Revista IDEIAS 116

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junho 2011

ano VI

Política, Economia & Cultura do Pa Paraná

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nº 116

R$ 10,00




Índic� colunistas

seçÕes

Rubens campana 12 culto da catástrofe

editorial 05

luiz geraldo Mazza 17 o búfalo da madrugada

Frases 07

luiz Fernando pereira 22 eleições peruanas. pobre américa látina

curtas 06

gente Fina 08 câmara dos Vereadores 23

Rogerio Distefano 24 grandes livros, pequenas maldades

paraná pesquisas 27

carlos alberto pessôa 26 contra as pretensões gls

prateleira 56

ensaio Fotográfico 46

Isabela França 70

Fábio campana 37 Mulheres

Balacobaco 74

nesta edição

solda 44 grandes esportistas do séc. XX

cartas/expediente 81

entrevista com abelardo lupion 14 Fábio campana

ana Teresa londres 51 o shortinho carioca

Megavigarista, o caso Vc consultoria 18 Mara cornelsen

ciro correia França 58 amigos de fé

78 dias no inferno 28 Márcio Barros

Izabel campana 59 encontro marcado com Fernando sabino

Você precisa de aulas de sexo? 32 Karen Fukushima o universo dos crossdressers 40 Marianna camargo uma história quase esquecida 52 sarah corazza especial Wilson Bueno 54 Marcio Renato dos santos Marianna camargo curitiba: a nova meca da cerveja 60 Thais Kaniak

54

Moda - Tess Biscaia 78

pryscila Vieira 82

74

luiz carlos Zanoni 64 o mestre de vinhos de Rondon Jussara Voss 65 celso Freire: uma lição camilla Inojosa 66 Que seja eterno enquanto dure... claudia Wasilewski 68 selo de qualidade para os homens Jaime lerner 80 o último tango

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116 E Fábio Campana

I

deias deste mês tem novidades. Estreia nova cronista, a Ana Teresa Londres, que nos conta como era a vida e os preconceitos na Curitiba dos anos 70 pelo olhar de uma carioca surpreendida pelo recato da acanhada província.

Há mais. O bom texto à casa torna. Marcio Renato dos Santos escreveu bela

homenagem ao Wilson Bueno que nos faltou há um ano. Vai ao lado da crônica de Marianna Camargo que também lembra o amigo. Thais Kaniak assumiu o Balacobaco. Isabela França faz o melhor colunismo social da cidade. Jaime Lerner bate o ponto com o último tango em Buenos Aires. Ciro França fala sobre os homens e mulheres de fé. Izabel Campana de suas primeiras experiências literárias e o dia em que conheceu Fernando Sabino. Jussara Voss assume a página de gastronomia no lugar de Vicente Ferreira, que tirou férias e saiu pelos sete mares conhecidos a descobrir novos sabores à mesa. Bravo Ferreira. Ele garante que a Jussara, por ele indicada, é a melhor. A reportagem de capa é mais um sinal dos tempos e das mudanças nos costumes de Curitiba. Agora temos escolas e mestras que se propõe a melhorar o desempenho de homens e mulheres na cama. Assinada por Karen Fukushima, que entrevistou as professoras, os alunos e o common people sobre esse novo negócio que aproveita a onda de erotização. Mara Cornelsen levantou a vida e as falcatruas daquele que gosta de ser conhecido como megavigarista. Neviton Pretti Caetano. Pasmem. Ele deu golpes que prejudicaram mais de 40 mil pessoas. Está preso. Por enquanto. Na prisão também está quem nada deve à Justiça. Incrível. Erros judiciários e entraves burocráticos mantêm encarcerados inocentes que aguardam providências. Isso acontece aqui, nas prisões do Paraná. Onde está a Defensoria Pública? E o Ministério Público? E o Corregedor de Presídios? Contra a burocracia e a visão estatólatra dos problemas é o deputado federal do Paraná, Abelardo Luiz Lupion Mello, que dá entrevista e assume o que outros políticos nativos não têm coragem de assumir. É de direita e explica o que isso significa para ele. Um gesto corajoso nestas paragens em que os políticos adoram a dissimulação para esconder suas verdadeiras ideias. Quando as têm. Há muito mais. Os de sempre. Luiz Geraldo Mazza, Carlos Alberto Pessôa, Rubens Campana, Luiz Fernando Pereira, Rogerio Distefano, Luiz Carlos Zanoni. E o humor do Solda. Para encerrar a leitura de todos e tantos outros, a Pryscila Vieira nos oferece Amely, a personagem fantástica que expõe, através dessa boneca inflável, os desatinos de homens e mulheres, ou seja, de todos nós.


Curtas

PALOCCI AMPLIA PATRIMÔNIO 20 VEZES

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O ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, teve um aumento de patrimônio de 20 vezes entre 2006 e 2010, quando ele era deputado federal, eleito pelo PT de São Paulo, de acordo com reportagem da Folha de S. Paulo.

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ESCÂNDALO REUTERS

Strauss-Kahn, presidente do FMI (Fundo Monetário Internacional) foi acusado de agressão sexual por uma funcionária de um hotel.A mulher que apresentou a denúncia contra Strauss-Kahn foi uma camareira de 32 anos, que fugiu do quarto após o incidente. De acordo com a polícia, o fato ocorreu no luxuoso hotel Sofitel, perto de Times Square.Strauss-Kahn, um possível candidato socialista nas eleições presidenciais francesas de abril próximo, deixou o hotel após o ocorrido. Ele foi formalmente acusado de agressão sexual e tentativa de estupro.

70 bi O governo anunciou no dia 12 de maio que serão destinados R$ 71,7 bilhões para a segunda fase do programa “Minha Casa, Minha Vida”. Desses, R$ 62,2 bilhões serão provenientes do OGU (Orçamento Geral da União) e outros R$ 9,5 bilhões de recursos do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) destinados à habitação.

Mais barato O etanol e a gasolina já estão mais baratos nos postos de combustíveis de Curitiba. A queda é reflexo do anúncio do governo federal, que afi rmou que o preço nas distribuidoras ficaria mais em conta.

ESCLARECIDO Afanar o gravador de um repórter, ameaçar jornalistas ou desvirtuar fatos para defender-se de acusações são atitudes típicas do déspota não esclarecido Roberto Requião de Mello e Silva. Seus gestos hoje surpreendem o país, mas eram conhecidos dos paranaenses, inclusive da maioria que o elegeu e reelegeu governador. O que prova que a patologia social muitas vezes pode ser maioria em eleições diretas. Especialmente quando parcelas da classe média ressentida se vê diante de um bufão a discursar seu moralismo chinfrim mesclado com frases extraídas da Carta de Puebla e outras do anedotário de Hugo Chávez. Motivo de chacota, o bufão experimenta agora a solidão do déspota sem poder.

Novo prefeito

Inimputável

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Lembra do padre que foi detido pela polícia quando dirigia bêbado, nu da cintura para baixo e abordava um adolescente? Ao ser preso, o Padre ainda tentou subornar os policiais. Isso aconteceu há um ano, no dia 16 de maio de 2010, em Ibiporã. Os fatos estão descritos em uma ação que tramita na Vara Criminal da Comarca de Ibiporã. Pois, pois, o tempo passa, o tempo voa, e o Padre Silvio Andrei Rodrigues está numa boa. Segundo a reportagem do portal Bonde, ele celebra missas no interior de São Paulo. Pasmem, agora é o Padre que processa os policiais que o prenderam por abuso de autoridade. A foto do Padre celebrando missa é do twitter do próprio.

O Ministério da Educação informou que não se envolverá na polêmica sobre o livro com erros gramaticais distribuído pelo Programa Nacional do Livro Didático, do próprio MEC, a 485 mil estudantes jovens e adultos. O livro “Por uma vida melhor”, da professora Heloísa Ramos, defende uma suposta supremacia da linguagem oral sobre a linguagem escrita, admitindo a troca dos conceitos “certo e errado” por “adequado ou inadequado”. A partir daí, frases com erros de português como “nós pega o peixe” poderiam ser consideradas corretas em certos contextos.

DÉSPOTA NADA

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POR UMA VIDA MELHOR?

O padre nu

A Justiça Federal informou que a sentença de Carlos Eduardo Sundfeld Nunes, mais conhecido como Cadú, assassino confesso do cartunista Glauco Villas Boas e do fi lho dele, Raoni, sai até o início de junho. O Ministério Público deu parecer de que o réu é inimputável.

Itaperuçu finalmente tem um prefeito definido. Neneu Artigas (PDT), foi diplomado no Fórum Eleitoral de Rio Branco do Sul e em seguida empossado na Câmara dos Vereadores de Itaperuçu. Ele teve o mandato cassado depois que seu adversário e segundo colocado nas eleições, Gerson Ceccon (PMDB), entrou com medidas judiciais para afastá-lo. No último dia 5 de abril, a juíza Adriana Benini, da 156º Zona Eleitoral, deu parecer favorável a Artigas que pôde assumir o cargo dia 11 de maio.

Coxa O Coritiba bateu o recorde nacional de vitórias. Foram 24 vitórias seguidas.


Frases “Em 70% dos municípios paranaenses não temos policiais civis” Secretário de Segurança Pública, Reinaldo de Almeida César, sobre o sucateamento das polícias de pelo menos 15 anos no Estado

“Temos que acabar com o abuso, o bullying que sofremos nas mãos de uma imprensa às vezes provocadora e muitas vezes irresponsável” Roberto Requião, senador

“Que horror é o mundo!”

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O autor dessas palavras, o escritor argentino Ernesto Sábato, morreu dia 30 de abril, aos 99 anos. Mas completou:

uma

“Este século é atroz e terminará de forma atroz. A única forma de salvá-lo é pensar poeticamente”

“grande bobagem”

disse a secretária nacional Antidrogas, Paulina Duarte,em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, em que nega epidemia do crack no país

“Eu não duvido nada disso” Ministro das Comunicações Paulo Bernardo sobre a possibilidade de logo vir a ser conhecido como “o marido da Gleisi ”

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“Faço um mea-culpa por não ter agido antes”

“Acho que eu compreendo o homem (Hitler)” O cineasta dinamarquês Lars Von Trier, que foi expulso do O Festival de Cinema de Cannes devido às declarações antissemitas e considerado persona non grata

Valdir Rossoni ao admitir que ele e outros parlamentares poderiam ter se insurgido antes de chegar ao comando da Casa

“Escolinha sempre foi ridícula” Jaime Lerner em entrevista à rádio CBN sobre a Escolinha de Governo que era comandada por Roberto Requião, na TV Educativa

DANIEL KATZ

“Pior seria receber elogios daquela turma”, completa

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FINA

As novas ideias de

Manoel guimarães

Marina

Marina Nessi é franqueada e diretora executiva de Casa Cor Paraná, exposição de Arquitetura e Decoração de Interiores que completa 18 anos este ano. E atinge a sua maioridade. Marina foi professora do ensino médio, diretora de escola e mais tarde representante comercial na área de decoração de interiores na terra onde nasceu, Rio Grande do Sul. Admiradora de Jaime Lerner e do empresário gaúcho Jorge Gerdau Johannpetter, a empresária faz tudo com dedicação, perseverança e entusiasmo. Marina é atenta ao mercado, às novas ideias, à determinação de fazer tudo muito bem feito. E consegue. Prova que o evento Casa Cor Paraná é um sucesso há 18 anos e se consolida como um dos mais importantes da área no país. O evento deste ano reforça o conceito da Sustentabilidade. A valorização dos costumes de uma comunidade e preservação da memória de uma sociedade são atitudes tão sustentáveis quanto o uso de equipamentos e produtos ecologicamente corretos. Mais uma vez, Marina acerta. A Casa Cor deste ano será em uma área de 10.000 m2 de um parque natural da Rua Paulo Gorski, do dia 10 de junho a 19 de julho. 8

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FINA

Thais estreia

Thais Kaniak jamais passará despercebida na multidão. A natureza ao terminar sua obra nos deu essa mulher de 1,85 de altura, de olhar iluminado, plena de graça e beleza que provoca inveja na ala feminina e suspiros ansiosos na plateia dos homens. Devagar com o andor. Neste momento Thais não está disponível. Sua agenda que já andava lotada agora inclui os eventos mais importantes da cidade que ela passa a registrar na coluna Balacobaco. Tanta formosura é acompanhada de neurônios ativos e permanente bom humor. Alegria de quem está de bem com a vida e no frescor da juventude. Qualidades que essa moça traduz em texto leve e capitoso como os bons vinhos. Thais é jornalista. Diplomada. Com pós-graduação em marketing. Escreve. Passou uma temporada em Londres para apurar seu inglês. De lá partia para incursões pela França, Espanha, Polônia, Itália e imediações civilizadas do hemisfério norte.

Dico Kremer

Bom roteiro para o seu interesse pela arte e pelo design que lhe permitiu outros voos. Arrojada, aceitou fazer uma temporada no Cirque de Soleil como hostess da tenda vip. Lugar certo para conhecer nomes famosos e cabeças interessantes. E para que gente famosa e interessante pudesse conhecer a bela Thais.

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gente

FINA

Esporte & Arte

C

omo se diz em Santa Felicidade, Mariane Biscaia é “da colognia”. Assim os italianos desse bairro chamam os filhos e netos dos imigrantes.

De descendência italiana por parte de mãe e alemã por parte de pai, Mariane tem uma tradicional herança culinária. Seu avô, nascido na Alemanha, foi padeiro e confeiteiro da Padaria Aurora, uma das mais antigas casas de pães de Curitiba. Sua mãe, Felicita Trevizan, comandou a cozinha do restaurante Cascatinha, de propriedade de sua família, por 30 anos. É de lá que vêm suas lembranças de infância e também os ensinamentos da saborosa culinária italiana. A polenta crocante, os risottos e a cassarola da Felicita, receitas de sua mãe, fazem parte do cardápio do Fellini unindo a tradição do bairro com uma nova proposta de gastronomia para Santa Felicidade. Formada em Publicidade e Propaganda, administra há 15 anos a loja de móveis Clafema, fundada por seus pais, anexa ao café, localizada na Avenida Manoel Ribas. A paixão pelo cinema e pela boa comida resultou no Fellini: simpático bistrô de influencia italiana com sobremesas artesanais e cozinha caprichada e saborosa.

acervo pessoal

Mariane

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Dico Kremer

La dolce

J

osé Kalkbrenner Filho, o Kalk, trocou a promissora carreira de ciclista profissional pela de fotógrafo. Perdeu o esporte, ganhou a arte fotográfica. Trabalhou com fotos sociais e com fotojornalismo. E, pioneiro, fundou o primeiro estúdio de fotografia publicitária do Paraná, a Fototécnica, com seu amigo Helmuth Wagner. Escola de fotografia prática, do início da moderna publicidade curitibana, antes da banalização das imagens, por lá passaram e lá aprenderam muitos profissionais. O ciclismo, por sua vez, contou com a perícia do Kalk que continua a pedalar até hoje. Aposentado, dedica-se ao motociclismo, à jardinagem, à dendrofilia, às histórias&estórias, às viagens de turismo, à boa mesa, ao epicurismo e aos amigos (que não são poucos). Dico Kremer

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FINA

O clima de

Nova York é aqui

E acervo pessoal

m 2005, depois de dez anos, Patricia Morais Soldati e Daniel Schmitt Carvalho se reencontraram em Nova York, e foi nesse cenário que surgiu a ideia de abrir um Coffee Shop em Curitiba.

A princípio este sonho que parecia tão distante foi se inspirando, primeiro nos famosos e deliciosos coffee shops de Seattle, cidade onde Daniel morou durante dez anos e onde o clima se parece muito com o de Curitiba. Depois, o dia a dia nova-iorquino imprimiu sua marca, seus lugares únicos, suas ruas, bairros cheios de história, bakeries, diners, restaurantes, e é claro os Coffee Shops.

Quando descobriram que estavam esperando uma filha finalmente decidiram que era hora de retornar e criar a pequena Isadora no Brasil. Em 2009, chegaram a Curitiba para colocar em ação seus planos de abrir o Brooklyn Coffee Shop. O ponto, no bairro São Francisco, completou no fim deste mês um ano e já é um local de referência da cena cultural curitibana. Realiza uma vez por mês, o Dinner & A Movie, evento em que um chef faz o cardápio de acordo com o filme. Um sucesso desde a primeira edição. Com bom humor e ideias novas, o casal traz, com categoria, o clima nova-iorquino para Curitiba.

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Rubens Campana

Culto da catástrofe

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iz Thomas Sowell que a descoberta de fósseis de criaturas marinhas no topo do Everest já deveria ser o suficiente para provar que enormes mudanças planetárias não são algo novo e que essas enormes mudanças acontecem desde muito antes de nós humanos darmos as caras por aqui. O aquecimento global é apenas o último de uma longa lista de cruzadas histéricas às quais o homem parece ser cada vez mais suscetível. Sim, o planeta está esquentando. Não, isso não levará à extinção da espécie. Tenho certeza de que os mais velhos podem lembrar ao menos algumas catástrofes anunciadas que não aconteceram. Num artigo publicado recentemente em Piauí, o embaixador Marcos Azambuja escreve que, hoje, aos mais de 70 anos, poderia escrever todo um livro sobre aquilo que, sendo previsto, não ocorreu em sua vida. O colapso da civilização já foi muito anunciado e viria de formas variadas. Chuva ácida. Desertificação. Esfriamento global. Alimentos transgênicos. Colapso da biodiversidade. Crise energética após o fim das reservas de petróleo. A destruição do mundo natural pelo uso dos pesticidas. O buraco na camada de ozônio. O bug do milênio. E meu favorito: a eterna ameaça da Grande Fome Malthusiana. É verdade que a água da chuva pode reagir com outros elementos e se tornar mais ácida. O resultado final não causa maiores problemas. Nunca um estudo sério encontrou riscos à saúde relacionados ao consumo de alimentos transgênicos. E existem muitos estudos. O medo dos pesticidas teve como resultado a proibição quase global do uso do DDT, candidato a substância mais mal compreendida de todos os tempos. A demonização do DDT custou milhares de vidas, condenando as pessoas mais pobres do planeta a encontrarem alternativas mais caras e menos eficientes para combater a malária. E a Grande Fome Malthusiana? Em 1968, o Dr. Paul Ehrlich declarava que “a batalha para alimentar toda a humanidade acabou” e que “na década de 1970 centenas de milhões de pessoas vão perecer de fome”. É difícil alguém cometer um erro tão espetacular e continuar a ser respeitado, mas é o que aconteceu com Ehrlich, que ainda conta com discípulos em todo o mundo. A população da terra continuou a aumentar e a produção de alimentos

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per capita aumentou ainda mais rápido. Em nenhum outro mwomento da história tantas pessoas se alimentaram tão bem quanto hoje. Mas os modernos discípulos de Malthus não lançaram alerta apenas quanto à escassez de comida. A “bomba populacional” acabaria com os recursos naturais, o que tornaria inviável uma vida confortável dentro de padrões modernos. É possível lidar com a escassez, é claro, mas o que fazer a respeito da inevitável finitude? Não por acaso, o mito de que os recursos naturais estão se esgotando existe desde o começo da revolução industrial. O que aconteceu, no entanto, foi que passamos a usar recursos de maneira cada vez mais eficiente e que encontramos substitutos para recursos à medida que suas reservas diminuem. Durante a enorme expansão da telefonia na metade do século XX, surge a possibilidade do esgotamento do cobre. Não seria possível conectar um país inteiro como os Estados Unidos nem com todo o cobre que era conhecido até então. A demanda cresceu, e também o preço. Com isso aumentaram os incentivos à oferta do metal, e nas décadas seguintes enormes reservas de cobre foram descobertas ao redor do mundo. O mecanismo do preço possui esta função dupla: é ao mesmo tempo informação e incentivo. Ainda mais importante, encontramos substitutos para o cobre na telefonia: a fibra ótica, que é feita de areia. O fim do petróleo é talvez a profecia que mais vezes foi provada falsa. O economista Steve Horwitz mostra que em 1882, as reservas mundiais de petróleo eram estimadas em 95 milhões de barris. Em 1919, as reservas conhecidas indicavam que não teríamos mais do que 20 anos de petróleo. Mas em 1950 as reservas conhecidas já eram de 100 bilhões de barris, e em 1980, 646 bilhões. Em 2000, mais de um bilhão de barris. As reservas atualmente conhecidas já são de mais de 1,2 bilhão. A sinistrose malthusiana encontrou inimigo formidável na figura do economista Julian Simon. Em 1980, Ehrlich e Simon fizeram a aposta mais famosa das ciências econômicas. Ehrlich elegeu cinco metais e apostou que após uma década seus preços iriam subir. Simon tomou a posição contrária. Os preços dos cinco metais caíram durante aquela década e em 1990 Simon saiu vitorioso. Se a aposta fosse repetida para os dez anos seguintes, ele também venceria. A mais importante contribuição de Simon foi um insight que mesmo bons economistas

às vezes perdem de vista — a idéia de que seres humanos vivendo em sociedades livres são “o recurso definitivo”. Nada — nem petróleo, nem ouro, nem terra, nem microchips — são mais valiosos para a riqueza material do homem do que a criatividade e o esforço humano. Na verdade, não existem recursos sem que a criatividade humana descubra como usá-los e sem que o esforço humano de fato os utilize. Reconhecer essa verdade torna até mesmo ingênuo o próprio uso do termo “recurso natural”. Nenhum recurso é natural. A maioria dos cientistas percebe questões como a do aquecimento global pelos olhos apenas das ciências naturais e da engenharia. Mas as lições da economia também são válidas: nenhuma transformação, por mais profunda que seja, deixará de ser acompanhada pela destruição criativa, pelo papel do empreendedor, pela formação de ordens espontâneas livres da engenharia humana e pela ação do mecanismo do preço funcionando como informação e incentivo na mudança das atitudes de consumidores e produtores. Em relação às questões climáticas, a palavra “ciência” tem sido usada como um mantra mágico para calar os críticos. Roubar a aura da ciência para fins políticos não é novidade. Marx chamou o seu tipo particular de utopia de “socia­lismo científico”. Não há dúvida de que o globo está aquecendo, e que ele já aqueceu e esfriou antes e não está tão quente hoje quanto esteve séculos atrás, antes dos automóveis e da queima de combustíveis fósseis. Nenhuma das terríveis conseqüências previstas hoje aconteceu então. Diante da linguagem histérica de figuras proe­ minentes, é uma posição legítima pedir que pessoas razoáveis concluam que a melhor política a respeito do aquecimento global não seja clamar por mais engenharia social que restrinja a prosperidade. Ao contrário. Diante da sinistrose, continuemos a enriquecer. A opinião expressa nos artigos é exclusi­vamente do autor e não reflete a posição do Ministério das Relações Exteriores.

rubens campana é diplomata.


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Entrevist�

Cara da direita FÁBio CamPana

N

este Brasil macunaímico é raro encontrar um político que assuma claramente a sua ideologia e a defenda em todos seus atos. O deputado federal Abelardo Lupion é honrosa exceção. No quinto mandato consecutivo, este empresário que é neto do governador Moisés Lupion, assume que é de direita e deixa claro o que isso significa para ele. Para espanto da cachorrada miúda, Lupion não tem o vício da conciliação tão comum entre os nativos. Enxerga boa oportunidade nas defecções que abalam o seu partido, o DEM. Acredita que, assim como ele, os políticos que ficarão são de direita e que o DEM tem a chance de parar de fingir que é de centro e assumir sua verdadeira identidade. — O DEM é um partido de direita e espero que assuma sua posição. A minha já foi assumida. Sou de direita e isso não é pecado. Lupion quer mais. Defende que os Democratas vão à luta por suas ideias que se apóiam em três grandes linhas: a defesa da propriedade privada, o Estado mínimo e a redução drástica de impostos. — Se isso é ser de direita, como se compreende no Brasil por conta da propaganda estatólatra e do monstro filantrópico, sou de direita. Minha formação é a do liberalismo. Nós precisamos assumir nossas teses. Aqueles que não acreditam nisso não podem ficar no DEM, diz Lupion, que do alto de sua longa experiência parlamentar, afirma que os políticos brasileiros não sabem o que significa ideologia. Ele divide a fauna assim: — A pessoa de centro no Brasil não tem posição. E 90% dos caras que se dizem de esquerda só querem estar na moda ou se beneficiar das benesses do Estado. Nessa linha de raciocínio, Lupion tacha de oportunista o PSD, o novo partido do ex-membro do DEM, Gilberto Kassab. Insinua que o prefeito de São Paulo e seus seguidores buscam apenas um lugar à sombra dos cofres federais: — Kassab está jogando para migrar para a situação. Ele e os seus seguidores vão ser base do governo federal. Mas nós, do DEM, não fomos eleitos para sermos situação.

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Lupion tem certeza de que o eleitor não vai entender a migração de políticos do DEM para o recém criado PSD. Ele entende que o eleitor do DEM é exigente e defende ideias e princípios. — Aqueles que estão saindo deixam para trás um compromisso com as urnas. Oposição é tão importante para o jogo democrático quanto a Situação. Nós, da Oposição, precisamos fiscalizar, debater, coibir impostos. O nosso papel é relevante.

a pessoa de centro no brasil não tem posição. e 90% dos caras Que se dizem de esQuerda só Querem estar na moda ou se beneficiar das benesses do estado Ele imagina que, endireitando-se, o DEM vai dialogar com 30% da população brasileira. Em sua maioria, “profissionais liberais, empresários e produtores rurais”. É um bom começo, um partido com base de apoio social qualificada que pode aspirar muito no futuro. Por isso mesmo, dá de ombros para

o emagrecimento: — Perderemos nove deputados federais e uma senadora. Vamos continuar com 37 deputados federais. Ficamos pequenos? Somos o quinto maior partido do Brasil hoje e provavelmente o único que terá ideologia nítida e prática coerente. O resto é essa repetição de frases feitas, de metáforas gastas, de dissimulação. A experiência depois da lipoaspiração que o DEM está sofrendo não assusta Abelardo Lupion: — Vamos continuar lutando pelos nossos espaços, sendo críticos, fiscalizadores. Esse é um reflexo de oito anos de oposição e mais quatro ainda pela frente As declarações de Lupion devem lhe render ataques da patrulha. No Brasil, como se sabe, ninguém costuma ser de direita. — Melhor enfrentar a patrulha, porém, do que realimentar a picaretagem ideológica. Como diz o deputado, “o DEM é de direita”. Convém assumir. O fisiologismo é a marca mais antiga e mais marcante da política brasileira. O adesismo é o padrão de comportamento da maioria dos políticos que, por isso mesmo, sempre se dizem de centro, onde estaria a virtude, embora se saiba que neste caso o forte é mesmo a corrupção. Forma-se no Brasil, incorrigivelmente, o maior partido do Ocidente. Já se chamou Arena, depois PDS, PMDB, no governo Sarney era o Centrão, depois virou time dos Mensaleiros sob o pomposo nome de Bloco de Sustentação da Governabilidade onde ainda habitam políticos de todos os partidos e facções, mas principalmente do PMDB e do PT. É o partido dos governistas. Dos políticos cuja coerência única é a de estar com o governo, qualquer que seja o governo. O importante para essa tigrada é estar pendurada nas tetas generosas do Estado. Lupion quer fazer do DEM um partido que seja a negação do fisiologismo — Muita gente que não sabe viver sem mamar nas tetas do governo sucumbe. Nós, remanescentes do DEM, vamos manter a dignidade no papel de críticos permanentes dos estatólatras e da corrupção.


