SANTART MAGAZINE # 10

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SANTA FINE ART

#10

Jeremy Mayer Andrzej Bochenski Claudia Jaguaribe Claudia Melli Fernando de La Rocque Franklin Cassaro Hal Joana Vasconcelos José Elffer Juan Manuel Echavarría Laurent Chéhère Luiz Aquila Nadín Ospina Olivier Valsecchi Rodrigo Visca Vivian Maier


www.bbmapfre.com.br

Pão de Açúcar - RJ


Mais de 800 mil visitantes em São Paulo e no Rio de Janeiro. Melhor exposição internacional pela APCA - Associação Paulista de Críticos de Arte. Melhor evento e melhor exposição do ano em votação popular pelo Guia da Folha. E tudo isso graças a você. BRANDING EXPERIENCE

O GrupO SeGuradOr BB e MapFre tem muito orgulho de patrocinar a exposição Impressionismo: Paris e a Modernidade. Patrocinador:

Realizadores:

MANON, VARINHA MÁGICA, 2012, coleção particular





endless summer an art screening by Oskar Metsavaht






ALICE QUARESMA ALICE SHINTANI ALVARO SEIXAS AMALIA GIACOMINI ANA VITÓRIA MUSSI BEATRIZ CARNEIRO ELISA BRACHER ENRICA BERNADELLI FABRICIO LOPEZ GISELE CAMARGO JAQUELINE VOJTA LAURA ERBER LUIZ MONKEN LUIZA BALDAN MARCIA THOMPSON MARTINHO PATRÍCIO PATRICIA CARMO TATIANA GRINBERG VANIA MIGNONE

VANIA MIGNONE EXPOSIÇÃO MAIO | JUNHO 2013


Sem título, 2007, pintura acrílica sobre MDF, 80 cm x 94,5 cm.


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fabrik.art.br

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90 DPZ


Santa Fine Art. Assine.

w w w . s a n t a f i n e a r t .c o m .b r

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MANON, AMAREVOLANTES, 2013, coleção SANTA FINE ART



Bust IV, 2010, peças de máquina de escrever, 25 cm x 40 cm x 36 cm

EXPEDIENTE # 10 2013 PUBLISHER

Sergio Mauricio sergiomauricio@santaartmagazine.com.br

DIREÇÃO EXECUTIVA

Sergio Mauricio Marcos José Magalhães Pinto DIREÇÃO DE ARTE, DESIGN E PROJETO GRÁFICO

Sergio Mauricio Bady Cartier EDITORIA ADJUNTA

Clara Reis clarareis@santaartmagazine.com.br

REVISÃO

Damian Kraus COMERCIAL

Clara Reis santa@santaartmagazine.com.br

BRANDING

Cerebelo COLABORADORES

Andrzej Bochenski Arturo Gamero Claudia Jaguaribe Claudia Melli Clara Reis Fernando de La Rocque Fernando Gerheim Franklin Cassaro Jeremy Mayer Joana Vasconcelos Jorge Luiz Nóbrega José Elffer Juan Manuel Echavarría Laurent Chéhère Luiza Interlenghi Luiz Aquila Hal Nadín Ospina Olivier Valsecchi Patrícia Kalil Roberto Massoni Rodrigo Visca Sergio Burgi Sergio Mauricio Vivian Maier

Fabio Szwarcwald Fred Coelho Guilherme G. Magalhães Pinto Jully Fernandes Marcos Prado Mauricio Pontual Moacir dos Anjos Nelson Ricardo Martins Pedro Karp Vasquez Waldik Jatobá Walter Carvalho Vanda Klabin Yael Steiner AGRADECIMENTOS

Absolut Alessandra Guillaume Alex Bueno de Moraes Antonio Jorge – Midia 1 Agostinho Resende Bernardo Walckiers Eduardo Ourivio Eduardo Salles Fabio Battistella Fabrizzia Gouvea Filipe Raposo Gagosian Galeria Mercedes Viegas 1500 Gallery Giuseppe Grill Gomus Music Branding H.A.P Galeria Hotel Fasano Huma art projects Hugo Monteiro Irmãs Clarissas Jorge Luiz Nóbrega Marcelo Torres Marcos Prado Mauricio Simões Milk Gallery Oskar Metsavaht Paula Bezerra de Mello Sergio K Carvalho Vera Greenhalgh Visualfarm Walter Clemente Werner Capeto White Cube Zipper Galeria AGRADECIMENTO ESPECIAL

CONSELHO CONSULTIVO

Alex Bueno de Moraes Ana Luisa Leite Claudia Noronha Duda Carvalho

Leograf Suzano DPZ Grito EAV – Escola de Artes Visuais do Parque Lage

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OLIVIER VALSECCHI

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JOANA VASCONCELOS

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ANDRZEJ BOCHENSKI

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VIVIAN MAIER

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LUIZ AQUILA

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JEREMY MAYER

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HAL

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JUAN MANUEL ECHAVARRÍA

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NADÍN OSPINA

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CLAUDIA JAGUARIBE

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LAURENT CHÉHÈRE

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FRANKLIN CASSARO

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CLAUDIA MELLI

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JOSÉ ELFFER

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RODRIGO VISCA

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FERNANDO DE LA ROCQUE


SANTA FINE ART

#10

O olho quer ver, a mente quer sinapses e o espírito iluminar-se Uma investigação constante, movida por curiosidade, amor e por uma persistência desmedida em torno daquilo que chamam de arte contemporânea e de suas relações com o olho e a mente, nos impulsionou até este instante. O olho quer ver, a mente quer sinapses e o espírito iluminar-se. E a SANTA tem uma paixão inevitável pela vida.

gráfica e pelo desejo de ser fine art, mas pelo fato de a SANTA ser, desde seu início, a primeira revista dedicada às artes visuais que mesclou toda sorte de linguagens, inclusive incorporando a fotografia. A única que, além de eminentemente visual, estimula a cada edição a reflexão, a crítica e principalmente a liberdade.

Pelo caminho encontramos o consagrado e o desconhecido, entre canônicos, iconoclastas e efêmeros, de tempos passados, do presente e do futuro – num tempo fora do tempo, realizamos sempre uma busca em meio ao turbilhão de cascalhos, com um desejo inexorável de encontrar o brilho daquilo que nasce eterno.

Chegar até aqui, na SANTA Fine Art #10, representa um acontecimento extraordinário dentro do contexto de impossibilidades em que vivemos, principalmente pelo fato não termos aberto mão, a cada número, de alcançar um novo estado de arte em impressão gráfica. Fazer isto no Brasil sempre foi considerado uma atitude quixotesca.

Sempre com a intenção de tratar tudo o que fique impresso nas páginas da SANTA Fine Art de um modo singular, que proporcione ao leitor uma experiência inédita perante uma obra no papel. Estimular o olho com signos portadores de sentido e principalmente inspirar o espírito de nossos leitores, iluminar caminhos, cultivar ideias.

A SANTA Fine Art é reconhecida hoje como a única publicação Fine Art do Brasil. E deseja ser uma das melhores do mundo. A vida não é fácil para ninguém.

A SANTA número 1 inaugurou uma proposta editorial inédita no Brasil. Não só pela excelência

Mas com propósitos consistentes no coração e a faca entre os dentes, estamos firmes no propósito de seguir para muito além desta SANTA Fine Art #10, que por hora temos o prazer de trazer ao mundo.

Sergio Mauricio PUBLISHER

cerebelo Esta Santa é dedicada a Vicente Green Santa Fine Art é editada pela Cerebelo Artes.

