(Re)Descobrir Teresa Sousa / Gravura - 60 Anos Depois

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re ) descobrir teresa sousa

gravura — 60 anos depois

textos

João Carvalho | José Victor Carvalho

( re ) descobrir teresa sousa

gravura — 60 anos depois

Este livro foi publicado por ocasião da exposição

(Re)Descobrir Teresa Sousa. Gravura — 60 anos depois, com curadoria de João Carvalho e José Victor Carvalho, apoio à curadoria de Ana Flor Galvão e Nadya Ismail, realizada na Biblioteca Nacional de Portugal, de 8 de Novembro de 2022 a 25 de Fevereiro de 2023.

Apresentação

João Carvalho | José Victor Carvalho

Teresa Sousa, uma artista plástica entre as demais no contexto da Cooperativa de Gravadores Portugueses

Cristina Azevedo Tavares

O lugar da obra de Teresa Sousa nas encruzilhadas artísticas do seu tempo

Fernando Rosa Dias

Teresa Sousa — versatilidade e excelência na aplicação das técnicas de gravura (ensaio sobre a obra gravada)

Joanna Latka 91

Teresa Sousa — nota biográfica

João Carvalho | José Victor Carvalho

Excerto da carta de Teresa Sousa aos pais, de 08-11-1955, comentando a primeira sessão da aprendizagem de gravura no Atelier 17, em Paris.

Apresentação

Teresa Sousa (1928-1962) distinguiu-se como gravadora, tendo sido uma pioneira da gravura moderna em Portugal.

A exposição (Re)Descobrir Teresa Sousa. Gravura – 60 anos depois é a segunda exposição individual desta artista, precisamente quando decorrem sessenta anos do seu falecimento, no início de 1962, com apenas 33 anos de idade. O nome da artista praticamente desapareceu do panorama das artes plásticas, sendo, desde então, muito rara a apresentação pública de obras de sua autoria.

É a primeira vez que se apresenta publicamente uma retrospectiva da obra gravada de Teresa Sousa, cuja única exposição individual, intitulada Calcografia, Desenho, Monotipia, se realizou de 30 de Março a 10 de Abril de 1957 na, há muito desaparecida, Galeria Pórtico, em Lisboa.

A exposição tem como núcleo principal a colecção de gravuras da artista doada pelos seus filhos à Biblioteca Nacional de Portugal. Inclui gravuras produzidas entre 1956 e 1961, e ainda provas únicas, cuja tiragem não se chegou a concretizar. Não obstante as primeiras gravuras, produzidas em Paris, durante a aprendizagem no Atelier 17, serem todas em técnicas de gravura em metal (cobre ou zinco) — buril, água-forte e processo misto —, Teresa Sousa dedicou-se a todas as outras técnicas de gravura: litografia, xilogravura, linóleo, serigrafia. Dada a sua morte inesperada, deixou bastantes trabalhos inacabados, de que se exibem também alguns exemplos.

Por Teresa Sousa ser presentemente uma artista pouco conhecida, na exposição também se apresentam alguns elementos do seu brilhante percurso académico e da aprendizagem de gravura no Atelier 17, orientada por Stanley Hayter, uma referência maior da gravura no século XX, com forte influência nas primeiras obras da artista.

E como a gravura é nos dias de hoje uma arte quase esquecida, na exposição também são exibidos exemplos das várias fases do processo de produção de algumas das gravuras expostas, nomeadamente desenhos, vegetais para

transposição de desenho para matrizes, matrizes, e provas de estado e de ensaio, em quase todas as técnicas em que a artista trabalhou.

Além de uma breve nota biográfica, o catálogo inclui ainda textos da professora Cristina Azevedo Tavares e do professor Fernando Rosa Dias, da Faculdade de Belas-Artes de Lisboa, e da artista gravadora e investigadora de gravura Joanna Latka, a quem os filhos de Teresa Sousa deixam registo de agradecimento, bem como à Biblioteca Nacional de Portugal, que teve a feliz iniciativa da realização da mostra e da edição do presente catálogo, contribuindo assim de modo muito significativo para a (re)descoberta da obra gravada da artista, sessenta anos após o seu desaparecimento.

