condição clínica do feto. Não é urgente legalizar o aborto agora que surgiu o vírus da zica, sempre foi urgente legalizá-lo por questões de saúde pública, pois são as mulheres pobres, negras e da periferia que morrem por causa de abortos inseguros feitos em clínicas clandestinas. A decisão pelo aborto pode até se apoiar em questões médicas associadas aos altos riscos à mãe e ao bebê, mas precisa ser uma decisão de foro privado da mulher e não do Estado, nem dos homens. Dizer que as mulheres podem e devem decidir sobre seus corpos e que as barreiras sociais aos corpos com impedimentos devem ser combatidas não são agendas incompatíveis. A ação judicial que apoio tem essas duas dimensões.

* Anahi Guedes de Mello é antropóloga, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pesquisadora vinculada ao Núcleo de Identidades de Gênero e Subjetividades (NIGS) e ao Núcleo de Estudos sobre Deficiência (NED), ambos na mesma universidade. Desenvolve pesquisas nos campos dos Estudos sobre Deficiência (Disability Studies) e Estudos Feministas. Atua nos movimentos sociais de pessoas com deficiência e LGBT, respectivamente, desde 1998 e 2008.


CONTRA O ABORTO

Zica, aborto e crianças com deficiência Por Lenise Garcia*

O AUMENTO DE CASOS DE microcefalia no Brasil, e sua provável relação com o surto de zica que vivemos, tem levado grupos de pressão a pretender a liberação do aborto nessa situação. A proposta é inaceitável por vários ângulos, que passaremos a expor. A lei brasileira não prevê o aborto eugênico, ou seja, em caso de deficiência. Defendemos os direitos da pessoa com deficiência e não há justificativa para que esses direitos sejam negados ao nascituro. Seria também pouco lógico abrir exceção para a microcefalia e não abri-la para as demais síndromes que acometem nossas crianças. A menção à microcefalia em caso de zica, representa apenas uma estratégia para se introduzir o aborto em caso de deficiências em geral, ou mesmo o aborto por demanda, sem qualquer justificativa, como infelizmente ainda ocorre em alguns países. Vale destacar que essa possibilidade vem ganhando rejeição especialmente entre as novas gerações, como pude comprovar ao participar da March for Life (Marcha pela Vida, em tradução livre), nos Estados Unidos, em janeiro deste ano. A neve que caía não impediu a manifestação

de algumas centenas de milhares de pessoas, especialmente jovens, que defendiam o valor de cada vida humana, desde a concepção. A microcefalia não significa necessariamente uma anomalia. Mais da metade das suspeitas, em crianças já nascidas, não tem sido confirmada. Durante a gestação, só pode ser percebida a partir do sexto ou sétimo mês, ou até depois, quando o bebê já é capaz de sobreviver fora do útero. Para o aborto, seria necessário matar o bebê intraútero, para que não se caracterizasse o infanticídio. Talvez por isso, os grupos que o pleiteiam já não falam em microcefalia, mas o pedem para a “mulher infectada com zica”, ou seja, antes mesmo de um diagnóstico do filho em gestação. O aborto eugênico traz enorme carga de preconceito e discriminação contra a pessoa com deficiência, como se fosse melhor que ela não existisse. Foi esse o testemunho da jornalista Ana Carolina Cáceres, com microcefalia, que veio a público contar a sua história quando leu o debate em torno desse assunto. Ela relatou o seu percurso até se formar na faculdade, como uma evidência de que os médicos podem falhar totalmente em sua capacidade de prever o futuro.

Também desconsidera-se o valor de cada filho, mesmo aquele mais debilitado, e o enriquecimento humano que ele pode representar para a sua família. O aborto não representa um alívio para a mãe, pois é impossível “cancelar” um filho. A gestante não mais escolhe entre ser ou não ser mãe, mas entre ter um filho vivo ou morto. Não é uma escolha verdadeiramente livre, pois muitas vezes o aborto é feito em delicada situação emocional, mesmo em desespero. A mãe que gesta uma criança com deficiência precisa de apoio médico e psicológico para superar a aflição da notícia, e serenamente preparar-se para cuidar desse filho como ele necessitar. Quantas mães (e pais) de crianças com deficiência relatam o susto do primeiro momento, a posterior aceitação e as inúmeras alegrias com cada pequena superação no desenvolvimento de seus filhos. Precisamos de prevenção e de que se propicie o tratamento adequado para as crianças com microcefalia e suas famílias, a fim de minimizar os efeitos de sua deficiência. Elas merecem ser acolhidas com o reconhecimento de sua dignidade e de seus direitos, e principalmente com amor.

* Lenise Garcia é doutora em Microbiologia, professora do Instituto de Biologia da Universidade de Brasília e presidente do Movimento Nacional da Cidadania pela Vida – Brasil sem Aborto.

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PSIQUE

Ter deficiência e ser feliz: isso é possível? por rogério andreolli*

Q

uem nunca ouviu aquela famosa frase? “Mesmo preso a uma cadeira de rodas, fulano leva uma vida normal.” Tal sentença é, por si só, um contrassenso, pois como pode alguém “preso” levar uma vida normal ou ser feliz? Um dos princípios que nos define como seres humanos é a nossa postura ereta e bípede. Ela nos diferencia dos demais animais que, em sua maioria, são quadrúpedes, conferindo-nos um status mais elevado tanto no sentido vertical quanto no sentido hierárquico da evolução. Assim, é fácil entender que, quando uma pessoa perde a capacidade de andar e começa a se locomover em uma cadeira de rodas, seus semelhantes passem a olhá-la de cima para baixo, o que causa uma impressão de inferioridade tanto para quem olha quanto para quem está sentado. Isso muda até mesmo aquilo que diz respeito à visibilidade real do outro, pois ele sai da linha de visão média para quem está em pé. Essa invisibilidade não é só física, mas também social. Em contrapartida, a força gerada pela empatia faz com que as pessoas coloquem-se no lugar do cadeirante e imaginem o quão devastador seria perder a autonomia e a independência geradas pela capacidade de andar, e que tal coisa o tornaria um peso para a sociedade e para a família. Consequentemente, as pessoas em geral enxergam o cadeirante com certa dose de paternalismo – quando não com pena – dando-lhe a falsa impressão de que está incapacitado e não pode mais fazer as coisas do cotidiano, como dirigir um carro, tomar banho sozinho etc. Talvez por falta de informação, a maioria acha que uma deficiência implica necessariamente na paralisia não só de todas as funções locomotoras como também da vida do outro em geral. Ledo engano, pois o ser humano tem uma enorme

capacidade de adaptar-se, que, aliada a sua inteligência e inventividade, torna-o tenaz e capaz de superar as mais adversas situações. Admito o impacto que deve ser para alguém de repente se ver sentado em uma cadeira de rodas e também que essa não é a condição mais confortável do mundo, contudo, também não é o fim dele! É possível ser feliz, amar, trabalhar, ter uma vida próspera e produtiva fazendo tudo o que se fazia antes, apenas tendo em mente que você o fará de outra forma. Como exemplos, você poderá dirigir um carro com comandos manuais de freio e acelerador, poderá comer com a sua própria mão, podendo ter de usar uma órtese para auxiliá-lo a segurar o garfo e assim por diante. Você poderá casar-se e ter quantos filhos quiser, seja pelos métodos tradicionais ou por fertilização in vitro, como tantos outros fazem. Como diria Fernando Pessoa: “Tudo vale a pena quando a alma não é pequena”. Com certeza, nossa capacidade de resiliência é a maior arma de que dispomos para superar as adversidades impostas por alguma deficiência e, sem dúvida, é ela que pode realinhar nossas potencialidades diante de um evento que nos traga uma deficiência. Por fim, a cadeira de rodas não prende ninguém a nada, é apenas uma forma de locomoção diferente, assim como a deficiência não torna ninguém mais ou menos dependente do outro, pois, como seres sociais, estamos o tempo todo dependendo em maior ou menor grau uns dos outros. A deficiência é apenas uma particularidade do ser humano, assim como ser alto ou baixo, gordo ou magro, branco ou negro. E se ela traz limitações, estas estão mais nas nossas mentes do que em nossos corpos. Portanto, ter deficiência e ser feliz não só é possível como necessário. D+

* Nevi Rogério Andreolli Carabajal, gaúcho, psicólogo pela PUC e pós-graduado em psicologia hospitalar pela Universidade Veiga de Almeida. Com sequela de poliomielite, foi o primeiro homem brasileiro com deficiência a dançar em uma cadeira de rodas. Também é ator e foi cofundador e bailarino da Pulsar Cia. de Dança. Apresentou-se nos principais festivais nacionais e internacionais de artes para pessoas com deficiência. Atualmente é presidente da ONG Vida, Sensibilidade e Arte (VSA – Brasil) e ministra workshops e palestras sobre inclusão sociocultural das pessoas com deficiência através da arte.

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POR DENTRO DAS GRANDES

Uma rampa para

a diversidade

Com o intuito de revelar ações de respeito às diferenças dentro de grandes empresas do mercado, a Revista D+ abre espaço para que práticas de acessibilidade ganhem evidência e se multipliquem texto renata lins fotos nathalia henrique

A

empresa Novartis, escolhida para estrear este novo espaço da revista, é uma multinacional farmacêutica e uma das maiores líderes no investimento em pesquisas do mundo. Sua origem se deu a partir da fusão de duas grandes companhias suíças, Ciba-Geigy e Sandoz, presentes há 80 anos no Brasil. Como Novartis, completa neste ano duas décadas de existência. Com filiais em 140 países, a organização se empenha na execução de programas de educação em saúde e infraestrutura; um exemplo é o Carreta da Saúde, parte do plano Brasil Sem Miséria, do Governo Federal, que contribui para a eliminação da hanseníase. A preocupação com a saúde e o bem estar, porém, não se resume aos negócios da companhia, mas começa por aqueles que são “da casa”. A Novartis se disponibilizou a mostrar o porquê já ganhou o título de empresa que mais respeita a diversidade. A multinacional situada no bairro de Santo Amaro, em São Paulo, conta com a participação de 2.700 colaboradores entre funcionários da fábrica e de campo (que fazem o trabalho externo), dentre eles, mais de 100 possuem algum tipo de deficiência, número que respeita os 5% exigidos pela Lei de Cotas (Lei 8.213/1991, que em seu artigo 93 obriga a contratação de pessoas com deficiências pelas empresas que possuem a partir de 100 funcionários).

Paulinho trabalha no setor de marketing e coordena a biblioteca da Novartis


Yara Baxter, diretora de Comunicação e Responsabilidade Social, explica que existem perspectivas inclusivas que vão desde a acessibilidade para pessoas com deficiência ao incentivo em respeitar as diversidades de gênero, religião, orientação sexual, etnia, cultura e todas e quaisquer diferenças. Importante ressaltar que a empresa preza por uma política de diversidade mais do que ações isoladas de inclusão. A responsabilidade pela capacitação e autonomia do colaborador com deficiência é iniciada por meio da parceria com associações que fazem o trabalho de preparação antes, como a Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), a Associação para

o Desenvolvimento Integral do Down (ADID) e, anteriormente, o Lar Escola. Assim que o funcionário está apto a ocupar determinada posição, é recebido na empresa com as adequações necessárias em seu ambiente de trabalho. Essa adaptação é acompanhada de perto pelo Comitê de Diversidade e Inclusão, também coordenado por Yara. AUTONOMIA, DESAFIOS E VALORIZAÇÃO Paulinho, como é conhecido na empresa, tem 45 anos e trabalha há dez na Novartis. Sua rotina começa às 8h e termina às 13h, quando já fez todo o seu serviço no setor de marketing e na coordenação da biblioteca.

“A Novartis é tudo para mim, eu ajudo todo mundo”, afirma. Ele, que possui síndrome de down, tem um mentor que o auxilia no que for necessário e que, de tempos em tempos, é trocado para que outras pessoas possam ter a experiência de vivenciar a diversidade. A diretora Yara Baxter diz que exige dele as tarefas entregues no prazo, como de qualquer colaborador. “Não é porque ele tem deficiência intelectual que vamos passar a mão na cabeça, isso vale para todos. A gente tem de estabelecer desafios para ele crescer, afinal, todos nós precisamos de desafios”. Segundo a coordenadora do Comitê de Diversidade e Inclusão, a empresa lida com vários tipos de pessoas

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POR DENTRO DAS GRANDES

“Diversidade e inclusão gera inovação” Yara Baxter

com deficiência – como surdez, deficiência física, mobilidade reduzida, nanismo, síndrome de down –, porém, reconhece que ainda falta incluir cegos em seu quadro de funcionários. Os recursos de acessibilidade, contudo, não são escassos. Ao caminhar pelos quatro prédios da companhia, é possível observar que o chão, em sua maior parte, é revestido por piso tátil, os elevadores são acessíveis para cadeirantes, existem rampas de acesso e vagas no estacionamento reservadas para pessoas com deficiência e mulheres gestantes. “Fizeram apenas adaptações na impressora [para que a altura ficasse confortável], mas como a empresa é totalmente acessível, não tenho dificuldade para me locomover”, disse Francisca Antônia Otávio Silva, 50 anos, cadeirante. Cléa de Faria Ferreira Brito, 34 anos, é assistente administrativa da área de marketing e, por caminhar com o auxílio de muletas, também ressalta a importância da acessibilidade na Novartis. Há dez anos na empresa, Cléa diz: “Pude conquistar muitas coisas, tanto pessoais quanto profissionais, através da Novartis. É minha base”. Os títulos que a Novartis recebeu em rankings de melhores empresas

para trabalhar são explicados pelas boas condições que proporcionam para que os colaboradores possam exercer as atividades, como o Espaço Viva Saudável, que conta com academia interna, manicure e Cantinho da Mamãe; além da possibilidade de fazer Home Office (trabalho em casa). Esse tratamento é refletido na vida e no comportamento dos funcionários. “Nos sentimos mais valorizados por causa da empresa”, afirma Milane da Silva, assistente administrativa de

comunicação, que possui nanismo. Aos 25 anos, a estudante de publicidade e propaganda, mesmo antes de completar um ano na Novartis, já faz planos na empresa: “Eu vejo muitas oportunidades para me desenvolver crescer aqui”. Sorridente, a assistente de RH Jéssica de Jesus Bispo, 23 anos, pergunta se o cabelo está bom para a foto. Ela, que perdeu a audição do ouvido direito e 80% do esquerdo na infância devido a uma meningite, usa o humor para falar de sua deficiência. “Às vezes eu falo um pouco errado, pago mico, mas é normal!”. A estudante de administração afirma que tem garantia de 100% da audição do lado esquerdo quando coloca a prótese, portanto, não tem a comunicação verbal comprometida. A jovem trabalha na Novartis há quase dois anos e sonha alto com a profissão que escolheu: “Eu me imagino com uma carreira sólida, como coordenadora de RH ou gerente”, declara. INCLUSÃO NA PRÁTICA: NECESSIDADES ATENDIDAS E SALÁRIOS COMPATÍVEIS Yara Baxter diz se preocupar também com o preparo dos gestores, para que, assim, possam oferecer