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Lupion acredita que a visão estatólatra dos problemas do país gerou esse Estado hipertrofiado usado como instituição de filantropia para garantir a reprodução da mesma turma no poder. Essa visão privilegia a expansão do Estado e da máquina burocrática. Multiplicou ao infinito órgãos, empresas, repartições, regulamentos, impostos, contribuições e taxas de toda a espécie. Hoje, tudo indica que já temos burocracia demais para as nossas posses. Para reiniciar um ciclo de alta taxa de desenvolvimento econômico e social, seria preciso desmontar, com a máxima rapidez possível, o sistema que privilegia o crescimento do estado e olha com desconfiança e cupidez a iniciativa privada. É óbvio que a posição de Lupion desagrada a grande parcela da sociedade que vive à sombra do Estado e que acredita, piamente, que as soluções para todos os males e para felicidade geral da Nação dependem do Estado e dos governantes. Não há povo mais governista que o nosso, indicam as pesquisas de opinião. Não ficaríamos impunes depois de séculos de culto ao Estado e à burocracia.

Baixa imunidade A democracia brasileira não soube criar mecanismos de defesa para evitar que a atividade política se transformasse em espetáculo de gosto duvidoso. Somos servidos diariamente pela projeção chinfrim do star system na vedetização excessiva dos homens públicos. É o que temos e as chances de mudanças são escassas. O marketing, a propaganda, as pesquisas sobre o look ou a imagem no domínio político fazem da vida pública algo que se aproxima de uma peça de teatro ou de um filme de produção

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barata. Às vezes, cenas de tele catch. O enredo é de vaudeville. Sem faltar momentos de comédia de equívocos temperados com escandalosas denúncias de corrupção que excitam o distinto público. A plateia adora punições aos flagrados com a mão no jarro, mas os reelegem na oportunidade seguinte, talvez para garantir a continuidade do espetáculo. Hoje, o homem público não se preocupa em convencer a maioria a adotar suas ideias e projetos. Nesta área do planeta o político quer informações sobre a opinião pública para corresponder, em gestos e discursos, às expectativas mais imediatas do eleitorado. O fundamental é garantir a popularidade nas

Quem se habilita a reduzir o fardo de impostos que sustenta essa estrutura gigantesca do Estado?

faixas mais ignaras da população. Lupion sabe que não se deve esperar ideais nobres ou projetos que os elevem acima do trivial. O horizonte dessa gente é a próxima eleição e o prazo máximo de qualquer plano são os quatro anos de mandato que cada qual pretende renovar para não sair do jogo e não perder as benesses e prebendas que a atividade lhes oferece. De sorte que não temos projetos de longo prazo, explica Lupion. Nem força suficiente para mudar aquilo que garante a continuidade da carreira da maioria. Quem se habilita a reduzir a máquina burocrática? Quem se arrisca a cortar na carne o excesso de funcionários nas repartições públicas desnecessárias? Quem se habilita a reduzir o fardo de impostos que sustenta essa estrutura gigantesca do Estado? A voracidade e o empenho para continuar na carreira limitam a ousadia e faz com que a maioria se iguale e que os partidos tenham programas parecidos e práticas idênticas. Por isso não são levados a sério pela minoria que pensa e se vê submetida à ditadura das massas, o que parece uma contradição, mas é, na verdade, o que resulta da democracia com suas regras que favorecem à mistificação e o sucesso dos atores medíocres, aqueles que conquistam multidões justamente porque tem a oferecer apenas filantropia e compadrio, os velhos vícios que tem raízes em nossas origens ibéricas. É essa minoria provida de neurônios e capaz de refletir além dos limites do populismo latino americano que Lupion pretende representar. Para realizar o esforço de mudança das ideias e dos costumes como nunca antes se viu na história desta República.


Luiz Geraldo Mazza

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O   

uase não foi percebido, lá pelos anos setenta, o ingresso de um búfalo num dos lagos do zoo da cidade, o Passeio Público. Preto e impassível, ele permanecia na área em que se situava a Ilha dos Macacos, ela própria, volta e meia, despojada de todo o verde da vegetação pela gula dos primatas. Sua rusticidade impunha temor e tanto que era proibida a aproximação de barcos e pedalinhos na área como lazer. Num fim de tarde, o búfalo subiu a rampa que havia no açude e diante do portão aberto se mandou para a gleba de pedra, que não era o seu mundo. Guardas do zoo não deram pelo sumiço do ruminante e ele só foi aparecer, horas depois, justamente na Estação Rodoviária, a antiga, hoje transformada em Terminal Metropolitano. A aparição do animal provocou agito na hora tardia em que as pessoas faziam o ritual das

despedidas: os noivos que iam para a lua de mel, a avó que abraçava o neto que iria, pela primeira vez, a São Paulo, enfim a rotina de todos os dias. Ia tudo normal até que alguém deu pela figura sinistra do bubalino no extremo norte da estação e estabeleceu-se o pânico: muitos se deslocando para a igreja de Nossa Senhora de Guadalupe em ponto elevado, outros se fechando dentro dos ônibus estacionados e alguns trepando nas partes mais altas da rodoviária com receio do animal que a escuridão tornava ainda mais misterioso. E foi nesse momento de suspense que um bebum reconheceu o animal e pespegando-lhe duas batidas na cabeça dura com um maço de jornais, advertiu: “eu te manjo e vou te levar de volta pra tua casa”. Dito isso, pegou o anel que estava no focinho do bicho, que tentava o exercício da boemia, e o conduziu diretamente, já no início da madrugada, ao Passeio Público e ao seu habitat de água fria. O pastor improvisado, conduzindo seriamente o búfalo e fazendo-lhe severas adver-

tências, percorreu uma das áreas mais boêmias do centro de Curitiba perto da Universidade Federal e foi olhado com inveja por todos os bebuns do itinerário. Não deixava de ser uma façanha e tanto. Dizem — e isso foi referido no discurso de posse do jornalista e escritor Roberto Mugiatti na Academia Paranaense de Letras — que o exímio homem do jazz e do rock, o Raulzinho do Trombone, teria lhe dedicado um flash musical e que um artista plástico o teria retratado. Imortalizado nas artes e no folclore urbano de Curitiba acabou levado ao matadouro lá por 1978. Transformaram-no em linguiça e outros subprodutos, mas os amantes da madrugada dizem que ouvem, conforme a lua, o seu mugido transcendente.

LUIZ GERALDO MAZZA é jornalista.

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Polícia

M,    A história do homem inescrupuloso que fez fortuna enganando os mais necessitados M C

S

e a natureza não lhe foi generosa em beleza física, pelo menos não economizou em malandragem. Inteligente e versátil, ganancioso e astuto, Neviton Pretti Caetano, 59 anos, passou boa parte da vida queimando neurônios para ganhar dinheiro da forma mais fácil possível, enganando os outros. Sem escrúpulos, fez fortuna em cima dos menos afortunados, passando a conversa nas camadas mais pobres da população e nos mais frágeis, como idosos e pensionistas do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Seus registros criminais datam de 1999. Algumas passagens pela polícia, por crimes de extorsão, formação de quadrilha, porte de armas e outros, e alguns meses de prisão entre 2004 e 2005, não quebraram a confiança do homem que passou a ser chamado de “megavigarista”, dada a capacidade de lesar milhares de pessoas em cada um de seus golpes. Quando “caiu” a primeira vez, há sete anos, calculou-se que havia lesado 40 mil vítimas com a empresa Vera Cruz Empreendimentos, e tantas outras com o famigerado site TV Injustiça, onde postava matérias “fabricadas” para depois extorquir os protagonistas das reportagens. O site e a empresa sumiram do mapa, com a prisão dele. No entanto, como a mitológica Fênix que ressurgiu das cinzas, ele montou outra arapuca, a VC Consultoria. E não se contentou em ficar apenas em território paranaense. Estendeu seus tentáculos para Santa Catarina e Rio de Janeiro, além de envolver o banco BMG de Minas Gerais, tido como seu principal parceiro. E foi com a VC Consultoria que promoveu mais um escândalo financeiro e parou novamente atrás das grades. Neviton e mais cinco cúmplices foram presos na manhã de 11 de maio, graças a investigações que estavam sendo realizadas pela polícia e pelo Ministério Público (MP) desde o começo do ano. Mais do que pipoca em óleo quente, estouraram centenas de denúncias contra a empresa, descortinando um golpe que pode ter rendido ao mentor R$ 10 milhões.

OPeraÇÃO “cONsiGNadO” aO amaNHecer A VC Consultoria anunciava dinheiro fácil para aposentados e pensionistas em televisões, rádios e jornais. Nas ruas, funcionários da empresa passavam o dia distribuindo folhetos oferecendo o crédito milagroso, mas não explicavam as taxas de juros nem o valor final que seria pago. Jovens sorridentes e solícitos davam aos clientes atendimento eficiente e rápido. Em pouco tempo, o dinheiro estava na conta do incauto, que sequer imaginava ter se transformado em uma nova vítima. A publicidade chegava a incentivar filhos e netos a convencer pais e avôs aposentados a emprestar dinheiro. Isso chamou a atenção da vereadora Renata Bueno (PPS), que encaminhou representação ao Conselho de 18

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A operação “Consignado” prendeu simultaneamente o empresário e os gerentes, e lacraram todas as lojas da VC Consultoria

Autorregulamentação Publicitária (Conar) sobre a propaganda irregular há mais de um ano. No começo de 2011 surgiram denúncias de descontos de empréstimos não solicitados que chegaram aos ouvidos dos promotores da Promotoria de Defesa do Consumidor de Curitiba, que instauraram o inquérito número 202-4/2010 para apurar práticas comerciais abusivas. Dado o pontapé inicial, não foi difícil reunir indícios que confirmavam as denúncias. Entraram em cena a Delegacia de Crimes Contra a Economia e Proteção ao Consumidor (Delcon) e o Núcleo de Repressão aos Crimes Econômicos (Nurce). O cerco foi fechado e armou-se uma grande operação policial, com o apoio do Centro de Operações Policiais Especiais (Cope), da Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente e da Divisão Policial do Interior. A Justiça deu sua contribuição através do juiz Pedro Sanson Corat, da Vara de Inquéritos Policiais de Curitiba, que emitiu 41 mandados

de prisão e de busca e apreensão. O sol nem havia raiado quando a operação, que levou o sugestivo nome de “Consignado” foi colocada em andamento. Neviton Caetano foi preso em um luxuoso apartamento em Camboriú (SC), junto com a mulher, Shirlei dos Santos Caetano, 36, e o motorista do casal, Arnaldo Weber Júnior, 42, o “Juca”. Ao mesmo tempo, em uma chácara e em um condomínio fechado, em São José dos Pinhais, ocorriam as prisões de Alexandre Rafael Nascimento Santana, 27, um dos gerentes da VC Consultoria e a jovem Letícia Justiniano dos Santos, 23, a “laranja” do esquema, em cujo nome estão a empresa, veículos de luxo e outros bens de Neviton. Já em Curitiba era presa Neide Fernandes, 43, outra gerente. “A casa caiu”, comemoraram os policiais.

O resultadO Ao mesmo tempo em que um grupo de policiais tratava de fazer as prisões, outro grupo providenciava o fechamento da

sede e de todas as filiais da VC Consultoria, lacrando as portas da empresa nos três estados onde atuava. Só no Paraná foram 13 unidades lacradas, sendo cinco em Curitiba e oito em Maringá, Cascavel, Londrina, Francisco Beltrão, Telêmaco Borba, Foz do Iguaçu, Ponta Grossa e Paranaguá. O resultado da operação, considerado totalmente satisfatório, foi a prisão de seis envolvidos, o cumprimento de 27 mandados de busca e apreensão e as apreensões de oito veículos: quatro Mercedes-Benz, dois Cherokee, um Toyota Hilux e um Jeep Wrangler, todos novos e de luxo, da forma como Neviton gostava de ostentar. Porém, o mais importante foi o recolhimento de cinco notebooks, diversos CPUs, aparelhos celulares e mais de 10 mil termos de adesão junto ao INSS para desconto previdenciário assinados em branco pelo titular do financiamento, escondidos no interior de um dos sobrados do condomínio Vovô Caetano (nome junho de 2011 |

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o golpe pode ter rendido ao mentor r$ 10 milhões e lesou mais de 40 mil pessoas

sugestivo), em São José dos Pinhais. Sem dúvida a polícia ficou com a “faca e o queijo nas mãos”. Nos bastidores comentou-se que Neviton não tinha medo de ser preso porque seus bens e empresa estavam em nome de Letícia, que não participava diretamente das negociatas, mas sabia o que acontecia. Ela emprestava o nome e em troca recebia uma vida de princesa. Não podia deixar a chácara em São José dos Pinhais, numa espécie de clausura consentida. Neviton provavelmente tinha medo que ela “desse com a língua nos dentes”. Em troca, recebia presentes e tinha praticamente todos os desejos realizados. Afinal de contas, não faltava dinheiro para isso.

Os GOlPes Depois da publicidade maciça, parte importante do esquema, restava aos golpistas aguardar os “clientes”. O interessado telefonava para a VC Consultoria buscando mais informações de como fazer um empréstimo. O atendente, se desmanchando em gentilezas, avisava que iria fazer um cadastro e apanhava todos os dados da futura vítima. Na verdade já se tratava da efetiva proposta. Querendo ou não, o empréstimo estava feito. A aprovação do 20

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“cadastro” gerava a liberação do dinheiro junto ao banco BMG. A VC apropriava-se do dinheiro, descontando a parcela no benefício do segurado, sem que ele soubesse. Uma segunda modalidade de golpe também surtia grande resultado. Era aquela em que a vítima queria o empréstimo, assinava a documentação necessária e sem saber, assinava outros empréstimos complementares, que eram descontados sem o seu consentimento. Em ambas as modalidades, quando a vítima suspeitava da irregularidade e tentava cancelar o contrato, não era mais atendida ou lhe eram apresentados tantos empecilhos para o cancelamento que desistia de fazê-lo.

um PassadO Que cONdeNa Quem co-

nheceu Neviton Caetano no passado, não se surpreendeu com o novo golpe. Afinal, há 12 anos ele está no ramo da sacanagem. Datam de 1999 os primeiros registros policiais contra ele. Mas o nome ficou conhecido mesmo em 2004, época em que se intitulava jornalista e advogado (sem ter qualquer curso superior). Atualizado, montou o site TV Injustiça, com o qual aterrorizava pessoas fazendo ameaças e as extorquia para tirar matérias “fabricadas” e exibidas na tal TV. Paralelamente mantinha a empresa Vera Cruz Empreendimentos, usada como fachada para extorquir imobiliárias e tirar dinheiro de pessoas que compravam terrenos em longas prestações. Na versão “Neviton advogado”, o vigarista aproximava-se de quem tinha dívidas com terreno, pedia a documentação para avaliar, e afirmava que a pessoa já era proprietária do lote e não precisava mais pagar as prestações. No entanto, para fazer a quitação final teria que lhe entregar certa importância em dinheiro. Ficava com a grana e o desavisado continuava com a dívida. Quanto às imobiliárias, dizia que iria convencer os compradores a não pagarem mais, o que resultaria em enorme prejuízo. Pedia dinheiro para não fazer isso. Mas foi com o golpe de “limpar” o nome de


quem estava “sujo” no Serviço de Proteção ao Crédito, o temido Seproc, ou no Serasa, que ele ganhou fortunas. Com uma equipe de advogados novos e estagiários, entrava com um pedido na Justiça para verificação do devedor e conseguia que o nome sumisse do cadastro por alguns dias, sem que a dívida fosse efetivamente paga. Mostrava o documento para o devedor, convencendo-o que a situação estava resolvida, cobrava por isso e só tempos depois a vítima, ao tentar nova compra no crediário, ficava sabendo que tinha sido enganada. Foram mais de 40 mil vítimas. Mas foi com a TV Injustiça que ele quebrou a cara, arrastando para a lama seis cúmplices, entre eles dois jornalistas e uma advogada, que chegaram a ir para a cadeia. A ousadia de Neviton o levou a manter em cárcere privado, na mesma chácara de São José dos Pinhais, uma jovem que havia sido namorada de um executivo da Spaipa. Ela foi forçada a dizer que tinha sido espancada pelo companheiro. A falsa notícia foi parar no site e com isso Neviton passou a exigir o pagamento de R$ 300 mil para retirá-la. Ao mesmo tempo tentava arrancar R$ 2 milhões do proprietário de uma mineradora em Campo Largo, a quem acusava de desviar ouro para outro Estado.

Nesta altura do campeonato Neviton já era procurado pela polícia e estava na mira do Ministério Público. Respondia a inúmeros processos criminais e 65 processos na esfera cível, distribuídos em 19 varas, por reparação de danos, reintegração de posse, despejo, embargo de terceiros e outros. Na área do crime, tinha ficha de dar inveja a bandidão. Contava com 17 passagens por estelionato, por quatro distritos da capital, bem como quatro delegacias (inclusive as de Pinhais e de Piraquara) e pela Polícia Federal. Com tudo isso, ficou preso por 11 meses, de maio de 2004 a abril de 2005. Em agosto de 2007 foi novamente preso, ficou algum tempo recolhido e ganhou as ruas, desta vez para iniciar uma nova empreitada, exercitando toda a sua genialidade maldosa.

Vítimas deVem ser ressarcidas A Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor de Curitiba instaurou inquérito civil contra a VC Consultoria visando o ressarcimento às vítimas do golpe do empréstimo. Embora o banco BMG tenha emitido uma nota, dizendo que desconhecia a fraude, o Ministério Público revelou que o banco deverá ser apontado como responsável solidário, por ser o principal par-

ceiro da VC e poderá também arcar com o ressarcimento. A defesa da VC Consultoria está a cargo do advogado Heitor Amante e, no dia em que aconteceram as prisões, ele avisou a imprensa que não tinha lido o processo e por isso não poderia se manifestar. Mesmo assim, procurou jogar a responsabilidade para o banco, afirmando que a empresa só intermediava os empréstimos. Quanto ao INSS, Altamir Cardoso, gerente executivo de Curitiba, garantiu que os pensionistas ou aposentados poderiam cancelar os falsos empréstimos em qualquer agência do Instituto, bastando uma declaração de que não tinham pedido o dinheiro. Mas não é isso que está acontecendo, pois o lesado tem primeiro que provar que não recebeu a quantia, apresentando documentação bancária, para depois pedir o cancelamento do desconto na aposentadoria. Muita gente nem chegou a notar o desconto, pois os valores eram baixos e variavam entre R$ 4,50 a R$ 9,00. Só depois que o golpe chegou ao conhecimento público, pela imprensa, é que os pensionistas ou aposentados perceberam que pequenas quantias estavam sendo retiradas dos benefícios. Fotos de AlioChA MAuríCio, dANiel CAroN e tribuNA do PArANá

Neviton Pretti Caetano está há 12 anos no ramo da sacanagem, as fotos acima são da prisão em 2004 junho de 2011 |

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Luiz Fernando Pereira

Eleições peruanas. Pobre América Latina

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economia peruana, em 2011, deve liderar o crescimento na América Latina. No primeiro trimestre saltou dez por cento. À exceção do ano-crise de 2009, há oito anos consecutivos cresce a mais de seis por cento ao ano. Sem inflação, tem reservas de trinta por cento do PIB. Conquistou a perseguida nota de investment grade nas três principais agências de risco do mundo. É neste cenário que o país está em processo eleitoral. Todos diriam que o candidato do governo, por tudo isso, seria o grande favorito. It’s the economy, stupid. A conhecida frase do marqueteiro de Clinton, James Carville, resume bem a relação entre economia saudável e resultado eleitoral positivo. Não é assim no Peru, no entanto. Alan Garcia, o atual presidente, sequer lançou candidato. Populista do Partido Aprista (quase um PDT peruano, com uma dose mais generosa de antiamericanismo), Garcia fez agora um governo bem diferente da sua desastrosa passagem pela presidência no começo da década de noventa. Deu continuidade à modernização do governo do antecessor Alejandro Toledo. Estive em Lima nos tempos de Toledo. O país vivia um momento

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único de crescimento econômico e libertação do terror maoísta-senderista, derrotado pelo tresloucado Fujimori (sobretudo depois da prisão do líder do Sendero Luminoso, Abimael Guzman). O restabelecimento da democracia parecia apontar para novos tempos no Peru. Foi um engano. Além de não apresentar postulante governista, nenhum candidato presidencial quis o apoio de Alan Garcia. Toledo, pai da recente modernização peruana, chegou apenas em quarto lugar nas eleições. A prosperidade econômica não beneficiou Garcia ou Toledo. Dois candidatos de oposição disputam o segundo turno: Ollanta Humala e Keiko Fujimori. Duas figuras politicamente bizarras. Uma disputa, eu diria, bem latina! É incrível a estima irracional que a América Latina tem por figuras excêntricas na política. Keiko é filha de Fujimori, o ex-ditador condenado a 25 anos de cadeia pela prática de diversos crimes (destaque para a corrupção). Os estudos de Keiko nos Estados Unidos foram financiados com dinheiro público desviado, confessou Montesinos (uma espécie de PC Farias de Fujimori, apenas um pouco mais refinado). Aos 36 anos de idade, Keiko está cercada de ex-colaboradores do pai e apresenta um plano de governo vago, repleto de populismo latino-americano. Já Ollanta

Humala é filho político de Hugo Chaves, irmão de Evo Morales, primo de Daniel Ortega; todos netos de Fidel Castro. Entre outras ladainhas, repete o lugar-comum preferido do perfeito idiota latino-americano: ianques go home. Duas candidaturas bolorentas. Parece faltar maturidade política aos eleitores latino-americanos. Como disse bem Renato Janine Ribeiro, estamos sempre com a “expectativa messiânica no surgimento de algum pai da pátria que nos livrará do desamparo”. Keiko e Ollanta representam a atual expectativa messiânica dos peruanos. Quando visitei o Peru, estive também em Cuzco — a capital do antigo império INCA. Conhecendo a história de alguns antigos imperadores incas, pré-colombianos, fico imaginando o que pensariam de Keiko e Ollanta. Quem sabe o Peru ainda leve algumas décadas para voltar a ter a maturidade política dos INCAS.

luiz Fernando Pereira é advogado.


Vereadores

Por dentro da CÂmara Acompanhe o trabalho dos vereadores da Câmara Municipal de Curitiba

VeNceDoR

eDucaÇão

HoMoFoBIa

BRaIle

coMBusTÍVeIs

O vereador Felipe Braga Côrtes (PSDB) destaca a atuação do atleta de jiu-jitsu Cristiano Kaminishi, que tem representado a capital em competições internacionais, com um cartel de 11 lutas. É o atual campeão dos pesos-pesados do Heat, um dos poucos eventos de MMA no Japão.

No mínimo 20% da publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverão ter caráter educativo. É o que diz o projeto de lei de autoria do vereador Caíque Ferrante (PRP), votado e aprovado pela Câmara de Curitiba.

Em alusão ao Dia Municipal contra a Homofobia (17 de maio), a professora Araci Asinelli da Luz (UFPR) e o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni Reis, participaram da Tribuna Livre na Câmara de Curitiba. Iniciativa da vereadora Professora Josete (PT).

O vereador João do Suco (PSDB), líder do prefeito na Câmara de Curitiba, e a vereadora Noemia Rocha (PMDB) querem possibilitar o acesso a bíblias em braile nas bibliotecas municipais. Tramita na Casa projeto que acrescenta o livro no programa Informação e Cultura ao Alcance de Todos.

Tramita na Câmara Municipal projeto para obrigar postos de combustíveis a colocarem cartaz informativo com o valor percentual da diferença de preços entre a gasolina e o etanol. A proposta é de autoria do vereador Algaci Tulio (PMDB).

copa 2014

TRaNspaRÊNcIa

saÚDe

lDo 2012

ITÁlIa

A diretoria do Clube Atlético Paranaense divulgou os novos valores de referência para as obras de adequação do estádio Joaquim Américo, a Arena da Baixada, para a Copa do Mundo de 2014. Novas exigências da Fifa teriam elevado o valor para R$ 220 milhões. A informação foi dada, em primeira mão, para os vereadores da Comissão da Copa.

O trabalho de revisão da Lei Orgânica Municipal (LOM), coordenado pelo vereador Paulo Frote (PSDB), será divulgado no portal da Câmara de Curitiba na internet, para que a população acompanhe as mudanças apontadas pelos vereadores. Entidades representativas dos diversos segmentos da sociedade poderão apresentar sugestões.

Ações da Secretaria Municipal da Saúde no quarto trimestre de 2010 foram detalhadas aos vereadores durante audiência pública aberta pela Comissão de Saúde, Bem-Estar Social e Meio Ambiente, presidida pelo vereador Aldemir Manfron (PP). O custeio do atendimento em saúde do município continua superior (61,17%) ao bloco de pessoal (37,50%).

O presidente da Câmara de Curitiba, vereador João Cláudio Derosso (PSDB), recebeu o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO). A previsão orçamentária da prefeitura para o ano que vem é de R$5,03 bilhões, 8% maior que o atual (R$ 4,66 bilhões). A prioridade nos investimentos será nas áreas da saúde (R$ 897,9 milhões), educação (821,5 milhões) e obras (R$ 426 milhões).

