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Maria Lúcia Simões
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Maria Lúcia Simões
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Belo Horizonte – Março de 2021 – 3ª edição
Copyright © 2021 by Maria Lúcia Pio Simões Silva Araújo Editor: Rafael Borges de Andrade Supervisão editorial: Maria Zoé Rios Fonseca Projeto gráfico: Mário Vinícius Silva Assistente editorial: Olívia Almeida Revisão: Olívia Almeida
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD S593c
Simões, Maria Lúcia Contos contidos / Maria Lúcia Simões. - 3. ed. - Belo Horizonte : Baobá, 2021. 92 p. : il. ; 13,5cm x 20,5cm. ISBN: 978-65-88968-01-7 1. Literatura brasileira. 2. Contos. 3. Sentimentos. 4. Reminiscências. 5. Prosa poética. I. Título. CDD 869.8992301 CDU 821.134.3(81)-34
2021-672
Elaborado por Vagner Rodolfo da Silva - CRB-8/9410 Índice para catálogo sistemático: 1. Literatura brasileira : Contos 869.8992301 2. Literatura brasileira : Contos 821.134.3(81)-34
3ª edição Proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem o consentimento por escrito da editora. Todos os direitos reservados à: Editora Baobá Ltda. Rua Helium, 115, 3º andar, Nova Floresta – Belo Horizonte/MG CEP: 31140-280 Telefone: (31) 3653-5217 editorabaoba@editorabaoba.com.br Impresso no Brasil Printed in Brazil
Para Geraldo Vidigal Silva Araújo
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São minicontos e magnipoemas. Densidade, emoção, tensão, beleza. São de provocar inveja e bênção.
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Antônio Houaïss
A meus pais
A meus filhos
A meus irmãos
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Sumário
11 Claridade 12 O colar 13 O saxofone 14 Noturno 15 A mordida 16 Lunática 17 A mulher fria 18 O aquário 19 O porão 20 Destino 21 A compra 22 Marketing 23 Narciso 24 Brilhantemente exposta 25 Um certo lucro... 26 Atavismo 27 Caminho novo 28 Marinha 29 Descuido 30 Anjo 31 O jogo
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32 Surpresa
54 Mãe
33 A noiva
55 Círculo
34 Estratégia
56 Carrossel
35 Febre
57 Sem limite
36 Sortilégio
58 Disfarces
37 O encontro
59 Nunca se sabe...
38 O chicote
60 Pausa definitiva
39 O frasco
61 O prisioneiro
40 Aquele tão verde olhar
62 O impossível canteiro
41 A caixa
64 Poética
42 Falsa prisão
65 Musical
44 O salto
66 Por causa de um gosto
45 Transformação
67 Devoção
46 Escrita a lápis
68 Desencontro
47 Purificação
69 Biblioteca
48 O defeito
70 Conceito
49 O recurso
71 O relógio
50 História gustativa
72 A montanha
51 O prazer adiado
73 Ascensão
52 A hóspede 53 A planta
79 Paratexto
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Claridade
A mulher chegou para o marido com o rosto completamente iluminado e ele se irritou porque há muito se esquecera como e onde se acendia essa luz. E por mais que se esforçasse não conseguiu se lembrar. A mulher iluminada foi se deitar ao seu lado e ele passou a noite sem dormir porque se acostumara ao escuro.
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O colar
Reuniu todos os brilhantes momentos que juntos passaram e debruçada na janela puxou o fio de uma nuvem que se esgarçava tecendo um belíssimo colar que tão logo ficou pronto se desprendeu de suas mãos e caiu. As contas espalharam-se pela paisagem noturna e ficaram por algum tempo ainda cintilando em forma de pequenas luzes.
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O saxofone
Marcos tinha dezessete anos e tocava saxofone. Enquanto tocava brotou do instrumento uma enorme flor amarela que atravessando rapidamente a sala estendendo-se em ramos e folhas verdes atingiu em cheio os quinze anos e as finas paredes do peito de Luíza criando em seu coração uma raiz, que, embora não tendo sido cuidada, ficou ali plantada durante muitos anos e só morreu quando morreu Luíza.