Na mesa de trabalho, Jéssica de Jesus Bispo diz não ter precisado de nenhum tipo de adaptação à sua deficiência


Milane, Cléa e Francisca: a empresa que pensa em inclusão é mais forte

suporte às pessoas com deficiência. “Eu tenho que dar toda a estrutura e treinar os gestores para que sejam inclusivos, isso faz parte de um processo muito amadurecido dentro da empresa”. A ideia, segundo ela, é criar subcomitês para entender detalhadamente as demandas dos colaboradores e levar para o comitê maior, que, por sua vez, leva às diretorias as reais necessidades de cada um, tornando o trabalho eficaz na prática e não apenas em teoria. Quando o assunto é esforço, a diretora de comunicação é categórica ao afirmar que não devem existir sentimentos de inferioridade entre as pessoas com deficiência. “Todos nós devemos ter ‘raça’. Os próprios cadeirantes demonstram desconforto ao ver outras pessoas com a mesma condição se apoiando na deficiência para

terem dó de si mesmas”. Segundo ela, as faixas salariais são estabelecidas pelas qualificações ou competências e não pela deficiência. Ou seja, um cadeirante que é assistente administrativo receberá mais se tiver um curso de inglês, por exemplo. Sobre o recebimento do certificado de protagonismo no II Prêmio Melhores Empresas para Trabalhadores com Deficiência, oferecido pela Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo, Yara afirma que pôde perceber a responsabilidade e o impacto que uma grande empresa tem na comunidade ao disseminar valores como respeito à diversidade e promoção da inclusão. Além de estimular as concorrentes a realizar trabalhos tão bons quanto os já desenvolvidos por ela, dando força ao movimento. D+

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ENTREVISTA

JosĂŠ Geraldo Silveira Bueno


mudar para progredir A Declaração de Salamanca abriu caminho para importantes transformações na educação de pessoas com deficiência. Ainda há muito para se percorrer entrevista cintia alves fotos jéssica aline carecho

T

oda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem”, expõe o segundo tópico da Declaração de Salamanca, apresentada de 7 a 10 de junho de 1994, na cidade de Salamanca, na Espanha. O conceito de educação inclusiva, no Brasil, avançou no final do século 20, com a declaração durante a Conferência Mundial da Organização das Nações Unidas (UNESCO), cujo intuito foi estabelecer uma referência à inserção de crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais no sistema regular de ensino. Além do objetivo principal de reafirmar o compromisso com a Educação para Todos (EPT), baseado nas propostas, direções e recomendações da Estrutura de Ação em Educação Especial. Para debater acerca da perspectiva e da trajetória da educação inclusiva, a Revista D+ convidou o especialista José Geraldo Silveira Bueno, doutor em Educação: História e Filosofia da Educação e professor titular da Faculdade de Educação, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC). O tema é analisado com olhar crítico por Bueno, que atua em projetos de Educação com ênfase nos processos de inclusão e exclusão escolar especial. “Sou crítico no presente e muito otimista no futuro. A crítica é exatamente para pensar que a humanidade tem condições de fazer um mundo melhor”. Confira a entrevista a seguir com os reflexos e avanços dos 21 anos de Declaração de Salamanca, na luta dos direitos das pessoas com deficiência no Brasil.

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ENTREVISTA

José Geraldo Silveira Bueno

A escola é um campo político. Não se pode pensar em inclusão de alunos com deficiência numa escola altamente excludente

Revista D+: Como era a educação antes da Declaração de Salamanca? José Geraldo: Não podemos falar de Salamanca sem falar da Declaração Mundial sobre Educação para Todos (Tailândia, 1990), porque a Salamanca é uma decorrência dela, do ponto de vista de atender e estabelecer normas, princípios e orientações a uma parcela da população, a chamada população de necessidades educacionais especiais. Acredito que até Salamanca a perspectiva educacional era dividida em dois grandes polos: o mais tradicional, com as instituições especializadas públicas e privadas e, depois da II Guerra Mundial, o novo movimento de inclusão de determinadas parcelas da população. Qual é a grande diferença entre a proposta de Salamanca e as políticas anteriores? A grande diferença é que nas políticas anteriores, que chamamos de política de integração, nós tínhamos que preparar o aluno para que ele fosse capaz de aprender na escola regular. Essa perspectiva mostrou-se limitada na medida em que não se exigia nada da escola: parecia que a escola

era boa e os alunos é que tinham problema e não se enquadravam nela. A Declaração de Salamanca transforma isso: sua proposição central é de que é preciso mudar a escola para receber esses alunos. Essa mudança é só educacional ou é, sobretudo, política? A escola é um campo político, esse é o primeiro dado e a grande característica de Salamanca. Não se pode pensar em inclusão de alunos com deficiência numa escola altamente excludente. O primeiro passo era mudar a política, seja nacional, seja estadual, local ou escolar. A política tem que ser essa para absorver este sujeito nos dois princípios básicos: do acesso e da permanência qualificada. Hoje, poderíamos dizer que houve um avanço no acesso, no qual nós eliminamos a reprovação com a progressão continuada, mas não melhoramos a qualidade. Como tem sido desenvolvida a Declaração de Salamanca no Brasil nos últimos anos? O primeiro ponto importante foi o acesso à escola regular, sou favorável que esses alunos sejam incluídos. Até a mudança


dessa política, a escola antiga, chamada de escola especial, na verdade, foi muito mais produtora de deficiência do que solucionadora dos problemas de deficiência. Na minha tese de doutorado de 1991, eu fiz um pequeno levantamento de alunos surdos que estavam em 21 classes especiais para surdos do Estado (região Sul de São Paulo). Havia alunos que estavam há 12 anos na classe especial e nunca passaram da 2º série! O segundo ponto é que hoje nós temos, efetivamente, uma política de educação especial, apesar de estar limitada e ter equívocos. Considero um ganho político, não só de Salamanca, mas do movimento todo. É muito interessante verificar que hoje há grupos que defendam os surdos, as pessoas com deficiência. Há o exercício da cidadania. Nós podemos contribuir, mas o que vai resolver o problema é a luta deles. O terceiro ponto é que a Salamanca coloca a deficiência no âmbito da cidadania. Em nenhum momento, no documento original, ela fala de Educação Especial. A política de inclusão tinha que bater maciçamente na pré-escola: é lá que devemos começar. Se nos voltarmos para a inclusão efetiva dos meninos de 2 ou 3 anos, teremos adultos que receberam trabalho adequado. anuncio DF revista d+ marco-15.pdf

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19/03/15

A partir de 2006, as instituições de ensino superior foram obrigadas a incluir a disciplina de Libras na grade curricular dos cursos de licenciatura. Como isso ajudou na inclusão dos alunos surdos no ensino comum, em sua opinião? Considero inócua essa obrigatoriedade do ensino de Libras no curso de Licenciatura. Primeiro porque é pouco, e segundo, porque se o indivíduo estuda 60 horas de Libras no 2º ano de Pedagogia, Geografia ou História, por exemplo, para ser professor, e passa 20 anos na escola sem ter um aluno surdo, você acha que ele lembrará algo de Libras quando enfim tiver esse aluno? É preciso planejamento: se você é professor do 3º ano e há um aluno surdo no 2º ano, você tem de se preparar neste ano para recebê-lo. Porque nós simplesmente esquecemos! Deveríamos ter em todos os semestres e praticar, para um dia poder receber um aluno. Houve uma tradução equivocada do termo “integrar” para “incluir” num trecho da Declaração de Salamanca. Quais são os impactos negativos e positivos desse erro? A primeira tradução da Declaração de Salamanca foi feita pelo Ministério do Governo Federal e lá está “integração”.

15:19

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ENTREVISTA

José Geraldo Silveira Bueno

Não podemos esquecer que somos 240 milhões num país continental e injusto, cuja tradição é muito arraigada de privilégios e não de direitos

Porque o documento original em espanhol, da UNESCO, diz integração. Na realidade, o que nós estamos fazendo é inserindo o aluno na escola regular. Nós não verificamos se estamos fazendo o processo de inclusão antes de ele estar lá. Esses alunos estão sendo inseridos, mas não estão recebendo nada; é o processo e o resultado que vão mostrar se eu tenho uma política efetiva de inclusão ou integração. O que estamos fazendo por isso? Quais estratégias, modificações e adaptações fazemos, incluindo a arquitetura da sala de aula, para que esse aluno possa aprender? Eu não consigo enxergar se é incluído ou integrado: tem que verificar o que está sendo feito. Um dado importante que deve ser levado em consideração também é que, em qualquer política educacional, grande parte das críticas se abate somente sobre o Governo Federal, como se ele fosse responsável por tudo, e ele não é. Qual rumo o Brasil está tomando na educação com perspectiva inclusiva? Não podemos esquecer que nós somos 240 milhões num país continental, da Amazônia ao Pampa, fora o fato de que somos um país injusto. É complicado gerenciar isso, ainda mais do ponto de vista de uma tradição muito arraigada de privilégios e não de direitos. Isso se abate muito sobre as crianças com deficiência. Elas precisam ter seus direitos reconhecidos. Qual seria a fórmula ideal para que houvesse a colaboração entre os professores no ensino? O primeiro ponto central de uma política de inclusão deveria ser o trabalho colaborativo entre professores do ensino regular e da classe especial, o professor especialista. Se você colocar o professor que sabe alfabetizar e o especialista, que conhece as características de determinada deficiência,

e eles conversarem e praticarem entre si; esse professor especialista vai incorporar o que o outro sabe de alfabetização, por exemplo, e esse incorpora o outro. O segundo ponto é atender as necessidades que esse aluno tem, seja o braile, Libras ou outra. Como deve ser a relação da família com os educadores para que se obtenham melhores resultados no processo de aprendizagem? Nós temos um problema sério de participação familiar, resultado das condições precárias de vida da maior parte da população. Ainda se exige, por exemplo, que o pai vá à noite numa reunião de pais depois de uma longa jornada de trabalho e de muitas horas no ônibus e metrô. Acho que o processo democrático exige que haja uma interlocução e uma participação mais efetiva. Há experiências magníficas de família e escola pública, que conseguiu fazer essa relação escola e comunidade mais forte; e tem outras de completa desordem. Acho a participação fundamental, pois há uma parte da escola que os pais podem discutir. No entanto, há questões que são de prerrogativa da escola. Na sua opinião, quais são os impactos que a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, que entrou em vigor em janeiro, para o progresso da educação inclusiva? Acho que é legal fazer desde que a gente reconheça os limites que a legislação tem. O primeiro artigo da nossa Constituição e do mundo inteiro diz: ‘Todos os homens são iguais perante a Lei’. Em nenhum país do mundo o homem é igual perante a Lei! Isso não quer dizer que eu sou contra o princípio, sou a favor de uma política e lei de inclusão. Mas ela é uma lei que, como toda lei maior, é uma lei de proposição. Se nós não transformarmos isso em política efetiva, ela pode ficar muito tempo na prateleira com muito pouco uso. D+



MISTO QUENTE POLÍTICAS PÚBLICAS


Evolução legislativa A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI) reconhece conceitos básicos de qualidade de vida, antes postergados pela política pública brasileira. É hora de colocar todos sob o mesmo guarda-chuva texto cintia alves

A

utonomia e igualdade são as palavras que representam a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI), de número 13.146, vigente no país desde o dia 2 de janeiro de 2016. O tema já foi reportagem de capa na edição 4 da Revista D+ e agora voltamos a ele, detalhando um pouco algumas das conquistas expressas na LBI. A Lei sistematiza as principais conquistas de acordos, tratados e convenções internacionais, por meio de referências legais, políticas e pedagógicas acompanhadas pela democratização da sociedade. O projeto da LBI formou-se através de inúmeros debates e de audiências públicas com alterações de textos legislativos nos anos 2000, baseado na Declaração de Guatemala – que promulgou a Convenção Interamericana para a eliminação de todas as formas de discriminação contra as pessoas com deficiência. Bem como na Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, no qual se constituiu um marco histórico na garantia e promoção dos direitos humanos de todos os cidadãos, sendo o projeto finalizado e aprovado pelo Congresso Nacional em 2015. A promulgação dos avanços abrange diversas áreas, tais como: acessibilidade, esporte, transporte e mobilidade em vias públicas e privadas, justiça, moradia, ciência e tecnologia, trabalho, assistência social, entre outros. O projeto evidencia a Educação por meio de seu apoio aos processos de construção dos sistemas educacionais inclusivos, encarando-os como um direito integral e acessível.