Câmara Municipal homenageou os 150 anos de unificação política da Itália promovendo uma sessão solene. A iniciativa é da vereadora Renata Bueno (PPS), que convidou empresários com trajetórias pessoais de valorização e preservação do legado cultural italiano.

cÂMaRa MuNIcIpal De cuRITIBa • www.cmc.pr.gov.br r. Barão do rio Branco, s/nº — CEP 80010-902 telefone: (41) 3350-4500 FAX: (41)3350-4737

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Rogerio Distefano

Grandes livros, pequenas maldades

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ona Juli é ascensorista do prédio no Centro. Não sei seu nome completo nem mais detalhes, nem ela os meus. Parece-me vagamente nissei. Não dá tempo para intimidade, pois nos vemos na viagem entre o térreo e o décimo andar. Sei de uma coisa, que nos aproxima: é leitora compulsiva. A leitura é hábito difundido entre as mulheres ascensoristas. Não avancei para saber por que os ascensoristas não leem. Dona Juli difere na qualidade das leituras: nada de autoajuda, religião e ocultismo, como vejo entre as colegas. Ela tem critério e não sei como faz isso. Desconfio que são os fornecedores, como eu que comecei emprestando o Urbenauta, do jornalista Eduardo Fenianos, assim meio displicente. Quando gostou, fui adiante e mandei ver n’O Mágico, de Somerset Maugham. Semana seguinte já estava lendo A Servidão Humana; quem emprestou deve ter percebido seu gosto e trouxe o outro livro de Maugham. Faço pequenas maldades literárias com dona Juli, como emprestar A Mulher de Trinta Anos, de Balzac. Ela não gostou, disse que o livro era bom, mas “quebrado” — na sua essência intuitiva apanhou Balzac na essência criativa, A Mulher uma marota colagem de textos escritos em épocas e fases diferentes. Mandei ver n’A Menina Que Roubava Livros, que Sirlei de Jesus queria que eu lesse. Juli devolveu sem ler, “muito triste”, disse. “Muito chato”, respondi, “também não consegui ler”. Agora Juli tem com ela o 1808 de Laurentino Gomes, que me tomou das mãos. Como o pacote estava pesado empurrei-lhe junto O Doce Veneno do Escorpião, cheio de pudores e reticências: “Sabe, dona Juli, me desculpe a ousadia, é que comprei por causa do filme da Deborah Secco”. Talvez agora ela brigue comigo. Se não brigar, despacho-lhe o Trópico de Câncer, de Henry Miller. Ou Eu e o Governador, de Adelaide Carraro. De livros também são povoados meus conta-

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tos com Sirlei de Jesus, podóloga na Praça Tiradentes. Sirlei, mais que compulsiva, é leitora algo neurótica, tem critérios e idiossincrasias: “Não suporto Paulo Coelho”. O Mago não entra no seu consultório — emprestei para Dona Juli,

NãO fala sObre meus livrOs, NãO falO sObre O Dele, que façO De refém até que DevOlva Os meus

que o derrubou em dez dias. Sirlei vai longe com os livros. É articulada, de tanto falar de livros com os clientes criou e administra um clube do livro informal. Compra e recebe livros em doação, até controla as ofertas literárias das Lojas Americanas. Consegui convencê-la de que sou cliente de sua técnica exemplar com os pés; dos livros sou conversador e fornecedor, não suporto leituras referidas — na realidade impostas, aquilo de “você tem que ler este livro”. Deixei lá a biografia de Clarice Lispector, um catatau meio chato, tese de universidade de estudante norte-americano, tradução de pé quebrado. Sirlei leu e gostou; mas detestou a personagem: “Clarice era uma grande egoísta”. Eu não tinha percebido e dei razão a Sirlei. O livro circulou, está com outra cliente-leitora, a médica Annelise Budel, que discorda de Sirlei — “Você não pode confundir o autor com a obra” — e repassou-lhe romances de Clarice. Sirlei já tinha lido. Agora Annelise quer emprestado a biografia de Carl Jung, de Deidre Bair. Avisei que primeiro tem que passar pelo clube de Sirlei. Os livros podem revelar nosso lado negro, como na maldade que administro com o advogado-jornalista Rhodrigo Deda. Ainda na faculdade Rhodrigo levou emprestados uns dez livros de Direito. Hoje, advogado de sucesso, ainda não devolveu meus livros. Rhodrigo apareceu um dia com uma leitura referida: A Literatura Europeia e Idade Média Latina, obra referencial e clássica de Ernst Robert Curtius. Li, reli, não paro de reler, adorei. Elogiei o livro duas vezes para o dono e nem toco mais no assunto. Ele não fala sobre meus livros, não falo sobre o dele, que faço de refém até que devolva os meus. Se não devolver continuo no lucro, pois vinte páginas de Curtius valem todas as dos dez livros de Direito.

RogeRio Distefano é advogado e colunista da Revista Ideias. Leia mais em: www.maxblog.com.br


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Carlos Alberto Pessôa

Contra as pretensões gls

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osso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las.” Este parágrafo de Voltaire (1694-1778) sintetiza o ideal liberal-libertário de tolerância. Transcrevo o dito a pensar nas infelizes&tolas declarações do militar reformado e deputado federal Jair Bolsonaro à Preta Gil sobre casamento entre branco(a)-negro(a). Num país como o nosso, de democracia racial exaltada pelo Gilberto Freire, num país de tão imenso número de mulatos, num país onde Machado de Assis foi presidente da Academia Brasileira de Letras, num país onde um negro é sem igual na Oropa, França e Bahia, num país de tantos negros&mulatos exemplares, modelares, vir alguém em pleno século XXI se opor ao milagre da miscigenação, esta sólida e benfazeja realidade, é ao mesmo tempo triste&idiota. (Mais tarde o deputado declarou que sua resposta visava o casamento homossexual, não ao inter-racial; que se enganou — e pediu desculpas; desmentiu ser racista, ao contrário — e citou suas amizades negras&mulatas, mas fez questão de reafirmar sua oposição às pretensões de gays&lésbicas. A propósito do casamento civil e da adoção). Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las. Ninguém pediu minha opinião sobre o casamento civil entre homossexuais nem sobre a adoção de crianças por duplas homossexuais,

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Posso não concordar com nenhuma das Palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las mas as darei assim mesmo; com licença. Sou totalmente contra o assim chamado casamento civil entre gays ou entre lésbicas. - Por quê? - Pela simples e boa razão que o casamento objetiva especialmente a formar família, a deixar descendentes, filhos. Ora, a impossibilidade de duplas homossexuais gerarem filhos entre si, torna o casamento civil entre eles uma macaqueação ou uma paródia perfeitamente dispensável e totalmente cambiável por outro documento jurídico que proteja seus desejos de

herança, etc. Ao decidirem se unir, homossexuais renunciam a ter filhos, renunciam a formar nova família; logo, estão dispensados das chatices implícitas do casamento ou da pura e simples união civil. Vejamos a questão da adoção. Também aqui sou totalmente contrário à adoção de crianças de qualquer sexo por duplas homossexuais. Entre outras razões pela mesma exposta aí acima e mais uma, a seguinte: - Crianças necessitam de dois modelos, pai e mãe de sexos diferentes. E não de doses duplas do mesmo sexo, seja dupla de lésbica seja dupla de gays, duplas que caricaturam ou não os casais de verdade, heterossexuais por definição: no primeiro caso, teremos mais do mesmo; no segundo, lamentável, patética paródia. Ao escolherem — livremente? — seus parceiros, lésbicas e gays escolheram também não ter filhos, não formar família. Logo ou consequentemente não deixa de ser estranho este desejo de brincar de papai&mamãe entre adultos, reservistas, vacinados, eleitores, contribuintes que — livremente? — renunciaram à heterossexualidade. Coerência, meninos! Coerência, meninas!

P.S.: Leiam a Fran Lebowitz. E se inspirem nela. Lésbica contra as contradições dos movimentos GLS.

Carlos alberto Pessôa é jornalista e escritor. Escreve diariamente para o site da Revista Ideias. negopessoa.com


Pesquisa

C     O Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou no dia 5 de maio, por unanimidade, o reconhecimento da união estável para casais do mesmo sexo. Levantamento do Paraná Pesquisas mostra o que os curitibanos pensam em relação ao assunto

Você é a favor ou contra o casamento entre homossexuais?

Você conhece alguma pessoa homossexual que não assumiu sua homossexualidade?

Se você descobrisse que seu filho(a), irmão ou irmã é homossexual, qual seria a sua reação: (ESTIMULADA) A favor 48,00%

Conhece 37,56%

Contra 48,89%

Não conhece 62,44%

Não sabe 3,11%

Concordaria e daria apoio 44,67% Se você tivesse oportunidade, você contrataria um profissional homossexual?

Concordaria, mas não daria apoio 14,00% Fingiria que não sabe de nada 5,11%

Você acha que em Curitiba existe preconceito contra os homossexuais?

Não concordaria, mas manteria relações afetivas 30,67% Não concordaria e cortaria relações afetivas 4,44% Não sabe 1,11%

Sim 74,00%

Sim 88,44%

Não 21,33%

Não 4,22%

Talvez/Depende 4,67%

Mais ou menos 4,67% Não sabe 2,67%

Esta pesquisa foi realizada com os habitantes do município de Curitiba maiores de 16 anos. Para a realização desta pesquisa foram entrevistados 450 habitantes. O trabalho de levantamento dos dados foi feito através de entrevistas pessoais em Curitiba durante os dias 13 e 14 de maio de 2011, sendo acompanhadas 19,55% das entrevistas. Tal amostra representativa do município de Curitiba atinge um grau de confiança de 95,0% para uma margem estimada de erro de 4,5%.

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Denúnci�

78 dias no inferno Rapaz preso injustamente pela polícia revela, com exclusividade para a Revista Ideias, os horrores que sofreu durante quase 80 dias na cadeia MÁrCio BarroS FoToS ÁTiLa ALBErTi

uanto vale a liberdade de um homem? Para alguns não muito, mas há registros na história que várias pessoas morreram em busca dela. Levando em consideração a inoperância do sistema judiciário brasileiro, a deficiência das polícias Militar e Civil é mais comum do que se imagina, pessoas inocentes serem presas por crimes que não cometeram. O caso mais recente aconteceu em Fazenda Rio Grande, na Região Metropolitana de Curitiba. Três rapazes foram presos, confundidos com bandidos que haviam assaltado um mercado, e passaram quase três meses atrás das grades. A injustiça só não foi mais extensa, porque um policial suspeitou que fossem inocentes e mesmo com o caso supostamente resolvido, continuou as investigações. Duas pessoas foram detidas, entre elas um adolescente de 17 anos.

o caso Sexta-feira, dia 25 de fevereiro. O sol já dava sinais de que o dia seria quente. O florista Giovani Aparecido da Silva estava de folga, dia perfeito para uma pescaria. Giovani não perdeu tempo. Ligou para o amigo Alexander Busato, e combinaram o dia de lazer. Giovani passou no mercado, comprou artigos de pesca, algumas frutas e outros alimentos para passar o dia na beira de uma cava, na maior tranquilidade. Com as sacolinhas do mercado em uma mão, e na outra o fecho com as varas, seguiu ao lado do amigo. Quando chegaram próximo do destino, encontraram Rubens Alves Ferreira, que até então não conheciam. Ele já estava pescando no local. Em poucos minutos, foram surpreendidos com o barulho de diversas viaturas policiais que 28

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sem conhecer os rapazes, foi preso junto, e a partir daquele momento, o dia de pescaria havia acabado, e dado lugar a uma temporada de terror, medo e decepção, que durou 78 dias.

giovani foi confundido com um assaltante, apesar de todos os indícios contrários

passavam pela estrada de chão, levantando poeira e arrastando os pneus. Eles foram abordados e explicaram que estavam no local pescando, no entanto, como se não tivessem sido entendidos, foram colocados no camburão. Rubens, mesmo

aqui É Brasil Três dias depois de ser libertado, Giovani recebeu a equipe da Ideias e contou como foram os primeiros momentos dos piores dias da vida dele. Na hora da primeira abordagem, mais de 20 policiais, todos com arma em punho, exatamente como deve ser uma abordagem, renderam os três e os revistaram. Eles disseram que estavam atrás de três assaltantes que haviam atirado contra as viaturas, abandonado um carro bem próximo dali e fugido no mato. “Teve um policial que foi educado. Ele conversou e já estava nos liberando, mas logo em seguida veio outro, e disse que a gente era muito parecido com os caras do assalto e que iria nos levar mesmo assim”. O equipamento de pesca foi jogado no chão e os três colocados no camburão. Apertados e ainda sem saber o motivo da prisão, foram interrogados aos gritos dos policiais, que mesmo sem ouvir as respostas, incriminava-os somente com o olhar. Os três não sabiam o que eles procuravam, mas tentavam justificar que estavam ali somente para passar algumas horas pescando, e para comprovar, apontaram as varas e demais equipamentos de pesca, além da sacola com as compras. “Eu mostrei a nota e disse que estava acontecendo um equívoco, e que eles poderiam confirmar tudo se fizessem uma ligação para a minha patroa, ou se fossem no mercado onde eu havia feito as compras. Mas não. Um soldado pegou as notas, amassou e jogou fora, dizendo que aquilo não era prova”, contou Giovani. Ele disse também que, antes de serem levados para a delegacia, ouviu dois policiais conversando


sobre a inocência dos pescadores. “Um deles disse que tinha certeza que não éramos os caras que eles procuravam, mas o outro insistia dizendo que precisava alguém preso”. Em seguida, a porta traseira da viatura foi fechada e um policial jogou spray de pimenta nas frestas, que imediatamente tomou conta do espaço todo. “Eu sou asmático e comecei a passar mal, até que um policial, o mais educado de todos, abriu a porta e questionou o outro, perguntando por que ele estava fazendo isso. Ele deu risada e disse que era assim que tinha que tratar o lixo da sociedade”. Curiosamente, segundo Giovani, quando um helicóptero começou a sobrevoar a área onde eles estavam, rapidamente os policiais fecharam a porta do camburão e se espalharam pelo mato, como se ainda tivessem procurando por alguém. “Não entendi por que eles fizeram isso, talvez porque ainda não tinham avisado a central deles de que haviam três pessoas detidas”. Quando chegaram à delegacia, as vítimas do mercado já estavam lá. Os três foram colocados em um paredão, com a cabeça baixa. E imediatamente o comerciante fez o reconhecimento com 100% de certeza. Com tantos indícios forjados, o reconhecimento, o depoimento dos policiais de que haviam trocado tiros com os rapazes, a prisão era somente uma questão de tempo. “Nenhum policial militar quis nos ouvir, ninguém quis saber da nossa história. Eu disse várias vezes que no mercado onde eu tinha feito as compras havia sistema de gravação de imagens e poderiam comprovar que eu estive lá de manhã, disse que poderia tirar minhas digitais, e até fazer o exame de coleta de pólvora, para comprovar que não havia manuseado uma arma. No entanto, um policial ainda tirou sarro dizendo que aqui é Brasil, e isso só existe nos filmes”, completou Giovani.

Duque 13 Enquanto aguardavam para serem colocados no xadrez, chegou uma outra viatura com duas moças adolescentes e um rapaz. Ele tinha sido preso com duas armas e uma sacola de dinheiro. “Não consigo imaginar quanto tinha de dinheiro, mas acho que entre R$10 mil e R$15 mil, divididos em notas e moedas, além de maços de cigarro. Vi eles (policiais) colocando nos bolsos e logo em seguida desapareceram. Só sei que aquele rapaz que foi preso com o dinheiro e com as armas, não ficou no xadrez junto conosco”. Quando estava sendo ouvido por policiais civis, Giovani, que tem uma cicatriz no lado direito do rosto, foi apontado como suspeito de um estupro, que aconteceu recentemente no município. Um homem que pratica assaltos e depois abusa sexualmente de suas vitimas, tinha uma

Mas a revelação, segundo ele, em vez de ajudar, atrapalhou. Quando foi colocado no xadrez, os presos queriam saber por qual motivo estava ali. O policial, supostamente sem saber do poder das suas palavras respondeu: “duque 13”(gíria usada no meio policial para identificar estupradores), foi o que bastou para despertar a ira nos mais de sessenta homens que ocupavam as três celas. “Eu os ouvi dizendo que iam esquentar água e óleo para dar um jeito em mim. Foi terrível. Mas graças a Deus um preso, acredito que era o líder dentro da cadeia, diferente de todos os policiais com que eu havia tido contato, conversou comigo e me ouviu. Contei toda a história e ele foi em cada cela e repassou para todos os detidos”. Os dias seguintes foram passando lentamente, principalmente porque, segundo Giovani, ficou sem apoio jurídico. “A minha força estava na minha família, e na minha patroa. Eles acreditavam em mim e sabiam que eu jamais faria uma coisa dessas. A advogada que foi contratada para me defender, nunca apareceu para conversar conosco, pra saber a nossa versão da história ou coisa parecida. Até hoje não sei exatamente de que forma ela ia me ajudar”, contou. O delegado Erik Wermelinger Busato disse que as provas não batiam, porém as vítimas e os policiais afirmaram que foram eles

“Todos os dias na cadeia ficarão marcados na memória, como se fosse uma tatuagem feita a ferro quente” marca muito parecida com a dele. “Quando o policial falou isso, para me defender, tive que falar sobre minha sexualidade. Contei que era homossexual e mesmo que não fosse, jamais estupraria alguém, sou contra todo tipo de violência”, contou o rapaz.

Tatuagem na memória Giovani disse que todos os dias na cadeia foram intensos, e ficarão marcados na sua memória, como se fosse uma tatuagem feita a ferro quente. Cada dia o pedaço de um desenho feio, que por mais que não quisesse mais ver, estará presente para sempre na sua vida. No 67.º dia, o delegado Erik Wermelinger Busato, chegou com uma boa notícia. Ele disse que sua equipe havia prendido um suspeito do crime. Vanderlei Augusto, de 31 anos, com várias passagens pela polícia, acompanhado de um adolescente, foi identificado por meio do sistema de gravação do estabelecimento, e posteriormente, os dois assumiram a autoria do assalto. O delegado disse que desde o começo havia algumas informações que não estavam batendo, mas pelo fato de todas as vítimas terem reconhecido os rapazes, e os policiais terem afirmado que foram eles, presos em flagrante logo depois de trocarem tiros, tiveram que permanecer presos. “A partir dessa nossa suspeita continuamos a investigação mesmo com os principais suspeitos detidos. Logo depois da prisão do verdadeiro assaltante, entramos em contato com o juiz informando sobre o ocorrido e solicitando que eles fossem colocados em liberdade”, explicou o delegado. Discordância A advogada Célia Mazzagardi disse que discordou da versão apresentada por Giovani. Ela disse que só foi contratada 15 dias depois de eles já estarem presos. Além disso, junho de 2011 |

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tentou de todas as formas ajudar a família dele. “A mãe dele, uma mulher doente, chegou aqui dizendo que ia vender a casa para poder pagar os serviços advocatícios. Eu disse que não precisava, que a gente parcelaria e tudo acabaria bem. Acertamos a forma de pagamento em uma entrada de R$500,00 e mais 10 parcelas de R$100,00, e ela concordou”, explicou a advogada. Ela disse que logo que pegou o caso, pediu a liberdade provisória de Giovani, mas foi negada, pois ele não era réu primário e havia diversas testemunhas do crime. “O juiz negou. E qualquer outro negaria também. É só colocar de um lado várias testemunhas que identificaram um assaltante, uma pessoa que já cumpriu pena por assalto. Difícil ficar do lado do suspeito”, comentou Célia. Dois dias depois de conceder a entrevista, ela renunciou o mandato e o processo passou a ser defendido pelo advogado Dalio Zippin, que é representante da Comissão Nacional de Direitos A advogada Célia Mazzagardi pediu a liberdade provisória de Humanos da Ordem dos AdvoGiovani, que foi negada por não ser réu primário e ser reconhecido gados do Brasil (OAB). Ele disse pelas vitímas. “Difícil ficar do lado do suspeito” que foi procurado pelas vítimas e imediatamente assumiu o compromisso de ajudá-los, e como a advogada e ainda ficaram 78 dias presos injustamente. que estava no caso renunciou, foi nomeado Eles deixaram de cumprir seus compromistitular de defesa. “Já sabemos que o Giovani sos, e pior do que tudo isso, vão ter que viver e o Alexander, que agora são meus clientes com essas marcas. Alguma coisa precisa ser foram maltratados, humilhados, ofendidos feita”, comentou. Com relação à passagem

que Giovani já teve na polícia, há muitos anos, no interior do Estado, o advogado disse que jamais um homem pode ser condenado por um crime levando em consideração o outro. “No passado ele errou, mas naquela ocasião, o juiz entendeu que ele deveria pagar sua pena doando cestas básicas e comparecendo no fórum mensalmente. Se naquela ocasião a pena foi branda, como pode agora, depois de tantos anos ele ser penalizado?”, questionou Zippin.

Gravíssimo O Tenente-Coronel Maurício Tortato, comandante do 17.º Batalhão da Polícia Militar, disse que as denúncias são gravíssimas e que todas elas serão investigadas. “Já identificamos os policiais. Vamos apurar os fatos e agir sem corporativismo, inclusive já entramos em contato com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e o Ministério Público para que eles acompanhem de perto todas as medidas que estão sendo tomadas. Não podemos agir precipitadamente, portanto, já determinei a abertura de um Inquérito Policial Militar e todos os envolvidos serão ouvidos. Caso seja confirmada a ação irregular, os culpados serão punidos no rigor da lei”, explicou o comandante. O advogado Dalio Zippin, disse que, como as denúncias são graves e atingem diretamente aos policiais da ativa, as vítimas deveriam ser incluídas no programa de proteção à testemunha, no entanto, novamente teriam que ser afastados das suas atividades até o caso ir a julgamento. “Eles preferiram ficar em casa, mas acreditam na seriedade da polícia, apesar do desvio de conduta de alguns deles”, completou.

A imagem dos verdadeiros assaltantes gravada pela câmara de segurança do estabelecimento. Os dois assumiram, posteriormente, a autoria do assalto

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Cidades

Nova gestão de polÍticas púBlicas REDaÇÃo

A

pesar de todas as adversidades enfrentadas pela Prefeitura Municipal de Almirante Tamandaré – que atende com orçamento enxuto de R$ 73 milhões anuais uma população que, segundo o IPARDES, tem uma parcela de 25,29% em situação de pobreza, e apresenta uma série de problemas sociais - o município tem avançando muito na política da Assistência Social e da Criança e do Adolescente. A fórmula não é mágica e envolve o planejamento e a execução dos serviços na modalidade do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) de atendimento. Desde 2009, a Prefeitura trabalha para proporcionar melhorias no atendimento a famílias que necessitam dos serviços de assistência social, cumprindo com a adequação ao modelo de gestão proposto.

Até 2010, contava com uma equipe técnica na área social de seis profissionais de nível superior centralizada na Secretaria. Atualmente, tem uma equipe descentralizada de 27 profissionais na área técnica social, distribuídos em equipamentos de gestão especializados como o CRAS I e II, CREAS, CASA DE PASSAGEM, entre outros. A implementação do CRAS, que hoje atende 25 bairros da região da Grande Cachoeira, oferece aos usuários: acolhida, escuta qualificada, visita domiciliar e atendimento multidisciplinar. Além disso, o CRAS se tornou um espaço da comunidade com a oferta de atividades para a geração de renda, e que fortalecem os vínculos familiares e comunitários. O CREAS, que completa um ano de funcionamento, é referência no município enquanto equipamento de suporte a outros programas diretamente ligados a ele (ver quadro),

com técnicos especializados que recebem capacitações contínuas para reconhecer e atuar em situações de risco complexas - priorizando a criança, o adolescente e suas famílias, conforme prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Além disso, outras ações demonstram a preocupação da atual administração em avançar para o nível de gestão plena de habilitação do SUAS, em que passará a ter autonomia total dos recursos provenientes do governo federal, de acordo com a realidade do município. Dentre as ações, pode-se citar: realocação da equipe técnica do órgão gestor em instalações mais adequadas no Centro Administrativo da Prefeitura; nova Casa de Passagem e equipe de profissionais em conformidade com as orientações técnicas do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA); dois tele-centros para

inclusão digital; um Centro da Juventude, com conclusão prevista para 2011; implantações de Rede de Proteção à Criança e ao Adolescente; Ficha de Notificação Obrigatória dos casos de violência contra a criança e o adolescente; previsão orçamentária e início da capacitação para os novos Conselheiros Tutelares Eleitos; planejamento para implantação do segundo CRAS; e outros. O Prefeito Vilson Goinski afirma que o novo modelo de gestão vem contribuindo com o desenvolvimento das políticas públicas do município. Para a Secretária da Criança e do Adolescente, Fabiane Ogasawara, “o ano de 2010, apesar de toda crise econômica, representa a ruptura do modelo de gestão com ações emergenciais e pontuais, investindo em uma política pública de forma planejada, priorizando ações de caráter preventivo, de acordo com as diretrizes do SUAS”.

2010: um marco na PolíTica da assisTÊncia social e da criança e do adolescenTe cras i atende 25 bairros da grande cachoeira

proteção social Básica: ações preventivas

suas o suas é o sistema público que organiza, de forma descentralizada, os serviços socioassistenciais no Brasil, com um modelo de gestão participativa, articulando os esforços e recursos dos 3 níveis de governo. proteção social especial: ações para situações de Risco

casa de apoio parceria com o FIa 2006. Instalações e equipe atendem normas do coNaNDa medida sócio-educativa peTI centro Jurídico casa de apoio Rede de proteção

creas o cReas é o centralizador dos programas de Medida sócio-educativa

medida sócio-educativa programa Municipal inserido na estrutura do cReas com equipe para acompanhamento do jovem infrator.

centro Jurídico Regulamentado com uma assessoria Jurídica com o apoio do cReas.

rede de ProTeçÃo Implantado com a divisão de 10 redes locais de atendimento com representantes de cada equipamento municipal de acordo com a área de abrangência.

PeTi- Programa de erradicação do Trabalho infantil uma nova sede para o prédio está sendo implantada com previsão para agosto. parceria com o FIa 2007.

