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Turquia e a diplomacia neo-otomana de Erdogan POR JAIME SPITZCOVSKY
O presidente turco, Recep Tayyp Erdogan, em quase 20 anos de poder e dono de uma agenda nacionalista e populista, transformou o país de um aliado de Israel e de países ocidentais, nos anos 1990, em um desestabilizador do Oriente Médio e de regiões próximas, com apoio a grupos terroristas e intervenções militares fora de suas fronteiras.
E
rdogan e seu partido, o AKP ( Justiça e Desenvolvimento), governam desde 2002 e, com uma orientação religiosa e de nacionalismo nostálgico dos tempos de poder do Império Otomano (séculos 13 a 20), afastam a Turquia das tendências secularistas e próocidentais, alicerces da modernização do país em décadas passadas.
E, mantendo posição de neutralidade durante a maior parte do conflito, a Turquia se posicionou ao lado dos aliados meses antes do final da 2ª Guerra Mundial. No cenário a seguir, da rivalidade global entre EUA e União Soviética, a liderança turca consolidou a aliança com Washington e o país passou a integrar a Otan, aliança militar liderada pela Casa Branca e criada em 1949. Naquela época, em 1947, a Turquia votou nas Nações Unidas contra a resolução 181, da Partilha da Palestina, refletindo posição do bloco islâmico. No entanto, dois anos depois, mudou de rumo, reconheceu o Estado de Israel e se tornou o primeiro país do mundo islâmico a fazê-lo.
Em 1923, Mustafa Kemal Ataturk proclamou a república, a ser construída das ruínas de um império que viu, na derrota na 1ª Guerra Mundial (1914-1918), momento decisivo em sua decadência. O kemalismo levou a Turquia a separar Estado de religião, num movimento inédito no mundo islâmico e apontou para a aproximação com países europeus como diretriz fundamental da Turquia pós-império.
As relações bilaterais, porém, sofreram com altos e baixos nos anos seguintes. Dois momentos de crise ilustram as turbulências. Em 1956, Ancara convocou de volta seu embaixador em Israel, em protesto pelas ações militares israelenses, em aliança com britânicos e franceses, contra o Egito de Gamal Abdel Nasser.
Ataturk introduziu o caminho da secularização e da ocidentalização, mas não da democratização. Militar, manteve ainda um sistema autoritário, com as Forças Armadas como espinha dorsal do novo regime, construído também a partir de acordos internacionais, como os tratados de Sèvres (1920) e de Lausanne (1923), assinados com as grandes potências e países vizinhos.
Cerca de duas décadas mais tarde, em 1975, o governo turco apoiou a infame resolução da ONU a equiparar sionismo a racismo, revogada pela própria organização em 1991. E, nessa última votação, a Turquia se absteve. 30