A Santa aceita propostas de colaborações, que são avaliadas pelo seu conselho. Todas as opiniões expressas nos ensaios, matérias, entrevistas, depoimentos e artigos publicados são de inteira responsabilidade dos respectivos autores. É proibida a reprodução de imagens ou textos por qualquer meio. Cerebelo Artes Ltda. CNPJ: 09.448.968/0001-50. Rua Jardim Botânico, 719 / sala 23. Jardim Botânico. CEP 22470-050. Rio de Janeiro – RJ


OLI V I ER

VALS E C C H I

ALIEN, 2012, fotografia, 120 cm x 120 cm, série Klecksography

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KLECKSOGRAPHY Olivier Valsecchi A canção The dreaming da Kate Bush não saía da minha cabeça. É uma canção estranha, com vozes fantasmagóricas do além. É como se as vozes anunciassem que os aborígenes australianos estivessem sendo invadidos pelos ocidentais. É apenas mais uma história sobre conflito, mas que me inspirou a criar algo sobre a luta contra outras entidades. Já que as duas pessoas que eu mais conheço são eu e eu mesmo, deixei que o monstro dentro de mim falasse e tomasse conta do processo criativo deste novo trabalho. O resultado é quase como uma série minha e dele. Nós concordamos que deveríamos apresentar tanto eu como ele nas fotos, como num duelo gráfico. O desafio era fazer isso acontecer sob os nossos olhos. Quanto menos eu retocasse as imagens, melhor; eu realmente não gosto desta parte do processo. Prefiro passar horas com pessoas tentando obter o resultado desejado, dividindo esforços, do que com um computador. É por isso que a série Klecksography é de co-autoria com o meu ‘monstro interior’. Ele me empurrou, jamais teria feito isso sozinho. Eu queria traduzir em imagens como o inimigo interior pode influenciar e impactar o nosso corpo, e como você sempre tem que manter um olho nele, e domá-lo para que ele não lhe faça mal. Vamos ser claros sobre o que é o inimigo interior: é uma parte de você que te conhece melhor do que você e usa essa força para jogar com seus pontos fracos. Há uma grande quantidade de “braços aleijados” nesta série. Vários braços num mesmo corpo, ou, pelo contrário, corpos sem nenhum braço. Os braços são um símbolo da capacidade de fazer as coisas acontecerem. Nós fazemos as coisas com os nossos braços e as nossas mãos. Mas vivemos num mundo onde precisamos fazer mais, sempre mais. E quanto mais nós queremos fazer, menos fazemos direito. E mais ficamos loucos. O tempo passa e nunca fazemos o suficiente. É quase como se precisássemos nos dividir e nos tornar duas pessoas para fazermos tudo o que gostaríamos ou o que as outras pessoas gostariam que fizéssemos. Isto é o que eu chamo de “sociedade onde nunca nada é suficiente”. É por isso que a minha voz interna sempre me diz: “não é suficiente”, porque ela sabe que mesmo eu fazendo o meu melhor, eu gostaria de fazer ainda mais. Estresse, medo, falta de autoconfiança e outros monstros psicológicos modificam seus gestos, tiques, expressões e rugas. A depressão pode te engordar, a ansiedade pode emagrecer. Cada foto desta série reproduz exageradamente um sentimento devorador de incapacidade, ou egocentrismo. Eu experimentei isso na minha vida, algumas pessoas que conheci mudaram consideravelmente ao longo dos anos, tornaram-se pouco atraentes, perderam o encanto, envelheceram mais rápido do que deveriam; ou ao contrário, outras melhoraram e ficaram muito mais sexy. O monstro interior assume o controle sobre você ou se torna um aliado. A série Klecksography apresenta ambos os lados do espírito encarnado nos corpos.

Olivier Valsecchi nasceu em 1970 em Paris. Já teve seu trabalho publicado em diversas revistas como Eyemazing, Azartphoto, Blink, Zoom e Photo. Sua primeira individual foi em 2012 no Centre Atlantique de la Photographie in Brest (França). Foi vencedor do Hasselblad Masters Award 2012 - Fine Art category.

Lotus, 2012, fotografia, 120 cm x 120 cm, série Klecksography

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VENUS II, 2012, fotografia, 120 cm x 120cm, série Klecksography

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Eagle, 2012, fotografia, 120 cm x 120cm, série Klecksography

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J OANA

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VAS C O NC E LO S


UNTITLED, 2012, mixed media on canvas, acrylic glass, 149 x 126 x CARMEN 23 cm. Courtesy MIRANDA, Gagosian 2008

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BLUEBERRY, 2008

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VIZIR, 2009

Joana Vasconcelos nasceu em Paris, em 1971. Vive e trabalha em Lisboa. A natureza do processo criativo de Joana Vasconcelos assenta na apropriação, descontextualização e subversão de objetos preexistentes e realidades do quotidiano. Partindo de engenhosas operações de deslocação, reminiscência do ready-made e das gramáticas nouveau réaliste e pop, a artista oferece-nos uma visão cúmplice, mas simultaneamente crítica, da sociedade contemporânea e dos vários aspetos que servem os enunciados de identidade coletiva, em especial aqueles que dizem respeito ao estatuto da mulher, diferenciação classista ou identidade nacional. Resulta desta estratégia um discurso atento às idiossincrasias contemporâneas, onde as dicotomias artesanal/industrial, privado/público, tradição/modernidade e cultura popular/cultura erudita surgem investidas de afinidades aptas a renovar os habituais fluxos de significação característicos da contemporaneidade.

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DARK WATER BEAUTY, 2012, 32,5 cm x 46,2 cm. Coleção particular

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ANDR Z EJ

B O C H ENSKI

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DARK WATER HAND, 2012, 32,5 cm x 46,2 cm. Coleção particular

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DARK WATER COLOURS, 2012, 32,5 cm x 46,2 cm. Coleção particular

Andrzej Bochenski, nasceu na Polônia na cidade de Lodz, em 1958. Atuou anos no mercado de moda sendo publicado e reconhecido nas principais revistas de moda desse país. Em 2011 passa a se dedicar exclusivamente à fotografia autoral. Ganhou 15 concursos de fotografia em 2012. Seu trabalho tem sido exposto em Londres, Nova York e Los Angeles.

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VI VI AN

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M AI E R


Girl Floating, Wilmette, IL, June 21, 1968. Courtesy of the Jeffrey Goldstein Collection

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SELF-PORTRAIT, New York, c. 1951-55 Courtesy of the Jeffrey Goldstein Collection

CÁPSULA DO TEMPO Jorge Luiz Nóbrega Vivian Maier foi uma fotógrafa franco-americana nascida em Nova York em 1926 e falecida em Chicago em 2009. Viveu dos quatro aos vinte e cinco anos em Saint-Julien-en-Champsaur, pequena cidade dos Alpes franceses. Começou a fotografar ainda na França e, ao longo de quase quarenta anos, produziu mais de cem mil fotografias (a maioria ainda não reveladas), grande parte em Nova York e Chicago. Trabalhou como babá durante quase toda a vida; viveu no anonimato e nunca divulgou nem expôs suas fotos. Não deixou parentes, filhos ou herdeiros. Suas fotos e negativos foram descobertos por acaso, em caixas de papelão que continham outros objetos de sua propriedade. As caixas foram leiloadas em 2007, por falta de pagamento, ao depósito onde ela as mantinha. Há uma curiosidade natural em saber mais sobre esta mulher reclusa, sem amigos, e cuja história aos poucos vai sendo revelada, ainda com muitas lacunas e explicações conflitantes. Há também uma grande surpresa em saber que uma obra de tal qualidade possa ter sido realizada no anonimato, aparentemente sem troca de experiências com outros fotógrafos que lhe foram contemporâneos. Pois Vivian Maier produziu uma obra fotográfica de grande qualidade, comparável aos trabalhos de respeitados street photographers do século XX.

