Revista IDEIAS 114

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R$ 10,00 nº 114 ano VI abr 2011 www.revistaideias.com.br

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Política, Economia & Cultura do Paraná

Curitiba

manchada de sangue

eSTReiA Jussara voss RepoRTAgeM Tragédia no litoral peRFil leila pugnaloni


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114 editorial FáBio cAMpAnA

O

horror é revisitado nesta edição de Ideias na reportagem de Marcelo Vellinho. O horror que ocorre quando as coisas deixam de ser o que costumam ser e saem dos limites e dos padrões que nos habituamos a aceitar e a suportar. Um casal de namorados ou uma senhora que são sequestrados no centro de Curitiba ou numa rua do Batel para serem roubados e mortos num matagal qualquer, encontraram o horror. Esse horror mora ali adiante, na favela ou no cortiço que hoje se chama conjunto habitacional, nas delegacias de polícia, nas prisões superlotadas. Para o assaltante, o horror é apenas o cotidiano, a rotina, sua vida e sua cultura. No seu mundo, como na cadeia, não se sobrevive de outro modo. Por que chegamos a esse ponto? O aumento da população, os dramas sociais, o rompimento da costura entre dois tecidos culturais diferentes, embora tão próximos, sempre são estudados para explicar a insegurança provocada pela escalada do crime organizado e da violência que carrega consigo. Mas sabemos que essa é apenas uma parte da explicação. Que tal ir direto à ferida e anotar a falta de policiamento? Por que não denunciar a pífia política de segurança pública dos oito anos de Requião e Delazari? Vellinho abre a caixa preta com a sua experiência singular de anos de cobertura jornalística da criminalidade em Curitiba e Região Metropolitana. É de meter medo em qualquer mortal que vive nesta cidade. Batemos recordes de homicídios, de assaltos, de roubos, de violência, enfim. Os números podem parecer-nos irreais de tão elevados, mas é isso mesmo e quem mais sofre é a população mais pobre, a que mais precisa de polícia. A taxa de sofrimento do povo é proporcional ao grau de irresponsabilidade do governo passado que deixou que a criminalidade tomasse conta da vida nesta área do planeta. A recuperação da capacidade da polícia não se dará da noite para o dia. A defasagem é enorme, de tropa, de policiais, de equipamentos, de tudo, e o novo secretário, Reinaldo de Almeida César, um homem capacitado para tanto, terá que fazer milagres para reduzir a taxa de horror que herdamos da era Requião et caterva.


NESTA EDIÇÃO

ÍNDICE A longa dieta de mentiras 18 Fábio Campana O imbróglio das multas 22 Marianna Camargo Era uma vez a Ilha da Boa Sorte 29 Karen Fukushima Tragédia no litoral 30 Thais Kaniak Novo caminho para a agricultura familiar 34 Sarah Corazza Curitiba manchada de sangue 40 Marcelo Vellinho

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Leila e o “domingo azul do mar” 56 Fernando A. F. Bini Entrevista com a Amely 68 Pryscila Vieira

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Carlos Alberto Pessôa 17 Não é mole, não Luiz Geraldo Mazza 21 Rossoni 9, Beto 4

SEÇÕES

COLUNISTAS

Jaime Lerner 16 A fila

Editorial 03 Curtas 06 Frases 08 Gente Fina 10 Câmara dos Vereadores 27

Luiz Fernando Pereira 24 Corrupção e financiamento público de campanhas

Paraná Pesquisas 23

Fábio Campana 26 Garçonnière

Prateleira 65

Rogerio Distefano 28 Quando a nudez não é castigada

Cartas/expediente 81

Ensaio Fotográfico 50 Balacobaco 76

Salvyano Cavalcanti de Paiva 48 O burro é sólido Marianna Camargo 55 No meio do caminho Jussara Voss 60 Noma, o melhor restaurante do mundo Solda 63 Sobre os Rogérios Dias Luiz Carlos Zanoni 64 Mofos de estimação

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Izabel Campana 69 Reviro os olhinhos Camilla Inojosa 70 A nobre arte de ser Tia Isabela França 72 Claudia Wasilewski 80 Palmatórias do mundo Pryscila Vieira 82 Humor

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cuRTAS

casal pessuti de licença médica

iMl

obras por fazer

O secretário de Segurança Pública Reinaldo de Almeida César prometeu a construção de uma sede própria do IML de Curitiba, orçada em R$ 15 milhões, além da compra de pelo menos 25 viaturas novas para o instituto.

O governo estadual pretende denunciar o ex-governador Orlando Pessuti ao Ministério Público por conta das obras que ele autorizou durante a campanha eleitoral do ano passado, o que

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Uma das prioridades do Secretário Reinaldo de Almeida César é resolver a destinação final dos 199 corpos de indigentes que estavam no IML de Curitiba. Dois deles foram enterrados no dia 24 de março no Cemitério da Santa Cândida. 6

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é proibido pela legislação eleitoral. Segundo fontes muito próximas ao Palácio das Araucárias, um levantamento feito pela Casa Civil apontaria cerca de mil obras.

Aposentadoria Beto Richa cancelou no dia 21 de março as aposentadorias de ex-governadores que passaram a receber o benefício após a promulgação da Constituição de 1988. O governador aprovou parecer normativo elaborado pela Procuradoria Geral do Estado (PGE), que considera ilegais os benefícios porque eles não estão previstos no texto da nova Constituição. A decisão vai suspender pagamentos aos ex-governadores Mário Pereira, Jaime Lerner, Roberto Requião e Orlando Pessuti.

corpos

na Assembleia. A licença foi concedida pela Junta Médica da Assembleia pelo prazo de 120 dias. A Assembleia está buscando estabelecer um convênio com o Estado para que as inspeções de saúde dos funcionários sejam feitas pela Junta Médica estadual.

economia

Flickr.com

Giovani Santos

Após o ex-governador Orlando Pessuti pedir sua licença médica para não voltar a trabalhar na Emater, o que ele prometia fazer desde o dia 3 de janeiro, descobrimos que sua amada e única dama (como sempre fez questão de ressaltar), Regina Fischer Pessuti também tirou uma licencinha médica

Com o cancelamento das aposentadorias vitalícias dos ex-governadores Mário Pereira, Jaime Lerner, Roberto Requião e Orlando Pessuti, o Paraná irá deixar de desembolsar R$ 96,4 mil por mês.

água Dono do maior potencial hídrico do planeta, o Brasil corre o risco de chegar a 2015 com problemas de abastecimento de água em mais da metade dos municípios. O diagnóstico está no Atlas Brasil – Abastecimento Urbano de Água, lançado pela ANA (Agência Nacional de Águas). O levantamento mapeou as tendências de demanda e oferta de água nos 5.565 municípios brasileiros e estimou em R$ 22 bilhões o total de investimentos necessários para evitar a escassez.


Quase seis meses depois das eleições e após duas votações empatadas, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu no dia 23 de março, por 6 votos a 5, anular a aplicação da lei Ficha Limpa para as eleições de 2010, ao menos para políticos condenados por improbidade administrativa. A partir de agora, candidatos barrados no último pleito devem provocar uma enxurrada de ações na Justiça para mudar os resultados estipulados em 1º de outubro do ano passado.

Desemprego O desemprego brasileiro aumentou em fevereiro e atingiu o maior patamar desde agosto passado, enquanto o rendimento do trabalhador caiu na comparação mensal. A taxa de desemprego nas seis principais regiões metropolitanas do país subiu para

6,4 por cento em fevereiro, ante 6,1 por cento em janeiro, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no dia 24 de março.

Mínimo O salário mínimo regional terá reajuste de 6,9%, mesma variação do piso nacional. O anúncio foi feito no twitter pelo secretário estadual do Trabalho, Emprego e Promoção Social, Luiz Claudio Romanelli.

Divulgação Assessoria de Imprensa

Fichas-sujas

Banho de sol O deputado federal Fernando Francischini (PSDB) defende a tese de restringir ainda mais a rotina dos presos nas penitenciárias de segurança máxima. Uma delas é fazer com que o preso tome o “banho de sol” individualmente, não com todos os presos como acontece, pois assim o risco de planos e conchavos entre eles diminui. Segundo o deputado, foi assim que Beira-Mar e Abadia combinaram o sequestro de Lulinha, o filho do ex-presidente Lula, que terminou frustrado apenas porque Abadia revelou o plano à polícia para receber o benefício da delação premiada. Beira-Mar e Abadia se conhecerem na Penitenciária de Catanduvas, no Paraná.

O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) adiou mais uma vez o julgamento da gestão contábil do ano de 2004 da Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa), período em que foi comandada por Eduardo Requião, irmão do senador e ex-governador do Paraná Roberto Requião (PMDB).

Transparência

A candidata

Uma pesquisa do Instituto de Estudos Socioeconômicos, de Brasília, divulgada dia 24 de março, coloca Curitiba como a cidade com maior índice de transparência orçamentária entre as capitais brasileiras. O assessor do instituto, Lídio Barbosa, explica que nenhuma cidade alcançou o nível de excelência. Curitiba teve nota 75,9, a maior entre as capitais.

Lula e o comando do partido insistem no nome da senadora Gleisi Hoffmann como candidata à prefeita de Curitiba em 2012. Gleisi já deixou claro que não pretende disputar as eleições de 2012, mas esta sendo empurrada para a disputa por orientação de Lula e do comando do partido.

Reprodução TV Globo

Divulgação

Adiado

Segurança máxima O governador Beto Richa decidiu construir uma penitenciária com uma ala de segurança máxima no Paraná. A decisão foi tomada no dia 21 de março em uma reunião com deputados do PSDB. O objetivo é isolar o crime organizado e a escolha vem após a revelação das cartas do traficante preso Fernandinho Beira-Mar, que mostram a fragilidade do sistema federal de segurança máxima. abril de 2011 |

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FRASeS

Você não pode chorar nos ombros de diamantes disse a atriz de olhos violetas ELIZABETH TAYLOR, morta no dia 23 de março aos 79 anos

O senador e ex-governador ROBERTO REQUIÃO (PMDB) se estranhou com os repórteres do programa CQC, da TV Bandeirantes, no lançamento da biografia do presidente do Senado, José Sarney (PMDB/AP), em Brasília. MARCELO TAS respondeu pelo twitter:

Dedico ao Requião, gordota do PR: A política brasileira é uma zona. Com todo respeito às moças que rodam a bolsinha

O capitalismo pode ter sido o culpado pela falta de vida em Marte, disse o presidente da Venezuela, HUGO CHÁVEZ

Eu sempre digo, e ouço, que não seria estranho se tivesse existido uma civilização em Marte, mas talvez o capitalismo tenha chegado lá, o imperialismo chegou e acabou com o planeta

Se eles não aceitarem essa última opção, só lamento. Passem fogo na pessoa e vamos pegar outra com mais peso político Trecho de uma das cartas do traficante FERNANDINHO BEIRA-MAR onde organiza um sequestro e um assassinato de uma penitenciária de segurança máxima

A senadora GLEISI HOFFMANN participou do almoço no Itamaraty ao casal Barack e Michelle Obama no dia 19 de março e contou que o que chamou a sua atenção foi a desenvoltura da relação entre DILMA e OBAMA.

Eles não pararam de conversar um minuto, parece que a conversa fluía

SOLDA foi demitido do site O Estado do Paraná por causa de uma charge publicada durante a visita de Barack Obama ao Brasil. O desenho do macaco atraiu críticas de vários blogs, inclusive do jornalista Paulo Henrique Amorim. Atento ao que considera “patrulhamento ideológico”, Solda atira:

Meu único preconceito é contra a burrice PESSUTI que teve sua aposentadoria de governador cancelada por BETO RICHA, mas ainda recebe a de ex-deputado disse:

Se vier a faltar alguma coisa, meus filhos me socorrerão. Mas afirmou que já fez pé de meia. Alguém duvidava disso?

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gente FINA

Os movimentos

de

Andréa

Andréa Sério Bertoldi é uma pesquisadora do

movimento. A coreógrafa consagrada no Brasil e no exterior assume agora a direção do Balé do Teatro Guaíra. Promete inaugurar uma fase de revitalização do trabalho como companhia de dança pública, com o desenvolvimento de ações que atualizam modos de produção e a relação com o público e artistas. E Andréa sabe o que faz. Graduada em Dança e Fisioterapia pela PUC do Paraná é também mestre e doutoranda em Comportamento Motor pela Federal do Paraná. Estudou dança clássica, moderna e contemporânea. Foi premiada pela Funarte por sua produção coreográfica e representou o Brasil em festivais internacionais de arte realizados nos Estados Unidos, Ásia e Europa. Desde 1997, atua como professora na Faculdade de Artes do Paraná e como palestrante de cursos de pós-graduação em inúmeras instituições do país. É autora de publicações nacionais e internacionais sobre pesquisas teóricas e aplicadas na área do comportamento motor e sobre o corpo com deficiência física na dança contemporânea brasileira.

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gente FINA

Dico Kremer

Simplesmente Aline

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line Castro é jornalista formada pela Universidade Federal do

Paraná e internacionalista com fluência em cinco idiomas. Integrou as equipes da Rádio CBN, da Rádio Band News FM, da Revista Ideias, do Jornalismo FM, da RPC TV e da Rede Globo/ Sportv. Estudou na Alemanha, foi correspondente na Itália e repórter no Rio de Janeiro e em São Paulo. Especializou-se em ferramentas de expressão em meios eletrônicos com profissionais da Rede Globo. O jornalismo revelou o seu notável talento comunicativo, mas também a fez despertar para as potencialidades comunicativas de cada um, mesmo daqueles que se julgam maus comunicadores. O trabalho de Aline é voltado a este assunto, ela ajuda as pessoas a vender suas ideias. Simples assim.

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gente FINA

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afael Silveira produziu fanzines no

O fabuloso mundo de Rafael

Em meados de 2000, seu interesse se volta para a ilustração. Seu trabalho circulou por algumas das principais revistas brasileiras como Superinteressante, Bizz, VIP, Época, Sexy, ganhando inclusive o Prêmio Abril de Jornalismo. Ilustrou também campanhas publicitárias e materiais promocionais no Brasil e Europa, muitos deles premiados (três vezes prêmio Max Feffer de Design gráfico, Anuário do CCSP, Revista Archive, Festival de Gramado, para citar alguns).

Flávia Itiberê

final dos anos 80. Durante toda a década de 90 publicou quadrinhos em fanzines e revistas independentes de todo o Brasil. Chegou a publicar pela editora norte-americana Dark Horse, uma das maiores do mundo.

Desde 2004 começou a pintar a óleo. Suas pinturas já passaram por galerias dos principais centros brasileiros e também nos EUA. No final de 2007, um livro compilando o melhor de seus trabalhos foi lançado pela editora Arte e Letra: Mulheres, Chapéus Voadores e Outras Coisas Legais. Em 2008 assinou a série de pinturas que ilustra o novo álbum do grupo Skank, e lançou o seu segundo livro: Pop Surreal, também pela Arte e Letra. Em 2010 entra para o time de artistas representados pela Galeria Choque Cultural, uma das mais expressivas do país, e tem sua primeira exposição individual em São Paulo.

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MADONNA AND SODA Óleo sobre tela,70x120cm


gente FINA Nossa menina de

ouro

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boxeadora Rosilete dos Santos precisou de apenas 11 segundos para provar a sua superioridade sobre a argentina Gabriela Aranda, no dia 19 de março. A luta, que fazia parte das comemorações do aniversário de 321 anos de São José dos Pinhais, acabou com um rápido nocaute da brasileira, que manteve o título mundial pela Comissão Mundial de Boxe.

Treinada pelo marido e ex-campeão de boxe Macaris do Livramento, Rosilete defendia o cinturão da categoria peso galo (53,5 kg). “Eu não esperava uma luta tão rápida, mas me preparei muito. Treinei muito forte para vencer. Me senti a verdadeira menina de ouro nesta luta. E foi especial por fazer uma disputa de cinturão no aniversário de São José dos Pinhais. Vou continuar trabalhando porque outros desafios difíceis virão pela frente”, comemorou Rosilete. abril de 2011 |

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JAiMe leRneR Arquiteto

A fila

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Jorge Woll / AEN

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o aeroporto, a confusão é imensa, época de férias. Filas enormes, bagagens ainda maiores, famílias grandes e atendentes em número sempre pequeno. O que fazer nessa confusão terrestre para uma viagem aérea? De repente, ele resolve se divertir, encosta nas três primeiras pessoas que procuram informações; imediatamente, atrás dele se forma uma fila. Acha divertido as pessoas o seguirem. Começa a gostar desse poder de atrair pessoas e lá vai ele organizar outra fila. Pouco a pouco, o aeroporto se divide em batalhões organizados a procura do troféu de um cartão de embarque. A brincadeira vai longe e já está repetitiva e chata. Começa outra fila para o balcão de reclamações das bagagens que não chegaram. Daí, lá fora, começa a criar filas para os táxis, ônibus e saída de carros. Caminhando pela avenida que leva ao aeroporto um exército de pessoas já o está seguindo. Nessa batida, um tsunami de gente já se encontra no Centro Cívico. Por falta de assunto, resolve tomar o poder.


cARloS AlBeRTo peSSÔA Jornalista

não é mole, não

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ui árbitro de bola-ao-cesto* entre a adolescência e o início da juventude. Modestamente.

Aos 15 anos trilava fortemente o apito de lata. E impunha respeito. Modestamente. De Itararé a Marcelino Ramos fui o árbitro. Era tão requisitado quanto vinho branco em coquetel. E apitava sozinho. ( ) Não esqueça, no bola-ao-cesto agora são três as suas senhorias; antes e por muito tempo eram duas. Pronto; cheguei aonde queria.

mESmicE O tamanho da quadra é invariável: 26X14. As tabelas, aros, suas alturas relativas ao piso, a linha de lance livre, o garrafão, o círculo central, a bola, claro – tudo é invariável. Além de não existir diferença entre os pisos dos ginásios do mundo, mundo, vasto mundo. Todos taco. Claro, só se joga basquete a sério em quadras cobertas. Que não tem “mau tempo reinante”, chuva, frio, granizo, calor, neve. É absolutamente supérfluo fazer “reconhecimento de quadra”. ( ) A NBA alterou muitos itens: o tempo de jogo, o número de faltas, de tempos a pedir, a distância da linha de três pontos. Idiossincrática, proibiu a marcação por zona. Mas nela não se joga bola-ao-cesto... No essencial, não houve mexida.

bá, tcHÊ! Quero convidá-lo a superficial comparação com o velho, rude esporte bretão, conhecido como balípodo, ludopédio. Que diferenças, hein? Lembre as brutais dessemelhanças entre o Alto da Glória, Arena, Burrão. Tudo é diferente – do piso ao teto. Lembro apenas um aspecto: a qualidade dos gramados passa de menos zero (no Burrão) a sete e meio ( no Alto da Glória) e a nove (na Arena). Pra tomar conta de um sítio de mais ou menos 105X68, sujeito a chuvas&trovoadas, que

se altera a cada metro quadrado disputado por 22 marmanjos munidos de chuteiras e as piores intenções, designamos solitário árbitro, acolitado por modestos bandeirinhas. E só. É soda.

P.S.: O melhor árbitro de futebol de todos os tempos foi meu irmão João, Negro João. Aquilo, sim, era autoridade! Uma tarde, no estádio do Olímpico, em Irati, clássico Irati-Olímpico, casa cheia, e eis senão quando o Juarez Ruteski, centro avante do Irati, parte em claro impedimento; João não hesitou – apitou! Mas o clamor da torcida encobriu o apito e o Juarez continuou a correr com a bola. Até que o João deixou a latinha de lado e berrou: – Quando eu apitar, para! Instantaneamente o Juarez estacou!

notinHa * Homenagem ao amigo&mestre Zé Maria Orreda. Que baniu dos treinos&textos, aulas&papos a palavra basquete, monopólio dos negros americanos. Que voam depois de decolarem enquanto os brancos sobem como helicópteros. O resto do mundo joga bola-ao-cesto. Soporífero com cinco pra cada lado. Carlos Alberto Pessôa é jornalista e escritor. Escreve diariamente para o site da Revista Ideias. Leia mais: www.negopessoa.com

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política Fábio Campana

A longa dieta de mentiras

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tigrada do PMDB não brinca em serviço. Dizia que tinha a solução para todos os nossos problemas no bolso do colete. Pois bem, o novo governo assumiu e ao vasculhar o cofre achou vento estagnado. Nada mais do que isso. E em cada órgão do Estado uma lista de contas a pagar deixadas pelo time de Requião e Pessuti. 18

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Ou seja, Requião e sua caterva estavam é empanturrando a gente de mentiras. Os políticos sempre mentiram muito, mas nesse caso atingiram o sublime. O Paraná obedecia a essa rigorosa dieta de mentiras há oito anos, talvez desde sempre, ministrada à maioria ignara pelos detentores do poder e por aqueles que no poder os sustentam.

