Revista SBE - Ano VII, Número 1 JUN/JUL/AGO 2018

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Revista

Ano VII • No 1

JUN•JUL•AGO 2018

Especialista para especialista Abordagem do especialista sobre endometriose e nutrição

Caso clínico Endometriose de vagina – Nova abordagem de avaliação ultrassonográfica tridimensional (US-3D) do fórnice posterior e septo retovaginal – Relato de caso Neuromodulação sacral para tratamento de disfunção urinária após cirurgia de endometriose profunda: relato de caso

Artigo comentado Endometriose: uma população de alto risco para doenças crônicas? Morcellation during uterine tissue extraction: an update Uma forma viável e efetiva de treinar residentes em laparoscopia ginecológica – ProTEGi-SC

Highlights 4o Congresso da Seud em Florença – Um fórum único para atualização em doenças benignas do útero



Pa l a v r a d o p r e s i d e n t e

Pa l a v r a d o p r e s i d e n t e Carlos Alberto Petta Professor livre-docente de Ginecologia Coordenador da Clínica Fertilidade & Vida – Campinas (SP) Coordenador do Serviço de Reprodução Humana do Hospital Sírio-Libanês

Caros amigos, Este ano completamos dez anos da fundação da SBE. Foi um período de muito esforço e dedicação de muita gente envolvida em todos os processos que fazem uma Sociedade andar e as coisas acontecerem. Presidentes, diretores e, em especial, muitos colaboradores que, apesar de não terem o nome escrito na nossa revista, contribuíram muito com o engrandecimento e a consolidação da SBE. Não só a Sociedade progrediu, mas o que mais importa: a endometriose é mais conhecida e melhor abordada em todos os aspectos e as cirurgias minimamente invasivas cada vez mais presentes nos hospitais do País, com melhores condições em termos de equipamentos e médicos com mais capacitação técnica para realizar procedimentos de grande porte por videolaparoscopia. Com isso, o acesso às cirurgias melhorou e as técnicas também se difundiram entre o público leigo, que hoje já solicita procedimentos cirúrgicos minimamente invasivos. Este é, portanto, um momento de festa e alegria, mas, principalmente, de agradecimento pelas conquistas de nossa Sociedade. Relembraremos momentos importantes desses dez anos nesta edição da revista, que passaram bem rápido, felizes com o que alcançamos e preparando o caminho para as futuras gerações que levarão a Sociedade adiante nas próximas décadas. Preparem-se também para um Congresso de alto nível científico e aprimoramento e de comemorações e celebração. Abraços e obrigado.

Carlos Alberto Petta Presidente da SBE

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10 anos de SBE

Como está a SBE hoje? É com muito prazer e orgulho que vejo hoje a SBE como uma Sociedade mais amadurecida e seguindo os planos e objetivos traçados há dez anos. Uma Sociedade mais estruturada e resultado do trabalho de muitos ao longo desses anos. A SBE continua uma instituição que não objetiva lucros nem sedes em edifícios. Por essa razão, não cobra anuidade de seus sócios e a contribuição de todos que trabalham nela se faz pela observação da importância de informar e educar sobre a doença, melhorar as práticas médicas e aumentar o acesso das mulheres aos serviços de endometriose. Nossos congressos sempre lotados demonstram o interesse da classe médica pelo tema da cirurgia minimamente invasiva e, em especial, a crescente frequência dos casos de endometriose em nossos consultórios. A SBE se renova, com caras novas no dia a dia da sociedade, sempre trazendo ânimo e disposição, mas sem se esquecer da enorme contribuição de muitos desde sua formação. Nossas ambições se mantêm: capacitar médicos e centros para o manejo da doença. Isto é observado no número cada vez maior de centros em todo o país com capacidade de diagnóstico por imagem da endometriose profunda e no tratamento de casos que requerem mais expertise cirúrgico. Hoje, a maioria dos estados da federação possui essa capacitação. Por meio de cursos e estágios oferecidos pelos associados, a SBE contribui muito para isso. Cada vez mais, apoiamos e divulgamos esses cursos e eventos de educação médica continuada. Na outra vertente, incrementamos o apoio a atitudes com o público leigo, aumentando o conhecimento sobre a doença. O dinamismo de dez anos atrás se mantém e aumenta com a continua contribuição dos associados. As linhas traçadas foram ajustadas à realidade de uma nova década, mas os princípios se mantiveram e devem continuar nos anos que estão por vir.

Carlos Alberto Petta Presidente da SBE

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10 anos de SBE

10 anos de SBE e o papel da Revista da SBE Há dez anos, um grupo de ginecologistas com intensa atividade científica percebeu a necessidade da formação de uma Sociedade Brasileira com foco na endometriose e em outras doenças que requerem intervenção minimamente invasiva na nossa especialidade. Mas por que uma nova sociedade? Por um lado, houve a imensa percepção de que a endometriose é um real problema de saúde pública que requer atenção muito especial. Além disso, o Brasil se tornou referência mundial no estudo dessa doença, com grande quantidade e qualidade de estudos desenvolvidos no nosso país. Por outro lado, o treinamento de profissionais capacitados a realizar cirurgias minimamente invasivas cresceu muito na última década, reforçando a necessidade de um enfoque especial nessa área de atuação. Com o crescimento da SBE, tornou-se essencial a criação da Revista da Sociedade, permitindo um canal de comunicação com o especialista brasileiro com informações atualizadas sobre a endometriose e a ginecologia minimamente invasiva, com foco especial nas atividades científicas nessa área. Nesses dez anos, muitas coisas positivas ocorreram. Além dos congressos brasileiros da SBE, houve várias atividades regionais, consensos, campanhas de esclarecimento à população e o Brasil foi sede de um dos principais Congressos Mundiais de Endometriose, com um expressivo número de participantes nacionais e internacionais. Em paralelo, a SBE se afiliou ao Journal of Endometriosis and Pelvic Pain Disorders (JEPPD), importante revista internacional nessa área. Ingredientes como esses motivaram o avanço de nossa Sociedade e o estímulo dos associados a buscar o principal objetivo: melhorar a qualidade de vida de nossas pacientes. Feliz aniversário, SBE! Parabéns à Revista da SBE!

Mauricio Simões Abrão Presidente da SBE (2008-2014)

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10 anos de SBE

10 anos de SBE e sua especificidade Caros colegas, com muita satisfação retorno a esta Sociedade em sua comemoração de dez anos de existência. Por que a existência de uma Sociedade tão específica? Quando nos juntamos há dez anos, percebemos que, embora nossas grandes sociedades tivessem espaços de discussão sobre endometriose, faltava uma visão mais específica voltada exclusivamente aos problemas decorrentes de uma doença crônica, com etiologia ainda desconhecida, sem consensos sobre formas de abordagem e sem apoio público para o cuidado das pacientes. Ao juntarmos um grupo de especialistas com diferentes visões, foram surgindo novas ideias e formas de encarar a doença e foram criados, ao longo desses dez anos, diversos fóruns que aumentaram muito o conhecimento das limitações e possibilitaram novas abordagens, mais pragmáticas e multiprofissionais, sempre tendo em mente que estamos diante de uma doença crônica cujo tratamento definitivo é raro e precisa ser administrado ao longo da vida da mulher. Os congresssos brasileiros ocorridos nesse período foram um sucesso absoluto, com ambientes de discussões proveitosas, com especialistas dando suas diferentes visões. Em todos eles, o número de participantes foi expressivo e o índice de satisfação, enorme, comprovando a necessidade que havia entre colegas de terem um fórum específico. Juntamos cada vez mais temas de cirurgia minimamente invasiva, pois esse é um assunto também pouco discutido em eventos de grandes sociedades, e tem sido bastante útil essa abordagem, com temas que vão de noções de anatomia a cirurgias de assoalho pélvico mais complexas. Pudemos trazer um Congresso Mundial de Endometriose em 2014 e, com a formação desse grupo, passamos a fazer parte do circuito internacional, com participação efetiva nas duas Sociedades mais expressivas ligadas ao tema, a World Endometriosis Society (WES) e a Society of Endometriosis and Uterine Disorders (Seud), sempre com a presença de brasileiros. Transmitimos em nossos canais posições sobre o debate envolvendo os morceladores em histerectomia, que veio à tona após manifestação da FDA. Com o CFM, participamos da luta apoiando a volta da Reprodução Humana como área de atuação, tentando corrigir um lamentável erro anterior da Febrasgo. Juntamo-nos à Febrasgo e a várias outras entidades médicas, apoiando o movimento que tenta cobrar do Estado e das agências suplementares de saúde o pagamento dos tratamentos de infertilidade, um direito legal que não é respeitado. Apoiamos iniciativas da sociedade civil, como a Marcha da Endometriose e a Frente Parlamentar, que visam consolidar uma melhor abordagem das pacientes. Estivemos presentes no Fórum de Saúde Pública realizado em Brasília, quando pudemos defender a visão de ser a endometriose uma doença crônica não transmissível que precisa de apoio para seguimento em longo prazo. Dessa forma, vemos a SBE entrando em um processo de maturidade, como uma entidade focada em um problema bastante prevalente, o que lhe dá a possibilidade de exercer ações coordenadas em prol de nossos objetivos. Nossas diretorias sempre foram constituídas por colegas especialistas engajados, com vivência prática e também acadêmica, o que tornou essa tarefa um desafio real, mas bastante possível de se concretizar. E foi concretizado! Ocupamos um espaço único, trabalhado com dedicação, sem interesses outros que não os de agregar boa discussão a um problema de grande repercussão à vida das mulheres afetadas. Parabéns aos dez anos de uma Sociedade séria e muito voltada aos problemas reais de nossas pacientes!

