MIP Mag 9

Page 1

make itmag positive

Psicologia Positiva • neurociência • coaching • saúde • conhecimento

Psicologia Positiva pela

PAZ

Congresso Português e Simpósio Luso-Brasileiro discutem como melhorar o mundo para gerações futuras 1

Veja também: Entrevista com Helena Marujo, da Universidade de Lisboa Soluções para o assédio moral em pauta em laboratório brasileiro Vínculo entre saúde e emoções positivas é diferente no Japão A diferença entre garra e autocontrole para uma vida bem-sucedida


2


editorial

Paz, otimismo e cultura

O

que as próximas gerações podem esperar (e receber) deste nosso mundo? É fato que, mesmo assistindo a uma onda de fundamentalismos e violência, vivemos mais e melhor que 25 anos atrás. E para a promoção de constantes avanços (e prevenções de crises de ordem cíclicas e sistêmicas já registradas na história de nossa civilização) eis aí um questionamento que deve ser frequente nas gerações atuais. Nesse sentido, um esforço coletivo de idealizar um planeta em paz, mais otimista e positivo como legado para quem está por vir ocorre entre os heads e participantes do III Congresso Português de Psicologia Positiva, que este ano abriga o I Simpósio Luso-brasileiro do tema, organizado por nossa colunista Andréa Perez Corrêa. A importância de discussões em Língua Portuguesa sobre o tema ultrapassa as questões do idioma e do nível da produção acadêmica dos países envolvidos, para lançar luz às questões culturais, que mostram como é diferente a compreensão e experiência do que seja felicidade nos mais diversos rincões deste globo. A primeira demonstração disso, no entanto, é mesmo de ordem etimológica. Enquanto o termo hapiness, de origem anglo-saxônica, refere-se ao que acontece, que está por vir, a designação latina para felicidade remete a fertilidade, virtuosidade e esse sentido certamente está ligado à forma como as comunidades de origem latina, incluindo países de Língua Portuguesa, vivenciam o bem-estar subjetivo. Ainda sobre culturas, enquanto achados significativos ligam as emoções positivas a benefícios à saúde, de modo geral, uma nova pesquisa sugere que essa questão depende da forma como são experienciadas essas emoções em cada sociedade. Para os ocidentais, diversos estudos estabeleceram a correlação positiva entre ambas. Já para o Leste Asiático, a relação entre emoções positivas e a prevalência de doenças cardíacas, em particular, não ocorre da mesma forma. Deslocar o eixo de pesquisa para os extremos meridianos e hemisférios seria algo saudável, pela perspectiva desse novo levantamento, que ocorreu com uma amostra considerável tanto de população ocidental quanto de oriental. A Psicologia Positiva se evidencia também no combate de um problema de ordem cultural, mas no microcosmo das organizações. É para silenciar o assédio moral que ela está sendo pesquisada e aplicada, em laboratório acadêmico catarinense, um dos únicos brasileiros a tratar de mais positividade nas organizações. É com essa mensagem de que a Psicologia Positiva se apresenta como um movimento consistente de transformações (e de que estas são necessárias para o aprimoramento de pessoas e instituições em nível global) que apresentamos esta edição de MIP Mag. Mas isso se trabalhado intencional e conscientemente, de forma contínua e em prol de interesses comuns. Boa leitura! Equipe MIP Mag

3

Ano II – n o 9 – mar./abr./mai./jun. 2018 www.makeitpositivemag.com

MIP Mag é uma publicação quadrimestral do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento (IPPC). É proibida a reprodução sem autorização do IPPC e dos autores. As informações ou opiniões contidas nesta publicação não refletem necessariamente a posição do IPPC. DIRETORIA Lilian Graziano Fabio Appolinário CONSELHO EDITORIAL Lilian Graziano APOIO

Associação de Psicologia Positiva da América Latina REALIZAÇÃO:

PONTO A comunicação • conteúdo • desenvolvimento humano www.ponto-a.com • comunicacao@ponto-a.com @PontoA_falecom • Tel./Fax (11) 3042-5900

Edição e coordenação: Jussara Goyano Arte e projeto gráfico: Monique Elias Pesquisa e traduções: Marina Werneck Colaborou nesta edição: Juliana Tavares CONTATOS COM A REDAÇÃO: E-mail: mipmag@psicologiapositiva.com.br Endereço para correspondência/ Adress: Rua Helena, 140, cj. 111/112, Vila Olímpia, S. Paulo – SP – Brasil CEP: 04552-050 COMERCIAL E MARKETING: secretaria@psicologiapositiva.com.br


SUMÁRIO

• clique nos assuntos para ler o conteúdo! •

EDITORIAL EVENTO III Congresso Português e I Simpósio Luso-Brasileiro de Psicologia Positiva

ENTREVISTA Helena Marujo fala sobre educação para o otimismo e cultura de paz

LEITURAS Character Strengths Intervention – A Field Guide for Practitioners, de Ryan M. Niemiec

CORPORATE Psicologia Positiva contra o assédio moral

TESTIMONIAL O exercício assíduo e constante do otimismo e das forças pessoais transformando vidas e oferecendo oportunidades

BEM-ESTAR A questão cultural na relação entre as emoções positivas e a saúde dos indivíduos NEUROCIÊNCIA O segredo do sucesso é o autocontrole

E MAIS... Positive News Positive WIKI Sua Felicidade

4

IMAGENS: FREEPIK/DIVULGAÇÃO

imagem da capa: freepik/montagem: Monique Elias


entrevista

Otimismo que se ensina

IMAGENS: FREEPIK

A Psicologia Positiva como combustível para a educação de cidadãos e cidadãs mais generosos e cidades mais humanas e pacíficas • Por Juliana Tavares •

5


entrevista

inúmeras

perspectiva da paz positiva

alimentam sustentam

6

YOUTUBE.COM/REPRODUÇÃO

E

la foi uma criança curiosa que, de tanto que se mexia e se fascinava pela vida ao redor, talvez tivesse recebido o diagnóstico de hiperatividade, se o diagnóstico fosse possível naquela época. Ainda pequena, decidiu que queria uma profissão com a qual pudesse ajudar a cuidar, dar atenção, reduzir o sofrimento e trazer alegria e leveza para as pessoas. A Psicologia surgiu, então, como sua escolha derradeira, embora sem muita referência. Apesar de fazer o que gostava, sentia um incômodo: apesar do seu objetivo tão positivo (diminuir o sofrimento psicológico) a Psicoterapia ainda implicava em olhar a pessoa através das suas fraquezas, problemas e déficits, diagnosticando patologias. Foi quando, no âmbito do seu doutorado em Psicoterapia e Aconselhamento Educacional, Helena Águeda Marujo decidiu estudar a depressão em crianças e adolescentes. Diante dos resultados segundo ela, não tem sido fácil dentro assustadores, que revelaram níveis de depressão da academia, pois há desconfiança auto-avaliados nos estudantes, ela escolheu que era sobre rigor do estudo do positivo, mas tempo de estudar as pessoas no seu melhor e ajudátem sido extraordinário! las a conhecer-se através desse ângulo. Encontrou A psicóloga interrompeu a agenda o livro “Otimismo aprendido”, de Martin Seligman, superlotada com os preparativos para o que veio reforçar a ideia de que podemos identificar III Congresso Português de Psicologia e otimizar as virtudes, em Positiva, que acontece em especial o otimismo. março e do qual é uma das “São Escreveu com Luis Miguel organizadoras, para dedicar as contribuições Neto e Maria de Fatima uma tarde inteira para Perloiro o livro Educar para responder às perguntas da na o Otimismo (1999), traduzido MIP Mag por e-mail. Além para o Espanhol e já em sua , de falar um pouco mais 20ª edição. Não demorou sobre como educar para o que implica a para se tornar uma das otimismo – Marujo aborda, referências em Psicologia construção intencional com exclusividade, o capítulo Positiva. “Felicidades: Como ser de ações que Marujo integra a humanos juntos”, de Marujo International Positive & Neto (no prelo) e que será e Psychology Association exposto em palestra no a paz” e acompanha a criação da congresso. Associação Portuguesa de Estudos e Intervenções em Psicologia Positiva. Há COMO VOCÊ AVALIA O CRESCIMENTO oito anos, co-organizou o I Congresso Português de DA PSICOLOGIA POSITIVA, HOJE, NO Psicologia Positiva e, há seis anos, criou a primeira MUNDO? e única pós-graduação em Psicologia Positiva no Exuberante, inesperado, incomparável. Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas Um crescimento pouco comum noutras da Universidade de Lisboa, o Executive Master em áreas científicas e dentro da própria Psicologia Positiva Aplicada. Um caminho que, ciência psicológica. Como um rastilho,


otimismo

que faz sentido às pessoas a reconciliação, a gratidão, “O e se alargou a tantas outras a comunicação construtiva está a morrer áreas cientificas, que prefiro e harmoniosa, os bens falar em Ciências Sociais não instrumentais, pelas mãos de uma relacionais Positivas – temos hoje a a defesa da biodiversidade a economia da felicidade; a todos os níveis, a otimização e um educação positiva; a saúde da esperança e do otimismo, da positiva... Espalhou-se por justiça social e da igualdade, todo o mundo, mesmo em da participação social inclusiva . Precisamos países com regimes políticos e da democracia, da felicidade de jornalismos menos respeitadores dos associada a uma vida com direitos humanos. Assim, que transcende as construtivos, que não sentido não é um movimento apenas metas pessoais, mas olha para deixem de trazer os o bem comum, entre outras. dos países desenvolvidos, mas também de países problemas, mas que NO LIVRO EDUCAR PARA em desenvolvimento, em guerra, ou em depressão. O OTIMISMO, VOCÊ também E está a ganhar contornos APRESENTA DADOS SOBRE AS ” com mais sensibilidade CONSEQUÊNCIAS DA EDUCAÇÃO cultural, especificidades DEPRESSIVA PARA O próprias aos contextos. Estas distinções no DESENVOLVIMENTO DOS JOVENS. É POSSÍVEL entendimento do que se estuda neste domínio APONTAR QUAIS SÃO ESSAS CONSEQUÊNCIAS e as particularidades das comunidades e grupos humanos, estão a enriquecer o movimento da Psicologia Positiva, complexificando os contextos e desafiando a melhores e mais profundas teorizações e investigações, fazendo face a algumas das críticas feitas ao próprio domínio, que se tem reinventado e melhorado mesmo em tão pouco tempo real de vida como movimento internacional.

sociedade jornalismo cínicos

foquem as soluções

IMAGENS: FREEPIK

QUAIS AS PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA POSITIVA PARA O DESENVOLVIMENTO DA PAZ NA SOCIEDADE?

São inúmeras as contribuições, em especial na perspectiva da paz positiva, que implica a construção intencional de ações que alimentam e sustentam a paz. Por exemplo, através de virtudes como o perdão e

7


entrevista

E COMO RECONHECER ESSES SINAIS DE DEPRESSÃO NUM SISTEMA EDUCACIONAL?