“Os maiores ganhos estão relacionados à garantia das condições necessárias para a plena participação no ambiente escolar e à maximização de suas potencialidades. Dessa maneira, as singularidades de cada um são consideradas”, afirma Martinha Clarete Dutra dos Santos, responsável pela Diretoria de Políticas de Educação Especial (MEC/SECADI). DEVAGAR E SEMPRE Apesar da evolução representativa em prol das pessoas com deficiência no país, a verdadeira inclusão caminha a passos curtos. Para que atitudes inclusivas venham à tona é necessário que as diferenças sejam extintas em todos os campos. Para Maria Isabel da Silva, jornalista e gestora da Assessoria de Comunicação Institucional da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo (SEDPcD), a fiscalização deve ser realizada por toda sociedade, mas cabe aos órgãos responsáveis resguardar os direitos. “Caso um cidadão sinta-se negligenciado em seu direito assegurado pela Lei, deve procurar uma instância de defesa, como o Ministério Público ou a Defensoria Pública, para registrar sua denúncia.” Com a regulamentação da Lei, inúmeras questões devem ser revisadas prioritariamente para que se aplique de maneira correta e não acarrete dúvidas para a sociedade em termos de execução. Veja a seguir alguns exemplos importantes de mudanças.

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MISTO QUENTE POLÍTICAS PÚBLICAS

Novos tempos, novas perspectivas 1. PREVIDÊNCIA SOCIAL E SAÚDE (ART. 99) COMO ERA: O art. 20 da Lei no 8.036/90, que regulamenta a retirada e movimentação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) dos trabalhadores, não beneficiava, até o ano passado, a pessoa com deficiência para utilização do valor. COMO FICOU: De acordo com o novo inciso XVIII: “Quando o trabalhador com deficiência, por prescrição, necessite adquirir órtese ou prótese para promoção de acessibilidade e de inclusão social”, ele poderá movimentar o FGTS. PRAZO: Janeiro de 2016 IMPORTANTE: “A Previdência Social precisa, por exemplo, dos detalhes de modelos, tipos e valores de órteses e próteses. Somente a regulamentação da LBI assegurará o cumprimento da Lei”, enfatiza Maria Isabel, da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo.

A família também deve denunciar negativas de matrícula ou atitudes discriminatórias. Os pais devem exigir a garantia do direito do estudante com deficiência a um sistema educacional inclusivo, tanto nas redes públicas quanto nas privadas Martinha Clarete, Diretoria de Políticas de Educação Especial

2. EDUCAÇÃO (ART. 28) COMO ERA: A advogada Consuelo Martin, mãe de Arthur Martin, de 10 anos, com atraso global de desenvolvimento, criou um abaixo-assinado para proibir as escolas de cobrar taxas extras para matrículas de alunos com deficiência. Foi assim que ela impulsionou a nova lei, antes sem nenhum apoio legal. COMO FICOU: “Às instituições privadas, de qualquer nível e modalidade de ensino, aplica-se obrigatoriamente o disposto nos incisos I ao XVIII (...) sendo vedada a cobrança de valores adicionais de qualquer natureza em suas mensalidades, anuidades e matrículas no cumprimento dessas determinações”. PRAZO: Janeiro de 2016 IMPORTANTE: “A família também deve denunciar negativas de matrícula ou atitudes discriminatórias. Os pais devem exigir a garantia do direito do estudante com deficiência a um sistema educacional inclusivo, tanto nas redes públicas quanto nas privadas, por meio da oferta dos serviços e recursos de acessibilidade”, reforça Martinha Clarete, responsável pela Diretoria de Políticas de Educação Especial.

3. TRABALHO (ART. 37 – II) COMO ERA: Apesar da Lei 8.112/90 oferecer novas oportunidades para pessoas com deficiência no mercado de trabalho, o incentivo às empresas para aquisição de equipamentos de tecnologia assistiva não ocorria de maneira direta, o que deixava o profissional sem qualquer autonomia para desenvolver as funções cotidianas. COMO FICOU: “II - provisão de suportes individualizados que atendam às necessidades específicas da pessoa com deficiência, inclusive a disponibilização de recursos de tecnologia assistiva, de agente facilitador e de apoio no ambiente de trabalho”. PRAZO: Janeiro de 2016 IMPORTANTE: “A expectativa é que as empresas alinhadas às tendências internacionais reproduzam no ambiente de trabalho a mesma diversidade existente na sociedade. Pois ela não deve ser aplacada, removida ou intolerada, e sim, aceita e respeitada”, argumenta Maria Isabel.


4. TRÂNSITO (ART. 47 § 3O) COMO ERA: Segundo o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), Lei nº 9.503/97, a infração para motoristas que estacionassem em vagas reservadas a idosos e pessoas com deficiência era considerada leve, com multa no valor de R$ 53,20 e três pontos na carteira. COMO FICOU: “A utilização indevida das vagas de que trata este artigo sujeita os infratores às sanções previstas no inciso XVII do art. 181 da Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 (Código de Trânsito Brasileiro)”. Alteração para infração grave, aumento do valor para R$ 127,69, cinco pontos na carteira e remoção do veículo. PRAZO: Janeiro de 2016 IMPORTANTE: Segundo a assessoria de imprensa da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), as mudanças da LBI colaboraram para a melhoria da fiscalização em respeito aos usuários das vagas preferenciais. Atualmente são 820 as vagas chamadas Defis – destinadas para o estacionamento de veículos dirigidos ou conduzidos por pessoas com deficiência física e/ou mobilidade reduzida. São oferecidas junto a locais que possuam demanda com necessidade de acessibilidade no sistema viário do município.

As salas de cinema devem oferecer, em todas as sessões, recursos de acessibilidade para a pessoa com deficiência 5. LAZER (ART. 44 § 6O) E TURISMO (ART. 45º) COMO ERA: Diversos projetos foram elaborados para a acessibilidade em espaços culturais, de lazer e turismo. Exemplo disso é a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que visa acessibilidade em suas normas, contudo, sem muito sucesso. COMO FICOU: “As salas de cinema devem oferecer, em todas as sessões, recursos de acessibilidade para a pessoa com deficiência”. “Os hotéis, pousadas e similares devem ser construídos observando-se os princípios do desenho universal, além de adotar todos os meios de acessibilidade, conforme legislação em vigor”. PRAZO: 48 meses (cinema) e 24 meses (hotéis) IMPORTANTE: “O prazo é prolongado, mas é importante que conste no arcabouço legislativo. As instituições de oferta desses serviços devem ter um tempo para ajustes e investimentos, mas depois dos prazos estabelecidos a lei terá que ser cumprida e a acessibilidade, garantida”, assegura Maria Isabel. D+


NOSSA CAPA

Adriana Poci Cabral, Larissa do Nascimento, Mila Poci Cabral, Myla Rzezak, Sueli Satow, Suzete Yazaki Yamashiro e Thays Martinez. Sete mulheres que assumiram o papel principal em suas próprias vidas

Entrevistas Mariana Santos Texto Taís Lambert Fotografia Marcelo Spatafora Assistente de fotografia Andrezza Silva

u gosto de me maquiar, acho que é um aspecto lúdico da vida. Uma das coisas mais marcantes da escola foi uma borboleta: a professora contornou o desenho com barbante e, então, era só eu pintar lá dentro. Para mim, aquilo foi o máximo, porque eu estava fazendo a mesma coisa que os meus colegas. Tem muita gente que defende que uma criança cega não precisa aprender a pintar. Eu acho que hoje, graças àquela borboleta, consigo lidar com a maquiagem.” Thays Martinez é advogada e analista no setor de precatórios do Tribunal Regional do Trabalho, tem 42 anos e é cega desde os 4. Chegou ao estúdio para a sessão de fotos dessa reportagem com o seu cão guia, o Diesel, e claro, maquiada. “Não seria melhor retocar? Eu esqueci de passar sombra!”, disse. Sentei-me com ela no sofá e, de sua bolsa, foi tirando algumas sombras, máscara para cílios e blush. Assim que terminei de maquiá-la, fui pegando as coisas e entregando nas mãos dela: “Aqui estão seu batom, blush e suas sombras”. Ela os pegou e rebateu: “Batom, não. Máscara para cílios, você quer dizer!”. Caímos na risada! Eu que enxergo, não vi. Pensei comigo: “Isso aqui vai render...”


número 8 - março / abril


NOSSA CAPA Thays Martinez Formação Direito Idade 42 anos Tem Cegueira Convive com a deficiência Desde os 4 anos Ama Ler ficção, comportamento e todas as histórias do Harry Potter Fez e aconteceu Criou o Instituto Iris para facilitar o acesso dos brasileiros aos cães guias

Eu me vejo como mulher, advogada, alguém envolvida em uma relação estável, tia, amiga, empreendedora. Dentre todas essas coisas existe uma questão na minha vida que é a deficiência visual.

Segundo o censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 25.800.681 mulheres têm algum tipo de deficiência. Isso corresponde a 26,5% do total das mulheres brasileiras. Dentre as pessoas com deficiência, 43,5% são do sexo masculino e 56,5% do feminino. Sabe-se que ser mulher em uma sociedade machista e patriarcal não é tarefa das mais fáceis. Ser mulher e ter deficiência faz do caminho algo ainda mais tortuoso e repleto de obstáculos. O estigma da inferioridade insiste em lançá-las numa vala comum: a da incapacidade, da não realização e, por vezes, da invisibilidade, tão forte é a negligência e o preconceito. “A discriminação é gritante; não apenas em nossa sociedade, mas em todo o mundo. A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, em seu artigo sexto, traz a afirmação de que os Estados reconhecem que mulheres e meninas com deficiência são alvos de múltiplos preconceitos, por serem mulheres e por terem uma deficiência”, ressalta Eliane Lemos Ozores, psicóloga especialista no atendimento à pessoa com deficiência e diretora de gestão da ONG Entre Rodas & Batom. Thays Martinez, que também é presidente do Instituto Iris, palestrante e autora do livro Minha Vida com Boris, seu primeiro cão guia (ela foi a primeira brasileira a ter um), acredita que as leis são importantes, mas não resolvem as coisas por si só. “Melhor seria se os parlamentares cumprissem o seu papel de fiscalizar, de exigir o cumprimento das políticas públicas. Já temos leis suficientes, a Constituição proíbe qualquer tipo de diferenciação entre homens e mulheres. Mas, na prática, o próprio judiciário ainda precisa ser um pouco mais vanguardista”.


Sueli Satow Formação Comunicação Social e Filosofia Ela sabe do que fala. Em seu livro, Thays conta a batalha de seis anos que travou contra o Metrô de São Paulo para que aceitassem cães guias nas estações. O Iris pressionou as autoridades para que leis nesse sentido fossem aprovadas: uma lei estadual em 2002 e uma federal em 2005. Esse foi um marco histórico na conquista de direitos para as pessoas com deficiência visual. “Um funcionário desligou a escada em que o Boris e eu estávamos e quase caímos. Foi uma grande surpresa, porque eu não imaginava que eles pudessem chegar a esse ponto. Foi um tipo de violência”, desabafa. ALÉM DO QUE OS OLHOS PODEM VER Até hoje, Sueli Satow ainda passa por situações “ridículas”, como ela mesma diz. Quando, por exemplo, em consultórios médicos, eles perguntam tudo o que ela tem e quais medicamentos toma... para a mãe dela. As balconistas das lojas perguntam o que ela quer comprar e qual o tamanho... para a mãe dela. Às vezes, tratam-na como criança. Sueli, de 63 anos, tem paralisia cerebral do tipo atetóide, moderada. “Todo o meu corpo foi afetado, mas o lado esquerdo é o mais avariado. Minha fala era muitíssimo pior do que agora”, conta. No entanto, é preciso dizer aos incautos que Sueli Satow, além de ser capaz de dizer o que tem, que remédios toma, que roupa quer comprar e que número usa, também é formada em Filosofia e em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). É mestre e doutora em Psicologia Social pela mesma instituição e expert em inclusão de pessoas com deficiência pela Universidade de Salamanca, na Espanha. Ah, sim, ela também é autora de dois livros: Paralisado cerebral: construção da identidade na inclusão e Memórias de uma incluída pela exclusão.

Idade 63 anos Tem Paralisia cerebral Convive com a deficiência Desde o nascimento Ama A vida, os pais, os amigos e conversar Fez e aconteceu Escreveu dois livros, milita pelas causas das pessoas com deficiência desde 1980 e conseguiu o primeiro banheiro adaptado da PUC-SP

Quando eu tinha 3 anos, minha avó paterna sugeriu que me internassem em uma instituição para crianças com deficiência intelectual. Daquelas “instituições-depósito”. Minha mãe só me contou quando eu estava fazendo o doutorado. Percebi a sorte que tive em ter a mãe que tenho. Ela me incentivou ao máximo nas minhas capacidades intelectuais e físicas número 8 - março / abril


NOSSA CAPA Adriana e Mila Poci Cabral Formação Adriana: Artes Plásticas Mila: Teatro

Têm Nanismo 1,28m e 1,18m

Ama Adriana: pintura e natação Mila: escrever e falar

Idade 50 e 47 anos, respectivamente

Convivem com a deficiência Desde o nascimento

Fez e aconteceu Criaram um negócio exclusivo: lojas de miniaturas

No supermercado eu peço a ajuda das pessoas, por exemplo, para pegar um pacote de macarrão no alto. Outro dia eu pedi para um rapaz no mercadinho aqui perto e quando ele se virou, era o Fábio Júnior! Ele perguntou: ‘Que sabor você quer?’. Eu respondi: ‘Galinha caipira’, suspirando! Adriana

“As mulheres com paralisia cerebral não passam despercebidas nem quando estão sentadas numa cadeira comum, o que pode tranquilamente acontecer com uma cadeirante”, afirma. “Então, somos ainda mais excluídas. A nossa imagem é diferente, até bizarra, porque nossos corpos e faces, conforme as sequelas, são distorcidos pelos espasmos e movimentos involuntários. Somos mulheres, temos deficiência e esta é a paralisia cerebral: somos triplamente rebaixadas”. Sueli diz ter sido muito beneficiada pela psicoterapia. “Ajudou-me a ver a minha identidade. O tratamento me deu a chance de me aceitar como paralisada cerebral, além de forças para continuar vivendo e para lutar contra as adversidades, que são muitas”. O processo de empoderamento das mulheres, com e sem deficiência, inevitavelmente passa pelo amadurecimento emocional. “Isso acontece em três fases: autoconhecimento, autorrespeito e autoestima”, enumera Eliane Lemos Ozores. “Não se conhecer é se ver aprisionada às expectativas dos outros. Não podemos permitir que alimentem nossas crenças a respeito daquilo que podemos ou não podemos ser. É preciso sentir-se bem com sua identidade, seu corpo e seus desejos. Não tem mágica: é amadurecimento, é fazer as pazes consigo mesma”, enfatiza.