Ocorre que nos últimos anos as mentiras cresceram em volume e passaram a ser pronunciadas com especial arrogância para engordar uma retórica ufanista e de moralismo chinfrim que deslumbra o nosso provincianismo pequeno-burguês e encobre os desmandos de quem está por cima. Inúmeros privilegiados cuidaram de fortalecer-se no privilégio ao propagarem o misticismo da política inspirada na Carta de Puebla, uma invenção dos publicitários de Requião. Agora, diz um empresário que manteve a cabeça fria mesmo quando muitos entre seus pares aplaudiam Requião e seus miquinhos amestrados. “Agora a ilha de prosperidade e justiça social está para ir a pique”. O que o novo governo liderado por Beto Richa deve fazer? A maioria à sua volta prega moderação e prudência na necessária denúncia da situação caótica em que recebeu o Estado. Vencem de lavada os conselheiros que tentam demonstrar que trombar não é tão mau assim e que a decisão política de enfrentar os moinhos de vento do PMDB vendo-os como moinhos de vento e não como gigantes fará mais para marcar a ação deste governo do que o quixotismo institucional. Gestos fortes não significam repetir o comportamento bizarro de Requião. Gestos fortes são, fundamentalmente, uma necessidade política quando administrar um Estado como o Paraná se torna um desafio ainda maior para Beto Richa diante do desgoverno que o antecedeu. Ou logo ele poderá ser confundido como continuidade dos desvarios. O Paraná não está próximo de naufragar porque é forte e capaz de suportar até mesmo oito anos de Requião et


famiglia no governo. A sociedade tem o direito de saber o que foi feito contra ela nesse período de desvario e bobagens. Até aqui, a Secretaria da Fazenda pagou R$ 152,9 milhões de atrasados. As liberações retiram recursos do orçamento deste ano, que deveriam ser direcionados a investimentos. A seguir, alguns exemplos do descalabro requianista:

O governo Beto Richa foi obrigado a pagar R$ 41,3 milhões das verbas rescisórias de 32.517 professores e funcionários contratados por Processo Seletivo Simplificado (PSS), não pagos pelo governo anterior ao fim do contrato, em dezembro de 2010. A Secretaria da Educação também anunciou que serão chamados 3 mil aprovados em concurso público em 2007 — que tem validade até 2012. O secretário da Fazenda, Luiz Carlos Hauly, disse que o pagamento das verbas rescisórias dos professores e funcionários representa aproximadamente 5% da folha de salários do Governo do Estado. Os recursos sairão do orçamento para 2011 da Secretaria de Educação e não constavam na relação de restos a pagar pela administração do governo anterior. Os recursos liberados para sanar dívidas de custeio das universidades estaduais atendem as instituições de ensino superior de Londrina, Ponta Grossa, Maringá, Guarapuava e Cascavel e são relativos aos meses de outubro e novembro do ano passado. “É possível que até o final de março sejam quitadas as contas do mês de dezembro, zerando, portanto, as dívidas do ano passado com relação às universidades estaduais”, informa Hauly. Além disso, os reitores dessas universidades apresentaram pedidos de suplementação para despesas com custeio, no valor de R$ 13 milhões, ainda para este ano.

Arnaldo Alves

rombo na Educação

Requião e Pessuti eram amigos cordiais quando usufruiam juntos do poder. Agora Requião diz que Pessuti não merece seu apoio nem mesmo para um cargo na República

liberou mais R$ 3,58 milhões para pagamento de dívidas. Desse total, cerca de R$ 2,6 milhões foram destinados a pagamentos devidos ao Sistema de Saúde do Estado (SAS) para oito municípios paranaenses, entre eles Foz do Iguaçu, Londrina e Ponta Grossa.

na medida do possível, o pagamento de atrasados nas áreas mais sensíveis, para não comprometer o atendimento da população que necessita dos serviços médicos. “O atraso dos repasses impõe dificuldades para dar início ao orçamento da Saúde planejado para 2011. É necessário manter os pagamentos em dia para não comprometer as prefeituras e o atendimento da população que necessita dos serviços médicos”, afirmou o secretário da Fazenda, Luiz Carlos Hauly. Os valores pagos são relativos a serviços prestados por entidades privadas e para o Fundo Municipal de Saúde de uma extensa lista de municípios, por serviços médico-hospitalares e odontológicos, no total de R$ 5.705.253,63. Também está incluído o pagamento de encargos com impostos de prestadores de serviços (INSS e ISS), que somam R$ 487.535,58, e outros R$ 2.736.932,98 em medicamentos (muitos de uso continuado) e material laboratorial.

“O Paraná não está próximo de naufragar porque é forte e capaz de suportar até mesmo oito anos de Requião et famiglia no governo”

Rombo na Saúde Pública Na Saúde, o governo do Paraná

Além desses pagamentos, o atual governo já havia quitado outros R$ 118 milhões, utilizando recursos da arrecadação de 2011 para saldar débitos do orçamento de 2010, que não tinham previsão de caixa no Tesouro do Estado. Neste mês de março também foram pagos R$ 439 mil usados na importação de medicamentos destinados a pacientes dependentes do Estado. A preocupação do secretário da Fazenda, Luiz Carlos Hauly, é apressar,

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O Governo do Estado liberou no dia 22 de março R$ 2,2 milhões do Fundo Rotativo da Polícia Civil, que serão utilizados por delegacias e distritos policiais para pagamento de atrasados referentes à alimentação de presos, entre outras despesas. O valor foi dividido entre 135 unidades de 120 municípios. Os recursos liberados correspondem ao repasse do Fundo Rotativo do mês de dezembro, que não foi realizado pelo governo anterior e nem relacionado entre os restos a pagar do orçamento de 2010. Assim, repetindo o que já ocorreu nas áreas da saúde, educação, assistência social e obras, o Estado precisou recorrer à receita do exercício atual para saldar os compromissos atrasados. De acordo com a Secretaria de Segurança (Sesp), mesmo com o atraso no pagamento, nenhum detento deixou de ser alimentado, porque a aquisição dos gêneros alimentícios é feita por antecipação de débito. Atualmente há cerca de 12.500 presos em regime provisório nas 194 unidades da Secretaria. A situação está regularizada em relação aos 15 mil presos das penitenciárias administradas pela Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania. A Secretaria da Segurança está fazendo um estudo para reajustar

o valor da diária para alimentação de presos de delegacias, que desde dezembro de 2001 é mantida no valor de R$ 2,00, a despeito de toda a variação dos preços nesse período. A secretaria reafirma que tal situação deixará de existir na medida em que os presos abrigados em cadeias e distritos policiais sejam transferidos para estabelecimentos prisionais da Secretaria da Justiça, conforme determinação do governador Beto Richa. Estes são apenas exemplos de três secretarias da área social. Imaginem o resto.

Arnaldo Alves

Rombo na Segurança

Hauly diz que está fazendo milagres para ajustar as contas que recebeu do governo anterior

Herança maldita

Arnaldo Alves

É a velha história, o povo aprende a votar. O único consolo para este infeliz início de 2011 foram as eleições do ano passado e a chance que a sociedade teve de dizer a que veio. Deu asas a um fenômeno político novo chamado Beto Richa. Primeiro governador da geração que não estava na ativa durante o regime fardado. As aparências muitas vezes enganam, mas pode estar aí o começo de uma nova época para este Paraná que sofreu durante uma década sob o tacanho governo de Requião et caterva. Foram anos excrementais da política paranaense feita à base de discursos de um moralismo chinfrim para encobrir a incompetência administrativa. Agora, temos um estilo novo no poder local. Menos messiânico, menos apocalíptico, menos primitivo, menos oitocentesco – e mais adequado à contemporaneidade do mundo, que o Paraná é obrigado a viver, Flávio Arns tem milhares de funcionários contratados frequentemente à sua reque ainda não receberam salários do ano passado velia. Se caminhar por aí, 20

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o Paraná se beneficiará muito com esse governo tucano que recebeu o Estado em péssimas condições e em meio ao descrédito dos políticos e de seus apaniguados. As melhores saídas estão à vista, a sociedade dirige-se naturalmente para elas, mas o governo e as instituições nos impediam de tomá-las. Chegamos ao fim de 2010 sem governo, com um governador desmoralizado e uma administração inoperante. Há, no entanto, nesta situação marcada pela ausência irresponsável de governo na década passada um traço, digamos, conseqüente. Reparem, falta tudo – o caixa está vazio, sobram contas para pagar, não há polícia, não há planos, não há programas, não há nada. É isso o que Richa recebeu do governo Requião/Pessuti. Problemas e falta de soluções à vista, que somados a uma imensa expectativa da população que sempre quer soluções imediatas para seus problemas antigos, transforma-se em grande dor de cabeça. Sem dizer que a imprensa nativa não tem, de uma maneira geral, simpatias pelo novo governante. Quem vive do lado de cá, antes que governado vítima do desgoverno, aprendeu a ser cético e exigente graças a formidáveis aulas de cinismo aplicadas por Requião.


luiz geraldo mazza Jornalista

Rossoni 9, Beto 4

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nquanto o governador Beto Richa se tos, entrou com várias ações diretas de mentoso caso dos jornalistas da sucursal mostra perplexo com a sucessão de inconstitucionalidade no Supremo Tri- de Curitiba da ‘’Última Hora’’ de Samuel desafios imediatos – caixa estoura- bunal Federal (como a que promoveu Wainer, também cassado. do, compromissos adiados, fila endêmica servidores de nível médio ao estrato sude caminhões no Porto – o presidente da perior sem concurso) com o que é olhado Assembleia, Valdir Rossoni, normalmen- com ceticismo por aqueles que já nas Promiscuidade visível te retraído, surfa, até aqui pelo menos, primeiras ações do Gaeco mostravam-se Esse sistema de vasos comunicantes com desenvoltura no enfrentamento às contrários às investigações convictos de deformações da Casa e ganha com isso que tais decisões por estarem no figurino entre a mídia acomodada e amoldada, do consuetudinário configurariam a expres- qual os veículos da Rede Paranaense de destaque nacional. Como no Legislativo o costume e a praxe são do direito adquirido. A fantasmice Comunicação eram consorciados, tanto se sobrepoem a qualquer sentido de lei posi- é generalizada na Assembleia, onde a que vários dos seus integrantes tinham tiva e a desordem é de tal natureza como se maior parte dos servidores, dentre eles posições de relevo na Diretoria Geral e ali fosse o império da anomia, da ausência de profissionais liberais e procuradores, ra- no quadro de procuradores, era praticamente extensivo a todos os referenciais de ordenamento de comunicação. Tanto jurídico, o que soa antinôA fantasmice é generalizada na Assembleia, meios é verdade que houve uma mico por tratar-se de uma época em que só as sucursais fonte de leis. O pior é que a onde a maior parte dos servidores (...), grandes jornais do país maioria conspira, ainda que raramente dava presença no expediente dos se ocupavam de denúncias, de forma silenciosa contra o presidente, por estar visiveljá que era proibido aos lomente comprometida por ação ou omissão ramente dava presença no expediente. cais tratar de tema tão comprometedor. com todas as barbáries ali praticadas. Isso tudo remonta a uma época em que Lembro que o deputado Deni Schwartz O estilo de Valdir Rossoni, um tanto o próprio Poder Judiciário pagava, como se entusiasmou com as denúncias que quanto rústico, normalmente, foi mudando funcionários seus, jornalistas e homens fazia e que ecoavam na mídia nacional e à medida que tentava desatar nós históricos de TV. Aconteceu comigo: em 1970 (esta- acabou, em consequência, ao menos por de mais de quatro décadas seja a existência va há seis anos sem conseguir emprego algum tempo, cortado do noticiário local, de um poder paralelo, mais articulado que por ser alvo do Ato Institucional Nú- o que também não lhe era conveniente o poder formal, já evidenciado e docu- mero 1, firmado por Ney Braga e pela nas relações com suas bases. mentado em operações da Polícia Federal Comissão encarregada de punir ‘’subverComo se vê é uma barra pesada não e mais recentemente do Gaeco, ligado ao sivos e corruptos’’) e fui convidado pelo apenas enfrentar as distorções do nosso Ministério Público Estadual ou a ampli- jornalista Francisco da Cunha Pereira Legislativo e de certa forma ir fundo nas tude das atribuições da Diretoria Geral para assumir a direção dos telejornais investigações sobre o governo anterior, que fazia de Abib Miguel de quem pelo da Rede Paranaense de Televisão, Canal especialmente nas áreas de Segurança, menos o jogo de espelhos sugeria um ente 12. Só que ele propunha algo insólito Educação e Saúde, mas também nos a que a própria Comissão Executiva, no para mim: receber os salários do Tribunal escândalos do Porto de Paranaguá até caso Nelson Justus e Alexandre Curi, se de Justiça. Convenci-o que não poderia agora tocados superficialmente pelos fazê-lo por já ser funcionário público, órgãos federais. Rossoni está longe de subordinava como se dele fosse refém. advogado do Estado, e estar punido pelo ser um audacioso em termos de coragem Ato Institucional e colocado em disponi- e ousadia, mas assim parece em função Sinal necessário bilidade e ainda por cima respondendo, da tranquilidade quase de yoga de Beto No empenho em derrubar a eficácia naquele momento, processo na Auditoria Richa. Por isso a nota dos três primeiros de atos jurídicos sabidamente imperfei- de Guerra da 5ª Região Militar, o mo- meses: Rossoni 9, Beto 4. abril de 2011 |

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DENÚNCIA marianna camargo

O imbróglio das multas

O

programa dominical Fantástico da Rede Globo apresentou no dia 13 de março denúncias que apontam possíveis fraudes de empresas de radares em diversas cidades brasileiras, entre elas, Curitiba. Na reportagem, Heterley Richter Jr, diretor da Consilux, empresa responsável por operar os radares de fiscalização de trânsito em Curitiba, relata a possibilidade de fraude e da retirada de multas do sistema. O prefeito de Curitiba Luciano Ducci rebate a denúncia, “ainda que a licitação em Curitiba tenha sido transparente, não posso aceitar que a empresa Consilux tenha o procedimento mostrado no Fantástico”, afirmou. O prefeito suspendeu o contrato com a Consilux e diz que ficou indignado com as denúncias de um esquema de corrupção envolvendo as empresas. Ducci disse que considera o sistema eletrônico de fiscalização importante para a segurança no trânsito. “Em Curitiba, os radares têm contribuído para a redução de acidentes e de mortes no trânsito. Mas a reportagem do Fantástico faz com que a população deixe de acreditar no sistema de fiscalização. Determinei que a URBS —Urbanização de Curitiba S.A. — e a Diretran assumam a operação de fiscalização. Precisamos fazer com que o sistema volte a ter credibilidade perante à população, pois é um sistema que ajuda a salvar vidas”, disse o prefeito.

Resposta A Consilux disse que não vai se pronunciar sobre o caso enquanto não for comunicada oficialmente da decisão pela prefeitura. Por meio da sua assessoria de imprensa, afirma que é responsável apenas pela manutenção dos radares e que o sistema de multas sempre foi inteiramente administrado pela URBS. Sobre as denúncias apresentadas pelo Fantástico a empresa afirma em nota oficial que não se 22

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responsabiliza pelas declarações de seu funcionário, Heterley Richter Jr, e que este foi afastado de suas funções. A nota diz ainda que “não existe possibilidade alguma de apagar multas do sistema. Cada infração detectada pelos controladores de velocidade é automaticamente enviada do radar para o sistema da contratante, no caso de Curitiba, a URBS. Quem opera o sistema, portanto, é a URBS”. Já o presidente da URBS, Marcos Isfer, diz que haverá mais transparência no sistema de multas a partir de agora. Ele afirma que o funcionamento dos radares e aplicação das multas sempre foi confiável, mas a intenção é dar mais credibilidade à administração do sistema. Isfer diz que a URBS já iniciou as alterações necessárias para encampar a administração de toda a estrutura que atualmente é mantida pela Consilux. Na área tecnológica, novos sistemas já estão em desenvolvimento e a estrutura interna também passa por mudanças. O presidente da URBS afirma não temer questionamentos judiciais depois da decisão de romper o contrato com a Consilux. Isfer disse que será realizada uma auditoria no sistema de radares de Curitiba pelo Instituto de Tecnologia do Paraná, o Lactec. O sistema será auditado desde o início do novo contrato, em abril passado, e deve permanecer sob constante monitoramento do instituto.

Crítica O deputado Tadeu Veneri (PT) disse que o cancelamento do contrato pela prefeitura não é o suficiente para garantir um sistema justo. Para Veneri, a atitude da prefeitura é contraditória.

Anderson Tozato

Denúncia aponta esquema de corrupção nas empresas que operam os sistemas de radares e lombadas eletrônicas da cidade

O deputado questionou as declarações do presidente da URBS, Marcos Isfer, em audiência pública na Câmara Municipal, segundo as quais a licitação que resultou na contratação da Consilux para operar radares em Curitiba teria sido perfeitamente legal. “O prefeito vem um dia e manda suspender o contrato. No outro, o presidente da URBS diz que a licitação é legal. Querem nos fazer passar por bobos”, criticou. Veneri apontou que o prejuízo para os cofres públicos – ou seja, para o contribuinte – pode ultrapassar R$ 100 milhões, e que a Consilux poderá inclusive usar as declarações do próprio Isfer para pedir na Justiça indenização por quebra de contrato.

CPI A bancada de oposição anunciou que vai aprofundar a investigação sobre a “máfia dos radares”. Segundo o vereador Algaci Túlio (PMDB), líder da bancada, os esclarecimentos não foram suficientes para o arquivamento do requerimento para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Casa. O requerimento necessita da assinatura de vereadores da base de apoio do prefeito para que seja apreciado pelo plenário.


pesquisa

Os curitibanos e os radares Levantamento do Instituto Paraná Pesquisas, feito com exclusividade para a Revista Ideias, mostra que a maioria dos curitibanos concorda que a URBS seja responsável pelo controle dos radares eletrônicos O Sr(a) é a favor ou contra que a URBS seja o órgão responsável pelo controle dos radares eletrônicos do município?

64,31% 26,27% 5,88% 3,53%

Os atuais radares eletrônicos instalados no município de Curitiba estão bem sinalizados?

A favor Contra É indiferente Não sabe

Depois da instalação dos radares eletrônicos, o trânsito no município de Curitiba de uma maneira geral melhorou, piorou ou permaneceu como estava?

51,76% 35,29% 10,00% 2,94%

Sim Não Mais ou menos Não sabe

Depois da instalação dos radares eletrônicos, o número de acidentes de trânsito no município de Curitiba aumentou, diminuiu ou permaneceu igual?

9,80% 44,71% 39,61% 5,88%

48,82% Melhorou 15,88% Piorou 32,94% Permaneceu como estava 2,35% Não sabe

Aumentou Diminuiu Permaneceu igual Não sabe

De uma maneira geral, o Sr(a) concorda ou não com os limites de velocidade estabelecidos para as vias da cidade de Curitiba?

75,29% Concorda 24,12% Não concorda 0,59% Não sabe

Esta pesquisa foi realizada com os habitantes do município de Curitiba maiores de 16 anos. Para a realização desta pesquisa foram entrevistados 510 habitantes. O trabalho de levantamento dos dados foi feito através de entrevistas pessoais em Curitiba durante os dias 22 a 24 de março de 2011, sendo acompanhadas 19,61% das entrevistas. Tal amostra representativa do município de Curitiba atinge um grau de confiança de 95,0% para uma margem estimada de erro de 4,5%.

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Luiz Fernando Pereira Advogado

Corrupção e financiamento público de campanhas

F

inanciamento de campanha e corrupção são temas que andam justos desde sempre. Cogitado pela primeira vez no tempo de Theodore Roosevelt (tio do futuro presidente Franklin Delano), no começo do século passado, o financiamento público se apresentava como medida para combater a corrupção no governo. O Brasil não tem um sistema adequado de financiamento de campanhas eleitorais. Temos aqui um sistema misto e que funciona muito mal. O contribuinte já financia as campanhas aqui no Brasil. Não falo do dinheiro destinado aos Partidos Políticos (algo em torno de 200 milhões por ano), mas do horário gratuito que os candidatos têm na campanha eleitoral, típico exemplo de financiamento público indireto. Em 2010, significou uma renúncia fiscal de mais de um bilhão de reais em favor das concessionárias de rádio e televisão. Todo o resto fica por conta da iniciativa privada. Até aí não há um grande problema. O financiamento público exclusivo não é necessariamente a melhor opção. Basta lembrar os escândalos do início da década de 1990 na Itália (o socialista Bettino Craxi e companhia). O país acabou abandonando o financiamento público exclusivo que adotara no início da década de 1970. O grande desafio está na fixação de limites e adoção de regras de transparência. 24

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O Brasil é um dos poucos países do mundo que não estipula limites para a arrecadação. Um candidato pode gastar aquilo que ele próprio lança como teto. Há limites, é verdade, em relação às doações (percentual de faturamento das jurídicas e do imposto de renda das físicas). Mas

não se limita a arrecadação. Esta equação autoriza que candidatos com muito dinheiro possam literalmente “comprar um mandato”. E o grande problema está na relação promíscua entre os candidatos e os interessados nas deliberações do executivo e do legislativo. O lobby pré-eleitoral (o investimento em campanha) influencia decisivamente o comportamento dos par-

lamentares, mostrou exaustivo trabalho dos americanos Torsten Persson e Guido Tabellini. Não é sequer necessário mencionar os efeitos nefastos da relação entre campanhas eleitorais e cargos no executivo. A verdade é que é necessário estabelecer um sistema de financiamento público de campanha eleitoral (dinheiro público para candidatos), doações privadas apenas de pessoas físicas, um teto para a arrecadação e muita transparência. Obama, na última eleição, conseguiu metade do total arrecado em doações de pessoas físicas pela Internet. Aqui no Brasil isso não funcionou. Continuamos na mão das “empresas investidoras” que depois acabam “materializando a gratidão”. Há quem não aceite. O “estado não pode gastar dinheiro com política”, é o lugar-comum dos críticos do financiamento público. Mas o fato é que o dinheiro público já está presente nas caríssimas campanhas eleitorais brasileiras, mas entrando pela porta dos fundos. É a corrupção que financia a campanha, ninguém duvida. Há outra grande vantagem com o financiamento público. Hoje em dia ninguém confessa: Senhoras e Senhores eu sou um corrupto. Todos sempre dizem que apenas estão arrecadando dinheiro para campanha. O financiamento público acaba com o desculpa. O corrupto vai ter de se assumir como tal. Só isso já compensa a mudança.