Rui Alberto Ferriani Presidente da SBE (2014-2016)

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Índice

Índice/expediente

Abordagem do especialista sobre endometriose e nutrição............................................................................. 10 Beatriz Taliberti da Costa Porto

Abordagem do especialista sobre endometriose e nutrição............................................................................. 13 Maria Fernanda Condes Areias

Endometriose de vagina – Nova abordagem de avaliação ultrassonográfica tridimensional (US-3D) do fórnice posterior e septo retovaginal – Relato de caso............................................................................................ 16 Cossi PS, Kamergorodsky G, Kopleman A, Silva Neves J, Schor E

Neuromodulação sacral para tratamento de disfunção urinária após cirurgia de endometriose profunda: relato de caso..................................................................................................................................................... 20 Camila Beckhauser Calegari, Leandro Nóbrega, Fernando Almeida, Marco A. Bassi, Luciano Gibran

Endometriose: uma população de alto risco para doenças crônicas?.............................................................. 24 Júlio Cesar Rosa e Silva, Ana Carolina Japur de Sá Rosa e Silva

Morcellation during uterine tissue extraction: an update................................................................................... 26 Ricardo de Almeida Quintairos, Rômulo Muller dos Santos Melo, Eduardo Miranda de Paiva, Celyne Agrassar da Silva

Uma forma viável e efetiva de treinar residentes em laparoscopia ginecológica - ProTEGi-SC.......................... 30 Anna Luiza Lobão, Helizabet Salomão Abdalla Ayroza Ribeiro, Fernanda Asencio, Fabio Ohara, Paulo Augusto Ayroza Galvão Ribeiro o

4 Congresso da Seud em Florença - Um fórum único para atualização em doenças benignas do útero........... 33 Fernando Reis

Expediente Órgão oficial de comunicação da

DIRETORIA 2016-2018 Presidente Carlos Alberto Petta Vice-presidente Eduardo Schor Diretor primeiro-tesoureiro Alexander Kopelman Diretor técnico-científico Júlio César Rosa e Silva Diretor de Relações Internacionais Fernando Marcos dos Reis Diretor de Ensino Marco Aurélio Pinho de Oliveira Diretor primeiro-secretário Marcos Tcherniakovsky

Projeto editorial e gráfico: Casa Leitura Médica Contato comercial: (11) 3151-2144 Distribuição: (11) 3255-2851 Av. Brigadeiro Luís Antônio, 1.700, 11o andar Bela Vista – São Paulo, SP – CEP 01318-002 www.lmedica.com.br

Tiragem: 10.000 exemplares Distribuição exclusiva à classe médica brasileira Periodicidade trimestral

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Secretário-geral Sérgio Podgaec Diretor de sede Giuliano Moyses Borrelli Diretor de Relações Institucionais João Sabino Lahorgue da Cunha Filho Diretor financeiro Luciano Gibran Diretora de Comunicações Helizabet Salomão Abdalla Ayroza Ribeiro

CONSELHO DE ÉTICA Presidente do Conselho de Ética Nicolau D’Amico Filho Vice-presidente do Conselho de Ética Luís Flávio Cordeiro Fernandes Primeiro-conselheiro do Conselho de Ética João Nogueira Neto Segundo-conselheiro do Conselho de Ética Claudio Crispi Terceiro-conselheiro do Conselho de Ética Caio Parente Barbosa CONSELHO FISCAL Patrick Bellelis Frederico José Silva Correa Gil Kamergorodsky CONSELHO VITALÍCIO Primeiro-membro do Conselho Vitalício Mauricio Simões Abrão Segundo-membro do Conselho Vitalício Rui Alberto Feriani Secretária executiva Monica Sgobbi


Editorial

Eduardo Schor Professor afiliado, livre-docente e coordenador do Setor de Algia Pélvica e Endometriose da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo

Em 2018, completamos dez anos da fundação da SBE. Na elaboração da Sociedade, os fundadores tinham como meta criar uma entidade sólida, capaz de divulgar informações sobre a doença e agregar médicos especialistas do país inteiro. Acredito que cumprimos a primeira etapa, que era dar à Sociedade solidez e sedimentar o nome SBE como um núcleo especializado em endometriose e cirurgia minimamente invasiva. Dentre as realizações, organizamos cinco eventos nacionais de sucesso e estamos agora organizando o sexto, que acontecerá em setembro deste ano em São Paulo. Para esse evento, estamos priorizando a interatividade, visto que a maioria dos participantes atua na área em foco e, portanto, acreditamos que aulas formais de longa duração não seriam um formato adequado. Portanto, as exposições serão curtas e o tempo de discussão foi ampliado, o que facilitará a discussão entre todos. Outro objetivo alcançado foi a revista da Sociedade. Acreditamos na época, e continuamos acreditando, que a revista é uma forma interessante de divulgar informações sobre a Sociedade, a endometriose e a cirurgia minimamente invasiva. Atualmente, os fascículos contam com casos clínicos, artigos originais, discussão multiprofissional, entre outros. Apesar de estarmos contentes com o lugar a que chegamos, muito ainda deve ser feito. Vamos passar para a segunda fase da sedimentação da Sociedade. Dentre os passos a serem cumpridos, acredito que a nacionalização desta será indispensável. Levar informações e trocar experiências com médicos do país inteiro é uma função que cabe à SBE. A realização de eventos regionais está sendo planejada e esperamos alcançar diversas regiões do país. Outro objetivo inicial da SBE foi a maior divulgação da doença para a população leiga e também para o ginecologista geral. Atualmente, com a utilização dos recursos digitais, essa tarefa ficou mais fácil. A organização do site e das mídias sociais com esse objetivo está em nosso plano para o próximo ano. Além desse objetivo, o site tem também a função de ser um espaço de troca de experiências e discussão de casos entre especialistas. Com certeza, o evento em setembro, no qual esperamos a participação de inúmeros especialistas, será o espaço para ouvir todos e, juntos, traçar os novos passos da SBE. A ajuda de todos é indispensável! Contamos com você!

Eduardo Schor Vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endometriose

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Especialista para especialista

Visão da ginecologista

Abordagem do especialista sobre endometriose e nutrição Beatriz Taliberti da Costa Porto Mestre pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo Assistente voluntária do Setor de Endoscopia Ginecológica e Endometriose da Santa Casa de São Paulo A endometriose é uma doença crônica estrógeno-dependente considerada de comportamento variável e incerto1. Os estudos estão cada vez mais buscando identificar a sua etiopatogenia como causas ambientais, genéticas, imunológicas e anatômicas para auxiliar tanto no tratamento como evitar a doença e a recidiva desta tratada cirurgicamente2. O que já se consagrou é que o tratamento de eleição para a endometriose profunda é cirúrgico3. O tratamento medicamentoso, por sua vez, não é considerado tão efetivo ao tratar a doença3. Porém, a endometriose necessita de tratamento multidisciplinar, pois a mulher, muitas vezes, dependendo da complexidade e do quanto está afetando a sua qualidade de vida, pode necessitar de acompanhamento psicológico pela depressão4, de fisioterapia e atividade física que podem diminuir níveis de estrogênio ou sua biodisponibilidade, reduzindo o risco da doença e melhorando a qualidade de vida dela5. Uma alternativa que a medicina está apostando como adjuvante no tratamento dos sintomas é uma dieta capaz de alterar a fisiopatologia responsável pela dor6. O acompanhamento nutricional tem sua importância, para alguns especialistas, principalmente quando há ressecções intestinais importantes7. Uma dieta saudável e com determinados nutrientes pode impactar no risco de desenvolver a doença, na melhora da dor e até mesmo na recidiva após o tratamento cirúrgico. Sugere-se que pode atuar no processo inflamatório, na atividade do estrogênio, no ciclo menstrual e no metabolismo da prostaglandina8. As pesquisas referentes à nutrição e à endometriose, na maioria das vezes, foram realizadas em animais, reforçando a necessidade da avaliação em humanos para se verificar a reprodutibilidade nos resultados. Os achados são promissores, mas sua veracidade nos humanos seria um avanço9. A endometriose tem um comportamento semelhante ao das lesões tumorais e, por isso, alimentos seletos estão sendo caracterizados com capacidade de gerar reações anti-inflamatórias e antiproliferativas, podendo auxiliar no tratamento da doença10. A gordura e seus tipos foram avaliados para se relacionarem com a endometriose e observou-se em diversos estudos que as gorduras saturadas e poli-insaturadas apresentam mais risco de desenvolver a doença e que a relação com uma dieta rica em ômega 3 causa menos dor no período menstrual, também nas pacientes já tratadas cirurgicamente11,12. A dieta restrita (baixa ingestão calórica e hipogordurosa) também tem mostrado sua importância na endometriose, pois a paciente com sobrepeso ou obesidade, quando alcança objetivos de perda de peso e dieta seleta, apresenta melhora importante de clínica de dor13. Para identificar possíveis vias biológicas comuns envolvidas na etiologia da endometriose - índice de massa corpórea elevada e adiposidade em geral -, um trabalho conduziu a