“Termos um

único objetivo

para nossa educação

limita empobrece

desenvolver, otimizar, desde idades precoces, e a maioria desses programas é realizado em contexto escolar.

Muitas vezes, só damos é algo que a conta dos alunos DE QUE MANEIRA ESTIMULAR O deprimidos se eles OTIMISMO DESDE A JUVENTUDE E e de tiverem maus resultados O QUE ISSO PODE PROPORCIONAR escolares. Num estudo forma assustadora. PARA TODA A SOCIEDADE? que realizei verifiquei Com bons modelos na esfera O mesmo para que os colegas são mais privada e na esfera pública, sensíveis em identificar quando esquecemos através de pais e professores quem está deprimido do que ensinam e modelam a que os docentes, pelo que formas otimistas de encarar podemos começar a ter os a experiência e a vida, e de ea colegas como elementos modelos inspiracionais com em cada um” sinalizadores dos alunos valor social que servem com menos e mais também a esse propósito. Como bem-estar. A depressão corta as raízes da esperança se cresce sem esperança? Com e do otimismo, da motivação para as coisas boas narrativas da família, da escola ou da vida, da construção de metas e da construção dos meios de comunicação social confiante de caminhos para os atingir e do sentido sempre a lembrarmos da dimensão de capacidade para conseguir atingir essas metas. O dramática dos nossos problemas, e mais belo deste processo é que há programas muito a trazer narrativas catastróficas. O bem testados e fundamentados que evidenciam otimismo está a morrer pelas mãos que a esperança e o otimismo se podem treinar, de uma sociedade e um jornalismo cínicos. Precisamos de jornalismos construtivos, que não deixem de trazer os problemas, mas que também foquem as soluções – quem, onde, como estão, já, a acontecer soluções práticas para cada problema social.

humanidade afetividade

QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS DESAFIOS DO SISTEMA EDUCACIONAL, HOJE, NO ÂMBITO DO BEM-ESTAR QUE SE OFERECE PARA ALUNOS E PROFESSORES?

O foco, quase exclusivo, no desempenho, no resultado escolar, na formação para uma profissão, com as questões econômico-financeiras como as mais importantes tem impedido e silenciado a formação das virtudes, das relações interpessoais, do sentido transcendente da vida etc. Termos apenas um objetivo para a educação é algo que a limita e empobrece, de forma

8


assustadora. O mesmo vale para quando esquecemos a humanidade e afetividade em cada um – em vez de autorizarmos sua presença e a acolhermos, no seio das nossas salas de aula, dos corredores e ginásios dos nossos espaços educativos...como trabalhamos a esperança, a resiliência, a motivação intrínseca, os bens relacionais, a transcendência, a generosidade, o sentido de humor, a espiritualidade, a sustentabilidade ambiental, a paz...Como nos permitirmos a usar a educação de forma realmente integradora da totalidade do ser humano.

IMAGENS: FREEPIK

O SEU PAINEL NO CONGRESSO SERÁ SOBRE TURISMO, PAZ POSITIVA E FELICIDADE PÚBLICA. QUAIS OS CRITÉRIOS PARA UMA CIDADE SER CONSIDERADA COM BOM ÍNDICE DE FELICIDADE PÚBLICA?

Para esta resposta, cito o artigo “FeliCidades: Como ser humanos juntos” (Marujo & Neto, no prelo). Unir a dimensão geográfica e espacial aos estudos da felicidade tem enorme potencial. Com efeito, após controlar as variáveis sociodemográficas, a evidência mostra que há diferenças significativas no bem-estar ligado à variação geográfica e que o desenho urbano impacta a forma como nos sentimos, pensamos e agimos perante a cidade. A vontade determinada de aplicar os conhecimentos da ciência básica do bem-estar, para melhorar, efetivamente, a vida dos cidadãos e das cidadãs, alinha-se com o modelo da Psicologia Positiva, que se tem debruçado sobre os

9

estudos da felicidade, tanto individual, quanto pública. Quando as culturas e os momentos históricos enfrentam falta de recursos, pobreza, instabilidade, ameaças militares, ou outras intimidações à felicidade e harmonia, preocupam-se naturalmente com a sua proteção, defesa e controlo de danos. Apenas quando a vida está estável, pacifica e próspera as culturas viram a sua atenção para a virtude, as qualidades mais transcendentes e belas, a criatividade. As cidades de futuro idealizadas são cidades que prosperam saudavelmente e ajudam os seus cidadãos a florescer, a usar de todo o seu potencial e a compartilhá-lo para o bem de todos e todas. Há uma ligação orgânica das cidades com a virtuosidade, e desta com a busca e construção da felicidade. As cidades que teremos dependem de nós, e das escolhas conscientes, refletidas, críticas, conversadas e fundamentadas

“Há uma ligação orgânica das cidades com a virtuosidade, e desta com a busca e construção da felicidade. As cidades que teremos dependem de nós

e das escolhas conscientes, refletidas, críticas, conversadas e fundamentadas que fizermos”


que fizermos. E este é um local, regional, nacional, “A proposta é tempo para voltarmos a em redor de tópicos e pensar criticamente como domínios ligados com a estamos a preparar a da comunidade, cidades emocionalmente ecologia consciência política e moral dinâmicas comunitárias, dos cidadãos e das cidadãs. relações comunitárias, , Tudo muda se acreditarmos e valores extrínsecos, com comunidades que há soluções possíveis, não estritamente que já estão em prática, materialistas. e que há vontade civil Ao nos movermos para com mais longe dos conceitos para as expandir, e cocriar outras, por forma individuais de felicidade, ética, a inverter a catástrofe e ao considerar o locus ecológica e o sofrimento e a responsabilidade da e equidade” pessoal e social. Viver com mudança de dentro do base numa coexistência mutuamente respeitadora, indivíduo em direção ao bem-estar da interdependente, entre pessoas e planeta, é algo comunidade – capacitando populações, enraizado nos valores humanos tradicionais da e desenvolvendo relações recíprocas cooperação. Se nos referirmos a comunidade positivas e bens relacionais, vemos como como um valor (forma de trazer coesão, justiça este caminho talvez ofereça a promessa social, empowerment…) e como um conjunto de de “cidades da felicidade do comum”. variáveis e categorias descritivas (como localização, A proposta é por isso desenhar interesse, identidade, comunhão, risco, recursos, e gerir cidades emocionalmente organizações, diásporas), percebemos a valia da inteligentes, com comunidades comunidade em si mesma, e do argumento da conectadas e próximas, promotoras necessidade de uma comunidade saudável – ao nível de bens relacionais não instrumentais,

desenhar e gerir inteligentes

conectadas e próximas, oportunidades

10


que aumentem a equidade e a justiça, e expandam as possibilidades de escolha ética e informada, virtuosa, com benefícios partilhados por todos. Perceber por que e como decidimos onde viver, para que cidades viajar, que custo financeiro estar disposto a investir em troca de comodidades específicas, nomeadamente bens relacionais ou naturais, e as suas relações com a felicidade autoavaliada, precisam continuar a ser estudados. Em particular, a investigação do capital humano das cidades, e a sua ligação com a felicidade dos seus habitantes, merece maior investimento futuro. O impacto das desigualdades na distribuição da riqueza, nas disparidades sociais, geográficas, espaciais e tecnológicas, e as prementes questões da justiça social e espacial, pela sua relação inequívoca

“O discurso sobre as cidades felizes inclui uma combinação de termos para expressar tudo o que uma cidade deve ser: sustentável e

tecnológica, inclusiva e competitiva, amiga das empresas e criativa, bela e respeitadora do ambiente, organizada e aberta à participação dos cidadãos e das cidadãs”

com a coesão social, devem fazer cada vez mais parte dos estudos da felicidade. O discurso sobre as cidades felizes inclui, assim, uma combinação de termos para expressar tudo o que uma cidade deve ser: sustentável e tecnológica, inclusiva e competitiva, amiga das empresas e criativa, bela e respeitadora do ambiente, organizada e aberta à participação dos cidadãos e das cidadãs, capaz de responder aos problemas práticos como a sobrepopulação ou o envelhecimento demográfico – na linha do que os sociólogos, economistas, neurocientistas, urbanistas, ecologistas, arquitetos, engenheiros e psicólogos mais defendem. Um dos fundamentais propósitos das cidades deverá ser, por isso, fazer as pessoas saudáveis e felizes, pelo que a felicidade dos cidadãos e das cidadãs precisa ser tida em conta quando se planeia, desenha e governa uma cidade. Por isso, qualquer cidade que se preocupe genuinamente com a felicidade das suas cidadãs e dos seus cidadãos, deve pensar a conexão direta da felicidade com a justiça distributiva que, afinal, não mais é do que a igualitária e equitativa distribuição de recursos. Ao colocar a justiça diretamente no centro do bem-estar, teremos cidades mais dignificadoras e humanizadoras, e mais pacíficas. • JULIANA TAVARES é jornalista e escreve sobre Ciência e Psicologia, entre outros assuntos relevantes.

11


corporate

Psicologia positiva contra o

assédio moral ESTUDOS MOSTRAM QUE AS PRÁTICAS DE ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO DIMINUEM A PRODUTIVIDADE, QUALIDADE E RENTABILIDADE DOS FUNCIONÁRIOS, ENTRE OUTROS FATORES • POR JULIANA TAVARES •

12


O

assédio moral expõe os trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho. De acordo com a pesquisadora francesa, psiquiatra e psicanalista Marie France Hirigoyen (2006), a prática se caracteriza por qualquer ação que possa trazer danos à dignidade, à personalidade, à integridade física ou psíquica de uma pessoa, e que pode colocar em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho. Segundo a Organização Mundial de Saúde, é uma das principais causas de estresse no ambiente de trabalho e constitui um fenômeno internacional, como é possível conferir em levantamento de 2016 realizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) junto a diversos países, que causa, entre outros fatores, diminuição da produtividade, da qualidade de vida e da

As causas que motivam esse tipo de comportamento no ambiente de trabalho são complexas e

