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1 Análise de causa-efeito para o desemprego na população refugiada através

6.6 Organigrama da organização social ..............................................111 6.7 Comparação entre diferentes opções de recrutamento .............................115 6.8 Desenvolvimento de um plano de formação .......................................122 7.1 Uma perspetiva sobre as estratégias financeiras nas organizações sociais ...........128 7.2 Ilustração da análise do peso das diferentes fontes de rendimento para a organização social ........................................................ 131 7.3 Ilustração de análise à evolução do peso relativo de diferentes fontes de rendimento .131 7.4 Intervenientes no processo de crowdfunding .......................................141 7.5 Fontes de financiamento e estágio de desenvolvimento da iniciativa social ...........143 7.6 Ilustração da análise à evolução dos resultados da iniciativa social ..................143 8.1 Etapas para a elaboração de um plano de comunicação ...........................152 8.2 Elementos para elaboração de uma Persona ......................................155 8.3 Características de uma boa história ..............................................158 8.4 Canais digitais ................................................................162 8.5 Funil do marketing digital .......................................................163 8.6 Fontes para obtenção de informação regular sobre o público-alvo ...................164 9.1 O processo de geração de desempenho ..........................................169 9.2 Processo de ajustamento dinâmico na gestão das organizações sociais ..............170 9.3 Processo geral para medição de impacto .........................................174 9.4 Modelo de gestão estratégica através do Balanced Scorecard . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .182 9.5 Proposição do mapa estratégico simplificado para o CEC/CCIC .....................185 9.6 Ilustração gráfica do desempenho obtido .........................................188 11.1 Análise de causa-efeito para o desemprego na população refugiada através do diagrama invertido de Ishikawa ...............................................204

LISTA DE SIGLAS

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BSC – Balanced Scorecard CCIC – Câmara de Comércio e Indústria do Centro CEC – Conselho Empresarial do Centro CF – Crowdfunding CMVMC – Custo das Mercadorias Vendidas e Matérias Consumidas FSE – Fornecimento e Serviços Externos IRC – Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas OIM – Organização Internacional para as Migrações RH – Recursos Humanos ROI – Return On Investment SEM – Search Engine Marketing SEO – Search Engine Optimization SROI – Social Return On Investment

Introdução

Vivemos num mundo onde as pessoas mais frágeis e desfavorecidas são as mais afetadas pelos impactos das decisões políticas (guerras e as constantes ondas de refugiados), das crises económicas (desemprego e inflação que aumentam a pobreza) e das mudanças sociais (exclusão no acesso às novas tecnologia e a bens de primeira necessidade). Vivemos numa época em que os problemas sociais como a fome, a pobreza ou a falta de uma habitação digna estão frequentemente associados aos mais desfavorecidos, como os toxicodependentes, os desempregados, as vítimas da violência doméstica, os sem-abrigo ou os refugiados, que todos os dias figuram nas primeiras páginas dos jornais ou abrem os noticiários nas televisões.

As respostas do Estado aos problemas acima enunciados não são suficientes, pois os recursos são sempre escassos, mas a sociedade civil mobiliza-se todos os dias para complementar o apoio do Estado e dar resposta aos novos problemas sociais que surgem.

Por isso, os empreendedores sociais são confrontados no seu quotidiano com desafios variados, o que exige um conjunto de competências indispensáveis (técnicas e psicológicas) para que possam responder com pertinência aos problemas que enfrentam. Nem sempre é fácil ser sensibilizado por um problema social e ter a coragem de reunir um coletivo de pessoas para institucionalizar a resposta sob a forma de um projeto de intervenção social ou chegar mesmo à constituição de uma organização social.

Este manual pretende reunir um conjunto de conhecimentos com fins pedagógicos e empresariais que facilite a elaboração e a gestão de projetos sociais. Neste sentido, a presente obra, composta por onze capítulos, pretende fornecer conselhos práticos para os empreendedores sociais sobre os diversos domínios da criação e gestão de projetos sociais.

O primeiro capítulo fornece as bases teóricas para justificar a necessidade do empreendedorismo social para resolver as falhas que surgem numa economia de mercado como a portuguesa .

O capítulo seguinte elenca os principais problemas sociais, exemplificando como estes podem ser analisados de modo a identificar uma oportunidade para intervenção social .

O capítulo três apresenta os elementos estruturais que vão servir de alicerce à construção da estratégia de intervenção social, como seja a visão, a missão, os valores, os eixos e os objetivos estratégicos.

No capítulo quatro, procede-se à identificação dos recursos necessários à construção do projeto ou organização social, avaliando-se a sua importância e avançando-se com formas específicas de mobilização e manutenção dos recursos críticos .

O capítulo seguinte, carateriza os diferentes stakeholders que podem ser sensibilizados para o projeto, identificando-se o seu contributo e o modo como devem ser geridos os relacionamentos com os vários stakeholders .

O capítulo seis, aborda a gestão dos recursos humanos na organização social, analisando tópicos como a análise e descrição de cargos, o recrutamento, a seleção e, concluindo, com as políticas de manutenção do capital humano .

O capítulo sete trata das questões relativas à gestão dos recursos financeiros referindo-se os possíveis fluxos de rendimentos, a indispensável estrutura de custos para funcionamento regular da organização, bem como o investimento e meios de financiamento.

O capítulo seguinte, refere diferentes metodologias para avaliar o impacto social da intervenção realizada pela organização social, em especial os mapas de valor (value maps), a análise custo-benefício, o retorno social do investimento (social return on investment) e o Balanced Scorecard .

A comunicação nas organizações sociais é analisada no capítulo nove, identificando-se possíveis objetivos, públicos-alvo, principais elementos para o desenho da mensagem, meios de comunicação a afetar e respetivo plano .

O penúltimo capítulo, fornece um guia prático para o desenvolvimento de um projeto social, com vista à angariação de recursos junto de um público que pode ser mobilizado para o projeto, bem como para o estabelecimento de possíveis parcerias .

A finalizar, é apresentado um caso prático que exemplifica as diferentes componentes teórico-práticas tratadas anteriormente no manual e que são aplicadas à construção de um projeto de intervenção ou organização social.

Este manual destina-se a um público abrangente, onde se incluem: professores e estudantes do ensino superior, como ferramenta pedagógica a usar dentro e fora da sala de aulas; responsáveis de instituições sociais, como fonte de inspiração para o desenho e aplicação de estratégias nos diversos domínios da elaboração e gestão de projetos sociais; empreendedores sociais como catalisadores da intervenção da sociedade civil para a mobilização de parcerias que promovam a resolução de problemas sociais .

Os autores

Susana Bernardino José de Freitas Santos

Um espaço para a intervenção na economia social e o empreendedorismo social

1.1 As falhas de mercado

1.1.1 Sobre um cenário de condições de mercado perfeito

Em condições de mercado perfeito os agentes económicos, ao prosseguirem o seu próprio interesse, estão a contribuir para a otimização do valor criado na sociedade. Neste cenário, os mecanismos de mercado, por si próprios, são capazes de conduzir a uma situação de equilíbrio entre o lado da oferta e da procura, uma vez que: i . os agentes económicos terão disponibilidade para produzir um determinado bem ou serviço desde que o preço a receber como contrapartida da transação lhes permita remunerar adequadamente os custos envolvidos na produção. ii . os indivíduos estarão dispostos a comprar esse bem ou serviço desde que a utilidade que o seu consumo lhes proporciona justifique o respetivo preço.

A este ponto de encontro entre a oferta e a procura, conhecido como equilíbrio de Pareto, qualquer reafetação de recursos não permitirá melhorar o bem-estar da sociedade em geral . Por isso, nenhuma reafetação de recursos permitiria o alcance de uma situação mutuamente benéfica para as partes envolvidas.

Neste contexto, não há necessidade de intervenção por parte do Estado ou outras entidades da sociedade civil, uma vez que as forças de mercado seriam suficientes para maximizar o bem-estar da sociedade no seu todo.

1.1.2 As imperfeições de mercado

Os pressupostos para a existência de um mercado perfeito, porém, nem sempre se verificam. Na verdade, na maioria das vezes existem falhas de mercado que levam a que os bens disponibilizados pelos agentes económicos não correspondam ao valor ótimo. Estas falhas de mercado decorrem da existência de externalidades (positivas ou negativas), da natureza específica associada aos bens públicos, da

forte assimetria na distribuição de rendimentos, e da assimetria no acesso à informação (figura 1.1).

Figura 1.1 – As falhas de mercado como fonte de oportunidade para a criação de valor social

Bens públicos

Externalidades Falhas de mercado

Assimetria na distribuição de rendimentos

Assimetria de informação

Fonte: elaboração própria

Capacidade de criar valor para a sociedade no seu todo

As imperfeições de mercado assinaladas têm implicações no comportamento dos agentes económicos, sendo capazes de influenciar a capacidade de produção e/ou consumo de bens. No quadro 1.1 são referidos o conceito, as principais implicações e alguns exemplos das falhas de mercado.

Quadro 1.1- As falhas de mercado e suas implicações para a intervenção social

Falha de mercado Conceito

Áreas em que o preço de um bem ou serviço não é capaz de representar todos os impactos associados à transação. Podem ser:

Implicações Exemplo

Externalidades

Bens públicos

Forte assimetria na distribuição de rendimentos

Assimetrias de informação Externalidades positivas: Há benefícios que não se encontram refletidos no preço definido entre o comprador e o vendedor com base nas leis de mercado Nível de produção (e de consumo) de bens com externalidades positivas inferior ao desejado para a otimização do valor criado Produção têxtil com matérias-primas e métodos de produção sustentáveis e com políticas socialmente responsáveis de contratação de colaboradores

Externalidades negativas: Há outros custos/prejuízos que não se encontram refletidos no preço definido entre o comprador e o vendedor com base nas leis de mercado Nível de produção (e de consumo) de bens com externalidades negativas superior ao desejado para a otimização do valor criado Empresas têxteis com métodos de produção ambientalmente agressivos e com condições de trabalho extremamente precárias

Áreas em que após a sua produção todos os indivíduos poderão usufruir dos seus benefícios, não sendo possível excluir o seu consumo por parte dos indivíduos que não paguem o produto ou serviço Nenhum consumidor racional estará disposto a pagar por um bem de que poderá usufruir gratuitamente, pelo que a iniciativa empresarial não terá qualquer incentivo económico à produção e disponibilização desse bem Iluminação pública, segurança nacional, qualidade ambiental e biodiversidade do ecossistema

A existência de fortes desigualdades na sociedade leva a que determinados segmentos da população, embora careçam de certos bens, não tenham capacidade financeira que lhes permita pagar um preço que cubra os respetivos custos, apesar dos fortes benefícios (sociais) que o bem é capaz de proporcionar Não concretização de uma transação capaz de criar valor ou nível de atividade disponibilizada pelo mercado insuficiente pelo facto de ser considerada não atrativa pela iniciativa privada Formação superior para famílias com fortes carências económicas

Tratamentos de saúde para famílias com fortes carências económicas

Situação em que uma das partes envolvidas numa transação possui, quantitativa ou qualitativamente, mais informação do que os restantes elementos envolvidos Em situações em que os consumidores não estão bem informados em relação à qualidade de um serviço, a sua qualidade é de difícil mensuração ou a transação envolve serviços pessoais complexos, os consumidores procuram minimizar os riscos e incertezas envolvidos na transação, preferindo as organizações que lhe pareçam mais credíveis Prestação de cuidados de saúde

Fonte: elaboração própria

1.1.3 Novas respostas face à ausência de mercados perfeitos

Na ausência de mercados perfeitos, um modelo estritamente dependente dos mecanismos de mercado nem sempre consegue alcançar uma situação de maximização do valor para a sociedade, o que justifica a intervenção dos governos e o surgimento de iniciativas por parte de outras entidades .