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análise de genes associados à endometriose, concluindo que há uma base genética compartilhada entre endometriose e distribuição de gordura13. Uma revisão sistemática de Parazzini et al., em 2013, utilizou como busca os seguintes termos: “dieta”, “nutrição”, “vitamina”, “gordura”, “vegetais”, “café”, “cafeína”, “carne”, “peixe” e ”fruta”, com artigos apenas em inglês, iniciando a busca com 256 artigos e finalizando com 11 que tinham relação da dieta com a endometriose14. Esse estudo sugere importantes informações nutricionais que auxiliam o médico na adjuvância do tratamento clínico da endometriose14. A tabela 1 demonstra com base nessa revisão um resumo do que o especialista pode agregar no combate à dor e melhorar a qualidade de vida da paciente em questão14. A revisão mostra que os vegetais, principalmente os verdes, têm benefício para a doença, interferindo na cadeia de DNA-metil e impedindo a formação

de novas lesões. No que se refere às frutas, ainda não apresentam resultados significativos, porém a conclusão maior é que produzem reação anti-inflamatória14. No que se refere à vitamina A, sugere-se que não tem benefício porque, pelo baixo consumo das mulheres nos estudos, não possibilitou conclusões efetivas14. As vitaminas C, E e D têm a capacidade de diminuir o estresse oxidativo e atuam positivamente no sistema imune. No que se refere aos alimentos gordurosos colocados na Tabela 1, estes são considerados estimulantes hormonais e, por isso, devem ser evitados14. Peixes, óleos vegetais, ômega 3, fibras, soja e café têm pontos positivos no combate à endometriose. Por outro lado, os carboidratos podem atuar negativamente como visto nessa tabela. Neste caso, a opinião do especialista mostra que, hoje, trabalhar com uma equipe multidisciplinar pode ser benéfico à paciente. A dieta escolhida com nutrientes específicos deve ter basicamente os princípios anti-inflamatório e antiproliferativo.

Tabela 1. Principais achados dos efeitos de alimentos específicos sobre processos patológicos associados às endometrioses. Tabela adaptada de Parazzini et al. Diet and endometriosis risk. A literature review. Reproductive Biomedicine online. 2013;26:323-36. Nutriente

Efeito na doença

Efeito potencial na doença

Vegetais

Discutido ↓

Suprimento ou regeneração dos grupos de DNA-metil, sendo alterações moleculares que impedem o desenvolvimento de novas lesões (Riscuta e Dumitrescu, 2012)

Frutas

Discutido

Alteram vias hormonais, podendo ser anti-inflamatórias (não esclarecido) (Grassi et al., 2010; Craig et al., 2011; Buck Louis et al., 2012)

Cenoura, betacaroteno e vitamina A

Discutido

Produzem espécies reativas de oxigênio com reação inflamatória (não esclarecido, devido ao baixo consumo das mulheres) (Mier-Cabrera et al., 2009; Traber e Stevens, 2011)

Vitaminas C e E

Discutido

Diminuem a produção de espécies reativas de oxigênio (Ngô et al., 2009; Traber e Stevens, 2011)

Folatos

Sem efeito

Gordura

Discutido

Aumenta a concentração de estradiol e mediador de estradiol, mantendo a doença (Bu-lun et al., 2012; Fung et al., 2012)

Carne vermelha: gordura saturada

Discutido ↑

Aumenta a concentração de estradiol e mediador de estradiol, mantendo a doença (Bulun et al., 2012; Fung et al., 2012)

Manteiga

Discutido

Aumenta a concentração de estradiol e mediador de estradiol, mantendo a doença (Pape-Zambito et al., 2010; Bulun et al., 2012)

Óleo de azeite, gordura mono

Discutido

Removem a produção de espécies reativas de oxigênio (Psaltopoulou et al., 2011)

Peixe, ômega-3, gordura poli-insaturada

Discutido ↓

Produzem prostaglandina E2 e citocinas (anti-inflamatório) (Calder, 2003)

Gordura trans

Discutido ↑

Aumenta a concentração da produção inflamatória (Mozaffarian, 2006)

Leite, vitamina D

Discutido

Atuam positivamente no sistema imune (Correale et al., 2009; Chambers e Hawrylowicz, 2011; Kriegel et al., 2011) e diminuem a absorção de estrogênio (Kaneda et al., 1997)

Fibras

Discutido

Diminuem a absorção de estrogênio (Kaneda et al., 1997)

Carboidratos e cereais

Discutido

Proliferação de células endometriais por meio de insulina (Friberg et al., 2011)

Soja, fitoestrogênios

Discutido

Efeito antiestrogênio (Yavuz et al., 2007; Chen et al., 2011)

Café

Discutido ↑

Muda a biodisponibilidade de diversos hormônios (não conclusivo) (Ferrini e Barrett-Connor, 1996; Lucero et al., 2001; Homan et al., 2007)

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Diferentes nutrientes podem causar diversos efeitos em estágios diversificados da doença. Por fim, a nutrição direcionada ao tratamento clínico da endometriose, mesmo com resultados duvidosos, tem sua função na melhora dos sintomas e na estabilidade da doença, podendo também ser útil ao evitar recidiva desta.

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Especialista para especialista

Visão da Nutricionista

Abordagem do especialista sobre endometriose e nutrição Maria Fernanda Condes Areias Doutora em Clínica Médica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP). Especialista em Nutrição Clínica pelo Grupo de Apoio a Nutrição Enteral e Parenteral (Ganep). Nutricionista do Núcleo Pró-endometriose

A conhecida associação entre endometriose e diversas condições imunológicas, como fibromialgia, asma, hipotiroidismo e alergias, fez alguns pesquisadores suporem que o sistema imune teria participação no desenvolvimento da doença. Com a evolução desta, ocorrem alterações imunológicas, como aumento das células B e diminuição das células T, resultando em reação atígeno-anticorpo inadequada e, consequentemente, elevação nos níveis de citocinas pró-inflamatórias1. Alguns nutrientes têm função específica para ajudar na resposta inflamatória e na função hormonal, que é a grande responsável pela doença2. Alguns trabalhos demonstram uma importante relação entre o hábito alimentar e a endometriose. Assim, o papel da dieta e sua relação com o aparecimento e o controle dos sintomas relacionados à endometriose já são de interesse há algum tempo e estudos foram realizados nos últimos anos. A dieta pode exercer influência na etiologia da endometriose por meio dos níveis dos hormônios esteroides. As dietas vegetarianas e as dietas ricas em fibras aumentam a excreção de estrogênio, assim como a concentração e a biodisponibilidade deste, diminuindo, dessa forma, o risco de endometriose3,4. Já as dietas ricas em gordura podem levar a aumento nos níveis de “estrona”, sulfato de “estrona” e estradiol em mulheres na pré-menopausa. Sendo assim, dietas pobres em gordura e ricas em fibras talvez possam modificar o risco de endometriose mediante a alteração do metabolismo dos hormônios esteroides5. O tipo de gordura também pode influenciar, de forma significativa, o controle da endometriose. Dietas ricas em ácidos graxos ômega 3 (w-3) estão relacionadas à diminuição da atividade inflamatória nas lesões teciduais6. Além disso, a redução do consumo de gordura “trans” pode ser o primeiro fator de risco modificável identificado para a endometriose. Tais evidências fornecem outra associação de doenças que corrobora os esforços para remover gorduras transinsaturadas do suprimento de alimentos7. O elevado consumo de vegetais verde-escuros e frutas diminui o risco emergente para endometrioses, enquanto a ingestão de carne vermelha e presunto aumenta o risco. Já o consumo de leite, fígado, queijo, cenoura, álcool, café e peixe não apresenta relação significativa com a endometriose1. O glúten também parece exercer um papel importante na diminuição dos sintomas da endometriose. A submissão a uma dieta isenta em glúten por um período de 12 meses demonstrou que 75% das pacientes apresentaram melhora da dor e 25% não observaram

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diferença nos sintomas após esse período e concluiu-se que uma dieta isenta em glúten pode amenizar os sintomas relacionados à endometriose8. Em relação às vitaminas, acredita-se que bons níveis sanguíneos de 25-hidroxivitamina D [25(OH)D] e baixa ingestão de gorduras diminuem o risco de endometriose9. As vitaminas B, C e E podem influenciar os fatores envolvidos na patogênese endometriose, como estresse oxidativo e metabolismo de hormônios esteroides. Sendo assim, uma dieta rica em vitaminas pode contribuir para a melhora dos sintomas10. A vitamina C, especialmente, apresenta efeitos anti-infamatório e antiangiogênico, contribuindo, dessa forma, para a prevenção e regressão da endometriose por diminuição do estresse oxidativo11,12. A soja e os fitoestrogênios provenientes dos alimentos também parecem ter uma relação com a endometriose, os quais parecem aumentar o risco para a doença13. O consumo de café e cafeína e o risco de endometriose ainda são contraditórios. Contudo, acredita-se que o consumo desses alimentos aumenta a concentração de estrogênio e de globulina de ligação a hormônios sexuais14. O consumo de carne vermelha está diretamente relacionado a mais risco de desenvolvimento de endometriose10. Sendo assim, o papel da dieta na etiologia da endometriose fica evidente, podendo esta constituir um fator de risco ou de proteção altamente modificável. A participação e a inclusão da nutricionista na equipe multidisciplinar no atendimento das pacientes com endometriose são de suma importância, contribuindo para a melhora da qualidade de vida dessas mulheres, uma vez que determinados alimentos e nutrientes podem minimizar ou até mesmo interferir nos sintomas clínicos que têm impacto significativo na saúde física e mental das portadoras.