CIDADE DA REDAÇÃO

Transparência na pauta A administração de Almirante Tamandaré aposta na transparência como medida modernizadora da cidade

A

administração pública de Almirante Tamandaré se moderniza e assume medidas com foco na transparência, na busca de maior qualidade e eficiência na prestação de serviços de interesse público. Dentre as medidas para modernização da gestão, cumprimento da legislação e transparência, a Prefeitura realiza o Pregão Eletrônico como modalidade mais utilizada nos processos de licitação, além de estar implementando o Portal de Transparência. A Prefeitura Municipal de Almirante Tamandaré, desde junho de 2005, utiliza a modalidade de licitação denominada “Pregão Eletrônico”, disponibilizada pelo Banco do Brasil através do site www.licitacoes-e.com.br, para aquisição de “bens e serviços comuns”. De acordo com a pregoeira Sandra Maria Cumin, em 2010, aproximadamente 90,15% das licitações realizadas pelo setor de compras e licitações foram pela modalidade de pregão eletrônico. Como resultado, a Prefeitura teve uma economia de mais de 4,5 milhões de reais. Por meio dessa modalidade, destacam-se alguns exemplos de aquisição dos quais se obteve uma economia acima do esperado no ano passado, tais como: aquisição de utensílios e equipamentos de cozinha, em que o valor máximo da proposta era de R$ 489 mil reais e o valor final foi de R$ 269 mil reais, gerando uma economia de R$ 220 mil reais para o município; a aquisição de uniformes escolares para fornecimento no corrente ano, com

valor proposto de R$ 565 mil reais e valor final de R$ 295 mil reais, perfazendo uma economia de 270 mil reais; mochilas escolares onde o valor proposto era de 210 mil e o valor final foi de 61 mil, com 149 mil reais de economia, entre outros. Essa modalidade de licitação, que é também uma disputa pelo fornecimento de “bens e serviços comuns”, acontece por meio da internet e é uma das medidas que veio para facilitar e modernizar a rotina do administrador público de Almirante Tamandaré. “O Pregão Eletrônico, além da economia, oferece outras vantagens tais como: agilidade, segurança, otimização de pessoal, transparência e modernidade nas licitações do município”, afirmou o Prefeito Vilson Goinski. Transparência e modernidade também são as palavras de ordem no novo sistema que será adotado pela Prefeitura, em fase de implementação no portal eletrônico do município. De acordo com a Lei Complementar nº 101, em vigor desde maio de 2009, municípios com população entre 50.000 e 100.000 habitantes tem o prazo de 2 anos para a adoção do sistema. De acordo com dados do IBGE de 2010, o município tem uma população de 103.245 habitantes. No entanto, em 2009, quando a lei entrou em vigor, o município possuía uma população estimada pelo IBGE de 97.523 habitantes, tendo portanto até maio deste ano para se adequar as normas da lei. Para visualizar o portal do município, acesse o site www. tamandare.pr.gov.br.

O prefeito Vilson Goinski obteve uma economia acima do esperado no ano passado

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FÁBIO CAMPANA Jornalista

Garçonnière

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avalheiro não leva dama ao motel. Convida-a para a sua garçonnière. Motel é para a massa middlebrown. A garçonnière é o refugio encantado do homem ou da mulher que se sentem sufocados por laços conjugais. É bom dizer que nada impede uma mulher casada ou solteira de ter a sua, pelas mesmas razões. A garçonnière deve, antes de tudo, ser discreta. Segura. Para que o namoro não corra o risco de uma intervenção deselegante. Imagine o quanto é desagradável ver um marido ou namorado a invadir a sua cama armado de garrucha e de orgulho ferido. Ainda vivemos num mundo bem menos civilizado do que o de Marcel Proust. Conheço uma senhora que exigia marcar seus encontros em motel sórdido do norte da cidade porque ali se sentia segura. Acreditava que o marido ou qualquer bisbilhoteiro que pudesse denunciá-la dificilmente frequentaria um lugar como aquele. Pois bem, a necessidade levou-a a estranho vício. Com o tempo ela se habituou à sordidez de tal forma que agora só sente prazer em lugares que cheiram a mofo dissimulado pelos detestáveis aromatizantes de ambiente. Mas essa é outra crônica. Voltemos à garçonnière e a pessoas de bom gosto. Diz-me uma amiga experiente que a segurança da garçonnière é importante para dar estabilidade emocional à convidada, sem o que tudo pode se perder em medos e reflexões sobre o adultério. É verdade que essa amiga é bastante ansiosa, embora seja psicanalista e capaz de decifrar a origem de todas as inseguranças alheias, menos as próprias. Não exagere em cuidados, recomenda. A garçonnière não deve ser angustiantemente camuflada. Isso pode levar sua convidada à mesma insegurança que prejudica o objetivo principal do encontro. O lugar deve ser um abrigo celestial, que pareça único e freqüentado apenas pela dama da vez. 26

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Nada da sensação de promiscuidade que os motéis de alta rotatividade sugerem. Além de discreta, segura, deve ser confortável e elegante. Leve para lá os livros e objetos que você gosta e que sua mulher vive engavetando ou tirando do lugar. A garçonnière deve ter o seu estilo. Jamais repetir o mau gosto das decorações de motéis que lembram o gosto genérico dos emergentes nativos e suas peruas de companhia. O interior deverá refletir o melhor gosto do anfitrião. Além de uma cama ampla, os melhores objetos, quadros e gravuras. Móveis e tapetes bonitos que façam parecer a extensão da casa de cada parceira. Nada acintoso, nada de gravuras eróticas, o erotismo deve ser o que emana do encontro. Banheiros são fundamentais. Se possível, uma banheira. Perfumes e loções displicentemente pousados à distância. Tudo muito limpo, o que exige alguém de confiança absoluta para fazer a arrumação. Alguém que não deixe nenhum sinal de sua existência logo que termina seu trabalho. Por fim, o bar. Não há garçonnière digna desse nome que não tenha um estoque razoável de champagne. Tenha sempre vinhos à disposição. Para as pessoas que preferem os destilados, os de melhores marcas, a começar pelo scotch. Por mais barrocos que esses detalhes possam parecer sua importância não deve ser desprezada. Alguém dirá que se a convidada aceitou o convite é porque sabe o que quer, com ou sem mobília e elegância. Mas lembre que as mulheres não são todas iguais e diz a nossa psicanalista ansiosa que a garçonnière ideal é aquela montada para a mais arredia, a mais histérica, a mais apavorada e mais hesitante das mulheres que, ao encontrar o seu ninho se sentirá homenageada e terá vontade de ficar para sempre. Sublime conquista. Fábio Campana é jornalista e escritor. Diretor da Travessa dos Editores e editor da Revista Ideias. Leia mais: www.fabiocampana.com.br


vereadores

Por dentro da Câmara Acompanhe o trabalho dos vereadores da Câmara Municipal de Curitiba TRÂNSITO

O presidente da Câmara Municipal de Curitiba, vereador João Cláudio Derosso (PSDB), propõe a implementação da Operação Escola em todas as unidades da rede municipal de ensino. A orientação do trânsito garante segurança adicional às crianças e jovens da capital. BAIRROS

O vereador Sabino Picolo (DEM) vai intensificar sua atuação nos bairros Cidade Industrial, Sítio Cercado, Jardim das Américas, Santa Cândida e Tarumã. “O objetivo é ampliar o atendimento às reivindicações da população”, explica o parlamentar.

HOMENAGEM I

Em sessão solene alusiva ao Dia Inter­ nacional da Mulher, 18 personalidades receberam uma homenagem da bancada feminina da Câmara Municipal. São mulheres com destacado trabalho em benefício da cidade. HOMENAGEM II

A bancada feminina no Legislativo municipal é formada pelas vereadoras Julieta Reis (DEM), Professora Josete (PT), Dona Lourdes (PSB), Nely Almeida (PSDB), Noemia Rocha (PMDB) e Renata Bueno (PPS). SEGURANÇA

A bancada do PT na Câmara Municipal de Curitiba, de acordo com o seu líder, vereador Jonny Stica, repudia o aumento da tarifa do transporte público. A passagem de ônibus na cidade subiu de R$ 2,20 para R$ 2,50, um aumento de 13,6%.

O delegado Vilson Alves de Toledo foi recebido pelo vereador Emerson Prado, líder do PSDB na Câmara de Curitiba. Alcioney Valeski Ferreira, que integra o Movimento dos Apro­ vados, formado por quase 3 mil selecionados em concurso público da Polícia Civil, participou da reunião sobre segurança.

TRINCHEIRA

TRABALHO

TARIFA

O vereador Jair Cézar (PSDB) solicitou à prefeitura uma trincheira em rua do Cajuru, pois os moradores enfrentam dificuldades para chegar às suas casas. Um trecho da via está “espremido” entre um córrego e trilhos da estrada de ferro.

O secretário municipal do Trabalho e Emprego, Paulo Bracarense, ocupou o espaço da Tribuna Livre da Câmara de Curitiba, no início de março, a convite do líder do prefeito na Casa, verea­ dor João do Suco (PSDB), e da Mesa

Executiva, comandada pelo vereador João Cláudio Derosso. TRABALHO II

Curitiba tem 666.769 trabalhadores com carteira assinada. Segundo Bracarense, “nos últimos 12 meses, o município gerou 39.655 novos empregos formais, atingindo o maior patamar desde o início da série avaliada”. AVIAÇÃO

Representantes dos aeronautas do Paraná detalharam aos vereadores seu posicionamento contra a determinação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), de fechamento do escritório de Curitiba e outras unidades do estado. O espaço foi cedido por solicitação do seg­ undo vice-presidente, Tico Kuzma (PSB). ESTACIONAMENTOS

O vereador Zé Maria (PPS) proto­colou projeto de lei para que os estacio­namentos privados tenham locais ade­quados para motocicletas e tarifa diferenciada dos carros. BIODIVERSIDADE

O vereador Juliano Borghetti (PP) sugere a concessão de prêmio anual a jornalistas, estudantes de ensino superior, professores e pesquisadores que pesquisem a biodiversidade local.

Câmara Municipal de Curitiba • www.cmc.pr.gov.br R. Barão do Rio Branco, s/nº — cep 80010-902 telefone: (41) 3350-4500 fax: (41)3350-4737

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Rogerio Distefano Advogado

Quando a nudez não é castigada

A

imagem da deputada Jaqueline Roriz não me sai da cabeça. Não por estar recebendo dinheiro de José Roberto Arruda, nada disso. Ela é do Distrito Federal, filha de Joaquim Roriz, gente de Brasília, Sodoma e Gomorra da nação brasileira. Lá todo mundo recebe dinheiro por fora, por baixo, pelo lado, aquilo é uma peneira de corrupção. Novidade é o filme feito pelo delator geral Durval Barbosa. Mas também não era sem tempo, em Brasília só faltava uma Consilux honesta flagrando os corruptos com câmeras escondidas. O que me chocou no filme onde Jaqueline Roriz recebe propina foi a beleza da deputada. Cabelos loiros bem escovados, baixíssimo percentual de gordura, bonita, é dessas quarentonas que mexem com o imaginário cinquentão – turbinado pelas fantasias que podem ser engendradas por qualquer deputada, inda mais deputada brasiliense. Receber dinheiro, isso não tem problema,

Com tanta coisa para esconder, Jaqueline devia mesmo é revelar-se toda nas páginas da Playboy pelo menos duas outras deputadas do Distrito Federal receberam da mesma fonte, e também não declararam. Mas não eram – continuam não sendo – bonitas como Jaqueline. E pegar Jaqueline no pulo foi maldade, mas paciência, ela devia saber onde estava se metendo. Não vou cair na bobagem de dizer que a deputada não precisava do dinheiro entregue pelo delator geral, porque precisava. Mesmo sendo rica, filha de pai riquíssimo, ela precisava. A explicação os próprios corruptos fornecem: era dinheiro para a campanha. Acredito piamente e dou minhas razões. Devemos fixar o momento: o dinheiro foi entregue nas vésperas da eleição; então não era compra de deputado, extorsão de deputado contra governador, essas coisas. Dinheiro de corrupção não é entregue para o político na véspera ou durante a campanha. 28

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É entregue depois que ele está eleito, porque é quando o político tem poder, pode ajudar como pode prejudicar, exato aí sobe sua cotação na bolsa da corrupção. Portanto, o dinheiro entregue para Jaqueline era o tradicional “recurso não contabilizado” da nossa linguagem rica em eufemismos. O dinheiro que Jaqueline recebeu tinha apenas dois problemas: 1) tem origem mal explicada, suspeita; 2) não foi declarado à Justiça Eleitoral. Mas Jaqueline errou o suficiente para se incomodar. Seja propina ou contribuição de campanha, a deputada não escapa, pois estava no lugar errado com a roupa errada. Explico de novo. Os flagrados no mensalão de Brasília foram colhidos pela câmera delatora de Durval Barbosa rigorosa e sobriamente vestidos. Guardavam dinheiro em bolsos, bolsas, cueca e meias, uma deputada escondeu no fundo falso do closet e a promotora pública chegou a enterrar no quintal. Não quero dizer que os flagrados deveriam receber o dinheiro suspeito em trajes de Adão e Eva, completamente nus – porque não haveria como esconder e levar o dinheiro, e a câmera estaria ali de todo jeito. Mas conheço o precedente esperto do diretor de estatal que escolhia justo a sauna para receber propina – pior, ‘sauna mista’; ainda jogava na conta do empreiteiro a tarifa da massagista. Está aí o segredo. Não tem aparelho para baralhar conversa telefônica e evitar grampos? Pois bem, o diretor da estatal sabia evitar tanto grampos como filmadoras. Onde o empreiteiro iria esconder o microfone e a lente para documentar a propina? Admitamos que conseguisse esconder, empreiteiro é esperto, mas o vapor e a umidade tirariam o foco e queimariam os circuitos dos aparelhos. Com tanto coisa para esconder, Jaqueline devia mesmo é revelar-se toda nas páginas da Playboy. Daria dinheiro limpo para ela e diversão sadia para os brasileiros. Rogerio Distefano é advogado e colunista da Revista Ideias. Leia mais: www.maxblog.com.br


JApÃo KARen FuKuSHiMA

era uma vez a ilha da Boa Sorte

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unca ouvi tantas vezes e repetidamente meu sobrenome como agora. Fukushima. Sempre me orgulhei do significado – Ilha da Boa Sorte ou Ilha da Felicidade. Hoje, o nome Fukushima ganha muitos outros significados, menos o de boa sorte. Fukushima fica a 250 quilômetros ao norte de Tóquio com população de 300 mil habitantes. O que levou a até então desconhecida cidade aos holofotes internacionais foi a crise nas centrais de energia nuclear, decorrente do terremoto de 8.9 graus na escala Richter, segundo maior da história do país, e subsequente tsunami que arrasou o norte do Japão. O tremor violento causou a interrupção no fornecimento de energia que mantinha o sistema de refrigeração dos reatores. O superaquecimento causou a explosão de quatro dos seis reatores da usina, que liberaram grande quantidade de material radioativo no ar. O medo entre os japoneses e estrangeiros após o terremoto e tsunami do dia 11 de março era enorme. Agora o risco de contaminação radioativa toma conta do país. Os brasileiros no Japão se mobilizam para sair, mas o êxodo é tão intenso que não há passagens disponíveis para todos. No consulado brasileiro em Tóquio, o número de pedidos de passaporte quintuplicou. Nem todos querem voltar imediatamente, mas precisam estar com todos os papéis em ordem caso a situação se agrave. No aeroporto de Tóquio a fila de espera para voltar ao

Flickr/Sargento Jeremy Lock

A cidade de Fukushima, no Japão, traz medo e insegurança ao país já arrasado pelo terremoto e tsunami.

Brasil chega a duas semanas. Assim como milhares de brasileiros descendentes de japoneses, sou mais uma que aguarda ansiosa o retorno dos familiares. Um dia após o acidente, sem ter notícias dos meus no Japão, busquei contato. Com sorte, consegui falar com um primo pela internet. Eram cinco horas da tarde aqui e madrugada por lá. Tudo estava bem e naquele momento nada se falava ainda sobre as usinas. Há poucos dias, soube que minha tia, Toshimi Fukushima, quer antecipar sua volta que já estava programada para este ano. Mas até agora não conseguiu passagem. Não há o que fazer daqui a não ser esperar, valendo-nos da típica e agora necessária paciência oriental.

Sem dúvida, Fukushima será símbolo, assim como Chernobyl, do desastre nuclear. São casos e proporções diferentes, mas assustam da mesma forma. Faz parecer que não somos capazes de manter uma energia deste nível sob controle. Fukushima pode não significar o fim da era nuclear, mas com certeza será responsável por inaugurar um novo capítulo, de cuidados e prevenção. A mesma energia nuclear que ganhou espaço nos últimos anos como uma alternativa aos combustíveis fósseis por não agredir ao meio ambiente – energia limpa – agora mobiliza a comunidade internacional com o perigo da contaminação radioativa. O mundo todo se

Alerta de Radiação

questiona e revê seus sistemas de segurança. A Suíça adiou a construção de novos reatores. A Índia anunciou uma revisão completa de seus procedimentos de segurança. No Brasil uma audiência pública discute os projetos de construção de usinas nucleares no país e a situação das usinas que já estão em funcionamento (Angra 1 e Angra 2). Compartilho com Fukushima não somente a igualdade fonética do sobrenome e as possíveis raízes genéticas com os nativos. Mas a esperança de que a cidade possa voltar a se orgulhar do seu significado e faça deste episódio apenas um capítulo curto de sua história. Até o fechamento desta edição, ultrapassava 25 mil o número de pessoas confirmadas como mortas ou desaparecidas no Japão. A Agência de Polícia Nacional informou que 9.487 pessoas foram confirmadas como mortas e 15.617 como desaparecidas, um total de 25.104. Outras 2.755 pessoas ficaram feridas. Centenas de milhares tiveram de deixar suas casas e ir para abrigos. O terremoto tornou-se o maior desastre natural do Japão desde um grande tremor ocorrido em 1923, que matou 142 mil pessoas.

E a lista de alimentos contaminados aumenta a cada dia. Agora já são 11 vegetais proibidos por causa da radiação. O brócolis e o repolho cultiva-

As explosões na usina nuclear de Fukushima já apresentam consequências diretas na vida dos moradores

dos na região apresentam níveis de radiação 164 vezes maior do que o tolerado.

de Tóquio, a capital japonesa. O nível da radiação da água

O governo japonês paralisou a distribuição dos

das torneiras na cidade está o dobro do normal, o que é

alimentos da região de Fukushima na segunda-feira

perigoso para bebês de até um ano de idade. O reser-

(21) e desde então os mercados não recebem nada

vatório contaminado abastece 10 milhões de pessoas.

que possa estar contaminado.

abril de 2011 | abril de 2011 |

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RepoRTAgeM

Orlando Kissner/AENotícias

THAiS KAniAK

TRAgÉDiA no liToRAl As cidades litorâneas de Antonina, Morretes, Paranaguá e Guaratuba foram arrasadas pelas chuvas de março

Q

uarta-feira de cinzas. Data que marca o fim do Carnaval – período conhecido mundialmente pela alegria, pelas cores e pelos ritmos que tomam conta do país de Norte a Sul - foi marcada no Paraná por uma manifestação da natureza de força jamais vista antes nesta região dos trópicos. No dia 9 de março de 2011, depois da folia, a chuva começou de fininho, mas depois veio com tudo e com tal força que deixou as cidades de Antonina, Morretes, Paranaguá e Guaratuba debaixo d´água. A maior parte dos deslizamentos ocorreu de sexta-feira (11 de março) para sábado (12 de março). A devastação é considerada uma das maiores tragédias ambientais do Estado. Segundo o Simepar, o volume de chuvas da primeira quinzena de março ultrapassou quase o dobro do estimado para todo o mês de março. Em Antonina, onde foi decretado estado de calamidade pública, choveu 117,2 milímetros entre 30

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os dias 10 e 13 de março, sendo a média climatológica para o mês de 334 milímetros (veja gráfico ao lado).

cidadES arraSadaS Antonina, Morretes, Paranaguá e Guaratuba foram as cidades mais arrasadas pela forte chuva que caiu na região serrana. A tragédia foi tão avassaladora que fez com que o governador Beto Richa decretasse estado de calamidade pública em Morretes e Antonina. Foi a primeira vez que uma autoridade do poder executivo anunciou estado de calamidade para um município. Paranaguá e Guaratuba ficaram em situação de emergência. Números preliminares divulgados pela Defesa Civil do Estado apontaram que na primeira semana da tragédia morreram quatro pessoas. 14.363 moradores ficaram desalojados, 2.499 desabrigados

e mais de 4 mil casas foram danificadas e destruídas. A dimensão deste evento climático mobilizou vários setores públicos ao atendimento da população. Estado e prefeituras trabalharam em conjunto para garantir atenção prioritária à população do litoral. O governador Beto Richa anunciou a criação de um gabinete de emergência formado por secretários de Estado e presidentes de empresas governamentais. “Toda a estrutura do governo será direcionada para as comunidades atingidas. Uma situação como essa passa a ser prioritária e emergencial dentro das demandas do governo. Vamos trabalhar com eficiência e agilidade para que todos os problemas sejam solucionados”, disse Richa. O apoio do governo federal também foi solicitado pelo governador Beto Richa para a reconstrução dos municípios. Na visita do ministro da Integração Nacional,


SECS/Divulgação

Orlando Kissner/AENotícias

O governador Beto Richa e a secretária da Família e Desenvolvimento Social, Fernanda Richa, acompanharam de perto a tragédia no litoral

Fernando Bezerra, ao Paraná no dia 16 de março, Beto Richa entregou um relatório preliminar elaborado pela Defesa Civil que apontou prejuízos de R$ 87,973 milhões provocados pela enxurrada e deslizamento de terra. O governador também pretende solicitar a liberação de recursos do PAC 2 e parte das verbas destinadas à preservação de patrimônios históricos. O ministro sobrevoou as áreas atingidas e elogiou a ação do governo estadual que colocou técnicos, bombeiros e helicópteros para evacuar áreas de risco antes dos deslizamentos de terra. “Poderíamos ter perdido muitas vidas e isso não ocorreu pela ação do Estado. Pude verificar pessoalmente que todos os desabrigados estão sendo bem atendidos”, afirmou Bezerra. De acordo com o ministro, a orientação da presidente Dilma Rousseff é que o governo federal trabalhe em parceria e

Ponte metálica do exército enviada por determinação da presidente Dilma Rousseff

some esforços com o Estado e as prefeituras para atender os desabrigados e recuperar a infraestrutura. A presidente determinou o envio de uma ponte metálica do Exército para substituir temporariamente uma das pontes que foi derrubada pela enxurrada. A instalação da ponte permitiu que o tráfego entre a BR-277 e o município de Morretes fosse parcialmente normalizado. A ação liberou o principal acesso de Curitiba com as cidades do litoral. O secretário da Infraestrutura e Logística, José Richa Filho, garantiu empenho total para a liberação de avenidas, estradas e para a reconstrução das pontes interditadas. “A preocupação do governador é envolver as equipes na rápida busca de soluções para agilizar o atendimento aos municípios do litoral afetados pelas águas. A normalidade de

cHuva acumulada - milímEtroS (mm) EStação

10/mar 11/mar 12/mar 13/mar chuva acumulada entre 10 e 13/mar

Média climatológica março

Barragem Marumbi

44,4

164

17,4

5,8

231,6

227

Antonina

46,4

98,6

26,4

5,8

177,2

334

Guaricana

15,6

137,8

27,8

7,2

188,4

230

Salto do Melo - BR 376

63,4

155,2

38,8

34,8

292,2

230

Vossoroca - BR 376

20,6

99,4

16,6

22,8

168,4

230

Guaratuba

64,4

16,2

90,8

16,4

187,8

294

cHuva na SErra do mar E litoral - março dE 2011 300 250

10/mar

200

11/mar 12/mar

150

13/mar

100

Chuva entre 10 e 13/mar

50 0

Barragem Marumbi

Antonina

guaricana

Salto do Melo BR 376

vossoroca BR 376

guaratuba

Fonte: Simepar

vida nas comunidades deve ser o quanto antes restabelecida”, disse o secretário.