Os curadores

João Carvalho | José Victor Carvalho (filhos de teresa sousa)

A Virgem e o Menino, 1956 (Paris) [gravura premiada na I Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian, 1957]

Buril sobre cobre, 32,7 × 23,6 cm [BNP E. 1840 A.]

O Anjo, 1956 (Paris)

[gravura premiada no I Salão dos Novíssimos, SNI, 1959]

26,3 × 15,9 cm [BNP E. 1841 A.]

Buril sobre cobre,
Pequena Árvore, 1956 (Paris)
Água-forte sobre zinco, 23,9 × 15,6 cm

Esta peça monocromática (31,2 × 23,3 cm), muito bem trabalhada em técnica de água-forte, apresenta lindíssimas gradações de gamas de preto, cinzento-escuro e cinzento-claro, sem qualquer presença do branco, o que permitiu à artista criar a ilusão de um território desconhecido da geometria flexível, provando assim a excelência do domínio desta técnica por Teresa Sousa. Através de linhas curtas, longas, verticais e horizontais, por vezes espessas e de cor forte, por vezes muito finas e delicadas, quase invisíveis, a artista cria dentro dessa subtil narrativa gráfica uma perspectiva e profundidade que proporcionam ao observador uma poderosa ilusão de tridimensionalidade no espaço de uma oficina que poderíamos qualificar de quase alquímica.

Observando com atenção a gravura, identificamos com facilidade a estética de linhas dinâmicas da escola de Hayter perfeitamente integrada nos elementos e nos objectos deste misterioso local de trabalho. A composição, baseada em figuras geométricas (triângulos, círculos, rectângulos, quadrados, ovais, losangos, paralelogramos, etc.), que se sobrepõem umas às outras perfeitamente organizadas na totalidade do espaço da chapa, evoca as ideias de Kazimir Malevich (1879-1935) e da sua filosofia do dinamismo do «aparato suprematista», do dinamismo da «transcendência e da redução», ou ainda o dinamismo «de ir além das idealidades limitadas».

Para finalizar a parte deste ensaio dedicada às gravuras produzidas em técnicas de metal, é impossível não mencionar também a bela gravura A Ilha (1959), que no espólio da artista é contabilizada em diferentes versões cromáticas. Nesta grande gravura (39,5 × 49,8 cm), a artista demonstra-nos a sua perfeição máxima no domínio técnico (buril e água-forte), tal como na aplicação da cor. Observamos um registo abstracto da visão de uma «ilha desconhecida», onde o traço de Teresa Sousa se torna muito mais expressivo e transforma a linha num grafismo próprio muito forte, que porventura nos leva numa viagem imaginária numa «ilha voadora», para encontrar as suas concepções do exterior e interior do seu íntimo ou desabitar pelos visíveis ou não visíveis caracteres que aparecem ou desaparecem deixando, por vezes, somente traços das suas sombras, situando-as assim dentro de memórias, perdidas na realidade entre o espaço e o tempo, como as metáforas das mesmas, transportando assim quem as vê para uma viagem dentro do nosso imaginário.

Como foi referido no início, além de técnicas de gravura em metal, a artista trabalhou em todas as técnicas de gravura praticadas na altura. Também nestas diferentes abordagens técnicas, igualmente como no metal, a artista con-

Provas a cor da gravura A Ilha, buril e água-forte (1959), 39,5 × 49,8 cm.

Desenho para a gravura Grande Natureza-morta (1960), 35 × 53 cm.