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BOY VENDOR, Maxwell Street, Chicago, 1967. Courtesy of the Jeffrey Goldstein Collection

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GIRLS WADING IN LAKE MICHIGAN, Wilmette, IL, July 1968. Courtesy of the Jeffrey Goldstein Collection

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A fotografia de Vivian Maier sintetiza diversas tendências de street photography que vigoraram entre os anos 1930 e 1970. Dona de uma técnica apurada, ela retratava pessoas, cenas urbanas, composições arquitetônicas geométricas e grafismos que nos fazem lembrar fotógrafos desse período. É difícil falar em influências, mesmo sabendo que ela dispunha de alguns livros de fotografia. É mais adequado dizer, com as informações que temos, que Vivian foi uma fotógrafa do seu tempo, criada na atmosfera da guerra e do pós-guerra, imbuída de um sentido humanista como vários outros artistas da época. Sua fotografia é generosa e empática com as pessoas, mas mantém um distanciamento prudente e certa dose de ironia. É a fina combinação destes elementos – sem pretender a crítica social nem o romantismo piegas – que dá seu caráter autoral. Seu trabalho mostra muita espontaneidade, o que é surpreendente para quem usava quase sempre um equipamento que não privilegiava a rapidez em capturar o instante nem a intenção de se passar despercebida. Neste sentido, seu estilo se aproxima da austríaca Lisette Model, nos seus aspectos mais críticos, e da americana Helen Levitt, nos aspectos mais românticos. Em diversos momentos, a relação entre distanciamento e empatia faz lembrar Cartier-Bresson, nesta característica em que ele foi insuperável. Vivian possuía também um apurado olhar geométrico, e fotografou excelentes composições urbanas, com e sem a presença de pessoas. Neste particular, dialoga bastante com André Kertész, o fotográfo franco-húngaro admirado por Cartier-Bresson. Sendo de certo modo estrangeira na América (falava com sotaque francês), introvertida e sem vínculos pessoais, é possível que a postura de “aproximação respeitosa” lhe fosse muito natural: a fotografia foi certamente sua forma preferida de interagir com o mundo e com as pessoas, protegida pela intermediação de uma lente. Durante seu período mais produtivo, Vivian Maier fotografou com uma Roleyflex de lentes duplas que produzia fotos quadradas. Ela se ateve a essa limitação técnica mesmo quando a maior parte dos fotógrafos já adotava os planos retangulares das câmeras de 35 mm. A street photography evoluía, através do plano retangular, para o aumento da visão periférica incorporando diversos elementos ao texto fotográfico, tirando assim a centralidade de um objeto específico, num aumento de complexidade e de distanciamento em relação à cena e consequente perda de empatia. Até onde se sabe, Vivian não seguiu essa mudança, e se manteve fiel à sua combinação de proximidade física e equilibrada relação empática com pessoas e objetos retratados. Onde existiu a limitação, residiu também a potência de sua obra. A história de Vivian Maier está sendo escrita neste momento: novas fotos são reveladas; diversas pesquisas estão em curso; um documentário com 150 pequenos vídeos por ela produzidos deve ser finalizado este ano. Todo este material é revelado e editado por terceiros, portanto nunca saberemos o que ela aprovaria ou rejeitaria, e de que forma ela conduziria tais revelações. Como apenas sua obra pode falar por ela, talvez nunca saibamos quem foi realmente Vivian Maier. Mas o que dela foi apresentado até agora, como uma cápsula do tempo recém aberta, representa o resgate da memória afetiva de uma certa ideia da América, um pouco ingênua, porém mais humana e generosa.

Vivian Maier, nasceu em Nova York em 1926 e faleceu em Chicago em 2009. Trabalhou como babá e foi fotógrafa. Jorge Luiz Nóbrega mora no Rio de Janeiro e coleciona fotografias.

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VIVIAN’S SHADOW WITH FLAGS, Chicago Area, July 1970. Courtesy of the Jeffrey Goldstein Collection

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WASTE BASKET, CHAIR, MANNEQUIN, Chicago, 1968. Courtesy of the Jeffrey Goldstein Collection

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A PINTURA VIOLETA E ENCARNADA, 2011, acrílica sobre tela. Atelie Flamengo

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LU I Z

AQ U I L A

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A PINTURA E A POSIÇÃO CORRETA, 2012, acrílica sobre tela. Atelie Flamengo

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AO MESTRE COM CARINHO Sergio Mauricio Nunca fui aluno do Luiz Aquila. Na verdade nunca o havia conhecido pessoalmente até marcar um encontro com ele no Paço Imperial, palco onde foi assinada a lei Áurea pela princesa Isabel, no Rio de Janeiro. Neste espaço icônico estava exposta uma retrospectiva inédita e antológica, denominada Quase Tudo, a respeito de sua obra. Um conjunto representativo da coragem de um artista que se recusou a escravizar sua verve aos ditames nefastos que declaravam a morte da pintura. Aquila promoveu uma libertação da expressão gestual, da cor, do espírito e a pintura enfim libertou-se dos grilhões conceituais reducionistas. Sempre entendi o Aquila como o herói do Retorno à Pintura. Foi com isto em mente e arrepiado que apertei a mão deste artista. Um artista excepcionalmente simples e consciente de sua obra. A grandeza do mestre e a sua importância estavam ali materializadas, não só por uma figura humana destituída de artíficios, mas pelo conjunto generoso de obras realizadas nos últimos 50 anos. O universo Aquiliniano exposto em suas diversas dimensões e formas atemporais, sem medos ou complexos retinianos. De rabiscos em papéis à sistemas cromáticos explosivos em telas cujas as partículas poderiam ser estrelas, sistemas vivos, galáxias, não as galáxias do universo, aquelas vistas pelo Huble, mas sistemas estelares internos que parecem aflorar de um inconsciente geológico, uma espécie de linguagem secreta, eloquente, anterior a palavra, destituída das figuras que habitam o reino humano racional das identificações. Uma celebração pura ao rito pictórico. Aquila representa uma das forças mais positivas dos anos 1980 para cá, não só como artista, mas também como um professor que soube acender em seus alunos a centelha da liberdade.

Luiz Aquila da Rocha Miranda nasceu no Rio de Janeiro em 1943. Desde 1965 participou de mais de uma centena de exposições no Brasil e no exterior com destaque para a 17ª Bienal de Veneza, a 18ª, a 19ª e 20ª Bienal Internacional de São Paulo. Foi professor da Universidade de Brasília no período entre 1968 e 1972 e, também, da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro, RJ, entre 1979 e 1986, sendo diretor da EAV de 1988 a 1990. A obra de Luiz Aquila está presente, entre outras, nas coleções do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Museu Nacional de Belas Artes, Museu de Arte Contemporânea de Niterói (coleção João Sattamini), Museu de Arte Contemporânea de Curitiba, Ministério das Relações Exteriores, VARIG, IBM, BNDES, Chase Manhattan Bank e Banco Itaú e Itaú Cultural.

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PIN.G, 2012, acrílica sobre tela. Atelie Flamengo

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J ER E M Y

M AY ER

BUST V (Grandfather), 2011, peças de máquina de escrever, 56 cm x 28 cm x 43 cm

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Deer III, 2010, peças de máquina de escrever, 90 cm x 40 cm x 90 cm

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PENGUIN III, 2012, peças de máquina de escrever, 15 cm x 15 cm x 36 cm

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“Faço figuras humanas completas, animais e insetos a partir de peças de máquina de escrever. Eu remonto as peças usando somente os componentes e os processos mecânicos nativos da máquina de escrever. Eu penso que a máquina de escrever é algo quase arcaico, como uma parte de nossos arredores naturais. Todas as máquinas de escrever não utilizadas e descartadas são acréscimos de nossa atividade, do nosso crescimento semelhante a um cupinzeiro, a um ninho de pássaro ou uma colmeia de abelhas. Ao transformar essas máquinas de dentro para fora e retirando todos os componentes de sua estrutura original, espero mostrar como os desenhistas de máquinas de escrever inspiraram-se no corpo humano e na natureza”.

Jeremy Mayer, nascido e criado no norte de Minnesota (EUA), mudou-se para o norte da Califórnia, em 1990. Atualmente vive e trabalha em Oakland, Califórnia.