A intervenção dos governos ocorre para atenuar ou corrigir as ineficiências do mercado, passando a assegurar a provisão de determinados bens e serviços com o intuito de colmatar as falhas do mercado (Estado de Bem-Estar Social). Os impostos cobrados aos agentes económicos são desta forma redistribuídos às pessoas e às famílias .

No entanto, a resposta do Estado nem sempre é suficiente, sendo os recursos que este tem à sua disposição escassos para o conjunto de funções para o qual é solicitado. O desajustamento entre a oferta e a procura de bens sociais revela uma capacidade de resposta insuficiente para resolver os problemas sociais vigentes (figura 1.2).

Figura 1.2 – Racionalidade económica para a emergência de iniciativas sociais

Existência de mercados imperfeitos

• Externalidades e bens públicos • Forte assimetria na distribuição de rendimentos • Assimetria de informação

Inexistência de mercado Mercado com falhas funcionais

Atuação por parte do Estado

• Fornecimento de bens públicos; • Regulação, correção de falhas de mercado; • Atuação como player no mercado; Falha Necessidades sociais

OPORTUNIDADE SOCIAL

Iniciativas sociais

Fonte: elaboração própria

É sobretudo a partir das décadas de 70/80 que a chamada “outra economia”, ou economia social, começa a ganhar um papel de destaque na procura de soluções para os problemas sociais que se encontram sem resposta. As organizações da economia social e solidária começam a atuar em áreas que até então eram levadas a cabo exclusivamente pelo Estado Social, tais como serviços sociais, saúde, educação ou ambiente. Estas novas organizações mobilizam indivíduos com o intuito de fornecerem bens que não são disponibilizados em quantidade ou qualidade suficientes, seja pela iniciativa privada seja pelo setor público.

Segundo a teoria da falha institucional, é precisamente na incapacidade por parte das instituições vigentes que reside a razão para a existência de organizações sociais. Neste contexto, o aparecimento e desenvolvimento de organizações sociais e iniciativas de empreendedorismo social é justificado por alterações contextuais e institucionais que conduziram a um desajustamento entre o nível da oferta e da procura social e por ineficiência no fornecimento de bens sociais.

Estas novas estratégias prosseguidas pelo setor público, privado e social centram-se não apenas nos problemas sociais ao nível nacional, mas também em problemas das comunidades locais, onde a proximidade das instituições sociais é muito importante para identificação e avaliação dos problemas e para aumentar a eficiência das ações a serem desenvolvidas . De facto, estas iniciativas sociais emergem de uma forma local e ajustada às especificidades das necessidades com que uma determinada população se depara, através de processos bottom-up, que englobam o contributo das comunidades locais para a exploração de oportunidades que permitam resolver ou pelo menos atenuar os desequilíbrios evidenciados, bem como produzir impacto social, tirando partido dos recursos e capacidades endógenos. Estas ações estão em geral associadas ao dinamismo do sistema social, à vitalidade do ecossistema local (formal e informal) e ao surgimento de novas formas de intervenção adotadas pelas instituições locais .

Porém, estas organizações da sociedade civil também se têm deparado com importantes alterações e desafios ao longo dos últimos tempos, que as obrigaram a ser mais eficientes e a adotar uma postura mais empreendedora na forma como ajudam a resolver os problemas sociais. Deste modo, a adoção de um novo paradigma na gestão destas organizações, que alia um comportamento empreendedor a uma orientação para o bem-estar social, emerge como resposta aos problemas sociais complexos que permanecem negligenciados ou sem uma solução eficaz.

1.2 O empreendedorismo social e a criação e gestão de organizações sociais

Dada a existência de problemas/desafios sociais que permanecem por resolver, atores organizados, preocupados com essas questões sociais, têm criado instituições que permitam atenuar o problema identificado e satisfazer os interesses da sociedade em geral ou um subsegmento desta .

Estes bens ou serviços irão ser disponibilizados ou comercializados (consoante a estratégia seguida pela organização), de forma a permitir criar valor social junto do público-alvo do projeto. Neste sentido, é criado valor social quando os recursos, processos ou políticas são combinados para gerarem melhorias nos indivíduos ou na sociedade no seu todo. Quando assim é, estamos perante a criação de valor social, aumentando dessa forma a sua utilidade para os membros da sociedade, depois de contabilizados os recursos utilizados no desenvolvimento da atividade social. O conceito de criação de valor social envolve, assim, um comportamento virtuoso, objetivos altruístas e a promoção de atividades com um propósito social.

O empreendedorismo social é visto sobretudo como uma nova abordagem à criação e gestão das organizações sociais que visa e aplica um comportamento empreendedor à área social. A conjugação de uma dimensão ‘social’ com uma dimensão ‘empreendedora’ num mesmo modelo organizacional procura sinergias que amplifiquem a capacidade geral de criação de valor e o impacto para a sociedade. Mantendo a missão social explícita e central, estas organizações incorporam uma visão empreendedora e económica com o intuito de aumentar a eficácia, eficiência e viabilidade das suas operações. A originalidade deste novo enquadramento reside precisamente em combinar a eficiência dos mercados, que o setor privado prossegue, com a orientação para o bem-estar inerente ao setor social .

Figura 1.3 - Modus operandi de uma organização social

ORGANIZAÇÃO SOCIAL

RECURSOS

ATIVIDADES ORGANIZACIONAIS

BENS OU SERVIÇOS

CRIAÇÃO DE VALOR SOCIAL

Fonte: elaboração própria

Uma iniciativa social é, então, entendida como a organização ou entidade onde são adotadas técnicas e práticas empresariais com o intuito primário de criação de valor social e de impacto social positivo e sustentado para a sociedade (figura 1.3). Neste sentido, o conceito de organização social diz respeito à unidade organizacional onde são cristalizadas as atividades necessárias à disponibilização dos produtos e/ou serviços que são utilizados como veículo de criação de valor social junto de um determinado público-alvo e à prossecução da missão social para a qual a iniciativa foi constituída.

Apesar de a prossecução de fins sociais não implicar necessariamente a criação de uma nova organização, é necessário algum suporte institucional. A organização social será, assim, a unidade em que ocorre a agregação de um conjunto de recursos, com o intuito de criar valor social, e onde se potencia a criação de sinergias que de uma forma individual não seria possível. A criação de uma resposta social através de uma organização permitirá aumentar os resultados que é possível alcançar, aumentando o número de soluções que serão tecnicamente possíveis. Para além disso, a posse de personalidade jurídica poderá conferir alguns benefícios, nomeadamente em termos de acesso a apoios existentes, bem como legitimidade/confiança que a organização é capaz de alcançar junto da comunidade em que irá atuar.

O papel da gestão será o de articular a mobilização e aplicação de recursos em atividades que sejam conducentes à criação de valor social, de forma a otimizar o resultado (social) que a organização é capaz de alcançar. Aliado ao desejo de resolução de um problema social, importará encontrar e implementar um modelo de negócio (social) inovador, através de uma construção multidimensional, que envolve a expressão de um comportamento empreendedor para o alcance de uma missão social. Este comportamento empreendedor é entendido como uma atenção para com as forças de mercado e a tudo o que rodeia a iniciativa (o contexto). Traduz, ainda, uma forte preocupação em termos de eficácia, eficiência e transparência, bem como sustentabilidade e autossuficiência económica. A missão social é explícita e central para este tipo de iniciativas, em função da qual deverão ser mobilizadas todas as atividades e recursos da organização. Não obstante, a inclusão de uma vertente económica é também importante, ainda que considerada instrumental uma vez que é utilizada como um meio de suporte para a construção de uma resposta social duradoura, que potencie a continuidade do exercício da missão social da organização. De facto, a debilidade financeira da organização poderá resultar na incapacidade de esta prosseguir os seus programas e, por esse motivo, comprometer a maximização do valor social criado.

Não será pelo facto de as organizações sociais não terem, amiúde, finalidade lucrativa que leva a que a sua gestão não seja relevante. Pelo contrário, a gestão destas entidades será fundamental para que possa haver uma otimização do impacto que estas são capazes de alcançar na sociedade, através de respostas mais eficientes, bem como pelo desenvolvimento de novos programas para os seus utilizadores e/ou alcance de um maior número de utentes, através das estratégias de crescimento prosseguidas .

1.2.1 Especificidades na gestão de iniciativas sociais

As iniciativas sociais constituem uma realidade com características muito próprias, uma vez que integram, na sua génese, uma dimensão social e económica. As organizações sociais conjugam, por isso, lógicas distintas, por vezes concorrentes, que moldam as dinâmicas internas das organizações, os seus valores, regras e ações. Por esse motivo, as organizações sociais são reconhecidas como um campo aberto, pluralista, regido por múltiplas linhas de fundo e híbrido por excelência, que potencia a aplicação de práticas gestionárias heterogéneas.

De seguida apresentam-se algumas das principais peculiaridades que caracterizam as iniciativas sociais: (i) missão e objetivos; (ii) criação e apropriação de valor; (iii) quadro legal; (iv) papel dos stakeholders e fronteiras organizacionais; e (v) gestão de recursos e estratégias de geração de rendimento.

Missão e objetivos

A missão é um dos principais elementos caracterizadores das organizações sociais. A missão destas organizações é social, explícita e central. Constitui um elemento importante na identidade destas iniciativas, representando a pedra angular em torno da qual serão construídas as suas estratégias, políticas e abordagens. A missão (social) irá afetar o modo como as oportunidades de criação de valor (social) são percecionadas, avaliadas e exploradas, através da estratégia de intervenção prosseguida .

Apesar de não haver um consenso claro sobre aquilo que é uma ‘missão social’, existe a ideia generalizada de que esta contém um desejo de beneficiar a sociedade ou contribuir para o seu bem-estar. Uma missão social diz, assim, respeito à intenção de se prosseguir uma consequência benéfica, esperada e previsível, para um grupo externo à organização.

