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Belo Horizonte 2018
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Copyright © 2018 by Roberto Lanznaster
Editor: Rafael Borges de Andrade
Gerente editorial: Mário Vinícius Silva
Supervisão editorial: Maria Zoé Rios Fonseca de Andrade
Ilustrações e projeto gráfico: Roberto Lanznaster
Revisão: Libério Neves e Lílian de Oliveira
Lanznaster, Roberto
L297 Imaginarium: monstros do Novo Mundo / Robert Lanznaster; ilustrações do autor . − Belo Horizonte: RHJ, 2018.
68p. : il.
1. Literatura infantojuvenil. I. Título
CDD: 808.899282
CDU: 869.0(81)-93
Elaborada por: Maria Aparecida Costa Duarte
CRB/6-1047
ISBN: 978-85-7153-362-2
1ª edição
Proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem o consentimento por escrito da editora.
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Impresso no Brasil
Printed in Brazil
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“Nós vagamos aqui e acolá em nossa pobreza desolada. Vimos sangue e dor onde uma vez vimos beleza e valor.”
Canção asteca para os deuses, século 16.
“Encontramos um grande número de livros escritos nesses caracteres e, como nada tivesse, a não ser flagrantes superstições e mentiras do demônio, nós os queimamos a todos.”
Diego de Landa, bispo de Yucatán, século 16.
Para os sobrinhos, Luiz Felipe e João Guilherme. Agradecimento especial: Denise Ravizzoni
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meia-noite, uma língua de fogo iluminou o céu sobre Tenochtitlán, a capital do Império Asteca. Enquanto a inquieta população da cidade se aglomerava, admirando apreensiva o firmamento, uma voz maternal ecoou, melancólica, na grande esplanada: “Oh minhas crianças queridas, vocês estão perdidas. Oh minhas crianças, onde poderei escondê-las?”
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Era um presságio sombrio, a confirmação de uma antiga profecia: naquele ano, os deuses retornariam do leste, vindos do outro lado do mar, para reclamar seu trono por direito. Eles desembarcaram no mês de abril de 1521.
Pálidos como cadáveres, trajavam roupas que cintilavam ao sol. Montavam bestas estranhas, enormes e desconhecidas. Contudo, não eram deuses, mas seres de carne e osso: eram homens; comportavam-se como feras.
Em menos de dois anos, esses invasores – apenas quinhentos soldados espanhóis – reduziriam o esplendor do Império Asteca – forjado com ouro, pedra e sangue – a pó. A Conquista das Américas, o Novo Mundo descoberto por Colombo, começava.
Era um lugar de contrastes e extremos: de altas montanhas cobertas de neve e vastas pradarias; de quentes florestas tropicais e planícies geladas; de terras férteis luxuriantes e desertos estéreis. Onde terremotos violentos rachavam o solo em segundos e chuvas torrenciais castigavam a terra durante meses.
Os primeiros viajantes que de lá chegavam traziam relatos fabulosos: os rios eram feitos de ouro; as montanhas possuíam veios infinitos, de onde a prata jorrava em profusão; das árvores era possível colher esmeraldas e turquesas. A promessa de fortuna e glória atraiu soldados e mercenários.
Sob as bênçãos da Coroa Espanhola eles partiram, singrando os mares em galeões, dispostos a saquear e explorar a qualquer custo os tesouros do Novo Mundo. Sua ambição, porém, encontraria resistência.
Mais de dois mil povos, cada qual com costumes e dialetos próprios, viviam espalhados pelo continente. Três sofisticadas civilizações o dominavam. Duas encontravam-se em seu apogeu – os Astecas, no México, e os Incas, no Peru –, e uma, em clara decadência: os misteriosos Maias – antigos senhores da Península de Yucatán. Suas enormes cidades – verdadeiros milagres de engenharia – rivalizavam em esplendor com as da própria Espanha, com a própria Roma. Seus costumes e ritos encheram os europeus de assombro e horror: como selvagens pagãos seriam capazes de construir tais maravilhas?