MAYUKO’S DAMSELFLY, 2010, peças de máquina de escrever, 13 cm x25 cm x 33 cm

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Skull I, 2012, peças de máquina de escrever, 23 cm x 30 cm x 38 cm

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H AL

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FLESH LOVE, Ichika & Arisa

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NUNCA AMEI ASSIM Clara Reis

Amor, é o que tenho a oferecer. Imune a embalagens ou rótulos. Não existe coisa completa. Ninguém é absolutamente inerente ao outro. Fundamental mesmo é amar sem esquecer que o limite é o do amor próprio. Afinal, antes de tudo, o importante é ser feliz na própria companhia. Entendo que a paixão pode subverter ou simplesmente amadurecer e se transformar em... amor – verve mais potente para a construção dos verdadeiros laços. Respiro fundo. Sou guiada pelo magnetismo e pela catarse dos desejos. Sinto as borboletas baterem asas no estômago, o coração preencher e a alma transbordar os poros. Me jogo no intenso e complexo abismo das emoções. Mas, vez ou outra, gosto de ficar só para evitar submergir. Sinto a ausência para necessitar a presença porque me sinto junto mesmo distante. Sempre que necessário não hesito em correr às janelas para mais uma vez respirar. Porque o amor é oxigênio.

FLESH LOVE, Chihiro & Takeshi

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FLESH LOVE, Yoshi & Naomi


HAL, fotógrafo nasceu, estudou e vive em Tóquio. Clara Reis, jornalista, carioca, investiga arte contemporânea.

FLESH LOVE, Kamio & Naoco

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JUA N

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M ANU EL

E C H AVA R R Í A


ORQUIS MORDAX, from the series “Corte de florero”, 1997, impressão em gelatina de prata, 50,5 cm x 40,6 cm. Coleção Casa Daros

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ORQUIS LUGUBRIS, from the series “Corte de florero”, 1997, impressão em gelatina de prata, 50,5 cm x 40,6 cm. Coleção Casa Daros

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ORQUIS NEGRILENSIS, from the series “Corte de florero”, 1997, impressão em gelatina de prata, 50,5 cm x 40,6 cm. Coleção Casa Daros

Juan Manuel Echavarría nasceu em 1947, em Bogotá, onde vive e trabalha. Com frequência, Echavarría recorre à metáfora para validar os seus temas colombianos. Aplica seus recursos estilísticos de modo preciso e claro, obrigando o espectador a um segundo olhar para chegar à compreensão de suas obras. A relação social entre dois papagaios no vídeo Guerra e pa se converte em uma imagem simbólica da convivência humana. Um hino à sua terra natal se transforma, antes de percebermos, em um pequeno monte de cocaína (Bandeja de Bolívar). Plantas de aspecto exótico, que parecem extraídas de enciclopédias botânicas do século XIX, são, na verdade, ossos humanos.

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CACICA PREÑADA, 2001, cerâmica vermelha, 35 cm x 22 cm x 15 cm

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NAD Í N

O S PI NA

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SÉRIE FOGO FÁCIL BARRIGUDA, 2001,-cerâmica 2 (Díptico), policromada, 2011, acrílica 38sobre cm x 26 tela, cm130 x 21 x 200 cm cm. Cortesia Choque Cultural

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Nadín Ospina nasceu em 1960, em Bogotá, na Colômbia, onde vive e trabalha. Ospina parte das famosas esculturas pré-colombianas em pedra, cerâmica ou metal, para modificá-las, colocando nelas cabeças do fabuloso mundo animal de Walt Disney. Assim, Mickey Mouse, Minnie, Pateta e Pluto decoram cerâmicas ou esculturas “pré-colombianas”, e uma estátua de Santo Agostinho é coroada com a cabeça de Bart Simpson. Todas as peças são genuínas falsificações, elaboradas por especialistas locais a partir de modelos originais. Além do puro jogo com a surpresa do observador, esses objetos discutem a fusão das diferentes culturas. Ospina não se limita a traçar o domínio das culturas latino-americanas pela cultura norte-americana, mas, de uma forma mais geral, remete ao processo de hibridização de sua própria cultura e a de outras ao longo dos últimos séculos. O artista responde de forma amena e divertida, mas com um tom amargo, à pergunta sobre a identidade, tão comum na América Latina: o original como tal só permanece como um objeto de prestígio ou de estudo em coleções preciosas; nada no presente é tão autêntico; tudo é permeado por uma série de influências que contaminou de forma substancial a concepção de original. Apenas na mistura é ainda possível encontrar uma identidade verdadeira.

VASIJA ZOOMORFA, 2001, cerâmica policromada, 27,5 cm x 27 cm x 23 cm

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CL AU D I A

JAG UAR I BE

ENTRE MORROS: O construído e o documental nas recentes fotografias panorâmicas de Claudia Jaguaribe

Sergio Burgi

A série Entre Morros de Claudia Jaguaribe coloca seu trabalho na vertente da tradição clássica da fotografia panorâmica realizada sobre a cidade do Rio de Janeiro por fotógrafos como Marc Ferrez, Georges Leuzinger e Augusto Malta ao longo do século XIX e início do século XX. O formato panorâmico em fotografia é resultado do panorama cenográfico introduzido na Europa no final do século XVIII como nova forma de representação visual que permitiu ao grande público, através da observação de uma pintura de grande formato montada em um ambiente especificamente construído para esta finalidade (uma rotunda de 360 graus que abrigava pinturas de valor histórico, documental ou alegórico), experimentar uma sensação de imersão sensorial equivalente àquela que seria proporcionada posteriormente pelo cinema e suas salas de projeção. Os panoramas cenográficos, em função de sua imponência e grandeza, cumpriam assim uma missão simultânea de comunicação visual e espetáculo público, pois atraíam uma grande audiência para um mesmo local de imersão e fruição da obra. Isso levaria, em seguida, no início do século XX, ao desenvolvimento do cinema como espetáculo público em todo o globo, fruto direto também das evoluções tecnológicas no campo da fotografia, inclusive das câmeras panorâmicas de varredura. Paralelamente, nas artes gráficas e na fotografia de paisagem, o formato panorâmico foi largamente empregado por fotógrafos e artistas, consagrando-se ao longo do século XIX e século XX como um dos principais formatos de imagem utilizados na representação da paisagem urbana e natural.

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No Rio de Janeiro, Georges Leuzinger desenvolveu a utilização sistemática dos panoramas produzidos a partir de dois ou mais negativos fotográficos em seu trabalho de documentação da paisagem urbana. Já Marc Ferrez buscou realizar panoramas com grande ângulo de visão em um único negativo de vidro, sempre de médio ou grande formato, incluindo a utilização de câmera fotográfica de varredura para registro de imagens de 180º com correção automática de perspectiva, operando sempre no limite das possibilidades técnicas e formais da fotografia do período. Se considerarmos, como discutiremos em mais detalhe neste texto, que na fotografia contemporânea a produção simultânea de imagens de caráter documental e conceitual é uma decorrência das características intrínsecas do próprio meio fotográfico, veremos que os panoramas da série Entre Morros situam-se exatamente neste vértice de confluência do documental e experimental. Claudia Jaguaribe faz referência a uma forte tradição pictórica na fotografia de paisagem do Rio de Janeiro, ao mesmo tempo em que explora e expande os limites desta linguagem, seja por sua utilização do formato panorâmico em diversas situações inusitadas com enquadramento vertical e também por sua utilização quase que jornalística deste formato, incorporando o elemento humano em primeiros planos desconcertantes. Por outro lado, os panoramas horizontais, de planos elevados, realizados em voos pela orla que incorporam pontos de vista inalcançáveis no século XIX, somados ao tratamento de imagem que introduz a colagem e a montagem como recursos construtivos de sua obra, permitem que ela realize uma leitura singular do cenário urbano do Rio de Janeiro, contemporânea e inovadora, porém em constante diálogo com o registro histórico da cidade.