dESabrigadoS Outra questão crucial é a habitação popular. Os moradores desalojados e desabrigados foram encaminhados pela Defesa Civil para abrigos públicos. Mounir Chaowiche, presidente da Companhia de Habitação do Paraná (Cohapar), afirmou que busca recursos federais do Programa Minha Casa Minha Vida para a construção de novas moradias para a população que perdeu suas residências. A Secretaria da Família e Desenvolvimento Social, sob o comando de Fernanda Richa, em parceria com o Programa de Voluntariado do Paraná (Provopar) e a Defesa Civil, já tinha enviado, até o dia 21 de março, 359 toneladas de alimentos, roupas, colchões, leite, água mineral e produtos de limpeza e higiene pessoal para as vítimas das enxurradas no litoral. “É fundamental o trabalho conjunto para atender a população que necessita. Vamos atuar para que todos sejam atendidos”, afirmou a secretária da Família. Outra presença de peso na tragédia foi a da Polícia Militar do Paraná. O Comandante Geral da Polícia Militar, o Coronel Marcos Teodoro Scheremeta, contou que a PM foi um dos pilares no gerenciamento de crise no litoral do Estado. “Precisávamos manter a razão e atuar com planejamento e organização”, descreveu. A corporação enviou 450 policiais militares do Corpo de Bombeiros, das tropas abril de 2011 |

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da PM, da Polícia Rodoviária Estadual, do Batalhão de Polícia Ambiental e do Grupamento Aéreo. O Comandante relatou que já na sexta-feira, 11 de março, foi instalado um gabinete de gestão de crise em Paranaguá. Ele explicou que a ação da PM foi dividida em três etapas. A primeira foi a de preservação de vidas. A segunda foi o resgate das pessoas em risco ou isoladas; “resgatar e prover”, como definiu o Coronel. Já a terceira etapa se caracterizou na tentativa de minimizar os danos, ou seja, buscar solução: reconstruir pontes, encontrar alternativas para levar meios de subsistência, como água e energia elétrica. No bairro Graciosa, em Antonina, 152 casas foram evacuadas deixando 400 pessoas desalojadas na madrugada de domingo (13 de março) para segunda (14 de março). Em Paranaguá, 140 mil pessoas ficaram sem água durante dias por causa da enchente. “Faltou até farinha de pão em alguns lugares”, ressaltou o Comandante. Mas no meio do caos, houve também momentos de vida. O Coronel contou que houve oito partos no Hospital de Antonina, mesmo sem água e sem luz. “É gratificante”, afirmou. O Comandante destacou a importância da força-tarefa, da coordenação conjunta que envolveu governo estadual, prefeituras, companhias de água, energia e abastecimento, Ecovia, Defesa Civil, Corpo de Bombeiros e até rádios, que foram usadas para instruir a população e transmitir serviços de utilidade pública. O trabalho foi todo dividido. “Assim se sabe quem cuida do quê”, ilustrou o Comandante. Ele explicou que foi essencial estabelecer missões. Além do cuidado com a saúde física, também houve apoio psicológico, que ficou sob responsabilidade do serviço social, do voluntariado e da assistência social. O Coronel ainda relatou o difícil trabalho de convencimento para tirar as pessoas de suas casas. E ainda a atuação do efetivo policial para garantir que os moradores não voltassem às suas residências em áreas de risco e impedir que mal intencionados entrassem nas casas para roubar. Nestas horas de transtorno o ser humano tem a possibilidade de usar sua 32

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Orlando Kissner/AENotícias

O Coronel Marcos Teodoro Scheremeta (o segundo à esquerda em pé), Comandante Geral da Polícia Militar do Paraná, no gabinete de gestão de crise instalado em Paranaguá

capacidade tanto para o bem como para o mau. Um exemplo foi a comercialização de galões de 20 litros de água pelo preço abusivo de R$ 70,00. Nestes casos, a Polícia Militar – em comum acordo com o Procon, a Delegacia de Proteção ao Consumidor, o Poder Judiciário e o Ministério Público – apreendeu o material para doar às vítimas da enchente.

Voluntários Para contrapor o mau exemplo, houve o caso de mais de 100 policiais militares e bombeiros que trabalharam voluntariamente. Eles já tinham sido dispensados por terem trabalhado direto na Operação Viva o Verão 2010-2011 no litoral, que começou dia 11 de dezembro e terminaria em 14 de março, mas foi estendida até o fim do mês de março devido à enchente. Depois das duas primeiras semanas mais críticas, o Coronel explicou que o gerenciamento de crise feito pela Polícia Militar estava chegando ao fim. “Começamos a sair de cena, claro que mantendo o reforço nas cidades e o assistencialismo dos bombeiros. Mas agora vem a hora da reconstrução, que cabe ao poder público”, explicou o Coronel. Ele acredita que deve demorar mais de um ano para que se volte à normalidade. Além da recuperação das estradas e da reconstrução das cidades, também está sendo tratada a questão do impacto ambiental. O Comandante contou que tem sido pensado – sob a supervisão do Ministério Público – em como utilizar as árvores e toras, que foram arrastadas pela

chuva, na reconstrução. “Não pode pegar este material e descartá-lo”, afirmou.

Apocalíptico Jeferson José Pereira trabalha na área administrativa do Restaurante Ponte Velha, em Morretes. Ele relatou o drama que a cidade viveu nos apocalípticos dias de chuva sem fim. “No dia 11 (de março), quando acordei e vi a chuva, saí para ajudar. Quem podia, estava ajudando. Todos ficaram 24 horas ligados, com medo”, disse. Pereira contou que toda a comunidade se mobilizou, em suas palavras: “um ajudou o outro”. Ele explicou que, aos poucos, a vida vai voltando ao normal e que a vontade de recomeçar é grande. “A vontade é duplicada, mas o sol precisa voltar a brilhar forte para melhorar a situação. Com esta garoa, todo mundo fica apreensivo”, declarou. Segundo Pereira, os moradores do centro do município estão seguindo em frente. “Joga-se fora o que estragou, compra novo ou então se ganha e, assim, as pessoas vão tocando”, afirmou. Mesmo com a vida voltando aos eixos, Pereira não consegue apagar de sua mente a imagem que viu na Floresta, na zona rural de Morretes, que foi fortemente castigada pela chuva. “Nunca vi nada pior, não sei se o tsunami ganhava. Era uma onda de lama vindo com troncos de árvores que chegavam a ter dez metros de comprimento e larga espessura de diâmetro”, relembrou. Ele ainda disse que hoje não se reconhece mais aquela região, não se vê mais nada e que o acesso só é possível com trator de esteira. A cidade, famosa por seus restauran-


Orlando Kissner/AENotícias

com a Palavra, o ESPEcialiSta

Orlando Kissner/AENotícias

1.

Osvaldo Ribeiro

2.

3. 1. A BR-277, que liga Curitiba ao litoral do Estado, foi interditada devido aos danos causados pela chuva 2. Morretes debaixo d’água com as chuvas de março 3. Mais de 300 toneladas de donativos foram enviadas às vítimas da enchente e dos deslizamentos

tes que ficam cheios nos fins de semana, vive neste momento pós-tragédia uma ausência de turistas. “É uma sensação de desemprego, de insegurança”, disse Pereira. O restaurante onde trabalha quase não foi atingido, apesar de o rio passar a poucos metros dele. A água entrou apenas no depósito e a chuva causou fissuras no telhado, acumulando água na laje, o que causou infiltração. Os danos já foram consertados e o restaurante reabriu as portas ao público no dia 21 de março. Agora a expectativa é seguir em frente.

Renato Lima, geólogo e integrante da Coordenação e Avaliação de Desastres da ONU e também coordenador do Centro de Apoio Científico em Desastres da Universidade Federal do Paraná (Cenacid), explicou que inundações e deslizamentos são processos geológicos perigosos, assim como erosão e cabeça d’água, um fenômeno proveniente da chuva que cai em um determinado lugar, principalmente em serras e aumenta o nível de água, podendo provocar uma enchente. Estes processos sozinhos não gerariam problema. O que causa a tragédia é a presença do homem no local. “Sem homem não há desastre”, definiu. Lima disse que inundações na região serrana são um processo natural, mas que a impermeabilização que o homem faz nos terrenos nas cidades agrava este processo natural. “O que seria meio metro de alagamento vira um metro”, exemplificou. Uma equipe do Cenacid formada por Lima e mais cinco geólogos passou oito dias no litoral do Estado, com sede em Antonina, para fazer uma gestão do desastre. A missão do grupo foi dividida em duas linhas: apoio à Defesa Civil e avaliação emergencial de riscos nas quatro cidades atingidas pela chuva. Nesta avaliação, foi mapeado o que iria deslizar, o que estava deslizando, onde poderia ficar e onde não poderia. Lima também esteve no estado do Rio de Janeiro, no mês de janeiro, quando a chuva devastou a região serrana do Rio. O geólogo contou que os processos perigosos ocorridos nos dois estados foram do mesmo tipo e que no litoral do Paraná, a magnitude dos processos foi ainda maior. “Aqui, provavelmente, mais do que lá. Tivemos danos estratégicos, como a interdição de uma ferrovia e de duas rodovias importantes, a BR 277 e a 376”, declarou. Para Lima, a diferença entre o número de vítimas fatais nos dois estados se deve ao fato de os deslizamentos nos municípios do Rio terem acontecido a noite, pegando as pessoas despreparadas, e a densidade populacional lá ser mais alta. “As áreas atingidas com centenas de deslizamentos aqui no litoral do Paraná eram pouco habitadas e ocorreram durante o dia. Isto faz muita diferença para o número de vítimas”, explicou. Os municípios paranaenses atingidos pela enchente e pelos deslizamentos passaram por uma mudança de paisagem. Segundo o geólogo, foram cerca de cinco mil deslizamentos no litoral. E, agora, encostas, rios e áreas secas estão em novos lugares. “Precisa-se conhecer novamente, estabelecer uma nova relação do homem com o ambiente”, esclareceu. O que poderia evitar que um desastre natural como este ocorresse, seria um mapeamento de risco geológico nas cidades em escala de detalhe, que seria de, no máximo, 1 para 10.000. “Risco zero não existe, mas o mapeamento do risco geológico permite planejar ações concretas para refazer o plano diretor municipal e, assim, buscar melhores condições de segurança”, afirmou. Neste mapeamento, detectam-se quais são os tipos de perigo, onde eles estão e se tem uma ideia aproximada de frequência. Desta forma, poderia indicar possibilidades de ação. Lima ainda afirmou que este foi o maior desastre dos últimos 30 anos na região litorânea do Estado. Mas que evidências geológicas mostram que já tiveram processos geológicos da mesma magnitudes ou maior. “Lembrando que para ser um desastre é necessário ter uma consequência”, finalizou. abril de 2011 | abril de 2011 |

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econoMiA SARAH coRAzzA

novo caminho para a

agricultura familiar

A

agroindústria familiar e os produtos tradicionais ganham espaço nas prateleiras dos supermercados paranaenses. Para se ter uma ideia, a última edição da Feira de Sabores do Paraná realizada em Curitiba reuniu mais de 32 mil visitantes e movimentou cerca de R$ 1 milhão – entre as vendas diretas e futuras dos 1.200 produtos oferecidos. Já a realizada no mês de janeiro em Guaratuba, contou com a participação de 25 mil visitantes e pouco mais de R$ 200 mil em vendas diretas.

Heraldo Gillung transformou o sonho em realidade. Hoje vive da fabricação e comercialização da cerveja

No acompanhamento realizado pela organização da Feira de Sabores do Paraná foram verificadas ainda a visita de sete excursões da região metropolitana de Curitiba e também de Santa Catarina. “Estes grupos trouxeram técnicos, estudantes, professores e consumidores interessados na singularidade dos produtos apresentados”, explica Eder Dalla Pria, 34

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coordenador do Programa de Agroindústria Familiar - Fábrica do Agricultor, da Secretaria da Agricultura.

SEm rESSaca Heraldo Gillung, 60 anos, é um grande ideologista. Daquelas poucas pessoas que têm uma ideia na cabeça, acredita

nela e corre atrás dos seus sonhos para fazer com que se concretizem. Dos pais, herdou o gosto pelo campo e agricultura e desde cedo começou a trabalhar com a terra. No início plantava cevada e vendia a produção para a fábrica da Antarctica, que funcionava em Ponta Grossa. E foi plantando a principal matéria-prima para a fabricação da


bebida que o agricultor de Palmeira, nos Campos Gerais, teve a ideia de produzir sua própria cerveja. Para isso, participou de alguns cursos, separou um pouco da cevada que plantava e começou a fazer seus experimentos. “Há mais de 30 anos, comecei a fazer minha cerveja e descobri que os cursos que frequentava não eram bons porque nem eu conseguia beber. Ela era muito ruim”, confessa Heraldo. Mas isso não o fez desistir do seu plano: produzir uma cerveja de qualidade. Continuou pesquisando e estudando e descobriu que algumas cervejas fabricadas na Alemanha eram famosas porque não davam a famosa ‘ressaca do dia seguinte’. “Sempre gostei de tomar aquele copinho a mais e depois era aquela dor de cabeça. Pesquisando descobri que isso acontecia porque as cervejas que tomava, essas comuns que encontramos nos mercados, não eram fabricadas com o puro malte. Mas que havia na Alemanha umas cervejas diferenciadas que não davam ressaca. Neste momento decidi que a cerveja que eu produziria seria deste tipo, das melhores”, contou. O agricultor ficou quase duas décadas em cima das pesquisas e estudos, mas não conseguia produzir uma cerveja realmente boa. Só em 2004, quando participou de um curso sobre tecnologia cervejeira, ministrado por técnicos alemães, na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC PR) é que Heraldo aprendeu como fazer para que a sua cerveja ficasse semelhante as produzidas na Baviera, desde 1916. Neste curso aprendeu que para se fabricar uma cerveja de qualidade é necessário apenas água mineral, lúpulo e fermento e que a qualidade dos produtos utilizados influi diretamente no sabor da cerveja. As cervejas tidas como “comuns” costumam utilizar arroz, milho, açúcar e outros carboidratos na sua composição, o que possibilita que o preço seja menor. Enquanto o malte custa R$ 1,50 o quilo, a quirela pode ser encontrada a R$ 0,05 o quilo. “Fiz mais de seis

cursos e só neste da PUC é que aprendi que apenas o malte deve fermentar, os outros produtos servem apenas para dar cor e sabor à bebida. É isso que a deixa mais suave, que agride menos a garganta”, explica.

autÊntica cErvEJa alEmã dE PalmEira Somente após as dicas dos mestres cervejeiros alemães, Heraldo conseguiu produzir uma cerveja de qualidade, agradável para o consumo e boa para a comercialização. Neste momento surgiu a Nat Bier, que significa, cerveja natural. O nome é devido à matéria-prima utilizada e o processo de fabricação. Hoje, Heraldo fabrica 15 tipos de cerveja, todas de puro malte. A mais vendida é a de trigo. Alguns maltes ele faz na sua propriedade com a ajuda da esposa e de dois funcionários, os mais simples compra de uma cooperativa agrária que fica na região de Guarapuava “porque é mais barato e não vale a pena produzir” e o resto importa da Alemanha. A água utilizada também não passa por nenhum processo químico, o que ajuda a garantir a qualidade e não é utilizado nenhum tipo de oxidante. “Nossa cerveja é diferenciada e o gosto se aproxima muito das produzidas na região da Baviera. Há seis anos compro diversos tipos de cervejas alemãs e experimento para comparar o gosto”, afirma. A participação na Feira de Sabores, produzida pelo governo do Paraná, foi um divisor de águas na comercialização da cerveja produzida em Palmeira. De acordo com Heraldo, apenas depois da feira ele conseguiu vender seu produto para bares e mercados especializados em cervejas importadas de Curitiba e Ponta Grossa. “A feira funciona como uma vitrine para nós, pequenos agricultores. As pessoas puderam experimentar a cerveja, comprar e depois começaram a procurar nos comércios especializados. Isso fez com que alguns comerciantes nos procurassem e os negócios começassem a expandir”, conta. abril de 2011 |

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FeiRA De SABoReS: vitrine dos pequenos produtores

N comPotaS orgÂnicaS Em 2004, quando começou a participar da Feira de Sabores, Heraldo e sua esposa Marina tiveram a ideia de diversificar um pouco os produtos. Fabricaram compotas de frutas. Também produziram as compotas de maneira diferenciada. Por isso, só trabalharam com produtos orgânicos, sem conservantes e consequentemente o preço também era um pouco mais caro que as compotas encontradas com facilidade em qualquer supermercado e o lucro menor. “Eram compotas orgânicas. Sempre com matéria-prima de ótima qualidade. Tentamos a venda em algumas edições da feira, mas o retorno das compotas sempre foi muito menor que o da cerveja”, explica Heraldo. Com o tempo, a demanda da Nat Bier também cresceu e a fábrica precisou de mais espaço. Assim, o local que antes era utilizado para produzir as compotas foi transformado e adaptado para a fabricação da cerveja. “Hoje consigo viver só com a fabricação e comercialização da cerveja. Parei de plantar e meu trabalho é voltado totalmente para a Nat Bier. Conto com a ajuda da minha mulher e dois funcionários. Minhas filhas ajudam sempre que podem. Uma agora está fazendo doutorado em biologia na Alemanha”, comemora.

artESanato dE bananEira Transformando o tronco da bananeira em artesanato. Foi assim que Ana Gomes Armstrong, 45 anos, começou a ganhar o sustento da família. Moradora 36

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da zona rural de Morretes, aprendeu a transformar e agregar valor ao tronco da bananeira. As frutas, até então sem serventia, eram doadas para famílias carentes e distribuídas pela vizinhança. Comercializava seu artesanato nas feiras locais, mas o retorno sempre era pequeno, o que dificultava o sustento da família. Em 2004, Ana resolveu participar pela primeira vez da Feira de Sabores. Surpreendeu-se com a participação do público e as vendas. Teve algumas ideias para fabricação de novos produtos e começou a pensar em outras possibilidades para aumentar a renda. Há dois anos, depois de alguns testes criou a Essências da Terra e começou a fabricar a batata chips. No ano seguinte se arriscou também com a banana chips e a bala de banana, utilizando as frutas das bananeiras que antes não tinham serventia. Com o tempo e o aumento da demanda, o marido e os dois filhos começaram a se dedicar à produção dos produtos oriundos da banana. Hoje, tudo o que produzem comercializam nas feiras. “Participamos das feiras aqui de Morretes e sempre que temos condições comparecemos a Feira de Sabores também. Ela é tudo pra gente, além do lucro nos dá visibilidade. Representa 80% dos nossos atendimentos”, conta Ana. Segundo a produtora, após o evento, sempre recebe alguns pedidos. “As pessoas entram em contato com a gente para conseguir adquirir mais dos nossos produtos, mas acabam fazendo um ou dois pedidos e depois acabam parando”.

ão importa a região nem o ramo de atuação dos pequenos produtores e agricultores familiares. Todos são unânimes em apontar a Feira de Sabores como a principal vitrine para a comercialização dos seus produtos. Desenvolvido pelo Governo do Paraná desde 1999, através da Secretaria de Agricultura, o programa incentiva os agricultores a transformar e industrializar sua produção para agregar mais renda e gerar empregos na localidade onde se encontram. O maior atrativo fica por conta dos expositores que possuem receitas únicas, muitas vezes passadas pelas famílias de geração em geração. Além das feiras, os produtores podem comercializar seus produtos nos supermercados associados à Associação Paranaense de Supermercados – Apras, que possuem as gôndolas da Agroindústria Familiar do Paraná. Só para este ano estão previstas mais de 30 edições da feira, que abrange produtores e agricultores familiares de todo o Estado. O que além de movimentar a economia serve de vitrine para a agroindústria familiar. Para Heraldo, o fabricante de cervejas apenas depois da feira ele conseguiu vender seu produto para bares e mercados especializados em cervejas importadas de Curitiba e Ponta Grossa. “A feira funciona como uma vitrine para nós, pequenos agricultores. As pessoas puderam experimentar a cerveja, comprar e depois começaram a procurar nos comércios especializados. Isso fez com que alguns comerciantes nos procurassem e os negócios começassem a expandir”, conta.