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Comportament�

VocÊ precisa de aulas de seXo? Em CuritiBa tem KarEn FUKUSHima

MaRcelo RoMaNI

C as professoras andreia Berté (sentada) e Fernanda pauliv

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omo enlouquecer um homem parecer patética para muitos. Afinal, a relação na cama? Como enlouquecer sexual é algo atávico e não necessita passo a uma mulher na cama? Se você passo. Será mesmo tão simples? não sabe, não se desespere. Há a redençÃo “As aulas de artes sencomo aprender. Todo mês, censuais salvaram meu casamento”. Este tenas de pessoas vão à busca de é o depoimento da vendedora Daniele aulas sobre o assunto. Sim. Há um segmento, Evangelista, 21, casada há três anos e que há dois com berço na capital paranaense, que ensina teve uma filha. A crise no casamento veio logo o “como fazer”. É o mercado das Professoras após o nascimento da filha. Ao contrário da de Sexo. maioria das mulheres, que ganham peso e se inApenas um dos centros especializados em comodam com os quilos a mais, Daniele não se aulas de Artes Sensuais em Curitiba atende conformou com a nova forma esguia. Ao invés hoje, por mês, cerca de 700 mulheres, entre de aumentar, diminui, e muito. “Depois que tive aulas no próprio centro e palestras em outros minha filha, emagreci muito. Não tinha mais estados. E não é exclusividade para mulheres. bunda, peito, não tinha mais nada. Fiquei com No começo a ideia era essa, atender apenas o complexo de inferioridade. Para mim, qualquer público feminino. Mas a expansão foi tamanha mulher era mais bonita que eu”, conta. que alcançou também o público masculino. Daniele rejeitava seu próprio corpo, carenEste mesmo centro realiza, por ano, quate de curvas. Com vergonha, afastou o marido. tro palestras exclusivas para homens. Sempre com casa cheia. Este novo nicho de mercado é “Não queria que meu marido chegasse perto. Ele dizia que eu estava bonita, mas eu não acreditapromissor e muito rentável. Seja para orientar va. Estava perdendo meu casamento porque não iniciantes ao mais trivial da relação sexual ou para renovar relações consumidas pela rotina, deixava ele se aproximar, relações só no escuro e nada de diferente”. Apesar de estar ciente do as Professoras de Sexo garantem noites incríveis que acontecia em seu relacionamento, não mupara os parceiros de suas alunas e vice-versa. É possível que o caro leitor esteja com a im- dou nada até então. “A gente só pode dar o que a gente tem, e eu não tinha nada”. pressão de algo vulgar e promíscuo. A ideia de Mas quando a desconfiança de uma possível se lecionar sobre sexualidade e erotismo pode


VOCÊ SAI DE LÁ OUTRA MULHER, VOCÊ SAI DE LÁ SE ACHANDO GOSTOSA, PODEROSA. NÃO É UMA LAVAGEM CEREBRAL. É AUTOESTIMA Daniele Evangelista, vendedora

ARROZ COM FEIJÃO UMA HORA CANSA. PARA NÃO TER QUE TROCAR O PRATO, A GENTE MUDA OS TEMPEROS Emerson Antoniolli, assessor político a personal sex cris Fontoura ensina um novo movimento

“outra” surgiu no seu casamento é que o relacionamento de Daniele pareceu degringolar de vez. “Descobri que ele estava olhando para outra. Depois disso só piorou. Então me espertei. Parei e refleti que precisava pensar em mim”. Daniele lembrava ter recebido de uma amiga, há muito tempo, um panfleto do Joanah Pink. Não tinha mais o papel, mas o nome nunca saiu de sua cabeça. Procurou na internet e achou o local. E se inscreveu para uma palestra. “A primeira palestra foi dos Cinco Sentidos. Cheguei a chorar no dia, tudo que era falado parecia ser para mim. No dia em que fui, estava brigada com o meu marido.” Daniele foi pela primeira vez ao chamado Centro Integrado da Mulher Joanah Pink há um ano. Hoje se sente outra mulher e até dá conselhos. “Você sai de lá outra mulher, você sai de lá se achando gostosa, poderosa. Não é uma lavagem cerebral. É autoestima”. Para a vendedora que estava na iminência de terminar um casamento, mesmo amando seu companheiro, as palestras de artes sensuais funcionaram como uma terapia. O centro é agora seu divã e o frequenta regularmente, sempre que há palestras e cursos. Com a autoestima restabelecida, Daniele diz que toda essa energia é transmitida para o relacionamento. Se está infeliz, transmite infelicida-

de. Se está feliz, sente-se bonita e atraente, assim será vista pelo marido. “Foi a salvação do meu casamento. Tudo que aprendi foi muito bom e indico para todo mundo. Se quiserem que eu faça propaganda na TV, eu faço”, diz Daniele animada.

Para TemPerar “Arroz com feijão uma hora cansa. Para não ter que trocar o prato, a gente muda os temperos”, assim o assessor político Emerson Antoniolli, 32, justifica sua procura pelas aulas de artes sensuais. Apesar de recém-casado, com oito meses de matrimônio, Emerson namorou sua esposa por dois anos antes do casamento. Gosta do trivial feijão com arroz, mas também acredita que uns temperinhos sempre ajudam a melhorar o prato principal. Foi através da internet que o assessor soube sobre as palestras e se interessou. Cadastrou-se para o curso e foi. E hoje fala de boca cheia que quem mais gostou dos ensinamentos que aprendeu foi sua mulher. Emerson participou de apenas uma palestra, há quatro meses. Para o público masculino, as aulas e cursos de artes sensuais são mais raros, por enquanto. Mas quando anunciados, lotação máxima. No dia em que Emerson falou com a IDEIAS, estava inscrito para outra palestra. Mas desistiu por causa de uma viagem a trabalho. Apesar de

lamentar que a próxima demoraria um pouco, garantiu presença sempre que puder. Está interessado, inclusive, que sua esposa se torne aluna e faça aulas no centro. “Ela nunca foi porque trabalha o dia inteiro e ainda fazia pós-graduação à noite. Com a experiência que eu tive acredito que ela vá em breve”, disse animado.

no PrincíPio, agora e semPre “Belas e curiosas meninas, aqui está a Escola da vossa sabedoria, e a colecta das principais cousas que deveis saber para que contenteis vossos maridos, se os tiverdes; este é o segredo infalível para conseguirdes ser amadas pelos homens mesmo quando vos falte formosura, e o modo fácil de fazerdes com que o tempo da vossa juventude decorra entre doçuras e prazeres”. O excerto acima é de autor desconhecido do século XVII e foi retirado do livro Écolle des Filles ou Escola de Meninas. Apesar da distância temporal do livro, as promessas são equivalentes. Os ensinamentos não estão em cartilhas ou livros. São transmitidos em palestras para grande público, aulas em grupo ou ainda particulares. Aqui em Curitiba nasce a ideia das aulas de Artes Sensuais. As precursoras são Andreia Berté e Fernanda Pauliv que trabalhavam juntas em uma agência publicitária. Ambas, casadas, junho de 2011 |

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NUNCA NOS DESRESPEITARAM, MAS SENTÍAMOS UMA RESISTÊNCIA. NO COMEÇO AS PESSOAS NÃO ENTENDIAM MUITO BEM O QUE NÓS FAZÍAMOS. QUANDO COMEÇARAM A PERCEBER COMO FUNCIONAVA, TUDO MUDOU

Fernanda Pauliv, empresária e professora de artes sensuais

NOSSO TRABALHO É FALAR DE MULHERES COMUNS, COMO NÓS, QUE NÃO SÃO MODELOS DE BELEZA, COM DEFEITOS QUE TODAS TÊM, PORÉM, QUE SÃO CAPAZES DE SE TRANSFORMAR

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EM UMA LEOA ENTRE QUATRO PAREDES, PORQUE LÁ VALE TUDO

Andreia Berté, empresária e professora de artes sensuais

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procuravam sempre formas criativas de agradar seus maridos e apimentar a relação. Cada nova experiência era sempre compartilhada. Foi de uma dessas experiências que nasceu o Centro Integrado da Mulher Joanah Pink. “Um dia, quando voltei de uma viagem, a Fernanda falou: vamos fazer fotos sensuais para os nossos maridos? Como a gente trabalhava em agência, tínhamos muito acesso a fotógrafo, iluminador, maquiador e ao mesmo tempo receio, porque eles nos conheciam profissionalmente. Mas na hora eu falei: vamos fazer!”, conta Andreia. As duas foram para um hotel com toda a equipe. “Éramos mulheres comuns fotografando fotos sensuais. Quando recebemos as fotos, achamos muito legal. Mas faltava alguma coisa. Então eu tive uma ideia. Chamei uma diretora de arte e perguntei pra ela se ela não transformava aquelas fotos em uma revista, como a VIP. E ela desenvolveu a programação visual e foi assim que entreguei para o meu marido. Isso há dez anos. Nessa época eu já tinha feito vários cursos de sensualidade, já tinha chamado uma amiga para me ajudar a fazer a decoração de um quarto para o meu marido. E na ocasião até falei: imagi-

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precisar para sua nova casa. As amigas se reúna a gente trabalhar com isso, decorar suítes para nem (e só mulheres são permitidas) e separam casais? Mas eram ideias soltas. Com a Fernanda também uma infinidade de trotes para a noiva. eu sempre falava de como era difícil entrar em Se a noiva erra o presente, geralmente embruuma sexy shop em Curitiba. Um dia pensando lhado de forma a despistar o conteúdo, paga nisso tudo, acordei e pensei de fazer um lugar que tenha tudo isso junto. Fiz um projeto e apre- alguma coisa. A ideia é passar por situações sentei para Fernanda que me ajudou a aperfeiço- ridículas e embaraçosas, como dançar na boar. Daí surgiu a Joanah Pink”, relembra Andreia. quinha da garrafa, inventar declarações ou cantar. E claro, muitos desenhos de batom no rosAntes de Andreia e Fernanda já existiam to e enfeites dos mais variados no corpo. A profissionais que ensinavam algumas técnicas noiva acaba o dia como uma árvore de natal. de sensualidade, que se restringiam a dicas de Não deixa de ser divertido um encontro só massagem sensual, strip-tease e palestras de de mulheres, com comes e bebes e com direito autoestima. Agora a lição é mais completa, com a sacanear a amiga. Mas agora há modalidades direito a workshops e MBA no assunto. E como há mercado para todos, logo surgi- “apimentadas” de chás de panela e de lingerie. Em ambos, uma professora é convidada para dar ram outras empresas e profissionais autônomas dicas, ensinar truques e danças sensuais para a que oferecem serviços semelhantes. A IDEIAS noiva usar na lua de mel e na vida a dois. E claro, acompanhou uma aula de “Como Enlouquecer as amigas aproveitam. A noiva sai do encontro um Homem na Cama” e também um “Chá de ilesa de marcas de batom, mas com balangandãs Lingerie Sensual”. pra lá de sensuais. chÁ Para aquecer Desde que há O Chá que a IDEIAS acompanhou foi de Lingerie casamento, há também rituais antes e teve como sede uma loja de lingeries no Batel. do casamento. Entre as mulheres, o Hoje existem lojas com ambientes programados Chá de Panela é o mais comum. A noiva distri- para este tipo de evento, que sedem o espaço desbui uma lista de utensílios de cozinha que vai de que as convidadas façam as compras na loja.


APRENDEMOS, PRINCIPALMENTE, QUE loja no bairro Batel onde é realizado os chás de lingerie

TODAS AS MULHERES QUEREM SE SENTIR MAIS FEMININAS, MAIS PODEROSAS, MAIS SEDUTORAS. E O QUE NÓS FAZEMOS É APENAS AJUDÁ-LAS A DESCOBRIR ONDE ESTA MULHER FATAL ESTÁ ESCONDIDA

Cris Fontoura, empresária e personal sex

Geralmente há, nessas lojas, um espaço com acessórios eróticos que entram na lista de compras. O chá começou no sábado à tarde. As convidadas eram recepcionadas por funcionárias da loja, que as encaminhavam para o piso superior, onde estava a noiva. O ambiente muito feminino e aconchegante. No cardápio, mini trufas com recheios variados e mini salgadinhos. Para beber, champanhe. Neste Chá, a noiva optou por uma aula de Chair Dance, que é uma dança individual onde a mulher utiliza uma cadeira para executar os movimentos. A aula começou quando as convidadas já estavam mais descontraídas. A professora era Cristiane Fontoura, a Cris, uma das proprietárias da Mafia Pura Eventos Femininos. No começo, muita timidez. Aos poucos, a professora consegue que as alunas se libertem. Cada passo deve ser repetido por todas. E claro, a noiva deve repetir todos em destaque, para que todas vejam. Ao final, unem todos os passos aprendidos e a Chair Dance é realizada por todas. Aplausos, risadas e suor. Assim a noiva e as convidadas terminam a aula com vontade de mais. Neste dia, as amigas da noiva queriam o contato da Cris para marcar uma aula mais de-

talhada porque gostaram do que aprenderam durante o Chá. Naquele mesmo dia, Cris tinha na sua agenda outro Chá marcado, onde seria uma aula mais completa. A empresária e Personal Sex, como se intitula, explica que a procura é cada vez maior. Por fim de semana realiza, em média, três Chás. Mas já chegou a ter cinco em um único dia. Desde 2006, quando a Mafia Pura foi fundada, Cris contabiliza mais de 5000 mulheres nos cursos, chás de panela e lingerie, workshops, encontros. “Aprendemos, principalmente, que todas as mulheres querem se sentir mais femininas, mais poderosas, mais sedutoras. E o que nós fazemos é apenas ajudá-las a descobrir onde esta mulher fatal está escondida. Cada novo encontro, uma nova festa. Não apenas aquela que ajudamos a construir, mas por todo o novo mundo que ajudamos a mostrar a nossas alunas. E que elas mostram para nós”.

Tudo que vocÊ semPre quis saBer, mas Tinha vergonha de PergunTar Uma noite de prazeres incríveis que realiza os desejos secretos do homem brasileiro, ou seja, tudo o que você sempre

quis saber sobre os desejos dos homens, mas tinha vergonha de perguntar. A IDEIAS acompanhou a palestra “Como enlouquecer um homem na cama – Noite dos desejos secretos” e confirma que não há meias palavras quando o assunto é sexo. Era uma terça-feira e a palestra estava marcada para começar pontualmente às 19h30min com término previsto para 22h. De fato. Foram duas horas e meia de palestra. As mulheres chegavam sempre acompanhadas de outras mulheres. Em duplas, trios ou grupos. Nunca sozinhas. E aos poucos, a sala em L que estava cheia de cadeiras vazias e enfileiradas, foi tomada pelo murmurinho curioso das mulheres. À frente, um grande telão branco passava informações para as presentes. A palestra não podia ser gravada nem fotografada. Os aparelhos celulares deveriam ficar desligados. O único registro dos ensinamentos deveria ser feito pelas alunas, em suas anotações individuais. Assim que a entrada da palestrante foi anunciada, silêncio absoluto. Andreia Berté era a palestrante da noite e começou com um exercício de relaxamento, para descontração geral. Em seguida, explicou e pediu que todas fizessem um junho de 2011 |

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onde encontrar

drinks afrodisíacos

No centro Integrado da Mulher Joanah pink as aulas de artes sensuais são em formato de palestras, cursos ou ainda particulares. os valores variam conforme a opção escolhida. as palestras custam, em média, R$50 e tem duração de 2h30m. os cursos ficam na faixa de R$ 120 e têm duração de 4h. as aulas particulares são compradas em um pacote para três pessoas, custa R$ 420 por uma hora. o chá de panela ou lingerie sai em média por R$ 600.

Poção de eva • 3 copos de gelo • 1 lata de leite condensado • 4 colheres de sopa de extrato de guaraná líquido • 4 colheres de chocolate amargo (200g) • 4 gotas de pimenta forte • 2 copos de vodca

Joanah pink www.joanahpink.com.br

Dissolva bem o chocolate com o leite condensado. Bata no liquidificador com a pimenta, o guaraná, o gelo e a vodca. Coloque em uma taça e tome com um canudinho.

No Mafia pura eventos Femininos as aulas podem ser individuais ou em grupos. Há o workshop que engloba dança, técnicas de pompoarismo e massagem tailandesa por R$ 100 e tem duração de 4h. aulas específicas de strip-tease que custam R$ 250 e tem duração mínima de uma hora. e também um workshop específico para noivas, custa R$ 350 e tem duração mínima de 2h. o chá de panela ou lingerie sai em média por R$ R$ 290.

Poção lilith • 6 morangos grandes • gengibre ralado • 1 lata de leite condensado • 1 garrafa de frisante • 1 copo de vodca • 100 ml de extrato de guaraná líquido • copo de gelo

Mafia pura www.mafiapura.com.br

juramento de que os ensinamentos aprendidos ali deveriam ser compartilhados apenas com seus maridos e namorados. Não com qualquer um. O homem deveria fazer por merecer todo o esforço. E também, como uma irmandade, as mulheres deveriam guardar segredo do aprendizado, não espalhando aos quatro ventos. A primeira parte da palestra apresentou os 10 desejos mais secretos do homem brasileiro. Diferente das fantasias sexuais, conta Andreia, os desejos são difíceis de identificar porque não são falados abertamente pelos homens. Após extensa pesquisa com o público masculino, estes 10 desejos foram identificados e nesta primeira parte, Andreia explica detalhadamente cada um deles. A proposta da segunda parte da palestra é ensinar como as mulheres podem, sozinhas, realizar estes desejos dos seus respectivos companheiros em apenas uma noite. Para tanto, dose extra de criatividade e muito boa vontade. Para cada desejo secreto, uma solução criativa. Nomes como Escorregador Erótico, Mãos Gulosas e Chuva da Paixão estão entre os passos da noite. As demonstrações têm o auxílio de ajudantes masculinos inanimados. Um boneco inflável e um manequim de loja. E as mulheres se divertem muito. É quase um stand up sensual. A condução da palestra é didática e ao mesmo tempo divertida. Mostra que todas, independente de formas, idade ou etnia, são capazes de realizar. E durante todo o tempo, os blocos de anotações são coqueluche e os punhos não param.

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Bata tudo no liquidificador, exceto o frisante. Coloque o creme em uma taça e complete com o frisante.

Ninguém quer perder sequer uma dica, uma lição. Além da forma de executar as dicas, há também os acessórios utilizados em cada uma, como velas aromatizantes, gel estimulante, cremes de massagem corporal entre outros. Quando a palestra acaba, as mulheres correm para a sala anexa, uma Sexy Boutique. Querem tudo. Compram tudo. Saem com sacolas cheias. É uma corrida ensandecida pelos produtos apresentados. “A gente sempre brinca que é uma Disneylândia, depois da atração, vai para a loja. Elas recebem aqui uma consultoria completa. Sabemos o quanto a mulher é imediatista. Ela viu tudo aquilo e ela quer fazer. Ela não vai sair daqui e ir comprar. Fizemos a loja como uma forma de comodidade, de facilidade. Como forma de complementar nosso trabalho”, conta Fernanda. As amigas e sócias do Joanah Pink enfatizam que adoram o que fazem porque têm o compromisso com a felicidade das mulheres. Abandonaram tudo por um projeto, que deu certo. Quanto questionadas sobre como foi no começo, explicam que ninguém entendia bem a proposta, mas que hoje são reconhecidas e respeitadas em todo o Brasil. “Como não existia referência, as pessoas não sabiam o que exatamente fazíamos aqui. Tinha gente que achava que era clube das mulheres, que achava que era curso para garotas de programa, mas não, garotas de programa não precisam de curso (risos). No começo era nebuloso, as pessoas não entendiam o formato do programa porque

não existia nada parecido. Quando começaram a perceber como funcionava, frequentavam e viam que tudo que a gente falava era coerente, tudo mudou”, relembra Fernanda. E para Andreia, existia o preconceito e ainda há. “Mas a pessoa coloca o pé aqui dentro, conversa cinco minutos com a gente e já muda de ideia. As professoras de artes sensuais acham que precisam ter estereótipo de lindona, cabelão, bocão, peitão, comportamento super sexy. E isso é um absurdo. Na verdade existe uma linha muito tênue entre sensualidade e vulgaridade e a gente cuida muito disso em tudo que a gente faz. Não existe nada na nossa empresa que seja vulgar, uma palavra, a roupa que usamos, nosso comportamento, nada. Nosso trabalho é falar de mulheres comuns, como nós, mulheres que não são modelos de beleza, como nós, mulheres com todos os defeitos que todas têm, porém, que são capazes de se transformar em uma leoa entre quatro paredes, porque lá vale tudo. Provamos que não é preciso andar de microssaia, saltão, peitão, decote, bocona vermelha e cabelo jogando de um lado para o outro, para ser uma mulher sensual. Basta ser você mesma”.

karEn FukusHima é jornalista


Fábio Campana

Mulheres

S

ou da geração que testemunhou o fim da era da castidade e o início da liberdade sexual das mulheres. Talvez por isso sejamos bígamos incorrigíveis. Guardamos em nosso imaginário a relação de dualidade que separa as mulheres virtuosas das mulheres do prazer. As primeiras destinadas ao amor casto, à vida doméstica e à reprodução. Estas têm de se guardar virgens até o casamento e se manter fiéis ao marido até que a morte os separe. Nestas se projeta a imagem da mãe, de quem não se admite pecado em nossa civilização ocidental, cristã e psicanalisada. As do prazer teriam vindo ao mundo para atender as nossas expectativas que emergem abaixo da linha da cintura. As amantes, as mulheres sem tutela, sem peias, prontas para a paixão e para os relacionamentos de ocasião. Nem tudo é tão simples. Há hibridismos. Mulheres capazes de várias vidas ao mesmo tempo. A adúltera, senhora doméstica e virtuosa que ao mesmo tempo tem como diversão preferida os casos fora do casamento, repete o comportamento masculino típico que as mulheres de formação mais recente condenam. Conheci uma senhora que conseguia ser mãe e esposa dedicada pela manhã. À tarde prestava serviços sexuais ao chefe, o que lhe assegurava estabilidade no emprego e o pagamento disfarçado em salário mensal, que exigia pontual, impreterivelmente no dia 5, para que desaparecesse a sensação de prostituição. Não satisfeita, à noite vestia a farsa de animadora de festas e deitava e rolava, literalmente, com todos os homens que lhe apeteciam. Duas

ou três taças de vinho a ajudavam a aplacar a consciência e voltar ao lar, doce lar, cheia de pudores e a verter observações de um moralismo exacerbado para o crédulo marido. Seria a puta vocacional, de que falava Nelson Rodrigues? Não me arrisco, soaria a machismo condenável nestes dias em que as mulheres são livres para todas as experiências, inclusive aquelas antes condenáveis pela moral de padrões vitorianos que vigia até o fim dos anos 60 do século passado. A verdade é que assim como nós, homens formados em uma época de dualidades, há mulheres que só se satisfazem em vida promíscua. Orgasmo só se houver traição ao distinto pai ou pretenso pai de seus filhos. Os analistas freudianos tentam explicar. E a filmografia de Federico Fellini é toda construída sobre essa obsessiva compulsão para a vida amorosa que tem duas faces. Fique claro. A mulher ideal não é aquela que reúne as qualidades das duas. O prazer só se

completa quando cada qual cumpre seu papel e a vida escorre em duas vertentes. De um lado a personagem de Anouk Aimée, de outro as Saraguinas e Gradiscas. Afinal, quem não sonhou conciliar pessoas e situações absolutamente inconciliáveis? A esposa e a amante. O pé no chão e o direito de sonhar. O resgate da figura materna e a pacificação com o personagem paterno. Perguntei a uma amiga psicanalista e ela disse que essa soma de impossíveis vive, como desejo, no fundo do inconsciente de cada um. Por isso Fellini, com seu 8 1/2, toca tão fundo. A poucos filmes se aplica tão bem a frase de Horácio nas Sátiras: “Quid rides? Mutato nomine, de te fabula narratur” (perdoe o latim). Por que ris? A anedota fala de ti, só que com outro nome. A situação desejada por homens de meu tempo seria deitar-se numa banheira, a fumar um Hoyo de Monterrey acompanhado de uma taça de champagne, cercado por todas as mulheres pretendidas e disponíveis para os prazeres e as perversões, enquanto a vida segue em outro plano, tranquila e sob controle da mulher única, casta, insubstituível. Aquela do amor eterno enquanto dura. Ao fundo, o som da marchinha circense de Nino Rota. Seria uma epifania, desde que se aprenda a separar os sentimentos e jamais esperar das Gradiscas o que só a verdadeira pode oferecer.

Fábio Campana é jornalista e escritor. fabiocampana.com.br

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Comportament�

Sou é homem, mas de saia, salto alto e Batom Conheça o universo dos homens que se vestem como mulher Marianna Camargo

D

esde que o cartunista Laerte apareceu de peruca, saia, salto alto e batom o assunto veio à tona. Mas o fetiche de vestir roupas do sexo oposto vem de muito tempo. O termo crossdresser é atual e significa em tradução literal “vestir-se ao contrário”. Nos Estados Unidos e na Europa este termo é bastante utilizado e diferencia a fantasia de usar roupas do sexo oposto das preferências sexuais de cada um. Como o assunto é tabu gera preconceitos e estranheza. No Brasil, existe um site criado há 14 anos por Monique Michele, Deborah Lee, Priscila Queen e Deborah Cristina (nomes fictícios) voltado ao assunto chamado Brazilian Crossdresser Club (BCC), pioneiro no tema. O BCC é voltado a homens que vestem-se como mulher, pois existe também o crossdresser masculino, ou seja, mulheres que vestem-se como homens. Segundo o site, a finalidade é a integração social entre pessoas que têm a fantasia de usar roupas do sexo oposto ou crossdresser. O site deixa bem claro que não tem caráter sexual ou de encontros. As informações colocadas no portal são dividas por assunto, associadas por região e como fazer para entrar no clube. A anuidade custa R$ 120 reais e a associada tem direito a um perfil dentro do site, ajuda do webmaster e participar do Holiday en Femme, eventos onde todas se encontram, que pode ser um cruzeiro, uma festa ou viagens, inclusive com o direito de levar suas esposas. Hoje há 310 associadas inscritas no Brasil e 26 no Paraná.

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aceitem tranquilamente, pois há certos “rótulos” que virão junto com você, como de você ser gay ou travesti, como se quiséssemos apagar por completo nossa personalidade masculina, o que não é verdade. E esses preconceitos são muito difíceis de mudar”, desabafa. Suzana conta que há pessoas de diversas classes sociais que são crossdressers e explica que muitos não conseguem viver de uma maneira plena esse estilo de vida, por preconceito e por causa da profissão, e revela que existe o crossdresser masculino também, que são mulheres que gostam de se vestir como homem.

Para Suzana Rodrigues ser crossdresser é um estilo de vida

Fetiche É importante fazer uma distinção. Os crossdressers não são necessariamente homossexuais. A opção em usar roupas do sexo oposto é uma fantasia, um fetiche. Os crossdressers não modificam o seu corpo por meio da terapia hormonal ou cirurgias, como os transe­xuais, e muitos têm orientação heterossexual. O crossdresser é um desafio até mesmo para a área médica. Isso ocorre por falta de informações e estudos detalhados sobre a prática. Para a psicóloga Telma Linhares, o fato de vestirem-se com roupas do sexo oposto não os coloca na categoria classificada pela Associação Brasileira de Medicina, como “transtornos de identidade gênero”. “Os crossdressers se vestem assim para uma realização particular, é apenas uma fantasia”, afirma a psicóloga. Alguns crossdressers concederam entrevista para a Revista Ideias e revelam um pouco deste universo enigmático, que subverte o padrão convencional do ver, ser, fazer, e por isso mesmo, cumpre um papel ousado e questionador. E como qualquer atitude que ultrapassa limites e regras mais conservadoras, estremece linhas tênues de comportamento, provoca reações polêmicas e o principal: faz “pensar ao contrário”. Personalidade masculina Suzana Rodrigues é de Curitiba e tem 35 anos. Trabalha como assistente administrativa. Ela explica que “ser crossdresser, nada mais é que gostar de se produzir e estar como mulher, independentemente da escolha sexual”. Suzana diz que pelo preconceito, ainda há poucas crossdressers que se arriscam a sair produzidas de casa. “É muito difícil ter pessoas da família e amigos que

Juliana Pinque adora vestir as roupas das namoradas

Universo feminino A história de Suzana começou quando tinha 17 ou 18 anos, e por morar apenas com a mãe e a irmã, acabou tendo contato com universo feminino que sempre gostou. O desejo pelo “estar feminina” sempre a atraiu, até que um dia, sozinha em casa, se produziu com roupas de sua irmã, e isso só desencadeou um desejo cada vez mais constante de estar produzida. “No dia a dia, que é como homem, tenho muitas coisas a fazer, e nem sempre acontece de eu poder me produzir, pois existem várias variantes que eu considero, pois minha família não sabe que sou crossdresser, nem meus amigos, ou seja, é uma identidade paralela, que normalmente quem me conhece como Suzana conhece a Suzana, e quem me conhece como homem, apenas me conhece dessa forma”. Suzana conta que existem eventos que o Brazilian Crossdressing Club organiza para que as crossdressers possam ir, por exemplo, em cruzeiros, onde elas podem estar como mulher, inclusive podem levar suas esposas — quando elas sabem e apoiam — e amigos, ou mesmo bares GLS (gays, lésbicas e simpatizantes) onde possam se sentir confortáveis como mulheres e tratadas como tal. Biquíni Juliana Pinque, curitibana, tem 35 anos e trabalha como autônoma. Explica que crossdresser é “homem que se veste de mulher sem que isso influencie em sua opção sexual”. Declara-se heterossexual e diz que sua história começou quando resolveu vestir a roupa que uma namorada havia deixado em sua casa. Juliana diz que no dia a dia não costuma se vestir de mulher, mas que já passou 15 dias na praia de biquíni e adorou. Conta também que teve namoradas que junho de 2011 |

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gostavam desta fantasia, que para elas era como “brincar de boneca, só que no caso, eu era a boneca, que elas vestiam, maquiavam e muitas vezes saíam juntas assim”.