O choque de culturas liberou uma onda de violência incontrolável e absoluta. As armas dos nativos não eram páreo para canhões, arcabuzes e armaduras de aço; os corpos não possuíam a imunidade necessária contra as novas doenças trazidas pelos estrangeiros, como a varíola e a gripe. Milhares foram mortos. Outros, dominados, convertidos e escravizados. O resultado do conflito mudou a face dos dois mundos para sempre.
Para enfatizar a vitória, os conquistadores destruíram templos e monumentos, erigindo novas cidades sobre as fundações. Derrubaram monolitos sagrados e apagaram as inscrições. Os conhecimentos seculares registrados nos códices* – os livros dos Maias – foram queimados em grandes fogueiras. Seu sistema de escrita pictográfica – complexo e único –, proibido e, por fim, esquecido. No final do século 16, cerca de cem mil europeus viviam no Novo Mundo. O completo mapeamento – e total domínio – do território continental, no entanto, ainda demoraria centenas de anos para acontecer.
Mais ou menos nessa época, na cidade espanhola de Salamanca – sede da célebre universidade –, um jovem estudante estava prestes a começar a própria conquista. Na biblioteca da instituição, atrás das paredes empoeiradas de uma velha estante, descobriu, por acaso, três fragmentos de papiro – rasurados e queimados. O jovem examinou o texto dos manuscritos, em grego arcaico, e concluiu: eram as páginas de um tipo de catálogo, em que eram narrados os hábitos e as características de feras fabulosas: um dicionário de monstros. E aqueles fragmentos específicos faziam parte de uma obra especialmente rara, considerada perdida há séculos: o Imaginarium, de Isidoros de Korinna**
A incrível descoberta movimentou ainda mais a já agitada Universidade de Salamanca (no período, a instituição vivia sua era de ouro – em que a troca de novos conhecimentos era alimentada pelas ideias do movimento Humanista). Viajantes chegavam de todos os cantos para inspecionar e admirar os papiros. Um novo interesse sobre o estudo de seres sobrenaturais varreu a Europa. Surgiram rumores de uma expedição às Américas, com o propósito de catalogar novas espécies de criaturas – nos moldes do trabalho de Isidoros.
Por fim, após longos debates e reuniões, o líder da missão foi, finalmente, eleito. Seu nome era Juán Felipe del Castillo – o mesmo jovem que redescobrira o Imaginarium. A escolha não foi arbitrária. Juán Felipe, como muitos outros em sua época, possuía formação nos mais diversos campos do conhecimento: noções de medicina, estudos das ciências naturais, artes e filosofia. Mas o que o tornava tão singular – e a pessoa ideal para a missão – era a combinação de uma curiosidade obsessiva e de uma coragem quase imprudente. Também era dotado de uma mente rebelde e de um espírito livre: foi sua a decisão de partir
* Códices (da palavra em latim codex) eram manuscritos do período antigo e medieval gravados em madeira. Os códices Maias eram livros desdobráveis – parecidos com uma sanfona –, produzidos a partir da casca de algumas árvores, como a figueira.
** Imaginarium – Dicionário de Monstros (Editora RHJ). Isidoros de Korinna foi um filósofo, matemático e estudioso das ciências naturais e esotéricas de grande notoriedade em seu tempo (século 25 a.C.). Os exemplares de sua obra – o Imaginarium – foram destruídos durante o incêndio da Biblioteca de Alexandria, no Egito.
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sozinho à Cidade do México – que serviria como cidade-base da aventura – e lá recrutar, entre os moradores locais, os quinze integrantes necessários à expedição. Só existem informações precisas sobre dois deles: um exímio cartógrafo e rastreador, Diego de Sahagún, ex-missionário franciscano, que, ao testemunhar os horrores infligidos aos nativos, abandonou a ordem religiosa; e a bisneta de uma princesa maia, chamada Itzel Kan-Balam. Além de hábil tradutora – fluente em espanhol e nas línguas nativas***, Itzel também foi a responsável por ilustrar o novo Imaginarium, ao estilo dos antigos códices de seu povo.