A paisagem é, portanto, nesta série sempre registrada em formato panorâmico e, em muitos casos, posteriormente sofrendo interferências digitais executadas pela fotógrafa, buscando-se neste processo de construção das imagens uma interpretação do cenário urbano carioca que permita uma reflexão sobre o momento presente da cidade, em particular nas áreas urbanas de fronteira onde se desenvolvem as intensas interações entre o espaço construído e o espaço natural, numa sociedade que historicamente relegou o planejamento urbano a um segundo plano, induzindo assim a ocupação das áreas de encostas e morros da cidade pela população mais carente, que em seu processo de subsistência constrói suas moradias mediante mecanismos de autoconstrução em conglomerados periféricos que receberam no Rio de Janeiro a denominação de favelas, termo transportado para o Rio pelas tropas da Guerra de Canudos que permaneceram acampados no Morro de Providência, na cidade, à espera de um plano habitacional governamental que nunca veio. Claudia Jaguaribe formou-se em história da arte pela Universidade de Boston, Estados Unidos, em 1979. De volta ao Brasil, torna-se responsável pelos cursos de Artes Plásticas e Fotografia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Além das atividades didáticas, realiza fotografias de moda e publicidade para diferentes jornais. A partir da primeira exposição individual, em 1982, passa a expor regularmente nas principais cidades brasileiras e no exterior. Projetos e exposições resultam em diferentes livros, como Cidades, 1993, Retratos Anônimos, 1996, Atletas do Brasil, 1999, O Corpo da Cidade, 2000, Aeroporto, 2002. A fotografia e o vídeo juntam-se à internet no projeto interativo Você Tem Medo de Quê?, de 2006. Seu


MENINOS NA GRADE. Cortesia HAP Galeria

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A PONTA. Cortesia HAP Galeria

trabalho fotográfico ao longo dos últimos anos tem sido exposto internacionalmente, e crescentemente analisado por diversos críticos de arte. Para a compreensão da obra de Jaguaribe, é preciso levar em consideração o conjunto da produção fotográfica contemporânea que se desenvolve a partir da intensa experimentação pós-moderna dos anos 1960 e 1970, quando artistas e fotógrafos conceituais estabelecem os termos e condições mediante os quais a fotografia artística define-se a si mesma e em sua relação com as outras artes, transformação esta que converteu a fotografia em uma forma artística moderna e estabelecida que evolui explicitamente a partir de então através da dinâmica permanente da autocrítica. A partir dos anos 1960, o questionamento radical por parte da nova geração de artistas fotógrafos quanto ao profundo enraizamento da produção fotográfica daquele período na tradição pictórica da arte e da fotografia moderna, e também na tradição do próprio fotojornalismo de vertente humanista, produz uma experimentação de caráter reducionista e desconstrutivista que explora não a desfiguração, como na pintura, mas sim desenvolve, por um lado, a autocrítica do fotojornalismo e de seus elementos, introduzindo inclusive a noção de performance na construção das imagens, e, por outro lado, busca a negação do autor e da noção sacralizada de autoria, substituída pelo amadorismo, compondo assim as principais vertentes experimentais que radicalizam a experimentação artística de vanguarda no campo da fotografia nos anos 1960 e 1970, como mostram os trabalhos de Richard Long, Bruce Naumann, Dan Graham e Robert Smithson.

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Se considerarmos que foi através da autocrítica que a pintura e a escultura se distanciaram da descrição figurativa, que historicamente havia se constituído na base de seus valores sociais e artísticos fundamentais, no caso específico da fotografia, diferentemente do que nas outras artes, a fotografia pós-moderna não pôde encontrar alternativas para a descrição figurativa, permanecendo, portanto, a documentação e representação do real um traço intrínseco do meio fotográfico. Assim, a fotografia permanece, após este intenso período de autocrítica, entendida como um sistema de descrição figurativa, ainda que não através do acúmulo de sinais individuais, mas sim através da operação instantânea de um mecanismo integrado. Caberá assim à fotografia contemporânea, portanto, ao longo de sua trajetória, gerar simultaneamente documentação de caráter histórico e trabalhos de criação visual. Como demonstra Clement Greenberg em Pintura Modernista (1960), por mais impressionados que estivessem os fotógrafos com o rigor analítico do discurso crítico da modernidade, que levou à revolução da arte abstrata e experimental, evoluindo posteriormente para o repúdio da descrição figurativa e de sua própria história como arte de delineação e representação, a própria evolução histórica da fotografia em um discurso moderno esteve condicionada pelo fato de que, diferentemente de outros campos das artes plásticas e visuais, não podia prescindir da descrição figurativa e, portanto, aparentemente não poderia também embarcar na própria aventura que havia viabilizado inicialmente, se considerarmos que se deve à própria aparição da fotografia como a arte essencialmente

representativa da Revolução Industrial a deflagração de processo histórico da arte moderna. Não por acaso, fotógrafos do período moderno em todos os continentes exploraram inicialmente as características mais formais e abstratas do meio para posteriormente retomar em parte uma fotografia mais documental e humanista no desenrolar de suas carreiras, seja no fotojornalismo, no retrato ou no trabalho propriamente autoral, como é o caso da obra de Paul Strand, Man Ray, André Kertész, Aleksandr Ródtchenko, Manuel Álvarez Bravo e, no Brasil, de Thomaz Farkas, entre outros fotógrafos que atuaram entre os anos 1910 a 1960. Pode-se pensar, portanto, que a partir destas características específicas do meio fotográfico, a fotografia contemporânea permitiria uma reconstrução crítica da tradição pictórica baseada na representação figurativa, transcendendo, possivelmente de uma forma mais abrangente, a própria arte moderna e contemporânea, sem deixar de incorporar as grandes contribuições trazidas para o debate artístico pelas vanguardas pós-modernas. É nesse sentido que se inscreve o trabalho de Cláudia Jaguaribe, como representação contemporânea da cidade do Rio de Janeiro que faz uma releitura da representação pictórica clássica da cidade contida na obra de fotógrafos como Marc Ferrez, mas incorporando necessariamente as questões do fazer contemporâneo, onde o olhar transcende o documental e incorpora a reflexão sobre o tempo presente em imagens construídas que provocam estranhamento e imersão crítica no universo registrado.


MENINA NA LAJE. Cortesia HAP Galeria

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MENINO COM MESA DE XADREZ. Cortesia HAP Galeria

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IPANEMA. Cortesia HAP Galeria

Claudia Jaguaribe nasceu no Rio de Janeiro. Vive e trabalha em São Paulo. Graduo-se em História da Arte pela Universidade de Boston, EUA. Seu trabalho está presente em importantes coleções nacionais e internacionais: Maison Europèenne de La Photographie, Paris, Acervo de Fotografia do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Coleção Instituto de Joaquim Paiva, Coleção de Fotografia Pirelli do Museu de Arte de São Paulo, entre outros. Sergio Burgi, Master of Fine Arts in Photography e Associate in Photographic Science pela School of Photographic Arts and Sciences Rochester Institute of Technology, NY, EUA onde obteve especialização na área de conservação fotográfica no ano 1984. Foi coordenador do Centro de Conservação e Preservação Fotográfica da Fundação Nacional de Arte, no Rio de Janeiro, entre 1984 e 1991. É membro do Grupo de Preservação Fotográfica do Comitê de Conservação do Conselho Internacional de Museus (ICOM) e, desde 1999, coordena a área de fotografia e a Reserva Técnica Fotográfica do Instituto Moreira Salles (IMS), principal instituição voltada para a guarda e preservação de acervos fotográficos no Brasil.

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L AU RENT

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C H É H È R E


HOUSE 11, série Flying Houses, impressão em jato de tinta (metacrilato). Cortesia Galeria Lume Photos

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HOUSE 10, série Flying Houses, impressão em jato de tinta (metacrilato). Cortesia Galeria Lume Photos

Laurent Chehere, nasceu em 1972 em Paris. Na série “Flying Houses” (casas voadoras) Laurent se inspirou no filme O Balão Vermelho (filmado em Ménilmontant, 1956), obra prima de Albert Lamorisse, que mostra uma Paris triste e cinza, ainda se recuperando da Segunda Guerra Mundial. O universo de Chéhère se assemelha ao filme nas imagens lúdicas e nos tons de cinza em contraste com cores mais fortes. Apesar das semelhanças, o balão vermelho possui uma sequência de dança e um final feliz, enquanto que as casas flutuantes aparecem em um espaço já resolvido, mas possuem um final ainda incerto a ser criado pelo espectador.