Vegetal para transposição do desenho para corte das matrizes em linóleo da gravura Grande Naturez-morta (1960), 32,7 × 52,7 cm.

seguiu obter excelentes resultados, que podemos ver, por exemplo, nas impressões multicoloridas em técnica de linóleo, especialmente visíveis nas naturezas-mortas, impressas em três cores: Natureza-morta (1959), Grande Natureza-morta (1960), Pequena Natureza-morta (sem data), ou ainda na gravura Peixe (1960). As obras de grande formato Grande Natureza-morta (36 × 55,5 cm) e Peixe (39,8 × 58,7 cm) representam uma abordagem de perfeição no controlo de impressão e de corte do linóleo. Nestes casos, e diferentemente das obras produzidas em técnicas de metal, para obter trabalhos multicoloridos, a artista teve de criar uma matriz diferente para cada cor aplicada. Ou seja, pretendendo uma gravura com três cores, a gravadora teve de preparar três matrizes diferentes para obter o resultado esperado numa só gravura. Trabalho bastante demorado, que nem sempre resulta bem, devido aos possíveis erros de impressão, em que, por milímetros não acertados, podem aparecer falhas na sobreposição das manchas coloridas. No caso das obras referidas, podemos observar o notável e muito bom domínio da artista na execução da obra, tal como, por outro lado, na criação de um traço elegante e espontâneo da apresentação geométrica de todas as atrás mencionadas naturezas-mortas, tal como na gravura Peixe.

Através de estudos preparatórios, que foram encontrados no espólio da artista — inúmeros desenhos, estudos em papel vegetal de organização de corte de cada matriz representante de cada cor, pinturas a guache com design de proposta de gravuras finais , conseguimos compreender bem a metodologia para a perfeita execução da escavação da matriz (com goivas), em especial nos casos já atrás mencionados: a Grande Natureza-morta e Peixe.

Gostaríamos ainda de referir que no mesmo arquivo foram encontradas monotipias e inúmeras provas de estado e diversas provas de cor de várias gravuras, nas quais verificamos o forte interesse da artista pela descoberta da textura e pela paleta cromática na gravura: «Tenho também realizado ultimamente composições de cor em monotipos, segundo um processo que me ocorreu, utilizando chapas de zinco, que faço imprimir como talhadora. Nesses monotipos procuro a profundidade espacial, por meio da sobreposição de finas camadas de cores transparentes.»13 De referir que Stanley Hayter, no «certificado» que emitiu a Teresa Sousa no final da sua brilhante aprendizagem de gravura no Atelier 17, fez constar que «as experiências que [Teresa Sousa] realizou em mo-

13 Da sexta página do relatório enviado por Teresa Sousa ao Instituto de Alta Cultura (IAC), em Março de 1956.

notipia para identificar as consequências da cor na transparência foram-nos úteis para um curso preparatório para principiantes que pretendam trabalhar em cores».14

É também claro que esta busca de cor na gravura foi uma vertente que surgiu naturalmente à jovem pintora. A artista observava e estudava «como na gravura a cor os escultores se vêm a braços com problemas puramente picturais, e como na gravura a preto e branco o pintor em pleno problema espacial, estão afinal tão perto da escultura».15

São de referir também os trabalhos de Teresa Sousa produzidos em técnica de xilogravura, na qual, mais uma vez, a artista conseguiu obter muito bons resultados finais. Gostaríamos de destacar nesta análise as duas grandes xilogravuras A Ponte (1960, 41 × 54 cm) e A Torre (sem data, 45,7 × 25,5 cm), ambas de representação geométrico-linear, de uma linha preta, fortemente grossa, e por vezes fina, que altera o seu ritmo de desenho numa forma muito espontânea, criando assim um interessante mosaico das diversas linhas e segmentos geométricos, finalizando-se numa subtil e poética maneira de interpretar a matéria geométrica pela artista. A semelhança estética de ambas as gravuras dá-nos a liberdade de presumir, embora a prova de A Torre não esteja datada, que foi gravada na mesma altura que A Ponte.

Relevante é também o conjunto das provas que representam a fase figurativa da artista, que, após a fase geométrica, se tornou de novo predominante no seu trabalho. Falamos de um conjunto de xilogravuras datadas de 1960, em duas cores, de dimensões 30 × 25 cm, tendo como tema as estações do ano, apresentando interessantes composições femininas — as gravuras Primavera, Verão, Outono e Inverno — bem ilustrativas, com riquíssimo grafismo da linha, no qual os ornamentos se misturam num ambiente misterioso, cheio de plantas, e onde os enigmáticos traços das mulheres retratadas nos levam para o interior de um mundo inexplicável.