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reportagem

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MARcelo vellinHo Fotos Átila Alberti

cuRiTiBA

MAncHADA De SAngue A cidade conhecida como capital ecológica e que ostenta índices invejáveis de condições de vida perde parte de seu charme desde que foi tomada pela violência

c

idade sorriso. Rotulada de capital ecológica pela Organização das Nações Unidas (ONU), com melhor qualidade e padrão de vida do país. Altos índices de educação que a preconizaram como a cidade do conhecimento. Referência no transporte urbano, impressiona pela limpeza e organização de suas praças e parques. Aos quatro cantos, é exaltada como “de primeiro mundo”. Esta é Curitiba, capital do Paraná, a maior cidade do Sul do Brasil. Para boa parte dos curitibanos – que se reúne em clubes luxuosos, discute a instabilidade do mercado financeiro em restaurantes refinados e difunde orgulhosamente as virtudes da cidade em viagens anuais à Europa – Curitiba é assim, um

exemplo a ser seguido. Difícil é convencer outra parcela da população – muito maior, diga-se de passagem – que tudo isso é verdade. Os curitibanos de classe social mais baixa, excluídos da atenção das autoridades, que se amontoam em invasões às margens de rios poluídos, abrigados em casebres de madeira, à mercê dos ineficientes serviços públicos. Povo que sofre, em becos escuros e estreitas ruelas de saibro, com o crescimento desproporcional do tráfico de drogas e o consequente domínio de grupos criminosos. É principalmente esta gente que sente na pele a dificuldade de morar na 6.ª capital mais violenta do país – conforme estudo divulgado recentemente pelo Ministério da Justiça, baseado em dados de 2008. A pesquisa revela que, levando em

conta o número de homicídios e o tamanho da população, Curitiba é mais perigosa que Porto Alegre, Belo Horizonte, Brasília, Rio de Janeiro, Florianópolis e São Paulo, cidades que também apresentam altos índices de qualidade de vida. Apenas quatro capitais do Nordeste e uma do Sudeste foram mais violentas que Curitiba, naquele ano. Infelizmente, de lá para cá, o quadro não se alterou. De acordo com levantamento do site Crimes Curitiba, no ano passado 860 pessoas foram assassinadas na capital paranaense, ou seja, mais de 70 por mês. Significa que a cada 10 horas e 11 minutos uma viatura do Instituto Médico Legal (IML) – sucateada, por sinal – atravessou a cidade para recolher o corpo de uma vítima da violência. Os números revelam o preocupante índice abril de 2011 |

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de 49,2 mortes por 100 mil habitantes. É tanta violência que, para a ONU, o índice é considerado epidêmico (o tolerável gira em torno de 10 a 12 mortes por 100 mil habitantes). Para efeito de comparação, nas europeias Londres, Paris, Roma e Madri, cidades inegavelmente de primeiro mundo, o índice não chega a duas mortes para o mesmo grupo de moradores. A ampla diferença deixa o “sorriso” da nossa cidade um tanto amarelado. Os dados são ainda mais estarrecedores quando somados aos desestruturados municípios da região metropolitana. Foram 1.850 assassinatos nas 26 cidades que integram a Grande Curitiba, alcançando a média, quase bélica, de cinco vítimas fatais por dia. Cidades como Piraquara e Pinhais, por exemplo, atingiram no ano passado índices espantosos de 131 e 105 mortes por 100 mil habitantes, suficiente para incluí-las na indesejável lista das 15 mais violentas do país.

violÊnciA eM 2010 GRANDE CURITIBA 1850 assassinatos 58,3 mortes por 100 mil habs.

CINTURÃO DA MORTE

cuRiTiBA Não é difícil apontar onde está situada a violência na capital paranaense. Bairros como Cidade Industrial, Cajuru, Sítio Cercado, Tatuquara e Boqueirão figuram com frequência nas manchetes policiais e há anos aparecem no topo do ranking da criminalidade. Ano passado, 44% dos assassinatos praticados em Curitiba aconteceram nesses bairros. Alguém pode justificar alegando que são regiões populo-

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sas. De fato, são. Porém, representam não mais que 30% da população da cidade. O que realmente contribui para a violência nesses lugares são os baixos níveis de desenvolvimento econômico e social, reflexo da pouca participação do estado, que culminam com o surgimento de invasões irregulares onde impera o tráfico de drogas. Por outro lado, bairros como Água Verde

e Portão, que também são bastante populosos, porém mais centrais e com melhor padrão de vida, contam com índices de criminalidade bem mais baixos. Ao analisar o mapa da violência de Curitiba é possível dividir a cidade em duas partes. A região que abrange o Sul, o

Sudoeste e o Leste da cidade é a que mais sofre com assassinatos. É formada por 13 bairros e forma um “cinturão da morte”(demarcado pela área vermelha escura no mapa), que começa no Cajuru e segue até a Cidade Industrial e o Caximba. Ano passado, foi palco de 556 assassinatos, ou seja, 65% do total. Os dez bairros com mais homicídios estão nessa área.

Em contrapartida, a outra faixa da cidade - que engloba a área central e as regiões Norte, Nordeste e Noroeste – lida menos com a violência (parte mais clara do mapa). Nesta porção, formada por 62 bairros, estão os únicos dez que não registraram um assassinato sequer em 2010. Ao todo, foram 304 crimes fatais e os bairros mais violentos foram Pilarzinho, Centro, Fazendinha e Parolin.


A criminalidade atingiu um patamar tão elevado que alarmou o novo secretário de Segurança Pública do Paraná, Reinaldo de Almeida César, empossado em janeiro. “É inacreditável que nosso Estado tenha índices tão altos de violência”, declarou em uma de suas primeiras entrevistas no cargo.

drogaS São inúmeros os fatores que contribuem para a propagação do crime e o avanço da violência. Problemas sociais comuns em periferias e invasões, como a falta de educação e oportunidades, desestruturação familiar e as quase nulas opções de lazer, frequentemente tiram jovens do trabalho honesto e os lançam para o mundo da criminalidade. Surge o tráfico de drogas e a ilusão de uma vida melhor, embora perigosa. O dinheiro rápido e fácil, o poder e a intimidação das armas se tornam mais atraentes que o serviço pesado e normalmente mal remunerado.

No entanto, como diz o ditado popular, o tráfico de drogas muitas vezes é um caminho sem volta, com destino à cadeia ou ao cemitério. As autoridades policiais são unânimes em afirmar que mais de 80% dos assassinatos são motivados por alguma desavença originada pelo envolvimento com as drogas. “O crack é um flagelo e 98% dos municípios brasileiros sofrem com ele. Precisamos combatê-lo como às outras drogas, que não são só um problema de polícia, mas uma questão de política pública”, declarou o secretário Almeida César. Boa parte das vítimas ingressa no tráfico para ganhar dinheiro e, em pouco tempo, se torna dependente químico. Começa a vender para sustentar o vício e, quando não tem mais, passa a furtar e roubar. Sem limites, chega a tirar objetos da própria casa e da família para trocar por algumas pedras. Se der sorte, acaba na prisão. Se não, entra para as estatísticas de mortes por assassinato.

baiXo invEStimEnto Mas se as drogas estão espalhadas por todos os cantos e o tráfico é um problema que aflige o mundo todo, por que os números da violência são maiores na Grande Curitiba? Para muitos, a resposta está no crescimento acelerado da população nas últimas décadas, que veio desa-

Drogas: as autoridades afirmam que o tráfico está por trás da grande maioria dos assassinatos abril de 2011 |

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em 2010, cinco pessoas foram assassinadas por dia, em média, na grande curitiba companhado de investimento na área da segurança pública. Em 30 anos, o número de habitantes aumentou em 106%, causando inchaço das cidades e agravando os problemas sociais. Por outro lado, a estrutura da polícia paranaense não acompanhou esta mudança, deixando uma lacuna que aos poucos foi sendo preenchida pela marginalidade, e propiciou o aumento da circulação de drogas e armas no estado. “A segurança pública piorou dramaticamente, na última década, com redução de investimentos e de efetivo policial e aumento paralelo significativo da criminalidade”, disse Almeida César.

De acordo com o secretário, para cumprir a legislação, o Paraná precisaria hoje contratar 10 mil policiais militares e dobrar o efetivo da Polícia Civil, que, atualmente, segundo o Sindicado das Classes Policiais Civis do Paraná (Sinclapol), é de aproximadamente 3,5 mil. “Nos últimos anos foram contratados policiais apenas para suprir os que haviam saído”, lamenta André Luiz Gutierrez, presidente do sindicato. O delegado Rubens Recalcatti, há 30 anos na carreira policial,

concorda. “A estrutura da nossa polícia hoje é a mesma de décadas atrás”, relata.

invEStigaçÕES PrEJudicadaS A falta de recursos no setor da segurança atinge diretamente as delegacias especializadas e os distritos policiais de Curitiba e região metropolitana. A Delegacia de Homicídios, por exemplo, responsável por investigar praticamente todos os crimes contra a vida ocorridos na capital, conta hoje com seis delegados e cinco equipes de investigadores, que recebem cerca de 60 inquéritos mensais. Como os policiais se dividem por turnos e não por região, muitas vezes são obrigados a investigar casos em cantos opostos da cidade, desperdiçando tempo e informações que podem ser fundamentais na

peRFil DoS ASSASSinAToS nA gRAnDe cuRiTiBA eM 2010

15 BAiRRoS MAiS violenToS

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 44

BAIRRO MORTES CIC 145 Cajuru 71 Sítio Cercado 66 Tatuquara 55 Boqueirão 45 Pinheirinho 37 Alto Boqueirão 31 Xaxim 30 Uberaba 28 Ganchinho 21 Pilarzinho 19 Umbará 17 Centro 16 Fazendinha 16 Parolin 16 | abril de 2011

TIPO DE CRIME Homicídio*: 1.726 (93,5%) Confronto com a polícia: 73 (4%) Latrocínio: 51 (2,5%)

SEXO DA VÍTIMA Homem: 1.675 (90,5%) Mulher: 175 (9,5%)

*inclui lesão corporal seguida de morte

FAIXA ETÁRIA DA VÍTIMA 0 a 15 anos: 50 (2,5%) 16 a 25 anos: 814 (44%) 26 a 35 anos: 555 (30%) 36 a 45 anos: 257 (14%) 46 ou mais: 162 (11,5%) Não apurado: 12 (0,5%)

ARMA USADA Arma de fogo: 1.511 (81,5%) Agressão física: 183 (10%) Arma branca: 136 (7,5%) Carbonizado: 11 (0,5%) Não apurado: 9 (0,5%) Fonte: www.crimescuritiba.com


Perigo: Campina Grande do Sul, Pinhais e Piraquara estão entre as cidades mais violentas do Brasil

RegiÃo MeTRopoliTAnA A região metropolitana de Curitiba é formada por 25 municípios, excluindo a capital, e sua população é de aproximadamente 1,4 milhão de pessoas. Em função do intenso fluxo migratório – motivado principalmente pelo atrativo das grandes empresas – e do crescimento desordenado, os municípios vizinhos testemunharam o agra-

vamento de inúmeros problemas urbanos e sociais. O resultado foi a transformação de boa parte deles em um verdadeiro faroeste. Os índices de violência beiram o inacreditável. Pinhais, Piraquara e Campina Grande do Sul, por exemplo, estão na lista das cidades mais perigosas do Brasil, quando se calcula o

número de mortes por habitantes. Além delas, Almirante Tamandaré, São José dos Pinhais, Fazenda Rio Grande, Colombo, Araucária, Rio Branco do Sul e Quatro Barras têm taxas de assassinato maiores que Curitiba. A criminalidade está tão espalhada que apenas o município de Doutor Ulysses passou 2010 sem registrar homicídio.

CIDADES

ASSASSINATOS

MORTES POR 100 MIL HAB.

Piraquara

123

131

Pinhais

123

105

Campina Grande do Sul

36

92,1

Almirante Tamandaré

89

86,4

São Jose dos Pinhais

189

71,8

elucidação dos crimes. Há anos, a classe policial reivindica, sem sucesso, a criação de uma Divisão de Homicídios, com departamentos de investigação espalhados pela capital. Na região metropolitana o problema é ainda mais grave. A maioria das delegacias sofre com o pequeno efetivo e as carceragens superlotadas. Casos de assassinatos são atendidos, normalmente, pela Polícia Militar, porque os investigadores não podem deixar a delegacia por questão de segurança. “Temos que resolver com urgência o problema da superlotação carcerária nas delegacias, que afasta o policial de sua verdadeira função. O policial na rua, desempenhando seu trabalho, traz sensação de segurança à população de bem e inibe os criminosos”, afirmou Almeida César. Com a ausência do investigador na rua, o delegado recebe as informações colhidas pelos policiais militares. Porém, muitas vezes esse procedimento é vagaroso. Como o efetivo da PM também é reduzido, o boletim de ocorrência demora a ser digitado e colocado no sistema. Por abril de 2011 |

45


“A segurança pública piorou dramaticamente, na última década, com redução de investimentos e de efetivo policial e aumento paralelo significativo da criminalidade”

Caso a pessoa não seja identificada no necrotério, ela é enterrada como indigente e a polícia sequer fica sabendo do assassinato. Por mais absurdo que possa parecer, é como se o crime simplesmente não tivesse acontecido.

ÓrgãoS SucatEadoS

Reinaldo de Almeida César conta disso, o delegado e os investigadores só ficam sabendo do caso quando a família da vítima aparece na delegacia. Ou seja, as primeiras horas após o assassinato, consideradas essenciais para obter provas e elucidar o crime, são perdidas. O mesmo acontece quando alguém sofre um atentado e é hospitalizado. As delegacias normalmente não são avisadas e a vítima permanece internada por dias ou até semanas sem que a polícia tome conhecimento. Quando a pessoa morre

na unidade de saúde, os parentes são obrigados a retirar a guia de necropsia para liberar o corpo no IML. É nessa hora que se registra o boletim de ocorrência e dá-se início à investigação.

O IML é outro órgão que sofre com o descaso na área da segurança pública. As viaturas danificadas, a falta de pessoal e a estrutura deplorável para atendimento ao público geram situações que beiram ao caos. Recentemente uma família de Fazenda Rio Grande não

ReTRATo De uM ASSASSinATo A cena acontece provavelmente em um fim de semana, à noite - ano passado 40% dos assassinatos ocorreram no sábado ou domingo. É possível que se passe no verão, já que os meses mais quentes apresentam índices maiores de violência. O mais comum é que a vítima seja do sexo masculino e tenha menos de 25 anos. Se 46

| abril de 2011

for igual à maioria das vezes, a arma usada foi revólver ou pistola. O motivo: drogas. Logo após o estampido dos tiros, o Siate é chamado e chega ao local em torno de 10 minutos. O rapaz não resiste e morre antes de receber atendimento médico. Na hora dos disparos, as testemunhas correm,

mas não dura muito para que voltem, misturadas a moradores e curiosos. Com a chegada da Polícia Militar, os populares permanecem em volta do cordão de isolamento, acompanhando a cena que, para muitos, já é rotina. Tão banal que alguns chegam ao disparate de levar filhos e crianças de colo, como que se estivessem no

circo ou no parque de diversões. Aos poucos, a rua é tomada de viaturas oficiais e veículos da imprensa. Policiais militares e civis, e repórteres de rádio, televisão e jornal tentam colher informações com a população ou familiares da vítima. Logo chega o perito para analisar a cena do crime

e, finalmente, surge o camburão do IML. Para a polícia, o recolhimento do corpo indica apenas o início das investigações. Para os curiosos, é o fim de mais uma “atração”. O público começa a dispersar e, rapidamente, a rua volta ao seu movimento normal.


O secretário de Segurança Pública do Paraná, Reinaldo de Almeida César, assumiu o cargo com o objetivo de reduzir os índices de homicídios

RAnKing DA violÊnciA nAS cApiTAiS eM 2008 Mortes por 100 mil habitantes

Cidade

conseguiu sepultar o ente querido porque o corpo não foi encontrado no necrotério e a suspeita é que tenha sido enterrado indevidamente. Na Grande Curitiba é comum ver parentes aguardando horas pela chegada do “rabecão”. Vítimas da violência são praticamente “veladas” pela família até que a viatura apareça para recolher o corpo. O Instituto de Criminalística também encontra graves problemas, principalmente pela falta de profissionais. O reduzido número de peritos e auxiliares não consegue dar conta da demanda de exames, que podem ser fundamentais nas investigações. “Mais de 5 mil armas estão armazenadas no instituto à espera de perícia”, declarou a chefe da divi-

cReSciMenTo populAcionAl De cuRiTiBA e RegiÃo MeTRopoliTAnA Ano

População RMC

1980

1.532.329

1991

2.099.558

2000

2.768.394

2010

3.168.707

Fonte: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (Ippuc) de Curitiba

são técnica da capital, Joice Malakoski. Algumas estão lá há quase 10 anos, gerando situações bizarras. “Temos armas de inquéritos que já foram concluídos e que o réu, condenado, já cumpriu a pena. Outras foram apreendidas com pessoas que já morreram e continuam aqui para serem periciadas”, acrescentou a perita.

ASSASSinAToS poR MeSeS eM 2010 nA gRAnDe cuRiTiBA

1

Maceió (AL)

107,1

2

Recife (PE)

85,2

3

Vitória (ES)

73,9

4

Salvador (BA)

60,1

5

João Pessoa (PB)

6

Curitiba (PR)

7

Belém (PA)

8

Porto Velho (RO)

46,9

9

Porto Alegre (RS)

46,8

10

Goiânia (GO)

44,3

11

São Luís (MA)

43,4

12

Cuiabá (MT)

42,8

13

Macapá (AP)

42,1

14

Belo Horizonte (MG)

41,9

15

Aracaju (SE)

40,8

60 56,5 47

Janeiro

200

16

Manaus (AM)

38,4

Fevereiro

220

17

Fortaleza (CE)

35,9

Março

173

18

Brasília (DF)

34,1

Abril

165

19

Natal (RN)

31,1

Maio

123

20

Rio de Janeiro (RJ)

Junho

146

21

Rio Branco (AC)

Julho

118

22

Teresina (PI)

Agosto

138

23

Campo Grande (MS)

25,6

Setembro

128

24

Boa Vista (RR)

24,9

Outubro

147

25

Florianópolis (SC)

22,6

Novembro

158

26

Palmas (TO)

18,5

Dezembro

134

27

São Paulo (SP)

14,8

Fonte: www.crimescuritiba.com

31 28,9 27

Fonte: Ministério da Justiça / Instituto Sangari

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Salvyano Cavalcanti de Paiva

O burro é sólido COTIDIANO

O

burro é sólido (*). Ou melhor, o burro é antes de tudo um forte, um triunfante na vida. Seja o burro escabroso, rabelaisiano; ou o burro emérito, ausente e laureado; ou o burro sumítico e valetudinário. Não há burros neófitos, não há condição; o sujeito já nasce burro glorioso.

NATUREZA O burro vence fácil e sem lutar: basta puxar. Recebe as maiores espinafrações sem tugir nem mugir (melhor diria zurrar), pois o verdadeiro burro sabe que o prêmio da subserviência é a posição destacada ou a recompensa financeira. E então – mentaliza o burro – chaleirar não compensa? Compensa. Todos os brasileiros são iguais perante a lei. Todos, menos os burros, que são melhores. A lei foi feita por burros ou espertos? Problemática para burro. Certo é que a lei é melhor gozada, plenamente gozada, absolutamente gozada pelos burros. Raciocina o não-burro, protetor de burros: são burros, coitados, e por isso merecem o reino da Terra, ou o queijo do Reino (corruptela de queijo do Reino, criada por burros). Burro merece o fácil perdão, a fácil compreensão e a leniência dos executores da lei – uns burros, todos. 48

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O burro é um líquen: rastejante e evanescente. Por isso brilha mais que as estrelas no céu. Horatio. O burro não lê nunca; e quando fala ou escreve é para emitir sua abalizada opinião de burro sobre o glorioso Exército, a invencível Armada e a ousada Aeronáutica (instituição não é ciência). O burro crê no céu, no inferno e no limbo. O burro se engaja na luta dos cratas contra os istas e com isto consegue um cartaz de 16 folhas, luminoso e sonoro, berrando ostensivamente sua burrice. Mas nesta luta os burros se dividem irmãmente: metade se alinha entre os comunistas, fascistas, anarquistas, socialistas e bairristas; metade se alinha entre os aristocratas, plutocratas, democratas e burocratas; o resto é simplesmente burro.

RETO Bastião da oralidade, o burro sofre o aguilhão da consciência, o que o torna um triunfador inapelável, inarredável e irreversível. Dono de sensibilidade exacerbada, o burro tem momentos de estesia pura ao perquirir sobre o esvaziamento da subversão das massas e inflacionamento das missas. O burro vive extremamente preocupado com a desincompatibilização. Tem peregrinas virtudes: invejável talento para abominar ideologias insólitas, pois, conforme tem declarado sempre, é um baluarte da ordem. O burro crê na hierarquia de valores, no patriotismo flamante e no extravasamento de recalques dos folguedos de Momo. O burro evita os tortuosos caminhos da falta de fé, pois sua admirável intuição o lava à conscientalização da burrice em defesa dos ideais liberais, libertários e liberticidas das exposições do Kennel Club.

ALVAR Todo burro é ordeiro e carneiro e faz a utilização dramática do patético em sua incansável jornada escalando os aclives da bonança. O burro não tem nervos à

flor da pele porque, em primeiro lugar, não tem nervos: nesta ordem de ideias, do limiar da batalha ao ocaso da mesma, age tranquilo como uma tartaruga, pois sabe que a burrice faz viver de quinhentos anos para cima. Mas é patético, fabuloso, em sua tática de envolvimento; é irresistível quando resolve arrasar o oponente descuidado ou de boa-fé. Pois nem sempre o burro é bom, há burros maléficos, invencíveis.

OPACO A maior parte dos burros apresenta-se como o baiacu, quer dizer inflado e agigantado, estourando em sua onisciência, onipotência e preciência. O que um burro desses diz é a palavra de rei, todos os burros repetem, e a melodia segue o mesmo diapasão. Um técnico classificou esse gênero de burro como de burro mamutiano ou antediluviano (um cara desses já vem à Terra fóssil). Mas há outra espécie, creiam: o burro compacto, burrinho ou burróide, ou ainda para-burro ou protoburro. Jamais profere burradas, mas comete seus pecadilhos veniais, suas burricites – e a enfermidade é contagiosa, é preciso ter cuidado, pois é vírus danado, talvez seja até um fungo ou um anticorpo desconhecido. Entretanto, é difícil, à primeira espiada, determinar a magnitude do burro: se compacto ou mamutiano. Pois muita vez o burro de primeira grandeza é precavido ao extremo e fica-se com a impressão de estar falando com um compacto; e quando menos se espera o compacto decepciona a gente, dando patadas, coices e realizando estrepolias, tais que se tem subitamente a impressão de estar diante de um superburro. Há um outro traço comum aos burros: a lascívia oculta sob uma capa de pureza e castidade. Enfim, o burro é útil aos que montam na situação. Por isso é um ser imperecível. (*) Definição soberba do brilhante filósofo moderno Alvarus Adelinus de los Morales.


