A Luta pelo Significado na Arte do Século XX / Rui Sanches

Page 1


a luta pelo significado na arte do século xx

A Luta pelo Significado

na Arte do Século xx

Rui Sanches

© Sistema Solar, crl (Documenta), 2024 Rua Passos Manuel, 67 b, 1150-258 Lisboa imagens © os Herdeiros dos Autores, os Autores © Rui Sanches

1.ª edição: Setembro de 2024 isbn: 978-989-568-073-3

Revisão: Ana Sim-Sim

Depósito legal: 537124/24

Impressão e acabamento: ACDPrint, sa Rua Marquesa D’Alorna, 25-19 2620-271 Ramada

«As hastes dos pára-raios têm de ter ligação à terra. Mesmo as ideias mais abstractas, especulativas, têm de estar ancoradas na realidade, na substância das coisas.»

Índice

11 Prefácio

15 Introdução

21 Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906)

43 Henri Matisse (1869-1954) e Pablo Picasso (1881-1973)

61 Marcel Duchamp (1887-1968) e Constantin Brancusi (1876-1957)

81 Wassily Kandinsky (1866-1944) e Piet Mondrian (1872-1944)

93 Jean Arp (1886-1966) e Sophie Taeubaer (1889-1943)

115 Vladimir Tatlin (1885-1953) e Kazimir Malevich (1878-1935)

135 Joan Miró (1893-1983) e André Breton (1896-1966)

153 Alberto Giacometti (1901-1966) e Francis Bacon (1909-1992)

173 David Smith (1906-1965) e Jackson Pollock (1912-1956)

193 Robert Rauschenberg (1925-2008) e Jasper Johns (1930)

199 Claes Oldenburg (1929-2022) e Andy Warhol (1928-1987)

213 Donald Judd (1928-1994) e Robert Smithson (1938-1973)

243 Eva Hesse (1936-1970) e Richard Serra (1938-2024)

261 Michelangelo Pistoletto (1933) e Bruce Nauman (1941)

281 Joseph Beuys (1921-1986) e Gerhard Richter (1932)

305 Julian Schnabel (1951) e Cindy Sherman (1954)

325 Epílogo

329 Bibliografia

Para a Maria da Graça

Prefácio

Este texto é o resultado do questionamento que, desde o início, tem acompanhado o meu trabalho como artista. A preocupação com a relevância daquilo que é produzido no campo das artes visuais tem sido constante e tem-se tornado indissociável da minha prática, permeia as suas fundações e, simultaneamente, é guiada por ela. Desde o momento em que tomei consciência de que esta faceta da minha forma de estar na arte se poderia transformar num projecto autónomo, foram várias as alternativas que considerei, formas diferentes de tratar o assunto: com um âmbito maior ou menor, mais ou menos centrada em estudos de caso, quais os artistas a relevar e qual o peso a dar aos dados biográficos, até ter, por fim, chegado ao formato agora finalizado.

Durante o período em que trabalhei directamente neste projecto ele sofreu diversas interrupções, ditadas por outras solicitações, mais urgentes ou, na altura, mais apetecíveis. Houve também um tempo em que, por razões relacionadas com a minha colaboração com a Universidade do Algarve, desviei parte do material que tinha vindo a recolher para dar forma a uma tese de Doutoramento, que defendi em 2017, e que foi posteriormente editada em livro1. Assim, a finalização foi sendo adiada ao sabor de vicissitudes de diversa ordem.

1 Sanches, Rui. Janela, Espelho, Mapa… Lisboa: Documenta, 2017.

É importante frisar que este texto foi concebido do ponto de vista de um artista. Não se pretendeu fazer uma história da arte moderna ou contemporânea, nem um levantamento crítico exaustivo das várias questões levantadas pelas artes visuais ao longo do século xx. Houve, na escolha dos artistas e dos momentos relatados, uma visão assumidamente parcial. Ao longo da minha vida tenho vindo a construir uma constelação de relações afectivas com um considerável número de artistas que me precederam e que, por vezes, em momentos específicos das suas carreiras, abordaram assuntos que me são particularmente caros. Ficaram de fora muitos outros que ocupam um lugar importante nas narrativas canónicas deste período; alguns serão, para certos leitores, ausências incompreensíveis, mas a escolha obedeceu a critérios principalmente subjectivos – o facto de a minha formação ter sido feita num ambiente anglo-saxónico terá com certeza tido peso –, que foram, posteriormente, em parte compensados pela tentativa de cobrir este campo de estudo de forma mais abrangente.

