ANO VIIII - 54 - JULHO/AGOSTO DE 2016
A REVISTA DO EMPRESÁRIO DO SETOR FUNERÁRIO
Turismo no Cemitério
do Bonfim
Necrópole mais antiga de Belo Horizonte possui inúmeras obras elaboradas por artistas de renome
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EDITORIAL Nessa edição da Revista InMemorian, trazemos para você uma aventura inédita: Turismo no Cemitério do Bonfim. O cemitério, que já virou patrimônio nacional e cenário de diversas obras de ficção, possui inúmeras obras elaboradas por artistas de renome. A visita guiada acontece mensalmente, e você se surpreenderá com a história por trás das lápides.
No Mundo Funerário, saiba mais sobre as últimas estratégias de investimentos e serviços inovadores nas funerárias, e aproveite para ler uma história incrível em Boa Leitura: “Vida, tecnologia e arte na peleja de ex-coveiro e agrônoma em cemitério”. Para curtir nas telonas, aposte no mais novo longa de Woody Allen, “Café Society”, que têm recebido críticas positivas por todo o mundo. Mas, se você curte mais uma leitura sentado no conforto do sofá, dá uma olhada na Vale a Leitura, e veja como a americana Caitlin Doughthy desmistifica o tabu da morte em relato de seu trabalho em crematório.
Nas últimas notícias de Minas Gerais, saiba mais sobre o novo cemitério de Montes Claros, cidade no norte de Minas que , por mais de 20 anos, sofreu com a superlotação de cemitérios. Além disso, confira também informações sobre a 6ª edição do Uaiktoberfest em Nova Lima, evento que celebra a cerveja artesanal.
Boa Leitura!
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Equipe In Memorian.
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EXPEDIENTE Diretor geral ROBERTO MÁRCIO P. DE CARVALHO Direção de Marketing ROSA CARVALHO Administração Financeira SABRINA COSTA
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Redação Gabriella Carvalho Layout e diagramação Arte Final Comunicação
16 CURIOSIDADE
24 CAPA
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ACONTECEU EM MG
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Mundo Funerário |
Funerárias investem em atendimento e serviços inovadores
Poucos mercados possuem uma de¬manda tão certeira como o funerário. Nos últimos anos, a estabilização das taxas de mortalidade tem obrigado o segmento a ampliar cada vez mais a oferta de servi¬ços. Mais do que crescer, o objetivo é não estagnar e conter um possível desaqueci¬mento causado pelo aumento da expecta¬tiva de vida geral da população. Apostando na combinação de serviços inovadores e atendimento especializado, o setor busca se reinventar e driblar os mitos e estigmas associados aos negócios do ramo. Ao ano, são registrados, em média, 1 milhão de óbitos no Brasil. Para suprir a demanda, o mercado funerário atual¬mente engloba cerca de 5.500 empresas e emprega mais de 50 mil pessoas. O perfil das companhias não varia muito: em sua maioria, tratam-se de empresas familiares, sendo 98% delas exploradas pela iniciati¬va privada, segundo dados da Associação Brasileira de Empresas e Diretores do Setor Funerário (Abredif). “Com pouca variação no número n º 54| An o VI I II |j u l | a g o 2016
de mortes, as em¬presas começaram a investir em serviços diferenciados, com ênfase em itens mais luxuosos e personalizados”, diz Jayme Adissi, empresário em atuação há mais de 4 décadas no ramo funerário. Por meio destas ações, o setor tem movimentado o equivalente a R$ 7 bilhões por ano no Brasil, com crescimento médio anual de 8%. “Sem contar um fato indiscutí¬vel: 0,7% da população brasileira morre por ano. Ou seja, minha empresa cresce acima do mercado”, observa Jayme, que também é autor do livro Quem quer comprar um túmulo? (Editora Urbana), com 8
dicas de gestão para empresas de todas as áreas. “Vender é o cerne do nosso negócio e, para isso, o fundamental sempre é agregar valor ao produto”, explica. Adissi investe em promoções e benefícios para seus clien¬tes, assim como em ações de marketing inovadoras para fortalecer sua marca, com destaque para as mídias sociais. “Há ainda um tabu neste segmento, pois ele trata de morte, enterro. Mas basta um olhar atento para enxergar além, para perceber facetas que muita gente ignora e que podem ser bem lucrativas.”
Tabu Mas, assim como nada na vida é tão certo como a morte, lidar – e lucrar – com o mais universal dos tabus nem sempre é tarefa fácil. “A principal dificuldade é traba¬lhar num segmento que não é visto como negócio, pois é muito difícil pensar na morte – e se preparar para o fim como nos preparamos para a aposentadoria ou para eventuais problemas com o carro, com a contratação de seguro, etc.”, reflete Jayme. Como se já não bastasse toda a carga “emocional” envolvida, o setor funerá¬rio ainda precisa lidar com uma série de questões burocráticas inerentes. Além das diversas especificações e normas que pre¬cisam atender, as empresas do ramo ainda enfrentam um concorrente imbatível: o poder público. “Para nós, o grande gargalo reside na impossibilidade de executar todos os serviços funerários na cidade, uma vez que o Serviço Funerário do Município de São Paulo detém o monopólio dos mesmos”, conta Sergio Dhelomme – diretor
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Atitude surgiu para driblar estabilização das taxas de mortalidade por ano no país
do Cemitério Congonhas, em funcionamento desde 1970 na capital paulista. “Do transporte do falecido à comercialização de urnas funerárias são atribuições exclusivas do SFMSP. As
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BOA LEITURA I
Mundo Funerário | únicas exceções são os cemitérios e velórios.”
on-line de coroas e descobri um nicho que até então era muito
Além do cemitério em Blumenau, o Grupo Jardim da Saudade
mal atendido”, relembra. Hoje, o site realiza em média 80
possui dois cemitérios na região de Curitiba, fundados nas
vendas por dia. “Nós apostamos no crescimento do segmento
décadas de 1970 e 1980. Sempre de olho nas novidades do
de pessoas físicas, principalmente pessoas que não têm
setor, em 1999 a companhia inaugurou o primeiro crematório
como se locomover até o velório de um amigo ou parente em
do estado do Paraná. Em 2004, o grupo adquiriu a unidade
outra cidade ou estado”, conta o empreendedor, que almeja
de Blumenau e, em 2012, foram inauguradas duas funerárias
crescimento de 50% neste ano.