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Referências bibliográficas 1.

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ENDOMETRIOSE2018.COM.BR Rev SBE • 2018 • 7 (1)

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Caso clínico

Endometriose de vagina – Nova abordagem de avaliação ultrassonográfica tridimensional (US-3D) do fórnice posterior e septo retovaginal – Relato de caso Cossi PS, Kamergorodsky G, Kopleman A, Silva Neves J, Schor E Setor de Algia Pélvica e Endometriose do Departamento de Ginecologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo

Introdução A endometriose de vagina ocorre quando há acometimento do tecido conjuntivo entre a parede do reto e a parede da vagina, com formação de nódulo com predomínio do componente fibroso1. Os sintomas mais frequentes são dispareunia e dor pélvica, podendo cursar também com infertilidade. Um bom exame clínico é circunstancial, mas é necessário diagnóstico iconográfico para estadiamento, como ressonância magnética e USTV com preparo intestinal. A exérese é o tratamento padrão. A seguir, será relatado o caso de uma jovem que apresentou nódulo de endometriose de vagina em consulta de rotina, em que o estadiamento da lesão foi realizado com US-3D transvaginal.

Descrição do caso T. R., 32 anos, nuligesta, oligossintomática, sem comorbidades ginecológicas. Em exame de rotina ginecológica, notou-se, ao toque, nódulo endurado em fórnice posterior na linha média. Os exames de imagens USTV convencional e ressonância magnética pélvica não identificaram a lesão. Optou-se por complementar o exame com nova abordagem que empregou US tridimensional (USTV 3D), que demonstrou a presença de pequena imagem nodular isoecoica em parede vaginal, ao nível do fórnice, que se estendia em profundidade até a serosa do reto. Paciente foi submetida a tratamento cirúrgico para exérese da lesão, confirmando a suspeita clínica. A figura 1 em “modo de superfície” – também chamado “renderização” – reconstrói a lesão em visão semelhante ao exame especular. A figura 2 demonstra a lesão em corte axial, nitidamente delineando seus limites e ilustra a invasão da serosa do reto.

Descrição da técnica de US-3D para avaliação de fórnice e septo retovaginal Ao final da US para mapeamento pélvico de endometriose, com a bexiga parcialmente repleta, introduzem-se na vagina cerca de 80 ml de gel ultrassônico isento de bolhas de ar. O transdutor transvaginal é colocado a 2 a 3 cm do introito vaginal. Na janela de inte-

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Figura 1 - USTV 3D em “modo renderizado”, possibilitando a visão espacial da lesão em fórnice posterior.

Figura 2 - Corte em plano axial da lesão. A magnificação (zoom) permitiu visualizar com detalhes a invasão da serosa do reto.

resse para aquisição do volume 3D, deve-se incluir em corte sagital parte da bexiga (cranial), o septo retovaginal em toda a sua extensão e o reto (caudal) e colo uterino (profundidade). A aquisição do bloco de volume obedece à seguinte normativa: a frequência de 6 a 9 MHz, ângulo de varredura mais amplo possível para que inclua bexiga, colo e septo retovaginal (ângulo máximo: 120º), velocidade de varredura média e qualidade máxima. As figuras 3 e 4 ilustram essa sistemática. No pós-processamento, o “modo multiplanar” permite a realização dos três planos cortes ortogonais,

demonstrando toda a arquitetura sonográfica do fórnice, do septo retovaginal e da parede anterior da vagina (Figura 5).

Figura 3 - Desenho esquemático do corte sagital para aquisição do bloco de volume 3D.

No “modo renderizado – visão 3D”, toda a cavidade vaginal encontra-se acessível, possibilitando reconstrução espacial de todo o canal vaginal, permitindo a visualização de lesões tanto em fórnice quanto em septo retovaginal. As figuras 5 e 6 ilustram casos patológicos: o corte sagital 3D da vagina, com visualização do canal vaginal e do septo retovaginal.

Figura 4 - “Aquisição do bloco de volume” incluindo vagina com gel anecoico, bexiga com pouca repleção, colo uterino ao centro e septo retovaginal em toda a sua extensão.

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Figura 5 - Visualização dos três planos ortogonais. Observa-se a vagina com interface absolutamente anecoica (gel).

Discussão A prevalência das lesões de endometriose na vagina pode variar entre 8,5% e 27,9% nas pacientes com endometriose profunda2. De maneira geral, a acurácia dos principais métodos de imagens para as lesões de vagina é baixa e, segundo Exacoustos et al., a USTV tem sensibilidade de 58,6%, especificidade de 82,7% e acurácia de 75,9%. Bazot et al. relataram para a USTV sensibilidade de 46,7%, especificidade de 95% e acurácia de 79,3% e para a RM sensibilidade de 80%, especificidade de 85,5% e acurácia de 83,7%2,3. Esses números demonstram que tanto a USTV quanto a RM não são métodos precisos para o diagnóstico das lesões de vagina e também de septo retovaginal. O desenvolvimento dessa nova metodologia com US-3D de vaginal tem potencial para incrementar esses números, pois apresenta a vantagem de insonar as estruturas na zona de foco ideal do transdutor vaginal, em razão do uso de gel ultrassônico sem bolhas, que cria uma interface anecoica ideal, permitindo acesso aos cortes nos três planos coronais. Especificamente, o corte axial da lesão conse-

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Figura 6 - Visualização da vagina no sentido “dentro-fora”. No centro, o colo uterino, e na parede posterior da vagina, o nódulo e sua relação com as estruturas adjacentes.

gue avaliar a profundidade em “precisos” 90 graus, fato não acessível na USTV convencional nem pela RM. No modo de reconstrução de superfície (modo renderizado), tem-se a “visão especular” da lesão, facilitando uma melhor compreensão tanto para o médico-assistente quanto para a própria paciente. Este caso relatado exemplificou bem essa recente sistemática e suplantou os achados da USTV convencional e da ressonância magnética. A validação dessa técnica é motivo de estudo em nosso serviço.

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De olho na imagem

This is a submucosal myoma of the anterior wall of the uterine cavity. According to the ESGE classification this is a G1, totally intracavitary myoma with a diameter of 2,5/3 cm. The IBS removal of this myoma lasted 15 minutes and the procedure was performed under visual control with almost no bleeding.

GYN 56 2.0GYN 04/2015/A-PT 56 2.0 04/2015/A-PT

Fonte: Dr. Giuseppe Bigatti

This is heart shaped polyp with a diameter of approximately 15 mm located into the right lateral wall of the uterine cavity very close to the tubal ostia. Its removal lasted a few seconds and it is interesting to note there was no damage of the surrounding endometrial tissue and related tubal ostia.

This image shows the Shaver tip in action during an operative hysteroscopy. It is important always to check the correct movement of the blade once entered the uterine cavity before starting the procedure.

Shaver intrauterino BIGATTI (IBS) para a histeroscopia cirúrgica Shaver intrauterino BIGATTI (IBS) para a histeroscopia cirúrgica

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Caso clínico

Neuromodulação sacral para tratamento de disfunção urinária após cirurgia de endometriose profunda: relato de caso Camila Beckhauser Calegari1, Leandro Nóbrega1, Fernando Almeida2, Marco A. Bassi1, Luciano Gibran1 Núcleo de Endoscopia Ginecológica e Endometriose do Hospital Pérola Byington Universidade Federal do Estado de São Paulo

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Resumo Endometriose profunda intestinal é uma doença infiltrativa que pode estar associada a dores pélvicas e sintomas digestivos graves. A cirurgia de ressecção intestinal segmentar é uma opção quando há sinais de estenose da luz do órgão e apresenta boa resposta terapêutica, porém, quando comparada às técnicas de shaving ou ressecção discoide, apresenta maiores taxas de complicações, dentre elas a disfunção miccional por lesão nervosa. Este caso relata o tratamento e seguimento de uma paciente submetida a implante de neuromodulador sacral devido à disfunção miccional após cirurgia de endometriose profunda.

Introdução Endometriose profunda intestinal é caracterizada pela presença de infiltração de tecido endometrial (glândula e/ou estroma) até o nível da camada muscular do intestino1. A doença pode causar dores pélvicas e sintomas digestivos graves, eventualmente não responsivos à terapia medicamentosa2,3. Nos casos em que a doença profunda infiltra a região paracervical em direção ao assoalho pélvico, região do trajeto do plexo hipogástrico inferior, podem ocorrer disfunções urinárias, mesmo sem a realização de procedimentos cirúrgicos, pelo próprio comprometimento da doença sobre os feixes nervosos autonômicos4. Sabe-se que a cirurgia com ressecção intestinal segmentar é uma opção que oferece possibilidade de melhora sintomática e de qualidade de vida a mulheres com lesões estenosantes de intestino. No entanto, pode estar associada a mais risco de disfunções urinárias, como retenção transitória ou definitiva, ou, ainda, bexiga hiperativa, em razão de lesão iatrogênica de fibras do plexo hipogástrico inferior, observada em até 5% dos casos5-7. Esse contexto clínico está associado a impacto negativo na qualidade de vida, com mais risco de isolamento social, sintomas depressivos, má qualidade do sono por noctúria, necessidade de cateterismo intermitente e infecção5.Terapia comportamental, fisioterapia do assoalho pélvico e intervenções medicamentosas devem ser testadas. Contudo, nos casos em que o tratamento conservador não é efetivo, a neuromodulação sacral tem sido proposta como alternativa para a melhora dos sintomas em casos de distúrbios urinários8. O procedimento minimamente invasivo realizado por via transcutânea constitui-se em introdução de eletrodos metálicos em forâmen de S3 conectado a dispositivo estimulador. O mecanismo de ação desse método ainda não foi completamente compreendido. Acredita-se que envolva a modulação elétrica de vias nervosas aferentes e eferentes das vís-

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ceras pélvicas. Ainda há poucos estudos associando esse método terapêutico para disfunção vesical após cirurgia de endometriose profunda intestinal. Esse relato de caso descreve os resultados desse procedimento9,10.