Esta não é uma obra académica, e desde o início, ao escrevê-la, tive a intenção de que, se bem-sucedido, ela pudesse interessar a um público muito alargado, de estudantes, curiosos e, também, participantes do «mundo da arte» nas suas várias vertentes. Nesse sentido, tentei utilizar uma escrita simples e directa, que pudesse resultar num livro agradável de ler e evitei carregar o texto com demasiadas referências eruditas e notas de rodapé. Integrei as referências recolhidas nas diversas fontes que utilizei para a construção da obra no corpo do texto principal. Esta lacuna na citação das fontes é suprida por uma bibliografia publicada no final, organizada de acordo com os temas dos diversos capítulos, que, não pretendendo, de modo nenhum, ser exaustiva, espelha as leituras que realizei na preparação da obra.

Quero deixar aqui expresso o meu agradecimento à Fundação Carmona e Costa, à Dinorah Lucas e, em especial, a Maria da Graça Carmona e Costa, que infelizmente já não pôde ver este projecto concretizado.

A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

Lembro também a Fundação Calouste Gulbenkian, na pessoa do seu antigo presidente, Emílio Rui Vilar, cujo apoio me permitiu um período de intensa investigação, de que resultou a minha tese de doutoramento e que ajudou também a viabilizar o presente texto. Alguns amigos e colegas leram fases anteriores da obra e contribuíram com as suas sugestões para a forma final. Não é necessário nomeá-los, pois eles sabem bem quem foram e conhecem a minha gratidão. O Manuel Rosa e a equipa da Documenta, foram, como sempre, exemplares no seu apoio e profissionalismo. Finalmente não quero deixar de agradecer, como sempre, à Teresa, a minha primeira leitora.

Introdução

Na parte final do século xix o mundo ocidental sofreu uma profunda transformação. Esta mudança aconteceu de forma extremamente rápida e consubstanciou-se numa série de processos socioculturais complexos, como a instauração de uma cultura baseada no progresso científico, a industrialização da economia, a acelerada urbanização, a progressiva democratização da estrutura social e a forte secularização da sociedade. Foi o culminar de um processo que tinha tido início no século xviii, consubstanciado em verdadeiras revoluções no campo político e económico: as revoluções americana e francesa e a revolução industrial, que permitiram as grandes alterações que se foram consolidando ao longo do século xix. A passagem de uma sociedade estratificada, orgânica, com relações sociais estáveis e, aparentemente, imutáveis, em que o poder estava concentrado no soberano, rei por graça de Deus, em que a religião estava indissociavelmente ligada a toda a estrutura do Estado e, de alguma forma, a justificava, para uma nova situação em que a fonte do poder era o povo, o rei passou a ser rei da nação e os cidadãos passaram a ser considerados livres e iguais em direitos, uma sociedade contratual em que a organização era um empreendimento comum a toda a comunidade nacional, constituiu uma mudança radical no mundo oitocentista. Por outro lado, a revolução industrial, com a substituição dos processos de produção artesanais pela mecanização, a industrialização da economia, permitindo a existência

Introdução 15

Um número importante de invenções e inovações técnicas introduzidas durante o século xix e início do xx, como a fotografia, o caminho-de-ferro, o telégrafo, a imprensa em grande escala e ilustrada, os navios a vapor, o balonismo e a aviação, a introdução da hora legal, o raio-x, o fonógrafo e o cinematógrafo, levou a uma grande aceleração da vida quotidiana, a uma profunda alteração da relação entre o espaço e o tempo, e da percepção do território, permitindo a rápida deslocação das pessoas e uma mais rápida difusão da informação, a uma mudança da fronteira entre aquilo que pode ser conhecido empiricamente e os conhecimentos obtidos apenas através da tecnologia, a uma dissociação entre as várias partes do corpo e das suas manifestações, levando a uma fragmentação e parcelarização do mundo. Todas estas mudanças radicais contribuíram para destruir a noção que tinha prevalecido de uma realidade coerente, íntegra, de que era possível ter uma imagem unitária.