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Noturno
O violino, com o fino anzol da música, fisgou a lua no fundo do rio, e a manteve suspensa por alguns compassos. Na primeira pausa, a lua, sobre a água, derramou-se em prata.
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A mordida
Presa por grossa corrente levou ao domador sua maior tristeza que, domesticada, deitou-se dócil e mansa, sem nem ao menos rosnar, durante cinquenta minutos, chegando a lamber-lhe as mãos quando se retirou. Afastando-se do picadeiro, longe do chicote do domador, a mesma tristeza revoltou-se contra seu dono e mordendo-o ferozmente provocou-lhe a mais funda ferida.
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Lunática
Tinha fases como a lua, da qual sofria grande influência. Em certas épocas minguava e se notava sua lunar presença. Lentamente ia se clareando e nova, adquiria luz aos poucos até que crescendo a cada dia visivelmente, terminava por brilhar inteira. Um dia, subitamente eclipsada, desapareceu.
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A mulher fria
Era uma mulher fria. Em pleno calor do mais tórrido verão mantinha-se pálida, os lábios sem cor, as mãos geladas. Gostava de sorvetes e vestia-se de branco. Na cama uma noite o marido a tocou e na rigidez do seu corpo reconheceu a dureza da estátua em que ela, aos poucos, sem que percebesse, se cristalizara.
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O aquário
Contava tudo que se passava em sua vida. O cotidiano era gravado e filmado e os amigos o assistiam muito interessados. Não satisfeita, e querendo se tornar cada vez mais atraente, trocou as paredes de sua casa por transparentes vidros, e uma noite, percebendo-se fixamente observada, verificou que em lugar dos braços brotaram-lhe nadadeiras e escamas vermelhas cobriam-lhe o corpo que se movimentava ágil entre plantas aquáticas.
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O porão
A mulher acreditava tanto que a pessoa é sua própria casa que, pensando em se reformar, traçou uma planta com as medidas rigorosamente dentro do esquadro e pintou portas, paredes e janelas. Plantou flores e passarinhos esvoaçaram em seus olhos. Por eles avistava-se o brilho dos lustres de cristal acesos mas, mesmo assim, muitas vezes, embora as cortinas estivessem no lugar e se ouvisse música, percebia-se que a casa estava vazia e que ela discretamente se retirara para o porão onde, entre baús e teias de aranha, folheava velho álbum de fotografias e relia antigas cartas de amor.
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Destino
Seu nome era um pleonasmo. Chamava-se Dulce. Tinha cabelos e olhos cor de mel. Numa belíssima manhã de abril acordou com o zumbido de muitas abelhas que se enredaram pelos dourados fios de cabelos e traçaram com eles as primeiras casas de uma colmeia. Mais tarde enriqueceu vendendo o produto engarrafado e rotulado. E na porta de sua casa grandes filas se formaram comprando sua doçura já agora inteiramente industrializada.
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A compra
Desejava o dinheiro com avidez. Trocava por ele todos os demais valores. E acumulando riquezas, um dia percebendo-se em condições de adquirir objetos caros e preciosos, verificou surpreendida que acabara de obter de volta, por altíssimo preço, o próprio coração, vendido por ela anos atrás ao judeu de um bric, e exposto agora, vivo e pulsante, em vitrine de famoso antiquário, entre porcelanas de Sèvres e candelabros de prata.
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Marketing
Desde menina gostava de se promover. Antes de andar já ensaiava graciosos passos de dança. Crescendo, aceitou com alegria o título de rainha do clube, e depois, de oradora da turma. Com raro entusiasmo falava de si própria em alto tom de voz, enaltecendo as inúmeras qualidades. Gostava de cores berrantes, vestidos exóticos, joias vistosas. Uma noite, usando o último recurso, luminosa, anunciou-se em néon.
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Narciso
Era tão vaidoso e tanto se admirava que não contente em se chamar Eugênio forrou as paredes de sua casa com espelhos que virados uns para os outros se refletiam indefinidamente até que a imagem desgastada sozinha se estilhaçou e, sem poder se perceber, esqueceu o próprio rosto, perdidos o nome e a identidade.