Vida, tecnologia e arte na peleja de ex-coveiro e agrônoma em cemitério ,
Mulheres de Cinzas por Mia Couto
nas cidades de Curitiba e Blumenau. “Buscamos sempre nos atualizar para oferecer uma solução completa aos clientes.
Os números do mercado funerário no Brasil
Desde o atendimento funerário até o sepultamento ou
* 1 milhão de óbitos por ano em média
cremação”, reforça Andreazza.
* 5.500 empresas
Mas nem só de cemitérios e funerárias é feito o vasto mercado
* R$ 7 bilhões por ano
funerário. Com o crescimento do comércio eletrônico, surgem
* 8% de crescimento médio anual
também empresas que prestam serviços fúnebres através
Fonte: IBGE
da internet. É o caso do portal Coroas para Velório, lançado em 2010. Considerada hoje uma das maiores empresas de
uma solução rápida, segura e prática de entrega de coroas de flores em todos os cemitérios, velórios, hospitais, igrejas e crematórios do País. A agilidade no serviço é garantida através de parcerias com redes de floriculturas que efetuam as entregas em até uma hora em todo o território nacional. Graças ao atendimento 24 horas, em 2013 a empresa aumentou as vendas em 150%. “Tivemos ótimos resultados desde a inauguração do nosso site, por isso, resolvemos n º 54| An o VI I II |j u l | a g o 2016
expandir o serviço e atender inclusive clientes que estão em outros países e precisam homenagear familiares e amigos no Brasil, para isso disponibilizamos todas as formas de pagamento que visam facilitar a compra on-line”, diz Eduardo Gouveia, sócio diretor da empresa. O empresário que entrou no ramo sozinho, com um investimento baixo e tra-balhando de casa, já expandiu a empresa, contratou funcionários e um sócio – Bruno Peres. A ideia de vender coroas de flores pela internet surgiu após o falecimento do avô de Eduardo. “Fui atrás de um mercado 10
“Nunca refleti tanto sobre a vida quanto agora que trabalho
“Quando a memória é de todos, ela é coletiva, vira história.
com a questão da morte”, filosofa Lúcia Salles, 54, agrônoma
Isto aqui é um parque de memórias, não tem nada de tétrico”,
que é superintendente do Serviço Funerário do Município de
define Lúcia, responsável pelo renascimento do cemitério
São Paulo desde 2014.
como espaço cultural e de interesse artístico.
Sentada ao pé de um túmulo em uma das alamedas arborizadas
Ela aponta para as árvores frondosas, os pássaros e as obras
do Cemitério da Consolação, a paulistana filha de duas famílias
de artes que circundam e enfeitam os jazigos da Consolação,
tradicionais sepultadas ali –os França Pinto e os Withaker–
um dos 22 cemitérios da cidade sob a sua administração.
cumprimenta Francivaldo de Almeida Gomes, o Popó, cearense
Um cenário que recebeu eventos culturais como o Cinetério,
que veio de Crateús há três décadas para ajudar a “construir”
exibições de filme na madrugada na Virada Cultural, e saraus
São Paulo.
em datas especiais, como Dia das Mães, com a orquestra do
O ex-ajudante de pedreiro de 49 anos encontrou no cemitério
Theatro Municipal.
uma razão para viver e se reinventar profissionalmente entre
A superintendente do Serviço Funerário fala com empolgação
túmulos e mausoléus que se tornaram referência em arte
sobre o potencial do cemitério da Consolação como museu ao
cemiterial.
ar livre. Ela cita outros exemplos bem-sucedidos no mundo,
Há uma década, Popó trocou o ofício de coveiro, para o qual
como o Père-Lachaise, em Paris, e o da Recoleta, em Buenos
prestou concurso 16 anos atrás, pelo de guia de um museu a
Aires.
céu aberto em plena avenida da Consolação, uma das artérias
“Muros em cemitério para quê”, indaga Lúcia. “Costumo
viárias da metrópole.
brincar e repito sempre que alma atravessa parede. É preciso
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homenagens fúnebres do Brasil, tem como meta oferecer
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BOA LEITURA I
destruir os muros físicos e os do pensamento. Deixar de ocupar
expoentes da Semana de Arte Moderna de 1922, o compositor
aos visitantes se utilizarem de um espécie de mini-Waze para
morte.Na Virada Cultural de 2014, por exemplo, José Mojica
de forma cidadã e não visitar tais espaços é uma segunda
Paulo Vanzolini e outros artistas e tantos engenheiros, políticos
se localizar na necrópole.
Marins, o Zé do Caixão, foi convidado a contar histórias de
morte, o esquecimento.”
e empresários que as novas gerações só conhecem como
Uma parceria com a Secretaria Municipal de Educação
terror no Cemitério da Consolação a partir da meia-noite.
Daí o reconhecimento ao “trabalho invisível” dos 600 coveiros,
nome de rua.
possibilitou uma agenda semanal de visitas programadas de
“Ele é uma figura emblemática. Fez uma palestra que não
que enterram 200 mortos por dia na cidade de São Paulo.
A visita guiada tem a duração da curiosidade de cada visitante.
estudantes ao cemitério.
podia ser de mais luz”, define Lúcia, imitando a voz tétrica
A tarefa executada pelos sepultadores toca a vida de cerca de
São vários roteiros, que já atraíram estimadas 10 mil pessoas,
Por meio de um convênio firmado com a PUC-SP, a administração
e tentando se recordar das palavras de Mojica naquela
2,8 milhões de moradores a cada ano, estima Lúcia, levando
que podem escolher passeios como percorrer os túmulos de
funerária passou a olhar de forma multidisciplinar as demandas
madrugada: “Você que se achava o máximo em vida? Você
em conta que cada velório atrai uma média de 30 pessoas e
figuras históricas ou conhecer os vários tipos de rocha usadas
de um serviço público complexo e essencial, que envolve luto,
que fazia seus empregados se curvarem, agora está na laje
são realizados 82 mil enterros anuais na cidade de São Paulo.
em jazigos suntuosos.
história, restauro e direito.
fria”, ela repete.