IMAGENS: FREEPIK

multifacetadas,

13

geralmente oriundas de uma mistura bombástica de personalidades rígidas e hierarquia

acrítica


corporate

Psicología Evolutiva, Educativa, Social y Metodología, da Universitat Jaume I, em Castellón de la Plana (Espanha). No Brasil, entre os poucos centros de pesquisa sobre o tema, está o Laboratório de Psicologia Positiva nas Organizações e no Trabalho (LAPPOT), alinhado com o curso de Graduação e Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), hoje sob a coordenação de Narbal Silva, especialista em Psicologia Organizacional e do Trabalho e doutor em Engenharia de Produção. Desde a sua criação, em 2015, o laboratório tem realizado pesquisas envolvendo Psicologia Positiva nas organizações e no trabalho, a partir de atividades de extensão e intervenção em organizações do primeiro, segundo e terceiro setores, além de participar de eventos, desenvolvimento de livros e inúmeras parcerias com núcleos de pesquisa nacionais e internacionais. Surgiu da percepção de Narbal de que a área de conhecimento e o campo de atuação em Psicologia das Organizações e do Trabalho, com o advento da Psicologia Positiva, precisaria ser ressignificada e atualizada, como modo de dar conta das atuais demandas nas organizações no que se refere à complexidade dos problemas humanos. “As organizações são microssociedades estruturadas que expressam em sua totalidade os contextos político, econômico, cultural e social nos quais estão inseridas”, explica Silva. “O laboratório pretende identificar, por meio da investigação e da discussão de questões relativas

rentabilidade dos funcionários. No Brasil, uma pesquisa realizada pelo site Vagas.com com 4.975 mil profissionais de todas as regiões do País, em 2015, mostrou que 52% das pessoas disseram ter sido vítimas de assédio sexual ou moral. Na maioria dos casos (84%), o assédio foi praticado por chefes diretos das vítimas ou por alguém que tinha um cargo mais alto dentro da hierarquia das empresas. As causas que motivam esse tipo de comportamento no ambiente de trabalho são complexas e multifacetadas, geralmente oriundas de uma mistura bombástica de personalidades rígidas, conservadoras e sobretudo autoritárias com organizações orientadas exclusivamente pelos princípios da hierarquia e da disciplina acríticas, nas quais prevalece o monólogo, ao invés do diálogo. Além disso, há o próprio clima organizacional de competição e de rivalidade que acaba contribuindo com a exacerbação da cultura do assédio moral. Com base nos pressupostos da Psicologia Positiva e diante das demandas sociais e das constantes mudanças nos contextos de trabalho, no Brasil e no exterior, vem sendo construídos paulatinamente conhecimentos pertinentes à Psicologia Positiva das Organizações e do Trabalho (PPOT). No exterior, como referência, há o grupo WONT (Work and Organizational Network), focado em prevenção psicossocial e organizações saudáveis, vinculado ao Departamento de

As respostas

organizacionais

frente às práticas de assédio moral podem se dar em duas frentes: a da prevenção e a do combate 14


Coerência entre

valores organizacionais, contratação de pessoas que

partilham ideais

semelhantes, a ausência de lideranças autoritárias e a manutenção

das promessas e planos evitariam o problema

assédio moral.; táticas da equipe sênior, que nomeia um capataz para fazer o trabalho sujo enquanto a diretoria permanece com as mãos limpas, além de práticas organizacionais opressivas, que incluem, por exemplo, punições para quem não atinge as metas. Nessa perspectiva, as respostas organizacionais frente às práticas de assédio moral podem se dar em duas frentes: a da prevenção e a do combate (Heloani & Barreto, 2010). A primeira envolve a construção de uma nova mentalidade no ambiente de trabalho. A segunda frente remete à construção de instrumentos e mecanismos de controle e punição aos responsáveis pelas práticas perversas. Em que pese os pressupostos da Psicologia Positiva quando prioriza a saúde psicossocial, de modo preventivo e enfocando o melhor do ser humano, e não a doença, as organizações deveriam basear as ações de qualidade de vida a partir de pressupostos

ao comportamento do trabalhador, quais variáveis impactam positivamente no enfrentamento das adversidades laborais cotidianas, contribuindo, assim, para o desenvolvimento da ciência e para exploração de novas fronteiras das virtudes humanas, auxiliando na prevenção e intervenção nos prejuízos causados pelo ambiente de trabalho”, diz.

IMAGENS: FREEPIK

FELICIDADE NAS ORGANIZAÇÕES Há diferentes maneiras pelas quais os gestores e demais trabalhadores podem começar a empregar táticas de intimidação como um estilo de gestão. Para exemplificar, Tehrani (2005) cita pressão externa (de acionistas, clientes ou agências do governo); metas de lucro ou desempenho pré-estabelecidos e que não podem ser alcançados, causando estresse significativo e pressão sobre todos os funcionários em toda a organização; história e cultura baseadas em crenças e premissas negativas, o que institucionaliza a prática de

15


corporate

assédio moral não são toleradas. “A qualidade de vida no trabalho, mediada pelo bem-estar subjetivo e psicológico, constitui meio aplicado fundamental para produzir a felicidade no trabalho”, defende a autora. “Ao escolher uma política positiva de dignidade no trabalho, os gestores percebem que é mais fácil e funcional encorajar os trabalhadores a terem uma declaração positiva e a implantarem bons comportamentos na organização.”

OBSTÁCULOS A liderança das organizações tem papel fundamental para a prevenção do assédio moral. Gumbau, Soria & Sorribes (2009), por exemplo, identificaram que o líder transformacional tem a capacidade de gerar nos seus liderados afetos positivos, fazendo com que se sintam mais relaxados, entusiasmados, à vontade, otimistas, resilientes às mudanças e satisfeitos com o trabalho. A implementação de estratégias positivas no ambiente corporativo, porém, exige uma mudança cultural profunda e é aí que mora o maior desafio

A implementação de

estratégias positivas

no ambiente corporativo exige uma mudança cultural profunda. Eis o maior desafio do combate ao assédio moral nas organizações 16

IMAGENS: FREEPIK

culturais humanistas, entre eles confiança, respeito e solidariedade (Silva & Tolfo, 2011). Na tese “Gestão de pessoas, prevenção e combate ao assédio moral em uma organização saudável”, realizada a partir de um estudo de caso, a doutora em psicologia e uma das integrantes do LAPPOT, Joana Cugnier, notou que quando há a percepção de coerência entre os valores preconizados pela cultura organizacional, a contratação de pessoas que compartilham das mesmas ideias, a não existência de lideranças autoritárias, a execução de estratégias e ações de acordo com o planejado e divulgado pela empresa e a promoção de um ambiente saudável no qual as pessoas sentem prazer em trabalhar, situações de


do combate ao assédio moral nas organizações. Segundo Freitas, Heloani e Barreto (Assédio Moral no Trabalho, 2008), esse tipo de conduta diz respeito à negligência dos aspectos desencadeadores do fenômeno pelos gestores, que o permitem não porque o desejam, mas porque se omitem. “A edificação de uma cultura contrária às práticas de assédio moral passa por atitudes e comportamentos não coniventes dos gestores a esse respeito, que devem ser guias de conduta na empresa. Os líderes, mais que todo mundo, devem apresentar comportamentos, escolhas e decisões que demonstrem ser avessos a qualquer tipo de assédio moral no ambiente de trabalho. Isso significa que gestores ou demais trabalhadores altamente resistentes em alterar hábitos e costumes que geram assédio moral deverão, por exemplo, deixar a organização, de modo a sinalizar para os demais que tais práticas passaram a ser vistas como absolutamente intoleráveis”, explica o coordenador do LAPPOT. Silva também sugere a criação, pelas organizações, de espaços de interlocução e diálogo com gestores e demais trabalhadores, visando identificar práticas e situações de assédio moral, além de propor ações efetivas de superação de tais malefícios. “É preciso evidenciar, inclusive, o quanto as organizações orientadas por práticas de assédio moral no ambiente

“Em que pese termos superado muito dos aspectos que se vinculam a todo e qualquer tipo de intolerância, (...) há muito em que avançar” de trabalho desequilibram a equação ‘qualidade de vida no trabalho, bem-estar e felicidade, produtividade, qualidade e rentabilidade’.” A Psicologia Positiva, neste âmbito, pode ajudar a promover outras iniciativas, como grupos de desenvolvimento do capital psicológico e de qualidade psicológicas positivas, tanto nos gestores como também nos demais trabalhadores, além de incentivar todo e qualquer tipo de ação que esteja orientada para a qualidade de vida, bem-estar e felicidade da força de trabalho. “Em que pese termos superado muito dos aspectos que se vinculam a todo e qualquer tipo de intolerância, rumo a edificação de organizações saudáveis, livres de políticas, práticas e comportamentos de assédio moral, há muito em que avançar. Ainda guardamos no contexto das nossas organizações muitos resquícios de intolerância e de preconceitos para com os seres humanos que se encontram à nossa volta. A Psicologia Positiva pode ajudar a prevenir e combater essas ações negativas”, finaliza Narbal. Sigamos adiante. • JULIANA TAVARES é jornalista e escreve sobre Ciência e Psicologia, entre outros assuntos relevantes.

17


bem-estar

Influência das

emoções positivas depende da cultura NOVAS PESQUISAS SUGEREM QUE O VÍNCULO ENTRE EMOÇÕES E SAÚDE PODE VARIAR DE ACORDO COM O CONTEXTO CULTURAL • POR JULIANA TAVARES •

I

númeras pesquisas têm se esforçado para identificar fatores de risco para doenças do coração. Algumas delas reuniram evidências de determinantes biológicos, comportamentais e psicossociais, além de fatores orgânicos – como hipertensão, obesidade e diabetes – que explicariam apenas 40% das ocorrências de doenças cardíacas (Kubzansky & Kawachi, 2000). Outros estudos empíricos têm demonstrado mais diretamente a relação entre doenças cardiovasculares e fatores psicossociais, tais como nível socioeconômico, suporte social, idade, gênero, padrão de comportamento tipo A (característica de pessoas extremamente competitivas, perfeccionistas e que gostem de realizar várias tarefas no menor tempo possível), estresse, depressão e emoções negativas e positivas.

18

De acordo com os estudos, as emoções, principalmente as negativas, provocam alterações fisiológicas com impacto negativo no prognóstico da doença coronariana (Kubzansky & Kawachi, 2000; Perez & cols., 2005; Richman & cols., 2005; Sirois & Burg, 2003), além de influenciar a adesão a comportamentos prejudiciais à saúde, como tabagismo, consumo de álcool e drogas, diminuição da qualidade do sono, má alimentação, obesidade, sedentarismo e isolamento social (Kubzansky & Kawachi, 2000; Sirois & Burg, 2003). Para somar a estas informações, um estudo recém-publicado pela Psychological Science, uma revista da


IMAGENS: PIXABAY

Adultos norte-americanos que experimentam níveis elevados de emoções positivas mostraram se mais propensos a ter índices

APS (Association for Psychological Science – Washington, EUA), mostrou que experimentar emoções positivas está associada a uma melhor saúde cardiovascular nos EUA, mas não no Japão, sugerindo que o vínculo entre emoção e resultados de saúde pode variar de acordo com o contexto cultural. Pela pesquisa, os adultos norte-americanos que experimentam níveis elevados de emoções positivas, como sentir-se “alegre” e “extremamente feliz”, mostraram-se mais propensos a ter índices saudáveis ​​de lipídios no sangue, mesmo depois de explicar outros fatores como idade, gênero, status socioeconômico e condições crônicas. No entanto, isso não se repetiu com os japoneses.