Navegando em pequenos barcos, viajando no lombo de mulas ou fazendo longas jornadas a pé, eles enfrentaram inúmeras adversidades. Exploraram o continente por dez anos, coletando histórias e mitos. Visitaram cidades perdidas e presenciaram a aparição de animais lendários. Com a ajuda de cartas, documentos e registros, é possível reconstituir sua trajetória. A partir da Cidade do México, o grupo embrenhou-se nas perigosas florestas da Serra de Chiapas, penetrando, posteriormente, a Península de Yucatán – até as ruínas da cidade maia de Chichén Itzá. De lá, invadiram o inóspito território português, descendo o Rio Amazonas, atraídos por relatos sobre uma cobra de fogo. Das terras brasileiras, partiram rumo a oeste, através da intrincada rede de estradas incas – cruzando a Cordilheira dos Andes –, até a costa do Pacífico, onde chegaram à cidade-fantasma de Chan Chan.
Depois, retornaram em direção ao México, mas decidiram permanecer por três meses na cidade de Santa Fé (atual Bogotá, na Colômbia). Lá, planejaram uma nova rota, rumo à América do Norte, atualizando mapas com a ajuda das anotações do explorador espanhol
Francisco Vásquez de Coronado**** .
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Seguiram viagem até a Flórida – na época disputada entre franceses e espanhóis –, de onde partiram para navegar o Rio Mississipi, na Louisiana. Então, adentraram a região das pradarias, subindo até os Grandes Lagos, nas fronteiras do Canadá.
Seu destino final seria o lar dos Inuítes (os esquimós), um local de frio extremo, praticamente inexplorado. Contudo, devido às duras condições climáticas, desistiram: no Golfo do Maine, próximo ao Monte Katahdin, embarcaram em um navio baleeiro com a intenção de voltar ao México. Próximo à costa da Virgínia, durante uma violenta tempestade provocada por um Pássaro do Trovão, o navio naufragou. Os únicos sobreviventes do desastre foram Juán e Itzel.
Foi ali, nos bosques da Virgínia, entre as folhas outonais dos carvalhos e álamos, que os dois escreveram e finalizaram o novo Imaginarium. O resultado – que você segura em suas mãos – é uma série de impressões, histórias, lendas e testemunhos. Uma narrativa não linear, tão diversa em tom, cor e estilo quanto as tribos e nações que um dia caminharam sobre as vastas – e outrora livres – terras do Novo Mundo.
*** Quiché (a língua dos Maias), Nauátle (o dialeto dos Astecas) e quéchua (o idioma dos Incas).
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Na região de Nova Castela * , existe uma vasta cordilheira, magnífica e aterradora. Os Incas – antigos habitantes dessa terra – chamam essas montanhas de Andes. Lá, nossa pequena expedição viajou durante meses por estradas e escadarias secretas, castigada por rajadas de vento e neve. Exaustos e doloridos, chegamos a um platô oculto, frio e seco, onde avistamos um lago de águas calmas e profundas, infinito como um oceano: o Titicaca ** .
Esse lago é o único lugar do mundo onde vive o Amaru, um raro tipo de dragão, diferente de todas as espécies conhecidas e registradas.
Sua cabeça é igual à da lhama. O corpo – com escamas coloridas – é de serpente, terminado em uma longa cauda de peixe. As asas, translúcidas, como as das borboletas, são cobertas por uma penugem finíssima, dourada e púrpura.
Quando os bandos de Amarus voam sobre o lago, durante as primeiras horas do dia, suas asas refletem e ampliam a luz do sol, criando um belo espetáculo. Por isso, os Incas acreditam serem os Amarus responsáveis pelo próprio nascer do sol, e que suas escamas produzem o orvalho e a geada. Caçá-los é um crime gravíssimo: conforme suas crenças, se os Amarus desaparecerem da terra, o sol nunca mais nascerá, e as chuvas deixarão de existir.
Uma vez ao ano, no mês de agosto, homens, mulheres e crianças navegam as águas do Titicaca, em barcos de junco. Partem até uma ilha sagrada, no centro do lago, para recolherem as escamas do dragão. Quando retornam, celebram um grande festival e as entregam a um velho sacerdote, conhecido como Amaruta, que é o único capaz de ler e interpretar, nos pequenos veios das escamas, os segredos ali contidos: o conhecimento sobre o passado e o futuro.
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