Para a prossecução da sua missão, as iniciativas socialmente empreendedoras terão que definir a sua estratégia e os objetivos que orientam os esforços dentro da organização. A adoção de uma orientação empresarial leva à necessidade de definição de metas de longo, médio e curto prazo. A pretensão de se criar não só valor social como também um impacto social sustentado e duradouro implica o desenvolvimento de um modelo de negócio que seja financeiramente sustentável. A inclusão de objetivos económicos é assim interpretada como um meio para a prossecução do fim que é a criação de valor social, favorecendo a sustentabilidade da organização e a continuidade da sua missão social. Nessa medida, a criação de valor económico é vista como um subproduto da atividade socialmente empreendedora, considerada instrumental para o alcance da sustentabilidade e autossuficiência da organização.

Criação e apropriação de valor

O valor é criado quando a utilidade percebida dos membros de um grupo aumenta depois de descontados os respetivos consumos de recursos .

A apropriação de valor, por sua vez, ocorre apenas quando o ator em questão é capaz de reter uma parte do valor criado. Esta apropriação de valor permite que uma organização seja capaz de assegurar (financiar) o desenvolvimento das suas atividades, viabilizando a sua sustentabilidade no futuro.

As iniciativas sociais visam a maximização do valor que são capazes de criar. Todavia, a sua capacidade de apropriação de valor é limitada, pois o valor social criado irá ser absorvido pela sociedade no seu todo ou por um segmento desta . A capacidade de apropriação do valor económico dependerá do formato jurídico da organização. Quando as atividades ocorrem dentro do âmbito das organizações sem fins lucrativos, estas deverão apropriar-se apenas do valor que lhes seja suficiente para assegurar as suas operações e investimentos em projetos futuros que permitam aumentar o valor social criado. Se se conceber o empreendedorismo social no âmbito das organizações com fins lucrativos, a capacidade de captura do valor económico será maior. Ainda assim, como a missão social é central, a retenção de valor será sempre relativamente limitada .

Quadro legal

As organizações são unidades construídas com o intuito de alcançarem determinados objetivos. Muito embora não sendo pessoas, as organizações, constituídas por escritura pública, ou por outro meio legalmente admitido, gozam de personalidade jurídica. A posse de personalidade jurídica traz consigo a suscetibilidade de serem titulares de direitos e obrigações . Em Portugal, a Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 82.º, consagra a existência de três setores de atividade: o setor público; o setor privado; e o setor cooperativo e social, no qual tipicamente são constituídas as iniciativas sociais. Em Portugal, este setor é bastante heterogéneo e diversificado, envolvendo uma grande variedade de organizações e formas jurídicas legais, tais como associação de solidariedade social, associação com fins altruísticos que atuem no âmbito cultural, recreativo, do desporto e do desenvolvimento local, associação mutualista, cooperativas, fundações, instituição particular de solidariedade social não abrangidas pelas alíneas anteriores, misericórdias, bem como outras entidades dotadas de personalidade jurídica que respeitem os princípios orientadores da economia social, tal como preconizado na Lei de Bases da Economia Social (Lei n.º 30/2013).

O papel dos stakeholders

As organizações sociais encontram-se inseridas num conjunto de entidades com as quais, de uma forma direta ou indireta, se relacionam. Esse conjunto de entidades é designado como stakeholders (em português “parte interessada”),

que consiste em qualquer grupo ou indivíduo que é afetado ou pode ser afetado pelo alcance dos objetivos de uma organização. Toda a teoria associada à gestão dos stakeholders sugere que as organizações têm que ser geridas de acordo com as necessidades e interesses, por vezes conflituantes, de todos os stakeholders relevantes para a organização. Por conseguinte, a sua atuação traduz-se numa estratégia sustentada, numa filosofia de parceria, na qual se procura a satisfação simultânea das várias partes interessadas da organização.

Nas iniciativas sociais o relacionamento com os stakeholders é particularmente complexo. O caráter híbrido das organizações socialmente empreendedoras resulta num número alargado e heterogéneo de stakeholders, provenientes de diversos setores de atividade e com expectativas diferentes em relação à organização. Acresce que a criação de soluções sustentáveis requer, amiúde, a colaboração dos vários stakeholders, que incorporam o seu conhecimento e experiências na discussão de um modelo que permita a resolução de questões sociais de forma mais inovadora, completa e multifacetada. Para além disso, tendo em conta que o valor criado é essencialmente apropriado fora das fronteiras da organização, estas não têm qualquer incentivo económico para concorrerem entre si, impondo-se, com frequência, a colaboração entre organizações que pretendem fazer face a um mesmo problema social . Como tal, a adoção de uma governança multistakeholder, a capacidade de criação de parcerias estratégicas e de cooperação de longo prazo são elementos potenciadores do sucesso das iniciativas sociais .

Gestão de recursos e estratégias de geração de rendimento

As organizações sociais aspiram a alcançar uma situação de autossuficiência financeira, embora o preço que são capazes de cobrar pelo bem ou serviço que disponibilizam aos utilizadores seja frequentemente exíguo para suportar a sua estrutura de custos, o que conduz a uma situação de dependência financeira, como comummente acontece na maioria das organizações sem fins lucrativos. Para financiar a escassez de rendimentos, as organizações recorrem, sobretudo, a donativos ou subvenções que lhes permitem manter as suas atividades. Porém, uma forte dependência de donativos traduz-se numa maior vulnerabilidade da organização social, na medida em que a impede de atuar de uma forma concertada no longo prazo e de prosseguir, de uma forma adequada, a sua estratégia. Nessa medida, as organizações sociais necessitam de aplicar um comportamento verdadeiramente empresarial na mobilização e gestão dos recursos.

Na figura 1.4 sistematizam-se as principais especificidades que as iniciativas sociais apresentam .

Figura 1.4 – As especificidades das iniciativas sociais

Missão e Objetivos

Missão social explícita e central

Objetivos sociais e económicos

Objetivo central: valor social Objetivo secundário: valor económico

Gestão de recursos e estratégias de geração de rendimento

Ambiente de escassez de recursos

Necessidade de adoção de um comportamento empreendedor para promover a autonomia e autossuficiência

Criação e apropriação de valor

Foco: maximização do valor criado Limitada apropriação do valor criado Quem se apropria do valor criado? Essencialmente população-alvo A organização apropria o valor mínimo para a prossecução da missão

O papel dos stakeholders

Relacionamento com uma vasta quantidade e heterogeneidade de stakeholders Gestão participativa e inclusiva Fonteiras permeáveis e porosas

Fonte: elaboração própria

Quadro legal

Espetro legal envolve uma grande variedade de tipologias e formas jurídicas

Problemas sociais e exploração de oportunidades sociais

2.1 As motivações para o empreendedorismo social

A teoria do comportamento planeado de Ajzen (1991) refere que as intenções são um excelente preditor do comportamento humano, reconhecendo-se o papel da motivação, quer ao nível da criação de novas iniciativas, quer ao nível dos comportamentos posteriores ao desencadear da iniciativa. De facto, as organizações sociais surgem geralmente da iniciativa de um indivíduo ou conjunto de indivíduos que decidem atuar perante um problema a que gostariam de dar resposta, com os quais se encontram comprometidos e junto dos quais pretendem atuar.

A criação de uma iniciativa social surge da concretização de uma manifestação de uma postura pró-social, para com uma determinada comunidade e/ou problema social, com o qual os indivíduos se encontram sensibilizados e pretendem resolver ou pelo menos atenuar o problema .

A motivação para atuar resulta muitas vezes da exposição a um determinado problema social, que leva um indivíduo ou conjunto de indivíduos a procurar soluções para esse mesmo problema, bem como devido à sua sensibilidade para questões sociais. Outras vezes, a motivação desencadeia-se por via da sua história pessoal, de uma experiência social singular ou da pertença a um grupo que a organização social visa servir.

O compromisso com uma questão social emerge, amiúde, como um sentimento de afetividade emocional e de responsabilidade para com uma causa, atuando como catalisador no desenvolvimento das crenças individuais . Neste caso, os promotores da iniciativa social sentem-se preocupados ou insatisfeitos com as respostas existentes para os problemas sociais que encontram na sua família ou comunidade, sendo que esta familiaridade poderá ajudar na identificação de oportunidades e na descoberta de uma solução para o problema .

A orientação empreendedora poderá ainda ser explicada pelas crenças e normas sociais que predominam nos círculos próximos (amigos e familiares), que são capazes de influenciar a predisposição para a criação de iniciativas sociais. O mesmo poderá resultar da imitação de papéis-modelo, inspirados a partir de percursos de comportamento semelhantes aos de outros indivíduos que o empreendedor admira e respeita .

Apesar dos objetivos sociais serem centrais à criação de iniciativas sociais, a evidência empírica reconhece a possibilidade de existência de um vasto conjunto de motivações, ainda que de natureza secundária, tais como a realização pessoal e a independência ocupacional, a reabilitação pessoal, a procura de soluções para as angústias/problemas pessoais, ou o sentimento de obrigação para com uma comunidade em virtude de partilharem um problema ou destino comum .

2.2 Um mapeamento dos diferentes tipos de problemas sociais

As iniciativas sociais surgem como uma tentativa da sociedade civil para reagir aos problemas sociais existentes. Várias condições contextuais arrastam consigo uma ‘explosão’ de novos desequilíbrios económicos e problemas sociais, a que um número cada vez maior de organizações sociais procura dar resposta.

Uma forma de captar a diversidade destes problemas pode ser efetuada pela análise do Sistema Português de Classificação Económica das Atividades (CAE Revisão 3), que se baseia no Sistema de Classificação das Atividades Económicas (NACE Revisão 2), que foi adotado pela União Europeia (INE, 2007), bem como pelo Handbook on Non-profit Institutions in the System of National Accounts das Nações Unidas (UN, 2003).

O sistema português de classificação indica 12 áreas sociais de intervenção (Franco et al . 2005; INE & CASES, 2013): 1) cultura e lazer; 2) educação e investigação; 3) saúde; 4) serviços sociais; 5) ambiente; 6) desenvolvimento e habitação; 7) lei, advocacia e políticas; 8) promoção do voluntariado e intermediários filantrópicos; 9) internacional; 10) religião; 11) negócios, sindicatos e associações profissionais; 12) não classificados nas categorias anteriores.

A Carta Social Portuguesa, por sua vez, identifica 7 áreas de atividade de acordo com a população-alvo (beneficiários): 1) crianças e juventude; 2) crianças, juventude e adultos deficientes; 3) pessoas idosas; 4) família e comunidade; 5) pessoas que sofrem de toxicodependência; 6) Pessoas e famílias afetadas pela Sida; 7) outras .

Uma análise da carta social fornece uma lista detalhada das políticas relativas a cada área de atividade, como desordens de natureza mental, pessoas sem-abrigo, violência doméstica e pessoas com incapacidades diversas. Para além disso, a análise de diferentes tipos de questionários administrados por diversas instituições públicas e de investigação permitiu identificar perguntas relacionadas com a identificação das áreas de atividade e dos seus beneficiários.

