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Nº8-2018
Brasília | Outubro | 2018 | ISSN 2359-0084
Revista CAU/UCB | 2017 |
Nº8-2018
Marcio Oliveira
EDITOR CHEFE CONSELHO EDITORIAL
Aline Zim | Carolina da R. L. Borges
PROJETO GRÁFICO
Daniel C. Brito | Thiago P. Turchi
COLABORADORES
Foto capa: Ilustração - Stephanie c. de Jesus | Editoração eletrônica: | Thiago Turchi | Perfil: Carolina Borges | Artigos: Aline Zim | Stephanie C. de Jesus | Carolina Borges | Geovana A. de Oliveira | Carolina Menzl Celaschi | Gabriella Assis Salles |
Explicando: Carolina Borges |
Acontece no CAU: Beatriz Melo | Carla Freitas | Daniel Brito | Laís Dourado | Milena
ISSN
Delannoy | Denys Mendes | Tatiana Chaer ArqCartoon: Daniel Brito | Thiago Turchi
Brasília | Outubro | 2018 | ISSN 2359-0084
Revista CAU/UCB | 2018 | Editorial
PERFIL RAIMUNDO NONATO VELOSO FILHO
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ARTIGOS 1- PERCEPÇÃO DO ESPAÇO DA HABITAÇÃO DESDE A INFÂNCIA: A PENUMBRA NAQUELA CASA 2- A FENOMENOLOGIA COMO FORMA DE EXPLORAR A LINGUAGEM ARQUITETÔNICA 3- SIMBOLOGIA NA ARQUITETURA CRISTÃ
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EXPLICANDO SOBRE O BELO E O UTILITÁRIO
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ACONTECE NO CAU 1- DESENHANDO A CIDADE, CONSTRUINDO CIDADANIA 2- DIPLOMAÇÃO
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ARQCARTOON VIDA DE ARQUITETO
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NONATO: Eu sou mineiro de Belo Horizonte, estudei lá entre 69 e 74, meu pai era arquiteto e professor por lá. Fiz alguns estágios enquanto estudava, me formei e vim para Brasília. Trabalhei inicialmente com um ex-professor, o arquiteto Hélio Ferreira Pinto, que fez o Banco Central. Ele estava montando um escritório aqui em Brasília e vieram alguns ex-alunos deles para cá. Eu fiquei menos de 2 anos ali, mas foi uma produção muito intensa, pois nesse período nós fizemos o Banco Central e o Asbac aqui em Brasília, e o Clube do Exército, o Banco do Brasil e Banco Central em várias capitais. Eu fiquei responsável
5 Carolina Borges | Professora do CAU/UCB
Bom dia professor Nonato, primeiramente gostaria de agradecer em nome do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Católica de Brasília pela disponibilidade e generosidade em nos conceder essa entrevista. Para começar, poderia nos falar um pouco sobre sua formação e o modo com que a arquitetura e a docência entraram na sua vida?
ENTREVISTA PROF. RAIMUNDO NONATO VELOSO FILHO
CAROLINA BORGES:
Fig 1 - Professor R. Nonato
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pelo Banco Central do Rio de Janeiro, era no início de 76 e eu era recém-formado. Durante a minha graduação na UnB, o Instituto de Artes pertencia à Faculdade de Arquitetura. Depois o Instituto de Artes rompeu com Arquitetura, e eu ainda fiquei lá alguns anos trabalhando com plástica, desenho, geometria e perspectiva. Depois de um tempo, eu decidi que não queria mais trabalhar com isso, queria fazer projeto, daí passei para a Faculdade de Arquitetura e fiquei 20 anos ensinando só projeto, trabalhando com calouros e formandos. Eu adorava dar aula. Meus ateliês, eu acreditava que eram quase mágicos! Quando eu entrava ali, eu sumia do planeta... Eu adorava aquilo... Eu dei aula por 40 anos, e foi ótimo! Mas daí eu pensei: “Vou dar espaço para os jovens professores terem a mesma experiência que eu tive, não vou ficar tomando lugar.” Eu acho que estava mais do que na hora de aposentar. Em relação ao projeto, eu pretendo ficar na área o quanto eu puder. CAROLINA BORGES: Você tem um método para ensinar projeto? Como se dá o processo de sensiblização da plástica e do espaço para os calouros, que nunca tiveram um contato com projeto arquitetônico antes? NONATO: Eu desenvolvi minha metodologia com o pessoal do Instituto de Artes, onde eu trabalhava com a sensibilização para as artes. Quando eu pedi para dar aula de Revista CAU/UCB | 2018 | Perfil
projeto, eu fiz uma espécie de oficina para sensibilização que trabalhava muito com maquetes de papel. Mas eu não chamo de método, é mais uma sequência de exercícios que eu criei com o objetivo de sensibilizar. O veículo sempre foi a maquete de papel. Nas aulas, eu sempre falava do panorama da arquitetura contemporânea e fazia o primeiro exercício em cima de algumas plantas baixas selecionadas, de autores diversos. Os alunos faziam cópias dessas plantas, croquis, geometrias de traçados reguladores, e a partir disso eles criavam espaços. Eles não sabiam a função original daquelas plantas, daí eu gerava uma situação imaginária de uma praça para eles terem uma ideia do contexto, para não ficar algo perdido. Era um exercício interessante, pois tirava o estresse da criação de pegar um aluno calouro ainda, e dar a ele um programa de necessidades para dar uma solução. Então eu começava por aí... as maquete, muitas vezes, nem eram de arquitetura, às vezes eram esculturas. Eu pegava umas esculturas em dobradura e ensinava a dobrar o papel antes de fazer uma maquete. Quando eu aprendi a fazer maquete eletrônica, eu comecei a usála mais do que o desenho. Eu domino bem a maquete eletrônica, mas para o calouro, eu prefiro começar trabalhando com a maquete de papel. Eu acho que a maquete física e eletrônica se completam. CAROLINA BORGES: Nesse momento, já eram ensinadas algumas particularidades sobre a relação do edifício com o espaço
urbano, sobre a orientação solar... Os alunos já tinham condições de pensar a arquitetura no seu diálogo com o entorno? NONATO: No início, eu comecei a trabalhar com um exercício de projetar a entrada de metrô, mas que era mais uma estrutura do que uma entrada, algo que pudesse referenciar o lugar, algo que dissesse que ali existe uma estação de metrô. E até por serem calouros, não se pode dar um tema muito específico. E daí entrava a questão da malha urbana, pois com a entrada do metrô, devia se pensar também no movimento da situação toda. Eu tinha uma outra série de exercícios em que eu trabalhava o espaço. As áreas que não necessariamente precisam ser espaços positivos, podem ser espaços negativos, como se fosse uma praça. Paralelamente a isso, eu selecionava várias obras de arquitetura, paisagismo e urbanismo em que a situação era mais importante do que a forma em si. O objetivo era tirar a noção de que a forma é o mais importante. Às vezes, a implantação e sua relação com o entorno vale muito mais do que a forma em si. No final, nós estávamos com o exercício que eu chamava de “exercício da luz”. Era um espaço para meditação e recolhimento, onde a luz não poderia incidir de forma direta. Daí eu dava uns exemplos, alguns modelos para serem seguidos. Eu trabalhava muito com a topografia e a luz indireta. Há uns 10 anos atrás, eu dava um
exercício baseado em plantas quadradas, retangulares ou circulares, em que eu queria trabalhar a plasticidade do espaço interno. Então eu colocava essas maquetes sem teto e propunha um programa mínimo, onde os alunos compunham e dividiram aquele espaço. Nesse momento, eu começava a falar sobre conforto ambiental. Explicava sobre os ambientes e a insolação, por exemplo, em uma biblioteca: “a orientação leste é melhor porque precisa de menos proteção solar e ainda vai haver muita claridade”. E a partir dessa maquete, com todos os ambientes definidos, eu falava para eles colocarem Norte, e os alunos buscavam colocar o Norte no local mais satisfatório. Eu buscava fazer tudo aquilo que eu achava que, se tivessem feito comigo na minha época de escola, o meu processo teria sido mais proveitoso. Só que quando eu começava a falar muito sobre a proteção solar, começa a se passar a ideia de que é possível fazer qualquer coisa, porque existe tecnologia para resolver tudo. E quantas vezes nós não vemos obras de interesse público que deveriam ter brises, mas que por falta de recursos financeiros, elas não têm. Então eu comecei a achar que se eu fizesse esse exercício de sensibilizar sobre a potência da luz, eu conseguiria ensinar por um meio muito mais fácil como fazer a divisão interna dos ambientes. Nessa altura do campeonato, os calouros já estavam fazendo um desenho técnico, então dava para fazer umas pranchas. Mas era um curso propriamente de sensibilização,
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com esse programa do espaço da luz, que era muito simples CAROLINA BORGES:
“Meus ateliês, eu acreditava que eram quase mágicos! Quando eu entrava ali, eu sumia do planeta... Eu adorava aquilo... Eu dei aula por 40 anos, e foi ótimo!” Nonato Veloso
Sobre o seu processo de criação como arquiteto, você tem um método particular de trabalho? Inspiração é um fator determinante? NONATO: Eu acho que uma coisa que vem muito do consciente e do inconsciente é o repertório. E se você tem uma consciência grande de tudo que já foi feito em certa situação, seja sobre topografia ou localização, você acaba assimilando alguma coisa e facilita a sua resposta. Uma vez eu fiz uma simulação de uma casa que estava na minha cabeça, como se fosse um ensaio. Fiz a proposta em um terreno em aclive, com uma passagem por baixo. É muito importante essa questão da entrada, pois às vezes a gente faz uma forma interessante e depois pensa em como se entra, e daí coloca uma portinha... (risos). Eu fiz essa casa em uma linguagem paulista. E para reforçar essa ideia, eu criei um plano de fundo para aplicar no terreno, que foi uma colagem com capas de livros da Lina Bo Bardi, do Villanova Artigas e do Paulo Mendes da Rocha. Aí entra novamente a questão do repertório. Acredito que quando você tem um repertório te influenciando, fica mais fácil.
CAROLINA BORGES: Como você lida com aquela situação comum em que um cliente solicita uma arquitetura, ou elementos da arquitetura que, por alguma razão, você não concorda? Como se dá o processo de convencimento? NONATO: Eu acredito que na arquitetura residencial o processo é mais leve, mas acaba que você tem que fazer muita concessão com o cliente, aí fica difícil. Eu tive algumas experiências engraçadas... Houveram casos em que o cliente vinha com as expectativas dele, e quando eu apresentava alguma proposta que não tinha nada a ver com que ele pensou, porque ele não é arquiteto e eu estava atendendo ao programa com uma abordagem de arquiteto... o cliente dizia: “você adivinhou que eu estava querendo”. O cliente não sabe o que ele quer, ele vem com um programa e dependendo do seu argumento, ele muda o programa. E quando você demonstra confiança e mostra que realmente entende do que está falando, e ele começa a entender o seu ponto de vista, e aceita. O Ângelo Bucci fez uma casa muito famosa que tinha uma piscina suspensa, ele mostra o croqui que os clientes fizeram e depois nos mostrou o que ele projetou e executou, uma proposta maravilhosa que os clientes não esperavam. Nem mesmo os arquitetos pensariam, ele traduziu como arquiteto a intenção do cliente.
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CAROLINA BORGES: Quais os arquitetos são fontes de inspiração para você hoje? NONATO:
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Eu fiz um trabalho sobre os arquitetos paulistas que participaram de concursos, desde 1990 até 2010, nesse trabalho eu cataloguei todos os concursos nacionais que aconteceram nesse período. Daí acabei ficando mais ligado à arquitetura paulista de um tempo para cá. A minha maior fonte de inspiração são os arquitetos paulistas. Não só eu, mas a maioria dos arquitetos de uma geração mais nova que a minha. Mas eu tenho uns clássicos, como Paulo Mendes da Rocha, o Artigas, a Lina..., e alguns discípulos – Angelo Bucci, Álvaro Puntoni, Milton Braga... Essa turma é a que mais me inspira. CAROLINA BORGES: A arquitetura de Brasília, especialmente as obras de Niemeyer, são referencias no seu trabalho? Qual a sua opinião sobre a frequente crítica a respeito da a ausência de vegetação nos monumentos de Niemeyer? NONATO: Eu estava conversando com Paulo Henrique Paranhos e ele comentou de uma particularidade daqui. Segundo ele, o pessoal de Brasília tem horizonte no olhar. Aqui o horizonte é mais aberto. Já em São Paulo é mais fechado. As pessoas de Brasília tem muita preocupação com Revista CAU/UCB | 2018 | Perfil
a praça, ou seja, o espaço aberto, que diferencia um pouco da arquitetura feita em outras áreas do Brasil. Oscar Niemeyer era o mestre de fazer a praça aberta, ele era um escultor do espaço urbano, sempre criando um espaço público muito interessante. Eu acredito que a intenção do Niemeyer era que as obras fossem visíveis, então a árvore de porte atrapalharia. Eu acho que sua preocupação estava na ocupação pública em massa, na criação do espaço cívico. As críticas que são feitas sobre a arquitetura dele, geralmente se referem às arquiteturas de grande porte, ou seja, as arquiteturas excepcionais, os espaços excepcionais. Nesses casos, eu até concordo com Niemeyer, não se deve colocar muitas árvores nesses espaços. CAROLINA BORGES: O movimento modernista no Brasil foi conhecido mundialmente pela sua expressão e por uma linguagem bastante própria. De lá pra cá, muita coisa mudou. A arquitetura contemporânea brasileira não tem mais a mesma expressão que tinha no modernismo...
“Quando eu pedi para
dar aula de projeto, eu fiz uma espécie de oficina para sensibilização que trabalhava muito com maquetes de papel.”
NONATO: Sim! Eu acho que no período moderno ainda havia muito mais coisa para ser feita, era o momento da industrialização. E aí veio Brasília e que deu um novo impulso. Daí houve uma produção dentro de uma mesmo fio condutor, e tornou esse corpo de obras, autores e críticos uma coisa única. Esse corpo foi divulgado e correu mundo afora, em uma época que em
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outros países não havia essa possibilidade, de experimentar o moderno. E hoje, a população é outra, a cidade tem outra configuração, e o número de arquitetos é outro. A quantidade de influências de lá para cá é muito grande, então é mais difícil esquecer essa unidade que existiu no moderno. CAROLINA BORGES: Acontece muitas vezes na arquitetura contemporânea, em função da forma ou dos materiais, uma ausência de um diálogo muito direto com o entorno, ou em alguns casos, a ausência de qualquer tipo de diálogo... NONATO:
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Há uns 10 anos atrás eu visitei o Guggenheim de Bilbao e eu tive uma certa decepção, pois aconteceu o seguinte: eu olhava por fora e via aquela forma arrojada, quando eu entrei nas galerias, vi caixas fechadas ortogonais que não tem nada a ver com a forma externa. Quando você entra na Catedral de Brasília, por exemplo, você sabe exatamente o que está resultando lá fora e vice-versa. Então a minha decepção foi essa. A justificativa do museu é que a cidade virou um ponto de visitação e a melhorou economicamente. Mas a gente não pode generalizar, pois a Zaha Hadid fez coisas geniais e arquitetura dela também vai nessa linha. Foi também o que Oscar Niemeyer fez: usou a novidade da forma e a transformou em sua linguagem.