Preconceito Yummy, curitibana, tem 39 anos e trabalha como engenheira. Define crossdresser como “poder se postar em situações do sexo oposto”. Começou mais como uma curiosidade, quando na época de ginásio aproveitava a ausência de familiares em casa para experimentar roupas e maquiagens da irmã e da mãe. Yummi também não pode incorporar na sua rotina a sua vestimenta feminina, mas sai ocasionalmente em baladas. Sobre o preconceito, Yummi diz que não sente muito porque quando está vestida de mulher frequenta ambientes discretos ou favoráveis a isso, mas dispara: “existe somente a percepção geral, no meio da sociedade que convivemos, que deve sim existir muito, haja vista a quantidade de comentários, brincadeiras que o tema ainda provoca”. Fantasias Selminha Rocha, 54 anos, nasceu em Maringá e mora em São Paulo, onde atua como consultora empresarial. Ela diz que ser

A opção em usar roupas do sexo oposto é uma fantasia, um fetiche crossdresser é muito mais do que se vestir de mulher. “É algo que existe dentro de cada um, e que nem por isso qualifica como homossexual.

Eu, por exemplo, não curto homem, é algo que me fascina apenas provocá-los, isso sim me excita e muito”. Selminha conta que sempre teve bons relacionamentos com mulheres e encontrou muitas delas que participaram e contribuíram com seu lado feminino. Ela revela que viaja muito na sua profissão, hospedando-se em hotéis. “Isso facilita e muito as minhas montagens, mas uma coisa é certa; já faz anos que só uso calcinha mesmo no dia a dia, muito raramente uso cuecas. Diz que algumas pessoas sabem do seu modo de vida, mas a maioria “não imagina e nem sequer sonha”. Selminha conta que viveu por oito anos com uma crossdresser em Paranavaí e “com ela eu era homem e mulher”. Sobre preconceito, Selminha é categórica. “Um dia sei que isto será superado e que talvez eu não esteja mais aqui para ver, mas quer saber, prefiro assim, acho que é um objeto de controle e que me deixa um pouco mais comportada, penso que se não fosse assim, acho que ficaria sem graça, é como um namoro às escondidas, quando descobrem, perde-se o encanto, entende?”.

Quem pensou ao contrário História Maria Quitéria nasceu em feira de Santana, na Bahia, em 1792. Estava noiva quando, entre 1821 e 1822, iniciaram-se na província da Bahia as agitações contra o domínio de Portugal. Maria Quitéria pediu ao pai, Gonçalo Alves de Almeida, autorização para se alistar. Tendo o pedido negado pelo pai, fugiu. Depois, cortou os cabelos. Vestindo-se como um homem, dirigiu-se à vila de Cachoeira, onde se alistou sob o nome de Medeiros, no Regimento de Artilharia, onde permaneceu até ser descoberta pelo pai, duas semanas mais tarde. Defendida pelo Major José Antônio da Silva Castro (avô do poeta Castro Alves), comandante do Batalhão dos Voluntários do Príncipe, foi incorporada a esta tropa, em virtude de sua facilidade no manejo das armas e de sua reconhecida disciplina militar. Na condição de Cadete, envergava uniforme de cor azul, com saiote feito por ela, além de capacete com penacho. Política Stu Rasmussen (1948) é um político americano e homem de negócios do estado de Oregon.

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Foi eleito presidente de câmara da cidade de Silverton em novembro de 2008, tendo sido eleito duas vezes antes para o cargo na década de 90. Rasmussen afirma que praticou o crossdressing toda a sua vida, mas só se revelou publicamente como tal em 1993. Rasmussen tem um relacionamento com a mesma mulher, Victoria Sage, há mais de 30 anos. Ele vive como homem e faz-se tratar no masculino. Cinema O cineasta americano Edward Davis Wood Jr. (1924 -1978), o Ed Wood, vestia-se como mulher. O filme Glen ou Glenda (1953) é sobre esta fantasia. Em 1994, Tim Burton fez um filme sobre o cineasta, que mostra o fetiche de Wood, interpretado por Johnny Depp (foto). Wood dirigiu os últimos filmes de Bela Lugosi, o célebre intérprete do Conde Drácula, de quem era grande admirador.

Moda A estilista francesa Coco Chanel (18831971) foi quem modernizou a moda e fez calças e trajes masculinos para as mulheres usarem em uma época em que isso era considerado um verdadeiro absurdo. Se não fosse Chanel, a moda estaria um tanto quanto antiquada. Além disso, inovou no corte de cabelo e lançou o clássico “chanel”, mais curto, e elegante até hoje. Chanel reinventou um estilo, vestindo as mulheres de homens da maneira mais sedutora possível. Se não fosse por ela, as mulheres não estariam usando calças compridas hoje. Rock O Glam Rock é um movimento que surgiu na Inglaterra no final dos anos 1960 e ganhou fama no início dos anos 70, que ficou conhecido pelo visual das bandas, com maquiagens exageradas e roupas chamativas. Bandas como New York Dolls (foto), Gary Glitter, Mott The Hoople e o camaleô­nico David Bowie são exemplos. Na década de 1980, veio o Glam Metal - Poison, Motley Crue, Wasp, e o New Wave com Adan and The Ants, Human League, Soft Cell.


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Solda

G    XX ABBDUL JABAR - ATIRADOR DE QUIBES, BRASIL, 1947. Abbdul foi o maior atirador de

pedes de sua famosa arcada dentária, que ostentava seis poderosos e reluzentes dentes de ouro, acumulados durante sua curta e risonha carreira. Recebeu várias honras, diversos títulos mundiais nas mais variadas categorias, que incluíam mordida a curta distância, espirro sem abrir a boca e bochechos com folhas de malva. Suas 18 vitórias, em 20 competições - três vezes a Maratona de Santa Felicidade, duas vezes a Palitada da Mateus Leme e ainda 12 títulos na categoria Espeto Corrido - mostraram que Arnésio palitava os dentes sem pôr a mão na frente pra disfarçar.

atropelado por um americano parecido com Carl Lewis e quase perdeu as pernas num acidente lamentável. Salamaleke é recordista mundial do salto em distância com colher de xarope e está até hoje correndo atrás do prejuízo.

JUVENILDO - JOGADOR DE FUTEBOL, BRASIL, 1926. “Cotovelo de Ouro” era o apelido de

DEUSDETE ROCHA - ENGOLIDORA DE SAPOS, BRASIL, 1980. Eleita pela imprensa esportiva

atravessar a rua na ditadura militar sempre foi um esporte popular no Brasil, muito praticado nos grandes centros urbanos. Velhinhas centenárias, ansiosas por chegar do lado de lá da rua, foram, durante muito tempo, ajudadas por Greta Patrícia, que começou cedo nesse esporte, aos 12 anos de idade, quando ajudou a tia a atravessar o corredor para chegar ao banheiro da enorme casa onde moravam. Patrícia abandonou a carreira depois de ajudar uma velha amiga a atravessar a BR-116, perto de Registro. A amiga morreu no local e ela teve ferimentos graves.

Juvenildo Constâncio, criador do gol de cotovelada. Sua habilidade não se restringia ao braço esperto: era hábil e poderoso também nas cabeçadas e na dança do ventre. Apareceu no futebol quando foi escalado pelo técnico Artacherches Fonseca como centro-avante do Frontêra Bagual, no Rio Grande do Sul, em 1943, numa memorável partida em que o time gaúcho goleou o CTFC (Centro de Tradição do Futebol Catarinense) por 6x0, fazendo três gols de cotovelada e um com a barriga milagrosa que espantava a torcida. Nunca chegou à Seleção Brasileira, pois era adepto do “copo de cerveja fatal” que o afastava dos coletivos por intoxicação alimentar. Também era mulherengo e viciado em naftalina. Na derrota do Brasil para o Uruguai, em 1950, chorou copiosamente e morreu afogado nas próprias lágrimas, ao descobrir que a empregada havia limpado as gavetas e jogado fora todas as suas bolinhas de naftalina. Era ainda nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga.

como “Engolidora do Ano” em 1997, Deusdete é dona de um público fiel, que coacha e aplaude todas as suas qualidades em campo. Filha do sapólogo Frog Frogger, ela desde pequena mostrou talento, engolindo as pererecas que infestavam a casa de campo da família na pequena localidade de São Luiz do Purunã. Dona de invejável pescoço e de uma insaciável disposição para engolir anfíbios anuros, em sua maioria peçonhentos, é capaz de suportar coisas desagradáveis sem revidar, por imposição ou por conveniência. Conquistou a medalha de prata para o Brasil em 1998, em Bruxelas, engolindo sapo-concho, sapo-cururu e sapo-da-areia, um após o outro, sem intervalos. Seu maior desejo é engolir um bufo marinus (da família dos bufonídeos) na próxima Olimpíada, se a vaca não for pro brejo.

ARNÉSIO DARLENE - PALITADOR DE DENTES, BRASIL, 1968. Arnésio é considerado, por

SALAMALEKE ABEBE - ATLETA, COSTA DO MARFIM, 1979. Salamaleke, um dos homens

unanimidade, o maior palitador de dentes de todos os tempos. Não perdoava fiapos de manga, fibras de costela, pedacinhos de azeitona, barba de camarão-abraçadinho e não permitia que resíduos de espécie alguma fossem hós-

mais rápidos do mundo, é o pai da corrida de trás pra frente nos 100 e 200m. Venceu várias provas internacionais, entre elas a famosa Fuga n 18º, de Johann Sebastian Bach. Na prova de Dublin, em 1992, 450m, corrida de soslaio, foi

quibes de todos os tempos, superando inclusive o campeão Mão Veloz, atirador de charutinhos de repolho, assassinado cruelmente por um palestino mal alimentado. Abbdul conseguia arremessar quibes a uma distância de mais de 20 metros, sem errar o alvo, geralmente o prato dos fregueses do restaurante, que aplaudiam freneticamente e dobravam a gorjeta.

DEREK MOSTELLO - PROVADOR DE SUPOSITÓRIOS, ITÁLIA, 1952. Mostello nasceu, literalmente, de cu pra Lua. Foi por isso que conseguiu quebrar a marca mundial de prova de supositório estabelecida por Mallavich Grevnik, búlgara que provou mais de 15 supositórios de menta e hortelã em dez minutos. Derek morreu pobre, no anonimato, como provador de Buscopan na veia, depois de uma carreira meteórica. Bundinha de Prata, como é conhecido até hoje, tem uma estátua de bronze na praça de sua cidade natal, Palermo, naturalmente, de bunda pra Lua.

GRETA PATRÍCIA MOREL - AJUDADORA DE VELHINHAS, BRASIL, 1964. Ajudar velhinha a

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RAIMUNDO GUAXININ - CAÇADOR, BRASIL, 1948. Poucos homens tiveram uma vida tão agitada quanto a de Raimundo. Para aumentar sua renda como jogador profissional de boxa, tornou-se caçador de pacas e tatus. Duas vezes campeão olímpico, atirador do mais alto nível, boxeur, ex-catador de papel.

SOLDA é escritor, humorista e cartunista. cartunistasolda.blogspot.com


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Ensai� Fotográfic�

Um viandante DiCo KrEmEr

J

ulio Covello é um viandante. Em amplo sentido. Percorreu, tenaz e paulatinamente, longo caminho para se fixar em sua profissão. Deslocou-se no espaço e o tempo o fez chegar àquilo de que mais gostava: a ordenação das coisas (objetos, pessoas, situações) num determinado espaço. Primeiro a diagramação, a programação visual, depois a fotografia. Da sua Curitiba natal ao Rio de Janeiro entre 1967 e 1973. Lá foi diagramador do Jornal do Commércio no tempo do Aloysio Biondi. A técnica era ainda mista, chumbo e off-set. Volta para Curitiba em 1974 para fazer o mesmo trabalho no jornal O Estado do

são paulo

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Paraná. Mas a composição no branco do papel não o atraía. O enquadramento pela objetiva, a formação de uma imagem latente que depois da revelação do negativo, da prova contato para a escolha da imagem e a cópia final é que o interessava. De câmera em punho fugia com a reportagem do jornal e em noites de folga, qual alma penada, saía na perseguição do enquadramento preciso. E foi a fotografia de uma carroça em rua com pouca luz que, por contraste, iluminou-lhe a trilha a seguir. Teve que esperar algum tempo para voltar ao caminho da escrita com as luzes. Depois de passagem como laboratorista da agência de publicidade Exclam começa a fotografar para

a imprensa: revista Quem, jornal Correio de Notícias, e vários clientes da empresa Conexão que fundou com os fotógrafos Alberto Viana e Ivan Bueno. E viaja muito como free lancer para o JB, Veja, Isto É, Valor Econômico, campanhas políticas, sindicatos. Do interior segue para o exterior. Viagem por um rio do Paraguai, vai ao Peru, Europa em 1988 e 1994, Cuba em 1997 e Estados Unidos em 2006. Ao lado do fotojonalismo os seus olhos estão atentos ao que se passa ao redor e essa é a sua viagem. E é neste exercício de olhar, na persistente busca de um ordenamento das formas que a arte de Julio Covello mais objetivamente se manifesta.


Friedrichstrasse - Berlin

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Mario Quintana - Curitiba

Usina - Cuba

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MoMA - New York

Karl Marx und Friedrich Engels Platz - Berlin

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Berlin

Squatter - Berlin

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Ana Teresa Londres

O shortinho carioca

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ra década de 70, eu tinha 25 anos e dois filhos. Havia me mudado para um apartamento na Avenida Iguaçu, terceiro andar sem elevador, o que não era problema para mim naquela época. O playground, situado nos fundos do prédio, era o ponto alto do imóvel. Apesar das escadas, carrinho de bebê para um, bicicletinha para outro, eu estava muito animada com a possibilidade de não precisar sair à rua para as crianças brincarem. Elas podiam apanhar um pouco de sol ali mesmo, ao ar livre. Carioca precisa de sol. Em Curitiba, devido ao clima, as crianças ficavam muito enfurnadas em casa, e as mães, naquela época, tinham medo de sair com elas ao menor ventinho. Desde que não estivesse chovendo, eu sempre passeava com os meus filhos. Era verão, janeiro, e o calor estava intenso. Eu morava nesta cidade havia quatro anos e ainda não tinha captado o modo de pensar curitibano. Todas as manhãs, vestia um short, e descia para o parquinho com as crianças. O clima estava sempre abafado, ali não ventava e parte do chão era de cimento, o que aumentava o calor. Fiz amizade com algumas mães e achava um pouco

estranho o fato de todas vestirem calças jeans naquele forno, mas nunca questionei o porquê daquela indumentária inapropriada, a meu ver. Certo dia, uma vizinha de porta veio me dizer que eu estava sendo mal falada no condomínio. Fiquei intrigada e perguntei o motivo, muito inocentemente. Para minha surpresa, eram os meus shorts. Eu olhei bem para ela e não respondi. É óbvio que por dentro fiquei rindo e não cobri as pernas. Acho que o comentário partiu do marido desta moça. Se estivesse sozinho, ele fingia não me ver ao cruzar comigo nas escadas. Outra vizinha levava suas duas filhas gêmeas para o Jardim de Infância a pé. Aquele mesmo senhor conduzia seu filho de carro para a mesma escola, no mesmo horário, mas não podia dar carona para uma senhora casada, apesar das três crianças como testemunhas no carro. O que a vizinhança iria pensar? Dois anos antes, outros fatos já haviam me surpreendido. Eu ainda não tinha filhos e morava no centro. As aulas da faculdade eram diurnas, e duas vezes na semana, à noite, eu estudava inglês num curso que ficava na Praça Osório. Naquela época não havia perigo em andar sozinha na região central após o anoitecer. Meu curso terminava às nove e meia, eu

atravessava a praça, subia a Rua Ermelino de Leão, em menos de dez minutos já estava em casa. Aí, outra vizinha veio com o seguinte comentário: “Eu acho que você não deveria vir sozinha do teu curso”. Como não via o perigo, não entendi o motivo. Fiquei quase sem ação quando ela me disse: “Mulher casada não anda sozinha na rua à noite”. No mesmo ano, meus colegas de faculdade vinham até minha casa para estudarmos e fazermos trabalhos em grupo. Era muito prático. Eu morava no centro e não havia ninguém em casa para incomodar. Meu marido estava trabalhando e podíamos estudar sossegados. Só um detalhe, os grupos eram de quatro alunos e montados por ordem alfabética. No meu, a única presença feminina era a minha. Pois esta mesma vizinha um dia me perguntou como o meu marido permitia que eu ficasse em casa a sós com três homens. Quanta imaginação!

AnA teresA londres é colunista da Revista Ideias.

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Perfil

U    Alvaro Silva, presidente da Sociedade Treze de Maio, o primeiro clube formado por negros no Brasil, conta a história de 122 anos da casa S C F E R

uando surgiu a ideia de fazer um texto resgatando a história da Sociedade Treze de Maio, o primeiro clube formado por negros no Brasil, achei a pauta superinteressante. Sempre gostei dessas matérias que resgatam a história de um povo. E para a minha surpresa todos com quem eu comentava sobre a matéria falavam maravilhas das festas que aconteciam no lugar. Logo imaginei um clube estruturado, com toda sua história preservada. Mas, infelizmente, para a minha surpresa o cenário que encontrei foi bem diferente. Quando cheguei para a entrevista que havia marcado com Alvaro Silva, presidente da Treze, ele estava sozinho. Seu escritório, que funciona no próprio clube, era simples. O único livro que vi foi um grande, de capa preta, que reunia as atas de todas as reuniões que já haviam realizado, desde a sua fundação. Apesar disso, não encontrei nada que revelasse a história e curiosidades do local. O clube me pareceu abandonado. O presidente também não se mostrou muito animado porque realmente sabia pouco do clube, apesar de seu pai ter administrado o local por 40 anos e ele estar no cargo desde 1997. O que ele sabia era que o clube era o mais antigo do país, acabava de completar 122 anos de história e foi criado para dar suporte para escravos recém-libertos pela Lei Áurea. “Aqui os negros encontravam uma ajuda para entrar no mercado de trabalho, irem para outras regiões, abrigo para dormirem e até dinheiro

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para problemas de saúde”, contou Alvaro. No tempo de maior representatividade da Treze, 300 sócios movimentavam o local, se reuniam para as festas e comemorações e também para tomar decisões de como continuar ajudando os negros recém-libertos. “Com o tempo os sócios foram se desligando, alguns morreram e as famílias deixaram de frequentar o clube, outros apenas pararam de vir. Hoje nosso número de associados não passa de 30”, conta o presidente, com olhar cabisbaixo. Mas, há três anos, um grupo de jovens procura reerguer o local. Para isso, eles realizam tradicionais festas, na tentativa de atrair cada vez mais pessoas. Começaram com a chamada ‘Domingueira’, que privilegia o samba de raiz. A festa começa a tarde, reunindo mais de 100 pessoas da terceira idade, que contam com o auxílio de um professor de dança para animar ainda mais o baile. A noite é a vez dos jovens, a maioria universitários, que se divertem com a música. “Nós disponibilizamos poucas mesas e cadeiras justamente para o povo dançar. Esse é nosso principal objetivo nestas festas”, afirma. Após observarem que estavam agradando o público, resolveram estender as festas por todo final de semana, acrescentando além do samba, o pagode e o forró. “Se não fosse o interesse desses jovens neste lugar, acho que a minha querida Treze já teria fechado as portas”, lamenta. “Pelos nossos planos ainda temos muito trabalho pela frente para que a Treze volte a ter a imponência e a importância que tinha antigamente. Hoje estamos buscando recursos com a prefeitura, que já nos ajudou em 2002 financiando uma reforma que fizemos no salão, mas pretendemos ampliar ainda mais nossos trabalhos, sempre voltado para os negros, resgatar nossas raízes e nossa cultura e para isso precisamos de mais ajuda”, complementa Alvaro. O presidente também lamenta a falta de interesse das Organizações não governamentais (ONGs) e dos grupos de auxílio aos negros em se unir ao Clube. “Ninguém nunca nos procu-

rou. Tive apenas uma oportunidade de conversar com um desses grupos, mas eles foram categóricos em afirmar que só nos dariam apoio se o local fosse restringido apenas aos negros. Não acho isso certo. Na minha opinião isso é uma maneira de racismo, de preconceito, mesmo porque os jovens que nos ajudam, que lutam diariamente conosco para reerguer este lugar são, na sua maioria, brancos. Mas apesar disso, temos juntado esforços simplesmente para que essa casa exista”, indigna-se o presidente.

RESGATE DAS ORIGENS O dia 13 de maio é um dia de festa para a sociedade de mesmo nome. Este ano, a data celebrou os 122 anos de existência da casa, fundada em 1889, e os 123 anos da abolição da escravidão com o tema “A resistência e a arte estão no negro, e a força e o sangue em todos os irmãos”. A ideia era resgatar as tradições e reunir toda a comunidade, não importando sua origem. As comemorações começaram com uma missa na Igreja Nossa Senhora do Rosário, conhecida anteriormente como Nossa Senhora do Rosário dos Pretos de São Benedito. Ela foi a terceira igreja construída em Curitiba e foi erguida graças ao trabalho dos negros mas mudou seu nome após a abolição da escravatura. No final da celebração, um cortejo de Maracatu conduziu todos os participantes à Sociedade 13 de Maio. Lá a festa começou com a bateria de samba da Treze, seguido por grupo de capoeira, teatro e uma sessão solene em homenagem à velha guarda. Após essa sessão, bandas de forró, pagode e rodas de samba animaram os 400 frequentadores, madrugada adentro. junho de 2011 |

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Especia�

O legado tropicalista de Wilson Bueno MarCio REnaTo DoS SanToS

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ilson Bueno tropicalizou Curitiba, o Paraná, o Brasil. Mais do que apenas um escritor, e ele foi – e é – um dos nomes de destaque da ficção contemporânea, esse sujeito irrequieto soube, como poucos, dialogar com autores e culturas variadas e ainda desenvolver uma linguagem radical. “O que me consola é que não guardo esperanças com relação a tudo o que vai aqui registrado. Já o disse em algum logar, e o digo de novo, e senão o disse, digo-o pela primeira vez – assim que me enfade o passatempo chinfrim, pico isto tudo em pedacinhos e o fragmento do fragmento jamais dirá o que foram as partes e muito menos ainda o todo.” O trecho, transcrito no parágrafo acima, está na página 21 de Amar-te a ti nem sei se com carícias (Planeta, 2004), obra na qual Bueno recria a dicção de Machado de Assis. O escritor paranaense conhecia a tradição. Poderia, como demonstrou em diversas oportunidades, reproduzir outras vozes marcantes do universo literário. De Machado a Guimarães Rosa, de Lewis Carroll a Franz Kafka: Bueno bebeu em muitas fontes, mas nunca se contentou em andar por caminhos percorridos anteriormente.