Para o mesmo grupo analisado, podemos ainda juntar as duas linogravuras a duas cores, Rapariga do Lenço (1960, 41,5 × 24,7 cm) e Menina com Colar (sem data, 33,5 × 21,5 cm), ou a gravura em metal Mulheres (sem data, 32,5 × 23,2 cm), tal como as representações figurativas em contexto de temática religiosa, onde a

14 Traduzido do documento emitido por Stanley Hayter e anexado por Teresa Sousa ao terceiro e último relatório de actividades enviado ao Instituto de Alta Cultura (IAC), em Junho de 1956.

15 Da segunda página do relatório enviado por Teresa Sousa ao Instituto de Alta Cultura (IAC), em Março de 1956.

artista exteriorizava a sua profunda fé, aliás transversal em toda a sua obra: xilogravuras Cristo (39,7 × 26 cm), Nossa Senhora das Dores (39,7 × 26 cm), Visitação (45,6 × 23 cm) e litografia Sagrado Coração de Maria (51 × 31 cm), (todas sem data, mas datáveis de 1960 ou 1961). Através das palavras da Doutora Maria de Lourdes Belchior, recordamos que Teresa Sousa era uma artista que partilhava da nossa frágil condição, na insegurança dos caminhos, e que, ao mesmo tempo, testemunhava de certezas que nos transcendem: as da fé.16

Por fim, é importante assinalar também que, paralelamente à gravura, a grande actividade produtiva de Teresa Sousa tinha também forte expressão na pintura e no desenho, tal como em outras formas de expressão artística, tão diversas como, por exemplo, os projectos para tapeçarias (uma foi mesmo executada pela Manufactura de Tapeçarias de Portalegre), ou para mosaicos e vitrais (Santuário de Fátima), todos desenvolvidos pela jovem artista com muita sensibilidade e extraordinária criatividade. Chama-se ainda a atenção para a importância do trabalho artístico de Teresa Sousa, na perspectiva do panorama artístico português nos anos 50 e 60 do século passado, e para o facto de ter sido uma das artistas pioneiras no estudo e na aplicação de técnicas complexas de gravura artística neste período em Portugal.

Esperamos que este ensaio, além de uma contextualização da desconhecida obra da artista, demonstre a existência de uma enorme riqueza artística no pouco reconhecido ramo da arte portuguesa que é a gravura, despertando assim o interesse de todos pela obra gráfica de Teresa Sousa, que certamente merece hoje uma maior atenção, tal como mereceu ao tempo da sua produção.

16 Do texto da autoria de Maria de Lourdes Belchior, publicado no n.º 42 do jornal Encontro, de Janeiro de 1963, p. 3.

José Dias Coelho, busto de Teresa Sousa, bronze, c. 1960.

Teresa Sousa — nota biográfica

de Teresa Sousa)

«Fui ontem à tarde à gravura, pela 1.ª vez. É o mesmo que querer escrever e não saber pegar na caneta… uma dificuldade imensa, pois tenho de aprender tudo de início.»

Foi assim que Teresa Sousa, em carta que enviou aos pais em 8 de Novembro de 1955, relatou a sua primeira experiência em gravura, no Atelier 171, em Paris. Não obstante as dificuldades com que deparou no início da sua aprendizagem, extensa e detalhadamente documentada nas cartas aos pais, ao Dr. João Couto («mentor» de Teresa Sousa, na altura director do Museu Nacional de Arte Antiga) e nos relatórios trimestrais enviados ao Instituto de Alta Cultura (actual Instituto Camões), o que experimentou e aprendeu no Atelier 17 foi decisivo para o reconhecimento do seu trabalho como gravadora.

Teresa Sousa nasceu em Lisboa, em Dezembro de 1928. Durante a adolescência, teve aulas de pintura com o pintor Romano Esteves. Após os estudos liceais, iniciou, em 1947, na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa (ESBAL), o Curso Superior de Pintura, que terminou em 1954, com «informação final de 20 valores». Durante a frequência do curso, foram-lhe atribuídos pela ESBAL os prémios de melhor classificação em Pintura (ano lectivo de 1950-51), Constantino Fernandes (1951-52) e Veloso Salgado (1952-1953), e pela Academia Nacional de Belas-Artes, os prémios Lupi (1951-1952) e Ferreira Chaves (1952-1953).