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FOTOGRAFIA DICO KREMER

Natureza e paixão

Rio São Francisco próximo a Xingó/AL

Z

ig Koch, arquiteto por formação e fotógrafo por profissão, tem um ponto em comum com o Sr. Victor Hasselblad: a paixão pelos pássaros. O Sr. Victor criou uma das mais competentes e criativas empresas de equipamentos fotográficos, a Hasselblad AB em Gotemburgo, Suécia. E a sua paixão pelos pássaros o fez aprimorar a câmera 50

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reflex de médio formato mais famosa do mundo e que leva o seu nome de família. Ricardo Koch Cavalcanti, o nosso Zig, já aos 16 anos perseguia suas queridas aves empunhando uma Pentax SP 500. Viajou para o México em companhia de sua família e da inseparável câmera. Foi lá ao lado das pirâmides e da luxuriante vegetação que, penso, as plumas

de Quetzalcóatl, a serpente emplumada dos maias, astecas e toltecas, abriram seus olhos e seu coração. Com a paciência dos apaixonados fez um curso de observação de aves em 1982 com o fotógrafo de natureza Haroldo Palo Jr. Com ele vai ao pantanal e durante um mês convive com aquilo de que mais gosta: a natureza. Percorreu a Serra do


Borboletas - Salto Augusto - Rio Juruena/MT

Mar e o litoral paranaense, com ênfase na Ilha do Mel, com o fotógrafo Francisco Kava Sobrinho. O contato com as maravilhas da terra do mar e do ar, dos cambiantes encantos da luz sobre as árvores, as flores, as praias, as ondas, os cânions, os pássaros, os peixes, os animais - dos maiores aos menores dos melhores aos piores, todos à ventura -

traçou e definiu o seu destino de vida e de profissional. Participa de bancos de imagens, exposições, fotografa para grandes empresas sempre com ênfase na natureza, no meio ambiente. Publicou e publica livros como autor e editor em várias editoras e também pela própria. Esta publicou quatro livros de sua autoria sendo dois com segundas

edições. Para o Zig a natureza não é um unicamente a matéria de seu trabalho. É uma tomada de consciência e uma luta para preservá-la. E se não inventou ou desenvolveu uma câmera foi com ela que voou, voa e continuará voando rumo ao registro fotográfico deste mundo cheio de vida de encantos e maravilhas. abril de 2011 |

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Boto-cor-de-rosa

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Pescadores Florian贸polis

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Ilha das Peças - Guaraqueçaba

Áreas alagadas às margens do Rio Araguaia 54

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Marianna Camargo Jornalista

No meio do caminho

S

ou pedestre, inveterada e convicta. Não pretendo comprar carro tão cedo, ou nunca.

Minhas manhãs a pé para o trabalho ou os fins de tarde são inigualáveis. Certo que tem dias que bate aquela preguiça, mas vale a pena o esforço. Minha ótica da cidade é outra. Sei de caminhos que taxista nenhum sonha. Aliás, que guerra quando sei mais que eles. Inaceitável. Sim, existe a prepotência dos motoristas que acham que sabem ir para qualquer lugar. Não. Se perdem, erram, ficam irritados. Ainda bem que existe o GPS. A melhor coisa das minhas caminhadas pela cidade é encontrar amigos no meio do caminho, nas esquinas, observar as paisagens, ouvir músicas no Ipod. Mas nem tudo são flores, existe a selvageria das ruas, o perigo de andar só numa cidade violenta, o que me faz ficar atenta a tudo. Treino frequente de atenção e pernas para que te quero. Além do que, as pessoas mais inteligentes que conheço não têm carro. Para citar alguns: Fábio Campana, Carlos Alberto Pessôa, Luiz Geraldo Mazza, time de especialistas em ver o mundo com lentes aguçadas. Estou bem acompanhada. Pelo menos intelectualmente, o que faz toda a diferença. Concordo integralmente com Jaime Lerner quando ele diz que as cidades deveriam ser pensadas como uma estrutura de vida, trabalho e movimento, e compara a cidade à tartaruga,

que carrega em seu casco toda a sua vida: seu abrigo, o trabalho e o movimento. “É possível imaginar que triste a tartaruga ficaria se cortássemos seu casco, tendo que viver num canto e trabalhar num outro. Acabaríamos matando a tartaruga. É isso que a maioria das cidades está fazendo. É preciso que as cidades tenham uma estrutura construída com trabalho, lazer, moradia, tudo junto. Quanto mais mistura houver, mais humana a cidade fica”, diz sabiamente o pensador arquiteto. Porém, o que se vê são as pessoas caminhando na direção oposta. Seja na construção desordenada das cidades, na compra alucinada de carros, no neurótico vai e vém que impede de pensar, de observar, de estar perto do que é mais essencial. Talvez seja esse o problema. Todavia, continuo minhas caminhadas a pé, a ver a cidade com minhas lentes sinuosas, reflexivas, planas ou íngremes, ensolaradas ou nebulosas, e muitas vezes solitária. Quer uma carona?

St oc

k.x ch

ng

Marianna Camargo é jornalista e cronista. Chefe de Redação da Revista Ideias. Leia mais: www.mariannacamargo.blogspot.com

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PERFIL

Leila Pugnaloni Fernando A. F. Bini Professor de História da Arte e Crítico de Arte

Dico Kremer

“Para Leila Pugnaloni também é necessário experimentar o espaço, compreender cor, linha, luz, arriscar e enfrentar a forma”

Leila e o “domingo azul do mar” E

m toda a história da arte, os pintores falam de cores: “A janela se abre como laranja/bonito fruto da luz”, diz o poeta Apollinaire. Falam de cores porque falam da luz. Para Leila Pugnaloni também, para ela é necessário “experimentar o espaço, compreender cor, linha, luz, arriscar” e “enfrentar a forma”. Leila nasce carioca para quem é sempre “domingo azul do mar” dos versos de Tom Jobim. Pequena viu Brasília crescer, planejada, construtiva, mas tornou-se curitibana. Sem abandonar suas primeiras memórias, inquieta, perambulou pelas formas e cores, da cidade, das academias, das pessoas, desta também planejada cidade. Uniu-se à amigos e artistas. Foi muito longe 56

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buscar o desenho e o gesto, para descobrir que o corpo sempre está envolvido integralmente com a arte, “nosso secreto e carnal pertencer ao mundo” (Michel Haar). De novo em Curitiba, envolve seu corpo com a pintura e a escritura, num flanar pela cidade e perder-se nela. Apesar do desenho gestual e espontâneo, Leila é colorista, é pintora, quando desenha é com o pincel num ritmo da bossa nova. Mas suas cores são luminosas, radiantes, não são somente aquelas que ela encontra na natureza, mas são as cores transformadas pelos meios tecnológicos, as cores artificiais dos monitores de vídeo. Na pintura “somente as cores, são a forma e o tema” disse Robert Delaunay

(1912), ao que os futuristas acrescentaram: “o movimento e a luz destroem a materialidade dos corpos” (Manifesto Técnico da Pintura Futurista, 1910). Desde suas primeiras exposições, mostra desenhos a nanquim e aquarelas denominados por ela de “caligrafias”, num fundo com jogo de texturas e de filigranas que lembram os espaços cheios do barroco ou as garatujas infantis, para destacar em primeiro plano a figura feminina. Parecem a expressão de sensações, de sentimentos, repletos de signos gráficos retirados da observação da natureza e que constroem um espaço envelopante e místico a um só tempo. As figuras femininas, centro do desenho, são atemporais surgidas de sua


Marco Antonio Teobaldo

própria existência poética. Estes desenhos já apresentam uma organização de espaço todo particular, partindo da geometrização, da simetria, eles sugerem o desequilíbrio pelo traço nervoso e espontâneo, mas também pelo gesto, estático e atemporal, assumido pelas figuras-temas. Merleau-Ponty, o filósofo do sentido, diz que o gesto de pintar “é a operação expressiva do corpo, iniciada pela mínima percepção, que se amplia em pintura e em arte.” (La prose du monde). Desenhar é performance, é desempenho, é ritual, mas é preciso saber desenhar, pois o exercício plástico é um ultrapassar-se constantemente. Esta é a sua lição, incluindo o ensino na sua escola onde o desenho é a dança do corpo. O seu desenho se torna sintético com a economia de traços, gráfico e caligráfico, repentinamente se transforma ou

se enche de escritura. Os construtivos brasileiros estão em sua memória que é reavivada em Curitiba pela companhia de Paulo Leminski e Alice Ruiz, poetas dos haicais, que não são somente uma forma de poesia, mas de canto também, uma modalidade poética com simplicidade, concisão e plasticidade, e então nascem as suas Alphavelas. Essa associação de seu desenho, e da sua pintura, com o haicai vai até o ponto quando aparece um traço cursivo que traduz a liberdade do seu pincel. São poucos traços, mas não de menos, concisos e objetivos. Sugerem algo, cabe ao espectador desenvolver esta sugestão.

“Olhar para tudo como se tudo tivesse igual valor, como se tudo fosse equivalente”

(A Espera, 2000)

Mas em suas memórias continuam os espaços urbanos em construção, as cidades que não param de crescer e o céu sobre elas resolvendo o problema do espaço que aqui de baixo é tão difícil de encontrar solução. Assim ela inicia suas pinturas sobre telas como se fossem espaços urbanos ou arquitetônicos vistos do alto – é a cidade e a luz da cidade que lhe atraem; mas uma cidade feita de espaço, de quarteirões, de regiões demarcadas, de tramas, como num sistema de redes geometrizadas: “Geometria, ma non troppo; geometria torta”. São rizomas, neste restrito significado descrito por Deleuze e Guattari em Mil Platôs: “O rizoma se refere a um mapa que deve ser produzido, construído, sempre desmontável, conectável, reversível, modificável, com múltiplas entradas e saídas, com suas linhas de fuga”, isto é, com a expressão máxima da multiplicidade dos signos gráficos que se conectam ou se desconectam. Ela utiliza um sistema geométrico colorido, organizado segundo um esquema ortogonal; as formas empregadas são formas neutras e anônimas: linhas, quadrados, múltiplos de quadrados, que estruturam o campo pictórico sem criar motivos, e lembram vagamente o dinamismo urbano de descendência futurista de Torres Garcia. Mas Leila vai além, ela integra as estruturas reais às da composição plástica, pois continua ainda a existir a recorrência aos seus motivos, urbanos ou arquitetônicos, aliados aos problemas plásticos. São pinturas construídas, são estruturas totalmente abstratas cujo tratamento da superfície de cor é totalmente plano. A tradição ocidental, depois do Renascimento, criou a ilusão do volume, seja pela perspectiva, mas principalmente pela cor. Nas obras de Leila Pugnaloni o plano bidimensional surge como volume livre no espaço através da cor luminosa. No entanto o plano bidimensional, na prática tem volume (explorado por Lygia Clark); este volume que é normalmente fechado pela moldura, na obra de Leila se abre, cria vida. Nem abstração geométrica, nem abstração lírica, sua obra se encontra alhures, nisso é contestadora, quer provocar, exigir do espectador a reflexão com o mesmo rigor com o qual ela pesquisa e medita. Ela tem ainda dois problemas a solucionar abril de 2011 |

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Sergio Sade Mariental

com a questão do suporte: de um lado a muralidade, a parietalidade da sua obra e de outro a tela livre, sem chassis. Ela parte morfologicamente de uma geometria estática e aí inclui o dinamismo com a inserção de “símbolos”, que foram também retirados do universo geométrico construtivo, gráficos, talvez mesmo feitos com régua e compasso, procurando um aparente equilíbrio (mas são instáveis, pois se modificam com o olhar do observador). Os quadros, ou mesmo os desenhos, são como superfície de inscrição, espécie de “gaveta de sapateiro” ou “papel mata-mosca” que recebem todo tipo de informação, as pessoais, as estéticas, as filosóficas, as colagens de objetos, de textos, etc. “Síntese de experiências sensórias e mentais”, diria Ferreira Gullar. Estes “quase-relevos”, como os denominou Tadeu Chiarelli em 1992, são trabalhos no plano e no volume, a linha da borda funciona como desenho que delimita e separa a pintura do espaço ao seu redor e o efeito aparece por estar na parede, mas que desestabiliza o observador. Estes objetos não podem ser vistos de um único ponto de vista, eles são volumes quase totêmicos com espessuras diferentes, na sua lateral, entre a base e o topo, e assim não são nem frontais nem estáticos, devem ser observadas quase como as formas barrocas, sempre em movimento. O interesse continua ainda no espaço-luz e no espaço-cor e que ela reestrutura fazendo quase desaparecer os contornos e aplanando o volume, sempre através da cor. De novo o tratamento teatral do jogo ilusionista reforçado pelo uso das cores fosforescentes, faz clara referência ao néon – e é o desenvolvimento dessa estrutura de cor que determina, fundamentalmente, a expansão ou a compressão das bordas exteriores. O quadro como espaço físico deve ativar a apreensão do “si mesmo” do espectador, pela a sua verticalidade antropomorfa. A serialidade, usada não como a repetição do igual, mas do diferente, produz também fenômenos luminosos, “raio de luz”, emanação da luz que correspondem ao instante vivido da experiência da realidade. Oferece o espaço, o espaço homotético e ao mesmo tempo o espaço

que separa o espectador do quadro. Mesmo feitos em três dimensões não se põe a questão de saber se são pinturas ou esculturas; a atenção está numa espécie de cor, numa “superfície de luz” que solicitam uma resposta sensorial ao material. Volumes de cores vivas presos na parede que existem e funcionam no espaço real, com um forte sentido de sedução, pois a artista considera a cor como um material de estrutura e que ela utiliza para construir formas. Sem dúvidas, são pinturas.

“O tratamento teatral do jogo ilusionista reforçado pelo uso das cores fosforescentes, faz clara referência ao néon”


A luz é aquela que lhe inspiram o ambiente urbano e as novas tecnologias. São as cores dos grandes anúncios luminosos de neon com miríades de cores, das sinalizações de tráfego ou mesmo de certos códigos eletrônicos. A tela da televisão, ou o monitor do computador, que emitem milhares de pontos fosforescentes formando a imagem à partir do material fluorescente da sua superfície. Esta é a origem da cor nos quadros de Leila Pugnaloni, não as cores “bem comportadas” da natureza, mas as estridentes dos meios tecnológicos. Atrai-lhe a fosforescência, aquela que por vezes torna o invisível visível: “tornar visível o que não é percebido” não era a idéia de Klee? Leila quer “tocar o espectador com a cor” e com a cor fosfórica e a chamada “Luz negra” a ajudam nesse envolvimento. “No vazio atuo até preenchê-lo com a cor. Quando a parte frontal é branca – emana outra cor – quando é preta também – a espessura é fosforescente, o preto e o branco são pretextos”, afirmou a artista em 1993. As experiências e pesquisas com a luz negra foram utilizadas na sua exposição na Galeria Ybakatu em 2006, elas quase eliminavam o quadro, tudo era espaço, o espectador agora se colocava no meio de pirilampos e vaga-lumes que traçavam pontos e linhas, determinavam limites, sugeriam palavras e textos, faziam surgir bailarinas, mas ao mesmo tempo, deixavam ver formas no seu plano de fundo, que não eram mais linhas retas e sim curvas, fazendo lembrar imagens de plantas ou flores. Podiam ser visualizados de duas ma-

neiras: “Assim” e “Assado”, com a luz natural ou com a luz negra, explorando todos os efeitos plásticos da cor e, como ela mesma diz: “Experimentar o espaço compreender a cor, linha, luz, arriscar.” (1996). Depois de nos fazer entender sobre a materialidade da cor e a imaterialidade da luz, da planeidade do espaço pictural ilusionista com uso dos monocromos com os jogos entre luz de superfície e superfície de luz, ela retorna novamente ao desenho. E agora a cor está lá, pode ser na simples sugestão de uma cor, a vermelha, por exemplo, e o que ela pode provocar no espectador. Ainda são as alegorias de suas vivências transformadas em material gráfico, ainda persiste o diálogo filosófico, ainda lembra o samba, o mar azul, a bossa nova, Rio, Nova York, Brasília, Curitiba, os bares de Curitiba, o frio de Curitiba; é local e também universal, trata de existência humana. Como Klee, ela tudo transforma em “seres gráficos”, pois a “linha sonha” e a cor a embala. Alphavelas, Quase-relevos, Mata-Juntas, Módulos de cor, Módulos de Luz, Jujús, Cochos, Jardins Transportáveis; algumas vezes uns estão em outros, pois “cada módulo de cor poderia ser um edifício em Alphavelas.” Faz lembrar o Leminski de Catatau abandonando as lunetas de Descartes; as suas obras cheias de brasilidade, também sugerem o rompimento com a lógica cartesiana, se servindo da economia próxima de um quadro de Mondrian, muito próxima da música, já advertiu Nilza Procopiak. É poético em toda a sua extensão. A construção poética dos trabalhos de Leila Pugnaloni faz lembrar a frase de Roland Barthes no seu livro O Grau

Ana Barrios

Ana Barrios

“Fosforeça, inventa e cria” “Cor-luz” (1996)

“São as alegorias de suas vivências (...) o samba, o mar azul, a bossa nova, Rio, Nova York, Brasília, Curitiba, os bares de Curitiba, o frio de Curitiba Zero da Escritura: “Cada palavra poética é assim um objeto inesperado, uma caixa de Pandora de onde saem voando todas as virtualidades da linguagem; é, portanto produzida e consumida com uma curiosidade particular, uma espécie de gulodice sagrada.” Se todo o universo e tudo o que existe dentro dele faz parte das inspirações de Leila, ela adverte que “a saída se encontra na própria história de vida, no trabalho já realizado”. Suas obras são representações da luz e da cor produzidas por alguém cuja existência é rica e consciente. DELEUZE, Gilles (et) GUATTARI, Félix. Mil Platôs, Capitalismo e Esquizofrenia, v. 1, Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995, p. 32-33. BARTHES, Roland. O Grau Zero da Escritura HAAR, Michel. A obra de arte, Rio de Janeiro, Difel, 2007, p. 97. abril de 2011 |

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GASTRONOMIA JUSSARA VOSS Jornalista que viaja para descobrir outros sabores, que às vezes estão na sua cozinha

NOMA

Por que brilha a estrela de René Redzepi, o chef número 1 do mundo

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que buscam esses chefs obstinados que fazem poesia com ingredientes? Passei a fazer essa pergunta inúmeras vezes depois de conhecer alguns deles e ter me tornado, eu mesma, uma louca perseguidora de novos sabores e talentos. Mais atrevimento ainda é querer contar como é a experiência de uma refeição no restaurante eleito o número 1 do mundo e tentar explicar o sucesso de René Redzepi. Enfim, sigo com o meu desafio, que espero dar conta em poucas linhas e com a ajuda de algumas imagens. Entenda, preparar perfeitamente os pratos considerados clássicos da gastronomia contemporânea é o mínimo, obrigação de quem se aventura a seguir a profissão de cozinheiro, esses top chefs que figuram na lista dos 50 melhores restaurantes do mundo* acham que no século XXI é preciso ir além e eles vão. Por isso, mergulham numa quase insana rotina diária de intermináveis horas de trabalho em laboratórios para descobrir novas técnicas, ou maneiras de preparo, ou vasculham campos e hortas atrás de ingredientes com a única finalidade de 60

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surpreender quem senta à mesa dos seus restaurantes. Vou contar: eles conseguem. Ir até o Noma, a casa de René Redzepi, é viver uma experiência sensorial. Experimente colher minúsculas cenouras e rabanetes orgânicos, tenros e cheios de sabor, plantados num vaso com terra comestível – na verdade, uma mistura de grãos, castanhas e ervas triturados –, ou achar um fantástico caramujo da Suécia aninhado dentro de uma flor no buquê que enfeita a mesa bem à sua frente, ou ainda ter de fritar um ovo de papagaio do mar da Islândia, você mesmo, comendo-o com inusitados ingredientes e entenderá. Diferente de tudo a que estamos acostumados, não é? Além disso, toda a monumental natureza da Escandinávia que nos deixa, principalmente os latinos-americanos, de boca aberta, o uso da bicicleta pela grande maioria da população, inclusive ministros de Estado, e o respeito com que todos são tratados lá. Falo em educação e saúde, apenas para citar dois itens comuns na social democracia da Dinamarca, também ajudam. Daí fica fácil entender porque quase todos

“Quando peguei com a mão um bocado do filé mignon moído na faca, coberto por uma generosa porção de azedinha e passei no caminho feito de sal defumado, molhando-o no suave molho e levando-o à boca, comecei a entender um pouco a filosofia do trabalho desse herói nacional, hoje condecorado Embaixador da Nova Cozinha Nórdica”


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os cozinheiros do restaurante desfilam suas criações, entregando, pessoalmente no salão, o que acabaram de finalizar na cozinha. O responsável por um prato cuida disso e até da compra dos ingredientes, com direito a explicações sobre o que os clientes estarão comendo e como se deve comer. Lá também não se vê o toque, o chapéu que distingue o chef dos demais cozinheiros. Quando René foi receber o prêmio em Londres, toda a equipe foi junto, inclusive o cozinheiro que teve o visto negado, cuja foto os colegas estamparam na camiseta que o grupo vestia. Noma e René Redzepi: pense num cara simples, que serve uma comida quase crua, com ingredientes prosaicamente frescos, mas tempera ou usa como guarnição em alguns pratos cinza de feno, porque era assim que seus ancestrais faziam. A cozinha é a porta de entrada do restaurante e você encontra lã de carneiro no encosto das cadeiras. Ali, luxo mesmo é a comida. Nem tomates, nem foie gras, nem molhos a base de vinhos. No Noma, instalado no térreo de um prédio do século 18, um velho barracão portuário, citado 62

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Nem tomates, nem foie gras, nem molhos à base de vinhos. No Noma a comida é nórdica

agora nos roteiros turísticos – “aqui é a ilha artificial de Christianshavn e ali está o restaurante número 1 do mundo” –, a comida é nórdica – nordisk mad – e inspirou o nome do local. A descendência (o pai é um taxista imigrante da Macedônia) ajudou na formação. Redzepi adora feijões e vegetais e não tem um prato preferido, mas sabe que precisa tirar proveito da natureza e respeitá-la, aprendeu isso nas suas férias na Macedônia, quando criança, e nas suas andanças pelo mundo. René Redzepi abriu o Noma aos 25 anos e ano passado, com 32, alcançou o prêmio mais cobiçado da atualidade. Mas o começo foi difícil, ninguém entendia a intenção do jovem cozinheiro. Ele não

se abateu e durante uma tormenta existencial, acuado numa cabana, com frio de 44 graus negativos, nos confins da Groelândia, decidiu teimar em explorar as estações e a natureza, seguindo a epifania apresentada, como conta no seu livro. Começava ali a se libertar do aprendizado dos anos passados no elBulli e em outros restaurantes famosos para criar, com liberdade, a sua própria cozinha, com uma assinatura peculiar. É preciso paciência, conhecimento e trabalho duro, recomenda Redzepi, que quando resolveu estudar gastronomia não tinha noção do que fazer, apenas seguiu o amigo, esse sim gostaria de ser um chef, ele só gostava de comer. Uma vez no Noma você sente a força do lugar e vive o momento. Isso é o que ele deseja. Precisa mais? *Ranking anual da revista britânica Restaurant – prêmio S. Pellegrino World’s 50 Best Restaurants. Participam da escolha 800 profissionais da área, entre críticos de gastronomia, jornalistas e gourmets. http://noma.dk Strandgade, 93 – Copenhague, Dinamarca + 45 3296-3297