No campo das artes visuais, a segunda metade do século xix foi um período muito conturbado, de grande conflitualidade, que levou ao progressivo desaparecimento dos consensos que existiram durante mais de três séculos quanto aos valores centrais da tradição europeia das Belas-Artes. Todos os sistemas organizadores do mundo da arte oitocentista – o ensino, os processos de produção, a forma de exposição e divulgação, o mecanismo de validação e o mercado da arte – foram, com o aproximar do século xx, entrando numa crise cada vez mais profunda. Enquanto os artistas mais avançados da segunda metade de oitocentos queriam fazer parte do sistema académico e, apesar das suas tentativas para serem aceites, eram recusados pelos seus pares, os artistas que vão surgir no início do século xx não têm já qualquer ilusão a esse respeito e colocam-se, à partida, completamente fora do sistema académico. Toda a sua produção é feita numa postura de confronto.

16

A Luta pelo Significado na Arte do Século xx de produtos feitos rapidamente, em grandes quantidades, com uma qualidade consistente e a custos muito baixos, transformou radicalmente a maneira como as pessoas viviam e se relacionavam com o seu ambiente e comunidade.

Para além destas questões de ordem sociológica e política, teve importância central a crise dos próprios fundamentos estruturantes das principais áreas das artes visuais, nomeadamente a pintura e a escultura. A relação, que se tinha tornado «natural», entre as artes visuais e o mundo, entre a representação académica e a realidade (entendida como aquilo que não é arte e a que a arte, inevitavelmente, se refere), foi cada vez mais posta em causa. Há praticamente três séculos que o carácter mimético da representação, ainda que assumido como forma ilusória, como artefacto construído, era um dado adquirido e estruturante da cultura ocidental. As forças praticamente simultâneas e convergentes da invenção da fotografia (que veio ocupar o lugar da pintura como processo de descrição da aparência visível do mundo), da produção mecânica (permitindo a realização de objectos de grande perfeição em números praticamente ilimitados e a preços muito baixos) e da criação do realismo e do naturalismo (como posição radical contra o vazio e o artificialismo da arte académica, a favor de uma relação mais directa e, simultaneamente, mais credível com a natureza e a sociedade do seu tempo) foram determinantes para levar os artistas a reconsiderar o carácter puramente icónico das artes visuais e a pressionar no sentido de uma arte em que o ser humano se sinta representado na sua relação com o mundo.

A noção de um mundo, exterior, ordenado, como referente comum a todos os humanos, foi sendo posta em causa pela modernidade desde o final do século xvii. A ênfase na individualidade, no carácter único de cada pessoa, vai levar à conclusão de que apenas por referência à subjectividade tenha existência o mundo sensível, que é o objecto da estética, categoria filosófica que ganha assim cada vez mais destaque. A estética, depois de sistematizada e tornada um ramo da Filosofia, é um discurso do corpo. Surge da necessidade de reconhecer a importância da percepção, da sensação e da emoção, juntamente com a mais abstracta razão, no conjunto das capacidades humanas. Até ao final do século xix a modernidade tenta conciliar esta progressiva subjectivização da experiência com a exigência de critérios consensuais e, portanto, com a objectividade, com a existência de um mundo comum.

Introdução 17

Estes critérios não resistiram à crise do positivismo e ao escrutínio, à crítica, de uma cultura cada vez mais individualista, em que parecia tornar-se impossível conciliar as exigências da liberdade individual com qualquer tradição. A arte parece, a partir de então, tornar-se a expressão pura e simples de uma individualidade, produtora de estilos singulares que já não são um espelho do mundo, mas um mundo particular. Um mundo onde os outros poderão entrar, mas numa relação de pura inter-subjectividade. De facto, se a ciência, com a sua preocupação em estabelecer um conhecimento do mundo baseado em critérios de objectividade e universalidade, era um valor básico da sociedade burguesa, o individualismo e a competição eram outros.