1 O Atelier 17 não era um espaço físico, mas sim um conceito de aprendizagem da gravura, predominantemente em metal (cobre e zinco), e que se caracterizava por um modelo de aprendizagem informal e colaborativo, ao modo de um workshop «No Atelier 17 não havia regras nem disciplina a seguir, apenas uma atitude constante de procura, de uma verdadeira curiosidade científica, que faziam da gravura um instrumento de exploração. Para Hayter, cuja energia no traço evidencia todo o dinamismo, a placa era o teatro de acção, materialização da energia mental. O processo criativo, radicado no inconsciente, levava à descoberta de si mesmo.» (Carla Esposito, «Stanley Hayter et L’Atelier 17, in Nouvelles de l’estampe, Paris, n.º 127, Março de 1993, p. 7 (tradução livre do original em francês).

Certificado de habilitações de Teresa Sousa. [Espólio documental Teresa Sousa]

Ofício informando a atribuição do prémio Lupi da Academia Nacional de Belas-Artes. [Espólio documental Teresa Sousa]

Ainda estudante da ESBAL, Teresa Sousa participa, em 1951, na exposição Cópias de Mestres Antigos, no Museu Nacional de Arte Antiga, e em 1953, no Salão da Jovem Pintura (Galeria de Março, Lisboa). Dois anos mais tarde, em 1955, participa na exposição inaugural da Galeria Pórtico, em Lisboa, com os seus colegas com quem fundou a Galeria: Lourdes Castro, José Escada e Cruz de Carvalho; em simultâneo, dinamiza e participa, com estes mesmos colegas, no Museu Nacional de Arte Antiga, na exposição Estudos sobre um Tema de Pintura. Participa ainda, em 1955, na primeira exposição colectiva da Galeria Pórtico e na II Exposição de Artes Plásticas de Almada. Entre Setembro de 1955 e Junho de 1956 estudou em Paris, no âmbito de uma bolsa atribuída pelo Instituto de Alta Cultura (a que sucedeu o actual Camões — Instituto da Cooperação e da Língua, I. P.). Tendo-se frustrado o objectivo principal da bolsa — estudos em Arte Sacra —, Teresa Sousa procurou orientação junto de Vieira da Silva, que vivia e trabalhava em Paris. Numa visita

de Lourdes Castro, por Teresa Sousa, sem data, 27 × 21 cm.

[Espólio documental Teresa

Retrato de Teresa Sousa, por Lourdes Castro, sem data, 34,2 × 22,3 cm.

[Espólio documental Teresa Sousa]

Retrato
Sousa]

Teresa Sousa, Paris, 1955. [Espólio documental Teresa Sousa]

ao atelier da artista e do seu marido Arpad Szenes, Teresa Sousa manifestou interesse em aprender gravura. Vieira e Arpad, que tinham frequentado o Atelier 17, entregaram-lhe uma carta de apresentação dirigida a Stanley W. Hayter2, amigo do casal e alma do Atelier 17, o que levou Teresa Sousa a iniciar os seus estudos de gravura neste carismático atelier, sob a orientação de Hayter, uma referência maior da gravura do século XX.

Durante a aprendizagem no Atelier 17 (Novembro de 1955 a Junho de 1956), Teresa Sousa, além das gravuras produzidas durante o processo de aprendizagem, produziu doze gravuras, algumas das quais com um elevado número de provas de ensaio, também de cor. No final dos seus estudos no Atelier 17, Stanley Hayter emitiu a Teresa Sousa um «certificado de habilitações» com conteúdo altamente elogioso.

2 «Considerado como um dos pais da gravura moderna, Hayter esteve na origem de um momento de confluência cultural de uma extraordinária fertilidade. À sua volta, a partir de 1927 e até à sua morte em 1988, escultores, pintores e gravadores de diferentes tendências encontraram-se num ambiente de liberdade e eclectismo intelectual, que deu origem a um excepcional atelier de experimentação gráfica. Na história artística do século XX, (…), o Atelier 17 destaca-se pela liberdade e abertura de espírito, tendo-se constituído um foco do qual irradiava uma extrema riqueza de imagens que contribuíram para uma nova concepção da gravura (idem, p. 6, tradução livre do original em francês).