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Brilhantemente exposta
Era uma mulher tão convencida do seu papel de mulher-objeto que pediu ao marido uma faxineira semanal que lhe daria brilho às unhas das mãos e dos pés, enceraria sua pele e varreria seus longos cabelos do pó acumulado. E assim tão bem cuidada trancou-se na vitrine do armário da sala de jantar e deixou-se admirar pelas visitas o resto de sua vida.
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Um certo lucro...
Quando adolescente, com loucura e entre suspiros, colecionava retratos de seu ator preferido formando completíssimo álbum reunindo, além das fotografias, muitos desejos jamais confessados. Anos mais tarde vendido o álbum a estudioso do assunto rendeu-lhe relativo lucro, concluindo que, algumas vezes, podem-se tirar dos sonhos resultados práticos ligeiramente satisfatórios.
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Atavismo
Por ser neta e bisneta de comerciante nasceu com a mania da troca. No início, trocou o choro pela mamadeira e o riso por bonecas de louça. Enquanto crescia e trocava, ofereceu o abraço pelo convite à dança e o beijo pela aliança de noivado. O corpo jovem e belo trocou por um casamento vantajoso até que, amadurecida e sem atrativos, nada mais lhe restando para exercer sua vocação, trocou a Vida por um novíssimo caixão de alças douradas.
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Caminho novo
Voava com tamanha exatidão que parecia seguir uma rota previamente traçada. Uma tarde de brisa, quando o azul do céu sugeriu alegrias imprevistas, mudou inesperadamente de direção e criou um novo caminho descobrindo que o azul é o mesmo em todos os lugares.
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Marinha
Tem olhos verdes. Oceânicos. E se lhes acrescentarmos o sal das lágrimas nada lhes faltarão para completar a marinha semelhança. Onde quer que vá o corpo, os olhos permanecem no litoral, podendo-se avistar neles a linha do horizonte e um e outro voo de gaivota. E se lhes medirmos a profundidade e mergulharmos à procura de submersos tesouros certamente faltará oxigênio, se não estivermos devidamente equipados, de onde se conclui que o mar não depende da geografia e pode estar em qualquer lugar desde que ali o procuremos.
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Descuido
Quando deu os primeiros passos notaram seu grande defeito: andava a alguns centímetros do chão sempre num voo rasteiro que, dependendo do vento, quase a levava para longe. Temeroso de perdê-la o pai amarrou em seu tornozelo pesada âncora que a mantinha sempre em segurança. E por marido arranjou-lhe experiente marinheiro que continuou a severa vigilância. Até que, distraído, deixou que a âncora se desprendesse e numa tarde de ventania ela foi arrastada para muito alto e se perdeu nas nuvens.
continua... 29
Toda palavra é composta. Se ainda por dizer ou plenamente dita, toda palavra é contida. Por singular a palavra, mais plural o seu sentido. E suspensa em poesia, maior a sua assimetria. Por mais que tudo se diga, não esgota o esquecido. Por mais que a tudo se cala, não preenche o vazio. Toda palavra é composta: por acordar no já vivido o mais e mais despercebido. Editora Baobá – Material de divulgação – versão submetida à avaliação.
Leio os Contos contidos de Maria Lúcia Simões. Os laços que amarram leitor e escritor neles se realizam pela capacidade, da autora, em anistiar as palavras, pressentir suas dimensões, estruturá-las sem se servir delas apenas para “re/velar” o seu imaginário, mas para somar-se, pelas palavras, à fantasia do leitor. Se contidos os contos mais abrigam a escrita do leitor. Livre para os sonhos, Maria Lúcia Simões é severa em registrá-los, pelo saber do absoluto que há neles. Ao condensá-los em palavras – espelhando um exato entendimento das funções literárias da escrita – ela permite ao leitor o deslocamento de suas fantasias para apossar-se de suas também incertezas. Contos contidos é uma obra propícia a todos pelo exercício de contenção contido neles. Conter é ter-con o outro. Bartolomeu Campos de Queirós
ISBN 978-65-88968-01-7
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786588
968017