Este subjectivismo, também baseado na noção de que a realidade não é algo que existe exterior ao observador e que se «descobre», mas que é, pelo menos em parte, construída pelo próprio observador, vai ter versões mais ou menos radicais, levando em casos extremos a situações de total incomunicabilidade. Ao longo de todo o século xx, como contraponto a este fecho sobre a sua própria subjectividade, assiste-se por parte dos artistas a uma forte vontade de estabelecer pontes com o colectivo. Estas tentativas irão tomar as mais diversas formas, já que, a partir do início do século xx, cada artista terá que repensar a sua relação com a comunidade e com a realidade, uma realidade nova, ainda não identificável, onde apenas era claramente visível a desintegração da velha ordem.

Em conversa com uma das suas musas, Pablo Picasso terá dito: «Desde Van Gogh, somos todos, em certa medida, artistas autodidactas – na realidade quase poderíamos dizer ingénuos. Os artistas já não vivem no interior de uma tradição e cada um de nós tem de criar, dentro das suas possibilidades, os seus próprios meios de expressão. Todo o artista moderno possui o direito de criar o seu próprio vocabulário de a a z.»1

A vontade de questionar todas as premissas que tinham sido dadas como adquiridas e como constitutivas do mundo da arte levou a pôr em

1 Pablo Picasso, citado em Gilot, Françoise. Life with Picasso.

18 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

causa as condições necessárias para a existência da obra de arte. Ao longo do século xx assistiu-se a uma permanente instabilidade da linha de demarcação entre a vida prosaica e o campo artístico, o que levou mesmo a pôr em causa a necessidade da existência da própria obra de arte.

Os artistas mais avançados do mundo ocidental tiveram, desde o final do século xix, a consciência aguda de que seria necessário encontrar formas novas de estabelecer uma relação produtiva com a sociedade, uma relação que, preservando a sua liberdade criativa, evitasse que a arte ficasse reduzida à irrelevância. Desde que se instalou esta situação crítica que, de diferentes formas, perdura até hoje, foi preciso que os artistas travassem uma verdadeira luta pelo significado. Essa luta tomou aspectos vários, sendo necessário passar por fases de destruição, de destruição dos anteriores processos significantes, esgotados e irrecuperáveis. Como veremos, em determinados momentos, esta tarefa passou até pela negação de qualquer tipo de significado (que foi o caso do movimento dada) ou, num extremo oposto, pela tentativa de incluir todos os significados (como aconteceu com a aventura utópica de Malevich).

Assim, iremos percorrer alguns dos momentos mais marcantes dessa luta, centrados sobre aqueles que, deste ponto de vista, foram os seus principais protagonistas, aqueles que introduziram no discurso artístico algumas das mudanças mais importantes, que contribuíram para manter a arte significativa e relevante para o seu tempo, para dar forma àquilo que conhecemos hoje como a história desse período e que continua a ressoar nas obras nossas contemporâneas.

Introdução 19

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906)

Provavelmente nunca saberemos ao certo porque é que Auguste Rodin, na única ocasião em que apresentou publicamente a sua Porta do Inferno, optou por uma versão despida de todas as figuras, reduzida a uma moldura e uma porta esvaziadas de toda a componente narrativa. A encomenda de uma porta em bronze para um futuro museu de artes decorativas, que seria construído em Paris, tinha sido ganha por Rodin em 1880, com uma proposta que previa um programa baseado no texto de A Divina Comédia de Dante. Durante os vinte anos seguintes o escultor foi trabalhando na sua porta, alternando períodos de grande intensidade com fases de afastamento, um pouco ao ritmo das vicissitudes que foi tendo a prestigiosa encomenda, que lhe garantiu, entre outras coisas, uma renda do Estado e a utilização de um dos grandes ateliês públicos reservados para este tipo de trabalhos. A Porta do Inferno foi-se tornando, com o andar do tempo, num «laboratório», onde Rodin pôde desenvolver e testar uma enorme quantidade de tipos e grupos de figuras que foram depois utilizados, inteiros ou fragmentados, em escalas pequenas ou grandes, num sem número de outras obras autónomas, ganhando novos significados pelas diversas ligações e contextos onde foram integrados. A constante indefinição quanto à sorte do futuro museu (de facto, desde 1887 que tudo levava a crer que as probabilidades de o museu vir a ser construído eram escassas) levou a um progressivo afastamento da concepção inicial da Porta e permitiu que o seu