CONDECORAÇÃO
PASSADO E FUTURO
Entre os resultados do programa de extensão universitária,
Como agrônoma de formação, Lúcia achou pertinente a
Em 6 de setembro, a agrônoma e o ex-coveiro se encontraram
A nossa primeira parada é o Mausoléu dos Chapeleiros. O ex-
está a preparação de uma cartilhas sobre o luto.
descrição do processo de decomposição feita por Zé do Caixão
novamente numa cerimônia solene na Câmara Municipal de
ajudante de pedreiro dá uma aula sobre a São Paulo antiga
“É uma demanda que chegou via o programa São Paulo
em sua performance: “Sabe o que você é? Um verme!”, frisou
São Paulo, na qual Popó ganhou o Título de Cidadão Paulistano.
espelhada no brasão oval da década de 80 do século 19 que
Carinhosa para ajudar as escolas a lidar com o luto. Se o tema
o ator e cineasta à plateia.
A homenagem, por meio de uma lei proposta pelo vereador
enfeita o túmulo coletivo.
já é um tabu para os mais velhos, imagine para crianças”,
Na mesma linha, a superintendente do serviço funerário
Jamil Murad (PC do B), premia a dedicação e o conhecimento
“Este baixo relevo representa um córrego que existiu na
diz Lúcia. “Estamos fazendo cursos, jornadas e material
encerra a entrevista.
enciclopédico do cearense.
cidade, o Anhangabaú, que deu origem ao vale do mesmo
pedagógico para ajudar o professor a tratar do tema da morte,
“Graças a Deus, todos nós viramos adubo. Só existe vida
Popó é capaz de desfiar de memória informações biográficas,
nome. Temos aqui também a chaminé da fábrica de chapéus e
não só quando ela acontece, mas quando ela é memória.”
sobre a terra porque a ciclagem de nutrientes passou a ser
datas de nascimento e morte de duas centenas de
uma plantação de ervas onde hoje é o viaduto do Chá”, explica
QUEBRAR PARADIGMA
eficiente. Faz parte da vida. E não é uma parte triste ou aflitiva.
personalidades famosas e personagens históricos sepultados
Popó.
A fala da chefe é a deixa para Popó mostrar como o périplo pode
É renascimento. É um ciclo. O túmulo é um berço de nutrientes
em mausoléus e jazigos do cemitério fundado em 1858.
Um dos mais belos do cemitério, o mausoléu foi erigido
ter um caráter educativo. Um bom exemplo é parar com os
para um nova vida. O moderno não é se dizer do berço ao
“Faço uma homenagem a São Paulo quase todos os dias da
a mando do alemão João Adolfo, dono de uma fábrica de
alunos diante do túmulo do escritor Monteiro Lobato, sepultado
túmulo, mas do berço ou berço.”
semana dentro deste cemitério ao guiar visitantes interessados
chapéus, para servir de última morada para funcionários.
ali em 1948. Uma parada perfeita para aprenderam mais sobre
nesta riqueza artística e histórica”, afirma o funcionário que
São informações desfiadas com uma certa cerimônia por Popó,
o autor de “Reinações de Narizinho” e seus personagens como
sucedeu na nobre função o historiador Délio Freire dos Santos,
mas que também passaram a estar contidas em QR Codes,
a boneca Emília e o Saci.
morto em 2002.
códigos de barras que podem ser lidos pelo celular e foram
Enfim, visitar um cemitério pode ser divertido, educativo e até
Para estar à altura da missão, o pupilo do antigo administrador
espalhados por 200 túmulos de personalidades sepultadas no
inspirador?
do Cemitério da Consolação voltou para os bancos escolares.
Consolação.
Lúcia responde. “Temos que quebrar paradigmas. Sem dúvida,
Concluiu o ensino médio, ao mesmo tempo que frequentava
Basta apontar o smartphone para o código fixado no túmulo
cemitério é também é sinônimo de despedida, de sofrimento”,
a Biblioteca Mario de Andrade para aprender mais sobre as
para que sejam carregados dados sobre o dono do jazigo, seus
reconhece a superintendente.
personalidades sepultadas na mais importante necrópole de
feitos e obras.
“No entanto, o saudável é o luto virar memória. Virar um sorriso
São Paulo.
O concorrente tecnológico seria uma espécie de Uber para
de lembrança de coisas boas, o que faz os mortos continuarem
“Eu tenho muito amor por esta cidade. Por isso aprendi tanto e
o guia do cemitério? Popó ri da comparação, mas segue
parte da vida de outra forma, no coração e na cabeça. Isso é o
guardo tantas informações na memória.”
confiante no papel que representa. “Tem espaço para todos”,
parque da memória.”
Popó imposta a voz e desafia os visitantes a listar nomes que
diz, diante do inevitável.