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“Nessa história de preguiçosos, o mais interessante não são os preguiçosos, mormente do sexo masculino, mas uma preguiçosa ou para ser mais exato – uma deusa preguiçosa.” O fragmento foi retirado de A Copista de Kafka (Planeta, 2007), obra que pode ser lida como um livro de contos, uma novela ou até como um romance. Essa fluidez ou drible nos limites e definições dos gêneros literários é um dos pontos centrais da produção artística de Bueno. Entre a direita e a esquerda, ele optou pela terceira margem do rio. Ou, para ser mais claro, Bueno não queria explicar, e sim confundir. Na realidade, o autor de Bolero´s Bar (Travessa dos Editores, 2007) queria mesmo era seduzir. Ele até flertou, mesmo que minimamente, com o discurso linear, mas a sua bossa era no desvio, no ziguezague, na curva e no aparente nonsense – aparente porque Bueno, mesmo com personagens animalescos, entre outros recursos inventivos, tratava desse assombro permanente que é a realidade. O projeto literário de Bueno pode ser definido a partir do título de um livro de Roland Barthes: O prazer do texto. Isso mesmo. O ficcionista de Jaguapitã que se radicou em Curitiba buscava o som ainda não dito, mesmo que fosse para dizer o mais do mesmo. “Voar será sempre um exagero de predestinação, um acessório supérfluo,

um luxo, e a notável convicção de que aí more – de vez – a poesia.” Ouviu? Escutou o canto de Bueno? Prosa mais do que refinada? Ou a mágica da poesia? De desbunde em desbunde, Bueno caetaneou. O tropicalista paranaense soube colocar em prática o texto odara que Caetano Veloso canta em “O Quereres”: “Onde queres o ato, eu sou o espírito/ E onde queres ternura, eu sou tesão/ Onde queres o livre, decassílabo/ E onde buscas o anjo, sou mulher/ Onde queres prazer, sou o que dói/ E onde queres tortura, mansidão/ Onde queres um lar, revolução/ E onde queres bandido, sou herói.” Quando o mundo exigia a linha reta, ele se assumia barroco. Se o obrigatório era o horário comercial, Bueno dormia para acordar diante do por do sol e, pela noite e madrugada acesa, tecer a ficção que, vista agora um ano depois de seu desaparecimento, evidencia uma profissão-de-fé segundo a qual a beleza, e somente ela, pode salvar o mundo.

marCio rEnaTo dos sanTos é escritor. minda-au.blogspot.com


O coração selvagem de Bueno

Maria Angela biscaia

Marianna Camargo

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onheci Wilson Bueno em um tempo que havia um mar de ideias, de pensamentos, catarse coletiva de neurônios. Parecia que tudo fazia sentido. O time era de craques. Observar o que acontecia já era uma experiência e tanto. Bueno tinha uma postura transgressora em uma cidade completamente retrógrada e provinciana. Quantos espantos ele causava. Quantas possibilidades inventava por ser do jeito que era. Bueno não apenas discutia, mas escancarava. Tudo nele era excesso, fase em que a boemia tomou conta. Até no jeito de se vestir, quando aos tropeços conseguia parecer um dândi. Quem mais poderia ser assim? Foi neste ambiente que observei as frestas do que poderia ser plausível, neste mundo que pulsava. O oposto do que acontecia no plano das ideias carregadas de mofo. Neste respiro descobri algo que nunca mais deixei: meu gosto pelo que é transgressor, pelo subversivo, pelo que ninguém mostra. Foi este universo que construí aos poucos, aos trancos, ao dissabor de dores e medos, mas que era possível. Caminho mais difícil, porém revelador. Aprendi nesse processo algo que acredi-

to que esteja ligado com uma íntima aliança com o que construímos pela estrada, e outro poeta, Ferreira Gullar, fala muito bem, que é não ser dogmático. Permitir-se mudar de ideia, de partido, de religião. Afiar o senso crítico. O que faz repensar, reinventar, não acomodar. Mais, essa abertura permite não carregar ideologias engessadas, mas opiniões. Que podem mudar a qualquer momento. Como bem escreveu Jorge Luis Borges: “Não te rendas. A masmorra é escura, a firme trama é de incessante ferro, porém em algum canto de teu encerro pode haver um descuido, a rachadura”. É esse descuido que absolve, ilumina. Seguimos intuitivamente essa fresta, assim como lobos enxergam no escuro. Assim também, sem perceber, trilhamos um caminho, às vezes mais longo, com percalços, outras vezes mais lineares e silenciosos. Porém, seguimos adiante. No plano cerebral, desviamos das tempestades, nos protegemos embaixo das marquises até passar a chuva e abrir de novo o céu. Na margem oposta está o medo, e nada acontece se não atravessarmos a ponte. Atenção ao vento veloz que sopra segundos antes. Por razões desconhecidas e misteriosas, o porto seguro está muito mais ligado à emoção

e ao que realmente somos e fazemos. O medo é o outro lado do rio. Superá-lo ou renegá-lo é de certa maneira não reconhecê-lo, não atravessar a ponte. Os medos são a soma de tudo que somos nós. E Bueno carregava seus medos como quem faz disso seu íntimo, seu estado mais profundo. Medo em estado bruto. Talvez por isso tenha feito uma opção de escrita mais selvagem, transgressora e intensa. Prefiro assim, a intensidade dos instantes em cada pausa, em cada silêncio, em cada palavra, como poema. O coração selvagem entrega assim sua fúria, com toda a delicadeza da cicatriz. A arte, diz Gullar, é necessária porque a vida não é o suficiente. Bueno sabia disso como ninguém.

Marianna Camargo é jornalista. mariannacamargo.blogspot.com junho de 2011 |

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livros

Prateleir�

o velho e rude esporte bretão

lavoura arCaiCa

raduan Nassar

por Dico Kremer

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esporte e eu temos nossas desavenças. E não por culpa dele. Nadei quando criança e adolescente e voltei a nadar depois de, digamos, maduro. A psoríase me proibiu. Tive breve passagem pelo tênis mas o que se poderia dizer, caridosamente, é que eu “não tinha jeito para a coisa.” Sempre esportes individuais, os coletivos me causavam e causam horror. O próximo muito próximo. Dentre eles o odioso futebol. Mas, curioso, li alguns livros sobre o tema: “O negro no futebol brasileiro” de Mário Filho, “1970, a copa e a crise do futebol brasileiro” de Carlos Alberto Pessôa e Walmor Marcelino – ganho do amigo Carlos Alberto – e “A pátria em chuteiras” do Nelson Rodrigues. Sociologia, livro de amigo e, claro, Nelson Rodrigues, a arte de bem escrever. Agora, 2011 A.D., tenho o prazer de ler do escriba (e fariseu ?) Carlos Alberto Pessôa o seu “O velho e rude esporte bretão”. É sobre futebol e não é. Ou melhor, é prosa da melhor lavra que tem como leitmotiv o futebol em seu amplo senso. Abrange um sem número de aspectos: técnicas de ataque e defesa, críticas e elogios a dirigentes, técnicos e jogadores, situação física de estádios, parte financeira do esporte, anedotas, casos e causos isso tudo e muito mais com verve, bom humor e bom gosto. E as citações !!! Vão de Peter Drucker a Aristóteles, de Guimarães Rosa a Camões, de Borges a Eça, de Roberto Campos a Fukuyama, e Giuseppe Verdi, Calder, Shakespeare, Al Capone, Mon-

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lavoura arcaica, de Raduan Nassar, é um dos livros mais bonitos que existem. leitura obrigatória para aprimorar a escrita, a essência, o estado bruto das coisas que chamamos pelo nome delas. amor, família, raiva, paixão, obsessão, dores. Raduan Nassar nasceu em pindorama, são paulo. escreveu apenas lavoura arcaica (1975), um copo de cólera (1978) e Menina a caminho (1980). porém, lavoura arcaica é arrebatador e de longe o melhor que escreveu. Nassar desistiu da literatura para criar galinhas em sua fazenda no interior de são paulo. por este motivo foi comparado a Rimbaud, que abandonou a escrita para viver como mercenário na África.

teiro Lobato, a “besta do Marx”, Hegel, Tocqueville, Donne, etc, etc. Recheado de humor o texto é uma viagem atemporal. E para valorizar o “conteúdo” (para citar uma palavra muito em voga há alguns anos atrás quando de nossas discussões sobre arte) encontramos uma belíssima forma, uma diagramação criativa bolada por Guilherme Zamoner com caixas altas e baixas e negritos. A colocação de fotografias e gravuras pontua com precisão e delicadeza o texto. É um prazer a leitura deste livro com seu estilo preciso, conciso e algumas vezes debochado, com doses generosas de humor e com o conhecimento daquilo de que fala pois, antes, analisou, praticou o que para muitas pessoas é tarefa hercúlea: a arte de pensar. Carlos Alberto Pessôa é um craque. Tirou, como dizem, de letra. o VelHo e RuDe espoRTe BReTão carlos alberto pessôa Travessa dos editores - 2011

Mesmo tendo escrito pouco, as palavras da sua obra são tudo o que poderia existir como literatura. cito um dos trechos mais comoventes e precisos do seu livro: “ o tempo, o tempo, esse algoz às vezes suave, às vezes mais terrível, demônio absoluto conferindo qualidade a todas as coisas, é ele ainda hoje e sempre quem decide e por isso a quem me curvo cheio de medo e erguido em suspense me perguntando qual o momento, o momento preciso da transposição? que instante, que instante terrível é esse que marca o salto? que massa de vento, que fundo de espaço concorrem para levar ao limite? o limite em que as coisas já desprovidas de vibração deixam de ser simplesmente vida na corrente do dia a dia para ser vida nos subterrâneos da memória;” (Mc) laVouRa aRcaIca Raduan Nassar - companhia das letras (1975, 1982, 1989) o diretor luiz Fernando carvalho adaptou o livro de Raduan Nassar, lavoura arcaica, para o cinema em 2001. Realizado sem um roteiro prévio, carvalho fez questão de utilizar o livro como fonte primária de todas as falas do filme. a trilha sonora foi realizada pelo compositor Marco antônio guimarães, líder do uakti. a música utiliza temas típicos da música árabe e faz uma citação d’a paixão segundo são Mateus de Bach. a direção de fotografia é de Walter carvalho, a direção de arte é de Yurica Yamasaki e os figurinos de Beth Filipecki. o filme foi sucesso de crítica no Brasil e no exterior, tendo recebido mais de 25 prêmios em diversas categorias de festivais e mostras nacionais e internacionais. No elenco, Raul cortez, selton Mello, Juliana carneiro da cunha, simone spoladore, leonardo Medeiros, caio Blat, Denise Del Vecchio, entre outros. (Mc) laVouRa aRcaIca Filme - Brasil, 2001, 163 min


exposições

Museu Oscar Niemeyer recebe Carlos Motta

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té 28 de agosto, o Museu Oscar Niemeyer (MON), em Curitiba, está com uma ex­posição com mais de cem peças assinadas por Carlos Motta. Com curadoria e museologia de Consuelo Cornelsen, da Planeta Brasil, a mostra faz uma retrospectiva da vida do artista. “Mostraremos a obra do Carlos Motta marceneiro, designer e arquiteto, como uma forma de retratar os diferentes períodos da vida desse grande artista e toda a sua versatilidade”, adianta Consuelo, que também é produtora executiva da exposição. Com mais de 35 anos de trabalho em projeto e execução de móveis, objetos e arquitetura, Motta diz que o que norteia o trabalho é a criação de objetos utilitários, que satisfaçam a necessidade das pessoas, sem nunca esquecer que o belo e longevo sempre devem estar

O feminino na obra de João Turin

João Turin

lide multimidia

presentes na peça final. Além disso, acredita que como profissional deve ter a responsabilidade e consciência para propor um trabalho e uma maneira de vida que cause o menor dano possível ao local onde vivemos. “A natureza é generosa, e muito nos tem oferecido. Mas nosso planeta está cansado, exaurido. Temos a obrigação de reconsiderar

Memórias em construção Criado em 1876 e reconhecido como o terceiro museu público mais antigo do Brasil, o Museu Paranaense inaugurou uma mostra que celebra sua história. Composta por objetos, documentos, fotos e quadros, “Memórias e Narrativas em Construção” apresenta os fundadores e alguns de momentos mais significativos da instituição, como a participação em Feiras Nacionais e Internacionais do final do século XIX, as primeiras aquisições do acervo, a sistematização dos setores científicos e a produção de artigos e outras publicações, além de fotos de Curitiba durante os anos da trajetória do Museu Paranaense. SERVIÇO “Memórias e Narrativas em Construção” Local: Museu Paranaense (Rua Kellers, 289) Até 4 de julho de 2011

o que é importante e vital para o homem. Propor um design objetivo, básico. Desvincular a felicidade do bem material”. SERVIÇO CARLOS MOTTA Local: Museu Oscar Niemeyer Até 28/08/11, das 10h às 18h Entrada: R$ 4 (inteira) e R$ 2 (meia)

El Mar em Buenos Aires

Nilo Biazzetto Neto

O fotógrafo curitibano, Nilo Biazzetto Neto, foi convidado para expor no Espacio de Arte La Paz, uma conceituada galeria de arte argentina, localizada no charmoso bairro da Recoleta. A mostra, intitulada El Mar, é resultado de mais de 500 imagens dos mares do Caribe e do Mediterrâneo na costa da Espanha, ambos de língua espanhola, capturadas entre 2010 e 2011. Esta será a 1ª exposição internacional de Nilo, fruto de incentivo do fotógrafo paulistano André Cypriano. Serviço Rua Azcuenaga 1739 pb “B”, Bueno Aires – Argentina Saiba mais : www.lapazespaciodearte.com.ar

“O feminino na obra de João Turin”, com desenhos até hoje nunca expostos ao público, estão expostos na Casa João Turin. A exposição é composta por 13 desenhos, sendo nove em nanquim e quatro em aquarela. Completam a mostra quatro esculturas do artista paranaense que remetem ao universo da mulher. O público terá a oportunidade de conferir obras em que o artista aborda a própria visão acerca do feminino. Em alguns desses trabalhos, Turin fez o desenho em nanquim e acentuou os traços com leves pinceladas de água, formando sombras de diferentes tonalidades. “Os visitantes poderão conferir um momento bastante expressivo da obra do artista”, diz Elizabete Turin, diretora do espaço. Os retratos, feitos em papel, são baixos relevos que mostram a feminilidade da mulher da primeira metade do século passado. Elas não possuem registro da data de realização. As esculturas também expostas foram realizadas em bronze e gesso. SERVIÇO Local: Casa João Turin (Rua Mateus Leme, 38. Curitiba). Data: de 6/5/11 a 31/7/11. Informações: (41) 3223-1182. Entrada gratuita.

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Ciro Correia França

Amigos de Fé

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enho inveja dos homens e das mulheres de fé, seja qual for a fé que professem. Do alto da sua compreensão meus bem-aventurados amigos de fé observam-me, penalizados, a arrastar as frustrações de pagão pela vida afora, certos do fim dantesco que me espera: — Perto do fogaréu do inferno isso aqui é fichinha, cara!, leio em seus piedosos olhos. Irrecusável por princípio, a solidariedade desses amigos só faz acrescentar mais uma às minhas adversidades: a de achar palavras de recusa que não soem desdenhosas à amizade com que me honram e tampouco à fé que professam. Com benevolência fraterna ensinam-me como salvar o meu corpo e, iniciando-me nos mistérios da fé, pretendem exonerar a alma, que supõem que eu tenha - de purgar castigo eterno nas profundas do inferno. — Custa muito – indagam-me os peregrinos - você percorrer o Caminho do Sol, (uma senda em meio à caatinga nordestina, lá onde o diabo perdeu as botas) e procurar o padre Inácio, cujas curas assombrosas só podem ser explicadas como milagres?! E como negar à esposa do amigo que me imponha as mãos, numa fervorosa manobra japonesa chamada de reiki, que me livrará do tumor? Ou como impedir minha mulher e filhas de levarem-me ao consultório itinerante de uma índia (que pilota a 200 km/h uma camioneta Ranger de luxo, sempre caçada por exercício ilegal da medicina) se essa aborígene, em troca de míseros 300 reais, me dará três pacotes de uma salvadora argila que esfregada na minha paleta vai pulverizar a doença que se encerra em meu peito? Com quais palavras negar-me ao tratamento mágico da auto-hemoterapia, indicado pelo amigo bem-intencionado que me diz ter recuperado com ele, em poucas horas, trezentas mil das suas plaquetas? — Tenha fé... recomenda-me, com voz grave. Ah! E os espiritualistas? Como fazer ouvidos moucos aos apelos desses beneméritos que resgatam para o nosso convívio o ectoplásmico dr. Fritz (sempre ele!), esculápio alemão desencarnado antes de Fleming ter descoberto a penicilina, mas que incorporado no ponta-esquerda do time de futebol de areia de Antonina receita num patoá arrevezado, com forte sotaque teutão, mezinhas capazes de implodir até o caroço de mil abacates, que dirá um carocinho

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mixuruca como o meu!? Sem falar nas cirurgias incríveis que realiza, valendo-se apenas de uma torquês enferrujada e de um chumaço de estopa! — Custa tentar, custa!? E os adeptos da magia negra (vade retro!)? Esses, com um brilho sádico nos olhos, querem convencer-me de que se eu esquartejar e beber o sangue de um bode preto em cima de um túmulo hebreu receberei em troca a cura imediata! Os esportistas? Esses atletas asseguram-me que se eu nadar todos os dias 18 mil metros no estilo butterfly e, à tarde trotar 45 quilômetros no Parque Barigui, ganharei saúde olímpica e força equina, e diagnosticam: — Esse sedentarismo ainda vai acabar te matando!!! Alguns camaradas esotéricos fitam-me – hélas! - com olhos de bagre morto e com voz cava sussurram a palavra mágica que eu julgava conhecer: “resiliência”. Essa palavra bem sonante, soprada ao pé do meu ouvido em tom de quem divide com você um segredo insuspeitado da física universal, parece guardar a fórmula secretíssima do Bálsamo de Ferrabraz, que será a minha redenção. Embora eu insista em querer saber o exato alcance do cabalístico vocábulo, apenas repetem-no: “resiliência...resiliência...”, como se me oferecessem a chave que me fecharia o corpo para todos os males. Recorro então ao meu novo Aurélio atrás do significado do termo: Resiliência - “[Do ingl. Resilience.] S.F. 1. Fis. Propriedade pela qual a energia armazenada em um corpo deformado é devolvida quando cessa a tensão causadora duma deformação elástica. 2. Fig. Resistência ao choque”. Interpretado o verbete e posto em português prático, tem-se que, se metais com resiliência fossem utilizados nos automóveis, esses retomariam imediatamente as suas formas originais depois de submetidos àquelas prensas de ferro-velho. Pretendem os que me sopram a palavra que eu me torne um desses personagens indestrutíveis de filmes bélicos de ficção futurista, que espedaçados por um tiro de bazuca no esôfago, imediatamente se refazem do estrago causado e pigarreiam faceiros. Ah! E os predestinados espaciais! Esses sorriem superiores quando eu descarto sem mais essa nem aquela a possibilidade de ser abduzido por um óvni e curado! É preciso que você acredite que não estamos sós, insistem, apontando-me a infinita abóbada celeste. — Posso tentar interferir... me diz um deles

que afirma manter estreitas ligações com alienígenas marumbinistas e que já passou pela sideral experiência mais vezes do que o trem de Paranaguá passou pela estação de Morretes. Apresentaram-me também a um cultor de Aristóteles que recomendou-me a esclarecedora leitura da obra do notável filósofo grego, que descobriu, entre outras coisas de embasbacar, que os testículos servem como contrapeso para manter o pênis em ereção, como no sistema da balança romana. (Esse Aristóteles tinha cada uma! - penso comigo...) Há ainda aqueles que querem fazer-me crer em conjunções astrais, favoráveis tanto ao corte de cabelo quanto à cura de qualquer mal... Outros querem dar uma mãozinha também, como os quiromantes, os leitores do tarô etc... Por falar nisso, procurando o significado de um nome caí outro dia num desses sites ocultistas*, que também explica a origem dos nomes próprios. A pesquisa estava aberta no prenome da minha médica e aproveitei para ler. Lá estava o seu significado: “Princesa”. Hummm... Tem fundamento, pensei. E continuei a ler: “Pessoa muito séria e com grande honestidade no meio profissional, busca a perfeição em tudo e se aborrece quando as coisas não saem conforme o planejado. Reflete muito antes de agir e quando toma uma decisão é capaz de mergulhar de cabeça no que está fazendo e esquecer todo o resto à sua volta. É atraída por assuntos ligados à saúde e adaptar-se-ia muito bem ao trabalhar nessa área...” Não poderiam ter acertado mais em cheio. Prossegui lendo... “Não se familiariza com encontros sociais preferindo sempre atividades que exijam concentração. [...] Nunca age com a intenção de impressionar e por isso só participa de conversas quando está embasada na sua observação e na sua cuidadosa análise. [...] Dificilmente confia na opinião de alguém...” Gulp! Na mosca de novo! Assustado com o acerto do diabo da coisa, decidi não ler mais nada, com medo de tornar-me um adepto de arcanos e outros bichos.

Ciro Correia França colunista da Revista Ideias.


Izabel Campana

Encontro marcado com Fernando SaBino

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á alguns meses escrevo aqui crônicas sobre aquilo que me vem à telha. Mas neste mês, nada me veio à telha e comecei a buscar um tema, um acontecimento quotidiano qualquer, uma inspiração em leituras passadas. Busquei alguns autores de que gosto e que costumam fazer movimentar a cuca no que chamam de inspiração. Foi nessa busca que dei de cara com texto de Fernando Sabino, em que começava por descrever exatamente essa mesma sensação. Ele não sabia por onde começar sua última crônica. A leitura me remeteu a episódio de infância que, penso eu, talvez renda uma crônica. Fernando Sabino foi meu primeiro autor favorito. Eu tinha o quê? Uns 11 ou 12 anos quando li pela primeira vez uma de suas crônicas na escola. Nessa época, o Colégio Anjo da Guarda imprimia umas apostilas com capa azul marinho e cheiro de mimeógrafo – lembrança esta que acusa o avanço da idade. As apostilas de Língua Portuguesa vinham recheadas de pedaços de histórias. Desde os primeiros fragmentos de texto, apaixonou-me a escrita de Sabino. Ainda não compreen-

do porque a gente nunca lia um livro todo, ou mesmo um texto todo. Talvez a intenção das professoras fosse mesmo a de gerar curiosidade. Uma única crônica seguida de exercícios textuais. Interpretação e gramática. Mas eu queria ler mais. Cheguei a casa e busquei nas estantes da biblioteca livros que já sabia que lá estariam. Tinha, e ainda tenho, mania de ir à biblioteca e olhar os livros. Leio os títulos e os autores. Outro dia mesmo, Neide, que faz a faxina do meu apartamento, me encontrou em casa assim, sentada em um banquinho admirando minha biblioteca. Perguntou se eu tinha algum problema. Senti no tom de voz que essa minha mania não é lá muito normal. Voltando ao que interessa, fui à biblioteca atrás dos Fernando-Sabinos que sabia que encontraria. Achei o “Deixa o Alfredo falar” e ri em voz alta lendo aquelas crônicas. Lembro como se fosse hoje o quanto me divertiam. Das crônicas que li na infância, a história do homem nu que busca o jornal no corredor era uma das minhas preferidas. Por conta dessa paixão, um dia fui conhecer meu autor predileto em uma livraria. Lembro de entrar, levada pela mão de meu pai, por um

labirinto de estantes cinzentas de metal, até o local do encontro marcado com meu ídolo. E lá estava o senhor de cara simpática. Nessa época, eu era pura timidez. Pedir objeto qualquer em loja era um martírio. Então fiquei só olhando para ele, em admiração. Tão incrível esse momento e eu queria sumir de vergonha. Não lembro o que ele me disse, só me lembro do sorriso caloroso que me deu. Ganhei também um livro autografado que guardo e releio até hoje. Mais tarde, recebi de Sabino um fax com um autógrafo e uma carinha feliz. O fax se apagou com o tempo e nosso encontro não foi mais do que um sorriso. Um bocado piegas, eu sei, mas mais do que um autógrafo, um fax ou um livro, o que Fernando Sabino me deu foi essa primeira experiência de fascínio por um texto e o gosto eterno pela literatura.

iZabEl CamPana é advogada

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Tendência

C:       Na contramão das cervejas industriais, que investem milhões em publicidade, quem ganha espaço na capital paranaense são as cervejas especiais T K

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Os curitibanos, conhecidos como padrão de exigência e qualidade em todos os quesitos, não ficaram fora dessa. Não é à toa que, de acordo com Junqueira, já existem sete microcervejarias em Curitiba e Região Metropolitana: Asgard, Bier Hoff, Bodebrown, Gauden Bier, Klein Bier, Way Beer e Wesnky Beer. As cervejas, além de serem aprovadas e bem consumidas, já conquistaram prêmios nacionais. Confira.

BEERVANGELIZAÇÃO “Não importa o tamanho da panela para fazer cerveja boa”. É assim que Junqueira define a produção da bebida. Para ele, o foco está nas propriedades da cerveja. Junqueira conta que com um fogão industrial ou fogareiro, três panelas – sendo, pelo menos, duas com torneira – e dois queimadores já é possível fabricar cerveja artesanal. Foi em janeiro do ano passado que Junqueira começou a fazer cerveja em casa: a Junka Beer. A vontade surgiu depois de ganhar de aniversário uma garrafa de cerveja artesanal. Para Junqueira, Curitiba é “a nova Meca da cerveja”. Ao perceber como o público tem acolhido a cerveja artesanal, sente ainda maior a

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uritiba, de quatro anos para cá, tem sido vista como uma das capitais que mais produzem cervejas artesanais. O mercado, pouco conhecido, tem cada vez mais produtos feitos no Estado. E os curitibanos aderiram à novidade. Antes, tomar uma cervejinha eram duas opções: a clara ou a escura. Hoje é comum ouvir sobre tipos de cerveja, “ale, brown, weiss”. Diferentes marcas e nomes vêm conquistando espaço. Caldo de Bituca, Cerveja do Amor e Perigosa são novidade por aqui. Além de um novo mercado, existe um novo hábito e modo de vida. Em janeiro deste ano foi fundada a Associação dos Cervejeiros Artesanais do Paraná (ACERVA-PR). Com menos de seis meses de existência, já conta com quase 100 pessoas. O movimento existe há mais de dois anos, mas a oficialização da entidade ocorreu agora em 2011, como conta André Junqueira, cervejeiro e presidente da Associação. “Foi o momento de criar a associação e envolver os cervejeiros artesanais e as microcervejarias. A regulamentação é cruel para cervejarias e temos como objetivo buscar uma diferenciação, uma equalização”, relata.


CERVEJA DE PANELA Do consumo próprio a 60 pontos de venda no Paraná e em Santa Catarina. Da cerveja produzida na panela em casa à produção de 50 mil litros mensais. Foi assim a trajetória da empresária Suelen Presser, que há cinco anos começou a produzir cerveja em casa para consumo próprio e para os amigos de cobaia, como define. “O bom da cerveja de panela é que serve como um ‘lubrificante social’”, completa. A iniciativa do experimento iniciou quando a empresária e o marido, também cervejeiro, Henrique Presser passaram a comprar cervejas diferentes e, assim, despertaram o gosto por cerveja artesanal. Este foi o passo inicial para o surgimento da microcervejaria Klein Bier, em Campo Largo, Região Metropolitana de Curitiba. Após uma pesquisa de mercado, o casal resolveu investir. O passatempo de Suelen e do marido virou negócio. Ambos largaram seus empregos para tocar a cervejaria. “Foi difícil largar meu trabalho na indústria pesqueira. Eram duas paixões: o mar e a cerveja. Foi um desafio. Um investimento tão alto que tinha que dar certo”, relata. A Klein produz cinco diferentes estilos de cerveja. A Pielsen, mais tradicional, garante metade da produção, a outra metade fica com as especiais. São elas: a Tchec, que é uma pielsen da República Tcheca; a Brownale, que leva cinco diferentes tipos de malte e um dos lúpulos mais caros do mundo; a Stout, estilo irlandês com malte torrado e lúpulo de amargor; e a Weiss, que é a cerveja de trigo. Suelen acredita que o público está absorvendo a cultura cervejeira. Segundo a empresária, uma prova disto é a grande aceitação dos bares em ter chopp especial. “O mercado está com sede de cerveja especial, que está ganhando espaço entre marcas conhecidas, como Heineken e Brahma”, exemplifica. Ela conta que tanto produtor quanto público ganham com a entrada de novas cervejarias. “Vende-se mais quando se pode escolher”, afirma. Motivo de orgulho para Suelen é a cerveja

ARQUIVO PESSOAL

necessidade de divulgar esta arte. “É a ‘beervangelização’: ensinar a cultura de cerveja de alta qualidade”, defende. O cervejeiro enfatiza a importância da revolução da cultura cervejeira: “precisa-se tirar a cerveja do status de marginalização. É a revolução versus a ignorância”.