SolDA Humorista

Sobre os Rogérios Dias

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u conheço a maioria dos Rogérios Dias. Todos eles, garanto, possuem identidade própria e se fazem identificar pelas pinceladas rápidas e certeiras que desferem. Os Rogérios azuis, esses são valentes. Nunca deram com os burros n’água, não rasgam seda, não jogam confete e jamais dão uma de joão-sem-braços. Fazer corpo mole, característica de qualquer mortal comum, nunca passou pela cabeça de nenhum deles. Os vermelhos. Ah, os vermelhos! Se fingem de cabeça-de-bagre só para enganar a plateia. Botam a carroça na frente dos bois, puxam a brasa pra sua sardinha, jogam conversa fora e ainda se dão ao luxo de dar aos pobres só pra emprestar a Deus. São, digamos, um polaco de cada colônia e ferem com ferro só pra conferir se domingo será feriado. Há os amarelos, disfarçados sob o ocre de maneira insuportável. Já foram vistos aos bandos, um por todos, todos por um, sempre. Dão um boi pra não entrar numa briga e uma boiada pra se safar dela. Como os demais, porém, não são maria-vai-com-as-outras e muito menos madalenas arrependidas. Embora nenhum deles sozinho faça verão, é melhor ter um na mão do que dois voando. Os Rogérios verdes foram retirados recentemente da praça, pois foi descoberto que levavam algum por debaixo do pano, portando ás na manga e oferecendo a outra face e admitindo que o criminoso sempre volta ao local do crime e o bom filho à casa torna. Sorriento, é lógico. Há ainda os incolores. Indescritíveis. Com eles, é oito ou oitenta. Ou ainda oitenta e oito, tanto faz. Preferem ensinar

um homem a pescar do que dar a ele um peixe-espada. Hesitam, entretanto, quando se trata de deixar para amanhã o que pode ser feito hoje. Se eles não vão à montanha, a montanha vai até eles. Se um dá o braço a torcer, todos os outros fazem vista grossa. Na terra deles quem tem um olho é o chefe da tribo. Os Rogérios brancos lavam roupa suja em casa. E isso lhes basta. Muito se tem dito sobre os Rogérios. Há quem garanta que eles foram extintos porque deram um passo maior que a perna. Mas como a vida imita a arte e vice-versa, ad eternum, olho por olho, dente por dente, e um deles foi apanhado em flagrante quando fazia das tripas, coração. Em tempos difíceis os rogérios escasseiam. Dizem as más línguas que eles estão apenas semeando vento pra colher tempestade, lá onde o diabo perdeu as botas. Subitamente, sem que ninguém perceba, eles reaparecem. São aqueles que estão lá no fundo da fotografia, com um cravo na testa e um passarinho no ombro. Mas isso já é chover no molhado. Enfim, há uma infinidade de rogérios dias. Um por todos, todos por um. Sempre.

Solda é escritor, humorista e cartunista. Colunista da Revista Ideias. Veja mais: www.cartunistasolda.blogspot.com

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LUIZ CARLOS ZANONI  Jornalista apreciador de vinhos

Divulgação

Mofos de estimação

As caves de Fernando de Castilla: a morada das “leveduras”

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impeza da adega é uma obsessão nas vinícolas. Lavam e esfregam, esfregam e lavam para que nada contamine as preciosidades armazenadas. Essa é a regra. Fernando de Castilla a exceção. Ai de quem ousar remover a gorda camada de mofo que enegrece as paredes da cave dessa centenária casa. Jan Pettersen, o proprietário, explica que tais fungos, ou leveduras como prefere dizer, proliferam espontaneamente no ambiente e são a garantia do caráter único dos vinhos de Jerez. Ao contrário da maioria dos vinhos, cuja guarda se dá em barricas ou cubas de inox muito bem vedadas, os de Jerez amadurecem em tonéis com o tampão ligeiramente aberto. As leveduras penetram por aí, formando sobre a superfície da bebida uma capa espessa chamada flor, que a isola do contato com o oxigênio e lhe atribui, com o tempo, sabores e perfumes singulares. Pettersen lembra que, numa afronta à tradição, muitas das vinícolas dessa região andaluza embarcaram numa vaga modernizadora, construindo novas e assépticas instalações. Deram-se mal. Os fungos desdenharam tais ambientes.

Pettersen já andou por Curitiba – sede da Porto a Porto, a importadora dos seus vinhos – e gostou do que viu. Ao lado de São Paulo e Rio, a cidade lidera o consumo dos rótulos Fernando de Castilla no Brasil. Mas o Jerez já teve bem mais apreciadores pelo mundo, chegando a dominar 40% do mercado inglês à época da Primeira Guerra Mundial. É produzido em Jerez de La Frontera, sudoeste da Espanha, com a uva branca Palomino. As parreiras cobrem 10.500 hectares na região, divididos entre 2.800 produtores que abastecem as 25 vinícolas existentes. A Fernando de Castilla é a única que utiliza apenas uvas de vinhedos próprios, tendo por isso pleno controle sobre a qualidade da matéria-prima. Fortificado pelo acréscimo de aguardente de vinho, o Jerez, ao contrário do Porto ou do Madeira, é em geral seco, não contém açúcar residual. E se diferencia ainda pelo sistema de fabricação, o solera. Empilham-se as barricas, os vinhos mais velhos nas fileiras de baixo. Na medida em que estas são aos poucos esvaziadas, a reposição vem das barricas de cima. Os vinhos jovens mesclam-se, assim, aos mais antigos, sendo por eles “educados”. O Jerez se desdobra em vários estilos, todos feitos pelo mesmo sistema. Os mais populares são o Fino e o Manzanilla, ambos de coloração clara, pálida, o nível alcoólico em torno de 15°. Servidos resfriados, em taças menores, são perfeitos como aperitivo, ao lado de embutidos, mariscos, pescados, queijos ou patês. Outro dessa linhagem é o Amontillado, com graduação alcoólica maior, chegando a 19°. O Amontillado Antique da Fernando de Castilla foi eleito em 2009 pela revista inglesa Decanter como o melhor vinho generoso do mundo. É muito seco, talvez o mais seco entre todos os vinhos de Jerez. Ideal no inverno, na companhia de sopas e consomês. No topo, feito de uvas ultra selecionadas, o Palo Cortado (20°), que envelhece por mais de 30 anos antes do engarrafamento. Pettersen o considera “um milagre da natureza”. É elaborado em conta gotas, por poucas bodegas. Das 80 milhões de garrafas de vinhos de Jerez produzidas todo ano, somente 20 mil são Palo Cortado.


pRATeleiRA

Livros

memÓRiaS gaSTROnÔmicaS de dumaS “Minha reputação culinária... promete apagar a minha reputação literária. Louvado seja Deus!”. Essa amarga previsão de Alexandre Dumas não se concretizou. Ao contrário, a popularidade de Os três mosqueteiros e o Conde de Monte Cristo, entre outros, é que ofuscou o Grande Dicionário de Culinária que Dumas montou pacientemente ao longo de 15 anos. É dessa obra de referência gastronômica, hoje reconhecida como das mais importantes, que se originam os dois textos do livro Memórias Gastronômicas seguido de Pequena história da culinária. Memórias Gastronômicas discorre sobre personalidades ilustres ou obscuras da história da gastronomia, como Carême e Brillat-Savarin, ou os pescadores e boêmios de uma aldeia na Bretanha. O livro compõe um retrato original dos costumes dos séculos XVIII e XIX em crônicas inesquecíveis, como “Um frango assado antes da guilhotina” ou “Reflexões sobre a salada”. Pela Editora Jorge Zahar. (FC)

diÁlOgO BORgeS e SÁBaTO Nestes diálogos entre Jorge Luís Borges e Ernesto Sábato a palavra é afiada, quase sempre refletida, calculada. O genial Borges tem a primazia dos golpes. Sábato é mais discreto, às vezes pede permissão para dizer algo que poderá causar discordância e, o que é ainda mais incrível, consegue igualar a proverbial erudição de Borges. Entre os muitos assuntos aqui discutidos, um é muito interessante. Borges propõe e Sábato aceita que cada um descreva seu método de criação. Nestas conversas, propostas aos dois pelo jornalista argentino Orlando Barone, o assunto principal é a literatura. Não só disso falam, contudo, apenas disso. Há revelações pessoais imperdíveis. O único terreno previamente excluído foi o da política, o que não reduziu em nada a qualidade da conversa. Os assuntos vão do tango e os Beattles à paixão comum por Cervantes, Flaubert e Kafka. Estes diálogos iluminam a obra de ambos num livro de leitura obrigatória para quem se interessa pela genialidade dos dois. Da Editora Globo. (FC)

leJOS de veRacRuz

O espanhol Enrique Vila-Matas é o narrador desta singular e fascinante novela, “Lejos de Veracruz”. A literatura é o último refúgio de seu personagem que se encontra em uma situação em que não lhe resta alternativa senão escrever. Derrotado na vida, este jovem de 27 anos, aleijado, se sente muito velho e cansado. Se dedica a escrever a história de seu ódio à casa da família e a de seus intentos de ser amado em lugares distantes da monotonia dos dias repetidos. Enrique Vila-Matas é um dos mais interessantes escritores europeus de hoje. Publicou um livro de ensaios literários, O viajante mais lento e vários romances, entre eles História abreviada da literatura portátil, Suicídios exemplares, Lembranças inventadas, Bartleby e Cia, Doutor Pasavento. O último recebeu o Prêmio da Real Academia Espanhol. Todos editados no Brasil pela Anagrama. (FC) abril de 2011 |

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Livros

Salazar definitivo

Para quem gosta de biografias e se interessa pelo ditador português, que forjou seu poder com base na austeridade fiscal, na retidão moral e na mitologia colonialista do país, está nas livrarias “Salazar – Biografia definitiva”, de 816 páginas, editado pela Leya Brasil. Originalmente escrita e publicada em inglês, chega agora traduzida ao Brasil. O autor é o português Filipe Ribeiro de Menezes, um “estrangeirado”, como se diz em Portugal dos intelectuais que construíram sua carreira acadêmica fora do país. Neste caso, a Irlanda, lugar onde o debate sobre Salazar é raro e que deu tranquilidade para Meneses escrever uma monumental biografia que ficará como um marco nos estudos sobre o homem e o seu regime. Imaginem a repercussão do livro em Portugal, onde Salazar é adorado por uns e acusado por outros de responsável pela longa noite fascista que começou em 1928 e que só terminou mesmo com o 25 de abril de 1974. (FC) 66

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O indizível de Homero Haroldo de Campos costumava sustentar o paradoxo de que só o texto intraduzível merece ser traduzido. Recrie-se o intraduzível, propunha. Pois, pois, um conjunto de professores liderados por Wilson Alves Ribeiro Jr. Acaba de publicar pela editora da Unesp “Hinos homéricos – Tradução, notas e estudo”, um calhamaço de 574 páginas onde o texto grego, ao lado das traduções e dos ensaios críticos apoiados em observações próprias e de uma ampla bibliografia da melhor qualidade fazem desta edição um primor. O ensaísta se propõe a examinar a mitologia grega num amplo contexto cultural, que inclui a nossa literatura oral indígena. A comparação procura responder a uma dúvida: em que a mitologia grega é superior à tupi-guarani? Não há privilégio, dizem os autores. Sendo o mito um diálogo do homem com o mundo, cada povo cria mitologias que ostentam indagações peculiares. (FC)

Ilustração de trechos da Ilíada, poema épico grego atribuído a Homero.

Tenho pena de você

A publicação reúne uma seleção de 50 desenhos assinados pelos artistas Alex Hornest e Thais Ueda, produzidos em conjunto durante o ano de 2007. A dupla escolheu o universo dos pássaros como temática central das obras. Animal geralmente associado à liberdade, sua escolha representou, talvez de forma inconsciente, o desejo de produzir de uma maneira mais livre, sem regras formais. Ora figurativos, ora realistas, são trabalhos com tinta acrílica, nanquim, colagens, onde um começava, o outro intervinha e vice-versa. O resultado são pássaros dos mais variados tipos, sexos e idades em situações humanizadas, exibindo pompa, desdém e ironia. O processo criativo se completa com textos sobre cada obra. Tenho pena de você, Alex Hornest e Thais Ueda.


Filme

O Discurso do Rei O Discurso do Rei (The King’s Speech, Inglaterra, 2010) tem direção de Tom Hoo­per e conta a história verídica de George VI, interpretado de maneira sublime por Colin Firth que assume, a contragosto, o trono de rei da Inglaterra quando seu irmão, Edward (Guy Pearce), abdica do posto em 1936. Por causa da guagueira, o novo rei pede o auxílio de um especialista em problemas de fala, Lionel Logue, interpretado pelo excelente Geoffrey Rush. Lionel Logue é um plebeu australiano de modos largos e tem uma linha pouco convencional de tratamento, o que faz o rei gago afastar-se. Depois de algumas tentativas frustradas, o rei resolve procurar novamente o instrutor por insistência de sua mulher, a rainha Elizabeth, interpretada por Helena Bonham Carter. Lionel consegue com suas táticas pouco ortodoxas curar a gagueira do rei num momento crucial da história da Inglaterra: a II Guerra Mundial. A partir daí os dois pactuam uma amizade que durou a vida toda. O filme tem momentos majestosos e engraçadíssimos, mas tem pausas e lentidões em um roteiro que poderia ser mais ágil. De qualquer maneira, Geoffrey Rush e Colin Firth formam uma dupla imbatível. O Discurso do Rei teve doze indicações para o Oscar 2011 e ganhou as estatuetas de melhor filme, melhor direção e melhor roteiro original. (MC)

Um lugar qualquer

Exposições

Todo o Bakun

Somewhere (EUA, 2010) da talentosa Sofia Coppola não é seu melhor filme. Difícil quando se compara com Encontros e Desencontros (2003), com o genial Bill Murray e a linda Scarlett Johansson, que lhe valeu Oscar de melhor roteiro original e vários prêmios respeitáveis do cinema. Antes havia feito Virgens Suicidas (1999), com um roteiro assombroso. Em 2006 fez Maria Antonieta, Oscar de melhor guarda-roupa, e trilha sonora impecável. Um lugar qualquer conta a história de Johnny Marco, interpretado por Stephen Dorff, um ator que usa barbitúricos, fuma, cai de tanto beber nas escadas do hotel Chateu Marmont, em Los Angeles, e é considerado pelas loiras, altas e siliconadas mulheres hollywoodianas um “galã”. Nesse vazio, a única coisa que faz sentido é sua filha Cleo (Elle Fanning). Uma menina de 11 anos, que o acompanha por alguns dias quando sua mãe resolver “dar um tempo” e viajar para um lugar qualquer. Cleo preenche todo o vazio que permeia a vida de seu pai, que não consegue deixar seus vícios por mulheres e bebidas longe enquanto está com a filha. A tristeza de Johnny Marco desaba quando Cleo o deixa e vai para a Colônia de Férias. Sozinho, agora como nunca, ele percebe o desencanto que o cerca. Mesmo não sendo seu melhor filme, Sofia consegue imprimir uma sensação de melancolia que nos acompanha por algumas horas. (MC)

O projeto “Curitiba (nós)” recebeu da artista Eliane Prolik a doação de quatro obras do pintor paranaense Miguel Bakun (1909 - 1963). O acervo municipal será enriquecido com esses trabalhos de Bakun, considerado um dos artistas pioneiros da Arte Moderna no Paraná e de reconhecida importância para o cenário brasileiro das artes plásticas. As obras participaram das exposições comemorativas do centenário de nascimento do artista - “A Natureza do Destino”, na Casa Andrade Muricy (2009), e “Na Beira do Mundo”, no Museu Oscar Niemeyer (2010). Filho de imigrantes eslavos, Bakun nasceu no interior do Paraná em 1909. Foi aluno da Escola de Aprendizes da Marinha, em Paranaguá, em 1926. Transferido para o Rio de Janeiro, encontrou o jovem marinheiro e artista, ainda desconhecido, José Pancetti (1902 - 1958), que o estimulou a desenhar, desenvolvendo uma inclinação de infância. Em 1930, quando foi desligado da Marinha, transferiu-se para Curitiba e passou a trabalhar como fotógrafo ambulante. Logo conheceu Guido Viaro (1897 - 1971) e João Baptista Groff (1897 - 1970), que o incentivam a pintar. Autodidata, dedicou-se profissionalmente à pintura até o fim de sua vida.

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enTReviSTA

dizia Quintana que “Se o homem não tivesse preguiça de caminhar, não teria inventado a roda”. Concordo. Minha maior motivação é a preguiça. E de vez em quando, chocolate. QUALIDADES PARADOXAIS: Sou feminista, mas ainda assim consigo ser feminina. PONTOS VULNERÁVEIS: O “G”. Ódios inconfessos: Barulhinho de gente desdentada chupando Halls causa-me ódio... Ou será tesão? PANACEIAS CASEIRAS: Uma pitada de pó de chifre de unicórnio diluído num copo de urina de ornitorrinco albino cura depressão, hemorroida, escabiose, cancro mole e acne. Chocolate ministrado com carinho cura frescura e TPM (se é que não são sinônimos). SUPERSTIÇÕES INVENCÍVEIS: Nunca sei onde a superstição transforma-se em Transtorno Obsessivo Compulsivo. Mas, acredito que sou comedida, pois tenho apenas uma superstição invencível: Só chego ao orgasmo nos dias ímpares de anos bissextos, andando a 63,4 km/h numa Kombi verde-varejeira, sendo massageada por cinco anões polidáctilos entoando o hino do XV de Piracicaba e dançando a Macarena. Nada que um ser humano comum não pense no dia a dia. TENTAÇÕES IRRESISTÍVEIS: Anões polidáctilos massagistas que entoam o hino do XV de Piracicaba e dançam Macarena dentro de uma Kombi a 63,4 km/h são tentadores. ATIVIDADE PROFISSIONAL: As mulheres queimaram sutiãs e conquistaram o direito de trabalhar feito homens, só que ganhando metade da remuneração deles. Com dinheiro no bolso, acumularam o direito de sustentar a família, só que ainda limpando a casa e cuidando dos filhos como outrora eram designadas. Diante da análise desses 68

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fatos, senti-me impelida a dedicar-me à militância em prol dos direitos DESIGUAIS da mulher, a fim de reverter esse quadro bizarro que pintamos com batom, suor, fogo e sutiãs.

MEDOS ABSURDOS: Tenho medo de ganhar uma lingerie tamanho P do namorado, de não ter dinheiro para fazer a cirurgia de reposição de prótese de silicone dos seios daqui uma década e de me apaixonar perdidamente por um faquir.

ATIVIDADES OUTRAS: Lavo e passo. Lavo a alma quando passo longe de serviços domésticos. Principais motivações: Já

ORGULHO SECRETO: Tenho orgulho de conseguir guardar segredos, mesmo sendo mulher.


izABel cAMpAnA Advogada e Cronista

Reviro os olhinhos

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ão gosto de ser contrariada. Mal de primeiro filho. Fico irritada, viro os olhos e fecho a cara. O pior é que tenho ainda outro defeito. Uma mistura de covardia com preguiça que acaba por me convencer a evitar a confrontação. O conflito, principalmente com familiares e amigos próximos, tem, para mim, se provado algo pouco proveitoso. Depois da discussão, vem a necessária convivência e invariavelmente me arrependo de ter dado início a qualquer mal-estar. Descobri recentemente uma saída para meus maus-bofes. O verdadeiro caminho para a harmonia familiar e fraterna não passa pela sublimação das próprias deficiências sociais. De maneira alguma. Minha receita para o bom-humor é aproveitar as pequenas chances de explosão que a vida oferece. Foi assim que passei a me divertir com aquele senhor que fura fila no banco ou com a senhora que leva um carrinho completo ao caixa de até 10 volumes no supermercado. Imediatamente reconheço a oportunidade de – com razão, plateia e apoio – descontar minha irritação no próximo. Lanço mão de sarcasmo, injúria e intransigência. E me delicio.

Nesses momentos me torno uma verdadeira dona-de-casa enfurecida. Daquelas que metem medo nas criancinhas em feiras de rua. Chamo o gerente, lembro que a ligação está sendo gravada, exijo o número do protocolo. Saio revitalizada. Não tenho apreço por brigas de trânsito, entretanto. Muito impessoais. A distância restringe os envolvidos a um gestual ensaiado e enfadonho. Gosto de planejar minhas ofensas, medindo o efeito cômico ideal para cada momento. Percebi que se quero ter motivos para um arranca-rabo mensal não posso abrir mão de certos serviços. Telefonia e TV a cabo são fundamentais. Companhias aéreas e fornecedores de banda larga também são úteis. Quando você menos espera, chega a casa e percebe que a internet está fora do ar. Ah, que oportunidade para extravasar o deboche. O lado positivo é que você não encontrará o sujeito tão cedo. Não é seu tio, vizinho ou amigo. Após o destempero, você volta para a paz do lar e compreensão da família, que haverá de concordar com a grande falta de educação que é pegar, com muita pressa, a última vaga no estacionamento.

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cAMillA inoJoSA Cronista

A nobre arte de ser Tia

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oje acordei assim, meio maternal. Acabei de virar tia, de novo. Talvez seja a minha função mais nobre.