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CAROLINA BORGES: É verdade. A diversidade de linguagens arquitetônicas e as diferentes interpretações hoje são infinitas, além do acesso ser irrestrito – eu não preciso mais viajar para conhecer. Com isso até a nossa análise crítica passa a ficar mais apurada. Terminamos aqui nossa conversa e agradecemos pela belíssima aula de arquitetura!
“...Eu acho que no
período moderno ainda havia muito mais coisa para ser feita, era o momento da industrialização. E aí veio Brasília e que deu um novo impulso.” Nonato Veloso
PALAVRAS-CHAVE: Fenomenologia, Arquitetura e Urbanismo, Linguagem.
Fig 2 - colagem 01 - Stephanie C. Jesus
Aline Zim | Prof. do CAU/UCB | Stephanie C. de Jesus | Aluna do CAU/UCB
O ponto de partida desse estudo é a casa. Não qualquer casa, mas aquela que reconhecemos ser a nossa primeira casa. Esta, segundo Bachelard, é o nosso “canto no mundo”, o lugar onde a relação entre o eu e o mundo não se guia pela racionalidade, sendo a nossa referência para a construção de toda a casa que habitaremos algum dia. Quando criança, a casa é o primeiro espaço onde experimentamos a corporeidade e vivenciamos o lúdico. Tal experiência está guardada na memória por imagens e pela percepção que temos delas. A ação fenomenológica que buscamos aqui é a reflexão sobre o primeiro habitar a partir dessas imagens e devaneios, entendendo o primeiro lar como objeto fundamental para a construção da subjetividade.
PERCEPÇÃO DO ESPAÇO DA HABITAÇÃO DESDE A INFÂNCIA: A PENUMBRA NAQUELA CASA
RESUMO
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INTRODUÇÃO
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Inicialmente, é preciso refletir sobre a construção de conhecimento a partir de subjetividades, abordagem esta que parece distante nas disciplinas de arquitetura e urbanismo. Explorar a casa somente em sua dimensão imaterial pode parecer, a princípio, improdutivo no que tange a produção de elementos objetivos. O ideário cunhado pelo modernismo disseminou o conceito de habitação como máquina de morar, espaço geometrizado, matematizado, gerado a partir da funcionalidade, produtividade e objetividade. Há, talvez, um processo de esvaziamento, principalmente no mundo ocidental, das demais dimensões que também compõem uma casa e que não estão destacadas nas linhas do pensamento modernista. A casa, enquanto espaço, abriga mais do que somente o corpo do homem e as necessidades que se referem a esse corpo. Ela abriga a própria condição humana, que está além dos limites e definições da geometria dos espaços. Cabe aqui nos atermos brevemente aos conceitos de objetividade e subjetividade. Para além da primeira aparência de total oposição, ambos os termos se expressam a partir de um diálogo. No campo da sociologia clássica, as duas partes desse diálogo são o indivíduo e a sociedade. Para o sociólogo Émile Durkheim a sociedade e sua organização são a fonte de toda a subjetividade do indivíduo. Para Lévi-Strauss, antropólogo e filósofo, é justamente o contrário, a vida social é que se organiza a partir da vida psíquica dos indivíduos, Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
da sua subjetividade e formas de saber sobre o mundo (SILVA, 1996). Aqui podemos começar a delinear um pensamento: a possibilidade de superação daquele primeiro olhar que antagoniza objetividade e subjetividade. No campo científico, a objetividade é alcançada na medida em que se esvazia de pessoalidades com o intuito de conhecer o objeto de estudo em sua universalidade. Afirma-se assim, que o produto gerado pela sua análise, ou seja, o conhecimento produzido, pode ser aplicado a todos os objetos que fazem parte desse universo sem as implicações das singularidades pessoais de quem faz a análise. Toda a subjetividade parece ser posta de lado quando há a pretensão de cientificidade. A subjetividade traz atrelada ao seu conceito um sentido de imprecisão, como se tudo o que se produzisse a partir dela fosse tendencioso e inclinado ao erro (e errar é, obviamente, um ato humano). O cogito ergo sun, premissa da intuição racional e objetiva, surge justamente das desconfianças sobre os sentidos, consistindo em duvidar de tudo (SILVA & HENNING, 2011). Mas há conhecimento que não venha dos sentidos? Todos os aspectos da dimensão humana estão presentes na construção da materialidade, influenciando-a e sendo influenciada por ela. O homem, como um ser passível, tem a significação das suas vivências e experimentações condicionadas à indissolubilidade dos pares objetividade – subjetividade, materialidade – imaterialidade presentes no mundo. Ele, como ser ativo, é também
um construtor desse mundo. Entre objetividades e subjetividades encontra-se o espaço, palco de todos os fenômenos segundo a física newtoniana. Tanto em seu sentido físico como em seu sentido fenomenológico o espaço é um campo de complexidades. Para Newton, o espaço é um ente imóvel, invariável, referencial e independente de todos os fenômenos. Sendo assim, o espaço é exterior ao ser humano, independente dele, real e objetivo (FRANCO, 2012). Na reflexão fenomenológica o espaço nasce desvinculado de qualquer realidade tangível e só se realiza a partir de significações: “Só ao se tornar ‘para mim’, o espaço recebe um significado, um sentido. O espaço ‘para mim’, ao contrário do espaço em si, só existe porque estou aqui. Nós não dependemos dele; ele é quem depende de nós, e sem nós nada seria. ” (FUÃO, 2003, p. 11). Assim, o espaço só se conforma enquanto a existência do eu se mistura a ele. Heidegger, quando designa a relação entre o sujeito e o espaço, o daisen (ou ser-no-mundo), não os coloca dentro de um ou de outro, mas aponta que a existência configura uma espacialidade, que já é ação para o próprio existir, ou seja, o ser-enquanto-ser (FRANCO, 2012). Podemos afirmar que a interação entre espaço e sujeito se dirige para além da materialidade prática do fenômeno. As subjetividades tornam-se presentes no espaço a partir da imersão do eu enquanto sujeito que, ao se especializar, se re-singulariza. Sujeito e espaço são, então, par-
tes de alguma possibilidade, de algo que ainda será. São ambos produtos e ambos devires. Tais conceitos e reflexões são úteis para a compreensão da escolha do lugar, do ponto de partida para estudar a percepção do espaço da habitação na infância. Não tratarei aqui de qualquer casa de infância, mas da minha casa, logo o lugar de onde parto é pela imersão no fenômeno, preservando, dentro do que me é possível, o olhar como pesquisadora. Busco refletir sobre o espaço a partir das expressividades poéticas contidas na dimensão da minha vivência procurando superar a materialidade arquitetônica da casa. Como sou eu o sujeito dessa narrativa, creio ser aceitável – até indispensável – a escrita em primeira pessoa. A utilizo no singular com o intuito de personalizar as percepções do espaço, deixando claro que a apreensão do lugar depende do sujeito da narrativa, e a utilizo no plural quando acredito que posso aproximar mais a minha experiência com a de quem lê, convidando o leitor ao sonho. Guiados pela memória, imagens e devaneios, vamos então atravessar o tempo e o espaço cartesiano e revisitar esse microcosmo captado pelas nossas percepções: as nossas casas. A casa era cinza. Não que sua cor fosse essa, talvez o correto seja dizer que a casa parecia cinza. Não lembro exatamente dos móveis nem da posição dos elemen-
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tos, exceto por uma poltrona que ficava entre o fim da cozinha e o início da sala, mas recordo da luz que entrava pela janela da cozinha se arrastando pelo chão, no decorrer do dia, em um esforço para iluminar todos os cantos. Que ingênua! A casa ainda parecia cinza. A luz mal chegava na sala e, estando sentada naquela poltrona, tudo o que vejo (e na verdade não vejo) está escondido na penumbra, se insinuando, não para meus olhos, mas para a minha imaginação. A sombra e a penumbra têm a potência de aguçar a imaginação para desvelar a concretude das coisas. Quem olha a sala não sou eu há anos atrás, sou eu no presente que me enxergo ali quando criança. Quando presentifico o passado, suspendo a passagem do tempo, retendo-o em um espaço que o define sem um sentido para o qual ele precise se encaminhar. Sim, onde me encontro é o espaço que define o tempo, seu comprimento através da memória, “[...] pelo espaço, é no espaço que encontramos os belos fósseis de duração concretizada por longas permanências. ” (BACHELARD, 1996, p.29). Volto então à minha casa da infância ou a trago para o presente.
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A casa natal é uma mistura de muitas imagens, de muitos fragmentos de vida que flutuam no tempo. A minha primeira casa não existe mais, a não ser pela minha memória que registrou parte da sua existência. Chega a ser estranha tal afirmação, “ a minha casa não existe mais”. A essência sobrevive ao tempo e
no tempo, enquanto a matéria já se foi. Mário Quintana escreveu em seu poema “Quem disse que eu me mudei? ”: “Não importa que a tenham demolido: A gente continua morando na velha casa em que nasceu” (1987, p. 760). A casa da infância não se apaga como uma lâmpada que, desligada, não deixa rastros de luz. Ela é sempre uma vela acesa, lançando uma luz sutil, formando sombras e penumbras que se estendem por muitos cômodos da vida, sobre muitos objetos, para ser ignorada ou esquecida. Ecléa Bósi confirma: A casa onde se desenvolve uma criança é povoada de coisas também preciosas, que não tem preço. Nas lembranças pode aflorar a saudade de um objeto perdido de valor inestimável que, se fosse encontrado, traria de volta alguma qualidade da infância ou da juventude que se perdeu com ele. (2004, p.42) Mesmo quando a nossa casa material há muito já se foi, as nossas memórias tratam de recompô-la por ser ela o nosso lugar de intimidade, a fundação de tudo aquilo que virá a ser: “Todo um passado vem viver, pelo sonho, numa casa nova. ” (BACHELARD, 1996, p.25). É a casa natal a raiz de todo habitar, depositada em nossas lembranças não como a casa que ocupamos um dia, mas como a casa que imaginamos ter habitado. A casa da infância é o pó nas estantes do tempo com o qual produziremos os tijolos que erguerão a casa sonhada. Em seu livro “A terra e os devaneios do repouso” (1990), Bachelard faz uma dis-
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tinção entre casa natal e casa onírica (ou casa sonhada, imaginada). A casa natal é a plataforma protegida onde abrigam-se os nossos sonhos, é a imagem primordial de intimidade de onde se projetarão as imagens mais profundas encontradas através do devaneio. Quanto à casa onírica, ele diz: “[...] é um tema mais profundo que a casa natal. Corresponde a uma necessidade mais remota. ” (1990, sem paginação) e reafirma dizendo que é justamente a casa natal o que dá o testemunho dessa proteção mais remota, ou seja, da casa onírica.
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Parece que a nossa casa é sempre diferente, mesmo quando igual a todas outras casas da rua ou do bairro. Na minha casa tinha elevador, nave, esconderijo, buraco negro e tudo isso representava mais do que somente a estrutura fechada de alvenaria que suportava o reservatório de água, que era comum em tantas outras casas. Sei que cabia todo mundo lá. Cabia o mundo inteiro e cabia vários mundos. Mesmo idêntica a tantas outras, eu não estava nessas outras, eu estava lá, na minha casa, no meu buraco negro, construindo com as minhas estrelas o meu microcosmo, construindo os meus segredos. Eu habitava aquele espaço debaixo da caixa d’água e ele habitava em mim. Enquanto eu revelo a minha casa, a casa também me revela. Ela narra a mim enquanto eu devaneio. Ela sussurra o modo como habito o mundo e assim ela me mostra, enquanto ser-no-mundo, mergulhada na complexidade de todos os fragmentos que construí e que me conRevista CAU/UCB | 2018 | Artigos
struíram. Quando me vejo ali, imersa na penumbra profunda do meu buraco negro imaginário, aquele habitar se evidencia no corpo, na essência, no que sou. Como bem disse Bachelard, “[...] as imagens da casa caminham em dois sentidos: estão em nós tanto quanto estamos nela. ” (1996, p.20). A casa é a referência. É o ponto de partida e a linha de chegada. A casa é a caverna, é a toca, é o lar, é o universo, é a proteção. Casa é um corpo pulsante, empurrando e puxando a gente: ora estamos presentes, ora estamos ausentes nesse movimento de eterno retorno a ela na busca por um abrigo, um lugar seguro. Casa é a mãe nos botando no mundo, nos parindo e tendo seu corpo marcado por nós. Casa é a mãe nos guardando do mundo, nos preparando para ele e para quem voltamos o nosso olhar quando rodeados por ele. A imagem é clássica, “Mãe e Casa, eis dois arquétipos no mesmo verso” (BACHELARD, 1990). São muitas as histórias que se alojam na minha casa da infância. Histórias sem início e sem fim. São todas histórias-meio (ou são poemas?), fragmentos que se unem formando imagens dentro de imagens e que conectam uma verdade hermética, que só é visível para mim. São o material que utilizo para construir o meu lugar, a minha casa onírica. Com os tijolos da memória construo essa casa. Com as estrelas, esses pequenos pontos de luz, vou desenhando um universo de extensas sombras que me atravessam. O cimento entre os tijolos, o fundo negro no céu es-
trelado: são esses os elementos que ligam tudo, são eles o devaneio. Partindo desse lugar, não construo a casa que tive, mas a casa que sonho ter, “ao invés de sonhar com o que foi, sonhamos com o que deveria ter sido, com o que teria estabilizado para sempre nossos devaneios íntimos” (BACHELARD, 1990, não paginada). Através das possibilidades, e não da realidade, eu sonho (construo) uma casa imaterial, sem limites e sem censura. Na fenomenologia do habitar buscamos nas memórias esse material de construção. Mas, enquanto as lembranças são imóveis, a imaginação, essa sim, se move juntando todas as penumbras, aqueles cenários embaçados do passado, que costurados com a linha do quase sonho, tecem o nosso espaço de aconchego. Nasce a casa imaginada, a casa onírica ou a casa-imagem, como uma escada etérea, muito leve e frágil, que liga a intimidade do sujeito à matéria concreta do mundo, unindo o porão habitado pelas sombras ao sótão preenchido de luz. Construir é habitar, escreveu Heidegger (FUÃO, 2016), e enquanto habitamos revelamos o ser em nós. Há certas tardes chuvosas em que me flagro deslizando da poltrona ordinária do meu quarto ou do assento de um ônibus, também ordinário, escapando para mundos intangíveis. Observo de longe um balanço em um urucuzeiro que nunca tem ninguém. Pergunto-me por que qualquer criança se absteria da diversão gratuita de balançar-se sem compromisso. Por que não tem ninguém? Por que não estou eu
ali, na euforia do movimento pendular, agitando as sementes do urucum dentro dos ventres secos da árvore? Parece impossível eu não ter brincado ali. A não ser que o balanço nem sequer tenha existido. Pouco importa! Ainda assim meu olhar se arrasta para ele, o contemplando de uma janela qualquer. E lá está ele, se movendo suavemente, protegido pela quase sombra da folhagem do urucuzeiro. Como um balanço em movimento permanente, que só pode existir em um devaneio, a casa onírica é tão somente uma utopia (o que não é pouca coisa), distante da realidade palpável. Por vezes, as imagens não são o produto fiel das lembranças da casa natal, mas misturadas a elas se desenham como um desejo e um devir: “ [...] num devaneio, uma vez que lembramos, o passado é designado como valor de imagem ” (BACHELARD, 2009, p.99). No meu devaneio, em qualquer árvore se pode pendurar um balanço! A árvore, agenciadora de espaços e percepções para mim, faz parte das penumbras da minha infância. Ela é a possibilidade, a potência, o devir de um balanço de madeira e cordas de sisal. A penumbra é campo fértil para o devaneio. É espaço que transgride, é lugar de desvios. Ela é o quase visível, sendo ainda oculta, seduzindo, sussurrando e inquietando, desprendendo-se da realidade e mira em uma promessa. Na penumbra, estendem-se as brechas para as subjetividades humanas, para os cenários que compõem a nossa dimensão existencial.