Colegas de Teresa Sousa no pátio de escultura da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa (c. 1955).

Em pé, da esquerda para a direita, Cruz de Carvalho (futuro marido de Teresa Sousa), Chico Rego, Aida Furtado, José Escada e Lourdes Castro. Irene San Payo ao centro. Sentadas, da esquerda para a direita, Lídia Bordalo, Geni, Manuela Machado, Filomena Froes e Manuela Martins.

[Arquivo José Maria Cruz de Carvalho]

Retrato de Teresa Sousa, por José Escada (1955), 19,5 × 13,5 cm (frente e verso). [Espólio documental Teresa Sousa]

Certificado de Habilitações de Teresa Sousa emitido por Stanley Hayter, em 15-06-1956. [Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, PT/MNE/CICL/IC-1/03211/05]

Capa do catálogo da primeira exposição individual de Teresa Sousa. Galeria Pórtico, Lisboa, 30 de Março a 10 de Abril de 1957. [Espólio documental Teresa Sousa]

Após o regresso de Paris, e ainda em 1956, Teresa Sousa organizou, na Galeria Pórtico, as exposições Cartazes de Paris e Vieira da Silva — Exposição de obras existentes em Portugal. Em 1957 realizou a sua única exposição individual, na Galeria Pórtico, intitulada Calcografia, Desenho, Monotipia, que mereceu acolhimento bastante favorável por parte da crítica. Neste mesmo ano esteve representada na I Bienal Internacional de Gravura, em Tóquio, e participou na Exposição de Gravura Portuguesa Contemporânea organizada pela Cooperativa Gravura (da qual foi artista gravadora), e na I Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian, onde foi distinguida com um prémio de gravura. Em 1958, participou na 5.ª exposição Bianco e Nero, em Lugano (Suíça), no I Salão de Arte Moderna da Casa da Imprensa (Lisboa), na III Exposição de Artes Plásticas de Almada, e no I Salão de Arte Moderna da Sociedade Nacional de Belas-Artes, e esteve representada na exposição colectiva de gravura que a Cooperativa Gravura organizou em Gotemburgo (Suécia). Neste ano ainda viu uma gravura sua capear o guia turístico Portugal Welcomes You, integrou a Missão Cultural Artística Portuguesa que visitou a Expo 58 (Bruxelas), e organizou a exposição O Branco, o Preto e as Cores, com trabalhos das suas alunas.

O seu primeiro filho nasceu em Março de 1959, ano em que recebeu o prémio Domingos Sequeira (para gravura) no I Salão dos Novíssimos. Esteve representada na Exposición de grabados portugueses contemporáneos (Madrid, Espanha), e na exposição L’incisione contemporanea in Portogallo (Roma, Itália), organizadas pela Cooperativa Gravura, e na exposição colectiva organizada pelo SNI em S. Francisco (Estados Unidos). Participou ainda na I Exposição de

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Estudo em têmpera para mosaico, 1960, 44,8 × 26,3 cm.

Vegetal para transposição do desenho para gravura não executada, sem data, 29,3 × 21 cm.

Reprodução da gravura Cidade no catálogo Exposición de grabados portugueses contemporáneos, Madrid, 1959.

Desenho Moderno (Casa da Imprensa), no II Salão de Arte Moderna da Casa da Imprensa, e na 22.ª Exposição de Desenho, Aguarela, Pastel, Gravura e Miniatura, da Sociedade Nacional de Belas-Artes.

Em 1960, esteve representada na Exposição Internacional Feminina do Museu de Arte Moderna de Paris, e participou na exposição das Comemorações Henriquinas, na Fundação José Nunes Martins (Oliveira do Conde), na Exposição de Gravura Portuguesa Contemporânea (Galeria da Pastelaria Dragão Vermelho, Almada), no II Salão dos Novíssimos e na I Exposição Nacional de Pintura da Quinta da Vigia (Funchal).