Estragar os sobrinhos. O primeiro, e até então, único, Rafael, já está virando mocinho. Semana passada teve a petulância de terminar o namoro porque descobriu que a namorada tinha celulite. Celulite? É tia, celulite. Mas, você viu? Não. Você sabe o que é celulite? Não tia, mas me contaram que ela tem, e eu não quero namorar uma menina que tem celulite. Onze anos. Levou uma bronca, mas depois vieram as risadas, e tudo terminou com um jantar no Mc Donald´s para comer muita gordura e eu poder provar para ele que mulheres com celulite são o máximo. A pequena Rebeca, italianíssima. Gesticula, gesticula, gesticula. O que seriam das crianças italianas sem suas pequenas mãozinhas. Ela me deu uma grande lição de vida. Seu marido gosta de futebol? Mais ou menos. Graças a Deus. Eu já sei que quando eu crescer vou querer um marido que não goste de futebol. Olhei com espanto. E a italianinha gesticulando, gesticulando e gesticulando falava sem parar um português de quem estava há apenas um mês no Brasil: Os homens amam mais futebol que tudo, esquecem da gente. Meu avó deixa eu fazer tudo, mas quando passa futebol ele tira o meu desenho preferido. E tudo isso para que? Para os jogadores ficarem ricos e irem embora. Nós estamos sempre por aqui, mas eles preferem os jogadores. Sete anos. Mais sábia do que muitas pessoas no mundo. Está longe, deixa saudades. Essas crianças. Na livraria um pequeno desconhecido também chamou minha atenção. Na

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fila discutia com o pai: Papai, eu quero esse livro. Mas filho, esse você já tem. Não tenho papai. Tem sim, é a história do leão, só que a capa é outra. Você também tem o filme, lembra? ESSE EU NÃO TENHO. Filho, escolhe outro. Com olhar indignado o pequeno ser, de aproximadamente cinco anos de idade olha para o pai, e para todos da fila e exclama: Eu já vi pai negar coisas ao filho, se ao menos eu estivesse pedindo um brinquedo, mas é um livro. Um livro e você não quer me dar. Nossa, se não fosse desmoralizar o pai eu tinha comprado o aclamado livro. O menino merece. Merece aplausos e o livro. Mesmo repetido. Eu vivo dizendo que quero um filho assim, um tanto quanto nerd, andando com o livrinho “Kafka para crianças” e vestido de barata. Mamãe, acordei inseto. Ow, não é lindo? Divagações a parte, como comecei dizendo, sou tia, mais uma vez. E, em breve, chegarão João Victor, Arthur e Eduardo para colorir as nossas vidas. Rodrigo chegou ao mundo e daqui a pouco terá dezenas de histórias. Centenas e até mesmo milhares. Mas no fim não nos importará o conhecimento dele sobre celulites, nem o que ele pensa sobre futebol ou literatura. Ele poderá ser médico, oceanógrafo ou cineasta. Poderá ser um pestinha, ou nos mostrar calmaria. Ele pode se vestir de inseto ou de palhaço. E no meio de tantas possibilidades, titia deseja apenas que ele, como o irmão Rafa, seja feliz. Rodrigo, bem-vindo. O mundo não é lá essas coisas, mas estamos aqui para ajudá-lo nessa jornada.


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ISABELA FRANÇA

Hiperativo, o empresário Wilson Quintella Filho, 56 anos, brinca com sua história que teria inspirado Sílvio de Abreu no papel do Rei do Lixo, Olavo, personagem de Francisco Cuoco, na novela Passione. Mas, ficção e vida real costumam inspirar-se uma na outra. É fato que o empresário alugava helicópteros para buscar aterros de lixo e incrementar o negócio montado em 2000 – após a quase falência no setor de soja –, como também é fato que ao comprar a Cavo, empresa responsável pela coleta de lixo de Curitiba, no mês passado, vestiu-se de gari e acompanhou uma das rotas da empresa que vai incrementar para mais de R$1 bilhão/ano o faturamento do grupo Estre. Seus contatos com a Camargo Corrêa, de quem comprou a Cavo, não são de hoje. Seu pai, Wilson Quintella, foi braço direito de Sebastião Camargo Corrêa por mais de 30 anos. O trânsito do empresário no meio dos negócios não pára por aí. Ele esteve por alguns anos no Grupo GP Investimentos e da amizade com Olacyr de Moraes nasceu a sociedade com sua sobrinha Gisele Moraes, com quem iniciou timidamente a Estre. Ao que consta o grupo administra a Estre Ambiental, empresa de gestão de resíduos com seis centros de gerenciamento de resíduos no Brasil (CGR Paulínia, CDR Pedreira, CGR Terrestre – Piaçaguera, CGR Guatapará, CGR Itapevi e CGR Fazenda Rio Grande), a Resicontrol, responsável pela gestão de resíduos industriais e urbanos com cinco unidades (Tremembé-SP, SorocabaSP, Paulínia-SP, Balsa Nova-PR, Americana-SP), a Água & Solo, consultoria e auditoria ambiental, a Oxil, empresa de manufatura reversa, a Estação Ecologia, que faz reciclagem de resíduos da construção civil, a Estrans, na Argentina, que também cuida da gestão de resíduos, a Pollydutos, responsável pela instalação e manutenção de dutos para o transporte de gás, petróleo e gasolina, e, a Estre Petróleo e Gás, que realiza serviços de perfuração e recuperação de poços de petróleo e/ou gás com fornecimento de sondas terrestres com atuação no Rio Grande do Norte, Bahia e Sergipe. Seus próximos passos? Transformar lixo em combustível.

PRATA DA CASA É do paranaense tomás Von

der osten a autoria do filme “Vó Maria” (2010), vencedor do prêmio de Melhor Curta da Mostra Foco – eleito pelo júri da crítica – da 14ª Mostra de Cinema de Tiradentes (MG), realizada no final de março. O jovem talento promissor é aluno do quinto período de Cinema da CineTVPR/FAP Faculdade de Artes do Paraná e recebeu o troféu na noite de premiação no último sábado (29), no Cine-Tenda. Seus pais, Sandra Mancino, assistente social do Ministério Público do Paraná, e Beto Von der Osten, líder sindical, ex-presidente da CUT e da Federação dos Bancários do Paraná, estão pra lá de orgulhosos.

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Leonardo Lara

Coisa de novela


cortesia Foi no salão de festas da Paróquia São Miguel, em Almirante Tamandaré, Região Metropolitana de Curitiba, que presenciei das mais agradáveis cenas de cortesia recentes. Acostumada aos bastidores Patrícia Klemtz

de festas, fiquei impressionada com a gentileza do pai da debutante que convidou um por um todos os fornecedores e prestadores de serviços que trabalhavam na festa para que jantassem, revezando-se em suas funções, garantindo que ninguém ficasse sem saborear as saladas e assados deliciosos de Dona Helena. Cuidado pouco visto

divulgação

em festerês dos mais badalados.

Simply Honest Para quem gosta de pagar o que vale, vai a dica: o outlet de grifes Costume Urbano, da descolada empresária Viviane da Paz Carvalho acabar de fechar contrato com a Doc Dog e já tem os transados jeans da marca paulista em suas prateleiras. Com quatro anos de sucesso em Curitiba, o outlet tem marcas bacanas como Houis Clos, Maria Garcia e Espaço Fashion.

EDUCAÇÃO PAÍS TROPICAL O cantor Jorge Ben Jor promete chacoalhar as estruturas do comportado Graciosa Country Club, no próximo dia 10 de junho. Nos moldes dos grandes shows que foram marca registrada nas duas gestões do presidente Tobias de Macedo, a apresentação acontecerá nas quadras cobertas de tênis e certamente levará ao clube boa parte dos trintões, quarentões e cinquentões, como já aconteceu nas edições anteriores com Blitz, Ultraje a Rigor e Titãs. Em julho, Tobias de Macedo passa a batuta a seu sucessor, após quatro anos à frente da diretoria.

A economista Eleonora Bonato Fruet, depois de deixar o primeiro escalão da Prefeitura de Curitiba, está prestes a passar um período de estudos em Genebra, na Suíça, para se tornar agente das Nações Unidas para a promoção da educação em países africanos. Na bagagem leva o projeto de escrever um livro.

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Ligações Deliciosas Nos dias 8 e 9 de abril, o dramaturgo Ricardo Rizzo põe à prova um elenco de peso. No palco do Grande Auditório do Teatro Positivo, a bela Maria Fernanda Cândido faz sua primeira vilã: ninguém menos do que Madame de Merteuil. Será inevitável a comparação com Glenn Close, que interpretou a deliciosa malvada nas telas em Ligações Perigosas, agora palco no Festival de Teatro de Curitiba. A obra do francês Choderlos de Laclos “Les Liaisons Dangereuses” (1782) é riquíssima em detalhes nuances subentendidas de um humor refinado. Rizzo assina a segunda direção do espetáculo – a primeira é de Mauro Baptista Vedia – e diz que buscou manter-se o mais fiel possível a esta característica. A jovem Laura Neiva, que desponta como talento do cinema, terá sua estreia no teatro no papel da jovem Cécile.

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João Caldas

ISABELA FRANÇA

NEM POR UM MINUTO O bafafá gerado pela discussão da curitibana Mirella Prosdócimo, tetraplégica que teve a vaga prioritária “roubada” por uma infratora desavisada, transformou-se em campanha. Inspirada no episódios que ganhou vulto nas redes sociais, a agência Getz, criou a campanha “Esta vaga não é sua, nem por um minuto”. Assim como “ 190km/h é crime”, que também ganhou as ruas de Curitiba e notoriedade fora da cidade, a nova campanha deverá angariar muitos adeptos.


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divulgação

de abril

CALOURO O secretário de Estado da Cultura, jornalista Paulino Viapiana, adicionou mais um afazer à sua agenda hiper movimentada: está na turma do primeiro ano do curso de Filosofia da UFPR. As aulas dividem, agora, o tempo e a atenção do secretário, que além das atribuições do cargo, curte sua Harley-Davidson, a gata Cicciolina, a gastronomia e um bom charuto.

A paralisação nacional prevista para 7 de abril, Dia Mundial da Saúde, quando médicos de todo o Brasil não atenderão pacientes de planos de saúde tem boa parte de sua estruturação no Paraná. A Associação Médica do Paraná (AMP), do Conselho Regional de Medicina (CRM) e do Sindicato dos Médicos do Paraná (Simepar), entidades que representam a categoria e compõem a Comissão Estadual de Honorários Médicos (CEHM) vem tratando da questão há vários meses e reuniu mais de uma centena de médicos, já no mês passado, na sede da AMP para garantir o movimento . Todas as discussões serão compiladas, transformadas num documento, que será enviado este mês de abril para a CEHM e para a Associação Médica Brasileira, Conselho Federal de Medicina e Federação Nacional dos Médicos.

MAIS BONITA Leva a assinatura da designer Alessandra Saltori e sua equipe da Ideale Design, a direção de arte e projeto gráfico da nova Revista do Comércio, da Associação Comercial do Paraná, lançada no último dia 28 de março. Alessandra assina projetos editoriais importantes como as revistas dos clubes Curitibano e Graciosa, além da publicação própria Mais, em parceria com a Saltori.

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BALACOBACO

Sheila Rigler e a jornalista Juril Carnasciali

Fotos: Tiomkim

Tatiana Rigler, Sheila Rigler e Zélia tacla

Empresária destaque A empresária Sheila Rigler recebeu no dia 15 de março uma homenagem especial da Business Professional Women de Curitiba (BPW) e do Palladium Shopping Center, pelo Dia Internacional da Mulher. Sheila teve sua imagem retratada na exposição “Fotos de Empresárias Destaque de Curitiba”, realizada na praça de eventos do Palladium.

Foto: Lis Catenaci

Dani Carioca, a DJ Biba Pacheco e a professora Andressa Zytkowski

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Analzira Carneiro, Maria Inês Borges da Silveira e Sheila Rigler

A ginga de Dani carioca Com toda a ginga, o calor e a euforia carregada no apelido, a professora da Cia Athletica de Curitiba, Dani Carioca (Daniela Martins) encerrou a 7a. Edição da Corrida Noturna Unimed em primeiro lugar geral (10 km), com o tempo de 40’57”. A competição neste ano bateu o recorde de atletas inscritos.


Sylvia Cesário Pereira, Angélica Fenley Beliche e Evelyn Bittencourt

Sonia e Ciro Camargo

Suely Loyola

Love & Seduction

Débora Alcantara Márcia Oliveira

Fotos: F22 studio

Ótima novidade para os fashionistas de plantão. Nos dias 17 e 18 de março, a designer Silvia Doring, lançou sua nova coleção Love & Seduction e suas peças feitas de ródio negro – é a primeira vez que a estilista usa este material. As peças trazem o contraste entre o negro do ródio e o colorido das pedras brasileiras (jade vermelha, ágata verde, amazonita nude, quartzo rutilado, quartzo fumê, quartzo rosa, quartzo azul e olho de tigre) que serão it-accessories da temporada mais fria do ano. Já a coleção Love & Seduction investe no romantismo com os tradicionais ícones do amor. Silvia Doring e Fabiana Spinello

Kely Ribas da Rocha e Ana Claudia Puzeena Guerios

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BALACOBACO René Dotti e Carlos Sandrini

No dia 16 de março, o Instituto de Inteligência Desportivo Centro Europeu (IID – Centro Europeu) promoveu a abertura o�icial de seu curso de Direito Desportivo. O evento foi comandado pelo renomado advogado paranaense René Dotti, um dos juristas mais experientes e respeitados do Brasil. A atividade foi realizada no Mabu Royal & Premium Hotel e reuniu advogados, estudantes e pessoas interessadas no segmento. Fotos: Rodrigo Torrezan

Mônica Corrêa e Doga Vitor

Carlos Sandrini, René Dotti e Juliano França Tetto

Raphael Viana

Francisco Zardo e Gustavo Nadalin

Alto estilo André Borin, Leila Martins e Simone Soifer

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Um coquetel em alto estilo marcou a reabertura da Colcci no Shopping Mueller no dia 17 de março. O evento contou com a presença do ator Raphael Viana, galã da novela global Araguaia. Em um ambiente preparado para receber convidados e clientes, ao som do DJ Ilan, a loja apresentou a coleção inverno da Colcci que traz na campanha Ashton Kutcher e Alessandra Ambrósio.

Fotos: Amarildo Henning

Inteligência da área


Risada bene�icente Stella Otto, Tatiane Mamets, Cheysa Biondo

Ana Bahr e Eduardo Rosa

Fotos: Priscilla Fiedler

O Curitiba Comedy Club realizou um show bene�icente para arrecadar doações para os desabrigados do litoral do Paraná. No dia 22 de março, vários humoristas como Alisson Diniz, Marcão Freire, Afonso Padilha, Michel Matos, Maicon Santini, Rodolfo Pereira, Fábio Silvestre, Diogo Portugal, Emerson Ceará, Pedro Lemos e Thiago Souza �izeram a casa de comédia lotar e o público gargalhar com um único objetivo: a solidariedade. Foram arrecadados, entre alimentos não perecíveis, roupas e água, duas toneladas de donativos. A arrecadação, separação e entrega �icou a cargo do Grupo Escoteiro do Mar Amigo Velho que, junto com a defesa civil, participa da ajuda ao litoral desde o início quando começaram as chuvas.

Maicon Santini

Ricardo Bordenousky, Mateus Meinig, Lucas Albers, Rodolfo Bordenousky, Leticia Florsz (escoteiros do Mar Amigo Velho)

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CLAUDIA WASILEWSKI Cronista

Palmatórias do

mundo

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ujam todos! Um batalhão está formado. Vem marchando e impondo seus conceitos, ou pior, seus novos conceitos. Reconheço que estou cada vez mais ácida e irreverente. Hoje faço a escolha das pessoas que me cercam e até aonde vou. Deve ser a maturidade. Sair de casa para ser mal atendida ou suportar conversas filosóficas não faz mais sentido. Fico em casa. O meu problema não é com ideologias ou religiões. É com os recém-iniciados que ainda estão na fase da

Haja paciência. Neste caso faço cara de paisagem e deixo falar. É mais ou menos como testemunho em culto evangélico. Se faz bem para eles colocar para fora o arrependimento, que o façam. Quem sou eu para contrariá-los.

to é surto, e de imediato sacam suas maquininhas de rotular. Vejam só, tive que ouvir que vou passar a eternidade no inferno. Fumo, como carne, não me casei em nenhum rito religioso e bebo (três vezes por ano no máximo). Sim, tenho que aguentar este tipo de coisa. Hitler não bebia, não fumava, era vegetariano, mas era o Hitler. Será que está no céu? Gostaria de saber se os politicamente corretos, que vivem a me atormentar, praticam no dia a dia o que pregam. Aposto que sou mais radical que eles em várias coisas. Jamais, eu disse JAMAIS,

Gostaria de saber se os politicamente corretos, que vivem a me atormentar, praticam no dia a dia o que pregam paixão. Como são chatos! Daí vem o festival de bolas foras. Uma conhecida Neo Vegetariana, daquelas que faz o discurso do pobre carneirinho que chora ao morrer, deixou escapar: – Cheguei em casa agora, fui ao mercado e comprei um vinho e um salaminho. Que raiva! Eu que como carne ando sonhando com salaminho, mas estou proibida de comer. Falar o que? Fingi que não ouvi. Medo que criasse um discurso pró-salaminho e tentasse me fazer acreditar que existem plantações. Os ex-fumantes são um show. Concordo que parar de fumar é difícil e daí se tem a real noção de como é horrível o cheiro da fumaça. Mas daí dar aulas de fisiologia já é demais. E a conversa começa assim: – Fumei por 25 anos... 80

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Os eco chatos estão em surto coletivo por conta do Novo Código Florestal. Vejam bem, não me refiro a agrônomos, engenheiros florestais e tantas outras profissões ligadas a terra. E sim àqueles que ouviram uma conversa aqui, outra ali e formaram juízo sobre o assunto. Neste caso não consigo ficar quieta como nos casos acima. Pergunto sobre qual tema, tecnicamente falando, eles são contra. E daí vem o argumento que o país será devastado. Credo! Eu que passei a vida discordando do PCdoB, desta vez concordo em inúmeros pontos com o Aldo Rebelo. Então aproveito e faço sempre, de forma humilde, o pedido de que leiam o projeto, marquem o que não concordam e procurem alguém que esclareça as suas dúvidas. Mas não, sur-

me sentei ou estacionei em lugares de idosos e deficientes. Não imponho a fumaça do meu cigarro a ninguém. Não me sinto superior a ponto de querer fazer lavagem cerebral nas pessoas com as minhas teorias, sobre meu modo de viver. Não me interessa se as pessoas são homo ou heterossexuais, negras, brancas, roxas de bolinhas amarelas. Ricas, pobres, burras, inteligentes. Me interesso pura e simplesmente por pessoa. Sou sonhadora, desejo, busco a felicidade. Quem quiser viver na prepotência e no autoritarismo, por favor, se afaste de mim.

Claudia Wasilewski é empresária e cronista da Revista Ideias. Leia mais: www.claudiawas.blogspot.com


Cartas do Leitor Escreva para cartas@revistaideias.com.br

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REVISTA

Publicação da Travessa dos Editores ISSN 1679-3501 Edição 114 – R$ 10,00 www.revistaideias.com.br e-mail: ideias@revistaideias.com.br EDITOR-CHEFE Fábio Campana CHEFE DE REDAÇÃO Marianna Camargo REDAÇÃO Karen Fukushima, Larissa Reichmann Lobo, Marisol Vieira, Sarah Corazza, Thais Kaniak.

Senhores, Queremos parabenizar Karen Fukushima pela reportagem isenta de preconceitos e bastante elucidativa sobre o mundo liberal e sobre o swing em Curitiba. Nós percebemos, na entrevista, uma jornalista realmente aberta ao que tínhamos a dizer. Uma honestidade profissional que pode ser vista na matéria. Obrigado e abraços, Casal Venus A ESCOLHA DOS TALHERES

Excelente este texto, realmente nós curitibanos da gema, em grande parte não compartilhamos dessas bobeiras carnavalescas... Parabéns ao Fábio Campana Gilberto O senhor é que deveria ser despachado para a Sibéria, para meditar embaixo do gelo, onde o cheiro do povo não lhe perturbaria o nariz empinado. Agora dá pra saber por que o carnaval não vai em Curitiba, porque aqui existe muita gente parecida com o senhor, que odeia o povo. Até acho que o senhor é do PSDB. Vai logo, pra longe do povo que assim ficamos melhor. Adeus. João Carlos de Freitas

Salvador Dali combina perfeita­ mente com essa crônica... Adorei e parabéns! Beijo Candice Bittencourt Tive o privilégio de conhecer este informativo e felicito a Direção pelo alto nível das informações e análises. João Luis Muller

Prezados amigos da Revista Ideias Parabéns pela publicação, única no gênero no Paraná. É sem dúvida uma revista diferenciada e com matérias que fogem do lugar comum.

COLUNISTAS Camilla Inojosa, Carlos Alberto Pessôa, Claudia Wasilewski, Izabel Campana, Jaime Lerner, Jussara Voss, Luiz Carlos Zanoni, Luiz Fernando Pereira, Luiz Geraldo Mazza, Luiz Solda, Pryscila Vieira, Salvyano Cavalcanti de Paiva, Rogerio Distefano. COLABORADORES Fernando A. F. Bini, Isabela França, Kraw Penas, Marcelo Vellinho. DIRETOR DE FOTOGRAFIA Dico Kremer TRATAMENTO DE IMAGEM Carmen Lucia Solheid Kremer FOTO CAPA Átila Alberti CAPA Clarissa M. Menini PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO Clarissa M. Menini, Katiane Cabral e Luigi Camargo DIRETORA FINANCEIRA Clarissa M. Menini CONSELHO EDITORIAL Aroldo Murá G. Haygert, Belmiro Valverde, Carlos Alberto Pessôa, Denise de Camargo, Fábio Campana, Lucas Leitão, Paola De Orte, Rubens Campana. PARA ANUNCIAR comercial@revistaideias.com.br PARA ASSINAR assinatura@revistaideias.com.br

Rua Desembargador Hugo Simas nº 1570 CEP 80520-250 / CURITIBA PR Tel.: [41] 3079 9997 www.travessadoseditores.com.br

Jaime Kaster abril de 2011 |

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Pryscila Vieira ĂŠ cartunista. Veja mais: www.pryscila-freeakomics.blogspot.com

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