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Ainda olhando para o meu balanço imaginário, sinto que há ali uma pausa. Nessa suspensão, há um tempo próprio para uma percepção sensível do espaço que criei. Há um tempo para o silêncio, para o ruído, para os sentidos, para um vácuo preenchido pelo meu ser. Essa simultaneidade - presença-ausência do ser - possibilita uma soma de elementos, conscientes e inconscientes, com os quais interajo, e que constroem significações profundas em mim. Ao mesmo tempo em que estou inserida no espaço, sei que sou esse mesmo espaço, sei que sou o balanço em movimento e a criança que lhe falta. Recordo o que escreveu Walter Benjamim: “ A criança não brinca apenas de ser comerciante ou professor, mas também de moinho de vento e trem. ” (1985, p. 108). Se em sua teorização Heidegger vai buscar no léxico germânico o significado do habitar (bauen) e encontra o ser (bin), creio que posso dizer: sim, eu habitei um balanço vazio!
ência que anseia por ser preenchida pelo material e imaterial que se injetam ali pelo sonho diurno, pelo devaneio: “ O devaneio cósmico [...] é um fenômeno da solidão, um fenômeno que tem sua raiz na alma do sonhador. ” (BACHELARD, 2009, p.14).
Enquanto a luz e os espaços iluminados são os recintos da reunião e da coletividade, para onde se vai quando se procura fugir de estar sozinho (percebamos que a lareira, a fogueira, o fogo em si são elementos de aglutinação), a penumbra é o canto primeiro da solidão. Diferente da sombra, onde prevalece a escuridão, a inexistência de luz e a negação, a penumbra é um cenário do “quase”, um talvez, um diálogo entre os dois entes. Essa alternância entre polaridades (luz-sombra, bem-mal, cheio-vazio, sim-não) é uma geradora de incompletudes, de uma aus-
Enquanto “escrevo” a minha casa natal e a minha casa onírica, deixo a penumbra tomar conta da narrativa, assim como deixo a imaginação tomar conta da memória enquanto devaneio. A imagem poética da casa é um entreabrir de portas para outras percepções: “o leitor que ‘lê um quarto’ interrompe sua leitura e começa a pensar em algum aposento antigo. ” (BACHELARD, 1996, p.33). Na imagem poética os elementos extrapolam o seu caráter individual, se expandem, flutuam, se atualizam, misturando-se a outras realidades e virtualidades, transcendendo a caneta de quem a escreve.
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Rememorar a casa natal e construir a casa onírica é sempre um exercício na solidão. Para compartilhá-las não é preciso descrevê-las, pois “Descrevê-la seria mandar visitá-las.” como diz Bachelard, e acrescenta “A casa primordial e oniricamente definitiva deve guardar sua penumbra.” (1996, p.32). São elas imagens poéticas e, sendo assim, não se desenham como coisa real, pronta e acabada, mas como uma possibilidade de reinvenção, de redesenho, de preenchimento de brechas com o conteúdo das subjetividades outras, proporcionando a criação de outras imagens, de outros encontros com a memória-imaginação.
Tal como o poema, as casas com as quais sonhamos estão libertas até mesmo de si: O poeta nomeia as coisas: estas são plumas, aquelas são pedras. E de pronto afirma: as pedras são plumas, isso é aquilo. [...] ao enunciar a identidade dos contrários atenta contra os fundamentos do nosso pensar. Por tanto a realidade poética de uma imagem não pode aspirar a verdade (expressa aqui como a realidade aceita como verdade). O poema não diz o que é, sim o que poderia ser. [...] a pedra é um momento da realidade; a pluma outro; e de seu choque surge a imagem, a nova realidade. (Paz, 2003, p.98 apud Castellanos, p. 107, 2014) Na expansão da interioridade humana, as superfícies do que é material e do que é devaneio estão sempre se tocando. A imagem poética da casa surge a partir daquilo que é tangível, físico e palpável, somado às percepções do sujeito. Assim, os espaços que construímos, e que por consequência habitamos, podem buscar na casa-imagem elementos para compor sua existência material. Se tem aí um ciclo de construção e experimentação que não limita a vivência do espaço, é um constructo permanente para todos aqueles que o habitam. Na inconclusão da ação que não se separa da imaginação, creio que o mais importante é que deixemos aquele pé de urucum crescer livremente em todos os lugares. Talvez coloquem nele um balanço, talvez edifiquem uma casinha sobre seus galhos ou mesmo utilizem seu tronco oco
como abrigo. Só deixemos ele lá, como um sussurro, uma penumbra, um quase.
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PALAVRAS-CHAVE: Fenomenologia, Arquitetura e Urbanismo, Linguagem.
Fig 5 - LUZ | https://br.pinterest.com/pin/543317142519974573/
Carolina da R. L. Borges | Prof. CAU/UCB | Geovana A. de Oliveira | Aluna do CAU/UCB
O artigo visa apresentar a constante relação que a arquitetura estabelece com o homem e com o espaço, ressaltando os efeitos que ela causa e como o homem a percebe. Em um primeiro momento se descreve como se caracteriza essa linguagem arquitetônica e a importância de se compreender suas influências para garantir que ela possa transmitir experiências relevantes para o contexto em que se insere, por meio do conjunto de elementos que a compõem, identificando quais são esses elementos e como eles podem influir na vivência da arquitetura. Só então se apresenta os conceitos que fundamentam a fenomenologia propriamente dita, sendo que, ao se ter conhecimento destes fundamentos, o leitor já possa compreender como eles se apresentam para a arquitetura e como eles podem estreitar sua relação com o homem, garantindo seu valor antropológico.
A FENOMENOLOGIA COMO FORMA DE EXPLORAR A LINGUAGEM ARQUITETÔNICA
RESUMO
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A IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM ARQUITETÔNICA A capacidade da arquitetura em comunicar é constantemente negligenciada diante dos interesses que a envolvem. Seu caráter artístico, muitas vezes, leva as pessoas a julgarem toda a composição arquitetônica apenas por sua aparência externa, ignorando o fato de que se trata de um conjunto de elementos que tem a capacidade de transmitir informações e exercer influência sob quem os presencia. CHOAY (2001, p.231) expõe que:
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Por um lado, a arquitetura é a única arte cujas obras exigem ser percorridas fisicamente. Só ela exige deslocamentos, percursos, desvios que implicam o envolvimento de todo o corpo e que não podem ser substituídos pela percepção visual isolada. Essas características únicas evidenciadas pela autora citada acima também esclarecem a relação íntima que a arquitetura estabelece com as pessoas, e por isso há uma importância em enaltecer a linguagem arquitetônica. O homem encontra-se em contato constante com a arquitetura tendo a oportunidade de vivenciar a sua arte, e não apenas apreciá-la como espectador. Outro ponto importante a ser destacado é em relação a produção arquitetônica e sua busca por suprir necessidades humanas. Geralmente ao se pensar na concepção de novos espaços, a maior prioridade, e muitas vezes a única, é o fim para o qual Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
ele se destina, entretanto, considerando o caráter complexo do comportamento humano e o contato direto entre o homem e o espaço, esse tipo de entendimento levará a obras insatisfatórias, que acabam por se perder dessa relação humana. Rasmussen (2002, p.13), entende que a compreensão da arquitetura está relacionada com os instintos humanos, precisamente no que diz respeito a descobertas e experiências, principalmente considerando nossa interação com objetos inanimados. A arquitetura deve priorizar também essa interação e explorar esses instintos, que são necessidades importantes a serem supridas para garantir a comunicação e o entendimento dela como linguagem. O homem mantém memórias de suas experiências e faz associações a partir daquilo que já vivenciou. Ao cultivar esses aspectos humanos, incentiva-se a leitura do espaço em sua totalidade. Essa linguagem arquitetônica também será determinada pelo modo com o qual ela se relaciona com seu entorno e como ocorre essa interação. Para compreender como será caracterizada essa relação, é importante destacar previamente que qualquer edificação vai exercer de alguma forma impactos sob a área em que se insere, e essa influência não é observada apenas no espaço ou na paisagem, mas também se manifesta em características imateriais, como o comportamento das pessoas em relação ao uso do espaço. Mesmo sem ter um entendimento claro sob os preceitos que envolvem determinados projetos, toda interferência no meio
transmite algo àqueles que estão em contato com o espaço e, consequentemente, influi no modo como as pessoas irão agir diante dessa interferência. Podemos usar como exemplo o Eixo Monumental de Brasília. As edificações que o compõem não possuem o mesmo efeito caso sejam desassociadas do conjunto em que se inserem. Esse espaço foi projetado de modo a ressaltar a escala monumental e o poder político que ali se instala e essas características se destacam pela disposição dos edifícios, como o Congresso Nacional que se encontra centralizado ao fim do segmento das vias, e os ministérios que estão dispostos ao longo dessas vias e levam a este ponto central. Além disso, os grandes canteiros mantidos entre os conjuntos de edifícios também têm esse papel de destacar o poder político, logo, é fácil perceber o caráter desse espaço, que impõe um certo tipo de comportamento e se expressa de alguma forma. O exemplo citado demonstra como o edifício se relaciona com seu entorno, nesse caso, o tipo de experiência a ser vivenciada foi previamente determinada. Entretanto, existem casos em que o todo não é levado em consideração, o que não quer dizer que não haverá impactos naquele espaço. Seguindo essa linha de pensamento, é interessante evidenciar as críticas que surgem diante de algumas obras contemporâneas, em que se aponta uma perda de significação urbanística dada pela falta de relação com o espaço urbano em que se insere. Esse problema acontece em detrimento do momento de glo-
balização em que se vive, em que muitas vezes o valor da cultura local é mantido em segundo plano, priorizando a implementação de obras monumentais. Dessa forma, elas acabam não representando uma identidade ou significação local relevante, perdendo também o valor artístico, já que exibem problemas para se relacionar. A questão é que essas obras são produzidas em diferentes locais do mundo, com uma tendência de homogeneização, sem considerar as variações e características singulares de onde se inserem. Esse fenômeno leva a implantação de edificações que não criam relações e não coexistem com a significação daquele ambiente. Considerando que o termo espaço confere uma área ou extensão física, e o termo lugar possui caráter antropológico, ou seja, se relaciona com o comportamento humano, é considerado um não lugar aquele espaço que não se caracteriza como identitário, relacional ou histórico (AUGÉ, 2012, p.73). Esse conceito ajuda a esclarecer que a falta de relevância dada ao modo como a arquitetura se relaciona com o seu espaço e com o comportamento humano contribui para concepção de ambientes que distanciam, produzindo uma linguagem que comunica de forma superficial, e consequentemente faz com que as pessoas não se identifiquem com o espaço. Dessa forma, fica claro que a arquitetura se apresenta como um tipo de expressão e que ela se comunica diretamente com as pessoas que fazem contato com sua obra, com o entorno em que se insere e com Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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OS ELEMENTOS QUE TRANSMITEM A LINGUAGEM
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Como já foi apontado, a arquitetura se expressa a partir de um conjunto de elementos que são responsáveis por imprimir diferentes percepções e que se apresentarão de maneira singular para cada pessoa. É importante descrever o modo com que se criam essas impressões e que tipo de características que fazem com que se estabeleça essa relação entre as pessoas e a edificação, onde os sentidos humanos são provocados pelo objeto inanimado e fazem associações diretas com o espaço. Rasmussen trabalha detalhadamente o modo com que a arquitetura estabelece essa comunicação com as pessoas através de seus sentidos e instintos. Para isso, ele pontua e discorre acerca das características arquitetônicas responsáveis por essa relação. Assim como no processo de projeto, o processo mental do observador se direciona primeiro para as formas principais e depois seguem aos detalhes (RASMUSSEN, 2002, p.44). A partir desse conceito, entende-se que antes de olharmos diretamente para algo, nós recebemos uma impressão do que pode ser aquele objeto. Essa primeira percepção se dará principalmente no que diz respeito ao volume, a massa constituída e aos vazios existentes. Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
A composição e os contrastes entre o que é sólido e o que não tem preenchimento é o que passará essa ideia geral e fundamental do objeto. Essas características podem ser trabalhadas de diferentes maneiras, a disposição do jogo de volumes, por exemplo, características de profundidade, ou o acondicionamento dos espaços vazios, que podem contribuir para a formação de sombras, ideias de movimento, leveza, força, estabilidade, que vão ajudar as pessoas a caracterizarem aquela obra. Entretanto, o uso das cores também pode ser responsável pela constituição desses efeitos e o modo como eles são transmitidos. Isso pode se dar pelo contraste ou pela relação que essas cores estabelecem com a forma, ou mesmo com as características presentes na paisagem em que se insere, gerando inclusive efeitos ilusórios. As cores podem transformar características da forma, do material constituinte, ou mesmo criar planos visuais, além de ajudar a expressar ideias e conceitos de um período. A proporção é uma das características primordiais para a arquitetura. Alguns modelos foram elaborados para suprir determinados preceitos, e eles podem inclusive marcar um período. Para se aferir a proporção de uma obra, é necessário fazer medições e análises matemáticas, entretanto, uma pessoa que não tenha nenhum conhecimento diante dos métodos que constituem uma edificação, ainda pode sentir que a mesma imprime uma percepção harmônica ou desarmônica proveniente do modo como essa pro-
Fig 6 - Percepção de ritmo na fachada do Palácio da Alvorada em Brasília | Fonte: https://www.archdaily.com.br
tudo com que se relaciona. Essa comunicação faz com que a edificação exerça influência sob esses aspectos, mas o tipo de influência vai ser determinada pelo modo como essa linguagem é abordada.
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porção está compondo essa edificação. Além da proporção, a escala também tem um papel fundamental no modo como a arquitetura se expressa e determina como o edifício se relaciona com as pessoas e com o entorno. Outro elemento importante é o ritmo, que é facilmente identificado por qualquer observador, mesmo que não possa explicá-lo. O ritmo é determinado pela variação, tem uma certa regularidade se caracteriza como uma marcação, semelhante ao que nós vemos na música. Ele cria movimento e determina o segmento da edificação, como ela será percorrida visualmente ou mesmo fisicamente.