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 21

22 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx autor a encarasse, cada vez mais, como uma obra pessoal, autónoma, onde podia exprimir a sua concepção da escultura, carregando-a de significados autobiográficos. A Porta do Inferno ficou sempre no ateliê do escultor, onde ao longo do tempo foi vista por vários visitantes: amigos, jornalistas, clientes, sendo muito referida em relatos publicados na imprensa da época. Em 1900, por ocasião da Exposição Universal de Paris, Rodin teve a possibilidade de mandar construir, na Place de l’Alma, um pavilhão, onde organizou uma exposição do seu trabalho. Aí reuniu, em condições que ele próprio pôde controlar, dezenas de esculturas, desenhos e fotografias, no que constituiu a sua primeira grande exposição individual em Paris e a maior retrospectiva jamais realizada por um escultor até então1. Foi nessa ocasião que decidiu, finalmente, mostrar publicamente a Porta, que, entretanto, ganhara um estatuto quase mítico: uma escultura de que muito se falava, mas que poucos privilegiados tinham podido ver. No entanto, foi uma escultura muito diferente da que estava no ateliê do artista que os visitantes do pavilhão puderam ver: durante a montagem, Rodin optou por não colocar sobre o fundo de gesso os elementos em relevo, a miríade de pequenas figuras que habitavam a superfície agitada da Porta, do que resultou uma escultura estranha, onde superfícies «abstractas», com graus diversos de textura, do liso ao rugoso, formando ondulações harmoniosas, preenchem a totalidade do espaço definido pelas molduras da porta. Uma vez que não chegaram até nós nenhumas declarações ou escritos do artista que justifiquem essa opção, poderemos formular infindáveis especulações sobre o que poderá ter levado Rodin a tomar esta decisão aparentemente contraditória: as intenções dos artistas são muitas vezes difíceis de discernir. A fotografia da Porta que vem reproduzida no catálogo da exposição mostra a peça completa, o que nos leva a crer que terá sido no último instante, provavelmente já durante a montagem das obras, que o escultor

1 O pintor Gustave Courbet tinha já seguido uma estratégia semelhante em 1855, quando, à margem da exposição universal, tinha mandado construir um pavilhão provisório onde expôs quarenta das suas obras.

terá mudado de ideias e optado por não mostrar as figuras. Curiosamente os relatos publicados sobre a exposição da Place de l’Alma não nos dão conta de grande surpresa perante a peculiar obra; normalmente referem a Porta como estando incompleta ou num estádio provisório (Rodin já tinha sido muitas vezes criticado na imprensa por expor obras aparentemente inacabadas), longe, portanto, da reacção ferozmente negativa perante o Balzac, uns escassos dois anos antes. Talvez uma explicação para a estranha decisão possa passar exactamente pela recepção que teve o seu Balzac, que ele considerava «o desenvolvimento lógico da minha vida de artista»2, que, para além de ter sofrido violentos ataques na imprensa, tinha também sido recusado pela própria Société des gens de lettres que o tinha encomendado. A amargura que sentiu talvez o tenha levado a pensar que o seu trabalho estava a ir num sentido diferente do mundo que via estar a ser construído à sua volta: enquanto a sua escultura passava por um processo de simplificação e depuração, em que o pormenor era sacrificado em favor das grandes massas que vibravam no espaço tocadas pela luz, o que via todos os dias quando se dirigia para o seu ateliê no número 182 da rue de l’Université e passava pelos estaleiros da futura exposição universal, era o crescimento de uma arquitectura pomposa, grandiloquente, antiquada, carregada de pormenores decorativos. Talvez esse cansaço e essa frustração tenham estado na origem da decisão de apresentar no seu pavilhão, como peça central, o Balzac e mostrar a Porta do Inferno despida de todos os seus elementos narrativos.

