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Sou a "miúda das causas", sempre o fui

“Tinhas três anos e já folheavas as páginas do jornal” - dizia-me o meu tio. E que saudades tenho dele...

O meu nome já sabem, a idade também. O resto

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gostava de vos contar calmamente durante um

café ou um almoço. Na impossibilidade de tal, estas palavras terão de servir.

Provavelmente, alguns de vocês sabem que venho de uma pequena terra, Crestuma. Uma vila encantadora perdida no sul de Gaia, por onde passa o Douro, esse belo rio. Foi precisamente aí que passei toda a minha infância. Foi aí que comecei a estudar, que fiz os meus primeiros amigos, foi aí que tive os meus primeiros contactos com a sociedade. Tarefa essa muito facilitada pelo convívio que sempre fui tendo com os clientes do café da minha mãe. Era eu bebé e a senhora Fátima e o senhor Henrique já me pegavam ao colo e brincavam comigo, quando vinham tomar o seu café diário.

Posso dizer que fui uma criança feliz, seria ingrata se não o dissesse. Cresci numa família que me deu tudo, às vezes várias dores de cabeça, mas gosto deles e eles de mim.

Tinha cinco anos e já cantava e dançava ao som de Pink Floyd, sempre que o meu pai punha o concerto deles na televisão. É a cultura, a arte e o saber que despertam em mim uma paixão que não consigo explicar. Não há qualquer dúvida, portanto, que o momento em que mais me senti eu mesma, foi no concerto que

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fui assistir do Roger Waters (ex-membro dos Pink Floyd). Sendo que posso afirmar que foi este o momento que me moldou a mim e à minha personalidade. Diria que a melhor forma de me conhecerem seria assistirem a este concerto.

Sou a "miúda das causas", sempre o fui. Não me importo que assim me apelidem, por mais piroso que possa soar. Algumas das minhas lutas são pessoais, outras puramente motivadas pelo desprezo que tenho por injustiças sociais.

Gostei particularmente da minha passagem pelo colégio, pois permitiu-me estimular este meu lado intervencionista, assim como fazer vários amigos que pretendo manter por longos anos.

Sou uma pessoa muito ambiciosa e sonhadora face ao pessimismo que me é imposto pela sociedade. Revejo-me nas simples palavras de Fernando Pessoa, “Matar o sonho é matarmo-nos. É mutilar a nossa alma. O sonho é o que temos de realmente nosso, de impenetravelmente e inexpugnavelmente nosso".

Quanto ao futuro, de muito pouco tenho a certeza. Sei que não vou ser médica - desculpa pai - e muito provavelmente nem engenheira - desculpa mãe. Apenas prometo dar o meu melhor para me sentir feliz e realizada. Não quero casar, muito menos ter filhos, talvez um dia venha a mudar de ideias (provavelmente não).

Quero estudar em Lisboa, fazer Erasmus em Berlim, ou talvez em Amsterdão. Quero viver em Edimburgo, Barcelona, Bordéus e Tuvalu. Em Crestuma, a minha família é conhecida por "Errante", talvez venha a ser a primeira a fazer jus ao nome.

Não sei quem ou como serei. A minha vida é construída tendo por base a incerteza e a constante e permanente vontade de aproveitar esta curta passagem pelo mundo ao máximo. Percorrer todas as filas da frente de todos os festivais do país, ir ao cinema três vezes por semana, entrar em contacto com todo o tipo de pessoas e experiências é o que quero, o resto vem por acréscimo.

Beatriz Santos

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