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As texturas, por sua vez, têm um caráter singular e apresentam diversas possibilidades, dentre elas: revelar o caráter natural de seu material ou mascará-lo, exibir padrões ou se apresentar de forma indefinida, caracterizar uma técnica construtiva ou um conhecimento antigo. Suas variações vão afetar o modo como a percepção de uma obra é expressa, mesmo que elas sejam muito sutis, e os materiais têm um caráter primordial nesse quesito, podendo criar efeitos marcantes para os usuários a partir do contraste ou variação de diferentes texturas, por exemplo. A luz do dia é, por sua vez, um elemento que não está intrínseco na arquitetura e possui uma alta variabilidade, sendo que o arquiteto não tem um controle direto sob ela. Dessa forma, as aberturas têm papel fundamental para se definir o modo como a iluminação natural atuará no amRevista CAU/UCB | 2018 | Artigos
biente e o efeito que ela causará. Ela pode ser utilizada para evidenciar texturas, elementos, ou mesmo mudar o caráter do recinto. Tudo isso será determinado pelo pé direito da edificação, a disposição das aberturas, a espessura das paredes e não apenas pelo tamanho das aberturas ou a quantidade de luz proporcionada. A arquitetura também vai direcionar o comportamento sonoro nos seus espaços, e isso pode ser definido através da forma, dos materiais, da escala e levar a uma distinção acerca da conduta das pessoas diante do recinto. Todos esses elementos nos levam a descrever os espaços arquitetônicos com termos não literais, como uma forma de expressar o que esse conjunto que compõe determinado ambiente nos faz sentir, e que nem sempre pode ser descrito de forma palpável ou objetiva. A ideia de peso e leveza, por exemplo, não é necessariamente uma característica concreta e palpável, podendo estar relacionada com o peso em si da edificação, com o caráter de sua estrutura, ou com sua forma, com o modo como ela se comporta, com a impressão que sua geometria emprega, ou ainda com os efeitos de cores e luz, que independente do caráter físico, podem impelir um ar de leveza ao se observar a obra, dando a definição de um caráter intangível. A FENOMENOLOGIA E A EXPERIENCIAÇÃO DA ARQUITETURA Antes de compreender como a fenomenologia se relaciona com a arquitetura, será
apresentado o seu conceito fundamental. O estudo da fenomenologia se inicia na filosofia com Husserl, no início do século XX. Suas ideias partem de um conceito antinaturalista, onde ele defende que a consciência não pode ser explicada pelas ciências naturais. Essa tentativa de reduzir essa consciência a uma explicação leva a uma generalização do homem e descarta a infinidade de possibilidades que a psique representa. A definição mais básica de fenomenologia se dá como o estudo dos fenômenos, ou seja, é o estudo da experiência em si, logo, é importante ressaltar que o interesse primordial é a própria experiência. Cerbone (2012, p.15) explica que as experiências apresentam uma certa complexidade, considerando que não podem ser analisadas pontualmente e que representam mais do que é constatado num dado momento, daí se dá o caráter transcendental da fenomenologia, que busca considerar as diferentes possibilidades e variações das experiências. Dessa forma, a fenomenologia surge para a arquitetura como um contraponto aos preceitos modernistas que vinham sendo difundidos pelo mundo. A implementação do International Style no movimento moderno estabeleceu regras e gerou uma padronização de suas obras, o que levou a criticas acerca do conceito de modernidade. O que surgiu como um movimento que buscava sempre se auto rever, vinha produzindo edifícios a partir de ideais pré-estabelecidos.
A arquitetura estava se estabelecendo diante de um forte racionalismo, com segmentos como “forma segue a função” ou “a casa é uma máquina de morar”, que não consideravam a complexidade do homem e do espaço. A fenomenologia surge então para a arquitetura, assim como para a filosofia, buscando priorizar essa complexidade. A arquitetura fenomenológica vai explorar a relação do edifício com o homem e como se dá essa experiência, ou seja, ela vai trabalhar diretamente a linguagem arquitetônica. Como nós estamos falando de duas questões importantes – a arquitetura e a experiência –, destaca-se a importância do corpo e dos sentidos no estabelecimento dessa conexão. Entende-se que a relação entre a mente e o objeto se dá por intermédio do corpo, cuja ideia é exposta no seguinte trecho: “É na concepção de corpo que Marleau-Ponty insere a temática da arte pois esse corpo não é a coisa entre coisas e sim sede das articulações das significações, fonte do cogito pré-reflexivo.” (LOUBET, 1993, p.26). Marleau-Ponty entende que o corpo é onde se permite estabelecer significação ao objeto e validar a experiência, logo, essa significação só se concretiza por intermédio do corpo humano. Entende-se que a prioridade é a própria experiência proporcionada pela obra, e não a obra em si. É a partir dessas ideias exploradas por Marleau-Ponty que o arquiteto Juhani Pallasmaa se aprofunda no entendimento Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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da arquitetura fenomenológica e explora a importância da relação entre o homem e o espaço a partir de seus sentidos. Pallasmaa, em concordância com Marleau-Ponty, entende que o corpo em sua totalidade se configura como o centro de todas as nossas experiências com o mundo e no mundo. Se nesse ponto entendemos que a fenomenologia destaca a atribuição de significados e sentidos por meio das nossas experiências com o mundo, podemos concluir, assim como Pallasmaa, que a arquitetura pode contribuir para nos sentirmos pertencentes, parte desse mundo.
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Pallasmaa também critica a supervalorização da visão e das imagens, que assim como foi abordado no início da discussão, é como muitas vezes se entende a arquitetura, que acaba sendo vendida apenas por sua agradabilidade visual. Para ele, os sentidos trabalham de forma complexa e integrada, e não isoladamente, e as experiências se constroem a partir dessa integração que compõe e agrega significação tanto ao mundo, quanto ao ser que o vivencia. Nesse caso, ele destaca a visão periférica que não segrega, mas inclui seu observador no quadro que se observa e o torna parte do todo. Uma das questões mais abordadas pela fenomenologia é o estudo dos múltiplos modos de se perceber um objeto e em nenhum momento ela se restringe a um ponto de vista ou uma única percepção, ela entende que essas variações são ilimitadas. Logo “[...] uma obra de arquitetura Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
gera um todo indivisível de impressões”. (PALLASMAA, 2012, p.42). Assim como foi destacado ao longo da discussão, a arquitetura faz parte de um conjunto de elementos, é o conjunto de tudo que constitui a linguagem arquitetônica – as texturas, a iluminação, o entorno – e Pallasmaa entende que as impressões causadas só se constituem a partir desse todo que vai gerar múltiplas impressões que compõem a sua experiência. Pallasmaa vai discutir como os elementos que foram descritos anteriormente nos afetam e sua importância dentro do todo. Nesse ponto, pode-se entender a importância de se conceber a arquitetura como um espaço para ser vivenciado, percorrido, explorado em caráter sensível e corporal. A arquitetura puramente racional ou visual não atende a complexidade da percepção humana. Para a fenomenologia, a concepção dessa arte deve levar em consideração tanto o conjunto de tudo que transmite a sua linguagem arquitetônica, como o conjunto e a integração dos sentidos humanos. A partir desse entendimento conclui-se que “a função atemporal da arquitetura é criar metáforas existenciais para o corpo e para a vida que concretizem e estruturem nossa existência no mundo.” (PALLASMAA, 2012, p.67). A arquitetura possui uma função muito além da necessidade primária e mais básica para que se constitui, ela atribui significação tanto para o mundo como para o homem. Ela ajuda a caracterizar a cultura e compreender as mudanças e variações marcadas pelo
espaço e pelo tempo, além daquilo que permanece e se mantém, ajudando também o homem a se identificar e se perceber como ser pertencente a este mundo. A fenomenologia na arquitetura destaca o caráter de transcendência que está além de suas definições de espaço ou qualquer característica concreta, pois a arte está em contato direto com as pessoas e é vivenciada por elas. E é essa experiência entre o ser e o objeto é que vai lhes conferir identidade. O avanço da tecnologia e a globalização permitiram muitas trocas e avanços, entretanto, no caminho, as concepções arquitetônicas muitas vezes passaram a se distanciar do que é humano. Suas características que representam cultura e significação deram lugar a outros interesses, o que levou a um distanciamento dessa experiência, gerando os não lugares. O estudo da arquitetura enquanto fenômeno vem como uma necessidade de reação a esse tipo arquitetura desassociada do contexto antropológico e do mundo, buscando nas obras uma relação em que o homem viva e se sinta como parte do mundo. ANÁLISE DE DIFERENTES EXPRESSÕES ARQUITETÔNICAS E SUA RELAÇÃO COM O HOMEM A arquitetura ajuda a caracterizar diversos períodos da história, contribuindo para criar uma identidade, seja de uma época, de uma cultura ou de uma ideologia. Muitas obras se tornam símbolos e possuem grande representatividade. Muitas vezes,
o que faz essas obras serem tão singulares é a experiência que elas proporcionam, mesmo com o passar dos anos. O conjunto de seus elementos e a forma com que a arquitetura se relaciona com o todo, cria uma identidade. E é exatamente o que é apontado pela fenomenologia – o homem cria uma ideia de pertencimento a partir de sua experiência com o objeto, compreendendo ambos como parte de um mundo real. A casa é a tipologia arquitetônica em que o homem mais tem contato, tornando-se um reflexo de sua identidade. Um dos primeiros registros de residência unifamiliar em meio urbano que se têm é a casa romana, conhecida como domus. Ela possuía não só a função de abrigo, mas já se caracterizava como um ambiente de reunião e rituais. A planta dessas casas obedece a um certo padrão, o acesso se dava por meio de um espaço denominado vestíbulo, e no centro da casa encontra-se o atrium, em torno do qual se distribuem os outros ambientes. Normalmente, no atrium encontram-se o impluvium e o compluvium¸ onde se canalizava as águas pluviais e criava-se um microclima com iluminação e ventilação natural, além de garantir uma vista do céu. Segundo Oates (1991, p.26) “na cidade de Pompeia, [...] os arqueólogos puseram a descoberto rua após rua, casas com pavimentos de mosaico, paredes com fresco pintados, pátios com colunas, água corrente [...]” Dessa forma, atualmente grande parte da cidade de Pompeia se mantém conservada. As casas abertas ao Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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Fig 9 - Coliseu em Roma | Fonte: https://www.archdaily.com.br
Fig 8 - Casa de Casca Longus aberta à visitação | https://historiaartearquitetura.com
Fig 7 - Casa em Pompeia com visualização aérea do átrio | OATES, 1991, p.25
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público guardam a identidade de um povo e permite que as pessoas ainda tenham contato com o antigo estilo de vida romano. É de grande relevância a importância da experiência vivenciada pelas pessoas que visitam as antigas casas romanas atualmente, e a relação com a experiência vivida por seus primeiros habitantes. Destaca-se os fatores de iluminação, ventilação, as pinturas, o caráter dos ambientes, a definição do espaço individual, as texturas empregadas e a significação que esses espaços internos se apresentavam na época e como esse conjunto de elementos, aliado ao seu caráter histórico, se apresenta hoje e os efeitos que eles imprimem nas pessoas. Todos esses aspectos representam uma arquitetura que estava totalmente relacionada com o homem e que explorava a ligação entre o corpo e a mente humana. Essas implicações transcenderam o tempo e ainda afetam os atuais visitantes, de alguma forma. Por sua vez, podemos citar também o Coliseu Romano, que possui uma tipologia de caráter bem distinta da mencionada anteriormente, e até hoje é considerado uma obra de muito valor. Esse interesse é despertado pela arquitetura em si, independentemente de sua função. Entende-se que o valor com que as pessoas atribuem ao Coliseu não se mantém apenas por sua aparência, a obra exerce uma ligação com o homem a partir de seus sentidos e proporciona um tipo de experiência relevante para as pessoas, mas que se distingue, por exemplo, da domus, que possui características diferentes e uma composição
de elementos totalmente distinta, levando a uma experiência completamente diferente. O Coliseu é um anfiteatro que foi palco de diversos espetáculos entre gladiadores e animais selvagens, e essas apresentações garantiam o entretenimento do povo. Uma de suas características mais marcantes é a sua escala monumental e suas proporções, com uma estrutura bem imponente – três fileiras de arcos sobrepostas com colunas de diferentes ordens para cada nível, que garantem a verticalidade e caracterizam sua fachada. A sua composição ajudava também a separar os espectadores de acordo com sua classe social, por meio de três diferentes níveis. A imponência que a obra emprega e as sensações que ela transfere às pessoas se dá a partir do conjunto de seus elementos, como a textura de seus materiais, os volumes das colunas e dos arcos e os efeitos de luz e sombra. Sua configuração gera curiosidade, espaços a serem descobertos e instiga os instintos humanos de diferentes formas. Mesmo sem saber sobre sua concepção histórica ou das implicações técnicas, as pessoas hoje são afetadas pela obra de algum modo, pelos padrões de proporção, pela escala, pelos materiais, etc... Em ambas as obras citadas, é importante ressaltar a distinção experiencial proporcionada nos diferentes períodos históricos. Em um primeiro momento, onde as construções se apresentavam em seu caráter original, a arquitetura e o conjunto Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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Fig 11 - Catedral de Notre Dame | Fonte: https://www.archdaily.com.br
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Fig 12 - Vista interna da Catedral de Notre Dame | Fonte: http://g1.globo.com
Fig 10 - Vista interna do Coliseu em Roma | Fonte: https://www.archdaily.com.br
de seus elementos mantinham uma configuração e significação específica dentro de seu contexto. Atualmente, a partir das ações do tempo e das mudanças sociais, o caráter dessa experiência se transforma, o conjunto dos elementos arquitetônicos não se apresentam mais em sua configuração original. Desse modo, a percepção das pessoas diante dessas obras não terá o mesmo efeito e significação que se vivenciava antigamente. Enfim, há uma grande variação dessa experiência, daí o caráter transcendental da fenomenologia. Já na arquitetura gótica, buscava-se uma aproximação com a presença divina e isso se refletia nas suas catedrais. A experiência vivida nas catedrais góticas era primordial para aproximar o povo do conhecimento religioso, por isso se explorava o uso da luz natural, de vitrais, gárgulas, ambientes internos amplos, maior verticalidade que direcionava os olhares aos céus, permitida pelo desenvolvimento do arco ogival. Dentre as catedrais góticas, a de Notre Dame em Paris se destaca como uma das mais antigas. Ela possui escultura em pedra, explora os cheios e vazios, tem padrões de proporção bem definidos que podem ser observados nas fachadas, movimento expresso em suas formas e muitas texturas. Há nessa obra também uma escala monumental, mas com um caráter diferente do Coliseu que conserva espaços abertos. Em Notre Dame, os espaços internos possuem um pé direito extremamente alto. Ela chegou a inspirar a literatura como na obra “O Corcunda de Notre Dame”, levando a crer que sua Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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composição inspira o imaginário, ou seja, mesmo sem conhecerem seus fundamentos, a obra marca as pessoas de alguma forma e proporciona percepções que despertam a mente. Como as igrejas góticas tinham intenção de aproximar a ideia do divino nos seus espaços, seus elementos estão constantemente estimulando os sentidos humanos, e algumas características como a questão da iluminação, leva as pessoas a fazerem associações, o que ajuda a tornar a obra muito marcante e distinta quanto a experiência que ela proporciona.