A forma como Rodin decidiu mostrar, pela primeira vez, a sua Porta do Inferno, inacabada e destituída de todos os elementos em alto-relevo, leva-nos a questionar qual a importância relativa que as várias partes da obra tinham para o escultor. Há muito tempo que o carácter narrativo e realista das obras vinha sendo secundarizado a favor de uma atenção

2 Butler, Ruth. Rodin et la Belle Époque. In Rodin en 1900. L’Exposition de l’Alma, Catálogo de exposição. Carta de Rodin aos subscritores do Monumento a Balzac, 4 de Junho de 1898; arquivos do Museu Rodin.

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 23

muito mais centrada nos processos envolvidos na criação de formas tridimensionais: a modelação do barro enquanto processo físico, que envolve a manipulação das massas de terra com as mãos e com as ferramentas tradicionais ou improvisadas; os resultados da execução dos moldes em gesso, cujas marcas são deixadas visíveis na superfície da obra, as zonas de ligação entre os vários tasselos, os desacertos que por vezes acontecem no acto de os juntar, todos esses acidentes passam a fazer parte da superfície da escultura, que é aquilo com que o observador se relaciona ao percepcionar a obra.

Os elementos que Rodin decidiu não incluir quando apresenta a Porta tinham vindo a ganhar autonomia, e funcionavam, com algumas alterações e, por vezes, integrados em grupos mais vastos, como obras autónomas de pleno direito. Uma das características do método de trabalho desenvolvido por Rodin ao longo dos anos para dar resposta a essa encomenda foi o tratamento em separado de cada um dos grupos de personagens. Alguns, como Paolo, Francesca e Ugolino, ainda conservaram uma ligação de identidade com personagens específicos da narrativa da Divina Comédia, outros, constituídos por dezenas de figuras baseadas nas almas penadas que Dante descreveu no século xiv, foram sendo transformados por Rodin até se distanciarem das personagens de Dante e se tornarem invenções do próprio escultor: O Pensador, As Sombras, O Adolescente Desesperado são disso exemplo.

Rodin começava por modelar e desenhar a partir de modelos vivos, que escolhia criteriosamente em função das características que pretendia imprimir à personagem, e que posicionava de acordo com a maneira como queria apresentar uma determinada cena. As figuras eram então trabalhadas em função de uma concepção do episódio ou personagem que era, simultaneamente, fruto da visão inicial e das características que o próprio processo de modelação ia conferindo ao trabalho do artista. A um primeiro momento, em que predominava uma aproximação naturalista às figuras, seguiam-se outros em que as figuras eram simplificadas, algumas características físicas eram exageradas, as superfícies eram retrabalhadas

24 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

Esta forma de trabalhar, a reutilização constante de partes de figuras, figuras e grupos de figuras que, depois de mais ou menos alterados, são integrados em novos conjuntos, muitas vezes com conteúdos narrativos completamente diferentes, dá ao processo criativo de Rodin características muito próprias. Ele cria uma espécie de «banco de imagens» constituído por corpos e partes de corpos em diversas posições e escalas, que são depois utilizados em várias combinações, numa espécie de colagem ou assemblage. Os vários elementos não parecem ter um significado a priori, mas o significado é-lhes conferido por cada um dos novos contextos em que são incluídos. Este processo é cada vez mais utilizado pelo escultor ao longo da vida, tendo a Porta, como foi dito, servido de «maternidade» para um grande número de esculturas.

O trabalho de modelação, que começa por estar associado à observação a partir do natural, acaba por, com a utilização deste processo de assemblage, se afastar da consistência realista e ganhar significados simbólicos que, pela sua própria natureza, têm um carácter mais subjectivo e menos consensual. A escultura conhecida como Eu Sou Bela consiste na montagem e adaptação de duas figuras inicialmente concebidas para a Porta: a Mulher Acocorada e o Homem em Queda. A mulher, modelada acocorada, com os membros inferiores flectidos, a cabeça e os ombros entre os joelhos e o centro de gravidade quase rente ao chão, está agora projectada no ar, suportada pelos braços e peito do seu companheiro; o homem, que foi