O quadro seguinte procura sintetizar alguns dos problemas centrais relacionados com as áreas sociais de intervenção (quadro 2.1)

Quadro 2.1 – Mapeamento dos principais problemas sociais

Problema Social Descrição

Ajuda mútua e desenvolvimento da comunidade Formas alternativas de proximidade ou vizinhança de todos os tipos (que vão da igreja e das organizações não lucrativas até às organizações privadas), constituídas para preencher necessidades específicas e promover a ajuda mútua (prestação de serviços no lar a idosos)

Coesão e participação cívica

Ações que aumentam a coesão social e a participação cívica nos diferentes níveis da sociedade (nacional, regional ou local) Cultura e lazer Promoção do lazer e de serviços de recreação, como as artes, a música e o desporto junto das pessoas mais carenciadas

Bem estar económico Pessoas pertencentes a grupos sociais desfavorecidos são normalmente quem tem maiores taxas de desemprego em relação ao resto da sociedade. A maior parte do apoio social está orientado para atenuar a pobreza relacionada com necessidades sociais, exclusão social, desemprego de longa duração e a promoção do desenvolvimento económico.

Habitação e alojamento Educação e aprendizagem ao longo da vida

Formação

Ambiente e sustentabilidade Satisfação das necessidades básicas da população em geral, como a habitação digna e o alojamento de diferentes grupos da sociedade. Aprendizagem ao longo da vida e educação procuram preencher as necessidades educativas em geral e, nalguns casos, as profissionais.

As pessoas que vivem nas zonas urbanas são em geral aquelas que menores rendimentos usufruem pelo seu trabalho ou que trabalham no setor informal da economia e, frequentemente, não têm acesso à formação vocacional. As ações desenvolvidas nesta área estão orientadas para a proteção e prevenção do ambiente, bem como para assegurar a sustentabilidade a longo prazo. Energia, transporte, fornecimento de água às populações estão entre as preocupações desta área.

Direitos civis e igualdade

Inclusão das pessoas na sociedade e no mercado laboral, independentemente do género, raça e incapacidades. Herança cultural As instituições desta área dedicam-se ao estímulo das atividades culturais locais, como artesanato, que promovem a disseminação da herança cultural Saúde e bem-estar (p. ex.: doença, saúde mental, deficiências)

Desenvolvimento internacional Dada a prevalência de pobreza nas comunidades mais desfavorecidas as pessoas frequentemente são confrontadas com falta de condições sanitárias, serviços de educação para a saúde ou a cuidados de saúde, bem como mais expostas a situações como violência, droga, tráfico humano, suicídio e crime. As organizações não-governamentais internacionais fornecem ajuda em todo o mundo contra a fome, assistência aos países em desenvolvimento, situações de guerra e catástrofes naturais.

Atividades religiosas

A maior parte dos serviços religiosos é administrada por igrejas de inspiração cristã que também fornecem e praticam serviços sociais importantes, particularmente ao nível comunitário e local. Acesso à justiça A maior parte das organizações que justiça das pessoas mais pobres. tratam destes assuntos promove o acesso à Bem-estar dos animais Instituições públicas e privadas ao nível local prestam serviços de saúde, abrigo e alimentação a diferentes tipos de animais.

Fonte: elaboração própria

2.3 Problemas sociais: manifestações e causas

A criação de valor de um modo duradouro e sistemático implica que as organizações sociais atuem, numa perspetiva empreendedora, não só sobre as manifestações de um problema social, mas também sobre as suas próprias causas, isto é, sobre os fatores que estão na origem das necessidades ou problemas sociais.

A criação de valor poderá ocorrer de duas formas: • De uma forma direta, através da disponibilização de um produto ou serviço que satisfaça uma necessidade social; • De uma forma indireta, através da sensibilização e consciencialização da sociedade para uma determinada questão social.

A intervenção social poderá também envolver uma alteração do sistema, através da reconfiguração de um conjunto de fatores que estão na origem do problema social. Isto poderá traduzir-se, por exemplo, na capacitação de grupos desfavorecidos, criação de condições de acesso à educação, alteração das estruturas institucionais, acesso a tecnologias da comunicação ou a capital financeiro, entre muitos outros. Ao invés da criação de relações de dependência e de uma provisão unilateral de soluções, importará aspirar à criação das condições que permitam que as pessoas consigam ultrapassar os seus próprios problemas sociais.

Importará por isso, através da iniciativa social, desenvolver uma nova proposição de valor social, que desafia um injusto equilíbrio, forjando a criação de uma nova situação de equilíbrio que assegure um futuro melhor para um segmento de indivíduos ou para a sociedade no seu todo, tal como ilustrado na figura 2.1.

Figura 2.1 – Processo de criação de um novo equilíbrio dinâmico como resposta a um problema social

Equilíbrio existente Empreendedor Ideia Oportunidade Organização Estratégia de intervenção social Novo equilíbrio

Fonte: adaptado de Light (2008)

Um instrumento que permite fomentar o conhecimento das causas que estão na génese de um problema social é a análise causa-efeito, que poderá ser desenvolvida através da aplicação de um diagrama invertido de Ishikawa (figura 2.2). Trata-se de uma ferramenta visual, que auxilia na reflexão sobre as causas que poderão influir sobre a manifestação de um determinado desafio social, permitindo fomentar a realização de brainstorming. Este instrumento de diagnóstico permitirá explorar e organizar as ideias de uma forma mais assertiva.

Categoria

CAUSA Figura 2.2 – Diagrama invertido de Ishikawa

Categoria Categoria

CAUSA

CAUSA

CAUSA CAUSA

CAUSA

CAUSA

CAUSA CAUSA CAUSA

CAUSA PROBLEMA/DESAFIO SOCIAL

Categoria Categoria Categoria

Fonte: elaboração própria

O uso desta ferramenta analítica fornece algumas vantagens . Desde logo, permite que o foco incida sobre as causas e não sobre os sintomas (manifestações) do problema. Atendendo à natureza gráfica desta ferramenta, será possível olhar para as diferentes causas que contribuem para a formação de um desafio social de uma forma lógica e holística, permitindo compreender as diferentes dimensões que concorrem para a formação desse problema, bem como o desdobramento assertivo das causas envolvidas. Para além disso, permite ainda a hierarquização e priorização das causas encontradas.

O desenho do diagrama de causas poderá ser implementado através de três etapas principais, conforme sistematizado na figura 2.3.

Figura 2.3 – Etapas para a construção do diagrama de causa-efeito

PASSO 1 • identificação do problema a analisar (o efeito); • redação da declaração do problema;

PASSO 2

PASSO 3 • Colocação da pergunta “Porquê?", para identificação das principais categorias (causas)

• Continuar a colocar a pergunta “Porquê?", para a criação de subcategorias em torno das categorias identificadas anteriormente (passo 2)

Fonte: elaboração própria

Este exercício poderá ser desenvolvido por recurso a uma estrutura de apoio fornecida pela árvore de problemas (figura 2.4).

Figura 2.4 – Árvore de problemas sociais, diagnóstico de causa-efeito

Porquê Problema social / Desafio social

Causa

Causa Causa

Causa

Causa

Causa Causa

Causa

Fonte: adaptado de Chahine (2016) Causa

A colocação sucessiva da pergunta “Porquê” permitirá explorar as causas e investigar as diferentes razões, incluindo as mais profundas, que estão na origem de uma manifestação, permitindo compreender quais as raízes efetivas do problema em análise .

Na figura 2.5 ilustra-se a aplicação desta ferramenta ao problema da mortalidade infantil num país em vias de desenvolvimento .

Figura 2.5 – Árvore de problemas sociais, diagnóstico de causa-efeito, uma aplicação

Desafio social: mortalidade infantil

Falta de cuidados pré-natais

Tempo e consciência limitados Parto não assistido

Falta de equipamentos

Pobreza

Corrupção Sistema de saúde e infraestruturas débeis

Governo instável

Fonte: adaptado de Chahine (2016)

A avaliação da causa dos problemas, tal como descrita, permite analisar numa perspetiva global, as diferentes variáveis, de natureza macro, que concorrem para a formação de um determinado problema que existe na sociedade. Não obstante, para uma melhor compreensão será importante analisar a interconexão entre as diferentes causas e a forma como estas se materializam num determinado indivíduo, numa análise realizada a nível micro. Tomando como exemplo a análise ao problema da saúde das crianças, a figura 2.6 realiza a análise de causa-efeito na perspetiva da população-alvo da iniciativa social .

Figura 2.6 – Análise da causa-efeito na perspetiva da população-alvo

Rendimento Educação Saúde Rendimento

Educação das crianças

Saúde das crianças

Rendimento futuro, etc.

Fonte: adaptado de Chahine (2016)

Para a realização desta análise importará (figura 2.8), em primeiro lugar, representar o principal problema social sobre o qual a organização social pretende incidir (1). Depois disso, esquematizar as principais causas que estão na origem do problema social em análise (2). Por fim, importará estabelecer a relação de causalidade que existe entre as diferentes causas-efeitos (3), de modo a compreender de uma forma mais clara e completa a espiral de co-construção de um problema social. Importará compreender através de símbolos gráficos (setas) a ligação que possa existe entre os diferentes problemas sociais, bem como o sentido da direção existente (figura 2.7).

Figura 2.7 — Análise de causas-efeitos numa perspetiva micro (população-alvo)

(3)

(2)

(1)

Fonte: elaboração própria

2.4 Problemas versus oportunidades de intervenção social

Identificado o(s) problema(s) social(ais) a que se pretende dar resposta e as respetivas causas, importará encontrar uma solução que permita transformar esse problema numa oportunidade para a criação de valor social .

Uma oportunidade é vista como um estado futuro desejado, que se considera ser possível de atingir, e como a presença de uma combinação de circunstâncias favoráveis que tornam possível um determinado curso de ação. O conceito de oportunidade (social) é central à gestão de entidades da economia social, compreendendo esta todas as atividades e os processos subjacentes à descoberta, definição, e exploração de oportunidades de modo a aumentar a riqueza social. O objetivo será a deteção de oportunidades que outros falharam em descobrir, melhorando assim os sistemas, inventando novas abordagens e criando soluções para melhorar a sociedade .

A oportunidade poderá resultar do reconhecimento de uma necessidade social já existente (que não está a ser adequadamente satisfeita), ou da identificação de um novo problema social . Algumas oportunidades de intervenção social poderão ser relativamente fáceis de identificar. Outras, no entanto, poderão requerer um comportamento verdadeiramente empreendedor e disruptivo, que consiga transformar problemas em oportunidades .

Para melhorar a capacidade de identificação e exploração de oportunidades, será necessário fazer um diagnóstico, o mais completo possível, do ambiente externo (contexto).