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Todas essas obras, mesmo tendo sido idealizadas em diferentes períodos, culturas e circunstâncias, além de apresentarem diferentes tipologias, tem um valor para as pessoas, além do histórico, além da funcionalidade. As pessoas sentem vontade de percorrer, de observar, sentir e perceber como se constituem esses espaços.
em que ela se insere, tanto urbano, quanto cultural, histórico, ambiental, tudo que poderá influir no estabelecimento de sua linguagem. A fenomenologia, ao voltar sua atenção aos fenômenos em si, provenientes da relação do homem com o mundo, ajuda a destacar a importância de se priorizar a própria experiência que as pessoas irão vivenciar, e não o valor da obra por si só. Esse pensamento contribui para a criação de obras que possam transcender, que estabelecem sua significação por meio da interação humana e comunicam de forma relevante. Esse pensamento pode ser exemplificado pelas obras discutidas, que apresentam grande valor para a população por proporcionar experiências que estimulam seus instintos e permitem que as pessoas estabeleçam conexões e significação, mesmo que sua função não se mantenha.
BIBLIOGRAFIA AUGÉ, M. Não lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade. 9. ed. Campinas: Papirus Editora, 2012 CERBONE, D. R. Fenomenologia. 3. ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2012 CHOAY, F. A alegoria do patrimônio. 1. ed. São Paulo: UNESP, 2001 LOUBET, M. S. Estudos de estética. Campinas: Editora da UNICAMP, 1993 OATES, P. B. História do mobiliário ocidental. 1. ed. Lisboa: Editorial Presença, 1991 PALLASMAA, J. Os olhos da pele a arquitetura e os sentidos. Porto Alegre: Bookman, 2012
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RASMUSSEN, S. E. Arquitetura vivenciada. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002
CONCLUSÃO A arquitetura deve estabelecer uma ligação com as pessoas, não só pela sua função, mas ela pode ajudar a intensificar a experiência das atividades que abriga, explorando a vivência da própria arquitetura, garantindo que o lugar em si proporcione uma interação ativa com as pessoas, para que elas valorizem também todos os elementos que compõem esse espaço, e não só sua funcionalidade ou seu caráter visual. Essa relação é estabelecida quando as pessoas conseguem fazer associações e criar uma identificação, por isso, é muito importante a consideração dos contextos Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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PALAVRAS-CHAVE: Símbolo, Significado, Arquitetura Religiosa. Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
Carolina Menzl Celaschi | Prof. CAU/UCB | Gabriella Assis Salles | Aluna do CAU/UCB
Assimilar a composição simbólica da arquitetura cristã é compreender como a diversidade de elementos ao longo de toda a história da arquitetura religiosa puderam compor uma riqueza de símbolos que remetem constantemente ao transcendente, inserindo o ser humano em um processo de construção pessoal em crenças. Este ensaio tem como objeto de estudo uma análise sobre os aspectos formais e compositivos que regulamentam a arquitetura religiosa ao longo da história. Tais elementos conformaram uma chave principal para a captação e perpetuação de fiéis, pois não se trata apenas de reproduções de ritos, mas consiste, principalmente, na influência da experiência sensorial dentro de templos religiosos. Dessa forma, a arquitetura eclesiástica é carregada de metodologias e significados que buscam elevar o estado espiritual do indivíduo através do emprego de elementos que configuram o conceito do transcendente ou representatividade do universo.
SIMBOLOGIA NA ARQUITETURA CRISTÃ
RESUMO
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O meio em que o ser humano se encontra imerso está carregado de simbologias que o encaminha a melhor compreensão daquilo que está em sua volta. A relação entre o símbolo e seu significado está associado ao meio em que está inserido, ou seja, ao longo da história humana, diversos elementos receberam importantes significados e se tornaram símbolos de uma sociedade de uma religião, por exemplo, e assumiram um papel de reconhecimento.
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A conformação de um espaço para a inserção de seres humanos deve estar baseada na busca do belo e, principalmente, da harmonia1 (SVITRAS, 2017). Esta deve ser concebida através de uma complexa ligação entre proporções e simbologias, que são caracterizadas como uma construção do próprio indivíduo que usufrui. Stigar (2008) afirma que o conceito de belo entra na crítica da obra de arte em parceria com as noções de gosto, de equilíbrio, de harmonia, de perfeição efeitos que se produzem sentido no sujeito apreciador. É intuitivo ao ser humano ter crenças que o encaminham para uma metodologia de vida, estas crenças podem estar, muitas vezes, relacionadas a religiões, irmandades e fraternidades que se diferem pela metodologia em que os ritos são executados, mas se assemelham 1 Segundo o filósofo Hegel, a beleza retratada através da arte, neste caso sendo relacionada a arquitetura, é o caminho de se alcançar formas sublimes através de infinidade de meios que a natureza, finita, proporciona às mãos de quem executa. Sendo assim, o belo artístico consegue ser infinito por se relacionar ao espírito, ao contrário do natural que está limitado em si. Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
pelo emprego de simbologias: conformação do espaço interno, ornamentação, uso de materiais e técnicas construtivas, e até mesmo a própria arte empregada através de quadros e pinturas pode representar um meio catequético. Mesmo possuindo símbolos característicos de cada religião, sua existência é a prova de que existe a necessidade do ser humano atingir experiências com o transcendente. Deste modo, é essencial compreender como o símbolo, que pode ser expresso e utilizado de diversas formas, é perpetuado ao longo de toda a história na Arquitetura Cristã como representação do transcendente ou como representatividade do universo. Carregada de simbologias, a Arquitetura Eclesiástica carrega uma grande utilização de significados em seus rituais e estes tiveram diferentes empregos durante o processo de difusão e consolidação das igrejas. 2. DESENVOLVIMENTO 2.1. PALEOLÍTICO
Fig 1 - A representatividade transcrita nas pinturas rupestres elucidava o desejo do homem sobre o ambiente. | Fonte: http://paleoliticonoticioso.blogspot.com.br/2013/04/el-arte-rupestre-de-los-primeros.html
1. INTRODUÇÃO
Nos primórdios da humanidade, os espaços físicos religiosos já se conformavam, não tão claramente como hoje em dia, mas estes podiam ser conquistados, apropriados, organizados, carregado de sentidos e intencionalidades, habitado conforme seus desejos e interesses, mas sendo prático para utilização. Esse uso transcreve o significado e o significante propostos, convertendo-se em extensão de seu ser individual ou coletivo. Geralmente, esses lugares possuíam a continuidade, a ordem e a beleza e assim eram facilmente classificados como locais cósmicos. Não eram tratados com noções de proporção e beleza, mas remetiam facilmente a praticidade de executar aquilo que lhe foi destinado (GOMBRICH, 1909). A experiência com o cósmico levava os indivíduos a um contato com o transcendente, reconhecendo que existe a presença de um ser sagrado que se mostra com benevolência. Mas, de forma geral, essa presença e manifestação transcendental ocorria em locais fixos, onde era permitido viver sua existência. Frade (2007) evidencia que a partir deste momento, a busca por símbolos que elevam o contato terreno do homem com o sagrado se torna o início da busca por experiências que iriam além do mundo físico. alcançar: ordem, forma e o modo para se dominar a natureza rebelde, já que neste tempo histórico acreditava-se que rio sem peixes, colheita improdutiva, terra infértil etc, era a natureza fora do seu estado de equilíbrio (FRADE, 2007).
O esquema geral e natural do Templo é a simples paisagem constituída pela colina com sua gruta, pedras, árvores e fonte, tudo circunscrito e protegido por uma ‘linha’ anunciando o caráter sagrado do lugar. [...] Quando surgiu a arquitetura, o templo se tornou uma casa e seus componentes minerais e vegetais se transpuseram para constituir os próprios elementos do edifício. Assim sendo, a ‘linha’ bem acabada ou rudimentar se tornou parede; as árvores se transformaram em pilares; a pedra se tornou o altar; a gruta fez surgir o nicho da abside e o teto foi assimilado ao céu. Assim surgiu o templo, como uma paisagem edificada. (FRADE, 2007 apud PASTRO, 1984. p. 11) De forma clara, o autor acima elucida sobre o início da conformação de um espaço físico, de como a paisagem natural mutável começa a ganhar formas mais rígidas através do processo de edificação. Este fato é comprovado no período Neolítico, os homens pré-históricos levantavam colunas de pedras verticais em honra a acontecimentos ou divindades – menir, e perceberam que a junção de algumas dessas colunas, quando postas em conformação cilíndrica ou defronte, com uma espécie de coluna horizontal apoiada, facilmente conhecida como laje, conformava um espaço físico que recebia funções diversas – dólmen AGUIAR, 2016). Como pode ser visto nas imagens abaixo, a conformação do menir que evolui para o dólmen mos-
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2.2. ANTIGUIDADE CLÁSSICA
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Sobre a planta baixa do templo grego Parthenon (447a.C a 432 a.C, Atenas, Grécia), Frade (2007) cita as classificações dos ambientes constituintes em: naos – local onde ficava a estátua representativa do deus e a pronaos – local simbólico entre interno sagrado e externo profano. No templo romano, sua composição interna recebe colunatas que possibilitam a criação de locais sociais para cultos. Como é possível observar na figura a seguir, a forma circular da planta baixa do Panteão (27 a.C.–14 d.C., Roma) difere no que estava sendo feito nos templos gregos, pois esta apresenta a marcação da colunata externa apenas na fachada frontal e sua simetria está apenas no eixo longitudinal. Marcos Vitrúvio, arquiteto romano do século I, deixa seu legado com o Tratado de Arquitetura que revela claramente a composição dos templos romanos e trata sobre a orientação a que deve estar inserido
Acerca da orientação do edifício, dá estas regras: se não há nada que impeça e se há possibilidade de uma livre escolha, deve-se tomar cuidado para que o simulacro (signum), colocado na cela, olhe para o ocidente (ad vespertinam coeli regionem), de modo que os sacrificadores e assistentes do sacrifício [...] e os próprios simulacros olhem-se uns aos outros a partir do oriente. [...] Vitrúvio testemunha também a preocupação de que o lugar sagrado suscite a devoção em quem o vê [...]. (FRADE, 2007 apud CATTANEO, 1967, p.21) Com a difusão do cristianismo neste primeiro período, principalmente em Roma que estava ligada ao culto apostólico, seus participantes não viam a necessidade de um espaço físico para suas reuniões, pois acreditavam que cada um era pedra viva do corpo espiritual de Cristo. Suas assembleias da Palavra e os cultos espirituais aconteciam em salas de casas romanas ou em locais cedidos por cristãos mais abastados, de modo que tudo acontecia em locais não marcados, principalmente pelo fato que neste período os seguidores do cristianismo eram perseguidos, logo suas reuniões deveriam acontecer em locais não marcantes. As catacumbas2 , nossos atuais cemitérios, são exemplos de locais que os cristãos da época tinham para se reunir e tinham a intenção de proporcionar um local digno para os mortos da 2 Galerias subterrâneas escavadas no tufo.
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Fig 2 - Exemplo de Menir | Fonte:http://uncyclopedia.wikia.com/wiki/File:Brittany_menhirs.jpg
A comunidade que desenvolve a construção de um templo irá implementar as características locais, assumindo elementos que consideram pertinentes como representação da época (FRADE, 2007). Para os gregos, o templo seria classificado apenas como uma morada para o deus e estaria localizado em locais altos como simbologia à proteção divina.
– regra que é seguida até hoje na construção de templos religiosos.
47 Fig 3 - mplo de Dólmen | Fonte:www.infoescola.com/arquitetura/monumentos-megaliticos/
tra claramente uma relação de estrutura pilar e laje, remetendo a construção e delimitação de um espaço.
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Fig 4 - Planta Baixa com marcação de Naos e Pronaos do Parthenon. | Fonte: https://thepursuitofbeautyblog.wordpress.com/2015/10/21/a-simetria-na-arquitetura/ | Intervenções de imagem: Gabriella Assis Sales
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Fig 6 - Planta Baixa Panteão Romano. | Fonte: <http://umolharsobreaarte.blogs.sapo.pt/8235.html>
Fig 5 - Divisão da fachada dos templos gregos | Fonte: http://desenho-classico.blogspot.com.br/2016/05/o-templo-grego.html
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Fig 7 - Fachada frontal e lateral esquerda do Panteão Romano mostra a diferenciação do templo grego. Este já recebe forma circular através do uso de abóbadas e uma cúpula. | Fonte: http://www.janelaitalia.com/o-panteao-romano/
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comunidade, pois não se aceitava a cremação (FRADE, 2007). 2.3. IGREJAS ROMANAS O judaísmo, religião monoteísta mais antiga já conhecida, surgiu por volta de 1800 a.C. e influenciou diretamente algumas simbologias cristãs já no início dessa nova religião que surgia. Frade (2007) mostra que o gradativo crescimento da religião cristã após a liberação para liberdade de culto em 313 d.C. como religião oficial do império, trouxe como consequência a necessidade de buscar locais maiores para comportar o número de fiéis – basílicas paleocristãs.