E como tal, os cemitérios também servem para nos lembrar da
contam a história da Pauliceia e estão ali sepultados, entre eles
O cemitério passará a dispor de conexão Wi-Fi, que permitirá
nossa finitude e até para brincar com os clichês em torno da
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(a América dos anos 1930/40, na costa leste ou oeste), com
formas diferentes. Aqui, cabe à mulher escolher.
seus usos e costumes e, sobretudo, música; a família judia
Woody não discute as razões de Vonnie, trabalha sobre a
com vasta diversidade (cada membro é de um jeito: há os
simples dor da escolha, que implica, sempre, renúncia.
bem-sucedidos e os fracassados, os ricos e os pobres, os
O setor romântico será o mais evidente desta comédia
gângsteres e a gente de bem), aproximada apenas pelos
dramática, o mais desenvolvido também. Aquele que cola
hábitos comuns.
todas as outras partes. Aquele ao qual Woody retorna de
Acima de tudo, esses aspectos conduzem ao lado romântico
tempos em tempos sempre apaixonadamente: o amor entre o
Woody Allen é um dos raros cineastas americanos atuais
da trama. O lado triângulo amoroso, sempre caro ao autor. Pois
dever e o prazer. Ou entre a segurança e a incerteza do futuro,
que trabalham em vários níveis. Em seus melhores filmes, ao
entre a insegurança do amor pelo ainda pobretão Bobby e a
tanto faz: afinal, são variantes de “Casablanca”.
menos. E “Café Society” é um dos grandes Woody Allen deste
segurança que lhe oferece o namorado secreto, Vonnie optará
E aquele que serve para confirmar o carisma enorme de
século, talvez o melhor.
por este último.
Stewart e Carell e a eficácia seca de Eisenberg, num conjunto
Ali o jovem judeu (sempre há um) é Bobby (Jesse Eisenberg),
Como em “Casablanca”, o clássico de 1942 e uma referência
invulgar em que também cai como uma luva a luz de Vittorio
sai do Bronx, Nova York, direto para Hollywood, disposto a
na obra de Allen (ver “Sonhos de um Sedutor”, de 1972), temos
Storaro.
trabalhar com o tio Phil (Steve Carell), poderoso agente de
aí uma mulher que ama dois homens igualmente, porém de
Um filme em que Allen retorna a ideias que conhecemos bem,
Ótimo, ‘Café Society’ talvez seja o melhor filme de Allen neste século
cinema. Do mundo mais que real ao mundo dos sonhos.
mas que parecem estar lá pela primeira vez. Em suma: um filme
nteriorPróximaEstamos entre os anos 30 e 40 do século
muito acima de quase tudo que se tem visto recentemente
passado. Jake detesta o ambiente hollywoodiano, com
e uma confirmação de Woody Allen como um dos principais
estrelas, frescuras, exibicionismos, excentricidades e tal. Mas
cineastas americanos da atualidade.
também sonhará: com Vonnie (Kristen Stewart), a secretária do tio, que o leva para conhecer a cidade e também tem uma queda por ele. Há, porém, um namorado secreto na jogada. Para resumir, Bobby volta para Nova York, onde gerenciará o night club do irmão. Sim, entram aí dois elementos centrais do filme: um é o café society que frequenta o lugar: artistas, nobres, milionários, gângsteres.
um elemento tão próprio de Allen e tão presente no filme: a família judia de Nova York, com seus personagens sempre bem diferentes entre si, os pais que vivem aos berros, a eterna busca de uma reafirmação do próprio judaísmo. Até agora, como vimos, não entrou nenhum intelectual na história. Entrará um, mas será bem secundário desta vez (será
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Gângsteres como o irmão de Bobby. E eis aí apresentado mais
também o comunista). Passemos. O que Woody faz aqui é articular os vários níveis da sua narrativa: um aspecto da história americana do século passado 14
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curiosidade |
curiosidade | esquentar casas. Com o argumento de empecilhos éticos e práticos, sua oferta foi recusada.
Como ocorre a cremação – por dentro do forno
Por outro lado, é algo bem comum e aceito na Dinamarca. O Conselho de Ética Dinamarquês (um grupo de filósofos e cientistas que aconselham o parlamento), declarou, em 2012, não haver questões éticas que pudessem desencorajar a reciclagem do calor emitido por crematórios e recomenda ações nesse sentido. O Crematório Ringsted, localizado perto de Copenhagen, teria a capacidade de aquecer 600 casas ao seu redor, por exemplo. Há desdobramentos que podem inibir esse uso. Um grupo
Piscina na Inglaterra é aquecida por crematório
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POR CAMILA APPEL
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“Federação Internacional de Cremação”, não aconselha a
POR CAMILA APPEL
prática de comercializar produtos provenientes da cremação.
Com a música clássica preferida do querido defunto, o caixão
Um dos motivos é que a venda de metais retirados das cinzas
começa a descer num buraco misterioso e eu não consigo
(como próteses de joelhos e quadris, que não carbonizam) é
segurar a vontade de chorar. O momento propicia uma
feita sem autorização da família.
despedida simbólica. Penso nos bons momentos que tivemos,
No município de São Paulo, a cremação é um monopólio da
no que ele representava para mim, na vida que construiu e na
prefeitura. Por isso, quem desejar contratar um crematório
família que ficava. Mentalizo imagens dele rindo, fazendo sua
particular, deve ir a cidades dos arredores, como Itapecerica
atividade preferida, cavalgar, tentando memorizá-las pois sei
O município de Redditch, na Inglaterra, tem uma piscina
energia que seria usada para aquecer a área de suas piscinas.
da Serra, onde há o Crematório Horto da Paz. Acredito que a
que nunca mais as verei. E hoje aquele rosto está um pouco
pública aquecida pelo crematório local. O ar quente que sai
Em coluna recente na Folha, Mariana Lajolo escreveu: “A
quebra desse monopólio seja importante para consolidarmos
apagado, mas esse momento da despedida, não. Foi a primeira
do crematório é captado por canos que alimentam o prédio do
natação não é um esporte barato. As pessoas começam a
um mercado de melhor qualidade, começarmos a debater
cerimônia de cremação que presenciei.
centro esportivo e aquecem a área da piscina.
praticá-lo em clubes ou escolinhas, geralmente pagas. Não dá
os direitos dos clientes (a família do morto), aumentarmos a
Dez anos depois, voltei ao Cemitério e Crematório Horto da
Em entrevista ao blog, Richard Boyd, do Conselho do Município
para nadar em qualquer lugar, manter uma piscina custa caro.
informação sobre esse tipo de serviço e, assim, quem sabe, a
Paz para conhecer o outro lado daquele elevador que levou
de Redditch, disse que a ideia de usar o calor de crematórios
Fatores que fazem com que não seja um esporte de prática
demanda por ele.
o caixão simbolicamente para “de baixo da terra” como
para aquecer prédios no Reino Unido é popular. Mas ele afirma
mais disseminada entre os mais pobres”. Quem sabe se essa
ser o primeiro centro esportivo a colocá-la em prática. Ele usa
iniciativa fosse usada no Brasil, as piscinas poderiam ser mais
outras formas de economia de energia, como luz de baixo
baratas e mais acessíveis. Claro que não é a solução, mas
gasto energético e painéis solares.
poderia ser o começo de um debate.