O ambiente externo diz respeito a toda a envolvente que rodeia a iniciativa, sendo capaz de influir a criação de problemas versus oportunidades sociais, bem como a forma mais promissora para se explorar essa oportunidade social. De facto, as sociedades operam num constante estado de desequilíbrio, em que alterações nas condições contextuais são passíveis de criar novas oportunidades. Será o ‘estado de alerta’ do empreendedor que permite que este esteja preparado para lidar com as alterações contextuais.

Tal como se observa na figura 2.8, o contexto, para mais fácil diagnóstico, pode ser subdividido em duas componentes: ambiente geral e ambiente de tarefa .

CONTEXTO EXTERNO

Ambiente geral

Figura 2.8 – O contexto externo à iniciativa social

Variáveis políticas

Variáveis económicas

Ambiente de tarefa

Variáveis sociais

Beneficiários

Outros stakeholders Organização social Comunidade local Variáveis culturais

Financiadores

Variáveis legais

Outras organizações sociais

Variáveis ecológicas

Variáveis tecnológicas

Fonte: adaptado de Teixeira (2013)

O ambiente geral diz respeito ao conjunto de variáveis, de natureza macro, capazes de influenciar positiva ou negativamente a construção de problemas e respostas sociais. O ambiente de tarefa, por sua vez, é mais próximo da organização, e inclui as entidades que influenciam ou são influenciados por esta (stakeholders).

2.4.1 Análise ao ambiente geral: análise PESTLE

Uma das formas mais comuns de identificar novas oportunidades sociais é a análise das tendências relativas às componentes políticas, económicas, sociais, tecnológicas, legais e ecológicas (análise PESTLE) da sociedade. Esta análise inclui uma avaliação do impacto destas tendências na geração de novos problemas sociais e oportunidades de respostas sociais a explorar. a) Políticas – O quadro político e as mudanças na política governamental podem implicar o surgimento de novos problemas sociais e oportunidades para as iniciativas sociais .

b) Económicas – O contexto económico influencia as trocas de bens e serviços, recursos financeiros e informação na sociedade. Por esse motivo influencia a procura e oferta de bens sociais. Por exemplo, a perda de emprego em virtude da pandemia leva à necessidade de intervenção em novas questões sociais. A

conjuntura económica altera também o volume de recursos disponíveis para a resolução dos problemas sociais . c) Sociais – O contexto sociocultural traduz os valores culturais, costumes e tradições da sociedade. Estes fatores são capazes de influenciar a criação de novas necessidades sociais, resultantes, por exemplo, de modificação do modo de vida em sociedade, alteração do conceito de famílias tradicionais, emancipação das mulheres, participação ativa das mulheres no mercado de trabalho . Os valores, hábitos e tradições predominantes numa determinada comunidade são também capazes de influenciar as respostas/modelos de intervenção que maior sucesso são capazes de alcançar, bem como a predisposição por parte da comunidade para apoiar a iniciativa social . d) Tecnológicas – Reflete o progresso técnico de uma sociedade e representa as instituições e as atividades envolvidas na criação de conhecimento e na sua transferência para novos produtos, processos ou materiais. Permite identificar novas oportunidades de intervenção, a partir de avanços na inovação tecnológica existente em termos de novos materiais, produtos, processos ou tecnologias existentes no mercado. Por exemplo, o desenvolvimento dos sistemas de comunicação e informação permitiram a realização de intervenções médicas à distância em países em desenvolvimento e com falta de recursos médicos. e) Legais – O surgimento de novas leis e regulamentos podem dar origem a novos problemas sociais ou abrir oportunidades para a intervenção social, condicionando igualmente a forma como se desenvolve um determinado projeto social .

f) Ecológicas – As preocupações ambientais e desequilíbrios ambientais são um assunto que tem assumido uma grande importância nas sociedades. Por exemplo, a preservação das espécies, a poluição ou preservação da biodiversidade, a produção de bens com base na ideia da economia circular são exemplos de oportunidades sociais a explorar. A análise PESTLE serve para avaliar o ambiente externo em que a iniciativa social se vai desenvolver. Será importante compreender/avaliar de que forma estas variáveis são capazes de influenciar a criação de novos problemas sociais (lado da procura ), mas também a forma de intervenção que a organização social deverá assumir, procurando compreender de que forma é que as variáveis (mais relevantes) são capazes de influenciar positiva ou negativamente o sucesso das ações levadas a cabo .

Na análise das variáveis que condicionam a formação de problemas versus oportunidades sociais descrevem-se os fatores político, económico, sociocultural, tecnológico, legal e ecológico. Os quadros 2.2 e 2.3 apresentam mapas de trabalho para a elaboração da análise PESTLE .

Variáveis

Políticas Problemas em alcançar maiorias de governo (instabilidade política) Etc. Muito Negativo (-2) Negativo (1) Positivo (+1) Muito Positivo (+2)

Quadro 2.2 – Sistematização de variáveis, análise PESTLE

Tendência Impacto

Económicas Expectativa de aumento de assimetrias na distribuição rendimento, evolução do nível de desemprego, etc. de

Socioculturais

Tecnológicas Perceção dos problemas sociais tende a manter-se inalterada Envelhecimento da população Valores sociais predominantes Etc.

Surgimento de novos desenvolvimentos tecnológicos Possibilidade de uso de plataforma de crowdfunding para financiamento de projetos Etc.

Legais Legislação aprovada tende a reduzir os apoios do Estado Etc. Muito negativo (-2) Negativo (1) Positivo (+1) Muito Positivo (+2)

Muito negativo (-2) Negativo (1) Positivo (+1) Muito Positivo (+2)

Muito negativo (-2) Negativo (1) Positivo (+1) Muito Positivo (+2)

Muito negativo (-2) Negativo (1) Positivo (+1) Muito Positivo (+2)

Ecológicas Preocupações crescentes com a poupança de água Etc. Muito negativo (-2) Negativo (1) Positivo (+1) Muito Positivo (+2)

Fonte: elaboração própria

A realização da análise ao ambiente externo permite aferir a favorabilidade do contexto para o desenvolvimento da iniciativa, bem como as principais tendências que são capazes de influir positiva e/ou negativamente na emergência da oportunidade social. A mensuração do impacto (positivo/negativo) de diferentes variáveis permitirá aferir da urgência do projeto a desenvolver. No caso do impacto ser negativo na maioria das dimensões em análise, significará que o projeto deverá ser revisto, procurando-se explorar a conceção da ideia a implementar de um outro modo, que procure tirar partido das forças contextuais existentes.

A análise do quadro 2.3 permitirá ainda compreender as principais dimensões que impactam o modelo de resposta social a explorar, compreendendo se este incide, por exemplo, essencialmente em questões económicas, sociais ou ecológicas.

Quadro 2.3 – Avaliação global do impacto da análise PESTLE

Variáveis Política Económica Social Tecnológico Legal Ecológicas Total

Fonte: elaboração própria

Impacto

2.4.2 Análise ao ambiente de tarefa: análise transacional

A análise do meio envolvente também pode ser efetuada ao nível transacional. A análise transacional analisa os problemas da comunidade em que a iniciativa se vai inserir, os potenciais beneficiários da iniciativa, os stakeholders e as organizações existentes (locais, regionais, nacionais) que desempenham atividades semelhantes àquelas que a iniciativa se propõe atuar.

O objetivo será compreender a adequabilidade da resposta face ao ambiente de tarefa em que esta se encontra inserida e de que forma se pode otimizar o modelo de resposta a adotar, tendo em conta a envolvente na qual se irá inserir.

Os quadros 2.4 a 2.8 procuram sistematizar a análise de todos os agentes e fatores que interagem diretamente na formação de problemas versus oportunidades sociais. Os principais elementos que integram a análise transacional são a comunidade onde a iniciativa vai procurar atenuar o problema social, os potenciais beneficiários da iniciativa, os stakeholders e outras organizações sociais existentes (locais, regionais, nacionais).

Para efetuar a análise, sugere-se a avaliação do grau de concordância em relação a cada uma das questões abaixo formuladas, usando a escala negativa (-2 e -1) ou positiva (1 e 2) para avaliar o impacto sobre a iniciativa social.

Quadro 2.4 – Avaliação da iniciativa social para a comunidade

Questões A iniciativa está adequada à comunidade onde se vai inserir? A iniciativa tem efeitos de rede fortes sobre a comunidade? A iniciativa ajuda a resolver um problema prioritário da comunidade? Existe na mesma comunidade iniciativas semelhantes? A comunidade está informada sobre o problema social? Outras questões pertinentes sobre a comunidade Total Impacto Observações

Fonte: elaboração própria

Quadro 2.5 – Avaliação da iniciativa social para potenciais beneficiários

Questões A iniciativa está adequada às necessidades dos beneficiários? O número de potenciais beneficiários é elevado? Podemos satisfazer necessidades adicionais dos beneficiários? Outras questões pertinentes sobre os potenciais beneficiários? Total Impacto Observações

Fonte: elaboração própria

Quadro 2.6 – Avaliação da iniciativa social para potenciais stakeholders

Questões O problema social é frequentemente abordado na comunicação social? O problema social é relevante para a sociedade em geral? Existem figuras públicas que possam ser o rosto da iniciativa social? A iniciativa é suficientemente importante para mobilizar stakeholders nacionais? A iniciativa é suficientemente importante para mobilizar stakeholders regionais? A iniciativa é suficientemente importante para mobilizar stakeholders locais? Outras questões pertinentes sobre os stakeholders Total Impacto Observações

Fonte: elaboração própria

Quadro 2.7 – Avaliação da iniciativa social em relação a outras organizações sociais concorrentes

Questões Impacto Observações

Outras organizações sociais já oferecem serviços semelhantes ao nível nacional? Outras organizações sociais já oferecem serviços semelhantes ao nível regional? Outras organizações sociais já oferecem serviços semelhantes ao nível local? Podemos criar uma delegação de uma organização social já existente ao nível internacional? Podemos criar uma delegação de uma organização social já existente ao nível nacional? Outras questões pertinentes sobre a concorrência de outras organizações sociais Total

Fonte: elaboração própria

Quadro 2.8 – Avaliação global do ambiente de tarefa

Componentes

Comunidade Beneficiários Stakeholders Outras organizações sociais Total Pontuação

Fonte: elaboração própria

A avaliação do nível de pontos obtido, permitirá aferir o envolvimento/apoio que será possível mobilizar através dos diferentes grupos de stakeholders, bem como o âmbito geográfico (por exemplo local versus nacional) que mais caracteriza a intervenção a desenvolver .

Para além disso, para uma melhor compreensão do contexto externo (ambiente de tarefa), importará avaliar as principais entidades que já lidam com o problema social em questão e qual a resposta por estas oferecida (quadro 2.9).

Quadro 2.9 – Mapeamento das respostas oferecidas por outras organizações sociais Organização Localização Respostas oferecidas Âmbito de intervenção

Fonte. elaboração própria.