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Fig 8 - Catacumba com afresco representando a Santa Ceia de Jesus e, logo abaixo, um túmulo. | http://pointdaarte.webnode.com.br/news/historia%20da%20arte%20paleocrist%C3%A3/
Fig 9 - Planta Baixa da Basílica de Santa Sabina mostra a divisão interna das naves. | Fonte: http://www2.oberlin.edu/images/Art336/366-007.JPG
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As Basílicas não surgem neste período de ascensão do cristianismo. De acordo com Werner (2014), já eram conhecidas no Império Romano como estruturas arquitetônicas que tinham uma função econômica e jurídica, e que sofreram uma série de modificações estruturais até serem adotadas como edifícios religiosos. A planta da Basílica de Santa Sabina (Roma), considerada uma das primeiras brasílias cristãs construídas, é formada por uma nave central maior que as laterais, tanto na largura quanto na altura, sendo que na central abriga uma grande quantidade de janelas. As sinagogas judaicas foram a base para as igrejas cristãs que usaram elementos judaicos na conformação do espaço para a realização de cultos (cristão x judaico): amplo estrado para os leitores (espécie de palanque baixo colocado sob piso eleva-
do) x bema; trono ou altar para o evangelho x arca com véu; candelabro x menorá (candelabro sagrado com sete brações); cadeira dos bispos x menção a cátedra de Moisés e banco dos presbíteros (FRADE, 2007). De uma forma geral, a configuração interna de uma sinagoga não foi alterada, da mesma forma que uma igreja cristã, permanecendo constante grande parte da disposição de seus elementos. A partir dessas considerações, é possível comparar dois templos religiosos semelhantes entre judaísmo e cristianismo conforme figura 10 e 11. A primeira, Sinagoga de Carfanaum do século IV ou V. Ainda que em ruínas, é possível destacar a presença de uma nave central, delimitada pelas colunatas, separando das naves secundárias. A segunda, a Basílica de Santa Sabina de 422, tem semelhanças com a sinagoga acima citada quanto a disposição interna dos elementos, ressaltando apenas a ausência de um palanque central, sendo este deslocado para junto do altar. Diferem-se pelo simples fato da orientação, onde as entradas devem estar localizadas a leste, ao nascer do sol. Neste período paleocristão, muitas basílicas não comportavam apenas a função para culto religioso, mas atrelava-se funções secundárias de mercado, edifício bancário e bolsa, sala de justiça e simples ponto de encontro (COLIN, 2011). A conformação básica de sua planta baixa, (como citado no exemplo acima da Basílica de Santa Sabina e de acordo com a figura abaixo) bem como das primeiras Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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construções religiosas desse período, é distribuída em: pátio e/ou átrio com pórticos –simbologia da passagem do mundo profano para o sagrado. Dentro haviam as naves, central e laterais, a primeira mais alta possibilitava a locação de janelas laterais, e a segunda acomodava os fiéis, e ao final da nave, a abside, semicircular ou poligonal, que abrigada o altar (FRADE, 2007). 2.4. IGREJAS BIZANTINAS
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Em meados do século IV, Constantino, imperador do império romano, transferiu suas tropas para Bizâncio, entre a Ásia e a Europa, nascendo a arte bizantina no oriente com influências greco-romanas, mas com grande presença do vernáculo oriental, empregando tijolos e argamassa (FRADE, 2007). Nesse novo contexto do império, algumas modificações aconteceram no modo de se fazer as igrejas, distanciando das basílicas romanas: configuração multifacetada, a cúpula apoiada em tambor e este sobre os arcos, uso de telhas finas e a aproximação com o altar através da planta com eixo central ou cruz grega (braços com mesma medida). Quando esta última acontecia, era implementado na extremidade dos braços as abóbadas e tambor, pois este último realizava a transição da base quadrada para a base circular onde se assentaria a cúpula. De modo geral, a maioria das igrejas construídas neste período era de forma centralizada (figura 13), tendo como exempRevista CAU/UCB | 2018 | Artigos
lo a Basílica de Santa Sofia (532 d.C.) em Constantinopla, dos arquitetos Antemio de Trales e Isidoro de Mileto. Foi uma das primeiras construções desse período e carregou todas as caraterísticas fundamentais do período, surgindo o novo modo de fazer igreja, pois conseguiu explorar ao máximo a volumetria das fachadas, assumiu o uso de cores no interior e agregou técnicas matemáticas avançadas no sistema estrutural. 2.5. IGREJAS ROMÂNICAS No século XI, novos arquitetos italianos, principalmente os de Lombardia, buscavam unir a forma basilical com aplicações bizantinas para encontrar um novo sistema para cobrir as naves com abóbadas. De acordo com Colin (2011) as construções arquitetônicas românicas implementam transeptos e um coro ampliado para as laterais, perpendicular à nave, formando a planta em cruz latina, como pode ser visto na figura 16. É o símbolo máximo do cristianismo, diferindo se da cruz grega por apresentar os braços laterais mais curtos. Conforme pode ser visto em figura acima, a marcação feita em tom rosa mostra facilmente a nova conformação da planta cruciforme, que também é ampliada e ganha mais uma colunata nas naves laterais. Quanto às soluções arquitetônicas, o estilo românico é marcado pelo uso de arcos para suportar o peso das abóbadas e a criação do matroneo, identificado como uma varanda interna sobre as
naves laterais, dando visibilidade à nave principal. O corpo eclesiástico inicia uma forte influência em um novo modo de se fazer arquitetura religiosa, contando com a presença de várias capelas e altares, compreensão do espaço litúrgico e, consequentemente, uma nova configuração do espaço interno. 2.6. IGREJAS GÓTICAS Em meados do século XII, surge uma vertente desenvolvida das técnicas utilizadas pelos românicos durante a Idade Média, as igrejas góticas marcam fortemente o final deste período, e se tornam um contraponto a tudo que estava sendo produzido. As largas paredes e as abóbadas de arcos semicirculares são substituídas por estruturas esbeltas com segmentos de arcos que garantiram alcançar estruturas mais altas – arcos ogivais. De acordo com FRADE (2007), a principal preocupação das construções deste período é a estrutura, composta por colunas, arcobotantes exteriores, contrafortes, arcos, abóbadas nervuradas, tudo sustentado pelo equilíbrio das forças, e os vãos são preenchidos por vitrais multicoloridos por onde permeia a luz. Neste momento, a arquitetura de igrejas cristãs consegue atingir significativas transformações. A partir das imagens acima é possível identificar que as modificações góticas vão além da planta baixa, que continua a ser em cruz latina. Elas estão presentes na verticalidade alcançada por torres, na nudez da estrutura, na ornamentação da
Fig 10 - Sinagoga de Carfanaum. | Fonte: http://www.pt.josemariaescriva.info/artigo/cafarnaum2c-a-cidade-de-jesus
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Fig 11 -Basília Santa Sabina, Piazza Pietro D’Illiria – Roma. | Fonte: < http://www.oggiroma.it/eventi/visite-guidate/basilica-di-santa-sabina-apertura-straordinaria/28497
Fig 12 - Planta baixa da Basílica Santa Sabina, Roma. | Fonte: http:// apuntes.santanderlasalle.es/arte/paleocristiano/arquitectura/basilica_santa_sabina_roma_planta.jpg | Intervenções de imagem: Gabriella Assis Sales
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Fig 13 - Exemplo de planta baixa de Igreja Bizantina. Primeira planta mostra centralidade, já a segunda mostra exemplo de planta em cruz grega. | Fonte: https://coisasdaarquitetura.wordpress.com/2011/09/22/morfologia-da-igreja-barroca-no-brasil-i/
Fig 15 - Interior da Basílica de Santa Sofia com escala monumental dos elementos que foram empregados. | Fonte: https://intensecare.wordpress. com/2013/07/07/um-pouco-sobre-a-basilica-de-santa-sofia/
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Fig 14 - Exterior da Basílica de Santa Sofia mostra multifaces.| Fonte: https://belostemplos.wordpress.com/2016/09/19/basilica-de-santa-sofia-turquia/
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Fig 16 - Basílica de São João de Laterano, Roma (313-19 d. C.) | Fonte: https://coisasdaarquitetura.wordpress.com/2011/09/22/morfologia-da-igreja-barroca-no-brasil-i/
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Fig 17 - Planta baixa da Catedral de Notre Dame de Chartes com a representação da projeção dos arcos presentes em sua estrutura, bem como a grande abertura para vitrais nas fachadas. | Fonte: https://coisasdaarquitetura.wordpress.com/2011/09/22/morfologia-da-igreja-barroca-no-brasil-i/
Fig 18 - Interior da Catedral de Notre Dame de Chartres, França.| Fonte: <http://www.abc.net.au/radionational/programs/blueprintforliving/iconic-buildings3a-chartres-cathedral/6642224>
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Fig 19 - Planta Baixa Igreja San Carlo alle Quattro Fontane, Roma.| Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/San_Carlo_alle_Quattro_Fontane
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fachada principal, na presença da luz no interior. Dessa forma, a catedral medieval típica dominava a cidade e afirmava sua preeminência por sua massa, seu volume e sua grande altura. Caracterizava não só a religião católica, mas também a riqueza, o poder do clero, bem como o sacrifício de toda a coletividade e o orgulho da cidade. Nesse sentido, essa grandeza estava pouco ligada à expressão do culto comunitário e muito mais a imagens de espiritualidade e de anseio de expressão mística (FRADE, 2007, p.45). 2.7. IGREJAS BARROCAS
58 Fig 20 - Interior da Igreja de Gesu, Roma. | Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Igreja_de_Jesus
Fig 21 - Catedral da Sé, São Paulo.| Fonte: http://www.arquisp.org.br/noticias/arquidiocese-celebra-aniversario-da-dedicacao-da-catedral-da-se
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Dentro do contexto histórico da sociedade cristã do século XVI, está o desequilíbrio provocado pela Reforma Protestante, que teve como mentor Martinho Lutero que protestou contra diversas questões da Igreja Católica Romana. Diante da fragilidade que se encontrava e dos constantes fieis que se afastavam, a igreja inicia um processo de reestruturação de algumas estruturas cristãs, avaliando as críticas da Reforma Protestante, além de reformular o aspecto morfológico arquitetônico (COLIN, 2011). Diante da necessidade de atrair novos fieis e resgatar os antigos, a igreja católica vive o período Barroco, fortemente marcado pela formatação peculiar da ornamentação intrínseca à arquitetura, bem como a aplicação da nova formatação interna.
A Igreja San Carlo alle Quattro Fontane (1641) em Roma, do Arquiteto Giovanni Borromini, possui uma nova conformação que subtrai as naves laterais para adicionar altares laterais e/ou capelas, e neste caso analisado, a estrutura curvilínea confere a sensação de movimento a todo o corpo da igreja, tanto em seu interior quanto na fachada. O piso oval da cúpula se inscreve dentro de uma estrutura retangular, em combinação com a forma de um losango cujos vértices arredondados correspondem à entrada, as capelas laterais e o altar principal (WIKIARQUITECTURA, 2017). As igrejas barrocas como um todo são reconhecidas pelo excesso de ornamentação e dinamismo, uso do claro e escuro e dramaticidade, que foram empregadas na linguagem formal da edificação. Mas Frade (2007) cita que de forma abrangente, o exterior das igrejas barrocas não é tão decorado quanto o interior, pelo fato de que a cena dramática se daria no interior por meio iluminação das janelas ocultas e curvas da ornamentação. 2.8. IGREJAS NEOCLÁSSICAS Marcado por um movimento repleto de exageros formais e ornamentais, o estilo barroco é abandonado durante o século XVIII com a justificativa de que era preciso resgatar a antiguidade greco-romana, enfatizando os modelos da arquitetura e a racionalidade e funcionalidade das formas. Entretanto, os arquitetos neoclássicos não se dispuseram a conformar um novo modelo de se fazer arquitetura com base nas regras da antiguidade, Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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mas reproduziram os templos na íntegra dentro do novo contexto urbano. Isso se deu pelo fato que as edificações greco-romanas eram resumidas em elevação do terreno através do pódio, colunata, entablamento, frontão e cúpula (principalmente em templos romanos). Como exemplo dessa arquitetura neoclássica, temos o Panteão Francês (Paris, 1790) dos arquitetos Jacques-Germain Soufflot e Jean-Baptiste Rondelet. Foi construído em planta de cruz grega para ser uma igreja, mas com sua conclusão se tornou o Panteão Nacional. 2.9. IGREJAS ECLÉTICAS
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No século XIX, surge o Ecletismo, que pretende combinar, em um único trabalho, elementos de diferentes estilos históricos – revivalismo historicista. Para as construções de cunho religioso, houveram correntes que influenciaram a formação do ecletismo histórico: Neogótico, Neo-românico e Neobizantino. A Catedral da Sé, figura acima, ressalta elementos góticos que resultaram na conformação de uma Catedral com 111 metros de comprimento, 60 de largura e torres de até 92 metros de altura, sendo composta por um corpo com 5 naves – proporções atingidas em muitas igrejas góticas europeias dos séculos XII e XIII (figuras 18 e 19 – Catedral de Notre Dame). Suas proporções, uso de estrutura com arcos ogivais, arcobotantes, escultura entalhadas e vitrais remetem facilmente ao gótico antes visto.
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2.10. ARQUITETURA ECLESIÁSTICA NOS SÉCULOS XX E XXI Para entender o caminho que a arquitetura religiosa segue no final do século XIX e início do século XX, é preciso entender a arquitetura concebida pelo Arquiteto Antônio Gaudí em Barcelona. Esse entendimento se dá a partir da Igreja da Sagrada Família em Barcelona (figura 28). Pois, a partir da arquitetura eclética que Gaudí emprega na igreja, inicia-se uma conceituação quanto à importância da funcionalidade como quesito indispensável para a conformação da arquitetura religiosa, que não deveria ter base na arquitetura em sentido artístico, de forma que o culto recebesse sua real importância, bem como a relação do fiel com a divindade, contrariando os conceitos antes abordados de uma exposição superficial da arte (FRADE, 2007). Analisando o emprego exacerbado de ornamentos e uma estrutura carregada na Sagrada Família, percebe-se que, na forma em que foi empregada, o entalhamento e esculturas da via sacra em fachada (figura 27), por exemplo, se tornam inerentes à composição arquitetônica. Tudo acontece como uma tentativa do arquiteto de aproximar os fiéis da cena cristã. Foi claro pelos primeiros promotores do Modernismo, como Louis Sullivan, Frank Lloyd Wright e Otto Wagner, que qualquer aparência de elementos ou estilos históricos que não era de nosso tempo, deve ser rejeitado. Em primeiro lugar, essa
rejeição da tradição assumiu a forma de subtrair ou abstrair motivos tradicionais em edifícios. Mais tarde [...] a arquitetura modernista procurou acabar com a distinção entre chão e teto, interior e exterior, janela e parede, e sagrado e profano, em que a arquitetura se historiou historicamente. (STROIK, 1997, tradução nossa) O ideário modernista para expressão da arquitetura, em geral, estava assimilado na racionalização formal e simbólica. Acontecia um processo de estética redutivista, a qual interessaria o uso de novos materiais – aço, vidro e, principalmente, o concreto armado, aplicados de forma a atender as necessidades básicas de uma igreja. Neste momento, críticas foram feitas a algumas igrejas construídas, pois muitas desviaram-se da forma tradicional e da iconografia das igrejas (VINNITSKAYA, 2013). Desta maneira, a estética cristã, bem como seus símbolos, foram resumidos, assumindo características externas que não se ligavam ao símbolo religioso antes conhecido. A igreja acima é projeto do Arquiteto modernista Richard Meier. Nela é possível entender a nova estética aplicada, de modo que a função é exercida através da forma, mas esta última não apresenta claramente sua função. O século XX, destacando o modernismo, é marcado por uma ruptura drástica nos métodos determinados anteriormente para a arquitetura religiosa, de modo que
a simbologia antes exacerbada e explícita, se tornou enxuta e implícita. Ou seja, as escolhas arquitetônicas para uma igreja moderna baseiam-se no simbolismo agregado à própria arquitetura. Vinnitskaya (2013) diz que a iconografia é frequentemente mantida, mas é menos enfática em relação ao altar de uma igreja católica tradicional em Roma. 3.2. CATEDRAL METROPOLITANA NOSSA SENHORA APARECIDA - OSCAR NIEMEYER A Catedral Metropolitana de Brasília é o segundo estudo de caso que, apesar de estar em meados ao final do modernismo, apresenta técnica construtivas e simbologias que seriam relevantes para o estudo. Projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer, este é o primeiro monumento de Brasília que apresenta um enorme peso arquitetônico pelas técnicas utilizadas. Suas composições arquitetônicas apresentam fortes características simbólicas que são empregadas em efeitos arquitetônicos, em um jogo de forma e luz e sombra. Quanto às partes funcionais do interior da igreja, no térreo é onde se encontra a capela, num corpo principal de. Entendendo as partes que compõe a edificação e a localidade que está inserida, a Igreja sobre a Água não assume atividades frequentes, sendo o seu corpo eclesial reduzido. Conforme figura 33, a delimitação do local onde seria o presbitério (local onde se insere altar-mor e todos os outros elementos ritualísticos) se encontra Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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rebaixado, o que não é comum, pois sempre está elevado em relação ao local da assembleia. A ausência do altar-mor também é outra observação relevante para a igreja, possuindo apenas o ambão (local onde são feitas as leituras, antigo púlpito) que compõe a harmonia com os jarros de planta em forma de cone e as cadeiras projetadas pelo arquiteto. 3.2. CATEDRAL METROPOLITANA NOSSA SENHORA APARECIDA - OSCAR NIEMEYER A Catedral Metropolitana de Brasília é o segundo estudo de caso que, apesar de estar em meados ao final do modernismo, apresenta técnica construtivas e simbologias que seriam relevantes para o estudo.