Quando foi instalado, há 5 anos, o projeto gerou polêmicas
Esse pensamento poderia ser expandido, porque não são
e foi considerado ofensivo, mas hoje em dia é bem aceito e
apenas piscinas que podem se beneficiar do calor de
recebeu o prêmio nacional de meio ambiente “Green Apple
crematórios. Em Oslo, por exemplo, a dona de um crematório
Environment Award”. Essa premiação se propõe a valorizar
chamado Alfaset, ofereceu usar o calor de seus fornos para
práticas de impacto positivo. Boyd diz economizar até 20% de
alimentar o sistema de aquecimento público da cidade e
ocorreria no sepultamento, mas nesse caso é o subsolo do prédio principal do cemitério. Lembro de achar que o corpo sumia naquele buraco no chão e ia direto para o forno, ser cremado. Esse pensamento me sensibilizou porque quando eu saia do cemitério, imaginava que naquele momento, o corpo que abrigou por tantos anos aquela pessoa amada, estava
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lobista localizado na cidade de Haia (Holanda), chamado
rapidamente entrando em combustão. Mas não tem nada de imediato e rápido no processo, e ele funciona de acordo com etapas, obedecendo normas com 17
curiosidade |
curiosidade | do Vila Alpina me informou que seus fornos antigos possuíam 2 compartimentos, que tinham a possibilidade de cremar 2 corpos ao mesmo tempo, porém de maneira separada, então os ossos carbonizados não se misturavam. Em 2005, trocaram os fornos antigos (Instalados em 1974 quando inaugurou o Crematório de Vila Alpina) por 2 novos fornos de tecnologia americana, com câmaras primária e secundária e em 2011, o Serviço Funerário adquiriu mais 2 fornos com tecnologia
fornos com tecnologia moderna e desde 2005 não opera com
fazer bolo, não sei que raios de associação eu fiz. E não me
dita.
sai da cabeça a imagem de um osso sendo quebrado como se
O saco com as cinzas é colocado na urna de escolha da
fosse giz, que foi a analogia feita por Reinaldo. O clic de um giz
família. A urna não é obrigatória por lei, mas um costume já
partindo é muito específico e me pareceu interessante a ideia
bem enraizado. São várias opções: a família pode levar a urna
de que um osso, algo que só se quebraria com um impacto
embora, pode guardar numa sepultura no próprio cemitério,
muito grande, virasse um giz após a cremação, transformado
adquirir uma urna biodegradável, de fibra de coco, e plantá-la
em osso calcificado. As cinzas recebidas pelas famílias são
com uma árvore de preferência. Há um bosque no Horto da
esses ossos triturados.
Paz com essa finalidade. Também é possível usar uma urna
O forno é pré-aquecido a 657°C graus. Ele tem duas câmaras.
de argila crua para jogar na água, como o mar e a cachoeira,
Os gases produzidos na primeira câmara passam para a
porque ela afunda e se dissolve na água. Há urnas específicas
segunda para uma requeima. Essa segunda câmara trabalha a
para serem levadas para fora do país, segundo normas da
900°C graus. Segundo Reinaldo, é isso que garante que o que
polícia federal.
sai na chaminé não polui o meio ambiente. Seu resultado seria
Formas alternativas para o destino das cinzas foram exploradas
de 20% a 30% menos poluente do que um automóvel andando
em posts anteriores. Veja indicações de leitura abaixo. O
a 40 km por hora.
Cemitério e Crematório Horto da Paz disponibiliza serviços
Dentro do forno, no canto direito superior (numa das fotos da
terceirizados pouco conhecidos. A empresa Brilho Infinito
galeria abaixo pode-se ver um buraco), é onde fica o queimador.
transforma cinzas em diamantes e a artista plástica Claudia
pelo sistema, que servirá para identificar as cinzas ao corpo e
Ele recebe uma chama a gás como se fosse um maçarico e
Eleutério pinta quadros misturando cinzas à tinta, chamada de
garantir que não haja trocas.
regula a temperatura conforme a necessidade. Quando o corpo
arte picto-crematória. O quadro é de escolha do futuro falecido
Eu achava que se cremava mais de um corpo num mesmo
e o caixão entram em combustão, o queimador é desligado. O
ou dos familiares. Também podem ser feitas esculturas. Ainda
local. No crematório Horto da Paz, o forno é destinado para
corpo se queima por ter carbono em sua composição e existem
há a possibilidade de pingentes e anéis com espaços “porta-
apenas um corpo e acabaram de comprar outro devido
entradas de ar nas laterais que servem para alimentar esse
cinzas” e separar as cinzas em um conjunto de miniaturas de
ao aumento da demanda. Reinaldo Dantas, administrador
processo. O queimador será acionado novamente quando já
urnas para distribuir entre os membros da família.
do local, me falou que o Crematório Vila Alpina costumava
tiver consumido tudo que for combustível. O primeiro processo
O crematório da Vila Alpina se considera um dos maiores do
trabalhar com um forno para dois corpos, mas hoje em dia
da desintegração do corpo é o da desidratação, já que somos
mundo e pioneiro da América Latina. Crema-se, em média, 25
passaram para o individual também. A assessoria de imprensa
80% água. O segundo processo é a cremação propriamente
corpos por dia e o custo parte de R$ 407,49, no plano mais
o sistema antigo. O Vila Alpina pertence ao Serviço Funerário de São Paulo, da Prefeitura de São Paulo, que mantém o monopólio de cremação na cidade. Por isso, o Horto da Paz instalou-se em Itapecerica da Serra. O corpo deve ser cremado junto com um caixão, chamado de ecológico por não ter químicas, como verniz e tintas. Retira-se uma preocupação pela segurança e eficiência como ocorre em qualquer empresa. Após a cerimônia, o corpo entra na programação do Horto da Paz, podendo levar até dez dias para ser cremado. Ele é mantido refrigerado a 4°C numa câmara fria. O tempo mínimo de espera é de 24h a partir da data do óbito, que é um período para contestação judicial ou verificação de erros médicos.