saudáveis de lipídios no sangue. O mesmo não aconteceu com os japoneses

19


bem-estar

Embora alguns estudos tenham examinado as

motivo desta diferença estaria no fator cultural. Enquanto que, para os norte-americanos, experimentar emoções positivas é desejável e até mesmo encorajado pela sociedade, nas culturas do Leste Asiático, as emoções positivas são vistas como fúteis e responsáveis por tirar a atenção das tarefas importantes. “As emoções positivas são concebidas e valorizadas de forma diferente em todas as culturas. Isso nos levou a questionar se os benefícios para a saúde observados em conjunto com as emoções positivas podem ser exclusivos das populações ocidentais”, afirmou o cientista psicológico Jiah Yoo, da Universidade de Wisconsin-Madison, que conduziu o estudo. Por cultura, entende-se como o conjunto de elementos que medem e qualificam qualquer atividade física

ou mental, que não seja determinada pela biologia, e que seja aprendida, compartilhada e padronizada por diferentes membros de um grupo social, incluindo valores, símbolos, normas e práticas. A partir dela, os atores sociais constroem significados para as ações e interações da sociedade, que sustentam as formas sociais vigentes, as instituições e seus modelos operativos ( Laraia, 1986). No caso da pesquisa da APS, foi criada uma comparação intercultural que examinou dados de dois grandes estudos representativos: Midlife nos Estados Unidos e Midlife no Japão, ambos financiados pelo National Institute on Aging. Além das classificações dos participantes sobre a frequência com que sentiram 10 emoções positivas diferentes nos 30 dias anteriores, os dados avaliaram os índices de lipídio no sangue. “Devido à prevalência global da doença arterial coronariana, os lipídios sanguíneos são considerados importantes índices de saúde biológica em muitos países”, explica Yoo. “Como esperado, os dados indicaram que a experiência de emoções positivas frequentes estava associada a perfis lipídicos saudáveis ​​para participantes americanos. Mas não havia tal evidência para os participantes japoneses.” Embora alguns estudos tenham examinado as diferenças culturais nas ligações entre emoções positivas e funcionamento saudável, o trabalho é inovador, na medida em que incluiu medidas biológicas de saúde e grandes amostras representativas de ambos os países. “Nossa principal descoberta é que as emoções positivas influenciam

diferenças culturais nas ligações entre

emoções positivas e funcionamento saudável, trabalho em questão é inovador, ao incluir medidas biológicas de saúde e grandes amostras representativas de ambos os países

20


Escore das Melhores Experiências Positivas no Mundo Paraguai Costa Rica

83

Filipinas

82

Panamá

Uzbequistão Equador os índices de lipídios do sangue de forma diferente em todas as culturas”, diz. Os resultados ressaltam a importância do contexto cultural para entender o vínculo entre emoção e saúde. Neste quesito, a Psicologia Positiva e as investigações que abordam o bem-estar subjetivo e a felicidade podem trazer importantes contribuições para a compreensão e a melhoria da qualidade de vida e saúde das pessoas.

IMAGENS: FREEPIK

ÍNDICE DE EMOÇÕES GLOBAIS Embora medidas como o desemprego e o PIB ajudem a quantificar certos aspectos da saúde de uma sociedade, praticamente não existem dados de nível macro sobre o estado emocional de um país. Por essa razão, o Instituto Gallup divulgou, em 2017, o terceiro ano do Relatório de Emoções Globais, no qual mensurou experiências diárias positivas e negativas das pessoas com base em cerca de 149 mil entrevistas com adultos em 142 países. Pela pesquisa, os mais altos escores significam que as emoções positivas são mais penetrantes em um país. Essas pontuações se relacionam fortemente com as percepções das pessoas sobre seus padrões de vida,

Guatemala

México Noruega

Chile Colômbia

82 82 81 81 81 81

80

80

liberdades pessoais e a presença de redes sociais. As experiências das pessoas com problemas de saúde e sua capacidade de pagar alimentos são preditivas de maiores pontuações negativas. Os países latino-americanos dominaram a lista de países o que reflete, pelo menos em parte, a tendência cultural na região para se concentrar nos aspectos positivos da vida. Tanto que, no ranking, o país com o melhor escore de pontuações relacionadas às emoções positivas (84) foi o Paraguai, pelo segundo ano consecutivo. O Brasil aparece no 38º lugar, com um índice de 75, empatado com outros oito países: Estados Unidos, Luxemburgo, Alemanha, Bolívia, Áustria, Reino Unido, Mali e África do Sul. •

Os países latino-americanos dominaram o ranking global de emoções positivas, o que reflete, pelo menos em parte, a tendência cultural na região para se concentrar nos aspectos positivos da vida. Na lista, o país com o melhor escore foi o Paraguai, pelo segundo ano consecutivo 21

84

JULIANA TAVARES é jornalista e escreve sobre Ciência e Psicologia, entre outros assuntos relevantes.


evento

Psicologia Positiva pela

paz

22


IMAGENS: PIXABAY

EM SUA TERCEIRA EDIÇÃO, CONGRESSO PORTUGUÊS DE PSICOLOGIA POSITIVA INOVA COM A REALIZAÇÃO DO I SIMPÓSIO LUSO-BRASILEIRO SOBRE O TEMA • POR JULIANA TAVARES •

A

paz é uma virtude essencial da vida coletiva e base da convivência e da coesão social, além de estar associada à sustentabilidade das relações humanas e do planeta. A guerra, o terrorismo global, os estereótipos acerca dos expatriados e refugiados, a proliferação nuclear, a poluição ambiental, a corrupção, e todo tipo de violência, do bullying na escola à violência cibernética, passando pela crueldade doméstica, ambiental e animal, instigam a viver com medo e insegurança, colocando a nossa espécie e o planeta em perigo, além de diminuir sobremaneira o otimismo das gerações futuras e o bem-estar individual e coletivo. Para mudar esse cenário e ampliar a cultura de paz no mundo, acontece, em março, o III Congresso Português em Psicologia Positiva, no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Sob o tema “Cotidianos positivos e o imperativo da paz”, o evento é considerado um dos mais importantes para a discussão da Psicologia Positiva na atualidade, e contará com a presença de um dos papas do movimento, o diretor do Penn Positive Psychology Center, Martin Seligman, que falará por video conferência sobre Paz e Psicologia Positiva. “Diante da hegemonia da língua inglesa e do pensamento anglo-saxônico sobre a Psicologia Positiva, é fundamental valorizar outros idiomas e visões sob o tema”, enfatiza Helena Águeda Marujo, docente do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, investigadora integrada do Centro de Administração e Políticas Públicas

23


evento

da mesma universidade e uma das organizadoras do evento. “Os debates no português ganham uma forma própria, mais abrangente, de abordar o positivo, porque a latinidade em geral, e a lusofonia em particular, tem uma forma própria de entender e vivenciar o positivo da existência.” Ela explica usando as palavras Happiness e Felicidade como exemplo. “Essas palavras não têm em comum raízes etimológicas e simbolizam coisas muito diferentes. No primeiro caso, a externalidade da felicidade dependente do que acontece (what happens) e, no segundo, a Felicitas, a nossa palavra latina para felicidade, que significa na sua raiz fertilidade, geratividade, fé, virtuosidade, é mais internalizada e relacional. Assim sendo, juntar Portugal, Brasil, e outros países que falam português traz inequívocas diferenças em relação a outras formas de entender a vida virtuosa - mais coletiva, mais comunitária, menos estritamente individual”, afirma. Nas edições passadas, o evento recebeu cerca de 150 participantes, entre eles profissionais da Espanha, Itália, Reino Unido, Canadá e EUA, dedicados a formas mais

Latinos e lusófonos

vivenciam a felicidade de

forma diferente. A começar pelo termo Latino que a designa, que remete em sua raiz à “fertilidade, virtuosidade”, enquanto happiness, a palavra em inglês,

depende do que acontece

(what happens), para citar um exemplo

24

relacionais, sistêmicas e comunitárias de olhar, investigar e potenciar o bemestar e a felicidade em áreas muito distintas, como educação, saúde, dia a dia das organizações, entre outras. Essa multidisciplinaridade do congresso estimula o debate e os estudos de caso, com abordagens teóricas e críticas sobre a permanência e o lugar da Psicologia Positiva e da paz, suas múltiplas manifestações e momentos de sobrevalorização em certas conjunturas, contextos e geografias.

BRASIL ALÉM-MAR Outro destaque desta edição é a realização simultânea do I Simpósio Luso-brasileiro de Psicologia Positiva. Organizado pela especialista em PP Andréa Perez Corrêa, membro-fundadora do Instituto Brasileiro de Psicologia Positiva (IBRPP), o encontro reunirá trabalhos de mais de 30 brasileiros especialistas que debaterão, entre outros temas: espiritualidade e paz interior; justiça juvenil; a felicidade como estratégia de negócio; perdão, educação e empreendedorismo positivo. “Minha sugestão era apenas levar a Portugal o projeto Diálogos em Psicologia Positiva, no qual alguns colaboradores do livro “Psicologia Positiva: Teoria e Prática” apresentavam seus temas. Os encontros foram muito bem aceitos e o participantes ficaram estimulados com a possibilidade de irem a Portugal divulgar seus trabalhos. O convite que se seguiu para a realização do primeiro simpósio luso-brasileiro sobre Psicologia Positiva foi uma grata surpresa e mostra que já temos massa crítica para representar bem o Brasil. É, sem dúvida nenhuma, um marco para


IMAGENS: PIXABAY/DIVULGAÇÃO

todos os estudiosos do tema no nosso país”, revela Corrêa. O evento é aberto para qualquer interessado. “A ideia é disseminar a Psicologia Positiva pelo mundo, para o maior número de pessoas possível e mostrar o trabalho sério que os profissionais fazem no Brasil não apenas na academia, mas com cases nas organizações, ambientes de psicoterapia e mentoria”, afirma a psicóloga brasileira que, durante o evento, apresentará o workshop Positive Scholar: um programa que, metodologicamente, consubstanciase nas concepções e ferramentas do coaching de Psicologia Positiva, para grupos de estudantes e profissionais da área acadêmica e que se propõe a favorecer o aumento da incidência de emoções positivas nos acadêmicos, bem como uma condução dos trabalhos, disciplinas, pesquisas e docência com uso de suas qualidades humanas positivas, a fim de melhorar a performance, considerando os benefícios do bem-estar subjetivo mais elevado. Para a psicóloga Lilian Graziano, sócia-diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento e da

Positive Business School, o evento estimula a troca de conhecimento entre os participantes. “Um evento desta envergadura contribui imensamente para a disseminação da cultura de paz”, afirma ela, que também apresentará uma palestra durante o Simpósio, “Eudaimonia e a paz consigo mesmo: compreendendo a relação entre felicidade e propósito”, na qual resgata o conceito da eudaimonia a partir da Antiguidade grega, relacionando-o com o conceito de bem-estar-subjetivo e, principalmente, apontando-o como a única maneira de se descobrir o propósito de vida e, consequentemente, de atingir a verdadeira paz interior. “Esse evento é, sem dúvida, uma oportunidade incrível para os participantes, mas principalmente para a sociedade. Afinal, a Psicologia Positiva é muito importante para ficar apenas na seara de conhecimento dos psicólogos.” •