Relato de caso Paciente do sexo feminino, 39 anos de idade, com quadro de dor pélvica crônica cíclica progressiva desde a menarca aos 13 anos, apresentou achado aos 32 anos em ressonância nuclear magnética de nódulo de endometriose profunda em compartimento posterior com acometimento de retossigmoide e ligamentos uterossacros (nódulo hipoecogênico em parede de reto a 6 cm da borda anal comprometendo a camada muscular até a mucosa, medindo 3,8 x 2,3 cm, acometendo 55% da circunferência + nódulo hipoecogênico retrocervical acoplado à lesão retal medindo 1,8 x 1,3 cm). O quadro clínico foi refratário ao tratamento com progesterona oral (desogestrel 0,075 mg) e sistema intrauterino liberador de levonorgestrel. Ao longo do tempo, a paciente evoluiu com inapetência, plenitude precoce, distensão abdominal, afilamento das fezes, o que sugeriu quadro de suboclusão intestinal, com indicação imediata de retossigmoidectomia segmentar laparoscópica em dezembro de 2015. No pós-operatório, apresentou retenção urinária com necessidade de uso de sonda vesical de demora, a princípio por 14 dias, voltando a reter urina e novamente sendo sondada por mais 30 dias. Após esse período (44 dias), apresentou micção espontânea, porém evoluiu com urgência miccional, noctúria e polaciúria.

Foram realizados seguimentos seriados para ajuste da potência e avaliação de resposta clínica. Obteve-se redução nas frequências urinárias diurna e noturna, na sensação de esvaziamento vesical completo e no início do jato urinário imediato sem necessidade de esforço. Posteriormente, foi submetida à colocação do gerador, tendo alcançado micções satisfatórias e com regularidade confortável.

Discussão O presente relato demonstra a evolução pós-operatória desfavorável da ressecção segmentar intestinal para tratamento de endometriose profunda em reto a 6 cm da borda anal e ligamentos uterossacros, onde a paciente apresentou disfunção urinária com características específicas, e, após intervenções clínicas sem bons resultados, optou-se pelo implante de neuromodulador sacral. Ao longo dos últimos anos, desde que o tratamento cirúrgico da endometriose profunda intestinal foi estabelecido, diversos autores têm apresentado taxas de complicações variáveis e a disfunção urinária pós-operatória tem sido evidenciada e associada a lesões baixas ou ultrabaixas e à técnica cirúrgica utilizada para ressecção11. A lesão ressecada neste caso situa-se anatomicamente em reto baixo, pois encontrava-se abaixo da reflexão peritoneal (6 cm da borda anal)12. Em razão de o formato da pelve feminina exercer um afunilamento nessa região, quanto mais baixa for a manipulação cirúrgica, maior será a proximidade com as estruturas nervosas que compõem o plexo hipogástrico inferior13.

Um estudo urodinâmico do quinto mês de pós-operatório revelou hiperatividade do detrusor moderada, precocidade na sensação de enchimento vesical e curva fluxométrica intermitente e alongada compatível com processo obstrutivo infravesical. Em anamnese direcionada no pós-operatório, foi relatado que, desde a infância, apresentava história de dificuldade de iniciar o jato urinário e sensação de esvaziamento incompleto, porém não relatado pela paciente previamente por considerá-lo normal.

A anatomia dos nervos pélvicos merece um importante destaque para o manejo cirúrgico adequado. De forma geral, os nervos pélvicos autonômicos são responsáveis pelo controle neurogênico sexual, retal e vesical. Os nervos hipogástricos são formados por fibras sensitivas e simpáticas responsáveis pelo relaxamento do músculo detrusor da bexiga e pela contração do esfíncter uretral. Os nervos esplâncnicos pélvicos, por sua vez, carregam as fibras parassimpáticas, responsáveis pela função de contração do músculo detrusor da bexiga14.

Foram prescritas terapia comportamental e fisioterapia e, pelas evidências de processo obstrutivo, foi contraindicado o uso de anticolinérgicos. Em abril de 2017, ainda mantendo quadro de debilidade da função miccional, foi submetida a implante do teste de neuromodulação sacral InterStim (Medtronic, Inc, Minneapolis, Minn). O procedimento teste foi realizado sob orientação fluoroscópica usando gerador modelo 3058 InterStim II Medtronic (largura de pulso de 210 µs e frequência de 14 Hz), tendo sido obtida resposta neurológica adequada.

A cirurgia com preservação nervosa (nerve sparing) utilizada para tratamento do câncer de colo uterino foi apontada, a princípio, como solução para evitar danos neurológicos em cirurgias de endometriose profunda, porém essa realidade nem sempre pode ser levada à prática, pois, uma vez que a doença, com características infiltrativas, compromete as estruturas nervosas dessa região, tanto o processo inflamatório diretamente sobre os nervos provocado pela endometriose quanto o dano provocado pela manipulação cirúrgica serão capazes de promover alterações funcionais14-16.

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A ressecção segmentar tem sido amplamente controversa e apontada como uma das principais causadoras de danos neurológicos com repercussão funcional. Outras técnicas como o shaving, a ressecção discoide, o duplo grampeamento17 e a ressecção linear têm sido apontadas como soluções menos agressivas e, portanto, com menos riscos de dano às estruturas anatômicas regionais, porém, no caso desta paciente, cuja lesão apresentava características estenosantes, acometendo toda a parede retal até a mucosa, com quase 4 cm de extensão, a única técnica passível de tratamento radical adequado seria, de fato, a ressecção segmentar18-20. A preservação do sistema nervoso autônomo pélvico é dificultada pelo fato de que seus nervos não são claramente vistos no campo cirúrgico devido à sua estrutura minúscula e à profundidade e à estreiteza da pelve13. A cirurgia radical de endometriose profunda, com ou sem ressecção intestinal, pode causar danos graves aos nervos autonômicos pélvicos, podendo desencadear retenção urinária e necessidade de autocateterização durante um longo período ou mesmo permanentemente21. A dissecção unilateral do ligamento uterossacro com lesão dos nervos pode induzir retenção urinária importante. Diferentes técnicas de preservação de nervos foram adaptadas em cirurgia radical para câncer cervical precoce e endometriose. A laparoscopia permite uma melhor visualização das estruturas retroperitoneais e melhor identificação dos nervos pélvicos, favorecendo sua preservação22. Neste caso, especificamente, acredita-se que a infiltração dos nervos pélvicos per se já era causadora de alterações das funções miccional e evacuatória, uma vez que a paciente apresentava diversos sintomas, como constipação crônica e dificuldade para micção. Outra possibilidade é que a paciente pudesse apresentar uma alteração congênita, como estenose uretral, por exemplo, pois, desde a infância, apresentava dificuldade para iniciar o jato urinário. Essa possibilidade encontra respaldo no achado do estudo urodinâmico que evidenciou curva fluxométrica intermitente e alongada compatível com processo obstrutivo infravesical. Considera-se que nesse caso houve lesão parcial na inervação pélvica, pois, após 44 dias de cateterização vesical, a paciente voltou a urinar espontaneamente, porém foram observadas novas queixas urinárias, como urgência miccional, noctúria e polaciúria, provavelmente decorrentes do processo lesional. Complicações possíveis em cirurgia de endometriose incluem disfunção detrusora por lesão da inervação motora vesical23. Tal fato pode ser explicado pela localização dos nervos hipogástricos e do PHI na porção proximal com o ligamento uterossacro.