Muitas pessoas, quando veem meu namorado, que também é anão, e eu de mãos dadas no shopping, dizem: ‘Olha, que fofinhos!’. Descobrir minha ‘fofura’ foi até uma conquista para mim, porque sou muito brava! É fofinho mesmo! Mila


Suzete Yasaki Yamashiro Formação Odontologia Idade 44 anos Deficiência Amputação do braço esquerdo Convive com a deficiência Desde os 34 anos Ama A filha Stella, de 11 anos Fez e aconteceu Representou o Brasil, pela AACD, no I Simpósio das Atletas com Deficiência do Nado Sincronizado, em Taiwan. A medalha vem de lá. Em breve competirá no Japão, ao lado da filha

QUANDO A MELHOR SAÍDA É CUIDAR DO PRÓPRIO NARIZ Para Daniela de Cássia Pinto, coach do Instituto Brasileiro de Coaching (IBC), os primeiros e mais importantes passos do processo de coaching para mulheres com deficiência encararem o mercado de trabalho com mais segurança são a aceitação das características e limitações do próprio corpo. “A partir daí é necessário trabalhar fortemente o despertar motivado de suas habilidades, competências e de seus sonhos. É assim que surge o planejamento, o foco, a determinação e ousadia”. Falando em ousadia, às vezes ela pode acontecer em dose dupla. Adriana e Mila Poci Cabral, de 50 e 47 anos, respectivamente, são irmãs empreendedoras que trouxeram ao Brasil um ramo de negócio no qual ninguém havia investido ainda: as miniaturas de móveis, utensílios e tudo o mais para uma casa. “Criamos a Casinha Pequenina quando não havia Lei de Cotas, há 23 anos. Era época de procurar emprego, as empresas barravam porque éramos anãs, então, optamos por abrir o quiosque no Shopping Eldorado, que depois evoluiu para uma loja. Meu pai era publicitário, minha mãe é decoradora: decidimos fazer um coletivo e investir naquilo que combinava muito com a gente”, conta Adriana Poci Cabral. Há cinco meses elas abriram uma filial na Granja Viana, onde sempre moraram. Antes de se tornarem donas do próprio nariz, ambas pensavam em seguir carreira artística: Adriana estudou artes plásticas e Mila fez teatro. “O mercado, que é cruel, nos fez mudar de ideia. Eu ia continuar fazendo papel de ajudante de Papai Noel e duende da floresta e não era isso que queria. Na época não tinha tanta abertura, hoje tem mais”, diz Mila.

Para mim a essência é o que a gente é. A pior deficiência é uma pessoa vazia, pouco inteligente no sentido de não ter sensibilidade, de ser pobre de espírito


NOSSA CAPA

Myla Rzezak Formação Medicina Veterinária Idade 45 anos Tem Esclerose múltipla Convive com a deficiência Desde os 25 anos Ama Filmes, música, cães e gatos Fez e aconteceu Estabeleceu uma nova relação com os animais e com os próprios clientes, que se tornaram verdadeiros amigos. Atende os bichinhos sentada no chão.

As duas são donas de excelente humor. Filhas de pais primos de primeiro grau, dizem que foi complicado encarar a realidade de não crescer quando estavam na pré-adolescência. “O médico recomendou o processo de alongamento, mas somos contra”, conta Adriana. Segundo Mila, seriam pelo menos quatro cirurgias: “Uma em cada joelho e uma em cada lado da bacia. Eu ia ficar mais ou menos um ano internada em um hospital do outro lado do mundo, em Pittsburgh. Num prolongamento de osso, a pessoa que tem 1,30m vai ficar com 1,40m, no máximo. Vai continuar sofrendo bullying e vai continuar com os problemas que a sociedade impõe. Dissemos ‘não’”. Mila faz palestras há seis anos em escolas e entidades de classe. Antes era sobre autoestima, a atual é sobre o humor. “É minha favorita. O humor é uma saída para as dificuldades diárias, um pronto-socorro emocional”. A RESSIGNIFICAÇÃO DE SI MESMA Duas de nossas personagens conheceram a vida sem deficiência física até a fase adulta. Suzete Yazaki Yamashiro, de 44 anos, e Myla Rzezak, de 45 anos, respectivamente dentista e veterinária, testemunharam, pouco a pouco, uma nova realidade se estabelecer. Suzete, que hoje trabalha na indústria farmacêutica, perdeu o braço esquerdo para um tumor ósseo chamado osteosarcoma, quase 10 anos atrás. Tinha acabado de ter a filha, Stella. “Foi um processo gradual, o médico foi me preparando. Em princípio eu não tiraria o braço, mas a primeira cirurgia foi bem complicada

Mais do que preconceito, há descaso, o que é ainda pior. Nos ônibus, os elevadores para cadeirantes estão sempre quebrados. Aqui no prédio, que é novo, fizeram a vaga de cadeirante na parte descoberta, longe do elevador


– durou 12 horas – e eu perdi o movimento do braço. Fiz quimioterapia, tive muita infecção, passei muito mal”. A amputação, segundo ela própria, foi a melhor decisão que tomou. “Eu não costumo sofrer mais do que uma ou duas semanas depois de tomar uma decisão. Acho que a vida tem que seguir. Depois disso, eu tirei carta de motorista e pude começar os tratamentos de reabilitação”. Foi quando Yamashiro conheceu a AACD e se engajou no esporte. Ela faz nado sincronizado e natação. “Todo mundo que perde uma parte do corpo, seja uma mama, seja uma perna, um braço, vive um luto, mas isso passa. O que não pode é ficar em luto para sempre. Hoje está tudo bem resolvido para mim”. O quadro psicológico mais comum apresentado por pessoas que adquirem uma deficiência envolve vários estágios. Segundo o psicólogo e psicanalista Emílio Figueira, autor de quase 50 livros (entre eles, Caminhando em Silêncio – Uma introdução à trajetória da pessoa com deficiência na história do Brasil), “A pessoa passa pelo choque, luto e pela negação. Raiva, depressão e defesa são ainda outras fases. Nessa última, que gera hostilidade, algumas podem permanecer indefinidamente, enquanto outras, numa defesa considerada saudável, somam esforços para enfrentar e buscar alternativas para contornar as barreiras”. Myla Rzezak faz isso o tempo todo. Inclusive indo para o chão: é assim que a veterinária atende seus ilustres clientes. “Eu deito no chão com os gatos e os cachorros. Na hora em que estou atendendo o bicho, eu só ligo para ele, pouco me importo com o lugar!”.

Larissa do Nascimento Formação Estudante de Administração de Empresas Idade 20 anos Tem Paraplegia Convive com a deficiência Desde os 9 anos Ama Nadar Fez e aconteceu Participa de competições oficiais de natação pela AACD dentro e fora do Brasil. Já ganhou 103 medalhas, sendo 50 de ouro.

Eu financiei um apartamento quando eu tinha 17 anos, mas por enquanto moro com a minha mãe, que me ajuda muito. Faço de tudo hoje: limpo a casa, cozinho e não pretendo trancar a faculdade. Estou muito ansiosa para o parto, para ver o rostinho! número 8 - março / abril


NOSSA CAPA

É urgente desconstruir o mito da incapacidade e renovar os valores que tangem à inclusão e ao respeito à mulher com deficiência


Faça parte desta campanha. Use: Ela descobriu, aos 25 anos, que tinha esclerose múltipla. Os sintomas apareceram aos 18 anos, mas ninguém identificou sua nova condição. Foi apenas em Nova York, onde foi fazer um estágio, que se viu sem forças até para segurar um copo e profissionais locais deram a notícia. “Eu achava que eles estavam malucos. Que era tudo coisa da minha cabeça, que eu mesma tinha criado isso em mim e que ia conseguir reverter a esclerose. O tempo foi passando e eu tinha muitos sustos. Esse tipo de esclerose é chamado de recorrente-remitente: você tem sintomas e, então, toma corticoide. Entrava em pânico toda vez que a perna começava a formigar.” Myla anda com duas muletas, mas na maioria das vezes, de cadeira de rodas. Sente tontura e, embora fraco, tem o movimento das pernas. “Eu não preciso mais lutar contra isso. Procurei várias terapias alternativas para eu me sentir mais tranquila, tive fé. Passei por muitas coisas”, relembra. Segundo ela, o processo de aceitação foi muito longo, “Uns 11 anos, no total. Mas hoje eu estou em paz. Consigo fazer tudo, dirijo, pego sozinha a cadeira no porta-malas, coloco de volta...”. O sorriso de Myla, se não resolve tudo, esmaece os problemas. Muito receptiva e alegre, é recorrente ouvir que não prestam atenção à sua deficiência. “Nossa capacidade profissional e intelectual independe disso. Por causa da minha simpatia, dizem que nem reparam!”. A gente acredita. O TEMPO NÃO PARA, A MUDANÇA URGE Larissa do Nascimento tem 20 anos e cursa o primeiro semestre da faculdade de Administração de Empresas. E espera, há seis meses, por Mirella, sua primeira filha. “O tiro entrou pelas costas, atingiu a vértebra T9 e saiu do lado. Eu tive uma lesão medular T9, o que significa paralisia total das pernas. O rapaz que me baleou tinha 16 anos, foi preso e lá ficou por apenas três meses. Ele sabe que eu estou na cadeira de rodas por causa dele, mas quando o vejo, ele abaixa a cabeça, não olha para mim”. Aos 9 anos, Larissa foi atingida por uma bala perdida enquanto brincava na rua. “Dois rapazes vieram trocando tiros e um deles me acertou. Mas eu não tenho mágoa porque sei que ele não quis atirar em mim”. Já está acostumada a responder, com naturalidade, que não, a gravidez não é fruto de inseminação artificial. O noivo – que provavelmente, enquanto você lê, caro leitor, já é marido, pois estavam de casório marcado – como ela diz, está “todo bobo”. Há preconceito relacionado à gravidez da mulher com deficiência? Sem dúvida. “A sociedade desencoraja muito, principalmente se elas tiverem deficiência intelectual. Com a aprovação da Lei Brasileira de Inclusão, as pessoas com deficiência, seja qual for, têm garantido o direito de casar ou

constituir união estável e exercer direitos sexuais e reprodutivos em igualdade de condições com as demais pessoas”, ressalta Eliane Lemos Ozores, da Entre Rodas & Batom. Um paradigma interessante, porque foi preciso uma lei para garantir o direito de viver um processo que lhe é inerente desde o seu nascimento. Segundo Marcelo Ares, fisiatra e diretor clínico da AACD, a reabilitação sexual da pessoa com deficiência é, primeiro, um trabalho de autoconhecimento. “Depois, são trabalhadas questões para tentar desmistificar essa crença de que a pessoa com deficiência não pode exercer sua sexualidade, ser foco de desejo ou desejar o outro. Na verdade, o que se procura na reabilitação, no geral, é a inclusão em todos os aspectos”. Larissa, além de futura mamãe, é nadadora: aprendeu todas as modalidades em seu processo de reabilitação na AACD. Desde os 14 anos ela participa das competições oficiais, somando 103 medalhas, sendo 50 de ouro. “Eu nado representando a AACD, então, quando tem campeonatos dentro ou fora do Brasil, eu vou. Adoro nadar!”. Se fosse para seguir a toada social, ou, em outras palavras, sujeitar-se ao débil e desvalioso papel que relegam às mulheres com deficiência, não teria medalha, não. Nem bebês. Tampouco autoria de livros, presidência de ONGs e curso superior. Ter o próprio negócio, independência, morar sozinha? Relacionamentos amorosos, vida sexual? Nem pensar. Viver a plenitude da nova condição física, mental ou intelectual – ou daquela com a qual se nasce – é um direito intransferível. E inadiável. É urgente desconstruir o mito da incapacidade e renovar os valores que tangem à inclusão e ao respeito à mulher com deficiência. O empoderamento de cada uma delas só fortalece seu protagonismo diante da vida e, consequentemente, contribui para a melhoria de tudo aquilo que a cerca. Quer a sociedade aceite e permita, quer não, elas encontram um caminho. Como tão lindamente poetizou Manoel de Barros, “Quem anda no trilho é trem de ferro. Sou água que corre entre pedras – liberdade caça jeito”. D+

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número 8 - março / abril


MISTO QUENTE COMPORTAMENTO

Nem vítima, nem herói Eles são Super Normais. Conheça o grupo de amigos que traduz em autênticas histórias em quadrinhos questões importantes da inclusão social e da pessoa com deficiência texto cintia alves