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Assim que chega, o corpo recebe uma pastilha de material
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refratário, com uma numeração conectada ao nome do defunto
o vidro, as alças e os metais. O Crematório Vila Alpina indica nas perguntas mais frequentes de seu site, que o caixão não é necessário para a cremação, apenas um recipiente de madeira ou cartão. Após aproximadamente duas horas, do corpo que entrou só restou pó, ossos calcificados e bugigangas tecnológicas como pinos de titânio e próteses ortopédicas, que serão entregues à família num saco diferente do das cinzas. Os ossos são triturados numa máquina que me lembrou uma ferramenta de
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mais moderna, portanto o Crematório de Vila Alpina possui 4
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curiosidade |
curiosidade | de espaço e às leis ambientais. Países que lidam com essa questão, como o Japão, já consolidaram a cremação como tradição predominante. O Horto da Paz indicou um aumento de 36% na quantidade de cremação nos últimos três anos. E o Vila Alpina afirma que desde janeiro de 2008, o número de
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barato, e R$ 15.576,59, no plano mais caro. Como o Horto da
1) Atestado assinado por um médico legista;
Paz, também dão o prazo de 10 dias para a entrega das cinzas
2) Boletim de Ocorrência;
às famílias. O Serviço Funerário do Município de São Paulo
3) Declaração de um delegado de polícia manifestando não se
indica quando a cremação pode ocorrer em seu site:
opor à cremação em questão;
– O falecido houver manifestado, em vida, este desejo através
4) Atestado de Óbito assinado por dois médicos.
de “Declaração de Vontade”, devidamente registrada em
Essa declaração de vontade, em sua forma mais abrangente,
cartório.
também é chamada de “Testamento Vital”, assunto bem
– A autorização para cremação, de quem não optou por
explorado aqui no blog (veja sugestões de leitura abaixo).
ela em vida, é concedida por um parente de primeiro grau
Tanto o Horto da Paz quanto o Vila Alpina me informaram que a
mais próximo, na ordem sucessória (cônjuge, ascendente,
cremação acaba se tornando mais vantajosa financeiramente
descendente e irmãos maiores de 18 anos) e testemunhada
do que o sepultamento. Inicialmente, ela parece mais cara,
por duas pessoas, além da apresentação do atestado de óbito
mas o sepultamento presume taxas adicionais que a cremação
assinado por dois médicos. Parentes de 2.º grau não podem
não tem, como a taxa de conservação mensal e os custos com
autorizar a cremação.
a retirada do corpo na exumação (com três anos no Vila Alpina).
-No caso de morte violenta, a cremação só ocorrerá mediante
A cremação parece uma tendência inevitável. Hoje em dia é
autorização judicial. Para isso são necessários:
muito difícil abrir um cemitério convencional, devido à falta
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cremações dobrou em São Paulo.
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VALE A LEITURA ! | com uma cultura que ela considera negar a morte: “Se não
Americana desmitifica o tabu da morte em relato do trabalho em crematório
podemos aceitar que vamos morrer, não vamos aceitar que estamos matando o planeta. Não iremos aceitar que estamos destruindo espécies. E acabamos admitindo certos atos de guerra, terror e violência. Se a morte não é real para nós,
A norte-americana Caitlin Doughty abraçou uma missão:
vamos permitir que essas coisas continuem acontecendo”.
desmitificar o tabu da morte. Com seu canal no YouTube, o
Agora, Doughty trabalha em seu próximo livro: sobre como
“Ask a Mortician”, ela apresenta vídeos curiosos sobre a
revolucionar o setor funerário e define uma epígrafe para si:
indústria da morte usando humor afiado e sagacidade. E usa a
“Ela morreu fazendo o que amava: a morte”.
escrita para apresentar o leitor a um setor pouco conhecido do CONFISSÕES DO CREMATÓRIO AUTORA Caitlin Doughty TRADUÇÃO Regiane Winarski EDITORA Darkside Books
Seu livro, “Confissões do Crematório” (ed. Darkside, 2016), lançado recentemente no Brasil, é uma compilação de casos reais vividos durante seus primeiros seis anos trabalhando em
rolante de um shopping center.
um crematório nos Estados Unidos.
Doughty diz ter se traumatizado por nunca ter tido contato com
Doughty não pisa em ovos. Ela destrincha os tópicos mais
a morte antes desse evento. Após o trabalho no crematório, ela
mórbidos de forma bem direta. Conta sobre um bebê que
cursou uma faculdade funerária em São Francisco e chegou à
precisou raspar a cabeça (pois a família queria guardar o cabelo
conclusão de que “quanto mais eu aprendia sobre a morte e a
de lembrança), e atividades como lubrificar uma mão para
indústria da morte, mais a ideia de outra pessoa cuidando dos
tirar a aliança, remover marca-passos para não explodirem
cadáveres da minha família me apavorava”. Essa consciência
no forno crematório, moer ossos em um liquidificador de
a estimulou a fundar sua própria casa funerária, a “Undertaking
metal, inserir tampas espinhosas embaixo das pálpebras para
LA”.
os olhos ficarem fechados e barbear mortos. São ações que
CONSCIÊNCIA FUNERÁRIA
incitam um dilema comum aos trabalhadores desse ramo: “Eu não tinha certeza se Byron era um ‘ser’ ou uma ‘coisa’ (um
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corpo), mas parecia que eu devia ao menos saber o nome dele para executar um procedimento tão íntimo”, escreve. A autora oferece uma revisão histórica da morte, como o surgimento do embalsamamento, da cremação, dos cemitérios modernos, a higienização do processo do morrer com a transferência dos moribundos das casas aos hospitais, os ritos fúnebres nas diversas culturas –a tribo brasileira Wari que comia seus mortos, os budistas tibetanos que deixam os corpos ao ar livre para serem devorados por entidades celestiais (os urubus) e o costume fúnebre da ilha de Java, na 22
Indonésia, de abraçar e lavar cadáveres.