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 25 para conseguir o desejado efeito de claro-escuro, tudo no sentido daquilo que Rodin sentia ser a verdade expressiva que pretendia obter. Os conjuntos, já passados a gesso, eram então posicionados na estrutura da Porta. Algumas dessas figuras aparecem mais do que uma vez na Porta: As Sombras, que encimam a obra, são a mesma figura repetida três vezes e colocada de forma a apresentar diferentes aspectos ao espectador; a figura de adolescente com os braços erguidos e a cabeça deitada para trás começou por ser modelado para o grupo de Ugolino, à esquerda do qual aparece na Porta, e foi depois, mais elaborado e conjugado com uma figura feminina, utilizado no conjunto conhecido por Fugit Amor ou Amor Fugidio.

inicialmente concebido como uma figura em perda de equilíbrio, cabeça pendente para trás, coluna vertebral curvada e braços no vazio, foi transformado num ser com os pés bem firmados no solo que eleva nos braços e peito o corpo da mulher, cujo peso o tronco musculado e inclinado para trás suporta sem dificuldade. Este grupo escultórico é um excelente exemplo de como as figuras ganham novos significados em função do contexto em que são inseridas, apesar de originalmente terem sido concebidas em resposta a uma pose específica do modelo, descrevendo uma certa condição física das várias partes do corpo: esqueleto estruturado numa determinada configuração, suportado pelos músculos que, para isso, se contraem ou distendem de uma certa maneira, o que imprime determinadas características ao corpo tal como ele é visto pelo observador. Essas figuras são, depois de sofrerem algumas alterações, integradas em contextos que nada têm em comum com a sua situação inicial. Mesmo as figuras individuais são, por vezes, o somatório de vários momentos do mesmo modelo. Um exemplo dessa prática é o célebre Homem que Caminha, em que cada parte do corpo, torso, braços, pernas, está representada num momento ligeiramente diferente no tempo, num ponto diferente da acção de andar, dando a impressão ao espectador de assistir, de facto, ao movimento do modelo3. Essa ênfase na componente relacional das obras, que introduz na escultura, de forma particular, o factor tempo, estabelecendo com a duração do olhar do observador uma relação completamente distinta do que era habitual até então, quando o escultor era suposto apresentar ao espectador uma forma que se tornava imediatamente inteligível a partir de um único ponto de vista, pode ser já pressentida nalguns dos seus desenhos iniciais onde, a um primeiro momento de actividade, se sucedem outros, transformando o suporte num verdadeiro palimpsesto.

3 «De cette manière, quand le spectateur promène ses regards d’une extrémité à l’autre de mes statues, il voit se développer leur gestes» (Desta maneira, quando o espectador passeia o seu olhar de uma extremidade a outra das minhas estátuas, vê desenvolverem-se os seus gestos). Rodin, citado por Paul Gsell, 1914.

A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

A questão do sentido que a Porta do Inferno tinha para Rodin está também associada à função para que a escultura tinha inicialmente sido concebida. Como vimos, a encomenda feita ao escultor em 1880, implicava a concepção e realização de uma porta monumental para um futuro museu de artes decorativas. Foi uma encomenda que, como era habitual na altura, definia a função e o local previsto para a obra. As vicissitudes do longo processo de laboração levaram a que a Porta se fosse afastando das características inicialmente previstas: a não construção do museu levou a escultura a deixar de ter um local, a sua funcionalidade perdeu-se (tal como existe hoje, a Porta não poderia funcionar), possibilitando assim a sua evolução no sentido de se tornar uma obra autónoma, uma escultura no sentido moderno do termo, um objecto artístico sem um local de destino certo, que vale por si mesmo. Não foi esta a única ocasião durante a vida do escultor em que monumentos que lhe foram encomendados, acabaram por ter destinos muito diferentes do inicialmente previsto.

No final do século xix era esperado que as encomendas de escultura fossem executadas segundo o modelo daquilo que foi chamado a «lógica do monumento»4: obras pensadas para funcionarem como marcação de um local com características especiais, concebidas segundo um programa narrativo bem determinado, e que, no caso de monumentos em espaços urbanos, deviam obedecer a uma tipologia estabelecida e, explícita ou implicitamente, consensual. Colocada sobre um pedestal, que tinha como principal função tornar clara a separação entre o espaço «sagrado» da representação e o espaço prosaico do espectador, a escultura devia apresentar uma imagem reconhecível da figura homenageada e representá-la numa composição que fosse eminentemente pedagógica. O que significava que a forma de representar a figura, os gestos e indumentária, a utilização de atributos e de figuras secundárias, tudo devia contribuir para um conjunto harmonioso e concebido no respeito pelo decoro considerado indispensável. Todos os monumentos concebidos por Rodin se afastaram,