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uatro amigos reunidos com um desejo enorme de dizer ao mundo o que ainda não foi dito em histórias de quadrinhos. Os três personagens reais – Manoel Negraes, 37 anos, com retinose pigmentar desde o nascimento, começou a perder a visão aos 15 anos; Rafael Bonfim, 33 anos, com deficiência física congênita e Mirella Prosdócimo, 41 anos, tetraplégica devido a um acidente de carro na adolescência – retratam situações cotidianas ligadas às deficiências vividas por eles e seus colegas. Idealizado há três anos e meio, em Curitiba, o projeto Super Normais nasceu das mãos do designer e cartunista Rafael Camargo. Depois de ter seu primeiro contato com pessoas com deficiência na oficina desses três amigos, ele propôs a parceria para ilustrar as

tirinhas como forma de apontar estas questões de maneira mais densa. O grande diferencial do projeto foi explorar o tema valorizando a diferença e não a igualdade. “Nunca abordamos a temática de que todos somos iguais. Independentemente de nossa condição física, todos nós temos diferenças!”, comenta Rafael Bonfim. O quarteto sempre procura evidenciar nas tirinhas, através das singularidades, a busca por soluções para um crescimento em conjunto. Identificar as principais adversidades da sociedade contemporânea, como por exemplo, as barreiras criadas no relacionamento entre pessoas com e sem deficiência, é um dos motes do grupo. Representá-las com olhar ácido, perspicaz e bem-humorado é a marca registrada das tirinhas. Segundo Bonfim, os Super Normais sempre tiveram

uma visão mais descontraída justamente por eles próprios conviverem com uma deficiência. A abordagem ampla dos quadrinhos retoma pontos críticos acerca da inclusão dessas pessoas, destacando a democratização das informações essenciais para quem não vive no contexto. Para os Super Normais, ampliar o tema é uma motivação para que as pessoas falem naturalmente sobre inclusão. “É uma visão diferente do mundo, uma lupa nas barreiras sociais”, finaliza Rafael Bonfim. Na página ao lado, você confere o trabalho do grupo e, a partir da próxima edição, a Revista D+ terá o prazer de contar com a participação fixa dos Super Normais: eles estarão conosco apresentando as tirinhas inteligentes e reflexivas de sempre. Bem-vindos! D+


foto divulgação

O que é ser Super Normal? Não é somente aceitar a deficiência. É abraçá-la e aproveitar o seu potencial de voz de maneira positiva para transformar o seu entorno. Rafael Bonfim É ser tratado com respeito pela sociedade como qualquer outro cidadão. Com defeitos e qualidades que podem colaborar para uma sociedade melhor. Manoel Negraes Ser Super Normal é tratar com naturalidade e bom humor um tema repleto de preconceito e estigmas. Assim, quem sabe em um futuro breve, tenhamos uma sociedade mais justa. Mirella Prosdócimo

Mirella, Manoel, o cartunista Rafael Camargo e Rafael Bonfim: os Super Normais

Acesse também: facebook.com/supernormais número 8 - março / abril


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ste Caderno de Educação apresenta seções que vão ao encontro de pais, familiares, professores, estudiosos e leitores em geral. Inclui, para isso, uma série de reportagens que discorrem sobre o tema Transtorno do Espectro Autista (TEA). Teoria e Prática apresenta o caso do aluno Dimitri Marques Vieira, que é aluno da Escola Municipal de Educação Básica Prefeito Aldino Pinotti em São Bernardo do Campo, São Paulo. Complementando a mesma seção, Sequência Didática ensina a fazer um Diário de Bordo para estimular a ampliação da comunicação do aluno que ainda não se expressa pela fala. Pensando em prestar um serviço aos pais e familiares, Experiências Internacionais inclui os depoimentos de duas moradoras do estado da Flórida, Estados Unidos, que destacam sobre a aprendizagem dos filhos com TEA na escola pública e sobre algumas atividades educativas de que eles participam. Já Família Participativa inclui o depoimento de Ana Paula Chacur, mãe de dois filhos com TEA, que aborda como lidar com questões relacionadas à educação inclusiva e sobre a aprendizagem dos filhos na escola pública e em atividades fora dela. Palavra de Especialista traz uma discussão sobre a inclusão escolar de pessoas com TEA a partir do trabalho da psicóloga Marina Martins Bialer, que pesquisou autobiografias de autistas. Acontece divulga a 1ª. Jornada de Psicopedagogia da Baixada Santista de Autismo, além de uma Agenda de eventos sobre Educação. Boa leitura! A redação TEA É NOTÍCIA Criado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 18 de dezembro de 2007, o Dia Mundial de Conscientização do Autismo (Transtorno do Espectro Autista – TEA) é comemorado, anualmente, no dia 2 de abril. No Brasil e em outros países, alguns monumentos e prédios foram iluminados na cor azul, que simboliza o TEA, pois a síndrome é mais comum em meninos do que em meninas.

DICA DE LEITURA “A escola inclusiva educa o aluno para a convivência na família e na sociedade. Isto é, educa para a vida. Um sistema de ensino inclusivo é aquele que conta com escolas regulares realmente inclusivas e que tem o apoio de instituições especializadas, quando necessário. Há alunos que não carecem de apoio de instituições especializadas. Estes devem frequentar exclusivamente o ensino comum. Porém, há outros que precisam, pois a escola regular sozinha não dá conta de prover um atendimento multiprofissional, com fonoaudiologia, psicopedagogia, dentre outros.”

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Editora (jornalismo) Rosa Buccino Assessora de projetos pedagógicos Claudine Davids

divulgação

SAIBA MAIS! O direito à educação da pessoa com deficiência está assegurado em documentos como: a Constituição Federal de 1988; a Lei nº 8.069, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990; a Lei nº 9.394, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996; o Decreto nº 6.949, de 2009, que ratifica a Convenção da ONU de 2006 sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência; o Decreto nº 7.611, de 2011, que dispõe sobre o atendimento educacional especializado; e a Lei nº 13.146, de 2015, que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência. A Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com TEA foi instituída pela Lei Berenice Piana (Lei nº 12.764, de 2012) e promulgada pelo Decreto nº 8.368, de 2014. As orientações do MEC para a implementação dessa lei nos sistemas de ensino foram dadas pela Nota Técnica nº 24, de 2013.

(Eugênio Cunha é psicopedagogo, trabalha com crianças que apresentam dificuldades de aprendizagem e TEA, além de pesquisador na área educacional, professor da educação básica e do ensino superior; e coordenador de eventos da Clínica-Escola do Autista, situada em Itaboraí, RJ. Já lançou os livros Autismo e inclusão - psicopedagogia e práticas educativas na escola e na família; Autismo na Escola - um jeito diferente de aprender, um jeito diferente de ensinar e Práticas pedagógicas para a inclusão e diversidade).


CADERNO DE

Educação

Autobiografias de pessoas com TEA indicam a necessidade de os especialistas não pressuporem limitações para elas

divulgação

Psicologia e inclusão escolar

PALAVRA DE ESPECIALISTA

reportagem e texto claudine davids

É

importante ter clareza que o conhecimento se renova, que a ciência segue descobrindo novos olhares sobre o mundo, que as instituições sociais se transformam e que os especialistas devem acompanhar esse movimento sem se ater a verdades cristalizadas. Lembrar do percurso histórico da Educação Especial e de suas interfaces com a Psicologia pode nos ajudar a refletir sobre a figura do especialista em tempos de educação inclusiva. A psicóloga Marina Martins Bialer, no artigo “A inclusão escolar nas autobiografias de autistas”, recorre a 14 autobiografias de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) para estudar suas experiências escolares, mostrando as críticas que fazem ao poder do especialista. Segundo Marina, o adolescente com TEA americano Ido Kedar, por exemplo, escreve que muitos especialistas desse campo têm uma “postura de cegueira clínica”, isto é, ficam atrelados às suas teorias, sem ouvir o que a pessoa com TEA tem a dizer. É uma discussão para além dos modelos teóricos que reduzem essas pessoas a uma lista de comportamentos estranhos. “Preso dentro do encapsulamento, Ido era incapaz de se apropriar de sua boca para falar ou da mão para escrever para contar quão bem escutava e compreendia tudo o que estava sendo dito”, relata Marina. Por isso, foi subestimado pelos especialistas até aprender a se expressar pela escrita: “Uma vez que eu não posso falar, se eu não mostrava minha inteligência, assumia-se que sou burro. Pare de olhar para nossos movimentos bizarros, faces blank, falta de fala, dificuldade de escrita à mão, pobre autocontrole, and on and on, como prova de atraso intelectual. Pode parecer isto, mas

eu penso que aqui as aparências enganam”. Na percepção dele, se seus pais tivessem se limitado às orientações dos especialistas, ele estaria “restrito a um currículo de 1+1 e ABC”, registra a pesquisadora. Para a australiana Donna Williams, cuja autobiografia também foi analisada por Marina, a pessoa com TEA pode acumular uma grande quantidade de informações e deixá-la de lado até conseguir processá-la em algum momento — o que evidencia a importância de ser tratada como inteligente e sensível, independentemente de sua severa sintomatologia. Várias autobiografias enfatizam a hipersensibilidade sensorial e a importância de esse modo diferente de processar as informações sensoriais ser respeitado pela escola. “Isso pode exigir adaptações ambientais, como, por exemplo, a redução da luminosidade da sala de aula ou o uso de protetores de ouvido”, complementa Marina. Para a pesquisadora, a inclusão escolar de alunos com TEA impõe desafios, mas a leitura das autobiografias demonstra que muitos podem contribuir para o crescimento de todos os estudantes. Assim, ao focalizar esses relatos, a psicóloga ressignifica a figura do especialista e avança no sentido indicado por Ido Kedar: não pressupor limitações hipotéticas para quem não consegue se expressar da maneira normatizada; afinal, “quem sabe o quanto está trancado dentro”? e LEIA! BIALER, M. M. A inclusão escolar nas autobiografias de autistas. Revista Quadrimestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, São Paulo, v. 19, n. 3, set./dez. de 2015, p. 485-492. número 8 - março/abril


CADERNO DE

Educação TEORIA E PRÁTICA

Dimitri gosta de ouvir músicas gesticulando diante da turma

INCLUSÃO PELA ARTE O caso de um aluno com TEA do ensino fundamental favorecido em seu processo de ensino e aprendizagem reportagem claudine davids edição rosa buccino fotos jéssica carecho


D

imitri Marques Vieira é aluno da Escola Municipal de Educação Básica Prefeito Aldino Pinotti em São Bernardo do Campo, SP. Em 2015, participava duas vezes por semana de aulas de Arte ministradas pela professora Tânia Domingues, licenciada em Artes Visuais com especialização em Desenho. As aulas aconteciam num ateliê, cujo mobiliário era disposto de acordo com o objetivo e o tipo de trabalho (individual, em duplas ou em grupos). Na mesma escola, segundo a coordenadora pedagógica Simone Godoy de Pádua Passafaro, a professora do Atendimento Educacional Especializado (AEE), a de Arte e a de referência da turma trabalhavam de forma colaborativa, planejando estratégias e recursos em prol de todos os alunos. Para o incremento da comunicação e da participação de Dimitri, por exemplo, numa parceria da escola com a família, foi criado um caderno de comunicação [veja a sequência didática adiante] onde eram registradas as atividades da criança, inclusive nas aulas de Arte: “O caderno de comunicação era um recurso útil para a socialização de acontecimentos e saberes dentro e fora do ambiente escolar; era importante nas rodas de conversa em que todos os alunos falavam sobre um dado assunto ou sobre o final de semana”, esclarece Simone. Dimitri tinha o apoio constante de um auxiliar em educação, que mediava as ações propostas pelas professoras de referência da turma, de Arte e do AEE em todos os momentos da rotina e espaços da escola. Embora conseguisse permanecer no ateliê durante as aulas, Dimitri mantinha o foco e a atenção compartilhada por um tempo curto. Quando percebia sua irritação ou cansaço, a professora solicitava a ajuda dele para levar algo para outro professor, significando a saída do aluno. Além disso, eram antecipadas para ele as ações que se seguiam, os deslocamentos de um ambiente para outro e as trocas de atividades. Inicialmente, a rotina era marcada por imagens, mas depois passou a ser registrada em lousa e caderno, inclusive com informações escritas. Dimitri alfabetizou-se nos dois primeiros anos do ensino fundamental. NOS CAMPOS DA ARTE De acordo com o texto preliminar da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a Arte articula diferentes formas de cognição (saberes do corpo, da sensibilidade, da intuição, da emoção etc.), contribuindo para que o aluno aprenda a lidar com a complexidade do mundo, por meio do pensamento artístico. O texto da Proposta Curricular de São Bernardo do Campo para a Educação Especial (2007) lembra que “muitos limites têm sido superados por intermédio das múltiplas possibilidades que a Arte oferece. Ela é um campo

Acesse o site www.revistadmais.com.br e leia mais um Estudo de Caso sobre o aluno João Vítor Soares Barbosa, que concluiu o primeiro ano do ensino fundamental em 2015, na EMEB Profª. Sylvia Marilena Fantacini Zanetti, no município paulista de São Bernardo do Campo.

Equipe da EMEB Prefeito Aldino Pinotti (da esquerda para a direita): Liliane, orientadora pedagógica; Marilene, professora do AEE; Simone, coordenadora pedagógica; Ana Paula, professora de referência da turma em 2016; e Tânia, professora de Artes.