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Projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer, este é o primeiro monumento de Brasília que apresenta um enorme peso arquitetônico pelas técnicas utilizadas. Suas composições arquitetônicas apresentam fortes características simbólicas que são empregadas em efeitos arquitetônicos, em um jogo de forma e luz e sombra. A experiência fenomenológica da Catedral é iniciada através do caminho único que leva o visitante do exterior para o interior da edificação. Ele é feito pela longa praça em concreto com a demarcação do caminho feita pelas estátuas dos evangelistas (Mateus, Marcos, Lucas e João – apóstolos que mais anunciaram a palavra de Jesus), elucidam o caminho para o anúncio. Logo após, todo o caminho até o subsolo é feito por um corredor Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
sem iluminação, suprido apenas pela iluminação natural, até chegar ao ápice da beleza que concerne a edificação: o corpo edificado com vitrais em cores vibrantes e pilares que encaminham a visão para a ponto mais alto, que ultrapassa a forma física, levando ao transcendente. A composição formal da edificação é o ponto chave para que ela receba destaque, o uso do concreto armado num formado não usual, quando considerado a obra como um todo, conforme pode ser visto na figura 35, passa a ideia de esbeltez, em conjunto com os tons de azul e branco dos vitrais que parece flutuar por cima do corpo principal da igreja. Os 16 elementos estruturais de seção parabólica [..] com 90 toneladas, escoram-se entre si e têm, ao rés do chão, um anel de tração que define um espaço de 70 m de diâmetro. Sustentam ao alto uma laje circular de cobertura plana de 16 m e são interligados por um anel de compressão embutido nos próprios elementos estruturais. (SEGRE; BARKI, 2012) Os pilares de concreto armado fazem a composição da parte externa da catedral, de modo que esta também compõe a cobertura. Conforme figura 35, é possível compreender que as atividades de culto (assembleia, presbitério, secretaria, sacristia etc) estão abaixo do nível do solo e todos os pilares com vitrais se encontram acima deste nível.
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Fig 22 - Cenas da Via Sacra em uma das fachadas da Sagrada Família | Fonte: http://milhasapercorrer.blogspot.com.br/2011/12/basilica-da-sagrada-familia-ou-falling.html
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Apesar dos dois exemplos possuírem programas de necessidades diferentes, sendo a igreja de Tadao mais simplificada, por conformar o espaço de uma capela, ou pela catedral por possuir uma escala maior, agregando maior número de atividades, ao realizar uma análise comparativa entre os estudos de caso, é possível estabelecer elementos comparativos semelhantes entre as duas em seus aspectos fenomenológicos. Como citado acima, ambas possuem percurso ritualístico conformado por uma separação clara entre o mundo profano e o divino, tendo na transição entre os dois um percurso por escada, na Igreja sobre a Água e por uma rampa na Catedral Metropolitana, da mesma forma que a finalização visual estará sobre imensa luz que emoldura a cruz. 4. CONCLUSÃO
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Fig 23 - Cenas da Via Sacra em uma das fachadas da Sagrada Famíliada-familia-ou-falling.html |
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Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos Fig 27 - Caminho ritualístico | Fonte: https://www.archdaily.com/97455/ad-classics-churchon-the-water-tadao-ando | Intervenções de figura: Gabriella Assis Sales
Fig 25 - Interior da Capela da Santa Cruz, Arizona – EUA. | Fonte: https://www.archdaily. com/131125/ad-classics-chapel-of-the-holy-cross-richard-hein
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Fig 26 - ICapela da Santa Cruz, Arizona – EUA. | Fonte: https://www.archdaily. com/131125/ad-classics-chapel-of-the-holy-cross-richard-hein
Fig 24 - Igreja de 2000, Itália. Fonte: https://www.archdaily.com/20105/church-of-2000richard-meier. Richard Meier. 2000
Fig 28 - Vista interna da Igreja.| Fonte: https://www.flickr.com/photos/ellens_album/sets/72157594233789919/
Fig 29 - Acesso principal da edificação | Fonte: http://au17.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/226/artigo275969-2.aspx
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Fig 30 - Interior da Catedral Metropolitana de Brasília | Fonte:http://au17.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/226/artigo275969-2.aspx
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Diante da linhagem histórica acima representada, é necessário destacar que as diversas características adotadas pelo cristianismo durante todos esses séculos para o culto a divindade estiveram relacionadas com a busca ao transcendente. No entanto as percepções de cada período foram diferentes, de acordo com sua lógica contemplativa, de modo que o espaço do templo sempre foi conformado para morada de Deus. Os gregos iniciaram esse processo em seu sentido literal, construindo o templo apenas como um local de morada e culto, mas os romanos iniciam esse processo de conformação de espaço religioso que perpetua até os dias de hoje: espaço destinado a sociedade, com a configuração de espaço litúrgico – a distribuição do espaço interno romano foi a base os diversos outros períodos posteriores (figura 11). No século IV as igrejas iniciam um processo de afirmação do cristianismo, também associado a estabilidade do império, representadas pela escala dimensional. Neste momento, a proporções de largura e altura representam a importância cristã (figura 15). A partir das igrejas bizantinas, assumi-se as fachadas múltiplas e a planta centralizada, colocando o altar – símbolo maior do cristianismo – ao centro. A configuração radial bizantina foi base para que as igrejas românicas implantassem a planta em cruz latina, o que seria um prolongamento dos braços da cruz grega bizantina. Retirando o altar do centro e colocando em uma das extremidades, associou os braços laterais a capelas.
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O gótico, bem como o barroco, são períodos que apresentam características marcantes quanto ao reconhecimento da arquitetura religiosa. As igrejas góticas empregam técnicas construtivas que verticalizam o espaço interno, ganhando maior pé direito e aberturas que recebem vitrais. Seu conceito baseia na percepção do homem como ser pequeno diante da imensidão de Deus e o caminho feito até Ele é através da luz. Da mesma forma, a igreja barroca, emprega em sua arquitetura detalhes relevantes para atrair o fiel através do vislumbre dos altares carregados de ouro e ornamentação, como tentativa de reassumir o poder da igreja católica após os fortes atacas da Reforma Protestante. Por fim, acontecendo de forma simultânea no início do século XX, o modernismo e o Movimento Litúrgico resultam em modificações significativas, tanto do âmbito arquitetônico, através da afirmação de uma arquitetura mais contemplativa, o qual apresentou a subtração de muitos símbolos religiosos para que o espaço aparecesse de forma mais simplista; e a busca por ritos mais fáceis de serem compreendidos, a fim de causar maior proximidade do fiel com a igreja e seu ritual. Neste período, há muitas críticas quanto ao simplismo empregado pelos modernistas, podendo ter resultado em uma arquitetura fria por conta do excesso de simplicidade. Algumas dessas questões estão presentes até os dias atuais, porém, o que se percebe atualmente é uma busca maior por texturas e ornamentos que vão além do
concreto armado. A estética modernista permeou a conquista de Corbusier na arquitetura religiosa e parece que os arquitetos contemporâneos seguiram esses passos, rompendo a tradição para criar uma experiência religiosa baseada na meditação e na contemplação, independentemente do credo. (VINNITSKAYA, 2013, tradução nossa)3 Diante deste estudo que percorreu todo o contexto histórico dos elementos compositivos da arquitetura cristã, pontuando os aspectos simbólicos de destaque, conclui-se que o fiel reconhece sua fé a partir de sinais, sendo estes empregados de modos diferentes, com destaques diferentes ao longo dos períodos, mas é universal a necessidade de reconhecer o motivo da fé através do único elemento imutável: a cruz, pois através dela o cristão reconhece o sacrifício da ressureição de Cristo.
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3 e modernist aesthetic permeated Corbusier’s take on religious architecture and it seems that contemporary architects have followed in these footsteps, breaking from tradition to create a religious experience based on meditation and contemplation regardless of creed. Revista CAU/UCB | 2018 | Artigos
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Obras de arte operam com conceitos, mas transcendem esses conceitos. A mensagem artística é indizível pela linguagem comum e só se manifesta no objeto artístico, sendo que a impossibilidade de descrição do belo resulta na sua autonomia, e que a sua manifestação enquanto “obra de arte” é a única maneira dela exprimir o que exprime. O crítico e teórico da literatura e da arte, Jan Mukaovský (1891-1975), coloca a estética no campo da função e acredita que, dentre as diversas funções da arquitetura na esfera da arte, a estética predomina sobre as outras. Cita como exemplo o arquiteto Van de Velde, que “(...) fala da 1 Immanuael Kant. Crítica da Faculdade do Juízo, 2002, pg.56.
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Carolina da R. L. | Prof. CAU/UCB
(Karl Philipp Moritz apud SABINO, pag. 57)
Se o belo é o que sem conceito agrada1 , este necessariamente não poderia ter uma função, ser interessado. No entanto, certos objetos podem ser utilitários e belos ao mesmo tempo, embora não possamos dizer que o belo só exista na medida em que for útil. A arte poderia ter uma “função”, mas não poderia estar a ela subordinada, ou seja, o belo deve sobrepor o utilitário.
SOBRE O BELO E O UTILITÁRIO
Não podemos reconhecer o belo em geral de nenhum outro modo a não ser se o contrapomos ao útil, e o diferenciamos dele tão rigorosamente quanto possível. Uma coisa não se torna bela porque não é útil, mas porque ela não precisa ser útil.
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beleza da máquina como objeto extremamente útil ou da beleza da linha dinâmica”. [...]2.
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Karl Philipp Moritz faz uma distinção entre o belo e o utilitário do ponto de vista da relação com o sujeito, mas também indica uma função para o belo, que é de elevação do homem para um nível de “eliminação da sua subjetividade”, tornando-o, nesse sentido, um ser virtuoso. Tal distinção não é pensada do ponto de vista do prazer, pois ambas as dimensões são capazes de causar prazer, ou seja, é impossível que um objeto inútil dê prazer a um ser racional. Sensações prazerosas surgem, seja em presença de objetos úteis, seja na frente de objetos belos. Ao mesmo tempo, não desconsidera a função dos objetos belos, mas eles não foram feitos e pensados para serem úteis. Segundo ele, a subordinação do belo ao útil, transformaria a arte em ornamento3 . Sem prejuízo de sua beleza, (o objeto) pode também ser útil, ainda que não exista para ser útil; assim também o útil pode, sem prejuízo de sua utilidade, ser belo em certa gradação, ainda que exista apenas para ser útil. (Karl Philipp Moritz apud SABINO, pag. 58) 2 Jan Mukaovský. Escritos sobre Estética e Semiótica, 1997, pg 160. 3 Publicado na revista Monats-Schrift der Akademie der Künste und mechanischen Wissenschaften zu Berlin, ano II, vol. 3, fevereiro de 1789, p. 74-77. Republicado nos livros Launen und Phantasien von Carl Philipp Moritz, org. Carl Friedrich Klischnig (1796) e no Erinnerungen aus den zehn letzten Lebensjahren meines Freundes Anton Reiser. Als ein Beitrag zur Lebensgeschichte des Herrn Hofrath Moritz, de Karl Revista CAU/UCB | 2018 | Explicando
Moritz justifica que uma coisa não seria bela somente porque nos dá prazer, pois nesse caso, todo o objeto útil seria também belo; mas aquilo que nos dá prazer, sem ser propriamente útil, é o que chamaremos belo (apud Todorov, pag.164). A utilidade necessária em objetos belos está voltada ao prazer da fruição e no modo com que este eleva o ser humano para uma certa transcendência, pois a subjetividade própria do homem é momentaneamente esquecida. No (objeto) meramente útil, [...] eu me ponho no centro [...], isto é, considero o objeto apenas como meio – contanto que minha perfeição seja desse modo promovida – do qual eu mesmo sou o fim. O objeto meramente útil, portanto, não é em si mesmo nem um todo nem algo perfeito e acabado, mas somente se torna um quando alcança o seu fim ou se completa em mim. Na contemplação do belo, porém, eu coloco de volta no próprio objeto o fim que estava em mim: eu não o considero como algo completo em mim, mas nele mesmo, formando, portanto, um todo em si, e proporcionando-me prazer em razão de si mesmo, e por isso o objeto belo se refere menos a mim do que eu a ele. (Karl Philipp Moritz apud SABINO)
características essenciais e constitutivas, mas depende do modo com que o sujeito irá utilizá-lo, o belo é o que não tem nenhuma justificação externa ao objeto. Uma coisa é bela na medida em que é intransitiva. A existência do belo consiste na sua própria realização, e a finalidade da sua existência se encontra nele mesmo. Nesse raciocínio, a obra de arte é superior ao homem e até ao artista, pois o homem na sua “incompletude” só se aproximará de uma “perfeição” na medida em que se relacionar com objetos que contenham qualidades ou características que ele não tem. A arte deve comunicar com o observador (receptor) de forma que este a recrie, a reconstrua, a partir de suas vivências. A obra de arte tem um poder de fazer com que o observador se reconheça na obra e se transforme. A contemplação da obra implica em um esquecer-nos de nós mesmos, como se o deslumbramento e o bem estar gerado pelo belo fizesse com que o sujeito se dissolvesse no prazer puro desinteressado:
Enquanto o útil encontra a sua finalidade fora do objeto na medida em que a qualidade de utilidade não faz parte das suas
Enquanto o belo atrai totalmente nossa contemplação, ele a faz desviar um instante de nós mesmos e parecer que nos perdemos no objeto belo; e esse perder-se, esse esquecimento de nós mesmos, é o grau mais alto de prazer puro e desinteressado que o belo nos proporciona.4 (Karl Philipp Moritz apud SABINO)
Friedrich Klischnig, (1794). Tradução de José Feres Sabino, in: SABINO, J. F. Ensaios de Karl Philipp Moritz: linguagem, arte, filosofia. 2009.