2.4.3 O desenho da resposta de intervenção social

Após o reconhecimento da oportunidade, importa encontrar a estratégia de intervenção adequada, que permita criar valor através do problema social identificado, bem como convertê-la num projeto organizacional.

Para compreender a intervenção que poderá ser desenvolvida perante um determinado desafio social, será importante refletir sobre as opções que podem ser seguidas com o projeto. O quadro 2.10 poderá auxiliar na reflexão quanto ao desenho da solução a prosseguir .

Quadro 2.10 - Questões para reflexão sobre a resposta social a prosseguir

Qual a questão/problema social a tratar?

Quem é o público-alvo a servir?

Algumas estatísticas quanto ao número de pessoas afetadas/envolvidas pelo desafio social a tratar.

Que características sociais e demográficas apresentam os segmentos que se pretende beneficiar?

Quais os passos necessários para trazer a mudança para o público-alvo ?

Como irá a organização beneficiar o seu público-avo? Quais as necessidades que irá permitir satisfazer?

Quais os produtos/serviços que a organização irá disponibilizar?

A organização permitirá satisfazer as necessidades de outros stakeholders?

Fonte: elaboração própria

2.4.3.1 Definição da cadeia de valor social

Após a clarificação do problema social a tratar, importa esquematizar a forma como a organização pretende intervir, explicitando os resultados pretendidos e as atividades organizacionais necessárias para o efeito (figura 2.9).

Figura 2.9 – Cadeia social de impacto

Trabalho planeado da organização Resultados pretendidos pela organização

Inputs Atividades

Recursos

Recursos necessários para a atividade Por exemplo: investimento necessário, número de pessoas a trabalhar no projeto, equipamento, etc . Atividades

Ações concretas a desenvolver pela organização Por exemplo: desenvolvimento e implementação de programas, etc . Outputs Outcomes

Produtos/serviços a gerar com a atividade

Número de pessoas alcançadas, itens vendidos, etc. Por exemplo: a construção de escolas em 32 locais

Mudanças, benefícios, aprendizagens, efeitos resultantes da atividade

Efeitos observados na população-alvo Por exemplo: aumento do nível da educação; lugares ocupados pelos estudantes: 8 Impacto

Atribuições das atividades da organização a resultados mais amplos e de longo prazo Tendo em atenção as ações de outras entidades, consequências não intencionais, etc. Por exemplo: novos estudantes com acesso a educação: 2

Fonte: elaboração própria

Através deste esquema, será possível idealizar a cadeia de impacto social que se pretende alcançar com a intervenção .

A esquematização deverá iniciar-se da direita para esquerda, uma vez que o projeto deverá ser concebido tendo em conta o impacto social, duradouro e sistemático, que se pretende alcançar. Para além disso, importará definir os resultados mais imediatos, a curto e a médio prazo, que se pretendem alcançar junto dos beneficiários do projeto. Depois disso, é importante definir os outputs do projeto social, isto é, o portfólio de produtos/serviços a disponibilizar, como veículo para a satisfação das necessidades do público-alvo . Os outputs emergem como ponto de contacto entre as atividades da organização e os seus beneficiários, consistindo, assim, na disponibilização de produtos, serviços, apoio, ou interação social com os beneficiários da organização, e que poderão ser quantificados.

Ainda na conceção da cadeia de valor social, importará pensar nas atividades que serão necessárias para a produção dos produtos e/ou disponibilização dos serviços, bem como os recursos necessários para o efeito (inputs), estejam estes já disponíveis para a organização (recursos disponíveis), ou não (recursos necessários). Através das atividades e dos outputs, serão produzidas mudanças na vida dos beneficiários (quer os beneficiários diretos, como de outros stakeholders, tais como as suas famílias ou comunidades, entre outros).

Na figura 2.10, disponibiliza-se um mapa para reflexão sobre a cadeia de valor social a adotar para uma determinada iniciativa social .

Figura 2.10 – Mapa para reflexão sobre a cadeia de valor social a adotar no projeto

Trabalho planeado da organização Resultados pretendidos pela organização

Inputs

Recursos Atividades

Atividades Outputs Outcomes

Produtos/serviços a gerar com a atividade

Mudanças, benefícios, aprendizagens, efeitos resultantes da atividade Impacto

Atribuições das atividades da organização a resultados mais amplos e de longo prazo

Fonte: elaboração própria

2.4.3.2 A definição de um modelo Canvas para uma iniciativa social

Após o reconhecimento da oportunidade, importa encontrar a estratégia de intervenção adequada, que permita criar valor através do problema social identificado, bem como convertê-la num modelo de negócio operacional.

O modelo de negócio descreve de forma clara como um negócio está/será estruturado, que tipo de pessoas são necessárias para aquele negócio e quais os papéis que elas desempenham no negócio. O modelo é uma representação abstrata de uma organização, de todos os seus acordos básicos inter-relacionados, desenhados e desenvolvidos por uma organização na atualidade e no futuro, assim como todos os produtos básicos e/ou serviços que a organização oferece ou vai oferecer, com base nos acordos necessários para alcançar as suas metas e objetivos estratégicos.

O modelo Canvas, ou modelo da tela, como é também conhecido em português, foi proposto por Osterwalder e Pigneur, em 2010. Este modelo pode ser descrito como uma ferramenta concetual que identifica o valor que uma empresa oferece a um ou vários segmentos de clientes, descreve a arquitetura da empresa e da rede de parceiros de negócios, e do marketing necessário para entregar esse valor relacional e para gerar receitas rentáveis e sustentáveis . O modelo da tela permite a visualização gráfica do negócio, sistematizada numa única página, bem como a descrição dos seus elementos de interação que conduzem a uma visão relacional entre os processos e o objetivo do negócio.

Recentemente têm surgido adaptações do modelo Canvas para o setor social (como o Social Enterprise Model Canvas). Aqui o modelo de negócio é visto como a

forma como uma organização determina os inputs adequados, fluxos de recursos e as tomadas de decisão importantes, e o seu papel nos ecossistemas sociais e económicos.

À semelhança do modelo Canvas original, é composto por blocos, que permitem a identificação de elementos-chave e a análise da sua (inter)relação. O seu uso para as iniciativas de empreendedorismo social é importante, pois permite ajudar a refletir sobre o modelo de resposta a implementar, permitindo explorar de uma forma consistente as diferentes opções a seguir, tendo sempre em conta a missão social que a organização se propõe alcançar. Desse modo, permite compreender e comunicar as características e as estratégias de uma organização social.

O modelo Canvas para as organizações sociais é composto por 14 blocos, conforme se sistematiza na figura 2.11.

Figura 2.11 — Modelo Canvas para as organizações sociais

Governança

Outros stakeholders Recursos-chave Canais Clientes e beneficiários

Atividades-chave Envolvimento com clientes e beneficiários

Missão

Objetivos

Estrutura de custos Proposta de valor social Medidas de impacto

Medidas de outputs

Fontes de rendimento

Fonte: Sparviero (2019)

Segundo Sparviero (2019), os elementos que constituem o modelo Canvas para as organizações sociais são os seguintes: • Clientes e beneficiários: grupo de pessoas que a organização visa alcançar e servir; • Proposta de valor social: descreve o conjunto de benefícios que os produtos e serviços criam para um segmento de clientes/beneficiários em específico, podendo assentar em múltiplas dimensões de valor; • Canais: descreve a forma como a organização torna os produtos/serviços disponíveis aos seus clientes/beneficiários e como contacta e comunica com estes .

• Envolvimento com clientes e beneficiários: descreve o modo como a organização estabelece o relacionamento com os segmentos de clientes/ beneficiários específicos; • Recursos-chave: descreve os ativos mais importantes, necessários para assegurar o funcionamento da organização; • Atividades-chave: descreve as atividades mais relevantes para potenciar a criação de valor; • Outros stakeholders: outros stakeholders que não os clientes/beneficiários da organização; inclui parceiros da organização social; • Valores da missão: define os objetivos de longo-prazo mais importantes para a organização; • Objetivos: define objetivos a curto-prazo, e modos de conduta desejáveis a curto prazo; • Medidas de impacto: define as medidas de avaliação dos valores da missão; • Medidas dos outputs: define as medidas para avaliação dos objetivos definidos; • Estrutura de custos: descreve as principais rubricas de custos envolvidos na operacionalização de um modelo de negócio; • Fontes de rendimento: descreve as principais fontes de rendimento a que a organização social pretende recorrer; • Governança: define as principais regras e comissões instituídas para gerir a organização.

2.4.3.3 Diagnóstico interno do projeto: forças e fraquezas

Para o lançamento e desenvolvimento da iniciativa social será necessário um conjunto de recursos e competências, que permitam o desenvolvimento de atividades conducentes à criação de valor social .

Importará, por isso, fazer uma pré-avaliação dos recursos e competência que a iniciativa terá à sua disposição, através de uma análise previsional das necessidades que a realização do projeto impõe, os recursos e capacidades que se espera ter à disposição, as características que apresentam e a facilidade com que se possa ou não dispor para a sua mobilização e capacidade de retenção.

Este exercício permitirá fazer um autodiagnóstico da iniciativa e um melhor conhecimento das suas forças (potencialidades) e debilidades (fraquezas), que deverão ser acomodados na configuração do novo modelo de negócio social. Neste diagnóstico previsional devem ser descritas as principais carências e virtualidades do projeto em relação às infraestruturas necessárias, para além da estimativa de rendimentos e das principais fontes de custo para manter o projeto a funcionar (quadro 2.11). Cada ponto forte será avaliado com +1 e cada debilidade com -1, e em caso neutro 0 .

Quadro 2.11 – Diagnóstico previsional das forças e fraquezas da iniciativa social

Caracterização das necessidades e situação atual Forças Fraquezas Avaliação

Infraestruturas necessárias ao desenvolvimento do projeto

Recursos materiais necessários ao desenvolvimento do projeto

Recursos humanos necessários ao desenvolvimento do projeto

Gestão da iniciativa

Equipa técnica

Outros recursos humanos necessários

Voluntários

Estrutura de custos

(e.g. principais custos, evolução da estrutura de custos, previsibilidade dos custos, eficiência no nível de custos)

Recursos financeiros necessários para iniciar o projeto

Fontes de geração de rendimento

(e.g. principais fontes de rendimento a utilizar, estabilidade dos fluxos de rendimento, diversificação das fontes de rendimento, sustentabilidade das fontes de rendimento)

Capacidade de inovação

Reputação da iniciativa

Capacidade de relacionamento com os stakeholders

Fonte: elaboração própria

Formulação e implementação da estratégia social

Após o reconhecimento de uma oportunidade de intervenção social, os empreendedores irão convertê-la num modelo de negócio operacional. Para tal, tendo por base os valores, a visão e a missão da organização, torna-se necessária a formulação e implementação de uma estratégia, que oriente os programas e atividades da organização. Assegura-se, desta forma, a coordenação dos esforços de todos os elementos da organização em torno de um propósito comum.