Dimitri dançando na frente do espelho.

número 8 - março/abril


rico de experimentações, aberto às novas composições e elaborações, por isso propõe olhares diferenciados sobre a realidade – olhares que eliminam barreiras arquitetônicas, comportamentais (segregação, estigma e preconceito) e de comunicação, por não partirem de modelos preestabelecidos. Por essa razão, a Arte representa, por excelência, um vetor de inclusão social”. Os objetivos de aprendizagem da Arte são definidos a partir do contexto social e cultural dos alunos, levando-se em conta seus saberes prévios e a necessidade de diferentes abordagens. Para a arte-educadora Ana Mae Barbosa, citada na referida Proposta Curricular, a construção de conhecimento em Arte deve contemplar o fazer artístico, a análise de obras de arte e a História da Arte. No caso em questão, o conteúdo das aulas não foi adaptado, mas foram incluídos elementos com os quais Dimitri gostava de trabalhar (músicas com gestos, historietas, figuras, rádio, fones de ouvido, vídeos musicais, imagens para apoio visual, borrachas macias). Artes Visuais Nos anos iniciais do ensino fundamental, os alunos devem familiarizar-se com elementos constitutivos das Artes Visuais. Dimitri tinha usado tinta, giz de cera, massinha e argila na educação infantil; porém, não gostava dessas texturas e se recusava a desenhar ou pintar. Vídeos sobre História da Arte e músicas permeando as atividades tinham boa aceitação. A turma trabalhou com a técnica de animação Stop Motion: Dimitri vivenciou toda a construção, mas não gravou as vozes

Prevista no atual Plano Nacional de Educação (Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014), a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) vem rediscutindo os conteúdos e objetivos essenciais de cada etapa da educação básica, da educação infantil ao ensino médio. Entende-se que o currículo deve ter uma base nacional comum, à qual todos os estudantes têm o direito de ter acesso, a ser complementada em cada escola e sistema de ensino por uma parte diversificada. A Arte, especialmente em suas expressões regionais, é um dos componentes curriculares obrigatórios, cujo ensino deve abranger as Artes Visuais, a Dança, o Teatro e a Música – o que é um desafio para as escolas, uma vez que a formação do professor ocorre em licenciaturas específicas. Esta matéria apresenta como esses quatro subcomponentes foram trabalhados com uma turma de segundo ano do ensino fundamental em que havia um aluno com Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Xilogravura: a textura lisa do EVA favoreceu a participação do aluno.

das personagens nem pintou os cenários. Outro trabalho proposto foi uma xilogravura: o aluno assistiu a um vídeo sobre a origem do cordel e da xilogravura, ouviu as histórias, sulcou o EVA, aceitou fazer nele os desenhos com o tema indicado, pintou a superfície com tinta (a textura lisa do material o agradou) e teve seu trabalho impresso e divulgado no painel da Mostra Cultural. Dança Foram explorados os movimentos a partir de ações corporais básicas; maneiras de respirar e relaxar; a percepção da voz e do silêncio do corpo; deslocamentos; despertar para a sensação de grupo. Como trabalho final de Música e Dança, houve uma apresentação na Mostra Cultural do Projeto Sustentabilidade; antes, os alunos trabalharam a letra da música “A água” (Marcelo Serralva), estudaram a preservação da água e as bandeiras nas contas de consumo, produziram um folheto com dicas de economia de água e ensaiaram a apresentação. Dimitri foi conduzido nas coreografias pela professora. Música Foram explorados sons e ruídos corporais, vocais e ambientais e realizada uma pesquisa de sonoridades utilizando a voz, o corpo, instrumentos e outros possíveis recursos musicais. Dimitri tinha o hábito de batucar em vários materiais, o que, nas aulas de Música, foi ressignificado por meio do uso de instrumentos musicais. Aprendeu a bater a baqueta no tambor apenas para produzir música. Embora não falasse, nas aulas de Música se arriscava a cantar, fazendo sons e movimentos com a língua e copiando gestos relacionados a canções. Porém, era necessário controlar o barulho no ambiente, pois o excesso de ruído deixava-o muito agitado. Teatro Já nas aulas de Teatro, nas quais houve experimentação para os jogos de sentidos e em que era preciso um maior grau de interação, Dimitri permaneceu como expectador. Em 2016, ampliar esses momentos de socialização e expressão é um dos principais objetivos. e


CADERNO DE

Educação DIÁRIO DE BORDO

Sequência didática Confira uma forma de estimular a comunicação de seu aluno

Exemplo de capa de caderno de comunicação em que o aluno colou seu nome.

texto claudine davids fotos jéssica aline carecho

O

caderno de comunicação, conhecido por alguns como diário de bordo, não é empregado apenas com alunos com TEA. Tem por objetivo principal o incremento da comunicação, servindo como “pista” para o parceiro de comunicação da criança “puxar” a conversa a partir de situações vivenciadas por ela. Existem várias formas de se montar esse recurso, a depender das características e interesses do aluno. 1) Providenciar um caderno de desenho e construir para ele uma capa, junto com a criança, que seja significativa para ela. A criança pode colar sua fotografia, fazer um autorretrato, carimbar as mãos com tinta ou até, como no exemplo, colar o seu nome. 2) Registrar a cada folha do caderno, JUNTO com a criança, uma atividade significativa que possa ser explorada em outro contexto, por outros parceiros de comunicação da criança. Ex.: registro do que a criança fez no final de semana, fotografia da aula de Capoeira na escola, registro da aula de Arte (aprendizado do uso de tesoura). É bacana registrar a data e relatar sucintamente o que a imagem significa, para facilitar a conversa.

Registro feito em casa: “Neste final de semana, eu fiquei em casa com meu pai e minha mãe, pois minha mamãe estava dodói”.

Registro feito na escola: “Demonstração de capoeira. ´O que eu mais gostei foi do berimbau!´ Obs.: O professor ensinou o Dimitri a tocar o instrumento durante a apresentação; ele adorou”.

3) A ideia é que a criança exiba o material de que dispõe, dando pistas de suas atividades em outros contextos. O parceiro de comunicação (a mãe, professor, amigo, familiar, etc.) deve demonstrar interesse, ao mesmo tempo em que deve deixar algumas brechas, fazendose de desentendido, para que a criança se empenhe e busque novas estratégias comunicativas. e

Registro feito na aula de Artes: “Usando a tesoura”.


CADERNO DE

Educação EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS

Educação inclusiva merece atenção nos Estados Unidos Moradoras da Flórida, Estados Unidos, revelam parte do cotidiano dos filhos com TEA em suas respectivas escolas reportagem e edição rosa buccino

S

egundo dados divulgados em 23 de novembro de 2015 pelo Center of Diseases Control and Prevention (CDC), Estados Unidos, um em 45 norte-americanos, de três a 17 anos, apresenta o Transtorno do Espectro Autista (TEA), representando 2,22% da população. Diante desse dado de peso, é normal que programas didáticos voltados aos educandos com TEA sejam pensados como forma inclusiva e social. Nesse rumo, o trabalho desenvolvido por Alexandre Lopes, professor de nacionalidade brasileira, titular até 2013 na Carol City Elementary School, em Miami Gardens, Flórida, foi indicado para o 63º Teacher of the Year (professor do ano), premiação promovida desde 1952, anualmente, pelo The Council Of Chief State School Officers (CCSSO), organização que reúne secretários estaduais de educação nos Estados Unidos. Naquela ocasião,


CASOS REAIS Quando Andres completou três anos de idade, sua mãe Daisy Jaime, moradora do estado da Flórida, Estados Unidos, decidiu que o filho com TEA passaria a frequentar educação infantil numa escola pública. Ela lembra que, de imediato, o menino foi matriculado numa turma com mais cinco alunos com TEA e outros seis fora dessa condição. Hoje, matriculado no ensino fundamental, Andres frequenta uma classe comum e, em outro horário, recebe atendimento educacional especializado. Sobre o sistema de ensino desse país, Daisy explica: “Tenho notícia de que a média de professores em salas de aula é de dois para oito alunos matriculados. No caso de Andres, ele tem acompanhamento de um professor durante as aulas práticas, de modo a incrementar seu desenvolvimento intelectual e sua vivência em grupo. Este ano, aliás, ele já frequenta a sexta série (no Brasil, sexto ano) na Palm Springs Middle School, Hialeah, Flórida, e noto progresso em seu aprendizado. No entanto, defendo que o sistema de ensino público norte-americano ainda ‘pede’ melhorias tanto para alunos com deficiência como para todos os demais. É preciso pensar na educação inclusiva com foco na socialização em sala de aula”. Raiza Rodriguez, moradora do estado da Flórida, notou

TOME NOTA! Mesmo sendo um país de primeiro mundo, os Estados Unidos apresentam controvérsias envolvendo o ensino público. Em artigo recente divulgado no site da educadora Nancy Bailey (o Nancy Bailey´s Education), a matéria “Meeting the Common Core State Standards for Students with Autism: The Challenge for Educators (Definir o Padrão Único de Ensino para Estudantes com TEA: o Desafio dos Educadores)” abordou as falhas existentes no ensino público como um todo. Nancy destacou que o padrão único de ensino adotado no país deixa de atender às reais necessidades de todos os estudantes matriculados na rede pública norte-americana, inclusive as dos estudantes com TEA que não conseguem aprender da mesma forma que os demais. Até por isso, ela defendeu, no mesmo artigo, medidas mais rigorosas e muita atenção no que se refere à educação.

divulgação

a premiação aconteceu na Casa Branca, Washington, com a presença do presidente Barack Obama, e o professor foi o quarto finalista com reconhecimento pela atuação na educação infantil inclusiva no estado da Flórida. Ao abordar a própria didática, Alexandre Lopes foi categórico, comentando conduzir cada uma das práticas pedagógicas em salas de aula com foco nos alunos com TEA de três a cinco anos de idade.

Esquemas visuais (visual schedules) de um grupo de alunos com TEA. Note que cada aluno possui uma tira indicativa de acordo com as atividades propostas. A tira azul é a do aluno Raphael, filho de Raiza Rodriguez.

que seu filho Raphael, aos oito meses de idade, desviava o olhar. Diante disso, ela o levou a um oftalmologista que diagnosticou a visão dele como normal. Adiante, aos dois anos de idade, como ele persistia em desviar o olhar, Raiza decidiu por uma consulta a um neurologista que o diagnosticou com TEA. Nem tardou, o menino passou em consulta com um pediatra devido às suas limitações de fala e começou a participar de um programa denominado Early Steps (Primeiros Passos) como melhor alternativa em busca de terapias de fala funcional, que, segundo Raiza, foram fundamentais para o desenvolvimento do filho. Hoje, matriculado na escola pública Panther Run Elementary, em Hollywood, no ensino fundamental (first grade), o menino frequenta a classe comum e o Autism Cluster (Grupo de Autismo), que possui o chamado Individualized Education Program – IEP (documento individual com os dados educacionais do aluno com deficiência). “Nesse documento, constam o histórico do aluno com TEA e todas as atividades que são direcionadas a ele durante o ano”, detalha Raiza, que nota progressos de aprendizagem através de práticas, como Countmath (atividade lúdica para a criança aprender a contar) e Picture Exchange Communication System – PECS (sistema de comunicação de troca de figuras, que são transformadas em pequenos cartões com fotos, desenhos e palavras escritas para serem utilizados no lugar de palavras que não são verbalizadas). e número 8 - março/abril


CADERNO DE

Educação foto divulgação

FAMÍLIA PARTICIPATIVA

Um ato de amor

A visão materna no desenvolvimento escolar de filhos com TEA reportagem e edição rosa buccino

T

em sido mais palpável acompanhar as evoluções de aprendizagem escolar de um filho com Transtorno do Espectro Autista (TEA). É como observa a técnica em edificações e graduanda em pedagogia Ana Paula Chacur, mãe de dois filhos, que conheceu a área da educação inclusiva, a partir do momento do diagnóstico de TEA associado a má-formação fetal (Hipoplasia do vermis cerebelar) de sua primeira filha Helena. Daquela ocasião em diante, ela começou a pesquisar e estudar sobre a condição da menina em busca de informações que pudessem auxiliá-la a compreender o assunto. Adiante, como ainda não dispunha de uma mediadora, viu-se obrigada a participar do processo de aprendizagem dentro da escola municipal que a filha frequentava, no bairro de Guaratiba, Rio de Janeiro. Matriculada, atualmente, na Escola Municipal Emília Maria Reis, em Santos, São Paulo, Helena frequenta a sala de recursos no contraturno com atendimento educacional especializado, além de praticar aulas de surf adaptado, na Cisco Araña Surf School, pioneira no ensino de surf no Brasil, que fica no posto 2, Praia José Menino. Ela considera toda atividade física importantíssima para o desenvolvimento escolar da criança com TEA, e o papel do educador físico é indispensável, nesse caso. Paralelamente,lida com o fato de Tom, seu segundo filho, ter sido diagnosticado com TEA aos 13 meses de idadeem um grau leve em relação à irmã. Hoje, ele frequenta o ensino infantil na UME José da Costa Barbosa, na mesma cidade.