André Junqueira: “Não importa o tamanho da panela para fazer cerveja boa” junho de 2011 |

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VALTERCI SANTOS

A beer sommelier Carolina Tedesco Fiorani se reúne com amigas na Confraria do Esmalte para degustar cervejas especiais

CONFRARIA DO ESMALTE “As cervejas artesanais produzidas no Paraná não deixam a desejar para as cervejas internacionais”, afirma a beer sommelier Carolina Tedesco Fiorani. Carolina, que é dona da Mercearia Coralina, vende no seu estabelecimento 40 marcas de cervejas artesanais de todo o Brasil – metade é de Curitiba. Ela explica que o público cervejeiro gosta de consumir cerveja de qualidade e de degustar a bebida. “Existe uma ideia errada de que cerveja é para se beber até encher a cara. Não, você pode apreciar, degustar. Tem cerveja que equivale a uma refeição”, conta e exemplifica mostrando uma cerveja fabricada com três tipos de grãos. Assim como Junqueira, Carolina também defende a promoção da cultura cervejeira. “As pessoas estão se abrindo para as cervejas especiais, mas é um trabalho de formiguinha”, analisa. Os clientes da mercearia já aderiram a esta cultura e, a partir da metade do ano, poderão apreciar a cerveja que Carolina irá produzir com outra beer sommelier. Carolina conta que as mulheres têm se destacado como consumidoras de cerveja especial. Tanto que, há dois anos, ela e mais cinco mulheres se encontram uma vez por mês para degustar cervejas e fazer a harmonização com pratos de comida ou petiscos. “É a Confraria do Esmalte e só entra quem é convidada”, garante. PRÊMIOS Os prêmios conquistados pelos cervejeiros do Estado comprovam a qualidade das cervejas artesanais paranaenses. Elas não agradam apenas o circuito cervejeiro local. Ultrapassaram as fronteiras do Paraná e garantem espaço no cenário nacional. Em 2008, o cervejeiro Edigyl Pupo, de Imbituva, criador da De Bora Bier, levou o prêmio na categoria English India Pale Ale (IPA) no 3º Concurso Nacional de Cervejas Artesanais, re62

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alizado em Belo Horizonte. Já no ano passado, foi a vez da cerveja de Junqueira, da Junka Beer. Ele foi campeão da categoria Oktoberfest/Märzen no 5º Concurso Nacional de Cervejas Artesanais, em Porto Alegre. Ainda em 2010, outra cerveja local foi premiada. A São Seba foi a vencedora do concurso Mestre Cervejeiro da Eisenbahn. Hoje os seus três criadores têm a marca Ogre Bier e a cerveja de malte defumado (Rauchbier) Caldo de Bituca é a menina dos olhos da marca. Neste ano, o Paraná continua no holofote cervejeiro. A cervejaria Way Beer, de Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, teve a sua American Pale Ale (APA) eleita como a melhor Pale Ale do país pela revista masculina Maxim.

CERVEJARIA-ESCOLA A microcervejaria Bodebrown, sediada em Curitiba, é pioneira: tem a primeira cervejaria-escola do país, como conta um dos cervejeiros da marca, Paulo de Tarso Cavalcanti. A escola ministra oficinas para Cervejeiro Caseiro, de Técnicas Cervejeiras Específicas, de Propagação de Levedura e de Degustação e Harmonização. Os cursos podem ter duração de um fim de semana até uma semana, dependendo do módulo escolhido. A cervejaria-escola tem capacidade para atender 25 alunos por turma. Em 2010, segundo Cavalcanti, 170 pessoas passaram por ali. “A procura é muito grande. Sempre tem lista de espera. Mal acaba uma turma e já têm interessados para a próxima”, relata. Além do conhecimento, a Bodebrown compartilha com os microcervejeiros a oportunidade de utilizar as máquinas da fábrica para que eles façam a sua receita. A cervejaria-escola da Bodebrown

CONSUMIDOR O ilustrador Bruno Hoffmann Junior consome cerveja artesanal há oito anos. O interesse surgiu quando a cervejaria catarinense Eisenbahn chegou ao mercado. “Meus amigos já apreciavam cerveja especial, então uma coisa levou a outra”, conta. Hoffmann revela que quase não bebe mais a cerveja pielsen comercial, dá preferência para a artesanal. Para Hoffmann, este movimento em torno da cerveja artesanal está apenas no início. “É pouca cerveja para muita gente. Não só os bares devem comprar a ideia desta ‘revolução’, mas o público também, para correr atrás e produzir sua própria bebida”, analisa. Ele explica que não fabrica cerveja em casa por falta de espaço, não de vontade. Como consumidor de cerveja especial, Hoffmann não ficou de fora da 2ª edição do Beer Day, realizado em Curitiba no dia 13 de

MAICO ANTONIO RIBEIRO

brown ale da marca. É a primeira cerveja deste tipo no Brasil. “Nós que fizemos o registro no Ministério da Agricultura”, conta.

existe desde 2008, mesmo ano do surgimento da marca. A comercialização das bebidas só começou no fim do ano passado. A Bodebrown também tem uma loja de insumos e acessórios, onde os cervejeiros podem comprar equipamentos e matéria-prima.

Suelen Presser trocou de paixão: o mar pela cerveja. Hoje comanda a produção de 50 mil litros mensais da bebida


SERVIÇO Confira alguns lugares onde você pode consumir cerveja artesanal de várias marcas e estilos em Curitiba. Asgard Rua Brigadeiro Franco, 3388 – Rebouças Cervejaria da Vila Rua Mateus Leme, 2631 – Centro Cívico

RAFAEL DAVID

Clube do Malte Rua Desembargador Motta, 2200 – Centro Mercearia Coralina Rua Desembargador Hugo Simas, 862 – Bom Retiro Mestre Cervejeiro Rua Cel. Dulcídio, 775 – loja 3 – Batel

A cervejaria-escola da Bodebrown, a primeira do país, tem fila de espera para atender a todos os interessados na arte de fazer cerveja

fevereiro deste ano. O evento reuniu mais de 2,2 mil pessoas sedentas por cerveja especial. Mais de cinco mil litros de cerveja foram consumidos. Uma oportunidade e tanto para os apreciadores

que puderam escolher entre cerca de 100 rótulos disponíveis de cervejas dos mais variados estilos, oriundas de Curitiba e outras cidades do Paraná e também de outros estados e países.

Ele acredita que um evento como este é fundamental. “Promove o encontro de quem gosta, além de reunir os produtores, que podem trocar receitas e técnicas”, finaliza.

GLOSSÁRIO CERVEJEIRO Cervejas artesanais são aquelas produzidas de forma caseira. Mesmo quando microcervejarias utilizam equipamentos modernos e engarrafam suas bebidas, são consideras cervejarias artesanais devido ao cuidado com a produção – desde os ingredientes até a receita e o modo de preparo. Cervejas especiais são produzidas com certa diferenciação se comparada com as cervejas comerciais. Geralmente, as cervejas artesanais e as importadas são consideradas como especiais. Elas são fabricadas com matéria-prima de melhor qualidade e com maior cuidado na fabricação.

STOCKXCHNG

Os estilos de cerveja são, geralmente, divididos em duas famílias: Ale e Lager. A principal diferença entre elas é o tipo de fermentação. Ales são cervejas de alta fermentação ou fermentação quente (geralmente entre 15 e 24ºC) que destaca os sabores mais complexos – maltados e lupulados – deste tipo de cerveja. Elas são mais vigorosas e encorpadas. Suas características são variadas, podendo ser doces ou amargas, claras ou escuras.

Temperatura ideal para degustar: 3 a 5ºC Alguns tipos de cerveja da família Ale: Weizenbier, Kölsch, Belgian Pale Ale, Strong Ale, Bière Brut, Weizenbock, Stout. Lagers são as cervejas de baixa fermentação ou fermentação a frio (de 6 a 12ºC). A graduação alcoólica é, geralmente, entre 4 e 5%. Seu tipo mais conhecido é a Pilsener, criada no século XIX na cidade de Pilsen, região da Boêmia da República Tcheca. Temperatura ideal para degustar: 2 a 4ºC Alguns tipos de cerveja da família Lager: Pilsen, Amber Lager, Oktoberfest, Rauchbier, Schwarzbier, Vienna, Bock. Existem também as cervejas do tipo Lambic que, segundo a maioria dos especialistas, é classificada como uma terceira categoria, separado das Ale e Larger por causa da sua fermentação, que é espontânea. Esse tipo de cerveja é feita de trigo e não são adicionadas leveduras no mosto, os agentes naturais são os responsáveis pela fermentação. É um tipo peculiar de cerveja e possui uma extensa gama de aromas, que vão do frutado, como framboesa, cereja ou banana, ao cítrico, como vinho branco ou vinagre. É o tipo de cerveja mais antigo do mundo. junho de 2011 |

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Luiz Carlos Zanoni

O mestre de vinhos de Rondon

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Dico Kremer

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seus conhecimentos em viticultura, vinificação e comércio são testados à exaustão. Uma pedreira. Além de milhares de horas de estudo, conta a experiência prática. As provas às cegas, relata Vianna Junior, eram o teste mais desafiador. Servida a taça, o candidato tinha

Dico Kremer

ra com certeiros joelhaços no baixo ventre dos pacientes que o analista de Bagé tratava desajustes e aflições emocionais. O divertido personagem foi criado por Luís Fernando Veríssimo nos idos de 80, época na qual os consultórios de psicoterapeutas viraram coqueluche. Hoje, como a moda anda mais para adegas do que para divãs, imaginar um Master of Wines de Marechal Cândido Rondon, no sudoeste do Paraná, pode parecer uma caricatura do que já havia sido a caricatura do bajeense típico. Acontece que a vida imita a arte. O MW de Rondon não pertence ao reino da ficção. Ele existe, é operante, chama-se Dirceu Vianna Junior, e foi à custa de muita ralação que conquistou um dos mais cobiçados títulos do mundo dos vinhos. A prova concreta disso tudo acaba de chegar às prateleiras, o livro em que compartilha vivências e conhecimentos. Vianna Junior trocou a cidade natal por Curitiba ainda muito jovem. Estudou no Colégio Paranaense, depois no Cefet e na Universidade Federal do Paraná, mas não chegou a completar o curso de economia. Interrompeu-o para em 1989 viver um período em Londres, onde, trabalhando em restaurantes, começou a se interessar pela enologia. Em 1997, diplomado pela Wine and Spirits Education Trust, conceituada escola inglesa de vinhos, já ocupava cargo de direção na importadora Coe Vintners, tendo como função visitar produtores nos mais diferentes países para conferir safras e lançamentos. A experiência aí acumulada (chegava a provar 500 vinhos por semana) o estimulou a obter o título de Master of Wines, ou MW para os íntimos. Essa graduação, atribuída pelo Institute of Master of Wines de Londres, é com certeza a mais ambicionada entre os profissionais. Para se habilitar à inscrição, o candidato deve antes ter trabalhado no mínimo cinco anos na área e cumprir programa educacional de 28 meses. Só então começa a maratona de provas, sempre no mês de junho, ao longo de cinco anos, onde

de identificar uvas usadas, safra, região de origem, métodos de vinificação e qualidades. Foi um calvário, mas valeu. Em 2008, Vianna Junior recebia um título exclusivo de apenas 280 pessoas no mundo, ascendendo ao mesmo plano de figurões como Jancins Robinson e Steven Spurrier. Tornou-se o primeiro (e ainda único) MW da América Latina, um título que traz vantagens concretas. Os raros possuidores são disputados a peso de ouro pelas empresas. Dá prestígio tê-los no quadro funcional. Vianna Junior continua na Coe Vintners, em Londres, cidade que considera o grande centro mundial do comércio de vinhos. O livro que lançou, Conheça Vinhos, foi escrito em conjunto com o jornalista José Ivan Santos, propondo um abrangente tour pelos vinhedos e adegas, com preciosas informações aos apreciadores. Quem não encontrar nas livrarias pode pedir diretamente no portal da editora, a Senac. Nosso MW vem regularmente a Curitiba, ocasiões em que se torna objeto de disputa das confrarias locais de vinhos. Ele acha que o consumidor brasileiro é maltratado. Certos rótulos para cá exportados simplesmente não chegam às mesas europeias, pela baixa qualidade. E os preços praticados são absurdos quando comparados aos dos países de origem, embora, neste particular, veja uma exceção em vinhos oriundos da Argentina e Chile. Gosta do que as bodegas Lagarde, Norton, O’Fournier, Concha y Toro e Santa Carolina produzem. E garante que o melhor tinto nacional que provou foi o Merlot Terroir 2004, da Miolo. Vianna Junior costuma passar os fins de ano em Rondon, com familiares. Sempre leva um Tempranillo espanhol jovem e vibrante para acompanhar o porco no rolete, prato tradicional da região.

LUIZ CARLOS ZANONI é jornalista e apreciador de vinhos


Jussara Voss

Celso Freire: uma lição

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Na pia Começou quando a profissão tinha zero de status. Como tinha certeza de que não queria as carreiras clássicas, sobrou o curso que era novidade, economia, e a dúvida: a cozinha seria apenas um hobby? Já empregado em uma multinacional, leu sobre a abertura do primeiro hotel cinco estrelas na capital e a oferta de trabalho. Foi lá na hora do almoço e contou sua história para o espanhol José Serra Masso, o chef do local. No dia seguinte, lavando pratos no Bourbon, viu que jamais ficaria em paz longe de uma cozinha. Pouco tempo depois, tendo passado por todos os setores e acompanhado a criação do Business Club, foi mandado embora. Buscar mais formação e conhecer o trabalho de outros profissionais foi o presente de Masso ao jovem, além da base clássica. Assim, desembarcou em São Paulo para trabalhar com Giancarlo Bolla, do La Tambouille. Numa sucessão de boas oportunidades, chegou em Londres, recém casado, para comandar a ativa cozinha da embaixada brasileira. Na volta, antes de abrir o Boulevard, mais um tempo em São Paulo, desta vez com o craque Laurent Suaudeau. Parece que a sorte estava ao seu lado. “As oportunidades aparecem para quem sabe o que quer e se dedica para alcançar um sonho”, diz Freire, com sabedoria. O melhor chef de Curitiba por quatro vezes consecutivas da revista Veja, entre outros prêmios, suou para alcançar o posto e a fama. Levou tempo. “A melhor escola ainda é a cozinha. Hoje, todo mundo tem pressa.

terroir, como já fez tempos atrás, é um deles. Aonde iria? Conhecer o fenômeno Juan Mari Arzak, em San Sebastián, no país basco, para um superintensivo. Talvez. “Precisamos aprender sempre”, diz com humildade. Eu aposto que ganharíamos muito com essa escolha. Depois de 20 anos no mesmo lugar, talvez, esteja mesmo precisando voltar à cozinha, porque nós esperamos novos sabores de quem sempre soube dominar as panelas.

divulgação

omo listar os melhores restaurantes de Curitiba e deixar Celso Freire de fora? Quem leu o caderno especial da revista no mês passado, com uma relação dos melhores chefs da cidade, pode ter feito essa pergunta. Sem dúvidas, ele deixou um rastro na cozinha curitibana. Por isso, na boca pequena, corre o “antes e depois de Celso Freire”. Não estou exagerando. Pode não ser unanimidade, mas é impossível negar o seu legado. Na década de 1990, fez alta gastronomia na provinciana capital paranaen­se. Comida que já vinha servida no prato da cozinha era desconhecida aqui. Com poucos restaurantes na cidade, dois ou três apenas, ele mostrou seu talento e a técnica aperfeiçoada no exterior e com os chefs italianos e franceses que desembarcavam em São Paulo para tocar casas que seriam reconhecidas em solo brasileiro. Autoditada, aprendeu na prática e nos livros.

Faz um curso de um ano e sai achando que é chef. O médico se forma depois da residência. É preciso paciência e perseverança”, desafia.

Boulevard Pelo seu Boulevard, projeto erguido em parceria com o cunhado em 1990, passaram quase todos os chefs que hoje estão nas principais cozinhas da cidade. Durante certo tempo foi a escola de gastronomia que a cidade não tinha. Freire aprendeu olhando a cozinheira da casa dos pais, a Guega, e prestou-lhe uma homenagem no último ano em que esteve à frente de um restaurante. Depois dos tempos de glória, ele viu sua casa perder a clientela, mesmo com uma reforma audaciosa que não sustentou o local. A capital tomava outros contornos e novas opções começavam a aparecer. A fama de ser uma casa muito cara e a exigência da presença do chef em tempo integral podem ter sido os motivos, vai saber. Assim o Guega surgiu, vinha com a proposta de resgatar os sabores que despertaram no jovem o desejo de cozinhar. Comida caseira, pratos fartos e preços mais camaradas começaram a trazer movimento para o local. Infelizmente, não durou muito e um desacerto na administração entre os sócios acabou com o restaurante. Recomeçando Mas engana-se quem pensa que Celso Freire se acomodou. O cozinheiro de espírito irrequieto faz planos, porque sabe que não consegue ficar longe do fogão, mas os guarda em segredo. Foi assim desde que decidiu por em prova a dúvida se queria mesmo ser um cozinheiro profissional. Passar um tempo aprendendo em uma cozinha autoral e de

Sem restaurante Sem restaurante, não entrou na lista da “Ideias para comer”. Atualmente, é sócio do Zea Maïs, mas não se atreve a entrar na cozinha só de mulheres que ele mesmo criou, com suas pupilas. Dá aulas nas principais escolas da cidade e palestras, onde for convidado, porque gosta de ensinar. Além de participar, ou promover eventos importantes, como o Gastronomia Responsável, que estimula o uso de ingredientes orgânicos e cuidados esperados dos cozinheiros do século XXI, o Gastronomix, a feira gastronômica do Festival de Teatro de Curitiba, ou o programa que tenta melhorar a comida servida nos hospitais da Pontifícia Universidade Católica (PUCPR), dentre outros. Herança Não parar de estudar, procurar os livros dos chefs com os quais se identifica, ler os clássicos e trabalhar muito são os seus conselhos para quem quer ser cozinheiro. “Também tem que conhecer os fornecedores”, diz, repetindo uma provocação que faz aos seus alunos. “Vocês conhecem bem a melhor manicure, ou o melhor mecânico, mas sabem quem é o melhor fornecedor de peixe, ou o açougueiro? É preciso estabelecer uma relação de proximidade com o fornecedor da comida e respeitar a época dos ingredientes”, ensina, lembrando que é imprescindível conhecer a história. “A cozinha deve resgatar os valores tradicionais, do lugar e da família, mas com o jeito do cozinheiro. Não é só fazer o que os outros querem”, afirma, com a responsabilidade de orientar. A filha mais velha segue o mesmo caminho do pai e carrega o peso de ser filha de quem é. Conheço essa história.

Jussara voss é jornalista junho de 2011 |

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Camilla Inojosa

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ntem eu estava aqui. Amanhã, não mais. Antes de ontem eu afirmava que você, Brasília querida seria minha cidade, para sempre. Hoje decidi ir embora. Não, não é você. Não se culpe, por favor. O problema sou eu. Só eu. Você me acolheu na sua imensidão, como acolhe a todos. Eu te admirei e admiro. Você tem o céu mais bonito que já vi. Todos os dias quando desfilo nas suas ruas, quando avisto a Praça dos Três Poderes sorrio e penso, sempre e todas às vezes: que lindo. Você não sabe o que significou para mim a sua acolhida, a magnitude de trabalhar na Capital Federal. Os seus grandes e enormes Tribunais. Você exala trabalho, direito. É Supremo, é superior. É Brasília. Lembra como no começo você se fez de difícil? Quem te conhece há de se lembrar. O lugar mais estranho do Brasil. A capital mais silenciosa do mundo. A sensação de: o que estou fazendo aqui? A magia de se perder nas tesourinhas. A imensidão. O perto que não chega nunca. É pertinho, ó! Tá vendo, a gente tem que chegar ali, naquela bola. Vira aqui, olha, a bola tá ali, aqui, não, ué. Eita, a bola ficou para trás. É isso que você faz com as pessoas. Mas depois você dá chances. Avista-se e se sabe mais ou menos como chegar. E depois você se rende, desvenda os seus mistérios, deixa escapar que a bola é na verdade o Museu Nacional.

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POSSO DIZER QUE HOJE JÁ TENHO SAUDADES. AMANHÃ TEREI BOAS LEMBRANÇAS. AS RUINS, ESQUECEREI E juntos damos risadas. Você se torna acessível sem ser óbvia. Da raiva, passa-se ao amor. Você é assim, Brasília querida. Com seus encantos e seus mistérios. Encantos cinza, encantos de concreto, desenhados sob um céu único. Até o seu clima é acolhedor. Pode não ser para todos, mas para mim, é excelente. Não, não se culpe. Você é seca sim. Mas não deixa de ser doce. E chora quando precisa, após o coro das cigarras. Essa é você.

Não é por isso que fiz essa opção, juro. Não se culpe também por servir de abrigo para aqueles que não te merecem. Você foi criada para isso, eles é que devem ter vergonha. Defenderei a sua honra quando te igualarem a eles. Prometo. Mas não quero falar sobre eles. São assunto dos noticiários. O povo não se lembra, não enxerga. Você sabe que isso me irrita, mas, não é hora. Vamos falar de nós. Peço que me entenda. Quando fiz a escolha era para sempre. Você foi objeto da minha admiração. E agora eu escolhi deixá-la. Mas sem deixar de te amar. Vou assim, sem conseguir definir meus sentimentos. Vou porque decidi. Vou voltar para o meu Recife. Não. Não peça que eu faça comparações. É para os tolos. Amarei cada uma a sua maneira. Mas posso dizer que hoje já tenho saudades. Amanhã terei saudades e lembranças. Boas lembranças. As ruins, esquecerei. Não se culpe. O problema sou eu. Foi perfeito enquanto durou. Vou lembrar de você. Todas as noites. Todos os dias.

CAMILLA INOJOSA é colunista.


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Claudia Wasilewski

Selo de qualidade para os homens

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efendo há mui­to tempo a criação de um selo. As mulheres precisam ser mais solidárias. Colocar as cartas na mesa e contar os prós e contras de ex-maridos e ex-namorados. Seriam dois selos. “Já peguei e recomendo”. “Caia fora que é fria”. Coisa simples e honesta. Chega de blá, blá, blá. Já fui taxada de fofoqueira pela proposta. Não sou. Só que o que não é bom para mim pode ser excelente para outra. O que custa abrir o jogo? É muito difícil encontrar uma mulher que assuma a culpa pelo fim de um relacionamento. Conheço mulheres e homens que mereciam ter o cérebro estudado. Fico matutando como conseguem manter a mente sã, convivendo com todo tipo de humilhações e críticas. Sem falar em violência. Se acomodaram na situação ruim ou acabaram acreditando que são péssimos. Voltando ao selo. Fico imaginando a conversa correndo solta, sem ciúme ou inveja. Mais ou menos assim: — Vai lá querida. Quando ele quiser assistir Fórmula 1 na madrugada, não faça como eu. Faça uma surpresa. Deixe um pacotinho de pão de queijo com um bilhete desejando boa sorte para o Felipe Massa. Pensar que acabei com meu casamento por causa da corrida na Malásia. Ele era ótimo, mas não aguentava o Galvão Bueno na calada da noite. Isto é o cúmulo da sinceridade. O que custa?

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Nada. “Mulheres do mundo, uni-vos”. Estamos no século XXI. Eu já dei muitos selos de qualidade para ex-namorados. Parece que não me levaram a sério porque tem um rapaz ainda solto por aí. Para uma mulher mais quieta seria ótimo, ele fala muito. Quando digo muito, é bem mais que eu. Estes dias minha amiga/irmã Lara Sfair me mandou três vídeos argentinos de propaganda de chocolate. Na tela ia aparecendo o grau de satisfação da moça através de uma barra de chocolate. À medida que agradava a barra virtual era completada. Em um deles o rapaz chega a um restaurante chiquérrimo com a moça. Escolhe o melhor vinho. O melhor prato. E a barrinha ficando marrom, só faltando um quadradinho para ficar completa. Eis que chega a conta. Ele divide por dois e dá o valor da parte dela. Pronto! O chocolate some. Eita bola fora. Baseadas na avaliação do chocolate, Lara e eu estamos estudando seriamente criar o A.A.V., um Aparelho de Avaliação Virtual. A ideia é criar uma rede de mulheres comprometidas com a mais absoluta verdade. O aparelho obviamente será no formato de chocolate, já que é um grande amigo das mulheres, principalmente nas piores horas. As perguntas serão claras e diretas para uma avaliação simples. Como gentileza, pontualidade, higiene, pegada, etc... As respostas transmitidas em tempo real e em rede serão o grande facilitador para destinação dos selos. Se a avaliação der Godiva, considerado o

melhor chocolate do mundo ou o Belga Lindt, ótimo. Caso dê achocolatado barato, é o fim. Afinal não dá para ficar na base dos ex, ainda mais quando a vida e o tempo não foram favoráveis a muitos deles. Outro aspecto é que a partir da industrialização e venda dos aparelhos os homens irão tomar mais cuidado em inúmeros pontos. Ninguém vai aceitar o “Caia fora que é fria”. Com certeza coisas esquecidas como flores, presentes voltarão à moda. Estão vendo como o A.A.V é tudo de bom? Globalização é isto. Só nos falta uma investidora de peso. Não acredito que a corporação masculina invista um centavo. Não sei bem se inclusão digital caberia no nosso projeto. Mas não custa enviar para o Ministério das Comunicações. Claro que aos cuidados do “Comunicativo Ministro Paulo Bernardo”. É de cunho social, e não pensem que a ideia é ficarmos trilhardárias. Não. Por enquanto não pensamos nisto. Queremos um mundo feliz. O resto é consequência. P.S. – Quem tiver um nome melhor para o aparelho, pode enviar e-mail para clauwas@gmail.com .

Claudia Wasilewski é empresária e cronista da Revista Ideias. claudiawas.blogspot.com


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João Caldas

ISABELA FRANÇA

A cantora Anna Toledo, conhecida dos palcos curitibanos e há alguns anos atuando em SP no casting de musicais da Broadway, deu dois dias de canja de música brasileira no bar cubano-brasileiro Esperanto, no coração do East Village, em Nova York. Ana passou uma semana na Big Apple, após apresentações em Ohio. Ao lado da jornalista e atriz Simone Delgado, da coreógrafa Carmen Jorge, do Ballet Guaíra, do diretor artístico da Cia. de Dança Streb, Fábio Tavares, deu um show no fim de semana de 14 e 15 de maio.

Sidney Axelrud e Adalberto Scherer, leia-se Cibraco, estão por conta da comercialização para todo o Paraná do mais novo must have imobiliário da costa catarinense: complexo Txai Ganchos, resort com 130 estúdios, bangalôs, apartamentos e casas, em Governador Celso Ramos. O empreendimento do grupo Cipasa e BHG deverá estar pronto em 30 meses e já tem 26 unidades vendidas. Com opções de metragem entre 160 e 800 metros quadrados, a unidade mais modesta custa a bagatela de R$ 3 milhões.