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Em 1994, um estudo realizado por Mineli et al. demonstrou que pacientes submetidas à cirurgia para excisão total ou parcial de ligamento uterossacro sofreram retenção urinária pós-operatória, geralmente transitória, ou distúrbios da peristalse intestinal, corroborando com a hipótese de que o dano neurológico não está relacionado especificamente à ressecção intestinal24. A eficiência do detrusor depende da atividade do nervo autonômico e somático. A lesão dos ramos detrusores dos nervos esplâncnicos pélvicos pode causar denervação dos detrusores e, consequentemente, retenção urinária. Os ligamentos uterossacrais e cardinais não são apenas um tecido conjuntivo que suporta o útero, mas contêm extensões do plexo hipogástrico inferior, cuja concentração é significativamente maior perto da origem desses ligamentos na parede pélvica lateral8. Em um estudo sobre ressecção colorretal laparoscópica para endometriose intestinal, viabilidade, complicações e desfecho clínico, demonstrou-se que a retenção urinária transitória ocorreu em 71 pacientes (19,9%). Após 30 dias, 34 pacientes (9,5%) apresentaram retenção urinária persistente e 15 (4,2%), constipação intestinal. No grupo de pacientes tratados com a técnica de preservação dos nervos, 5,8% apresentaram retenção urinária persistente e 3,8%, constipação após 30 dias. No entanto, na população total do estudo, os sintomas urinários foram resolvidos em todos os pacientes, exceto em três (0,8%)22. A paciente desse estudo foi tratada com terapia comportamental, tendo sido recomendado esvaziar a bexiga temporariamente e não ingerir grandes quantidades de líquidos no período noturno devido a queixas de noctúria. Além disso, foi submetida a sessões de fisioterapia do assoalho pélvico regularmente durante seis meses. Não havendo resposta satisfatória a essas terapias, optou-se pelo implante do neuromodulador sacral InterStim II (Medtronic, Minneapolis, EUA). O InterStim foi aprovado nos Estados Unidos, na Europa e em vários outros países, incluindo o Brasil, para o tratamento de pacientes com polaciúria associada a urgência miccional, bexiga hiperativa refratária, retenção urinária idiopática e disfunções de esvaziamento vesical25. A realização da estimulação sacral ou neuromodulação sacral consiste em duas etapas. A primeira é conhecida como avaliação neuronal percutânea e, posteriormente, a segunda fase, constituída pelo implante cirúrgico definitivo do eletrodo e do gerador de pulso, em pacientes que apresentam melhora satisfatória dos sintomas na avaliação inicial. A neuromodulação sacral tem por princípio a estimulação neuronal contínua, levando à modulação do


controle reflexo do trato urinário inferior. Esse efeito é relativamente compreensível em pacientes com bexiga hiperativa, em que a estimulação aferente de S3 inibe a atividade detrusora em nível de medula sacral, diminuindo a instabilidade detrusora e a urgência miccional. Porém, o mesmo estímulo pode levar um paciente com retenção urinária não obstrutiva a ter um melhor esvaziamento vesical. Para explicar esse fato, há uma teoria que sugere que a anormalidade primária nesses pacientes é uma hiperatividade cortical inibitória que também seria modulada pela estimulação de S3. O fato de que duas condições opostas podem responder à mesma terapia atesta a complexidade da autorregulação do trato urinário inferior8-10. Assim, como muitas outras formas de tratamento para disfunções do trato urinário inferior, o exato mecanismo de ação da neuromodulação sacral ainda não foi totalmente esclarecido e mecanismos de reflexo sacral, bem como centros de modulação pontinos ou corticais, têm sido postulados como responsáveis pelo resultado.

Conclusão A retossigmoidectomia, por meio da ressecção segmentar de lesões retais ultrabaixas, associada à ressecção do ligamento uterossacro, pode ocasionar disfunção miccional por dano às fibras nervosas do plexo hipogástrico inferior conforme apresentado nesse caso. O uso do neuromodulador sacral para tratar disfunção urinária pós-operatória refratária demonstrou ser uma alternativa terapêutica viável e eficaz.

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Endometriose: uma população de alto risco para doenças crônicas? Kvaskoff M, Mu F, Terry KL, Harris HR, Poole EM, Farland L, Missmer SA. Hum Reprod Update. 2015 Jul-Aug;21(4):500-16 Júlio Cesar Rosa e Silva1, Ana Carolina Japur de Sá Rosa e Silva2 Professor-associado do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Diretor científico da SBE 2 Professora-associada do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da FMRP-USP 1

Neste artigo de revisão, Kvaskoff et al. discutem a associação da endometriose com diversas doenças crônicas, como câncer, doenças autoimunes, doenças cardiovasculares, asma e doenças atópicas com base nos achados epidemiológicos existentes na literatura científica, e o potencial mecanismo envolvido nessas associações. Existem evidências do envolvimento hormonal, inflamatório, genético, ambiental e imunológico na gênese da endometriose, embora ainda careça de maiores elucidações se muitas dessas alterações são causa ou consequência da doença. Porém, a associação com algumas doenças crônicas tem sido sugerida e sua compreensão pode trazer conhecimento sobre alguns aspectos da sua etiopatogenia. Para isso, os autores utilizaram uma ampla revisão na literatura científica nas bases de dados PubMed e ISI Web of Knowledge entre endometriose e outras doenças crônicas e possíveis hipóteses do mecanismo envolvido nessa associação.

Câncer Cânceres ginecológicos Apesar de a endometriose ser considerada uma doença benigna, apresenta alguns comportamentos semelhantes aos dos tumores malignos, como proliferação aumentada, apoptose diminuída, invasão tecidual, disseminação hematogênica e danos genéticos, por isso tem sido associada a alguns tipos de cânceres. De todas as neoplasias, o câncer de ovário é o mais associado à endometriose. Com base, em sua maioria, em estudos retrospectivos, a associação de endometriose e câncer ovariano de células claras e o tipo endometrioide foi mais evidente com dados consistentes e de alto poder estatístico. Curiosamente, tais pacientes tiveram melhor sobrevida e detecção em estádios mais precoces do que as pacientes sem endometriose. Em relação ao câncer de endométrio, a maioria dos estudos também mostrou associação positiva entre essas duas doenças, porém os dados são escassos e de baixo poder estatístico, não permitindo concluir que tal associação seja realmente verdadeira. O câncer de mama tem situação inconclusiva, sendo encontrados na literatura científica dados epidemiológicos que o associam à endometriose, outros que mostram que não se associa e aqueles ainda que demonstram efeito protetor para câncer de mama. Já o câncer de colo uterino parece estar associado à diminuição da sua prevalência em mulheres com endometrioses. Estudos baseados em sua maioria em dados suecos demonstram que tal asso-

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ciação negativa ainda carece de mais investigação, visto que o poder estatístico também foi baixo.

Outros cânceres Em relação aos cânceres não ginecológicos, o melanoma é o mais estudado, porém os dados da literatura científica ainda não estão claros e, em sua maioria, demonstram inconsistência. Outros tipos de cânceres têm sido investigados, porém os dados são escassos e de baixo poder estatístico. São eles: linfoma não Hodgkin, cânceres endócrinos, como de tireoide e renal, não sendo possível avaliar se essa possível associação é verdadeira.

Doenças autoimunes Sabidamente, as mulheres apresentam mais prevalência de algumas doenças autoimunes, como lúpus eritematoso sistêmico (LES), síndrome de Sjögren (SS), esclerodermia, esclerose múltipla (EM) e artrite reumatoide (AR) em relação aos homens, possivelmente por ação hormonal e questões genéticas e ambientais. Os hormônios sexuais têm sido envolvidos no possível mecanismo de ligação entre essas doenças, pois podem ter efeito supressor no sistema imune, como os andrógenos, ou estimulador, como prolactina e estrógenos, ao mesmo tempo que mulheres com endometriose têm demonstrado alterações no sistema imune tanto celular como humoral. Os dados da literatura científica têm se demonstrado conflitantes e, em sua maioria, sem poder estatístico. O mais recente estudo que envolveu mais de 37 mil mulheres na Dinamarca associou positivamente a endometriose a LES, SS e EM, porém utilizou-se de dados sem confirmação cirúrgica da doença. Quando esses dados foram depurados, a associação só se manteve para EM, com poder estatístico realmente significativo, além da associação com doenças inflamatórias intestinais, como doença de Chron e retocolite ulcerativa. Outras doenças autoimunes como doença celíaca também foram encontradas com possível associação com endometriose, mas os dados ainda são insuficientes para confirmação estatística. Tal fato também ocorreu para as doenças autoimunes tireoidianas.

eczema atópico, intolerâncias alimentares e reações alérgicas exacerbadas. No estudo mais recente sobre o tema, Matalliotakis et al. demonstraram clara associação entre endometriose e asma, rinite alérgica e alergia medicamentosa, principalmente penicilina, com análise com poder estatístico significativo.

Doença cardiovascular Vários estudos têm associado endometriose a fatores de risco para doença cardiovascular, como aumento de citocinas inflamatórias local e sistemicamente, níveis aumentados de marcadores de estresse oxidativo e perfil lipídico alterado. Porém, os dados epidemiológicos só se concretizaram com o estudo Nurses’ Health Study II que demonstrou a associação entre endometriose e infarto do miocárdio, angina e angioplastias.

Conclusão Os autores concluíram que existem crescentes evidências de que mulheres com endometriose apresentam mais alto risco de várias doenças crônicas, embora o mecanismo pelo qual isso acontece ainda não possa ser explicado totalmente. Se tais mecanismos envolvem sistema endócrino, imunológico, resposta inflamatória exacerbada, fatores genéticos ou ambientais ou a associação de todos eles, ainda não se sabe. Futuros estudos, com metodologias adequadas e refinadas, são necessários para confirmar tais dados e, principalmente, definir o mecanismo pelo qual essa associação se faz presente.