Em entrevista à Folha, Doughty conta que a “Undertaking LA”
Ela relaciona o tabu da morte com o do sexo: “Enquanto o
é a única casa funerária sem fins lucrativos de Los Angeles, e
sexo e a sexualidade eram o tabu central do período vitoriano,
afirma se preocupar em envolver as famílias nos cuidados com
a morte e o morrer são o tabu do mundo moderno”. E cita
seus mortos. Ela organiza, por exemplo, workshops para os
o antropólogo britânico Geoffrey Gorer, “nossos bisavós
clientes saberem o que exatamente é feito com os cadáveres.
ouviram que os bebês eram encontrados embaixo de arbustos
“Eu não concordo com os funcionários do ramo (tanatopraxistas,
de groelha ou de repolhos; nossos filhos provavelmente vão
patologistas, funcionários do crematório) somente lidarem
ouvir que os que faleceram (...) viram flores ou descansam em
com os corpos mas nunca com suas famílias. Se você ignorar
lindos jardins”.
os vivos, a família enlutada, você pode perder de vista o fato de
O envolvimento profissional de Doughty com a morte surgiu
que cada corpo representa um ser humano com uma história”,
da tentativa de superação de um trauma de infância. Aos oito
conta.
anos, ela presenciou uma garotinha cair para fora da escada
Doughty relaciona os problemas da sociedade moderna
QUANTO R$ 49,90 (256 págs.)
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público em geral –os bastidores da morte.
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CAPA |
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Turismo no Cemitério
do Bonfim
por Renata Abritta
contou com a presença de alguns historiadores, entre eles a
Necrópole mais antiga de Belo Horizonte possui inúmeras obras elaboradas por artistas de renome
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Trata-se de um passeio repleto de história, arte e cultura, que
projeto. “O cemitério do Bonfim faz parte do planejamento
entrou para o circuito turístico da capital. O local mais parece
da cidade. Por 50 anos após sua inauguração ele foi a única
um museu à céu aberto, mas é o Cemitério do Bonfim! Ele
necrópole de BH e, por isso, reúne um número expressivo de
foi construído no bairro Bonfim no século XIX para receber
figuras importantes das famílias tradicionais que viviam aqui”,
os primeiros moradores finados da capital mineira. Com a
conta Marcelina, que também é professora. Em princípio, o
morte da filha de um dos construtores da cidade, a necrópole
público esperado era de estudiosos, mas o sucesso foi tão
acabou por ser inaugurada antes mesmo de Belo Horizonte,
grande que, hoje, é preciso garantir a vaga com antecedência.
em fevereiro de 1897.
Raul Soares, Olegário Maciel, Padre Eustáquio e Irmã Benigna são alguns nomes que podem ser encontrados nas
A visita guiada é gratuita e mensal, coordenada pela Fundação
lápides. O corpo da Irmã Benigna não está mais lá, mas as
Municipal de Parques em parceria com a Universidade do
pessoas continuam deixando bilhetes com pedidos e placas
Estado de Minas Gerais, Escola de Design. No dia em que fui,
com agradecimentos pela graça concedida. Pessoas menos
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Marcelina Almeida, pesquisadora envolvida e idealizadora do
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famosas também enriquecem a diversidade do cemitério. Lá
mais, um número maior de visitantes. “É uma oportunidade de
estão sepultados o escoteiro Caio Martins, os militares mortos
conhecer um pouco mais da história da cidade, das pessoas
em combate na revolução de 1930 e um hermafrodita anônimo
que foram enterradas aqui, dos artistas que trabalharam nas
que suicidou ao ser pressionado por um médico a optar por um
obras e nos túmulos e do significado que tinha a celebração
de seus sexos, conforme está escrito sobre seu túmulo, que é
da morte no século XIX”, diz a visitante Mayara Tavares. Vale
muito simples e até precário – e eu esqueci de fotografar.
muito à pena a visita! Amei!
Patrimônio: Por receber pessoas de todas as classes sociais, religiões e nacionalidades, os jazigos foram trabalhados de forma a destacar as crenças e condições sociais de cada família. As mais tradicionais investiam em grandes túmulos de mármore rebuscados com esculturas de artistas de renome como Lucy Serpa de Andrade, Ettore Ximenes, L. Galante, Bottaro, Carlos Simi Stor, Formenti e Jeanne Louise Milde. Um dos jazigos está estimado em R$ 400 mil reais.
Com tanta história e arte, o cemitério será, em breve, tombado como patrimônio da humanidade. “Quando entramos no cemitério, já percebemos seu valor cultural e artístico. A impressão que temos é de que estamos em um museu. O cemitério já está em processo avançado de tombamento”, afirma Karine Paiva Silva, presidente da Fundação de Parques Municipais. O edifício do necrotério já foi tombado pelo IEFHA/ MG em 1977.
O cemitério oitocentista está repleto de curiosidades. Ele é cenário, inclusive, de uma das famosas lendas urbanas de Belo Horizonte: a Loira do Bonfim. Cada um conta uma estória sobre ela, resumindo todas as versões, trata-se de uma loira que pegava caronas para sua casa, e o destino era o cemitério. Mais ou menos assim.