O processo estratégico para uma organização social é composto essencialmente por cinco componentes:

I . definição dos valores, visão e missão da organização;

II . definição dos objetivos, considerando as forças externas e internas do meio envolvente;

III . formulação de estratégias, políticas e programas específicos que permitam a consecução dos objetivos;

IV . implementação da estratégia, para que sejam alcançados os fins organizacionais.

3.1 Valores, visão e missão

Um aspeto-chave no desenho da estratégia para uma organização social será a identificação dos propósitos subjacentes à organização ou projeto social.

Para o efeito, será necessário definir os valores, a visão e a missão, de uma forma integrada, para que todo o processo de planeamento estratégico seja coerente (figura 3.1).

Figura 3.1 – Planeamento estratégico: valores, visão e missão

PLANEAMENTO ESTRATÉGICO

Valores

Visão Missão

Fonte: elaboração própria

3.1.1 Valores

Os valores são os princípios intemporais que orientam a organização ao longo da sua vida, representando as crenças mais profundas dos seus membros . Os valores são visíveis através dos comportamentos de dirigentes, colaboradores e voluntários no quotidiano da organização. Os valores devem ser distintivos em relação a outras organizações sociais e devem ser específicos à sua atividade.

A declaração de valores é uma proclamação aberta a todos os stakeholders sobre os comportamentos esperados dentro da organização, que se forem genuinamente vivenciados podem ser galvanizantes em tempos de prosperidade ou de crise. Pode incluir valores genéricos como “integridade” ou “respeito”, ou serem mais específicos (e. g. “inclusão”).

A declaração de valores da organização responde a questões como: Em que é que a minha organização acredita? O que é que a minha organização defende? Em síntese, os valores traduzem em palavras o que a organização pretende representar e têm uma natureza intangível.

Não existem valores certos e errados. Cada organização deve encontrar os valores centrais que traduzem a sua substância e são importantes para todos os seus membros. As organizações tendem a possuir um conjunto limitado de valores centrais que verdadeiramente refletem a sua essência. Um grande número de valores frequentemente é sinónimo de alguma confusão entre valores e práticas. No entanto, enquanto as práticas, processos e estratégias devem mudar ao longo do tempo em resposta aos desafios que a organização tem de enfrentar, é de esperar que os valores se mantenham estáveis ao longo do tempo.

Uma vez identificados os valores, estes devem ser interiorizados por todos, desde os dirigentes, até aos voluntários e colaboradores.

Os valores são importantes porque ao gerar-se uma lista de valores a organização pode criar um código de conduta que os membros da organização podem seguir e que os stakeholders têm a expectativa de serem cumpridos. Para além disso, a criação de um conjunto de valores pode ajudar a organização a tomar decisões e ações que estejam alinhadas entre si. Os valores não dizem para onde ir, mas podem dizer como chegar lá de uma maneira que todos filosoficamente estejam de acordo .

No quadro 3.1, apresentam-se, a título exemplificativo, a declaração de valores de algumas organizações sociais.

Quadro 3.1- Ilustração de declaração de valores de diferentes organizações sociais

Voluntariado. Como uma escolha responsável e de desenvolvimento pessoal, exercido de forma comprometida e profissional. Consciencializando a importância do exercício do voluntariado no colmatar das desigualdades e necessidades das comunidades que as organizações integradoras de voluntários envolvem. Assumindo o voluntariado como uma forma de estar na vida. Capacitação. Como espaço de aprendizagem e construção de competência para a utilização de instrumentos no exercício do voluntariado e na gestão do mesmo (para uma gestão eficiente e eficaz dos voluntários de forma a servir a missão das organizações que os integram). Transparência. A todos os níveis da organização, seja na relação com os seus membros, seus parceiros, financiadores e sociedade em geral. Dádiva e Partilha. A Dádiva e a Partilha definem o espírito que norteia todas as relações que se vão estabelecer entre os diferentes intervenientes e parceiros dos Bancos Alimentares.

Privacidade. Respeitar os espaços e tempos afetos à fruição dos clientes Integridade. Respeitar os deveres e os direitos de todas as partes interessadas e as regras organizacionais de conduta Confidencialidade. Guardar absoluto sigilo de todos os factos e informações relativos à vida da Instituição, designadamente as que respeitam ao direito à privacidade das pessoas, de que tenham conhecimento no exercício das suas funções ou por causa deles Rigor. O planeamento, a execução e o acompanhamento da ação são cumpridos com exigência, e de forma criteriosa, de acordo com procedimentos legais e padrões éticos Solidariedade. Os resultados e metas decorrem do trabalho conjunto e de intervenções multidisciplinares, quer entre colaboradores, quer entre parceiros, quer entre outras partes interessadas Responsabilidade. Decidir e atuar em conformidade com a Visão, Missão e Valores da Organização. A responsabilidade diz respeito a todos, sendo inerente às funções de cada um, num contexto de trabalho em equipa Participação. Envolvimento e corresponsabilização de todos, nas dinâmicas organizacionais e na comunidade

Fraternidade. Acreditar que “Todos os Seres Humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e de consciência e devem agir uns para com os outros em espírito de irmandade”. Solidariedade. Assumir as preocupações e as necessidades do ser humano como suas causas de ação. Tolerância. Procurar uma atitude pessoal e comunitária de aceitação face a valores diferentes daqueles adotados pelo grupo de pertença original. Equidade. Garantir o tratamento igual sem distinção de ascendência, idade, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social Verdade. Procurar sempre a adequação entre aquilo que se faz e aquilo que se proclama. Frontalidade. Dialogar e falar claro, respeitando os valores do outro, fazendo ao mesmo tempo respeitar os seus. Transparência. Garantir que o processo de atuação e de tomada de decisão é feito de tal modo que disponibiliza toda a informação relevante para ser compreendido.

Responsabilidade. Responsabilidade pela condução de todos os projetos a que se propõe, e por todos os projetos de vida que lhe são confiados. Rigor. Rigor na gestão das equipas e das ações que articula de forma a chegar ao seu objetivo primário: reintegrar as crianças e jovens que apoia nas suas famílias ou na sociedade. Transparência. Transparência na gestão das suas operações, otimização dos seus recursos e comunicação dos seus resultados. Dedicação. Dedicação de toda uma equipa que trabalha diariamente para ultrapassar barreiras, coordenar esforços e criar estruturas que permitam apoiar, melhorar e até salvar as vidas de todos aqueles que beneficiam das ações da Fundação.

Alegria e autenticidade. É o nosso estado emocional positivo, de maior abertura e disponibilidade para o outro, boa disposição, prazer, riso e brincadeira. Acreditamos que a alegria que oferecemos transforma o ambiente. Arte do palhaço. É ser espontâneo, genuíno e verdadeiro. É construir uma ponte entre a realidade e a fantasia, com criatividade, autenticidade e humor, brincando com o erro e acreditando no impossível. Confiança. É acreditar no outro, nas suas boas intenções e nas suas capacidades, respeitar as diferenças e respeitar os compromissos. Cooperação. Atenção e disponibilidade para ajudar o outro, espírito de solidariedade. Esforço na construção de uma equipa coesa. Empatia. Conseguimos pôr-nos no lugar do outro, perceber e respeitar o seu ponto de vista. É a atenção à singularidade, integridade, espaço e papel de cada um. Profissionalismo. Estamos empenhados na excelência do nosso trabalho e na qualidade das nossas relações. Fonte: elaboração própria

A declaração de valores deve ser formulada em primeiro lugar, pois são estes que enquadram e condicionam a declaração de visão e de missão. Para tal, deverão ser seguidos os seguintes passos (figura 3.2).

Figura 3.2 – Etapas para a construção da declaração de valores

Passo1

Recolher opiniões de dirigentes e stakeholders através de entrevistas e questionários

Passo 2

Clarificar os valores da organização

Passo 3

Escrever a declaração de valores para a organização

Passo 4

Avaliar a declaração de valores

Passo 5

Rever a declaração de valores

Fonte: elaboração própria

3.1.2 Visão

A visão de uma organização traduz o que a sociedade poderá ser diferente com a sua intervenção. A visão deve conter uma ideia concreta do futuro desejado para a organização, sendo o suporte para a formulação de estratégias e objetivos.

A declaração de visão deve ser uma frase única que descreva de uma forma clara e inspiracional a mudança de longo prazo desejada resultante da atividade desenvolvida ou a desenvolver pela organização. Uma declaração de visão estabelece o que é que a organização quer ser num prazo mais ou menos longo (5, 10 ou15 anos).

Uma visão robusta fornece a todos os membros da organização um quadro mental partilhado que ajuda a enfrentar as incertezas do amanhã. A visão deve inspirar cada colaborador ou stakeholder a testar as suas fronteiras, alargando a capacidade de prosseguir a missão da organização. Sem uma visão clara e inspiradora que guie as ações de todos os colaboradores, eles podem sentir-se perdidos sem saberem como podem contribuir para atingir os objetivos da organização.

Na figura 3.3, sistematizam-se as principais caraterísticas da declaração de visão. Esta deve: i) ser concisa, o que significa resumir em poucas palavras a essência da visão; ii) ser apelativa para todos os stakeholders, o que sugere que todos os stakeholders devem rever-se nessa visão; iii) ser consistente com a missão e valores da organização social, para não permitir desvios indesejáveis

ao seu funcionamento; iv) ser verificável, em que a organização social cumpre realmente a sua missão; v) ser inspiradora para entusiasmar os seus stakeholders; vi) ser alcançável para permitir que os objetivos decorrentes da visão possam ser atingidos; vii) finalmente, conseguir balancear os elementos externos com os internos à organização social para construir uma declaração de visão coerente.

Figura 3.3 – Características fundamentais da declaração de visão

Concisa Apelativa para todos os stakeholders

Consistente com a missão e valores da organização social Conseguir balancear os elementos externos com os internos à organização social Verificável

Inspiradora Alcançável

Fonte: elaboração própria

No quadro 3.2, apresentam-se, a título exemplificativo, a declaração de visão de algumas organizações sociais.

Quadro 3.2 - Ilustração da declaração de visão de algumas organizações sociais

Organização social Visão

Educar para o exercício de um voluntariado que efetivamente resolve os problemas das pessoas vulneráveis e do mundo.

Pretendemos ser uma instituição de referência na prestação de serviços de reabilitação e readaptação.

Atenuar as desigualdades e o sofrimento no Mundo, tendo o Ser Humano no centro das preocupações. Criar um mundo mais sustentável, mais harmonioso, mais inclusivo, mais tolerante, menos indiferente, menos violento.

Um mundo, no qual todos os Homens, tenham garantido o direito à alimentação.