4 MORITZ, K. P. Ensaio para unificar todas as belas artes e belas letras sob o conceito do perfeito e acabado em si. Tradução de José Feres Sabino, in: SABINO, J. F. Ensaios de Karl Philipp Moritz: linguagem,
Uma obra da arte está ligada a uma perfeição e se torna completa em si mesma pelo fato da coisa exprimir no interior de si mesma seu próprio fim. Por isso, o objeto belo distingue-se daquele útil. E para que se alcance a beleza, todas as partes constituintes devem ter tal integração a ponto de se parecerem unitárias e as suas posições devem ser “necessárias” para a composição, ou seja, “todo singular se apresenta primeiramente em sua necessária relação ao todo, e somente por meio do qual se torna claro que na obra de arte não há nada de supérfluo, nem nada que falte”5. Tal necessidade diz respeito à constituição da forma, pensando de um ponto de vista estritamente racional. Quanto mais necessárias são todas as partes singulares de uma obra de arte e suas posições umas em relações às outras, mais bela é a obra; quanto menos necessárias elas forem, podendo as partes ser colocadas e retiradas sem prejudicar o todo, pior e mais medíocre é a obra.6 (Karl Philipp Moritz apud SABINO) arte, filosofia. 2009. 145p. Dissertação (Mestrado em Filosofia). FFLCH, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2009, p. 108. 5 MORITZ, K. P. Ensaio para unificar todas as belas artes e belas letras sob o conceito do perfeito e acabado em si. Tradução de José Feres Sabino, in: SABINO, J. F. Ensaios de Karl Philipp Moritz: linguagem, arte, filosofia. 2009. Dissertação (Mestrado em Filosofia). FFLCH, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2009. 6 Publicado na revista Monats-Schrift der Akademie der Künste und mechanischen Wissenschaften zu Berlin, ano II, vol. 3, fevereiro de 1789, p. 74-77. Republicado nos livros Launen und Phantasien von Revista CAU/UCB | 2018 | Explicando
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[...] A figura, se é bela, não deve significar nem falar nada que esteja fora dela, mas deve como que falar apenas de si mesma, de sua essência interna por meio de sua superfície externa, e deve significar por si mesma. Por isso, no que se refere à bela arte, meras figuras alegóricas distraem a atenção e a afastam do principal. Se uma bela figura pode ainda indicar e significar algo além de si mesma, ela se aproxima desse modo do mero símbolo, para o qual a verdadeira beleza não é relevante (...). A obra de arte então não mais possui seu fim apenas em si, mas o encontra fora de si. O verdadeiro belo consiste, porém, em que uma coisa signifique apenas a si mesma, designe a si mesma, abarque a si mesma, seja um todo completo em si. (Karl Philipp Moritz apud SABINO, pag. 68) Se considerarmos um objeto do ponto de vista da utilidade e do ponto de vista da beleza, devemos levar em conta que ambos pressupõem uma relação que, no primeiro caso, é entre o objeto e aquele que o utiliza, e, no segundo, entre a obra e aquele que a contempla. O objeto útil se completa somente quando alcança o seu fim, que irá acontecer na relação com o sujeito. Carl Philipp Moritz, org. Carl Friedrich Klischnig (1796) e no Erinnerungen aus den zehn letzten Lebensjahren meines Freundes Anton Reiser. Als ein Beitrag zur Lebensgeschichte des Herrn Hofrath Moritz, de Karl Friedrich Klischnig, (1794). Tradução de José Feres Sabino, in: SABINO, J. F. Ensaios de Karl Philipp Moritz: linguagem, arte, filosofia. 2009. Revista CAU/UCB | 2018 | Explicando
Em relação ao belo, o sujeito é atraído em direção ao objeto para contemplá-lo. Agora o sujeito é secundário e o objeto está em lugar privilegiado na relação, o que faz com que o ultimo passe a ser considerado “como algo perfeito e acabado em si mesmo”. O belo constitui, portanto, um todo em si, que existe em função de si mesmo, em função de sua própria “perfeição” interna. A relação estabelecida entre o sujeito e o objeto útil é interessada porque é centrada no interesse daquele que utiliza algo. Já a relação entre o sujeito contemplativo e o objeto belo seria uma ação desinteressada, porque descentraria, segundo Moritz, o homem de seu ego. Em objetos belos, podemos dizer que a contemplação não os fazem “esgotar”, ao contrário, quanto mais são contemplados, mais são celebrados e mais serão preservados. Também podemos pensar que uma obra de arte pode gerar união entre as pessoas, como exemplo temos concertos musicais ou peças de teatro, que são executados para um grande público que se emociona numa espécie de “catarse”, acentuando a experiência de vivenciar a obra. Sentimentos como o amor e amizade também têm esse caráter de se auto sustentarem e se potencializarem na medida em que são, digamos, “compartilhados”. No entanto, mesmo que tal obra se encontre “acabada em si mesma”, onde “nada pode ser acrescentado ou retirado sem que não seja para piorar (Leon Batista Alberti), não é suficiente para tornar um
objeto belo, ou uma obra de arte. Moritz defende que a imaginação e a fantasia são elementos que fazem com que o sujeito saia do seu “eu” e conheça outras dimensões “não corpóreas”. O belo deve transcender a matéria num caminho de “sublimação”.
se volta novamente para si próprio. A beleza, nesse sentido, também tem uma função, que é a de promover ao sujeito um reconhecimento da sua individualidade.
[...] uma coisa para não ter de ser útil deve ser necessariamente um todo constituído em si mesmo, e que, portanto, o conceito de um todo constituído em si mesmo está vinculado inseparavelmente ao conceito de belo. Mas que esse conceito, sem dúvida ainda não é suficiente para alcançar o conceito de belo, vemos isso, por exemplo, no conceito de Estado, que embora seja um todo constituído em si mesmo, contudo não poderia estar vinculado ao conceito de belo, porque o conceito de Estado, em toda sua extensão, não toca nossos sentidos externos nem é abarcado pela imaginação, mas somente pode ser pensado por nosso entendimento. (Karl Philipp Moritz apud SABINO, pag. 55)
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O prazer gerado pelo útil – algo que compartilhamos com os animais – acontece na medida em que se supre uma necessidade prática do homem. No caso do objeto belo, este necessita do homem para que seja celebrado e reconhecido. No momento em que o homem contempla e estabelece um diálogo com a obra, se descentra do seu ego pelo deslumbramento, mas num segundo momento, a obra se torna um veículo para que este se reconheça na sua subjetividade. Daí a atenção Revista CAU/UCB | 2018 | Explicando
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Constatamos hoje que as cidades são pouco vivenciadas por seus habitantes. Acreditamos que a atividade de desenhar o espaço urbano e “no espaço urbano” em diferentes visadas e perspectivas pode
Beatriz Melo, Carla Freitas, Daniel Brito e Tatiana Chaer | Prof. CAU/UCB
Saber ler e interpretar graficamente o espaço construído à nossa volta possibilita intervenções mais conscientes. Cria-se a intimidade entre os habitantes e a cidade, aumentando a estima e o desejo de preservação a partir da afetividade com o lugar e não apenas de um olhar técnico-operativo.
DESENHANDO A CIDADE, CONSTRUINDO CIDADANIA
O grupo de desenhistas urbanos da UCB foi criado no ano de 2015 com o apoio da direção do curso de Arquitetura e Urbanismo, reunindo professores e alunos em torno de uma atividade lúdica extraclasse. Inspirado pelo movimento internacional “Urban Sketchers” , tem como principal objetivo apreciar e registrar in loco as cidades através de desenhos, no lugar dos dispositivos fotográficos. O objetivo do grupo é desenvolver e ampliar a apreensão do espaço urbano, pois consideramos que esta é uma habilidade importante para o exercício de projeto em arquitetura e urbanismo.
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estimular o olhar e a reflexão sobre os rumos que queremos para nossas cidades. Uma discussão urbanística tão urgente! O movimento internacional de desenho do espaço urbano, o “Urban Skechers”, surge num momento importante de crise e colapso dos nossos espaços urbanos e tem o grande mérito de trazer estas questões de uma forma lúdica e suave. Precisamos que as cidades de fato sejam para pessoas, como afirma Gehl (2013). E que estas pessoas possam usufruir das cidades, seja como for, morador ou viajante.
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Lynch (1997) afirma que a paisagem urbana tem inúmeras funções. Dentre elas, algo a ser rememorado e a possibilidade de proporcionar o prazer lúdico aos seus habitantes. As atividades desenvolvidas pelos participantes do movimento “Urban Sketchers” contemplam estas funções. E vão mais além: proporcionam o encontro de diversas pessoas em torno deste prazer comum, o desenho, que é a interpretação gráfica pessoal de cada um. Os encontros do “Urban Sketchers” são, portanto, momentos de troca e de confraternização. A capital federal conta com um grupo ativo deste movimento internacional, mas ali a participação é restrita “a quem já sabe desenhar” - não por que isto seja um pré-requisito para estar no grupo, que é livre e aberto a todos, mas porque muitos que gostariam de participar se sente incapazes. Percebemos, então, que em Brasília a atividade de desenhos urbanos, ou desenhos de rua, ainda precisaria de uma Revista CAU/UCB | 2018 | Acontece no CAU
alavancada grande, porque não temos uma cultura de desenho estabelecida, apesar de sermos uma cidade patrimônio da humanidade. Natural! A cidade, que é jovem, precisa crescer em diversos aspectos para potencializar os seus talentos. Existem estudantes de arquitetura que gostariam de participar do USK Brasília, mas que muitas vezes desanimavam: “ah, eu não sei desenhar o suficiente para ir, vou passar vergonha”, ou coisas do tipo; “ah, mas meu desenho é feio”... Essa foi uma grande dificuldade inicial, no entanto, havia o desejo de desenhar e o espírito de contribuir para a prática de desenhos urbanos na cidade. Decidimos então fundar este grupo universitário de uma maneira despretensiosa, porém comprometida com a tarefa de desenvolver a habilidade gráfica de jovens. O intuito é que eles se sintam livres e possam participar mais ativamente dos encontros de “urbans sketchers” pelo mundo afora, e não apenas em sua cidade. Elaboramos atividades inspiradas nos USK’s convocando os alunos a participarem. A resposta tem sido, desde então, muito positiva e eles estão cada vez mais motivados e confiantes nas próprias capacidades. Isso vem se refletindo, inclusive, nas disciplinas de projeto urbano. Não podemos deixar de citar que tivemos uma ajuda inesperada na motivação destes jovens: a participação do professor Edson Muniz, de Santos, SP. O professor Edson, muito experiente, participou dos encontros e compartilhou suas técnicas de desenho, o que empolgou mais ainda
os alunos. Mais tarde, o professor Daniel Brito passou a integrar a coordenação do evento, além da professora Tatiana Chaer, que juntou-se ao grupo, trazendo seu olhar de urbanista.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
A experiência, desde o início, tem sido fantástica, e sempre saímos transbordados de felicidade com os desenhos realizados, transformados em pequenas relíquias da nossa cidade em cadernos de desenhos. Ao passar as tardes em companhia dos colegas e ao vivenciar a cidade e o que ela pode nos oferecer como espaço de convivência e contemplação, saímos todos, alunos e professores, satisfeitos com os pequenos e grandes progressos,
LYNCH, KEVIN. A imagem da cidade. Tradução Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
GEHL, JAN. Cidade para Pessoas. Tradução Anita Di Marco. 2ed. São Paulo: Perspectiva, 2013.
O que esperamos com esta iniciativa é contribuir para a formação de pessoas mais conectadas com suas cidades, capazes de ver e compartilhar suas visões sensíveis dos lugares que habitam ou por onde passam. Enfim, esperamos contribuir para que as pessoas se tornem verdadeiros cidadãos e habitantes que amam e respeitam as suas cidades! Esperamos ir em frente e contribuir mais, (trans)formando mais que arquitetos urbanistas, (trans)formando cidadãos.
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CAPACIDADE DO PÁTIO:
Terminal de Passageiros do Aeroporto de Barreiras - BA
Cinco aeronaves ATR-72 ou três aeronaves ATR-72 e dois AIRBUS
ÁREA ÚTIL:
A319
7.501,36 m²
CAPACIDADE OPERACIONAL NO HORÁRIO DE PICO:
NÍVEL OPERACIONAL:
500 passageiros, levando em consideração nível de conforto Alto de
Regional
acordo com o método de dimensionamento de TPS Medeiros 2014
DIPLOMAÇÃO UCB
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ALUNO: Laís Dourado Giaretton | ORIENTADOR: Milena C.S. de Lannoy
NOME:
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INTRODUÇÃO
JUSTIFICATIVA
DIAGNÓSTICO
CONCEITO
PARTIDO ARQUITETÔNICO
PROJETO
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TPS BARREIRAS
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INTRODUÇÃO
JUSTIFICATIVA
DIAGNÓSTICO
CONCEITO
PARTIDO ARQUITETÔNICO
PROJETO
Veneziana fixa horizontal Detalhe grelha metálica
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Nebulizadores
Grelha metálica
esquemático bioclimático 8 Corte Sem escala
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TPS BARREIRAS
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ARBORIZAÇÃO
USO MISTO
RETIRADA DO MURO DO COMPLEXO
AUMENTO DE GABARITO
CICLOVIAS
SINALIZAÇÃO
ESTRUTURAS TEMPORÁRIAS ILUMINAÇÃO COMIDA DE RUA
ILUMINAÇÃO E PROJEÇÃO
BANHEIRO PÚBLICO
REDUÇÃO NÚMERO DE VAGAS
TRAVESSIA SEGURA
MOBILIÁRIO AMPLIAÇÃO DE CALÇADA
BARES/CAFÉS
SERVIÇOS DIGITAIS TRAFFIC CALMING
RUA SÓ PARA PEDESTRES
PORCKET PARK
O CENTRO DE TAGUATINGA PARA PESSOAS Este trabalho tem como objetivo propor estratégias para tornar o centro de Taguatinga mais humano. São intervenções por meio de novas abordagens de transformação dos espaços, chamadas aqui de práticas urbanas criativas. O urbanismo tático possui grande potencialidade de êxito para o centro, visto que essas intervenções estão relacionadas com questões que hoje veem sendo defendidas ativamente pelas pessoas. A intenção é apropriar do espaço coletivo a fim de interferir e dar qualidade as dinâmicas, fluxos e até produtividade urbana, podendo contribuir também em reverter os processos de esvaziamentos e ausência de vida nos espaços públicos nos diversos períodos do dia. A proposta será direcionada ao espaços públicos do centro de Taguatinga. O centro é o local mais dinâmicos da cidade, os diferentes tipos de fluxos que ali permitem as mais diferentes trocas. Porém o fato do centro se tornar uma área com grande predominância comercial, faz com que pouco se aproveite de sua infraestrutura em horários não comerciais, pela ausência de pessoas circulando nesses períodos. Dessa maneira a proposta vem como alternativa para que o centro possa ter vida urbana e que as mais diversas atividades. Foi feito um diagnóstico de percepção ambiental em alguns trechos do Centro utilizando metodologias já existentes e utilizadas em microplanejamento.
ESTRATÉGIA TAGUATINGA
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CAMINHABILIDADE Diminuir o espaço para o carro; Valorização do pedestre; Redesenho e redimensionamento das calçadas do centro; Incentivar trajetos a pé e transporte ativo.
TAGUATINGA CENTRO
As análises mostraram que o centro de Taguatinga é um espaço mal dimensionado, com problemas de qualidade do espaço no que se refere a acessibilidade, conforto e sociabilidade. O espaço carece de calçada, possui muito espaço destinado ao carro e pouco espaço para pedestre, o fluxo de veículos é confuso, poucos espaços de permanência e dentre outros problemas já descritos nas análises. Dessa forma, decidiu-se propor estratégias para que o Centro de Taguatinga possa se tornar mais humano, principalmente com a intenção de aumentar a quantidade de espaço para pedestres, proporcionando às ruas mais um caráter de lugar, ao invés de apenas espaço de passagem.
ESTRATÉGIA
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ESPAÇO PÚBLICO COMO LUGAR DE ENCONTRO Melhorar as condições de permanência em espaços públicos Propôr ações comerciais – como comida de rua e feiras Criar espaços que acolhem e incentivam manifestações culturais e artísticas.
ESTRATÉGIA
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CENTRO 24HORAS Diminuir o espaço para o carro Valorização do pedestre Redesenho e redimensionamento das calçadas do centro Incentivar trajetos a pé e transporte ativo
DIPLOMAÇÃO UCB
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ALUNO: Denys Mendes | ORIENTADOR: Tatiana Chaer
EVENTOS CULTURAIS
VIDA NOTURNA
O CENTRO PARA PESSOAS | Estratégias para tornar o Centro de Taguatinga mais humano Projeto de Diplomação do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Católica de Brasília - 2º semestre de 2017
RevistaCAU/UCB|2017|AcontecenoCAU Aluno: Denys Willian da Costa Mendes | Orientadora: Tatiana Chaer
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