Em 1961, participou nas exposições Paisagistas e Animalistas do Séc. XX e no 57.º Salão da Primavera, organizadas pela Sociedade Nacional de Belas-Artes, no III Salão dos Novíssimos e na Exposição Antoniana do Estoril, onde lhe foi atribuído o 2.º prémio de pintura.

No fim de Dezembro nasceu o seu segundo filho.

Faleceu inesperadamente em Lisboa, no dia 6 de Janeiro de 1962.

Apesar de ter sido uma pioneira da gravura moderna em Portugal, Teresa Sousa é hoje um nome quase apenas do conhecimento de especialistas em arte moderna portuguesa. Os poucos elementos informativos sobre a artista que se encontram na literatura da especialidade estão maioritariamente relacionados com o prémio de gravura que lhe foi atribuído na I Exposição de Artes Plásticas

Capa da versão em língua inglesa do guia turístico Portugal Welcomes You (1958), com gravura de Teresa Sousa.

Reprodução da gravura O Anjo, no catálogo da exposição L’Incisione contemporanea in Portogallo, Roma, 1959.

Painéis de mosaicos na Cantina Velha da Cidade Universitária de Lisboa, com desenho de Teresa Sousa.

da Fundação Calouste Gulbenkian, com a Galeria Pórtico (1955-1957), e como artista gravadora dos primeiros anos da Gravura — Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses, de cujo catálogo constam três gravuras de sua autoria, duas de 1958, e uma de 1959. A gravura Cidade (1958), n.º 33 do catálogo da Cooperativa Gravura, é a primeira calcografia a cores deste catálogo, o que constitui evidência do domínio da técnica da gravura em metal que Teresa Sousa adquiriu no Atelier 17. As três gravuras que a artista produziu para a Cooperativa Gravura constituem uma ínfima parte da sua produção artística, a qual, além da gravura, se estendeu também à pintura, ao desenho e às artes decorativas. No âmbito destas últimas, a registar o discreto painel de mosaicos, de sua autoria, existente na parede exterior norte da Cantina Velha da Cidade Universitária, em Lisboa.

Ao tempo em que desenvolveu a sua actividade como artista plástica (1955-1961), Teresa Sousa foi bastante prolífica, reconhecida e premiada, mas a morte prematura, com apenas 33 anos acabados de fazer, interrompeu uma carreira que se augurava promissora. Deixou bastantes trabalhos por concluir, nomeadamente gravuras, cartões para tapeçarias e projectos para mosaicos. Com excepção de algumas gravuras, a sua obra nunca foi objecto de estudo.

O crítico de arte Joaquim de Sellés Paes, no artigo «A gravura contemporânea portuguesa», publicado no n.º 3 (Maio de 1959) da revista Colóquio, editada pela Fundação Calouste Gulbenkian, refere que Teresa Sousa deveria «ocupar, numa panorâmica da nossa gravura, posição cimeira quanto aos conhecimentos e uso da sua técnica». Infelizmente, Teresa Sousa não teve possibilidade de ocupar a posição que à época o crítico lhe reconheceu.

Tapeçaria Porto de Abrigo, 1963, 155 × 125 cm.
Executada na Manufactura de Tapeçarias de Portalegre a partir de um desenho de Teresa Sousa de 1961.

Todas as imagens cuja proveniência não se encontra identificada são de trabalhos que fazem parte do espólio artístico de Teresa Sousa.

Visite www.teresasousa.pt

© Biblioteca Nacional de Portugal Campo Grande 83, 1749-081 Lisboa

© Sistema Solar, Crl (chancela Documenta)

Rua Passos Manuel 67 B, 1150-258 Lisboa

© Herdeiros de Teresa Sousa

textos © os Autores

ISBN: 978-989-568-139-6

1.ª edição: Setembro de 2024

Fotografias: Duarte Belo (pp. 2-9, 118-127); José Vicente (pp. 90, 96)

Design gráfico: Manuel Rosa

Revisão: Helena Roldão

Depósito legal: 537677/24

Pré-impressão, impressão e acabamento: Gráfica Maiadouro SA

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