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HOUSE 3, série Flying Houses, impressão em jato de tinta (metacrilato). Cortesia Galeria Lume Photos

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F RANK L I N

C AS S AR O

FALSA CORAL VERDADEIRA, 2011, folha de alumínio colorido, 25,5 cm x 21 cm x 35,5 cm. Foto: Marcia Kranz, 2011. Cortesia Artur Fidalgo Galeria

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MITOCICLAGENS ALIENÍGENAS Fernando Gerheim

“Galactus está faminto e somente a essência vital de um planeta inteiro pode saciar a sua fome.” Galactus

A primeira coisa que me atraiu a atenção no laboratório de Cassaro, em meio àquela galeria de “seres” de folha de alumínio que remetiam a um universo meio infantil, foi que eles eram feitos também da matéria da imagem. Havia algo diverso tanto do modelo monolítico da escultura “clássica”, que cria a unidade a partir do bloco, quanto do construtivo “moderno”, que relaciona livremente elementos e multiplica pontos de vista. Corpos concretos eram transformados de uma coisa em outra sem acrescentar nem tirar nada. Ao contrário da alquimia, porém, sua substância permanecia a mesma. O “ser” daquelas criaturas era precisamente criar com o mesmo quantum de matéria outra coisa: uma charneira. Mas a nova dobra do Biobildung – a escultura não como forma, mas, literalmente em alemão, como vida em formação –, a versão 2.0 do princípio por trás do irreverente “bioconcretismo” incluía agora a imagem. Cassaro me ofereceu um copo de saquê. No caminho da cozinha meus olhos perderam-se em um robô de caixas Tetra Pak de suco; orgãos de folhas de alumínio de rótulos de cerveja; vulvas de tampinhas de iogurte; bichos de papel celofane de embrulhar bombom... Não eram coisas rechaçadas depois de “vividas” – as únicas marcas ali eram as dos rótulos dos produtos –, mas restos da assepsia. O que sobra entre o que foi consumido e o que está por consumir. Variante de Merzbau com objetos casuais domésticos utilizados para criar, sem tirar nem pôr, por um método particular, com apenas a ação sobre a matéria, outra coisa, que não deixa de ser ainda a primeira. Camuflagens. Tomei outro copo da beberagem oriental. Toda matéria é um Cavalo de Tróia. A força insurgente daqueles seres, entes e órgãos, retirada do “barro” dos rótulos, despertada de seu sono bem embalado, fora novamente incubada: dobradiças extra-sensíveis. Nos cubos infláveis e penetráveis dos primeiros trabalhos do artista, a mesma matéria, graças ao sopro vital de alguns ventiladores, passava a ocupar ampla extensão no espaço. O alimento do futuro era escultura. Depois, na torção de latas de mantimentos, operação toponímica com o gesto decisivo da dobra, também tudo mudava sem, no entanto, alterar a matéria. Agora que o ar tornou-se imagem, os cubos de ar são engaiolados e resguardados em “levitação cúbica”; os organismos viram personagens; surge a metáfora geométrica da totalidade: a esfera. De sua forma é deduzida a estrela, letra-guia, tabuleta no céu dizendo: a terra incógnita é por aqui. Mas onde se vê o brilho sedutor do signo divinatório se vê também, no fundo, contra o seu contorno, a mandíbula da lampreia, vampiro do mar: Antropofagia Industrial Alienígena (A.I.A). A palindrômica sigla (o “I” poderia referir-se também a Informacional) apresenta o Fatos de Mercado: esferas aglutinadas com a infinita capacidade de se adaptar, transformar e receber imagens – Merzbau em branco –, superfície que atrai com hospitalidade para o seu campo epitelial imagens que chegam de enxurrada, mas que não assume figura semelhante a nenhuma daquelas que estampa. Cassaro nos serviu outra dose. A partir da deglutição construtiva de esferas, como anteriormente de cubos, o Fatos de Mercado pode utilizar-se de embalagens de pizza, tampas de copos de refrigerante de grandes cadeias de lanchonete e todo o arsenal esférico do nosso cotidiano mergulhado em imagens. Na passagem da topologia à mitologia entram cordel, HQ, mangá, grafite. A rigorosa pesquisa da fisiologia de um mito de alumínio pode passar por display de motocicleta em loja de veículos importados. Obras podem ser objetos de design, apropriando-se da lógica de integração funcional na sociedade. No mundo dos tigres asiáticos, o Fatos de Mercado veste indumentárias orientais como a Toy Art e outros lugares comuns do setor do consumo que se tornou a arte contemporânea. Ele pertence a um tempo em que a operação de linguagem de Duchamp está entranhada de tal modo na cultura que mercado é imagem e imagem é valor de mercado. Se o dadaísmo queria separar-se de toda a história da arte, o que manifesta hoje o novo ciclo de infantilização? O líquido não ocupava mais o interior dos copos. Enchemo-os outra vez. O Fatos de Mercado foi engendrado pelo Macunamause para bater o boom chinês na feira do mercado global. Sua inspiração robótica, como a da galeria de personagens de metal que reluz, é uma anti-veneração devoradora da tecnologia que tem mais a ver com Nam June Paik nos contextos da hipermídia e das disputas do capitalismo cognitivo pelo comunismo da atenção. O mito é a construção, com as roupas de imagens que a ele aderem, de uma nova linguagem. A linguagem é o mito contemporâneo e o Fatos de Mercado é uma escultura com a cultura, o sumo do consumo. Enchemos a garrafa de ar. Brindamos ao novo totem. Reintegrará ele a sociedade em suas esferas aglutinadas? Estrela. Goela de lampreia. Cassaro indagou: “Será um texto de ficção?”

Franklin Cassaro nasceu em 1962, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha. Cassaro inventou o bioconcretismo, termo que conceitua sua arte. Cassaro cria objetos vivos, que se modificam e estão em constante evolução. Elementos como o ar e o vento são fundamentais em muitos de seus trabalhos. As performances do artista surgem como atos escultóricos. Sua obra possui muita influência de Lygia Clark. Os objetos “infláveis” do artista acolhem o espectador no seu interior desabitado e vazio. Fernando Gerheim transita entre literatura, cinema e artes plásticas. Doutor em Literatura Comparada, é professor da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Autor do ensaio Linguagens inventadas – palavra imagem objeto: formas de contágio (Ed. Zahar, 2008) e da ficção Signofobia (Ed. Multifoco, 2012). Atualmente desenvolve a pesquisa vídeo cinefágico: apropriações do cinema e da imagem informática.

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MULHER MANTIS, 2011, folha de alumínio colorido, 40 cm x 40 cm x 30cm. Foto: Marcia Kranz, 2011. Cortesia Artur Fidalgo Galeria

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C L AU D I A

M E LLI

LUGARES ONDE NUNCA ESTIVE, técnica mista, nanquim sobre papel e fotografia. Cortesia HAP Galeria

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NEM TODO SILÊNCIO, nanquim sobre vidro, 30 cm x 30 cm. Cortesia HAP Galeria