A Fundação do Gil pretende um mundo onde todas as crianças em risco social e/ou clínico vivam com dignidade e bem estar e possam sonhar com a possibilidade de recuperar em pleno o seu projeto de vida.

Fonte: elaboração própria

No entanto, a declaração de visão é apenas o princípio, não identificando estratégias específicas para tornar a visão realidade. Uma visão ambiciosa pode criar o um clima favorável à mudança, mas não diz às pessoas especificamente o que deve ser mudado. A visão pode mobilizar as pessoas com diferentes experiências de vida a trabalhar para alcançar um futuro partilhado, mas não diz às pessoas especificamente o que precisa de ser mudado nos próximos meses para alcançar a visão .

A visão deve ser formulada depois da declaração de valores e antes da declaração de missão. Para tal, deverão ser seguidos os seguintes passos (figura 3.4).

Figura 3.4 – Etapas para a construção da declaração de visão da iniciativa social

Passo 1 Rever a declaração de valores

Passo 2 Alargar a declaração de valores para criar a declaração de visão: Até que ponto deseja que a sua organização seja diferente? Qual o papel desejado para a organização no seio da comunidade? O que é o sucesso para a organização? Como é que o mundo ficará se a organização for bem-sucedida no cumprimento dos seus objetivos?

Passo 3 Escrever a declaração de visão para a organização. Responder às questões do passo 2, criando uma declaração acerca da visão que a organização quer ter no futuro.

Passo 4 Avaliar a declaração de visão. A declaração de visão deverá responder às seguintes questões: Qual a imagem mental de um futuro possível e desejável para a organização? Para onde quer ir a organização? Qual o horizonte de pelo menos 5 anos para a organização? Como será a organização, como atuará, e de que forma o público irá percecionar a organização no futuro? De que forma a visão se adequa às mudanças da envolvente? Quais as competências únicas da organização?

Passo 5 Rever a declaração de visão. Partilhar a declaração de visão. Recolher contributos através de grupos relevantes de pessoas. Analisar os contributos recebidos procurando semelhanças e diferenças na perceção da visão pelos diferentes intervenientes. Atribuir a um pequeno grupo representativo a tarefa de rever a declaração de visão. Partilhar a declaração de visão revista com aqueles que contribuíram para o processo para ser, se possível, melhorada.

Fonte: elaboração própria

A construção da declaração de visão deve ser um processo de reflexão sobre a forma como a organização pretende atuar no futuro, e as mudanças que a sua intervenção pretende vir a alcançar na sociedade . Na medida do possível deverá ser um processo desenvolvido em equipa, onde seja possível recolher as ideias e perceções de diferentes intervenientes. Para além da definição da declaração de visão, a sua comunicação e divulgação no interior e exterior da organização social serão igualmente muito importantes .

3.1.3 Missão

A missão de uma organização traduz o contributo que se pretende dar para que esse mundo seja diferente. A missão traduz os propósitos gerais de uma organização e a razão básica para a sua existência. A missão constitui um elemento importante na identidade destas iniciativas, representando a pedra angular em torno da qual serão construídas as suas políticas, estratégias e ações. Para além disso, a missão afeta o modo como os empreendedores sociais percebem e avaliam as oportunidades de intervenção, e como moldam todo o seu modelo de negócio.

A declaração de missão é considerada fundamental para o setor social, nomeadamente porque: – na falta de orientação para o lucro, a missão é o elemento nuclear que articula a razão de ser da organização social – na declaração de missão é que reside a motivação da organização para atuar e expressar a contribuição que pretende dar à sociedade; – estabelece o ponto de partida para o processo estratégico da organização social; – permite criar um sentido de alinhamento, de foco e de unidade, em torno do qual são desenhados os objetivos e estratégias adequados aos propósitos da organização; – delimita os produtos ou serviços que a organização poderá disponibilizar no âmbito da sua intervenção social; – representa uma âncora para o desenvolvimento dos seus objetivos; – assume um papel de relevo nas orientações relativas à alocação dos recursos dentro da organização social; – representa uma importante ferramenta na definição da cultura de uma organização e na motivação dos seus colaboradores e voluntários; – a presença de uma declaração de missão explícita ajuda a atrair indivíduos que partilham os mesmos propósitos, valores e objetivos; – ajuda a compreender quem são os principais stakeholders da organização; – auxilia na atração de mecenas e doadores que se identifiquem com a missão social da organização.

Por todos estas razões, a missão deve ser formalmente definida e comunicada na organização. A sua comunicação é de tal forma importante que, para alguns autores, o trabalho do líder de uma organização social é promover a missão e a sua relevância para o trabalho da organização.

A missão deverá ainda ser distintiva e única, de forma a permitir distinguir a sua proposição de valor das demais organizações sociais. Como tal, representa um poderoso instrumento de comunicação dos valores e atividades da organização, quer internamente quer junto dos públicos externos, sendo, inclusivamente, um importante elemento para a construção da reputação da organização.

De seguida exemplifica-se a declaração de missão de algumas organizações sociais .

Quadro 3.3 - Ilustração da declaração de missão de algumas organizações sociais

Organização social Missão

Aspiramos a criar as bases para que o voluntariado seja as mãos do combate às desigualdades em Portugal e no Mundo. Também na batalha por um mundo melhor é necessário possuir competências. Queremos mudar o caducado paradigma da solidariedade que sustenta os seus pilares na “boa-vontade”, para um novo e emergente paradigma que se deve sustentar no “fazer-bem”.

Promover a inclusão, visando a satisfação dos clientes, suas famílias e colaboradores.

Levar ajuda humanitária e promover o desenvolvimento humano, tendo em conta os Direitos Humanos e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, nas áreas da saúde, social e ambiental, em qualquer parte do mundo, independentemente de raça, género, idade, nacionalidade, língua, política, religião, filosofia ou posição social, olhando para cada pessoa como um ser único, insubstituível, digno de atenção e cuidado.

Lutar contra o desperdício, recuperando excedentes alimentares, para os levar a quem tem carências alimentares, mobilizando pessoas e empresas, que a título voluntário, se associam a esta causa.

Promover o bem-estar clínico, social e emocional das crianças em risco social e/ou clínico perspetivando a sua reintegração social na família com autonomia.

Levar alegria à criança hospitalizada, aos seus familiares e profissionais de saúde, através da arte e imagem do Doutor Palhaço, de forma regular e com uma equipa de profissionais com formação específica.

Fonte: elaboração própria

Tendo em conta a relevância da declaração de missão para as organizações sociais, a sua construção deve ser feita de uma forma estruturada, conforme se sugere na figura 3.5.

Figura 3.5 – Sistematização das etapas para a construção da declaração de missão

Passo 1 Rever a declaração de visão

Passo 2

Alargar a declaração de visão para criar a declaração de missão Se a organização fosse desenvolver um projeto que tivesse o maior impacto possível na sociedade, qual seria esse projeto? Quais são as funções que a organização deseja possuir (serviços jurídicos, por exemplo)? Quais as tarefas que gostaria que a organização desempenhasse? Como é que o mundo ficará se a organização for bem-sucedida no cumprimento dos seus objetivos? Que tipo de organização quer ser (responsável, por exemplo)? Quais foram os maiores momentos de felicidade e de satisfação? Quais foram as atividades de que gostou mais na organização? Que forças ou capacidades que a organização tem no presente ou que desejaria ter?

Passo 3 Escrever a declaração de missão para a organização

Responder às questões do passo 2, criando uma declaração acerca das diferenças que a organização se propõe alcançar, incluindo detalhes . Expressar isso em vários parágrafos .

Passo 4 Avaliar a declaração de missão

A declaração de missão deverá responder às seguintes questões: Qual o propósito central da organização? Por que é que existe? Qual o passado (história, tradições da organização), o presente (interesses, skills e capacidades da organização) e o futuro (visão, objetivos de longo prazo, foco)?

Passo 5 Rever a declaração de missão

Partilhar a declaração de missão; Recolher contributos através de grupos relevantes de pessoas Analisar os contributos recebidos procurando semelhanças e diferenças na perceção da missão pelos diferentes intervenientes Atribuir a um pequeno grupo representativo a tarefa de rever a declaração de missão; Partilhar a declaração de missão revista com aqueles que contribuíram para o processo para ser, se possível, melhorada .

Fonte: elaboração própria

3.2 A definição dos objetivos e ações estratégicas para a iniciativa social

Para a prossecução da sua missão, as iniciativas socialmente empreendedoras terão que definir a sua estratégia e os objetivos que orientam os esforços dentro da organização.

A estratégia, ou gestão estratégica, diz respeito ao nível de topo das organizações e faz parte do processo geral de gestão. Trata-se de um conjunto integrado de ações, concebidas para assegurar que os propósitos básicos da organização sejam alcançados. A estratégia determina os objetivos de longo prazo de uma organização, as ações a desenvolver e a alocação dos recursos necessários para a sua prossecução . A estratégia pode ainda ser entendida como o padrão de decisões que determina os objetivos e produz os principais planos para o alcance desses mesmos objetivos. O processo de planeamento estratégico é apontado como particularmente relevante no caso das organizações sem fins lucrativos, devido à elevada sensibilidade ao contexto político e social e aos limitados recursos de que dispõem, o que obriga a que estas canalizem os seus esforços para aquilo que é essencial. Desse modo, os planos estratégicos irão orientar e articular as ações da organização.

3.2.1 A análise SWOT e a definição da estratégia e objetivos

A otimização da estratégia a seguir pela organização social recomendará que a organização, tendo presente a sua missão social, integre a informação relativa ao contexto externo e aos recursos e competências que a organização dispõe, procurando prosseguir um ajustamento entre estes elementos na estratégia e objetivos a definir (figura 3.6).

Figura 3.6 – Processo geral de planeamento estratégico

Declaração de missão

Análise do ambiente externo da organização social Análise SWOT Análise interna da organização social

Estratégia

Objetivos

Fonte: adaptado de Teixeira (2013).

Para que a estratégia possa ser bem sucedida terá de ser consistente com os valores, visão e missão da organização social, ambiente externo, recursos e capacidades, bem como a estrutura e sistemas vigentes. De facto, a estratégia deverá assentar, por um lado, na missão da organização e, por outro, no ambiente, atual ou esperado, que envolve a iniciativa social. Antes da determinação dos propósitos organizacionais interessa, pois, compreender as forças do ambiente na qual a entidade se encontra inserida. Com efeito, a organização deverá definir uma estratégia tendo em conta os seus recursos, competências e valores, e o meio envolvente que a condiciona. Deste modo, a estratégia é vista como uma força mediadora entre a organização e o seu ambiente, na medida em que confere um quadro que permite antecipar e lidar com a mudança. Por isso, possibilita à organização o alcance dos objetivos enquanto responde às oportunidades e ameaças do ambiente, transformando problemas em oportunidades de criação de valor social .

Para além da análise da envolvente geral, a organização social deverá entrar em consideração com o setor em que opera e com outras organizações

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