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Asma e alergias Alguns estudos têm demonstrado relação entre endometriose e doenças alérgicas, como asma,

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Morcellation during uterine tissue extraction: an update The Tissue extraction Task Force Members. J Minim Invasive Gynecol. 2018 MayJun;25(4):543-50 Ricardo de Almeida Quintairos1, Rômulo Muller dos Santos Melo2, Eduardo Miranda de Paiva3, Celyne Agrassar da Silva4 Coordenador-geral da Pós-graduação em Cirurgia Laparoscópica do Hospital Porto Dias Coordenador da Residência Médica de Ginecologia e Obstetrícia da Santa Casa do Pará 3 Preceptor da Pós-graduação em Cirurgia Laparoscópica do Hospital Porto Dias 4 Médica especialista em Endoscopia Ginecológica 1 2

Introdução e contextualização Este artigo traz uma atualização sobre uma situação não protocolar em cirurgia minimamente invasiva, que é o morcelamento de tecidos uterinos, quer seja mioma, quer seja mesmo o útero (miomectomia ou histerectomia subtotal). Morceladores eletromecânicos foram aprovados em 1995 pela Food and Drug Administration (FDA), porém, em 2014, a imprensa norte-americana noticiou a fragmentação em uma histerectomia supracervical laparoscópica com suposto diagnóstico de mioma uterino, porém o histopatológico revelou leiomiossarcoma. Esse fato fez a empresa responsável pela produção dos morceladores eletromecânicos retirar do mercado todos os equipamentos em âmbito mundial, restando apenas os instrumentos permanentes. Por esse motivo, a FDA emitiu um comunicado de segurança alertando quanto à possibilidade de disseminação de malignidade contida em peças cirúrgicas, principalmente o leiomiossarcoma (LMS)1. Consequentemente a esse comunicado, em 2014 a American Association of Gynecologic Laparoscopists (AAGL) fez uma análise crítica das pesquisas sobre as questões envolvidas nessa controvérsia e produziu uma revisão abrangente sobre o tema3. Desde então, novos estudos de alta qualidade surgiram, o que justificou novas atualizações e revisões sobre o tema2,3. Desta forma, neste artigo a AAGL se propõe a analisar criticamente os novos estudos e atualizar sua declaração anterior sobre o tema, com foco nas áreas em que a pesquisa e o debate ocorreram, ou seja, nos riscos de malignidade na peça cirúrgica. O assunto é de extrema relevância, pois, com a técnica laparoscópica já bem difundida e a progressão de equipamentos, cirurgias mais complexas e tumores de maiores dimensões estão sendo abordados, mantendo os conceitos de cirurgia minimamente invasiva e as vantagens em relação à laparotomia4.

Prevalência de câncer e sarcomas uterinos De acordo com os atuais estudos sobre prevalência de tumores uterinos malignos, o câncer uterino inadvertido pode estar presente em espécimes de histerectomia na frequência de 1:350 procedimentos2,5,6. No entanto, a maioria são carcinomas endometriais, tumores cujo morcelamento parece não afetar o prognóstico7-9.

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Já os sarcomas uterinos (em especial, o LMS), diferentemente dos tumores endometriais, são difíceis de distinguir dos leiomiomas benignos no pré-operatório, portanto representam um risco em cirurgia para patologia uterina benigna presumida10. A primeira tentativa de determinar a taxa de prevalência de LMS foi feita pela FDA em 2014, em uma revisão sistemática com alguns vieses e falhas, tendo encontrado uma taxa de 1:498 cirurgias2. Em 2015, Pritts et al., em um trabalho mais abrangente e criterioso, com 5 mil resumos e mais de mil manuscritos revisados e analisados, concluíram em uma metanálise que a taxa de LMS seria de 1:1.700 em estudos retrospectivos, 1:8.300 em estudos prospectivos e taxa de prevalência geral de 1:2.000 cirurgias11. Esses dados foram atualizados pela Agency for Healthcare Research and Quality of the Department of Health and Human Services (AHRQ) em 2017, tendo utilizado a mesma metodologia, adicionado mais de 106.002 cirurgias e 27 estudos e encontrado a taxa de menos de 1 caso a cada 4 mil cirurgias, usando histopatológicos confiáveis12.

Impacto do morcelamento na disseminação de tecido e sobrevida É provável que a fragmentação do tecido uterino, independentemente da técnica, possa piorar o prognóstico da doença, porém um percentual de pacientes que apresentam doença disseminada no momento da primeira cirurgia é difícil de demonstrar10. Nos casos de LMS, os desfechos costumam ser desfavoráveis, com taxa de sobrevida em 5 anos de apenas 40%. Mesmo nos casos em que as massas são extraídas da cavidade de forma íntegra, a maioria apresenta recidiva em 2,5 anos, mesmo em estádios precoces, com sobrevida de apenas 52 meses13. O LMS tem mau prognóstico independentemente da forma como foi retirado. O morcelamento desse tumor parece afetar negativamente o prognóstico do LMS14-17. Em 2015, uma metanálise de quatro revisões sistemáticas sugeriu que a ruptura do tumor levaria a um pior prognóstico, porém a metodologia utilizada recebeu duras críticas, o que torna seus resultados questionáveis e, portanto, não comprova o prejuízo maior do morcelador elétrico em relação a outras técnicas de morcelamento2. A melhor análise disponível foi encontrada no relatório AHRQ de 20173. Foram incluídos 28 estudos

de 14 países que forneceram dados sobre a progressão da doença em mulheres que tinham LMS identificado no momento da cirurgia inicial para miomas presumidos e para quem o método de remoção do tumor era conhecido e os dados de tempo de sobrevida poderiam ser extraídos. Setecentas e quinze mulheres foram tratadas de 1980 a 2015. A sobrevida global em cinco anos foi de 30% com morcelamento eletromecânico, 59% em mulheres submetidas a morcelamento manual e 60% sem morcelamento. Enquanto as estimativas parecem favorecer a morcelamento manual ou nenhum, não houve diferença estatística entre os grupos3.

Avaliação do paciente de risco para LMS O risco de LMS na população geral é de 1:25.0008. A criteriosa avaliação dos riscos de malignidade no pré-operatório ainda é válida e incentivada. Idade avançada, tumores volumosos, tumores com pouca resposta a análogos ou embolização, além do uso prévio de tamoxifeno, são considerados fatores de risco e devem ser analisados na escolha da técnica de extração dessas massas14,19. O maior avanço promete ser no diagnóstico preciso do LMS antes do procedimento cirúrgico. Métodos de diagnóstico por imagem são promissores, como RNM DWI e LDH, no entanto com poucas publicações e alguns resultados conflitantes20-22.Testes ou exames para confirmar a presença ou ausência de LMS ainda são desejados. Estudos com biópsia e testes imuno-histoquímicos evidenciaram também bons resultados, porém considerando o acesso difícil de alguns miomas, a ruptura da cápsula e a heterogeneidade desses tumores, são necessárias pesquisas mais amplas para esclarecer o valor clínico desse método23-25.

Assuntos relacionados Há grande preocupação com fragmentos de tecidos pós-cirurgia com morcelamento, particularmente em relação ao câncer ginecológico devido ao impacto na sobrevida e prognóstico da doença. Por esse motivo, o morcelamento contido em bolsas parece ser mais seguro para evitar a dispersão de células malignas e benignas (mioma parasita) na cavidade, sistemas já aprovados pela FDA e recomendados pela AAGL10 (Figura 1). Embora se acredite que as bolsas de contenção tenham uma proteção para disseminação de células e tecidos, as vantagens ainda não foram apresen-

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03

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Portal 3 - Aro metálico (morcelador)

01 120 90 60

30

2º Access

30

Portal 2 - 2º acesso (entrada auxiliar)

Portal 1 - 1º acesso (sistema óptico)

s ces Ac 1º

60 120

90

Identificação dos itens 01 Bolsa coletora 02 Proteção interna do safe bag M 03 Introdutor do safe bag

Figura 1. Modelo comercializado de bolsas de contenção para uso de morceladores.

tadas, merecendo um estudo a longo prazo e avaliação prospectiva rigorosa.

Como orientação para a prática médica, a AAGL sugere um TCLE que inclua os seguintes pontos:

A vantagem da via laparoscópica em relação ao morcelamento via vaginal (histerectomia vaginal) se deve, além da bolsa de contenção, à possibilidade de lavagem exaustiva e ao exame minucioso da cavidade, impossível pela via vaginal.

– Possibilidade de disseminação de tecido na cavidade peritoneal, o que pode aumentar a gravidade do tratamento e piorar o prognóstico.

O intervalo para reoperação de LMS, encontrado inadvertidamente em peça cirúrgica, parece impactar no prognóstico dessas pacientes. Um estudo relatou que esse intervalo ocorre, em média, em 20 meses26. Já o estudo de 2016 demonstrou que quando o segundo procedimento é realizado dentro de 21 dias, não há impacto na sobrevida do paciente27.

Ética e termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) Todos esses aspectos de uma cirurgia com morcelador devem ser explanados para a paciente tanto na conversação como na escrita, por meio de um termo de consentimento bem estruturado, para, então, decidir com ela o uso ou não do morcelador, respeitando sua autonomia.

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– Possibilidade de aumento da dificuldade em realizar uma avaliação patológica completa. – Possíveis lesões exclusivas do equipamento e procedimento.

Conclusão O morcelamento eletromecânico e/ou manual está cada vez mais presente nas práticas cirúrgicas dos ginecologistas brasileiros, apesar de não haver grandes relatos de diagnóstico inadvertido de LMS nem de outros tumores malignos. Porém, as evidências científicas mostram que há riscos e benefícios no morcelamento, bem como existe um fluxo de conhecimentos sobre o tema. Porém, não há motivos nem evidências de que a eliminação universal de qualquer tipo de morcelamento atende ao propósito de proteger as pacientes. À medida que novas evidências surjam para otimizar os benefícios e reduzir os riscos, estas devem ser incorpo-


radas à assistência. As bolsas coletoras e o termo de consentimento livre e esclarecido, assim como a boa relação entre médico e paciente, ainda são as diretrizes mais factíveis no momento.