ENTRE O PERTO E O DISTANTE Luiza Interlenghi

As distâncias configuram variações na paisagem que interligam lugares, pessoas, coisas. Três séries de Cláudia Melli – Tudo da vida é um país estrangeiro, Série Azul e Lugares onde nunca estive – rememoram, contraditoriamente, a estranheza de lugares comuns. Resultam da apropriação e edição de fotografias coletadas em diferentes mídias, interligadas por desenhos que as transformam, unem, separam e eventualmente apagam, para reinventá-las com a pintura. Encontram nas sutilezas do claro-escuro, na modulação dos contrastes, sinais de uma nostálgica experiência do sublime, levando ao limite uma crítica do funcionalismo que, embora descentrada e sujeita a múltiplas fraturas, permanece urgente e intempestiva. Certa claridade no céu nublado, vigas de um telhado, fachadas, colunas, fiações, muradas – vestígios recolhidos no extrato em que se depositam as lembranças –, encontram-se em superfícies transparentes e sob o mesmo enquadramento. Paisagens vazias, em preto e branco, revisitam o desafio à memória e ao tempo lançados pela imagem fotográfica. Na trilha da verossimilhança aberta pela fotografia, estas pinturas e montagens buscam o imaginário, as recordações e, em meio ao habitual, vão ao encontro de um mundo ainda não visto, atemporal. A fotografia, quando foi considerada uma comprovação daquilo que meramente representa, levou à substituição da imprecisão das lembranças pela certeza implicada na reprodução técnica. Porém, em contraste com o caráter indicial da fotografia, pintar significa, na tradição moderna, dar ao que é pintado um valor maior que ao que é visto. Com pinturas que tangenciam o fotográfico, Claudia Melli afirma a presença de um lugar que nunca “foi”, revisitando o conflito histórico entre razão e emoção, que também o cinema, radicalizou. Suas paisagens retomam o tradicional dilema entre real e imaginário ao buscarem uma conciliação entre a reprodução técnica e o artesanal, entre o cálculo implicado na edição e a intensidade emocional da manipulação do pincel. Na série Tudo da vida é um país estrangeiro, a forma triangular de uma estrada deserta lançada em direção ao horizonte – um ícone da sociedade moderna, capitalista, e de sua autocrítica pela geração beat –, equivale à proa que, solitária, aponta um lugar que é pura distância a ser percorrida. As variações da luminosidade convocam à espera. Certa indefinição no encontro entre as pinceladas e a tentativa de, com a imagem, tocar o infinito, mantêm o tempo em suspensão. O que virá? Como no clássico filme de Mario Peixoto, no qual uma embarcação à deriva navega o ilimitado, a estrada é um emblema do limite individual diante da natureza, recorrente representação romântica do que está por vir. Na Série Azul (onde a cor é imaginária), claro e escuro, alto e baixo, agitado e sereno, contrapontos mantidos por Melli em relativo equilíbrio, retomam certa transcendência revelada no encontro entre um vasto céu e o oceano. O vazio, porém, retira da imagem o que é excesso, ameaça apagá-la, reserva uma desejável pausa à visão saturada pela pragmática do mercado. Essa série abre vastos espaços para sutilezas que não encontram lugar nas classificações funcionais dos bancos de imagens digitais, cujos padrões estéticos, finalmente, demonstram a crescente vinculação da experiência do sublime ao consumo. A arquitetura em labirinto, as proliferações virais, o policentrismo dos modelos de circulação da informação em rede marcam o enfraquecimento da bipolaridade que prevaleceu no século XX, identificada com a contraposição entre natureza e cultura, conceito e afetos. A retomada por Claudia Melli da paisagem, um gênero que pretendeu superar essa dicotomia, leva a uma espécie de recuo do corrente fascínio pelo sublime tecnológico em benefício de antigos mistérios escondidos nas distâncias, entre o perto e o distante, na grandeza imprevisível que mantém toda construção e a própria cultura sob risco iminente.

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NEM TODO SILÊNCIO, nanquim sobre vidro, 30 cm x 30 cm. Cortesia HAP Galeria

Claudia Melli, nasceu em São Paulo, vive e trabalha no Rio de Janeiro. Tem trabalhos nas coleções Gilberto Chateaubriand – MAM RJ, Banco Santander, Banco Espírito Santo, Brazil Golden Art Investimentos, Fundação Leal Rios, Lisboa e Instituto Figueiredo Ferraz, Riberão Preto, SP. Luiza Interlenghi, mestre em Curatorial Studies - Bard College (2002) e em História Social da Cultura pela PUC-RJ (1994), é curadora independente e professora de História da Arte na PUC–RJ. Faz doutorado na linha História e Crítica da Arte - Escola de Belas Artes, UFRJ.

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J O S É

EL FFE R

O DOCE DEBOSCH DE JOSÉ ELFFER Roberto Massoni

Como um artista da palavra, que lida diariamente com o imaginário a povoar o mundo interno, alegro-me sempre ao escrever sobre a obra pictórica de José Elffer, por se tratar do imaginário expresso já no mundo externo, revelado pelas imagens, que busca a leitura do particular, conectada ao oceano do inconsciente coletivo, à imensa cascata de signos, e à vasta simbologia pesquisada e tratada, pioneiramente, por C. G. Jung: e também pela força visual, magnética, que prende aquele que aprecia a tela de José Elffer, em desenho que se firma pela preciosidade da técnica/do traço em dias de pantecnologias e recursos gráficos de alta definição. Trata-se, tal tentativa, de sondar algumas possibilidades, já que acompanho há algum tempo estas telas surgirem da mão veloz a querer não perder de vista, os detalhes, os ícones, os principais símbolos que povoam esta “cidade”: em quê, mantidas as distâncias, bebe da fonte de H. Bosch (1450 - 1516), principalmente na miniaturização de elementos humanos e animais, ou mesmo nas figuras híbridas. Vindo do fluxo do inconsciente, como num jato criativo, os desenhos criam uma assinatura identificada, com suas figuras escatológicas, visualizadas com enorme impacto, do todo para o particular, e neste os preciosos detalhes, em desenhos que constroem o religioso (Eva – a Maçã – a Serpente), figuras do elenco fixo dos “atores” desta cena que vira do avesso o mundo real, ou na verdade, o desenham como de fato ele é: com seus lados de figuras histriônicas, que quase convidam ao grotesco, o que é contido pelo viés do humor. Vindo da escola do desenho, no princípio, todos em p/b, em uso de nanquim, o artista sentiu a necessidade da cor, em seus trabalhos, e resolveu, depois de muitos anos sem ela, fazê-la estar em cena, sem roubar a mesma: assim, houve uma nova abertura, um novo “código” a se integrar, embora minoria, e tanto os p/b quanto os com cores no corpo do desenho, apresentam-se em telas de proporção média, para grande. O questionado “belo” das artes, das belas artes, realiza-se no olhar inicial impactante, mas traz a desfiguração deste conceito da beleza clássica, nos detalhes, em que figuras humanas, répteis, objetos, plantas, peixes, depois cruzes, barcos, pássaros, tudo sempre em franca e rasgada sexualidade, no espaço visceralmente preenchido em seu todo, como necessidade, e como proposta: e sempre como que de maneira lúdica – a brincar com as descobertas “perplexas” ou “delirantes” de cada um. Também carnavalesco, professor de artes, artista de teatro, o artista plástico José Elffer está antenado a um mundo que busca não mais entender, mas seguir em frente, entre o claro e o escuro de cada um, driblando os demônios e os sonhos que tragam a leveza dos anjos, ou quem sabe? O inverso! É deste contato diário com o mundo daqui de fora, que o desenho de Jose Elffer retempera e vira/ou revira – e conta uma história que a caneta, em sua mão ágil, nos surpreende e encanta – uma história que vem sendo escrita de desenhos, e não de palavras. Mas de peso e beleza iguais.

José Elffer nasceu em 1969 na cidade de Santos /SP . Graduado pela Faculdade de Artes do Paraná. Em 2001 realiza sua primeira exposição individual (Curitiba /PR). A partir de 2002 expõe em diversas galerias e espaços culturais, entre eles Galerias Le Caveau e Renoir (Santos / SP), Galeria do Parque São Lourenço (Curitiba PR), Museu de Arte Manuel Gismondi (Ribeirão Preto / SP), Espaço Cristal (São Paulo / SP ) e Centro Galego de Arte Contemporânea (Santiago de Compostela / Espanha). Teve prêmios e participações em diversos salões e mostras de artes nacionais e internacionais – 2° Premio Belvedere Paraty/RJ, XX Encontro de Artes de Atibaia /SP, 41º Salão de Arte Contemporânea Luiz Sacilotto - Santo André/SP, 19° Salão de Artes Plásticas de Praia Grande /SP, 28° Salão de Artes de Embú da Artes/SP e outros. Atua também como carnavalesco, cenógrafo e figurinista. Roberto Massoni nasceu em 1959 na cidade de São Paulo. É dramaturgo e escritor, com espetáculos realizados em diversas companhias teatrais. Autor dos livros Fio Terra (1980), Festa da Colheita (2001) e A Teoria Vesânia (2012). Possui artigos publicados em jornais e revistas nacionais e internacionais.