Palestra de Lilian Graziano resgata a eudaimonia, relacionando-a com o conceito de bem-estar subjetivo e apontando-a como única forma de

JULIANA TAVARES é jornalista e escreve sobre Ciência e Psicologia, entre outros assuntos relevantes.

serviço: III Congresso Português de Psicologia Positiva e I Simpósio Luso-Brasileiro de Psicologia Positiva

descobrir um propósito de vida e atingir a paz interior

1 a 3 de março Instituto Superior de Ciência Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa Informações: http://psipositivabrpt.com/

25


neurociência

Autocontrole e Garra

A CAPACIDADE DE CONTROLAR NOSSO PRÓPRIO COMPORTAMENTO E A GARRA COM QUE PERSISTIMOS EM UMA META SÃO FATORES CRUCIAIS PARA TER SUCESSO NA VIDA • POR MARCO CALLEGARO •

26


S

em dúvida, a capacidade de regular nossa atenção, emoção e comportamento quando estimulado por uma tentação é crucial para o sucesso na vida. Essa capacidade tão importante é chamada de autocontrole, e tem sido relacionada a uma série de indicadores positivos. Mais recentemente, a “garra” ou tenacidade (em língua inglesa, grit) tem sido destacada também como um determinante do sucesso na vida. A garra pode ser entendida como determinação, perseverança, ou a busca tenaz de uma meta apesar dos percalços e dificuldades. Embora essas características estejam interligadas, não significam a mesma coisa. Existem diferenças importantes entre o autocontrole e a garra. Pessoas com muita garra podem atingir realizações excepcionais, mas cair em tentações em outras áreas da vida que não sejam o foco da sua determinação. Por outro lado, as pessoas que tem elevado autocontrole podem ser consistentes em resistir às tentações de forma geral, mas falharem em perseguir uma meta dominante a longo prazo. A psicóloga positiva Ângela Duckworth tem estado em evidência na mídia depois do sucesso de seu livro de 2016 “Grit: The Power of Passion and Perseverance” (Garra: o poder da paixão e perseverança). As pesquisas de Duckworth têm chamado a atenção para essas características que são extremamente importantes para uma vida feliz e produtiva, a paixão ou garra, e a força de vontade, ou autocontrole. Em colaboração com o neurocientista James Gross, Duckworth tem publicado estudos sobre as diferenças entre garra e autocontrole e como se beneficiar do conhecimento sobre essas forças humanas. O autocontrole está associado com resultados positivos na vida. Estudos longitudinais de longa duração demonstram que altos níveis de autocontrole cedo na vida prevêem comportamento pró-social, renda, capacidade de ter economias, probabilidade de estar empregado, saúde física, desempenho acadêmico e realização.

Embora sejam mutuamente reforçadoras, existem diferenças entre o autocontrole e a capacidade de perseverar nas metas 27


neurociência

O autocontrole é recrutado em situações nas quais existe um conflito entre dois impulsos ou tendências de ação, sendo um deles direcionado a uma meta momentânea e o outro dirigido a um objetivo mais abstrato, de maior prazo para alcançá-lo O autocontrole é recrutado em situações nas quais existe um conflito entre dois impulsos ou tendências de ação, sendo um dos impulsos direcionado a uma meta momentânea e o outro dirigido a um objetivo mais abstrato, mais valorizado, cujos benefícios levam mais tempo para serem obtidos, mais distante psicologicamente. O adiamento de impulsos envolve a circuitaria neural do córtex pré-frontal, que faz uma regulação “top-down”, ou seja, de cima para baixo. A capacidade de exercer autocontrole parece depender do amadurecimento dessa região crítica, pois durante o desenvolvimento vai melhorando de acordo com a maturação do córtex préfrontal. Da infância à idade adulta, a capacidade de controle metacognitivo vai se tornando cada vez mais sofisticada. A habilidade de manter um esforço sustentado ao longo de anos, ou garra, está relacionada a sucesso profissional e realizações acadêmicas. Pesquisas longitudinais mostraram que indivíduos com mais garra conseguem completar metas e objetivos desafiadores mesmo com dificuldades e obstáculos. A garra

leva a um esforço persistente para praticar e trabalhar duro durante vários anos, décadas ou mesmo a vida toda em busca de uma meta altamente valorizada. Embora exista alta correlação entre garra e autocontrole, existem diferenças importantes. Algumas pessoas com elevado autocontrole passam suas vidas sem perseguir metas com garra, enquanto outros apaixonados por determinadas temáticas são indisciplinados de forma geral em suas rotinas. Quem tem maior autocontrole apresenta melhores medidas de funcionamento adaptativo no dia a dia, como notas mais altas ou maior disciplina com atividades físicas, e isso não acontece necessariamente com pessoas com elevada garra. Por outro lado, as pessoas com garra tendem a ter sucesso em objetivos específicos que envolvem esforço duradouro, enquanto indivíduos com autocontrole nem sempre conseguem manter-se focados nesses objetivos por tanto tempo, ou com tanta paixão. Para entender as diferenças entre o autocontrole e garra, Duckworth e Gross sugerem a estrutura teórica de hierarquia de metas. Essa teoria se funda na idéia de que as metas são organizadas hierarquicamente, com metas de baixa ordem servindo às metas de elevada ordem. As metas de baixa ordem são em geral de curto prazo, maior número, dependentes de contexto e substituíveis, enquanto as metas de alta ordem são menores em numero, mas são mais duradouras e mais importantes para o indivíduo, além de serem abstratas. Dentro da hierarquia de metas, em qualquer nível, uma meta tem mais probabilidade de ser ativada se é avaliada como possível de ser realizada e como desejável. Nessa teoria, as pessoas podem ter múltiplas metas,

28


Organograma de metas. As maiores (alta ordem) sucedem-se a um maior número de pequenas metas (baixa ordem), que se associam a tendências de ações envolvendo determinados níveis de atenção, emoção e comportamentos de natureza diversa.

META

META

META

AÇÃO

META

AÇÃO

AÇÃO

META

META

AÇÃO

META

META

AÇÃO

META

AÇÃO

META

AÇÃO

Fonte: Duckworth, A. & and Gross, J. J. (2014). Self-Control and Grit: Related but Separable Determinants of Success. Current Directions in Psychological Science, p. 1–7. DOI: 10.1177/0963721414541462

mas, além disso, podem ter diferentes hierarquias de metas, e com conflitos entre si. Dizemos que um indivíduo tem autocontrole quando consegue resolver conflitos entre dois impulsos para ação, quando um dos impulsos corresponde a uma meta valorizada no momento, e outro está ligado a uma meta de maior valor em longo prazo.

Objetivo valorado em longo prazo

Objetivo rival de maior valor momentâneo

A garra pode ser concebida, nessa teoria da hierarquia de metas, como algo envolvido em uma meta dominante superordenada, que se impõe sobre as demais de forma persistente, fazendo a pessoa trabalhar duramente para superar

obstáculos durante anos, ou mesmo décadas

CONFLITO

Fig. 2. Schematic showing how self-control is required to adjudicate between conflicting actions, one of which is aligned with an enduringly valued goal and another of which – although temporarily stronger – is aligned with a less enduringly valued goal. Self-control may consist in suppressing the momentarily alluring goal or potentiating the more enduringly valued goal. Fonte: 0 Duckworth, A. & and Gross, J. J. (2014). Self-Control and Grit: Related but Separable Determinants of Success. Current Directions in Psychological Science, p. 1–7. DOI: 10.1177/0963721414541462

29

Podemos usar como exemplo uma pessoas que está em conflito entre terminar um projeto importante em seu trabalho (mais valorizado em longo prazo) e assistir um capítulo de sua série favorita (mais tentador em curto prazo).


neurociência

Tanto a garra como o autocontrole partilham

Conforme a pessoa maneja suas tendências de ação no momento da tentação e usa estratégias cognitivas e comportamentais de autocontrole, poderá conseguir disciplinar-se para terminar o projeto. A garra pode ser concebida, nessa teoria da hierarquia de metas, como algo envolvido em uma meta dominante superordenada, que se impõe sobre as demais de forma persistente, fazendo a pessoa trabalhar duramente para superar obstáculos durante anos, ou mesmo décadas. Essa meta dominante paira acima das outras no topo da hierarquia, e as metas de ordem mais baixa estão fortemente associadas com essa meta. Nessa hierarquia da garra, as metas de ordem mais baixa originam ações efetivas que impelem o indivíduo em direção a meta maior, reforçando a persistência em direção aos objetivos.

a defesa de metas

valorizadas em face à adversidade. As principais diferenças da garra e do autocontrole são os tipos de metas que são perseguidas e a escala de tempo que está envolvida

a) PAIXÃO

b)

META RIVAL SUPER ORDENADA

NOVO OBJETIVO GERADO EM RESPOSTA À ADVERSIDADE

Esquemas ilustrando processos subjacentes. Garra implica ter um objetivo dominante superordenado, perseguido com paixão e perseverança, muitas vezes ao longo de anos ou décadas. O objetivo que corresponde a uma a paixão escolhida pelo indivíduo pode requerer a supressão de metas superordenadas rivais (a). Quando um objetivo particular de ordem inferior ou a ação estão bloqueados, novos objetivos ou ações são geradas e, em seguida, prosseguem com vigor (b).

Fonte: Duckworth, A. & and Gross, J. J. (2014). Self-Control and Grit: Related but Separable Determinants of Success. Current Directions in Psychological Science , p. 1–7. DOI: 10.1177/0963721414541462

30


As pessoas com garra são capazes de suprimir metas superordenadas rivais, ou não têm metas que possam competir, como apontam as descrições de biografias de indivíduos altamente tenazes. Quando uma pessoa altamente persistente enfrenta obstáculos e tem uma meta de ordem mais baixa bloqueada, descobre uma forma de gerar novas metas ou ações que ajudam a reconduzi-la à realização da meta de mais alta hierarquia. Por exemplo, se uma pessoa com garra tem a meta de conseguir um bom emprego e encontra a vaga que desejava preenchida, logo se volta para a busca de outros empregos semelhantes, ou busca uma nova área profissional anteriormente inexplorada. A garra impele o sujeito para identificar, ou mesmo criar, novas rotas alternativas para chegar ao seu fim. Portanto, tanto a garra como o autocontrole partilham a defesa de metas valorizadas em face à adversidade. As principais diferenças da garra e do autocontrole são os tipos de metas que são perseguidas e a escala de tempo que está envolvida. O autocontrole é necessário para selecionar entre metas de baixa ordem que estão em conflito impulsionando a tomar atitudes contraditórias. Já a garra envolve manter-se obediente a uma meta de mais alto nível por longos períodos de tempo mesmo tendo obstáculos e contratempos. A dificuldade para o exercitar o autocontrole tem como conseqüência ceder a um impulso e praticar uma ação que satisfaz uma meta imediatista, mas que é seguida de arrependimento. Já os problemas para exercer a garra estão ligados a seguir uma série de metas superordenadas em uma rápida sucessão, ou a desistir de uma meta superordenada por que uma meta foi bloqueada. Nesse sentido, o autocontrole bem sucedido está relacionado com o sucesso no dia a dia, enquanto a garra, quando canalizada apropriadamente, está associada a realizações