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Uma forma viável e efetiva de treinar residentes em laparoscopia ginecológica - ProTEGi-SC Anna Luiza Lobão1, Helizabet Salomão Abdalla Ayroza Ribeiro2, Fernanda Asencio1, Fabio Ohara1, Paulo Augusto Ayroza Galvão Ribeiro3 Setor de Endoscopia Ginecológica e Endometriose do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Santa Casa de São Paulo 2 Professora-assistente doutora do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Santa Casa de São Paulo. Chefe do Setor de Endoscopia Ginecológica e Endometriose do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Santa Casa de São Paulo 3 Professor adjunto doutor do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Santa Casa de São Paulo. Diretor do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Santa Casa de São Paulo 1

Desde 1988, quando a primeira histerectomia assistida por laparoscopia foi realizada por Harry Reich, essa técnica tem sido desenvolvida e aprimorada, objetivando um melhor tratamento de diversas doenças, com pós-operatório menos doloroso, menos perda sanguínea, menos tempo de internação, retorno mais rápido às atividades e menores índices de complicações1,2. Porém, o treinamento e a capacitação dos médicos não seguiram a mesma curva de desenvolvimento3. Fato incontestável é a falta de disseminação da histerectomia por via laparoscópica em todos os países e em nosso meio também4. Em 2017, apenas 1,12% de histerectomias no Sistema Único de Saúde foram realizadas pela técnica laparoscópica5. Dentre as diversas causas para esse fato, pode-se atribuir a dificuldade de treinamento e a aquisição da curva de aprendizado6. A evolução da cirurgia minimamente invasiva nos últimos 25 anos tem levado cirurgiões a repensar a melhor forma de treinar as habilidades específicas desse método7,8. Portanto, o maior desafio sobre o treinamento adequado da cirurgia videolaparoscópica é a longa curva de aprendizado9,10, que confronta com limitado número de intervenções cirúrgicas em hospitais-escolas11. O treinamento do cirurgião laparoscópico deve englobar a aquisição de habilidades como visão em tela bidimensional, navegação com câmera, coordenação entre mãos e olhos, destreza com manipulação de instrumentos longos em uma posição fixa, conhecimento da sala cirúrgica laparoscópica e habilidades psicomotoras laparoscópicas11. Tais habilidades devem ser adquiridas fora da sala cirúrgica em modelos de treinamento específicos e validados, objetivando redução de erros durante o ato cirúrgico laparoscópico11,12. O treinamento em cirurgia ginecológica laparoscópica é um desafio real. A pressão atual em torno da prática cirúrgica impõe um programa de treinamento controlado e validado. Esse controle e validação iniciam-se pela padronização do treinamento cirúrgico11. Em nosso hospital, utilizamos o ProTEGi-SC (Protocolo de Treinamento em Endoscopia Ginecológica da Santa Casa de São Paulo), um protocolo de treinamento padronizado para todos os aperfeiçoandos de primeiro ano em Endoscopia Ginecológica. O ProTEGi-SC consiste numa sequência de sete etapas de treinamento seguindo a ordem de exercícios expostos na tabela 1. Em nosso hospital, os residentes seguem a seguinte rotina de treinamento: 4 horas/ semana de exercícios em laboratório experimental (Figura 1), por 21 semanas, sendo as 7 primeiras semanas com a mão dominante pelo trocarte lateral, 8a a 14a semanas com a mão

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Tabela 1. Cronograma de treinamento laparoscópico sistematizado de habilidades e sutura Etapas

Treinamento

Primeira

Técnica do gladiador sem nó (figura 2)

Segunda

Técnica do gladiador com nó

Terceira

A agulha e suas orientações

Quarta

Cruz de verificação, pontos profundos e superficiais (escada)

Quinta

Ponto simples com nó (número e resistência)

Sexta

Cúpula vaginal: sutura contínua D→E e E→D e pontos em X (figura 3)

Sétima

Sutura para miomectomia e pontos invaginantes (figura 4)

Treinamento baseado no Romeo’s Gladiator Rule13.

Figura 1. Sala de treinamento laparoscópico.

Figura 2. Exercício da técnica do gladiador.

Figura 3. Exercício de sutura da cúpula.

Figura 4. Exercício de sutura para miomectomia.

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dominante pelo trocarte central e 15a a 21a semanas com a mão não dominante pelo trocarte lateral. O treinamento médico em cirurgia é desafiador e parece lógico que cirurgiões devam ter conhecimentos e habilidades antes de realizar a cirurgia propriamente dita. Por essa razão, surgiram os treinamentos dirigidos de dissecção e sutura simulando tarefas e capacitando o médico para tal, em um ambiente seguro, controlado e padronizado14. Em um estudo, Lobão et al. avaliaram o impacto do treinamento laparoscópico prévio nas complicações da histerectomia laparoscópica quando realizada em hospital de ensino e obtiveram taxa de 5,7% de complicações gerais, taxa inferior à encontrada na literatura entre 12% e 17%15,16. Também observaram que não houve diferença significativa das complicações intra e pós-operatórias quando cirurgias foram realizadas por aperfeiçoandos treinados em comparação a médicos experientes15. Em 2017, Clark et al. compararam resultados da histerectomia laparoscópica realizada por cirurgião aperfeiçoando com treinamento laparoscópico com as realizadas por cirurgiões sem tal treinamento, tendo obtido menos tempo cirúrgico, menos tempo de internação e maior volume uterino do aperfeiçoando versus outros cirurgiões. Apresentaram taxa de complicação de 17%, sem diferença entre os grupos17.

vo nos resultados da histerectomia total laparoscópica e de outros procedimentos laparoscópicos realizados em ambiente universitário. Salientamos ainda que o método utilizado em nosso serviço possa servir de base para outros hospitais de ensino, promovendo ensinamento laparoscópico seguro, eficaz, padronizado e supervisionado.

Referências bibliográficas 1. 2. 3. 4.

5. 6. 7.

8.

Esses dados confirmam que o treinamento em modelos inanimados oferece uma oportunidade aos residentes de praticar técnicas não familiares em ambiente artificial, permitindo maximizar a aquisição e retenção de conhecimentos em laparoscopia, o que potencialmente leva à diminuição de erros na sala cirúrgica e otimiza o tempo cirúrgico18.

9.

Uma revisão brasileira sobre treinamento em cirurgia laparoscópica para residentes concluiu que o estabelecimento de um processo pedagógico apropriado ao ensinamento da cirurgia laparoscópica em programas de residência médica é mandatório para promover educação cirúrgica sólida e determinar uma atividade profissional estruturada e segura16.

12.

Diversos estudos apontam que todas as modalidades de treinamento laparoscópico têm efeito benéfico na curva de aprendizado para aquisição de habilidades laparoscópicas, melhorando o desempenho cirúrgico sem aumento de complicações. O treinamento laparoscópico vem ganhando cada vez mais importância na educação e acreditação propostas. Desta maneira, baseados nos dados apresentados e na experiência de mais de uma década de treinamento padronizado em nossa instituição, concluímos que o treinamento laparoscópico sistematizado de habilidades e sutura associado à padronização das técnicas cirúrgicas apresentou impacto positi-

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Highlights

4o Congresso da Seud em Florença Um fórum único para atualização em doenças benignas do útero Fernando Reis Professor livre-docente associado do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais e professor visitante da Universidade de Siena

A Society for Endometriosis and Uterine Disorders (Seud) é o principal fórum global para discussão aprofundada e integrada das doenças benignas do útero. Seu quarto congresso reuniu em Florença, na Itália, o número recorde de 1.500 participantes provenientes de mais de 70 países. As sessões plenárias abordaram a endometriose sob todos os aspectos, com novas hipóteses e evidências para explicar a predisposição genética, o desequilíbrio imunológico, a regulação hormonal e as novas possibilidades terapêuticas resultantes desse conhecimento. Outra sessão plenária discutiu com profundidade o diagnóstico da adenomiose, considerando até sua coexistência com a miomatose uterina e os desafios encontrados no diagnóstico por imagem. Teve especial destaque a sessão dedicada aos fenótipos e manifestações clínicas da miomatose uterina, um tema clássico que tem sido amplamente revisto nos últimos anos, com a descoberta de novos mecanismos patológicos associados ao surgimento e crescimento dos miomas. Em uma conferência magistral, a professora Hilary Critchley, da Universidade de Edimburgo, na Escócia, dissertou sobre o estado da arte no manejo dos sintomas da miomatose uterina e identificou diversas lacunas de evidência científica sobre a eficácia dos tratamentos mais comumente utilizados. O congresso também teve uma extensa programação cirúrgica, com demonstrações ao vivo, apresentações de vídeos, cursos e simpósios. Houve especial destaque para a abordagem de pacientes complexas e a individualização da estratégia terapêutica. Membros da SBE participaram de toda a programação do evento e apresentaram trabalhos inéditos realizados no Brasil e em redes de colaboração internacional. O próximo congresso da Seud será em Montreal, no Canadá, de 16 a 18 de maio de 2019, com o tema central Uterine bleeding and fibroids: from bench to bedside.

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