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MELAGRIÃO

R$3 milhões


Studio Marco Aurelio

BACK HOME O executivo

Olho mágico

divulgação

O produtor Carlos Deiró fez questão de receber o autógrafo de Jaime Lerner, no lançamento do livro O que é ser urbanista (ou arquiteto de cidades), da série O que é ser, da Editora Record, em maio, em Curitiba. Na obra, em depoimento a Antonio Carlos Vaz, Lerner relata suas experiências pessoais e profissionais, muitas registradas pelos olhos mágicos do produtor e amigo Deiró.

Rodrigo Dienstmann, que já esteve no primeiro time da GVT e comandou o marketing nacional da Oi, acaba de assumir nova posição. Volta à Cisco do Brasil – onde já esteve entre seu período de GVT e Oi. Seu desafio na empresa é ampliar a fatia da empresa de segurança e soluções de tecnologia para empresas de médio porte, o grande nicho do mercado brasileiro e que Rodrigo domina como poucos. Apesar da mudança, o curitibano permanece no Rio de Janeiro, onde mora há quase três anos.

Bombordo Na primeira semana de junho, Corinna e Eduardo Souza Ramos reúnem amigos e esportistas para a primeira etapa da segunda temporada da Mitsubishi Sailing Cup. Nesta edição duas classes de veleiros dividem as raias de Ilhabela. A prova é a realização de um desejo antigo do casal que há mais de 20 anos pensava em trazer para o Brasil uma classe de barcos de oceano de última geração. Entre os velejadores participantes estão os melhores da América do Sul: Torben Grael, Gastão Brun, Francesco Bruni, Dee Smith e André Fonseca. Na Vela de Oceano, até cinco profissionais podem estar a bordo, oportunidade de mesclar grandes talentos das mais diversas classes, o que enriquece a disputa. O que atrai na Mitsubishi Sailing Cup é a possibilidade de competir com alguns dos melhores e mais preparados velejadores mundiais. A competição promete ser acirrada.

NA dIREÇÃO

Os produtores Silvio Cesar e Giovana Corrêa, que pilotam a Graphismo Broadcast & Film Production, estão com pique total. A produtora entra no segundo semestre com jobs do Grupo Positivo, Grupo Boticário, GVT, Electrolux, Rede de Farmácias Nissei, Masisa, entre outros. As produções de conteúdo, programas, publicidade e audiovisuais estão a todo vapor. Tudo sob o olhar atento de Silvio, diretor geral da Graphismo e de Giovana, gerente de operações. junho de 2011 |

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ISABELA FRANÇA

Pimientos divulgação

Os amantes da noite estão esperando ansiosos dois trabalhos que sairão em breve da prancheta do arquiteto Gastão Lima. Gastão está finalizando o projeto de remodelagem da casa noturna Warung, em Santa Catarina. Promete deixar o templo da música eletrônica do litoral sul ainda mais convidativo antes da chegada da temporada de verão. Já para a temporada de inverno da capital, em sociedade com o empresário espanhol Marcos Celdran, inaugura em junho o Txapela Herriko. Instalado num casarão secular na esquina das ruas Ébano Pereira e Saldanha Marinho, no centro de Curitiba, o Txapela trará a cultura do norte de Espanha, com um menu de tapas, croquetes, tortillas, jamón, frios, saladas e uma grande variedade de pintxos e montaditos, quentes e frios. A casa abrirá para almoço, happy hour e jantar.

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Corta frio

Kelly Knevels

Engana-se quem olha para a bela Heloísa Helena Follador e imagina que a moça com ares de bonequinha de luxo jamais entrou num ônibus. Sozinha, ela comanda uma frota com mais de uma centena deles. Diariamente acompanha da matriz da Viação Santa Clara, em Mafra, no Sul do Paraná, empresa do grupo Melissatur, uma operação de cerca de 20 horas diárias que transporta mais de 3 mil pessoas. Além disso, Heloísa ainda tem tempo para ações socioeducativas. É a maior propagadora do trabalho realizado num ônibus antigo transformado em consultório volante que vai até comunidades carentes para consultas e exames. Porém, seus olhos brilham quando conta o sucesso do projeto de diminuição do impacto ambiental implementado pela Santa Clara. Toda a água utilizada na garagem é reaproveitada. Uma horta mantida pelos colaboradores serve boa parte do cardápio do refeitório da empresa e os alunos das escolas públicas de Mafra são unânimes em afirmar que preferem o ônibus de passageiros às motocicletas poluentes – conforme aprendem nas palestras de conscientização da importância do transporte racional de pessoas ministradas na cidade. Nota dez para a bela.

arquivo pessoal

NA BOLEIA

Patrycia Coelho, sommelier e empresária à frente da loja de vinhos Grand Cru, anuncia um cardápio novo no wine bar pensado especialmente para o outono. Atento às combinações para os mais de 1,5 mil rótulos de vinhos, o chef Marcelo Chahad, responsável pelas novidades, criou a Bruschetta Peperoni – pão italiano, pasta pomodori, queijo masdam, peperoni e pimenta rosa – e outros aperitivos elaborados com o pão italiano. Patrycia também participou da criação e conta que a opção foi por ingredientes como berinjela, lombo defumado, pimenta e champignon para acompanhar o pão e tornar a harmonização certeira. Caldos e consomês prometem aquecer nos dias mais frios e cupcakes e profiteroles em inusitadas versões salgadas são o diferencial.


Karam

comemorando o campeonato da Superliga Feminina de Vôlei, vencido pelo Unilever, time comandado por Bernardinho. O casal é entusiasta do trabalho social do técnico e apoia com frequência os eventos do Instituto Compartilhar, idealizado por Bernardinho e sediado em Curitiba. No ano passado, a convite de Fahl Jr., Bernardinho dividiu o microfone com renomados palestrantes dos Estados Unidos e da Europa para uma plateia de mais de 200 dentistas brasileiros e estrangeiros e pôde apresentar o Instituto. Além de coordenar o Programa Esporte Cidadão no Paraná, o Instituto Compartilhar é responsável por um programa socioesportivo que atende a cerca de 5.800 crianças e adolescentes em cinco estados brasileiros (PR, SP, RJ, RS e RN). Complementando as ações esportivas, o Compartilhar inovou e ampliou sua abrangência criando um programa educacional que objetiva qualidade de vida e disseminação de conhecimento. Bernardinho faz questão de frisar que foi a forma encontrada para retribuir à sociedade o que o esporte fez por ele.

arquivo pessoal

RETRIBUIÇÃO Grace e Newton Fahl Jr. estão

Dois é bom Com a conta do shopping Patio

Batel encabeçando a carteira de clientes, as jornalistas Dani Brito e Sonia Marques acabam de apresentar ao mercado local de comunicação uma nova agência. A DAS Estratégias de Comunicação tem foco na mídia espontânea, gestão de redes sociais, curadoria, consultoria, reposicionamento de marca e relações públicas. Para isso trazem expertises distintas. Dani editou o Caderno Viver Bem, da Gazeta do Povo, por sete anos com atuação principalmente no jornalismo de comportamento, moda e beleza – atualmente participa do programa semanal Moda Básica do canal fechado ÓTV. Já Sonia atuou em veículos de imprensa, entre eles a TV Globo em Nova York, e nos últimos anos Sonia tem se dedicado à área de marketing e comunicação corporativa de grandes empresas como o Grupo Positivo.

QUEM CONTA É ZILdA FRALETTI BEM-CASAdOS

Iko Studio

O lateral do Lyon Michel Bastos e sua bela Letícia Wonsovicz estão em contagem regresssiva para o grande 11 de junho. O casal, que já vive na França há quatro anos, decidiu oficializar a união em grande estilo, na tradicional igreja Santa Terezinha, em Curitiba, com direito a festa de conto de fadas no Castelo do Batel. Quem cuidou de todos os detalhes – desde o traje dos noivos e familiares, passando pelos convites e decoração – foi Rossana Lazzarotto de Oliveira. Os 300 convidados, entre eles craques brasileiros e europeus, já receberam o convite que veio com um cartão magnético que deverá ser apresentado na entrada. A ambientação da festa será nas cores off white, cinza e rosa e o mobiliário foi inspirado na estilo neo-clássico da Maison Daslu, de São Paulo. Em férias de verão, o casal posou para fotografias, na Ilha do Mel. junho de 2011 |

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BALACOBACO

por Thais Kaniak

Os pais da noiva, Roberto Percy Isaacson e Andréa Isaacson, os noivos, Patrícia Isaacson e André Richa e os pais do noivo, Fernanda e Beto Richa

As bodas de André Richa e Patrícia Isaacson

O casamento de André Richa, 21, e Patrícia Isaacson, 20 anos, foi o acontecimento mais glamouroso da temporada. Luxo e bom gosto. Um toque de nobreza. Convidados da alta estirpe da política nacional ao lado de empresários de grosso calibre. Mulheres elegantíssimas. Perfume no ar. Tudo perfeito. Noite inesquecível. Mas nada empanou a beleza da noiva, a garbosa alegria do noivo, e a indisfarçável emoção dos pais Beto e Fernanda Richa. Patrícia Isaacson chegou à Igreja Santa Terezinha em um Rolls Royce. Linda. Em vestido clássico que remetia à década de 1950, Patrícia optou por look em tule de seda assinado pelo estilista Demi Queiroz e grinalda feita em Paris. Na mão direita, um anel de safira e brilhantes, chamava a atenção. Presente dos pais do noivo. Após a Igreja, os convidados foram recebidos em alto estilo, no Castelo Batel decorado por Jayme Bernardo. Mais de 30 mil rosas, orquídeas e tulipas. Arranjos de flores também compuseram a cena na pista de dança, que era de vidro.

Rogério Machado

Os noivos no altar e depois no Rolls Royce, a caminho da recepção no Castelo Batel

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Os tecidos que cobriam as paredes e toalhas da mesa eram italianos, da grife Fendi. Três salas de doces, mais de dez tipos de tortas, foram algumas das surpresas da recepção que foi marcada, em seu início, por queima de fogos. O ex-governador de São Paulo, José Serra, o presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra, o senador mineiro Aécio Neves, e o prefeito de Curitiba, Luciano Ducci, foram algumas das lideranças que circularam na festa.

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Fernanda e Beto Richa

Luciano e Marry Ducci, Fernanda e Beto Richa

José Serra cumprimenta os noivos

Patrícia chegou à igreja em um Rolls Royce. Linda. Em vestido clássico que remetia à década de 1950. Jaime Lerner cumprimenta André Richa

O governador Beto Richa, José Serra e o noivo, André Richa

Os noivos, André Richa e Patrícia Isaacson

Fernanda Richa, Ricardo Barros e Cida Borghetti

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BALACOBACO

por Thais Kaniak

Na brasa Francisco Urban. O bravo Chico. Recebeu os habitues de eventos gastronômicos da cidade para apresentar o novo menu preparado pela chef Eva dos Santos. Delícias que só a Eva sabe fazer. Na brasa, tudo na brasa. Sopa de tomate, caldo perfumado de mocotó, caldo de centolla. Vinagrete de ostra. Na brasa. Frutos do mar. Tudo na brasa. Vieiras. Camarões fantásticos. No ponto. Lula. Confesso que passei batida. Fui logo à Moqueca e me deliciei. Passei ao bacalhau. Divino. E não pude deixar de lado o bife de ancho. Feito na brasa.

Os jornalistas presentes no evento

Bem se vê que a temporada da Eva na Espanha foi de bom proveito. E tudo ficou melhor porque o paciente Chico Urban harmonizou o cardápio com belos vinhos. Chatêau Reynon Sauvignon Blanc 2009. Quinta da Bacalhôa Branco, 2007. Morgon Marcel Lapierre, 2009. Tinto Ânfora, 2006. Moscatel de Setúbal da Bacalhôa, 1998. Adorei, mas não tenho a pretensão de ir além deste registro, tantas eram as pessoas entendidas que agitavam suas taças, faziam profundas inspirações e completavam com uma observação daquelas. Procurei ouvir os que sabem. Do paciente Chico Urban ao sábio Zanoni. O empresário Francisco Urban, a chef Eva dos Santos e a equipe do Bistrô

A chef Eva dos Santos, que tem a admiração unânime da moçada da Ideias, mostrou que é especialíssima. Pena que nem todas as suas criações preparadas na brasa estejam no cardápio. Para fechar a degustação, sorvete de queijo na brasa. Adorei.

Lula na brasa

Julio Cesar Souza

“Gosto de vinhos, mas há idiotas demais agitando a taça, aspirando e falando bobagens sobre o que não entendem”

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Camarões na brasa com bernaise

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Moqueca de peixe na brasa

A chef Eva dos Santos e Chico Urban


Ali Chaim Filho, Esmeralda Silveira Chaim, o escritor e Ali Chaim

Nêgo Pessôa e Mário Celso Petraglia

Belmiro Valverde cumprimenta Nêgo

Nêgo ladeado pelo filho, Alexandre, e a bela nora, Ana Paula Batista

Nêgo e Denise de Camargo

O rude esporte bretão e o escritor de fino texto “O velho e rude esporte bretão” é o novo livro do Carlos Alberto Pessôa, Nêgo Pessôa, lançado em noite festiva que reuniu bípedes sem plumas de todas as tribos na Livraria Ghignone. Trata, é óbvio, de futebol. Mas vale um alerta para os desavisados. Mesmo os que não gostam de futebol terão imenso prazer ao ler 238 páginas de refinado texto muitas vezes usado para expressar opiniões ácidas e carregadas de calão. Pessôa, mesmo quando não concordamos com as suas ideias, é genial na maneira de defendê-las. Os desafetos que o digam. Sua teoria de que o técnico de futebol é uma figura absolutamente desnecessária bateu no fígado não só dos técnicos, mas de todos os que estão convencidos de que essa função é a mais importante para qualquer time. Imaginem a grita. Agora, leiam a frase do Pessôa sobre o assunto. É definitiva:

Nêgo entre os irmãos, Teresa e Miguel

Deiró também cumprimentou o autor

Sérgio Toscano e o autor

Luiz Groff, Nêgo Pessôa e Fábio Campana

Felipe de Souza

“Em equipe de craques, o treinador é supérfluo, em equipe de cabeças de bagre, inútil.”

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ÚLTIMAS DA MODA

por Tess Biscaia

Paris, inverno 2011/2012

Deu o que falar

A COLEçãO DE INVERNO 2011/2012 DA SEMANA DE MODA DE PARIS APRESENTOU ALGUMAS TENDêNCIAS PARA ESTA ESTAçãO. ANOTEM.

“Eu estou à venda. Não quero que minha marca morra comigo, quero passá-la adiante”, diz estilista Pierre Cardin, em comemoração aos 60 anos de sua grife, no dia 26 de abril em São Paulo. Aos 88 anos de idade, Pierre Cardin passou pela alta-costura, introduziu a moda unissex e criou peças icônicas inspiradas pelo cosmos. Sua grife hoje dá nome a roupas femininas e masculinas, acessórios, bebidas e alimentos.

The best of

LOUIS VUITTON CHANEL

O mais influente do ano

MAsCUlIno e FeMInIno Nos desfiles da Chanel e Louis Vuitton do inverno 2011/2012, os estilistas Karl Lagerfeld e Marc Jacobs, respectivamente, abusaram do hibridismo de peças feminina e masculina. Não se trata de composições “unissex”, mas limites bem marcados de roupas para homem e para mulher: saia com blazers masculinos, calças retas e sapatos baixos com blusa de renda, cintos bem marcados na cintura em camisas masculinas. stReetweAR A moda de rua tomou conta do desfile da Chanel nesta estação. Os clássicos tailleurs foram mixados com botas e tênis, o que deu um caráter mais urbano e rock’n’roll para a coleção, como bem frisou o badalado fotógrafo de moda Mario Testino. MetálICo Tecidos metálicos estão com tudo. A moda glam rock, em que David Bowie foi ícone na década de 70 como Ziggy Stardust, aparece em muitos desfiles. Do amarelo ao preto, o metálico voltou à cena. A grife Balmain foi uma das que apostou no brilho para a coleção desta temporada.

O norte-americano Tom Ford é o único estilista que integra a lista de 100 pessoas mais influentes do mundo em 2011, divulgada dia 21 de abril, pela revista “Time”.

Polêmico Galliano

BALMAIN

KATE MIDDLETON

O vestido longo, de cor marfim, mangas rendadas, que deixava entrever os ombros de Kate Middleton, tem 2,70 metros de cauda. Sob o véu, a noiva usou uma tiara de diamantes - emprestada pela rainha e dois delicados brincos de brilhantes. A peça foi desenhada por Sarah Burton, diretora de criação da grife fundada por Alexander McQueen, um ícone da moda britânica falecido no ano passado.

A diva

CABelos O gel voltou. O jeito certo é usar o gel nos cabelos bem lisos e presos. BoCA O batom vermelho estava na maioria dos desfiles da Semana de Moda. Não é tendência, é um clássico. GRACE KELLY

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Depois do lamentável episódio envolvendo o estilista da Dior, John Galliano, que declarou que “amava Hitler” e por este motivo foi despedido da direção criativa da marca, o último desfile criado por ele foi a sensação da temporada. O mundo da moda, em parte chocado, em parte curioso, assistiu ao deslumbrante desfile da Dior, sem a presença marcante e teatral do talentoso estilista. A equipe da Dior o representou na entrada final do desfile, porém o peso criativo de Galliano na marca fará falta.

Mcqueen

BRAnCo e PReto Não as duas cores juntas. O visual é monocromático. Todo branco ou todo preto, com matizes variadas.

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Um dos desfiles mais deslumbrantes da Semana de Moda de Paris foi da de Hermès. Apenas a entrada das modelos na passarela já valeu para quebrar a monotonia dos passos céleres e robóticos que imperam nos desfiles. A lentidão das modelos misturou-se com a preciosidade quase etérea das peças, cores e harmonia da marca. Em sua estreia na direção criativa da Hermès, Christophe Lemaire mostrou sintonia e criatividade, pois substitui ninguém menos que Jean Paul Gaultier. A sempre elegante e polêmica cantora Jane Birkin foi uma das personalidades que compareceu ao desfile da marca.

A mostra “Os Anos Grace Kelly”, aborda a juventude da belíssima atriz Grace Kelly na Filadélfia (EUA) até os compromissos oficiais já como princesa de Mônaco. Reúne 900 objetos pessoais da atriz, incluindo fotos, cartas e vídeos, sem esquecer das joias e vestidos que pertenceram a ela, como um vestido de tafetá que usou no dia em que conheceu o príncipe Rainier III de Mônaco. A exposição fica em cartaz até o dia 10 de julho no Museu de Arte Brasileira, da FAAP, em São Paulo.


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Jaime Lerner

O último tango

N

as tardes da Confiteria La Ideal, em Buenos Aires, os solitários se encontram em milongas onde dançam juntos histórias separadas. Como é triste o silêncio desses casais que mal se falam, no tango que dá o ritmo para que eles desenvolvam o trote de sua decadência. Aquele que saiu do trabalho no velho emprego; lá contínuo sem importância, aqui rei do salão. O galã barrigudo que investe com o ar decidido de um Valentino, enroscado nas pernas encobertas de uma velha que rebola suas curvas saudosas. Aquela de saia justíssima num corpo bem formado e decadente. O careca saudoso da brilhantina fustiga a baixinha tímida que quer se esconder no bandoleon. Eles dançam em posição oblíqua para voltear melhor, mais sérios que no seu próprio enterro. Ensaiam uma decadência gloriosa ao som da cantiga queixosa, às vezes saltitante para despertar o sonho dos que já parecem enterrados vivos. E continuam volteando a se despedir da realidade de uma vida cheia de desilusões.

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Aqui no piso gasto, ainda resistem e esperneiam nessa dança de estertores e olhares fixos nos espelhos que refletem um passado que já se foi. As mesas solitárias de lugares igualmente perdidos, a espera de um despertar cúmplice, soro para um último suspiro. Agora a música chora a missa de sétimo dia dos que celebram as confissões guardadas a chave nas gavetas mofadas com cheiro de maçãs. A voz em falsete entoa a canção dos mortos vivos alegres porque conseguiram acertar um passo. Um homem grande, muito grande, se debruça sobre uma criatura minúscula que parece mal sair do casulo para borboletear-se no salão. Que tímidos são os heróis obscuros de aventuras e conquistas temerárias. Quantas varizes aprisionadas nas teias de aranha da meia arrastão clamando pela liberdade. E o ritmo implacável do bandoleon ao prover a respiração que vai despertar esses corpos moribundos, com fortes perfumes para mascarar a carne que envelhece. Pobres sapatos a denunciar a decadência do galã que outrora calçava soberbo o sapato bicolor.

É feio o suspirar da decadência, o olhar envergonhado das tímidas funcionárias que no expediente tratam as unhas para melhor firmar suas farras de desespero. Mal termina uma música, os pares se despedem como se marcassem o ponto na repartição. Mal começa a outra música os pares se redistribuem como num balé bem ensaiado. Sim, não há paixão nesses olhares soturnos, nessa falta de esperança de afogados que desistiram de viver. Há o silêncio de um comboio que se dirige para o além, sem queixas ou revolta, e que já sinaliza uma conformação: Senhor, levai esses corpos ao embalo desses tangos tristes, dessas milongas saltitantes, no último suspiro dos que desesperam com calma. Há um desânimo que se desprega da vida e dela se despede com seu último tango.

Jaime lerner é arquiteto


Cartas

Escreva para cartas@revistaideias.com.br

MEU VINHO, MEU VÍCIO

REVISTA

Foi uma tremenda satisfação ler esse texto. Ele flui e não tropeça em nada: água limpa correndo rápido. Transparências múltiplas, imagens consistentes, e alguns deslocamentos adoráveis. Parabéns mesmo. Adorei essa viagem. Rubens Jardim

TEMPLO É DINHEIRO Dias atrás havia uma revista da Travessa aqui na minha sala. Era a revista IDEIAS e a reportagem falava sobre as igrejas e suas arrecadações astronômicas de dinheiro. Comecei devagar e acabei lendo 90% das matérias. Ronaldo C. Canos É lamentável notar que seitas como estas estejam deturpando o real valor das igrejas evangélicas seguidoras de Jesus. Muitas vezes não consigo engolir o que RR Soares e Malafaia fazem, as palavras, as pregações são decentes, mas quando começam a falar em contribuição em doar tanto dinheiro, pois só assim conseguirão mais, aí vejo a obra de satanás por entre essas pessoas.

Eu, como Caetano Veloso, “gosto do Pessoa na Pessoa”. Jota Geraldo

UMA CARTA PARA ELAS O texto da Marianna Camargo é incrível. Sensível, profundo e faz a gente mergulhar na história. Impressionante como a autora consegue passar uma sensação que faz a gente pensar diferente sobre a vida. Parabéns. Felipe Rodrigues

ENSAIO FOTOGRÁFICO

Grande matéria, o povo quer moralidade na política, enquanto o mesmo apoiam esta palhaçada com o nome de Deus... Rogério Excelente reportagem. Muito bom enredo, ideias e investigativa. Parabéns. Leonardo Como deter essa verdadeira praga? Sugiro algumas medidas: fazer com que paguem os impostos como qualquer instituição; ter suas atividades investigadas pela Polícia Federal, Polícia Estadual, Ministério Público e Judiciário. Isso para começar! Georgs Rozenfelds Fantástico. O melhor negócio de todos os tempos. Nem o governo lucra com eles, levam tudo sozinhos. Quero um empreendimento de fé também. Cláudio Soares

ISABELA FRANÇA Muito obrigado pela nota na revista Ideias. Comprei hoje. Como está ficando legal a revista, né? Adorei a matéria com os chefs e a diagramação geral da edição! Vicente Frare

EDITOR-CHEFE Fábio Campana CHEFE DE REDAÇÃO Marianna Camargo REDAÇÃO Karen Fukushima, Mara Cornelsen, Márcio Barros, Marisol Vieira, Sarah Corazza, Thais Kaniak COLUNISTAS Ana Teresa Londres, Camilla Inojosa, Carlos Alberto Pessôa, Ciro Correia França, Claudia Wasilewski, Izabel Campana, Jaime Lerner, Jussara Voss, Luiz Carlos Zanoni, Luiz Fernando Pereira, Luiz Geraldo Mazza, Luiz Solda, Pryscila Vieira, Rogerio Distefano, Rubens Campana, Tess Biscaia COLABORADORES Átila Alberti, Eduardo Reinehr, Guilherme Zamoner, Isabela França, Maria Angela Biscaia DIRETOR DE FOTOGRAFIA Dico Kremer

Amei o que o Dico Kremer escreveu sobre mim. Obrigada mesmo. Glaucia Nogueira - Fotógrafa

Cherry

Publicação da Travessa dos Editores ISSN 1679-3501 Edição 116 – R$ 10,00 www.revistaideias.com.br e-mail: ideias@revistaideias.com.br

ONDE ESTÃO OS PRÍNCIPES? Excelente! Na verdade o homem aprendeu que ser cafajeste compensa e a mulher já se relaciona melhor sem a presença de um príncipe encantado. Em suma: o que era encantador virou uma celebração ao “ficar” fácil e passageiro. O encanto acabou faz tempo, o amor é apenas uma celebração do orgasmo obtido. Homens e mulheres competem em tudo. Enfim, perderam a sensibilidade e a magia. Elias Glaucio

CURITIBA MANCHADA DE SANGUE Parabéns ao autor da matéria Marcelo Vellinho. A melhor reportagem sobre a violência da RMC em muito tempo. Fernando Seiji Imay

ERRATA No caderno especial de gastronomia, da edição 115, maio/2011 foi publicado errado o endereço do restaurante Manu. Segue o correto: Manu Al. Dom Pedro II, 317 Batel Curitiba – PR. Tel.: (41) 3044-4395

TRATAMENTO DE IMAGEM Carmen Lucia Solheid Kremer FOTO CAPA Chris Willis, www.snapchris.com licença de imagem: http://creativecommons.org/ licenses/by/2.0/deed.pt_BR CAPA Clarissa M. Menini sobre foto de Chris Willis PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO Clarissa M. Menini, Katiane Cabral e Luigi Camargo DIRETORA FINANCEIRA Clarissa M. Menini CONSELHO EDITORIAL Aroldo Murá G. Haygert, Belmiro Valverde, Carlos Alberto Pessôa, Denise de Camargo, Fábio Campana, Lucas Leitão, Paola De Orte, Rubens Campana PARA ANUNCIAR comercial@revistaideias.com.br PARA ASSINAR assinatura@revistaideias.com.br ONDE ENCONTRAR Banca do Batel • Banca Boca Maldita • Banca da Praça Espanha • Revistaria do Maninho • Revistaria Quiosque do Saber — Angeloni • Banca Presentes Cotegipe — Mercado Municipal • Livrarias Ghignone • Banca Bom Jesus • Revistaria Itália

Rua Desembargador Hugo Simas nº 1570 CEP 80520-250 / CURITIBA PR Tel.: [41] 3079 9997 www.travessadoseditores.com.br . Leia para saber.

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