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DOCE DEBOCH VI, 2002, nanquim s/ papel, 215 cm x 297 cm. Acervo Banco Santander

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AIR CARS, série 1, 2012, nankin e carimbo sobre papel, 21 cm x 14cm

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R O D R I G O

VI S C A

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AIR CARS, série 6 e série 3 , 2012, nankin e carimbo sobre papel, 21 cm x 15 cm

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FILTRO CIDADE “Foi meio agressivo, o AIRCARS. Eu ia de um lado para o outro, pela rua, no ônibus, metrô, os muros, calçadas, vias, o barulho, o cálculo dos passos, eu olhava, tinha cadernos guardados no bolso, as linhas, fios, na minha cabeça, no céu, a eletricidade passando. Esses desenhos vieram juntos de outros, PISANTES, eram um registro gráfico para tudo aquilo que batia no meu olho, meu rosto, eu registrava... Eu não me lembro quando comecei a desenhar, nunca quis saber quando aconteceu, não importa pra mim... essa não é uma pergunta pra mim, uma pergunta pra mim seria... Eu não sei se tenho uma pergunta. Eu andava e só, isso é meio vazio, é só um grande choque e as coisas dando voltas e curvadas. As pessoas trancadas, o tempo caindo, eu acabei pegando essa repetição e ela caiu na folha, eu carimbei. Eu acabei tomando o registro de jornal, a produção em série, os carros transformados em um signo de tudo isso que eu cruzava nos caminhos. A minha experiência gráfica é de uma síntese quebrada, em frações, são várias partes circulando como uma cidade, a cidade usada, piscina de ruídos, bolsas de gás, os ossos, a minha assinatura, os símbolos urbanos, o devaneio urbano, o delírio urbano, o exilio, a solidão compartilhada, um pequeno humor, a minha própria linha é algo humano, o meu traço é um traço cru, e isso entra no desenho, essa crueza, a suspensão humana... Eu tenho esses dois lados, a síntese humana, o drama da consciência estraçalhada pelos veios urbanos e a necessidade de silenciar numa síntese da linha crua, isso sou eu, esse é o meu desenho”. Em entrevista para Arturo Gamero

VISCA é um artista plástico e ilustrador brasileiro. Colaborador do Jornal Folha de S. Paulo, desde 2003 atua como artista visual e ilustrador, tendo seus trabalhos publicados em praticamente todas grandes revistas e principais veículos de comunicação do Brasil e publicações internacionais nos EUA, Espanha e Itália. Vive e trabalha na cidade de São Paulo investigando questões contemporâneas do meio urbano e relações entre o indivíduo e a metrópole.

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F ERNA ND O

D E

L A

R OC Q U E

DA ARTE DE SOPRAR FLORES EM BRASA Patrícia Kalil

Essas pinturas de Fernando de La Rocque são feitas com a adaptação de uma técnica milenar: o sopro de pigmento natural através de uma fôrma para marcar uma silhueta. Os artífices de Lascaux e Altamira já faziam isso em cavernas com suas pinturas rupestres. No caso, a tinta de Fernando é o pigmento oleoso que levita no ar como resultado das baforadas de seus cigarros de maconha. Sopra essa fumaça feita de flores em brasa através de stencils que ele desenha e corta com precisão e delicadeza. Com o jato de ar que comprime com sua boca, concentra a tinta que imprime sobre o papel de algodão. As imagens são como aparições e o estado é de contemplação. Deu à sua técnica o título Blow Job – Trabalho de Sopro. Ele pinta ícones que habitam o consciente coletivo. Figuras que, de certa forma, estão conectadas pela ideia de prazer e liberdade – o prazer é uma busca constante nos trabalhos de de La Rocque. Em Blow Job, ele apresenta imagens como o Êxtase de Santa Teresa, do artista barroco italiano Gian Lorenzo Bernini, o mago Aleister Crowley que escreveu “Faze o que tu queres – esta é a lei” e a cachorra Laika, que conquistou o espaço. Seu novo tríptico Não Consigo Parar de Pensar na Velhinha que Restaurou Jesus, reúne a imagem do Papa Bento XVI, o Ecce Homo “restaurado”, do artista espanhol novecentista Elías García Martínez, e Cecília Gimenez, a beata restauradora. Vale lembrar que este mesmo papa retratado por de la Rocque declarou o uso de cannabis como pecado capital, em 2008. A técnica de materializar as cores da fumaça revela um trabalho com potência estética, poética e política. O trabalho traz à tona questões sobre a liberdade individual do artista e o uso de canábis. Com repercussão mundial, essa série tem despertado a atenção de instituições de arte na Europa, cultivadores e apreciadores. De forma inteligente e bemhumorada, Blow Job imprime seu doce deleite.

Fernando de La Rocque é artista plástico. Nasceu em 1979 no Rio de Janeiro, cidade onde vive nos tempos atuais. Bacharel em escultura pela EBA-UFRJ, frequentou o Zona Franca e CEP 20.000, que lhe deram base de arte urbana, performance e outras modalidades. Suas exposições individuais realizadas em 2012 são O Movimento é Sexy (Chile), Blow Job – Trabalho de Sopro e Silhuetas de Amor à Luz da Lua (Artur Fidalgo galeria). Patrícia Kalil é escritora. Aos 33 anos, já morou na Holanda, França, Inglaterra, Irlanda, Estados Unidos e Moçambique, sempre em trabalhos ligados à cultura e desenvolvimento social. Atualmente, mora no Rio de Janeiro, onde além de jornalista da Rede Globo, tem uma agência de comunicação de arte contemporânea.

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ÊXTASE DE BERNINI SANTA TERESA. Foto: Patrícia Kalil. Cortesia Artur Fidalgo Galeria

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UMA PUBLICAÇÃO ÚNICA.

w w w. s a n t a f i n e a r t . c o m . b r

NORMAS PARA ENVIO DE COLABORAÇÕES A SANTA recebe propostas de colaborações pelo e-mail sergiomauricio@santaartmagazine.com.br. A SANTA reserva-se o direito de não submeter previamente o material diagramado à avaliação dos colaboradores selecionados. IMAGENS Na ocasião da proposição de trabalhos para publicação, devem ser encaminhados arquivos em formato JPG, em baixa resolução. Junto com estes, deve seguir, em arquivo de Microsoft Word, uma breve nota biográfica sobre o artista, relacionando principais exposições, publicações, prêmios etc. As imagens em baixa resolução devem ser acompanhadas de listagem de legendas, conforme o seguinte padrão: Título em negrito, ano, técnica, medidas em centímetros e coleção (se for o caso). As imagens posteriormente selecionadas para publicação devem ser encaminhadas por e-mail, em arquivos TIF, com 300 dpi e 36 cm de altura. TEXTOS Os textos devem ser enviados por e-mail em arquivo de Microsoft Word com margens laterais de 3 cm, fonte Times New Roman, corpo 12, espaço 1,5 e entrelinha entre parágrafos. São aceitos artigos (até 5.500 caracteres com espaços) e entrevistas (até 18.000 caracteres com espaço) em

língua portuguesa; inéditos ou publicados anteriormente apenas em materiais como catálogos de exposição – nesse caso, os dados da publicação original (instituição, cidade, editora, ano) devem ser informados em nota. O texto deve obedecer à seguinte seqüência: Título (caixa alta), nome do autor (caixa alta e baixa), corpo do texto, breve nota biográfica sobre o autor. Expressões em destaque, palavras estrangeiras e títulos de obras devem vir em itálico. Citações devem vir entre aspas, seguidas, entre parênteses, da referência bibliográfica completa (Nome e sobrenome do autor. Título do artigo. Título do livro em itálico. Cidade: Editora, ano, página). Notas devem ser reduzidas ao mínimo, numeradas e colocadas no pé de página. DIREITOS AUTORAIS Na mensagem em que forem enviadas as propostas de colaboração deve constar o seguinte texto: “Eu, NOME COMPLETO/NOME ARTÍSTICO/DOCUMENTO DE IDENTIDADE, declaro estar ciente de que esta proposta de publicação do trabalho NOME DO TRABALHO na revista SANTA FINE ART implica a cessão imediata e sem ônus dos direitos de publicação para a revista. Para publicações posteriores do material em outros veículos, permanecem reservados os direitos do autor, sem qualquer ingerência da revista. DATA E LOCAL.”

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