31

excepcionais, que podem tomar décadas para se materializarem. Os conceitos de autocontrole e garra, bem como a teoria de hierarquia de metas, podem contribuir para desenhar intervenções que possam potencializar estes processos psicológicos. O autocontrole é abordado como uma habilidade que pode ser treinada e desenvolvida com a prática. A garra, por sua vez, está relacionada a motivação e poder da vontade. As pesquisas futuras podem mostrar que traços e características como interesse, otimismo, motivação intrínseca, estilo de atribuição de causalidade, entre outros, estão presentes nas pessoas que desenvolvem uma paixão de tamanha intensidade por uma meta, que as inspiram a persistir tenazmente e superar os mais diversos obstáculos para chegar onde desejam. • MARCO CALLEGARO é psicólogo, mestre em Neurociências e Comportamento, diretor do Instituto Catarinense de Terapia Cognitiva (ICTC) e do Instituto Paranaense de Terapia Cognitiva (IPTC). Autor do livro premiado O Novo Inconsciente: Como a Terapia Cognitiva e as Neurociências Revolucionaram o Modelo do Processamento Mental (Artmed, 2011). É ex-presidente da Associação de Psicologia Positiva para a América Latina (APPAL). www.appal.org.br (Associe-se!)

saiba mais DUCKWORTH, A. & and GROSS, J. J. (2014). Self-Control and Grit: Related but Separable Determinants of Success. Current Directions in Psychological Science, p. 1–7. DOI: 10.1177/0963721414541462 DUCKWORTH, A. L., PETERSON, C., MATTHEWS, M. D., & KELLY, D. R. (2007). Grit: Perseverance and passion for long-term goals. Journal of Personality and Social Psychology, 92, 1087–1101. DUCKWORTH, A. L., GENDLER, T. S., & GROSS, J. J. (2014). Self control in school-age children. Educational Psychologist, 49, 199–217.


leituras

Forças pessoais em campo Publicação amplia horizontes de practioners em Psicologia Positiva • por Andréa Perez Corrêa •

D

efinitivamente, o ano de 2017, no campo do estudo das forças de caráter (forças pessoais), em especial, do VIA-Survey, viveu uma fase de muitas reflexões, reconfigurações e novas propostas, como relatado no Technical Report – The VIA test suite for adults: development and preliminary evaluation, de Mc Grath. A essencialidade de se reavaliar um campo novo de estudo deve permear sempre a postura de um pesquisador que dedique seriedade ao trabalho que realiza. E isso é o que temos visto em temas da Psicologia Positiva que se desdobram em novas descobertas, beneficiando inúmeras pessoas com resultados validados pelas pesquisas científicas. Especificamente quanto ao tema das forças

32

pessoais, é grande o número de estudos realizados desde sua concepção, em 2004, com a obra Character Strengths and Virtues de Christopher Peterson e Martin Seligman, resultado de uma grande pesquisa, em inúmeros campos, realizada pelas mãos de sérios profissionais e estudiosos, resultando nesse inventário, denominado como a “espinha dorsal” da Psicologia Positiva. Novos projetos e aplicações das forças pessoais, hoje, permeiam inúmeras ciências do conhecimento


humano, favorecendo Nos últimos dez anos, novas formas de os de acordo com a indivíduos interpretarem a si mesmos, nutridos plataforma Scopus, de qualidades humanas, o antes desconhecidas ou não percebidas. E também de um incrível incremento acadêmicas sobre das relações humanas no contexto familiar, social ou do trabalho, a partir de um olhar sobre o outro, com foco (na no que tem de melhor e não busca por título nos gaps de competências, nos defeitos, no que falta e de obra, resumo e no que vai mal. palavras-chaves) Nos últimos dez anos, de acordo com a plataforma ou se Scopus, o crescimento de manteve em todos publicações acadêmicas sobre “forças de caráter” os anos, culminando (na busca por título de obra, no último ano de resumo e palavras-chaves) cresceu ou se manteve em 2017, em 71 estudos todos os anos, culminando registrados no último ano de 2017, em 71 estudos registrados em livros ou journals sobre a temática. Destacamse, entre outros, autores renomados em número de publicações como Willibald Rush, primeiro da lista com 41 publicações, seguido pelo já falecido, mas grande projetista do inventário Christopher Peterson, com 30 e de sua parceira de estudos Nansook Park com 24 publicações, estando Martim Seligman mais abaixo na lista com 16 publicações. Tudo isso se deve à dedicação e à paixão que norteiam estudos de grande repercussão, desenvolvidos nas mãos de grandes mestres, como de Ryan M. Niemiec, que também vem construindo pesquisas no campo (na base Scopus, seis publicações indicadas) autor da obra que hoje dedico a vocês (Character Strengths Intervention – A Field Guide for Practitioners – Hogrefe, 2017). Eu não vou aqui ser pretensiosa ao ponto de achar que li muito no ano de 2017; até porque li muito menos que gostaria, no que tange a livros. Acabo me prendendo a ler mais artigos acadêmicos, pois sou daquelas que busca a fonte e oriento meus alunos

crescimento publicações

“forças de caráter”

IMAGENS: FREEPIK

cresceu

33

a fazer o mesmo. Dessa forma, como os livros são resultados contemplados a posteriori a esses estudos publicados de forma mais acadêmica, acaba não dando tempo para eu me prender somente a eles. Isso tudo para dizer que o livro do Niemiec foi o melhor que li neste ano. É do tipo que merece todos os elogios que um practitioner gostaria de dar a uma obra. Isso mesmo! O livro é para quem faz e aplica forças pessoais na vida, no trabalho e na sala de aula. Daquele tipo de obra que eu gostaria de ter publicado (Mais pretensão. Afe!) O que você imaginar sobre uma reunião de


leituras

dados, intervenções, teoria, reflexões, roteiros de uso, descrições sobre as forças pessoais, você irá encontrar. Vou optar por ser metafórica para tentar dar noção da obra. Todo mundo já montou quebra-cabeças, não é mesmo? Em 2016, o site Mundo Estranho, noticiou que o maior quebra-cabeça do mundo tem 1.141.800 pecinhas. Não vou chegar a esse mesmo número para dizer que essa seria a mesma quantidade de estudos, análises, intervenções, pesquisas, aplicações e opiniões sobre as forças pessoais, sobre as quais escutamos por aí ou que pesquisamos em livros e artigos. Mas passamos por aquele momento de abrir a caixa e jogar todas as peças na mesa e ter aquela sensação de: “Como organizar isso tudo?”; “Qual intervenção escolher para aplicar as forças pessoais?”; “Por onde eu começo?”; “Será que está tudo aqui que eu preciso?”. Aí você senta e nem sabe qual a peça irá escolher para ser o ponta pé inicial desse grande quebra-cabeça. De repente, você recebe em mãos um grande manual com as instruções de onde, com que peça e como começar a montar o quebra-cabeça. Um roteiro extremamente abrangente e detalhado que faz com que você se sinta mais capaz de montar o quebra cabeça, apesar de ainda caber a você, como profissional, a delinear o seu trabalho com aplicação das forças pessoais. Apesar de achar que a metáfora possa ter ajudado você a atender a funcionalidade dessa

34

obra, ainda é muito pouco perto do que ela traz ao público. Até porque ela é resultado de uma grandiosa dedicação de um apaixonado pelo VIA Institute, que em suas próprias palavras, afirma que “trabalhar para o VIA seria um trabalho dos sonhos, e para isso, eu esperaria para sempre” (p. 11) (“working for VIA would be a dream job, and for that, I would wait forever”). E não ficou somente no sonho, ele conseguiu realizar isso. Conforme narra o próprio Niemiec, em seus últimos oito anos de trabalho, tornou-se responsável por consolidar os estudos e aplicações relacionados às forças pessoais, e a devolver à comunidade essas informações para as melhores práticas por coaches, mentores, psicoterapeutas e profissionais. E o melhor: conseguiu e a publicação dessa obra é uma prova legítima disso.

Passamos por aquele momento de abrir a caixa e jogar todas as peças na mesa e ter aquela sensação de: “Como organizar isso tudo?”; “Qual intervenção escolher para aplicar as forças pessoais?”; “Por onde eu começo?”; “Será que está tudo aqui que eu preciso?” E eis em mãos um grande manual de instruções


Coletando inúmeros sua vida, produzindo o uso O autor reúne trabalhos, Niemiec deu das forças em diversos uma forma instrucional ao domínios e para diversos tema, nutrindo o leitor com públicos. E, ainda, mais detalhamentos teóricos algumas práticas adicionais sobre toda a concepção para quem ainda possa ter , além do e desdobramentos sobre achado pouco. que a maioria dos a análise das forças Em 299 páginas, o livro é pessoais: sua pesquisa, dividido em nove capítulos, livros indica: forças suas características, suas mais minhas sempre de , aplicações, suas sinergias, idolatradas referências suas colisões, seu overuse forças de , bibliográficas e, ainda, oito ou underuse, entre tantos apêndices, elucidando algo forças mais outros conteúdos. que ainda tenha faltado para Além disso, traz as olhares mais exigentes, (lower/lesser), forças últimas análises sobre mesmo diante de algo tão o modelo conceitual bem-feito. de , forças da publicação de Com a leitura do livro, fica e forças 2004, indicando o que claro o grau de exigência do chama de expansão autor quanto a compor uma “practitioner-friendly” da obra que abarcasse o máximo hierarquia da classificação possível de conteúdos para VIA, como uma hipótese a ser uma aplicação de qualidade por profissionais da contemplada. temática abordada. O autor reúne categorizações das Ao ler cada capítulo, revela-se mais uma forças pessoais, além do que a maioria quantidade de informações relevantes, dando dos livros indica: forças de assinatura, a impressão, ou porque não, a certeza de que a forças de felicidade, forças mais baixas obra não economiza, não esconde, não esquece (lower/lesser), forças de fase, forças médias e forças perdidas. Mas não para por aí. Para cada uma das 24 forças, Niemiec apresenta uma descrição em destaque, tais como: definição, essência, dimensão, outras forças que mais se relacionam, além de perguntas para construção da força, pesquisas relacionadas e intervenções possíveis. Tudo isso de forma consolidada em uma única página que serve de guia prático, útil e ágil para qualquer profissional ou estudante. Nesse ponto, se você acha que já estaria ótimo, o melhor ainda está por vir. O autor apresenta nada menos que 70 – isso mesmo, 70 – possibilidades de intervenções, devidamente categorizadas, para que você possa sugerir a seus clientes ou aplicar em

categorizações das forças pessoais

assinatura felicidade baixas

IMAGENS: FREEPIK/DIVULGAÇÃO

fase médias perdidas

35


leituras

Somente identificar suas forças pessoais não vai levar você ao seu uso ideal, ao seu âmago. É preciso acionar o ON da

auto-percepção

e conduzir-se em seus

comportamentos e atitudes, com atenção

ao uso de suas forças, de forma favorecedora a si e ao próximo conteúdos atuais sobre o estudo e a aplicação das forças pessoais. O livro pode ajudar a você – assim como veio ratificar ainda mais uma convicção que eu já nutria há muito tempo – a compreender que não podemos conceber as forças pessoais e o resultado do VIASurvey, apenas como mais um elenco bem “legal” ou “interessante”, que aumenta nossa lista de itens de autoconhecimento; até porque autoconhecimento vive na moda. Somente identificar suas forças pessoais não vai levar você ao seu uso ideal, ao seu âmago. Como costumo dizer: é preciso acionar o ON da auto-percepção, e conduzir-se em seus comportamentos e atitudes, com atenção ao uso de suas forças, de forma favorecedora a si próprio e a quem os rodeia em sua vida cotidiana, – ou de seus clientes, pois à medida que as utilizamos de maneira inadequada, seja pelo uso em excesso ou deficiente, não poderão mais ser consideradas como forças humanas positivas. E o livro traz muitas possibilidades de práticas e de conhecimento que nos permitem estar instrumentalizados, para aumentar a sua auto-percepção e aplicar as forças de maneira produtiva. Ainda só para cativar quem se emociona com as relações humanas, o autor, por sua vez, destaca a