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A LOIRA DO BONFIM
Com tantos atrativos, a necrópole está atraindo, cada vez 25
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ACONTECEU EM MG |
Novo cemitério de Montes Claros dá fim à falta de locais para enterros
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Começa a funcionar nesta segunda-feira o novo cemitério de
de que “ninguém quer cemitério perto de casa”. Na gestão
Montes Claros, construído por uma empresa particular após
anterior, quando a questão da falta de vagas nos cemitérios
vencer licitação para concessão pública feita pela prefeitura. O
Bonfim e Parque Jardim da Esperança se agravou, foi iniciada
Cemitério Parque dos Montes Claros foi inaugurado na manhã
a construção de um outro cemitério municipal, perto da
deste sábado. O empreendimento põe fim à falta de local
Estrada da Produção, a cinco quilômetros da área urbana.
para sepultamentos na cidade, que já dura mais de 20 anos.
Mas, houve denúncia de irregularidades na licitação e a obra
Ao longo desse período, os ocupantes da cadeira de prefeito
não foi concluída.
sempre procuraram “paliativos”, tentando ampliar o espaço para os sepulcros, com “puxadinhos” nos atuais cemitérios
No início da atual administração, foi feito um “puxadinho”
do município: Bonfim e Parque Jardim da Esperança,
no Cemitério do Bonfim, sendo usada uma parte do terreno
administrados pela prefeitura.
do estacionamento para a implantação de novas covas. Para solucionar de vez o problema, a Prefeitura decidiu fazer a
A demora na solução do problema foi decorrente do fato de os
concessão publica para a construção de um novo cemitério,
prefeitos evitarem desgaste político com a escolha do local na
por intermédio de licitação publica. O Cemitério Parque
cidade para a construção do cemitério, diante do pensamento
dos Montes Claros, localizado na região de Facela, a cinco
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Por mais de 20 anos, cidade no Norte de Minas sofreu com a superlotação de cemitérios
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ACONTECEU EM MG |
quilômetros da área urbana, foi construído em um prazo de
vão pagar pelos terrenos, tendo que, para isso apresentar
seis meses.
documentação da condição de pobreza junto à Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social.
O empresário Gilberto Gualter dos Santos, diretor da empresa responsável pela construção do Cemitério Parque dos Montes,
O empresário também disse que, independente de terem ou
disse que o empreendimento, em sua primeira etapa, conta
não o dinheiro para o pagamento, as famílias terão direito
com espaço mínimo para 30 mil sepultamentos, que pode
a fazer os enterros do mesmo jeito. A partir daí, terão o
chegar até 90 mil covas, tendo em vista que cada sepulcro
prazo de três anos para decidirem pela compra ou não dos
pode até três gavetas (três corpos). Desta forma, o problema
jazigos. Obrigatoriamente, deverão pagar somente a taxa de
da falta de um local para os enterros está resolvido pelos
sepultamento, de R$ 139,00. Os preços da compra do terreno
próximos 40 ou 50 anos, tendo em vista que, atualmente, são
no novo cemitério é de R$ 2.429,00 (três gavetas), R$ 1,590,00
realizados no município em torno de 1,8 mil sepultamentos
(duas gavetas) e R$ 800,00 (uma gaveta). A família tem prazo
por ano (médias de 150 por mês e de cinco a seis por dia),
de até 12 meses para quitar o pagamento.
segundo a Secretaria Municipal de Serviços Urbanos. (oto: Luiz Ribeiro/EM/DA Press Gilberto Gualter informou que, embora o empreendimento seja particular, por obediência ao edital da licitação que possibilitou a concessão do serviço, os sepultamentos continuarão sendo feitos da mesma maneira como são os enterros nos cemitérios
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administrados pela prefeitura. Assim, as pessoas carentes não
6ª edição do Uaiktoberfest celebra a cerveja artesanal em Nova Lima
Um dos maiores eventos de cerveja artesanal de Minas Gerais,
visitantes receberão uma caneca para degustar os mais
o Uaiktoberfest, chega a Nova Lima nos dias 21, 22 e 23 de
variados tipos de cerveja. As crianças, por sua vez, poderão
outubro com muitas novidades e atrações para o público. A 6ª
se divertir a valer no Espaço Kids. O evento ainda vai contar
edição do evento apresenta uma parceria com os restaurantes
com palestras, cursos e bate-papos informais com os próprios
Nova Gourmet e Neckartal, que serão os responsáveis por toda
produtores.
área gastronômica.
Ao todo, 16 cervejarias já estão confirmadas, entre elas a
Segundo um dos idealizadores do evento, Marcelo Vaz, este ano
Backer, Colder, Krug Bier, Walls, Bestem, entre outras. Além
será uma edição para marcar o calendário mineiro. “Este ano
disso, o evento oferece um espaço especial para as crianças
estamos investindo na mudança do espaço, que acreditamos
se divertirem.
será muito melhor para as pessoas curtirem o evento, e para os
Shows regionais e grandes destaques como as bandas Seu
expositores. Teremos estacionamento, conforto, boas cervejas
Madruga, Cash, Odete Roitmans, Beirakaos, Cogumelus, Guns
e boa gastronomia”, afirma Vaz.
Cover, Doctor Ray, Tarjados, Maverick, Dinasty, Geoharri, OTN,
Neste ano, dois palcos serão montados para receber as
Bicho Grilo, e a JPG prometem animar o público.
atrações musicais que têm como destaques os roqueiros
Serviço:
Lobão e Arnaldo Brandão e Banda Hanói Hanói. Além destes,
Local: Clube do Sindicato dos Mineiros de Nova Lima ( Rua
shows locais de rock e jazz também prometem embalar o
Renato Azevedo nº 1 Honório Bicalho Nova Lima/MG)
público durante os três dias de festa.
Horários: Sexta, 21 de outubro: 18h às 00h – Sábado e
A estrutura do evento vai contar com uma vilinha alemã
domingo, 22 e 23 de outubro: a partir de meio dia até as 00h.
cênica, onde serão comercializados produtos típicos, doces e
Pontos de venda: Central dos eventos e Sympla
lembrancinhas. Além disso, serão oferecidos dois restaurantes
Valores dos ingressos: Passaporte R$ 20 todos os dias. R$
(de comidas alemã e mineira), além das tradicionais
10,00 cada dia.
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ACONTECEU EM MG |
barraquinhas de petiscos. Conforme manda a tradição, os 30
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