Ana Paula confessa ter aprendido a lidar com todas as questões que norteiam o universo relacionado ao TEA e relata que, pelo fato de contarem com estimulação precoce, seus filhos foram adquirindo autonomia, fator determinante para o desenvolvimento escolar de ambos. Helena, por exemplo, apresenta melhor socialização, percepção do todo, aumento de vocabulário e progressos na linguagem gestual. Nesse caso, o acompanhamento da mediadora Jessica Souza desde que Helena iniciou os estudos na rede infantil foi igualmente importante. Em 2016, Helena já frequenta o 2º. ano do ensino fundamental e continua com a mesma mediadora, o que colabora no desenvolvimento pedagógico dela. Sobre Tom, hoje com 4 anos de idade, há progressos de aprendizagem - ele frequenta a sala de recursos, possui autonomia e verbalidade. Encontra, porém, dificuldades nas questões comportamentais, que têm sido acompanhadas por terapeutas através de instituições conveniadas à rede publica municipal. Uma questão sobre o acompanhamento dedicado ao filho é apontado por Ana Paula: “Quando Tom completar 5 anos de idade, a rede pública local não disponibilizará de tratamento específico. Um dado alarmante e que tem muito a ver com a própria realidade da educação inclusiva e o auxílio aos estudantes com TEA. Deixei minha carreira, busquei capacitação e tive que fazer o papel de terapeuta dos meus filhos. Tudo para acompanhar o desenvolvimento deles. No entanto, destaco que a educação inclusiva precisa ser melhor trabalhada em favor dos estudantes com TEA”. e


CADERNO DE

Educação ACONTECE

Um novo tempo

O TEACCH segue atualizado e adequado à educação inclusiva brasileira reportagem e edição rosa buccino

Ana Paula Chacur e Maria Elisa Granchi Fonseca: focadas em informações sobre TEA.

fotos divulgação

É

certo que escolas brasileiras têm aderido ao programa TEACCH como forma de incrementar a aprendizagem e o desenvolvimento de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Até por isso, Maria Elisa Granchi Fonseca, psicóloga e mestre em Educação Especial formada pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), e uma das duas profissionais autorizadas a divulgar o TEACCH (Treatment and Education of Autistic and Communication Handicapped Children — Tratamento e Educação para Crianças com Autismo e Desordens da Comunicação) no Brasil de acordo com sua certificação pela University of North Carolina, Estados Unidos, comenta que a rede estadual de ensino público, no estado de São Paulo, já conta com professores que passaram por formação continuada neste programa e que atendem os alunos com TEA nas chamadas salas de recursos, serviço de apoio que a rede oferece no contraturno das aulas regulares. Esse e outros assuntos dedicados ao programa foram abordados por Maria Elisa, no dia 5 de março, no minicurso Fundamentos do Programa Teacch: Ajustes à Realidade Brasileira, durante a 1ª. Jornada Psicopedagógica e Autismo na Baixada Santista, em Santos, litoral paulista. Ao abordar o TEACCH, ela mencionou a importância da flexibilidade no momento em que as atividades propostas são aplicadas. Isso, em outras palavras, significa que um determinado aluno poderá absorver certa atividade de maneira totalmente distinta de outro, abrindo um leque de possibilidades ao se aplicar o programa, caso a caso.

O mundo mudou a maneira de entender o TEA. Vivemos um momento inclusivo, onde a Educação Especial merece cada vez mais enfoques e soluções. (Maria Elisa Granchi Fonseca)

UM POUCO DE HISTÓRIA Quando foi criado, no final dos anos 60, por um grupo de psiquiatras da Faculdade de Medicina da Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, Estados Unidos, o programa TEACCH atendia crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e desordens de comunicação, dentro de propostas terapêuticas, onde pais e crianças eram tratados separadamente. Com o passar dos anos, o psicólogo Eric Schopler notou que era preciso uma abordagem educativa até que, em 1972, criou o programa TEACCH para trabalhar o conceito de ensino estruturado. Hoje, após 45 anos desde a criação, o programa e segue com um novo olhar ao abordar o TEA.

número 8 - março/abril


ACONTECE

AGENDA

PROJETO EXEMPLAR Em 1 de abril de 2014, véspera da data em que se comemora o Dia Mundial de Conscientização do Autismo, foi inaugurada a primeira clínica-escola do Brasil para atender pessoas com TEA. O projeto, idealizado por Berenice Piana (autora da Lei nº 12.764, de 2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com TEA), é coordenado pela professora Gisele Nascimento, em Itaboraí, Rio de Janeiro. Outras cidades brasileiras já manifestaram interesse de desenvolver o mesmo projeto.

ABRIL III Congresso Nacional de Formação de Professores (CNFP) e XIII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores (CEPFE) Tema: “Profissão de professor: cenários, tensões e perspectivas” Local: Hotel Majestic, Águas de Lindóia, SP Data: 11 a 13 de abril de 2016 Realização: Pró-Reitoria de Graduação – Reitoria da Unesp Informações: www.geci.ibilce.unesp.br/logica_de_aplicacao/site/ index_1.jsp?id_evento=64 V Colóquio Luso-Brasileiro de Sociologia da Educação

CAPACITAÇÃO Alunos com deficiência têm o direito de receber educação na classe comum e de receber Atendimento Educacional Especializado (AEE) no contraturno escolar. Em sintonia com essa necessidade, Neusa Rocca, coordenadora do Núcleo de Apoio Pedagógico Especializado (CAPE) da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo destaca a importância da capacitação de professores através de cursos on-line ou presenciais disponibilizados pela Secretaria. Além disso, ocorre a implantação gradativa de salas de recursos multifuncionais. Neusa Rocca conta que, no início de 2016, houve um aumento de 20% nos pedidos apresentados por escolas da rede estadual paulista para abertura de novas salas de recursos multifuncionais.

Tema: “Mérito, desigualdades e diferenças: cenários de (in)justiça escolar no Brasil e em Portugal” Local: Hotel La Residence Paulista, São Paulo, SP Data: 21 e 23 de abril de 2016 Realização: FE-USP, GPS-USP Informações: www.vcoloquiolusobrasileirosociologiadaeducacao.com XIII Semana de Estudos Clássicos e Educação da FE-USP Tema: “Os outros, os mesmos: a alteridade no mundo antigo” Local: Auditório da FE-USP, São Paulo, SP Data: 25 a 29 de abril Realização: FE-USP Informações: www3.fe.usp.br/secoes/inst/novo/eventos/ detalhado.asp?num=2612 MAIO VI Fórum Internacional sobre surdocegueira e deficiência múltipla sensorial: de mãos dadas saúde, educação e direitos no atendimento educacional especializado

FIQUE POR DENTRO! Renata Garcia, diretora da Divisão de Educação Especial da Secretaria Municipal de Educação (SME-SP) e responsável pelo trabalho dos 13 Centros de Formação e Acompanhamento à Inclusão (CEFAIs), mencionou que há progressos, nos três últimos anos, quanto à inclusão de educandos com TEA na rede, conforme ilustra o gráfico.

Tema: Divulgação do conhecimento científico sobre surdocegueira e deficiência múltipla sensorial Local: Auditório da Escola de Aplicação da USP, São Paulo, SP Data: 17 a 20 de maio de 2016 Realização: FE-USP Informações: www3.fe.usp.br/secoes/inst/novo/eventos detalhado.asp?num=2278 13ª Jornada de Educação Especial e I Congresso Internacional de Educação Especial e Inclusiva

LEVANTAMENTO DE EDUCANDOS COM TEA MATRICULADOS EM SALAS COMUNS DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE SÃO PAULO

Tema: “Desenhos contemporâneos da educação especial e inclusiva: fundamentos, formação e práticas” Local: Faculdade de Filosofia e Ciências - Unesp , Marília, SP Data: 18 a 20 de maio de 2016 Realização: Departamento de Educação Especial (FFC – UNESP – Marília), PPG em Educação (FFC- UNESP – Marília / Linha de Educação Especial) Informações: www.fundepe.com/jee2016/

1500 1200

Total 900 600 300 0

Autismo 31/12/2013

Autismo 31/12/2014

IV Seminário Internacional Inclusão em Educação: Universidade e Participação (UP-4)

Autismo 31/12/2015

foto lilian borges

Fonte: Secretaria Municipal de Educação de São Paulo (SME-SP).

Tema: “Inclusão, ética e interculturalidade” Local: Auditório do Roxinho e salas do CCMN – Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza, no campus UFRJ da Ilha do Fundão, Rio de Janeiro, RJ Data: 11 a 13 de maio de 2016 Realização: LaPEADE, Universidade do Brasil – UFRJ, CNPq, CAPE, FAPERJ, ECG do TCE-RJ Informações: www.lapeade.educacao.ufrj.br/ III Seminário Nacional de Administração Educacional / Encontro Estadual da Associação Nacional de Política e Administração da Educação/ Encontro do Programa de Apoio aos Dirigentes Municipais de Educação

SAAI (Sala de Apoio e Acompanhamento à Inclusão) da EMEF Deputado Rogê Ferreira

Tema: “A gestão da política nacional de educação: desafios contemporâneos para a garantia do direito à educação” Local: UFPI, Teresina, PI Data: 04 a 06 de maio de 2016 Realização: Anpae-PI, UFPI Informações: www.seminario3nuppege.ufpi.br



RESENHA PARALISIA CEREBRAL E A COMUNICAÇÃO

Organismo e Sujeito Uma diferença sensível nas paralisias cerebrais tese de roseli vasconcellos*

por eliza padilha

*Tese defendida por Roseli Vasconcellos, para a obtenção do título de Doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, pela Pontifícia Universidade Católica – PUC de São Paulo, em 2010

A

o longo de dez anos em clínica tratando pacientes impedidos de se expressar oralmente por conta de paralisia cerebral, Roseli Vasconcellos vivenciou os efeitos da Comunicação Alternativa, que consiste na utilização de símbolos com o objetivo de suplementar ou substituir a língua falada, dependendo do caso em questão. É aplicada tanto em crianças durante a aquisição de linguagem, quanto em pessoas mais velhas em que a fala é comprometida parcial, temporária ou permanentemente. Sua experiência com a Comunicação Alternativa, o que tornou Vasconcellos detentora de grande conhecimento a respeito e muito requisitada para disseminá-lo a demais profissionais da área, deu-se na Clínica de Linguagem, que utiliza esse sistema proposto pela teórica Cláudia Lemos, cujo laço de filiação aproxima-se do Estruturalismo Europeu, com a leitura de Jacques Lacan. Ou seja, não é apenas um tratamento fonoaudiológico organicista, social ou cognitivista; mostra, também, grande compromisso com os estudos aplicados da linguagem. A questão base para sua tese de doutorado surgiu ainda no mestrado, quando, interagindo com as ideias do linguista Ferdinand de Saussure, a autora discute a presença de significado e significante na linguagem de pessoas com paralisia cerebral, constatando a existência de um corpo que se comunica mesmo com a impossibilidade de vozear devido às limitações da paralisia. Desta forma, é possível tratar, não da paralisia e suas consequências limitadoras, mas da linguagem em movimento latente expressa nas produções dessa parcela da população. Roseli destaca as discrepâncias entre a Clínica de Linguagem e as demais clínicas que se utilizam da Comunicação Alternativa e explica o motivo: a separação entre organismo e sujeito. Uma das bases são afirmações feitas por Sigmund Freud, já em 1833, nos estudos sobre a histeria, que considerava a possibilidade de haver modificação funcional sem lesão orgânica, sendo o corpo expressão irredutível ao organismo. Tal diferença, que permeia toda a tese, permite observar a heterogeneidade dos efeitos na relação entre a criança com paralisia cerebral e a linguagem, de forma a analisar as “manifestações significantes de um corpo prejudicado – de um corpo que fala (como pode).” Desenvolvendo um diálogo pertinente com o discurso organicista, Vasconcellos explica que o termo “Paralisia Cerebral” é utilizado para descrever desordens neurológicas que não progridem, causadas por anormalidades cerebrais na infância, ou ainda na fase fetal, e afetam permanentemente movimentos corporais e coordenação muscular. A realidade é que ainda há muitos mistérios acerca dessas anomalias: se surgem na fase pré, peri ou pós-natal. Sobre isso, consulta Freud, em estudos antigos sobre pacientes com problemas neurológicos, nos quais notou outros problemas acompanhando a paralisia cerebral: retardo mental, problemas visuais e convulsões. Para o pai da psicanálise, tais desordens surgiam ainda na fase intrauterina, no desenvolvimento do cérebro.


Diante de um panorama da literatura representativa no campo da Comunicação Alternativa, a autora percebe um forte desejo de teorização. Mas sugere que para galgar novos degraus nesse sentido, é necessário que haja, primeiro, uma evolução teórica que trabalhe na articulação do sujeito com a linguagem, separando esta da função cerebral ou cognitiva, para explicar o porquê a paralisia que afeta o organismo não impede que o ser se expresse. Outra importante discussão abordada é a tentativa de classificação dos pacientes, o que a pesquisadora critica veementemente por culminar em uma homogeneização que impossibilita a percepção das peculiaridades e idiossincrasias emergentes na relação desses sujeitos com a linguagem. Ambas as discussões levam Vasconcellos a explicitar sua posição teórica, que justamente, enfatiza a linguagem produzida por esses sujeitos ainda que não haja fala oralizada. “Para mim, seus olhares e gestos, mais do que movimentos incoordenados, dizem de uma presença viva que convoca o outro.” A principal questão problemática, à qual sempre retoma a tese, é o fato de que a pessoa com paralisia cerebral não se reduz à anormalidade neurológica que afeta seu organismo.

A heterogeneidade espontânea dos efeitos de uma paralisia motora decorrente da paralisia cerebral não impede os pacientes de se constituírem seres da linguagem. Fica esclarecido que a Comunicação Alternativa funciona como um ponto de encontro entre o paciente que precisa se comunicar e o terapeuta, além de ponto de abertura da possibilidade de materialização da fala, caracterizando um sujeito-falante mesmo na ausência da oralidade. Isso comprova a existência do corpo que se manifesta, remetendo à afirmação inicial de que organismo e sujeito não coincidem. Após demonstrações teóricas e experiências clínicas, é preciso reconhecer a importância da Comunicação Alternativa praticada na Clínica de Linguagem, onde o paciente é compreendido como sujeito que se expressa independentemente das limitações orgânicas. Ali recebe um tratamento peculiar, que vai além da fonoaudiologia e da neurologia, acrescentando o compromisso com a linguagem, o que, conforme Roseli Vasconcellos vem provando ao longo de anos, possibilita avanços excepcionais e heterogêneos no que diz respeito à comunicação de pessoas com paralisia cerebral impedidas de oralizar. D+

número 8 - março/abril


APRENDA LIBRAS

por célio da conceição santana e joice alves de sá ilustrações luis filipe rosa

aprenda sinais de

tempo

A

palavra tempo pode ter muitos significados de acordo com o contexto em que é inserida, porém, nesta edição, vamos sinalizá-la como período. “Tempo, tempo, tempo é um dos deuses mais lindos...”, já dizia Caetano Veloso. Tão precioso e nem o vemos passar; é ele quem determina os momentos em anos, meses, semanas, dias, horas e minutos, organizando nossa vida em uma grande agenda linear. Não perca tempo, venha aprender!