36

importância de autores que ajudaram a construir essa temática, mencionando com carinho e respeito, não apenas Martim Seligman, mas o grande mentor do projeto do inventário de forças, Christopher Peterson, que, com certeza, estaria, imensamente, feliz em ter em mãos uma obra tão séria e favorecedora do uso e aplicação das forças pessoais. Se eu indico a obra? Claro que sim. Boa leitura. • ANDRÉA PEREZ CORRÊA é pós-graduada em
Psicologia Positiva e coaching, mestranda em
Sistemas de Gestão na Universidade Federal
Fluminense, membro-fundadora do Instituto Brasileiro de Psicologia Positiva (IBRPP), docente do MBA Desenvolvimento
Humano e Psicologia Positiva do Instituto de
Pós-Graduação (IPOG). Dedicase à disseminação
da Psicologia Positiva e é criadora da Biblioteca Positiva. 
E-mail: acorrea97@hotmail.com. Site: www.ibrpp.com.br. Facebook
Andréa: http://on.fb.me/1O97CZm. e Biblioteca Positiva: http://on.fb.me/1Mejd8T

Ficha técnica

Character Strengths Intervention – A Field Guide for Practitioners Autor: Ryan M. Niemiec Editora: Hogrefe Ano: 2017


testimonial

Sobre

FREEPIK

padrões e escolhas Psicologia Positiva e o leque de oportunidades que pode se descortinar em uma vida • por Jussara Goyano •

37

M

eu primeiro contato com a Psicologia Positiva foi indireto, ao pesquisar o tema para uma revista de divulgação científica em Psicologia, a qual dirigi por muitos anos. Incrível que também profissionalmente fosse me deparar com tamanha dicotomia (como na vida pessoal) equilibrando a abordagem de visões profundamente pessimistas da existência humana à de soluções opostamente pautadas em promessas científicas otimistas e na resiliência dos indivíduos. Se de um lado também dirigia uma revista de Filosofia, e outra de Sociologia, a mostrar as mazelas e feridas de nossa “modernidade


testimonial

como a música, a beleza da poesia e das artes em geral, de fato, nunca me atraiu. Talvez por ser o nosso jornalismo cultural muito mais voltado a questões de mercado que de estética. Meu contato com esse lado belo da vida foi pessoal, mesmo, em saraus promovidos por mim e amigos. E até através de familiares que tinham gosto pelo assunto – daí chegamos na dicotomia vivenciada em família entre a beleza, o bom, a esperança, a fé na sorte e o pé atrás que me ensinaram muito bem a ter com as pessoas e as circunstâncias desde muito cedo. Creio que segui em frente certamente por haver em mim uma tendência a enxergar o mundo com olhos mais coloridos e inexplicavelmente idealistas, como acontece com a maioria dos que perseveram. Não credito a caminhada mais colorida, no entanto, somente a essa líquida”* e contextos sociais de tendência individual. Credito, sim, “Creio que vulnerabilidade pretensamente ao aprendizado em Psicologia indissolúveis no histórico de Positiva, pautado inicialmente no nosso capitalismo e sociedade, certamente por trabalho do Instituto de Psicologia de outro, pude tratar de temas Positiva e Comportamento (IPPC) haver em mim como felicidade humana, a que fui apresentada por conta coaching, desenvolvimento uma tendência a de meus trabalhos jornalísticos. humano pela educação, Aos anos de terapia positiva (que enxergar o mundo foram dois, se não me engano) superação das pessoas com deficiência e avanços médicos e à profissão de coach, que com e neurocientíficos. Quando abracei a partir de uma formação repórter da revista Scientific oferecida pelo Instituto. Todo o e American Brasil, em início de conhecimento que obtive foi sendo inexplicavelmente carreira, conversava com meu posto em prática comigo mesma, editor sobre a possibilidade , como desde os meus 20 e poucos anos maravilhosa de o jornalismo (chego aos 40 neste 2018), a cada acontece com a passo dado adiante em todas as científico ser uma das poucas vertentes jornalísticas a dar esferas da vida, e, principalmente, maioria boas notícias (confesso ter certa durante meus cinco anos e alguns predileção pela área, mesmo não ” meses de atendimento a coachees me prendendo a ela em meus que me procuravam com objetivos trabalhos editoriais e de comunicação – e mesmo não dos mais diversos. sendo esta minha única fonte de esperança em mim Então digo que a minha escola foi mesma e na humanidade). o exercício intencional e assíduo do A temática da cultura, embora facilitasse o contato otimismo, da apreciação e da consciência com manifestações humanas que considero sublimes, de características individuais, que se

segui em frente

olhos mais coloridos

idealistas

dos que perseveram

38


“Mudar já não me soava trabalhoso, disruptivo e sim algo perfeitamente possível e esperado num curso de vida bem-sucedido e saudável” somou a momentos de intenso flow a cada descoberta. E a partir desse aprendizado se abriu diante de mim um leque de oportunidades. Primeiro, pude me reinventar como ser humano, algo que demonstra que a existência é sempre possível de algum modo, não sendo necessário prevalecer os padrões que nos sufocam e não servem mais, como sapatos velhos. Mudar já não me soava trabalhoso, disruptivo e sim algo perfeitamente possível e esperado num curso de vida bem-sucedido e saudável. Tal olhar precede e pressupõe todas as outras ocorrências: a de estabelecer melhores estratégias de enfrentamento de problemas, melhores relacionamentos e um melhor equilíbrio entre as diversas áreas da vida e a de seguir impactando pessoas positivamente. Familiares, amigos, colaboradores, clientes. Gerir gente, criar filhos e ter vida social e familiar ficou mais fácil, tudo se tornou mais rico e cheio de significado. Se tivesse sucumbido à primeira pedra, talvez não prosseguisse na estrada. Debaixo da pedra havia flores e as percebi. E assim, casei, tive filhos, criei círculos saudáveis de amizades e abracei trabalhos (e formas de trabalhar) que me gratificam. Livrei-me de situações e pessoas tóxicas cuja experiência e convivência seriam insuportáveis. Esse é o meu testemunho sobre como a Psicologia Positiva impactou a minha vida e a daqueles que de alguma forma me rodeiam e chegam até mim exatamente por estar inserida nesse movimento. Movimento que hoje considero algo essencial para o avanço de nossa civilização, que começa em mim, em você, e ressoa em todo o planeta. *Alusão ao filósofo Zygmunt Bauman, que apesar de nos apresentar à volatilidade da vida, tal como nossa sociedade a vivencia, angustiada, também nos aponta certos caminhos e soluções. “Os otimistas acreditam que o mundo é o melhor possível, ao passo que os pessimistas desconfiam que eles possam estar certos”, diz o pensador, cuja solução para o mundo atual, ele acredita, é a cooperação entre as pessoas. •

39


positive news

Mais estresse, menos percepção das ameaças

Após diversas pesquisas apontarem para o fato de que o estresse melhora nossa capacidade de detectar ameaças, um novo estudo envolvendo cientistas da Universidade de Nova York (EUA) mostra que justamente o contrário também é possível. Segundo os pesquisadores, uma carga elevada de estresse pode diminuir nossa capacidade de detectar os perigos, reduzindo nossa atenção para as mudanças no ambiente e capacidade de prever eventos potencialmente perigosos. A flexibilidade e tempo de resposta a estes também se alteram em um contexto demasiado estressante. Uma série de experimentos mensurou o comportamento de voluntários, associado ao nível de estresse. Os participantes se submeteram à visualização de imagens em uma tela de computador, associadas ou não a estímulos dolorosos. O grupo considerado “do estresse” submeteu-se, adicionalmente, a procedimentos para induzir a produção de alfa-amilase e cortisol, hormônios liberados em situações estressantes. No segundo dia de experimentos, o grupo do estresse teve mais dificuldade em prever (ou reagir a) eventos perigosos do que o grupo de controle, com uma indicação de que o estresse prejudicava sua capacidade de ser flexível na detecção de novas ameaças. A pesquisa foi apoiada por uma doação do Instituto Nacional de Saúde Mental dos EUA e recebeu cooperação da Universidade de Pekings (China). Foi publicada no Journal Proceedings of the National Academy of Sciences.

Mulheres rumo a mudanças mundiais em 2018 A Cúpula inaugural das mulheres da Conscious Company Media será uma poderosa reunião de profissionais femininas que são apaixonadas por usar os negócios como uma força para o bem no mundo. Esta reunião de primeira classe reunirá mulheres CEOs, fundadoras, empresárias, executivas, investidoras, líderes de pensamento e muito mais, para promover a discussão sobre como nós, como sociedade, podemos encorajar mais mulheres em posições de poder a ter um impacto positivo no mundo. O evento será projetado para facilitar a conexão íntima de pessoa para pessoa, discussões profundas e conversas cruas e intergeracionais que irão educar e inspirar os participantes a fazerem mais através do seu trabalho. (Fonte: http://www.csrwire.com/press_ releases/40688-2018-World-ChangingWomen-s-Summit?tracking_source=rss) – Na Goodnews Agency

Esta seção prestigia o trabalho da Good News Agency, que proporciona boas notícias às mídias do mundo inteiro, com material em inglês, italiano e português. (clique no link para saber mais)

40


Brasil rumo a energias renováveis Após anos de críticas, o governo do Brasil anunciou em janeiro que acabará com a era da construção de grandes hidrelétricas na Amazônia. Em um artigo no jornal O Globo, Paulo Pedrosa, Secretário Executivo do Ministério das Minas e Energia, disse que o governo não tem preconceito contra a grande hidrelétrica, mas que os custos e riscos agora superam os benefícios. Em um comunicado de imprensa sobre a notícia, o InterAmerican Clean Energy Institute disse que, durante anos, megabarragens na Amazônia atraíram a oposição dos povos indígenas, especialistas em energia e economia, organizações sociais e ambientais e cidadãos no Brasil e no mundo. Em particular, as campanhas contra as mega-barragas de Belo Monte e São Luiz do Tapajós mobilizaram uma ampla coalizão de comunidades indígenas e organizações da sociedade civil, que instaram o governo brasileiro a desenvolver os recursos eólicos e solares do país e investir em eficiência energética em vez de financiar mega barragens na Amazônia. Paulo Pedrosa, Secretário Executivo do Ministério das Minas e Energia, reconheceu o impacto desta resistência social, bem como os altos custos e riscos de mega-barragens, em declarações ao O Globo. O InterAmerican Clean Energy Institute disse que os recursos eólicos e solares brasileiros, a queda dos custos das tecnologias eólica e solar e também os avanços na integração de energias renováveis constituem um caso econômico convincente para uma transição de novas mega-barragens para outras fontes de energia (…).

IMAGENS: FREEPIK

(Fonte: http://www.renewableenergyworld.com/ articles/2018/01/brazil-vows-to-end-amazonian-mega-damconstruction-moves-toward-wind-and-solar-energy.html ) Good News Agency

41

Forças reunidas em prol dos direitos humanos

O presidente do futebol internacional, Gianni Infantino (FIFA), e o secretário geral do Conselho Europeu, Thorbjørn Jagland, se reuniram em Estrasburgo (França), para discutir como promover melhor os direitos humanos no esporte. Os líderes de ambas as organizações sublinharam a importância das convenções esportivas do Conselho da Europa na proteção dos direitos humanos no esporte, em particular a convenção antidopagem, a convenção de fixação de correspondência e a recente convenção sobre segurança e serviço em jogos de futebol. “O papel do esporte em nossas sociedades, por exemplo, no impulso da integração, não pode ser subestimado. Uma boa governança ajudará a garantir que todos possam ser beneficiados pelo esporte “, disse Jagland. (Fonte: http://www.humanrigh tseurop e.org/2018/01/fifaand-the-council-ofeurope-to-promotehuman-wrights/) – Na Goodnews Agency


positive news

Não deixe o estresse passar de pai para filho Nova pesquisa com ratos, realizada pela Faculdade de Medicina da Universidade de Maryland, descobriu que o estresse do pai pode afetar o desenvolvimento cerebral de sua prole. Isso porque o esperma paterno sofre alterações, modificando, depois, nos filhos, a expressão de certos genes (fenômeno conhecido como epigenética). Assim como o ambiente de uma mãe durante a gravidez, incluindo fatores como dieta ruim, estresse ou infecção, pode causar danos nos filhos. Camundongos machos adultos que sofriam períodos crônicos de estresse leve tiveram filhos com uma resposta reduzida ao estresse; As mudanças na reatividade ao estresse foram associadas a alguns transtornos neuropsiquiátricos, incluindo depressão e Transtorno de Estresse Pós-traumático (TEPT). O mecanismo da resposta reduzida foi isolado para estudo, quando se percebeu que o esperma do pai mostrou mudanças no material genético conhecido como microRNA. O microRNA é importante porque desempenha um papel fundamental em transformar genes em proteínas funcionais. Durante o processo foram revelados novos detalhes sobre essas mudanças de microRNA. No trato reprodutivo masculino, o epidídimo, estrutura onde o esperma amadurece, libera vesículas pequenas embaladas com microRNA que podem se fundir com esperma para mudar sua carga entregue ao ovo. O epidídimo respondeu ao estresse do pai alterando o conteúdo dessas vesículas. Ao aprender mais sobre os vínculos entre a exposição do pai ao estresse e os riscos de doença para sua prole, será possível entender, detectar e melhor prevenir esses distúrbios.

42


Dinheiro compra felicidade?

IMAGENS: FREEPIK

Pesquisas da Universidade de Purdue, na linha de diversos estudos anteriores de outras instituições, sugerem não só uma relação consistente entre nível de renda e satisfação com a vida, como também estabelecem a quantia ideal para níveis ideais de satisfação. Enquanto a felicidade é reproduzida na televisão como sendo fruto de uma busca sem limites por bens materiais (mensagens de campanhas publicitárias), esses levantamento identificaram o parâmetro individual de uma renda de US $ 95.000 para uma avaliação satisfatória da vida e que esse valor varia de US $ 60.000 para US $ 75.000 para uma melhor percepção de bemestar emocional. A avaliação de bem-estar emocional compreende um balanço das emoções do dia-a-dia, como sentir-se alegre, animado, triste ou com raiva, enquanto a satisfação com a vida é avaliada,

43

geralmente, sob influência de objetivos mais elevados. Acima do limite de renda registrado, porém, os índices de satisfação de vida não aumentam e, inclusive, são menores. Os cientistas envolvidos avaliam que, após satisfeitas as necessidades materiais dentro do parâmetro estabelecido, tudo seria supérfluo e induziria a comparações sociais, o que diminuiria o bem estar dos indivíduos. Os estudos da Purdue se basearam em levantamento global do Instituto Gallup, que reúne uma amostra de 1,7 milhão de pessoas em mais de 150 países. Foram publicados na Nature Human Behavior. Para saber mais: Happiness, income satiation and turning points around the world Andrew T. Jebb, Louis Tay, Ed Diener and Shigehiro Oishi DOI 10.1038/s41562-0170277-0


positive wiki

Nesta seção você verá conceitos e definições da Psicologia Positiva abordados ao longo da revista. (Elaboração: Equipe IPPC)

Felicidade:

FLOW O conceito de flow foi desenvolvido pelo psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi, que, a partir do estudo do processo criativo, interessou-se pelo fenômeno da motivação intrínseca. O estado de flow, também chamado de experiência máxima, faz com que o indivíduo se envolva completamente na atividade que está exercendo, empregando nela aquilo que de melhor ele tem a oferecer. Por essa razão, nos momentos de flow, atividade e sujeito tornamse um só. Ao agir na sua zona de excelência, o sujeito que experimenta o estado de flow não precisa de supervisão, controle ou qualquer tipo de monitoramento externo na medida em que a atividade exercida lhe é intrinsecamente recompensadora. O flow pode ser conseguido em qualquer tipo de experiência. Porém há pessoas que o conquistam no exercício profissional, tornando seu trabalho uma importante fonte de gratificação e, por extensão, de felicidade. Hoje já existem empresas no mundo todo interessadas em promover o flow no ambiente organizacional, numa típica iniciativa na qual todos saem ganhando.

Savoring

Enquanto as correntes tradicionais da psicologia tendem a buscar meios de lidar com experiências negativas, a Psicologia Positiva busca maximizar os efeitos das experiências positivas. O Savoring, por sua vez, visa a saborear os bons momentos, e é uma forma de intensificar e ampliar seus poderes, de modo a fazer as lembranças, reminiscências e antecipações positivas mais fortes e ativas do que as negativas em nosso funcionamento mental.

44

Partindo da ideia de felicidade de Aristóteles (eudaimonia), ainda no século IV a.C., a Psicologia Positiva acredita na felicidade como resultado de uma vida virtuosa. Não parte da ideia de que só devemos ter ocorrências positivas na vida para nos considerarmos felizes, mas, sim, colocarmos na balança todos os momentos e ter uma percepção positiva da vida, um foco no que há de bom e que pende a balança para uma vida feliz.

Locus de controle

Trata-se de um constructo que visa explicar de onde o indivíduo percebe ser a fonte de controle de sua vida. Existem dois tipos de locus de controle: o locus de controle externo (quando o indivíduo percebe sua vida como sendo controlada por fatores externos a ele mesmo) ou o locus de controle interno (quando o indivíduo sente estar ele próprio no controle de sua vida). Embora oscilem entre essas duas percepções, as pessoas têm um estilo de locus de controle predominante, e na pesquisa de Lilian Graziano sobre felicidade e locus de controle, essa pesquisadora encontrou uma correlação positiva significativa entre locus de controle interno e felicidade. (Para saber mais acesse: http://www.teses.usp.br/ teses/disponiveis/47/47131/tde23052006-164724/pt-br.php)


Eudaimonia e hedonismo

O hedonismo se refere à busca por experiências prazerosas, enquanto a eudaimonia, um conceito originalmente formulado por Aristóteles, envolve ter propósito e direcionamento profundos na vida. A felicidade eudaimônica, proveniente de uma vida com significado, é aquela que se propõe nas bases da Psicologia Positiva.

Forças pessoais

IMAGENS: FREEPIK

Peak performance

Peak performance, ou performance de pico, é um conceito bastante confundido com o estado de flow. Porém, especialistas costumam fazer a seguinte diferenciação: flow seria um estado mental, enquanto a performance de pico diria respeito a um desempenho físico ótimo, que por sua vez favoreceria o estado de flow.

• Gratidão • Bravura e Valor • Justiça e Equidade • Humor • Liderança • Perdão • Bondade e Generosidade • Cidadania • Entusiasmo e Energia • Criatividade e Originalidade • Curiosidade • Espiritualidade e Senso de Propósito • Apreciação da Beleza e da Excelência

45

• Capacidade de Amar e Ser Amado • Humildade e Modéstia • Esperança • Amor pelo Conhecimento • Inteligência Social • Integridade e Autenticidade • Perspectiva e Sabedoria • Prudência • Pensamento Crítico e Lucidez • Perseverança • Autocontrole e Autorregulação

IMAGENS: FREEPIK

A partir do conceito de felicidade como resultado de uma vida virtuosa, os pesquisadores estudaram vários códigos de conduta da cultura oriental e ocidental, tais como bíblia, alcorão, bushidô etc., procurando virtudes comuns a todos eles. Chegaram, assim, a seis virtudes: sabedoria, coragem, humanidade, justiça, moderação e transcendência. O próximo passo surgiu do questionamento: quais as características que um ser humano deveria ter para conquistar tais virtudes? Os pesquisadores chegaram, assim, a 24 características, as quais denominaram de forças pessoais. Nesse sentido, as forças pessoais são:


ARQUIVO PESSOAL/FREEPIK

sua felicidade

“F

Baú de tesouros

elicidade, para mim, tem relação com água salgada: suor, lágrimas e mar. Suor pelo esforço e resiliência, lágrimas de alegria e emoção, mar para renovar as boas energias! Ser feliz é ter orgulho de cada passo dado, apreciar a beleza do amanhecer e do entardecer, viver pela gratidão e não pela falta, que sempre existirá, e ser rodeada por grandes corações, sejam de amigos, sejam de família – o fato é que são estes os grandes tesouros da vida! Minha filha é a pedra preciosa desse baú de tesouros. Minha companheira de aventuras e quem me ensina a todo o tempo o que é felicidade verdadeira!” Glaucia Viola, 42 anos, jornalista e empreendedora. (Na foto a acompanha sua filha, Luna Gaia, 9 anos.)

Este espaço é seu! Conte pra gente suas vivências no email mipmag@psicologiapositiva.com.br 46


47


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.