Dia

Passado

Hoje

Amanhã

Ontem

Próxima Semana


Semana

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Próximo Mês

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MISTO GARFO QUENTE E FACA

ao ponto Carne de cordeiro, buffet sofisticado e acessibilidade sĂŁo as marcas registradas da tradicional Esteio Grill & Gourmet texto brenda cruz fotos nathalia henrique

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Pensando no maior conforto de clientes com deficiência, reformamos os espaços e agora garantimos ainda mais o acesso a todos Fabio Ortega Campardo

Q

uem aprecia um bom churrasco sabe que cada detalhe é importante para que a carne fique saborosa, macia e no ponto desejado. A churrascaria Esteio, inaugurada há quase 30 anos, sabe bem disso. Localizada no bairro do Ipiranga, em São Paulo, o restaurante tem ambiente amplo, confortável e aconchegante, com um viés rústico na decoração. A Esteio oferece muitas variedades para uma refeição completa: carnes nobres e opções sofisticadas das cozinhas italiana, japonesa, espanhola e portuguesa. O carro-chefe da casa, segundo o proprietário Fabio Ortega Campardo, é a carne de cordeiro. A entrada mais popular é a salada de rúcula com bacon, temperada com vinagre de vinho. A churrascaria tem um buffet diversificado, generoso e que atende a todos os gostos. A carta de vinhos não deixa a desejar: são cerca de 50 opções, entre nacionais, argentinos, chilenos, uruguaios, portugueses, espanhóis, italianos, franceses e sul-africanos. Aos amantes da boa cerveja, a casa oferece as tradicionais e as opções gourmet da Baden Baden. “São vários tipos de cerveja que harmonizam com diferentes cortes de carne”, diz Campardo. A melhor pedida para acompanhar o cordeiro, segundo ele, é a Baden Weiss à base de trigo, e para as demais carnes, a Baden Cristal é boa pedida. As principais sobremesas do restaurante são o petit gateau e a torta de sorvete servida com calda quente de chocolate, além do creme de papaia e do clássico abacaxi em fatias. A qualidade dos pratos e o bom atendimento garantiram o Certificado de Excelência do site TripAdvisor, que premia restaurantes, acomodações e atrações que recebem frequentemente avaliações excelentes dos viajantes. Além disso, há mais de 16 anos, o lugar oferece acessibilidade (veja o quadro). “Pensando no maior conforto de clientes com deficiência, reformamos os espaços e agora garantimos ainda mais o acesso a todos”, afirma Fabio. D+

Churrascaria Esteio Rua Francisco Peres, 250, Ipiranga, São Paulo Rodízio de segunda à sexta-feira por R$ 59,90; aos sábados e domingos por R$ 69,90. Sobremesas de R$ 10 a R$ 20 Tel.: (11) 5061-5581 www.churrascariaesteio.com.br número 8 - março / abril


MISTO QUENTE UNIVERSO CULTURAL

sobre asas e arte Comemorando 10 anos, a peça Judite quer chorar, mas não consegue! já excursionou por cidades do Brasil e exterior, atingindo um público superior a 20 mil pessoas texto brenda cruz

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resa a medos e incertezas, Judite é uma lagarta que se recusa a virar borboleta: prefere se acomodar no jardim por desconhecer o futuro. Seus questionamentos propõem uma reflexão sobre a solidão dos indivíduos em uma sociedade que procura padronizar as identidades e os desejos a partir de modelos definidos. A peça Judite quer chorar, mas não consegue! é um espetáculo de dança criado pelo coreógrafo-intérprete baiano Carlos Eduardo Oliveira do Carmo, de 39 anos, direcionado ao público infantil, mas que fascina todas as idades. O projeto, que comemorará 10 anos em outubro, viaja pelo Brasil e pelo mundo conquistando o público com sua forma poética ao tratar das transformações e perdas que enfrentamos ao longo da vida. Edu O., como é conhecido, faz apresentações em festivais, escolas e teatros por toda a Bahia, onde mora; em algumas cidades do Brasil, como São Paulo, Londrina e Viçosa, além de algumas incursões internacionais, como a apresentação na França.

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A história da lagarta se transformou em livro infantil, audiobook e HQ ASAS DE ARTISTA Desde a infância, munido de uma veia artística nata, Edu escrevia poesias, desenhava, criava histórias e cenários em miniatura para “brincar às tardes com a coleção de Playmobil” (uma linha de brinquedos com pequenos bonecos de partes móveis e uma série de objetos que compõem cenários temáticos). Eduardo sempre desejou seguir uma carreira onde conseguisse se expressar artisticamente. Sonhava em ser ator de novela, mas tinha consciência da dificuldade em alcançar tal desejo. “Eu não me via representado nas produções televisivas, pois, neste ambiente, o corpo com deficiência nunca esteve vinculado à produção artística”. Como artista independente, com deficiência – ele é paraplégico, devido à poliomielite que teve com um ano de vida –, fora da mídia e do eixo de maior visibilidade do país, e sem nunca ter recebido patrocínio para sua manutenção, Edu expõe seu orgulho pelo trabalho. “Judite é o meu projeto mais bem sucedido, aliás, posso afirmar sem medo que é um dos projetos de dança mais bem sucedidos do Brasil. Pois sobrevive há 10 anos e ainda tem fôlego e desdobramentos que me dão apoio para continuar.” O artista usa o palco com sabedoria para emplacar os sentimentos daquela pobre criatura que se

fotos celia aguiar

Edu também criou um curso voltado para crianças chamado Despertando Judites e um espaço cultural

foto arthur scovino

empenha em reprimir e negar a sua transformação. A interpretação final fica na responsabilidade individual do expectador. “O espetáculo deixa essa dúvida no ar e cada pessoa faz sua interpretação, criando seu próprio final para Judite. Se eu disser o que penso, e isso varia de acordo com o dia, com o público e com meu estado emocional, reduz as possibilidades, que são muitas”, revela o artista. A história da lagarta se transformou em livro infantil, audiobook narrado pela atriz Malu Mader, HQ e um curso voltado para crianças chamado Despertando Judites. Por sua vez, o curso também virou livro didático e ganhou um espaço cultural.

Crianças e adultos encontram ali elementos referenciais da obra de Judite: com cores, cheiros, sons, objetos e imagens que possibilitam uma experiência sensorial e estética a todos os visitantes. O espaço também recebe oficinas e apresentações artísticas seguidas de bate-papos, realizados sempre na segunda semana de cada mês. O Jardim ainda acolhe os Encontros Aborboletados, promovendo uma reunião de artistas e grupos locais com artistas e grupos visitantes para trocarem experiências e realizarem propostas artísticas que conversem com a estética do espetáculo. Toda a programação está disponível em www.jardimdejudite.com.br. D+

PROJETOS DE ANIVERSÁRIO A lagarta talvez não tenha criado asas e alçado voo, mas ganhou um lar. Em Santo Amaro, na Bahia, cidade natal e residência de Edu, o quintal da casa 53 na Rua C abriga a instalação interativa Um Jardim para Judite.

Os livros podem ser adquiridos na Livraria Cultura: Livro Infantil: R$ 30,00 Audiobook: R$ 30,00, com frete Livro Didático: Edição esgotada www.facebook.com/CasuloDeJudite www.monologosnamadrugada.blogspot.com.br número 8 - março / abril


ESPAÇO DO TILS (TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS)

Tempo escolar: a melhor maneira de usufruí-lo

Silvana Zajac

Professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (LAEL/ PUCSP), mestra em Educação (Unimep) e bacharelada em Letras/Libras (UFSC/Unicamp)

* Para participar com perguntas e sugestões, escreva para tilsdmais@gmail.com

A

ssim como o espaço escolar, os aspectos referentes ao tempo também são pouco estudados no âmbito da tradução e interpretação da Libras/ Português. Além de ser um assunto que suscita muita reflexão, pode ser determinante nas relações estabelecidas e na atuação do tradutor/intérprete de língua de sinais em sala de aula. Primeiramente, precisamos compreender que o panorama adotado neste artigo, sobre os aspectos referentes ao tempo escolar, está diretamente ligado ao desenvolvimento das competências do Tils, já trazidas em outras edições da Revista D+. Assim, conceituaremos tempo na perspectiva grega, que dispõe da seguinte forma: Kronos, o tempo do relógio; Kairós, o momento da oportunidade, o tempo em que algo especial acontece e tem natureza qualitativa; e Aión, que designa a intensidade do tempo vivido. Neste contexto, é de fundamental importância que o Tils pense o seu tempo não somente como kronos, ou seja, tenha um horário para chegar à escola, entrar em sala de aula, fazer o seu trabalho e ao final do turno, ir embora. Mas também, na perspectiva de kairós e aión, nos quais o profissional precisa aproveitar o tempo disponível nas aulas com intensidade/qualidade, visando ao melhor desempenho na tradução e interpretação para beneficiar sempre mais os alunos surdos. Como o Tils sempre estará subordinado à sistematização do regente da aula, é preciso entender que cada professor pode ter uma forma diferente de organizar o tempo: alguns preparam atividades individuais ou em grupos; outros planejam a aula inteira com exposição e explicação da matéria; há os dias de prova, nos quais a aula é dedicada à avaliação de conhecimentos; dentre outros. Diante das diferentes possibilidades de organizações, é importante que o Tils saiba como ocupar seu tempo em

sala de aula – com qualidade – que, na maioria das vezes, será interpretando ou traduzindo. Assim, trazemos algumas dicas importantes que precisam ser observadas pelo profissional da tradução e interpretação de língua de sinais em relação ao tempo: 1ª É de suma importância que o Tils sempre saiba e estude o conteúdo a ser trabalhado pelos professores nas aulas referentes a cada dia letivo. Para tanto, é imprescindível que use um tempo significativo – fora do horário de aula – para preparar e planejar a tradução/interpretação. 2ª Em sala de aula, é muito comum que o professor destine um tempo para leitura individual, realização de exercícios ou até mesmo cópia da lousa ou de algum material. Nestes momentos, o Tils deve ficar à disposição dos alunos surdos para eventuais perguntas. No entanto, na maioria das vezes, ele fica ocioso. Então, é recomendável que sempre use esse tempo para o desenvolvimento da competência referencial e leia/estude o conteúdo que está sendo trabalhado naquele momento. 3ª Nos casos eventuais de aulas vagas, é pertinente que o Tils invista no estudo de alguma das principais competências necessárias ao profissional da tradução/interpretação. É de muito bom senso evitar gastar esse tempo em bate-papo com os alunos. Pensar no tempo escolar nos desafia a refletir na função do tradutor/intérprete de língua de sinais dentro da escola também como agente de construção e reflexão, tanto do ato interpretativo, quanto da profissionalização dessa categoria. Nesse sentido, o tempo escolar deixa de ser aquele tempo de cumprir com as obrigações, de realizar atividades que se destinam meramente a D+ preencher a carga horária.



só mais cinco minutinhos...

N

A clássica frase feminina inspirou o primeiro vídeo Maquiagem em 5 minutos, em Libras

athália da Silva tem 26 anos, é maquiadora, surda e youtuber. Entre muitos pincéis, sombras e batons, criou o seu canal em Libras, direcionado à comunidade surda, com tutoriais encantadores. Apaixonada por maquiagem e fotografia, a jovem decidiu gravar os vídeos com intuito de ampliar as oportunidades de conhecimento da comunidade, após trabalhar por quatro anos como maquiadora em domicílio. “O objetivo sempre será mostrar as novidades e apoiar as pessoas com deficiência, facilitando a comunicação e o acesso às informações”, conta ela, em conversa exclusiva com a Revista D+. Apesar de o canal ser segmentado para surdos, Nathália começou a

texto cintia alves

receber mensagens de ouvintes interessados, que não se viam prestigiados devido à ausência de legendas e descrições nos vídeos. “Comecei com o uso de legendas para compartilhar com um público maior”. Hoje, Nathália também se arrisca em tutoriais sobre cabelo e faz planos ambiciosos de trabalho em diferentes lugares, entre eles, em grandes emissoras de TV. “O meu sonho é que o meu canal seja um sucesso!”. D+

Onde encontrá-la? www.nathaliasilva.com www.facebook.com/NathaliaSilvaMaquiadora www.youtube.com/user/nathaliamaquiadora

fotos divulgação

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A Honda Automóveis do Brasil Ltda. reserva-se o direito de modificar equipamentos ou especificações técnicas sem prévia notificação. Garantia de 3 anos sem limite de quilometragem válida na rede de concessionárias Honda. Assistência 24h. Consulte a disponibilidade de itens de acordo com as versões. Fotos ilustrativas. O sistema de impressão sobre o papel não reproduz com absoluta fidelidade a cor real do veículo, servindo apenas como referência. Consumo de combustível (km/l) para o Honda Fit 1.5 CVT: 8,34 km/l (etanol) e 12,27 km/l (gasolina) em ciclo urbano (cidade) e 9,90 km/l (etanol) e 14,14 km/l (gasolina) em ciclo rodoviário (estrada). Classificação no Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular: A. Consulte a disponibilidade dos itens de acordo com as versões.


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