4 Krauss, Rosalind. Passages in Modern Sculpture. Cambridge, MA: mit Press, 1981.

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 27

de forma mais ou menos acentuada, dessas regras implícitas. O escultor considerava que um monumento podia ser simultaneamente moderno, no sentido de ser a expressão de uma concepção individual, a invenção de um Artista, e significativo, tocando um público vasto (ou pelo menos um público culto). Todas as características que eram esperadas num monumento foram sendo postas em causa e muitas vezes eliminadas por Rodin.

Em nenhum outro caso foi essa tensão levada tão longe como no Monumento a Balzac. A escultura, executada em resposta à prestigiosa encomenda feita em 1891 pela Société des gens de lettres, na altura dirigida por Émile Zola, teve uma história extremamente conturbada. Na altura, Rodin era já considerado um dos grandes escultores de França, apesar de as opiniões a seu respeito se dividirem entre um campo de fervorosos apoiantes e um outro, de igual importância ou mesmo maior, de detractores implacáveis. O artista começou o trabalho com a sua habitual meticulosidade: leu ou releu a obra de Balzac e todos os relatos biográficos, passou em revista as imagens existentes do grande escritor, procurou na região de Tours, de onde Balzac era natural, modelos que pudessem servir como ponto de partida para a sua figura. Em seguida, experimentou diversas hipóteses de representação, até chegar a uma concepção que lhe pareceu certa: o grande homem seria representado só, de pé, envolto no traje de monge com que, segundo vários relatos, se vestia quando trabalhava, solitário, pela noite dentro. O processo de execução da peça revelou-se bem mais longo do que inicialmente previsto: não só as outras encomendas que tinha na altura não lhe permitiram dedicar-se em exclusivo ao monumento, mas, sobretudo, as suas dúvidas constantes levaram ao arrastar do trabalho. A comissão da Société encarregada do acompanhamento exercia cada vez mais pressão sobre Rodin e na imprensa apareciam com frequência artigos que punham em causa a sua capacidade de dar resposta à encomenda, a bondade da decisão da Société ter pago, como entrada, uma verba avultada ao escultor e circulavam rumores de que alguns dos subscritores do monumento estavam a exigir o seu dinheiro de volta. Em 1898, sete anos depois da data da encomenda, e quando, Rodin finalmente

A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

anunciou que o gesso estava pronto e podia ser enviado para a fundição, a comissão da Société des gens de lettres decidiu que a estátua devia ser antes apresentada no Salon. Quando as portas da exposição abriram os espectadores depararam com uma imensa massa branca que dominava a alameda central do grande pavilhão. A reacção foi brutal: uma multidão juntava-se todos os dias em frente à estátua para fazer troça do estranho objecto, as reacções na imprensa foram maioritariamente contrárias à novidade do Balzac, alguns membros da Société que sempre tinham sido contra a escolha de Rodin, vista por muitos como uma imposição de Zola, aproveitaram o seu acesso aos meios de comunicação para tornarem públicas as suas opiniões negativas. Apenas os seus apoiantes mais indefectíveis expressaram opiniões favoráveis. O golpe final chegou com uma carta oficial da comissão da Société des gens de lettres em que esta se recusava a aceitar o «esboço» de Rodin onde não «reconhecia» a estátua de Balzac. Rodin ficou completamente incrédulo.

O escultor tentou responder através de entrevistas e comunicados na imprensa e os seus apoiantes fizeram uma campanha de desagravo e circulou mesmo um abaixo-assinado de apoio que reuniu as assinaturas de alguns dos principais artistas e escritores do seu tempo. Foi lançada uma subscrição pública para fundir a estátua, que seria depois colocada noutro local de Paris, que recebeu contribuições de muitos membros da comunidade artística e intelectual de França e de vários dos seus admiradores de outros países. A crispação do debate, a situação política em França na altura, que levou a misturar a discussão à volta do Balzac com a divisão entre aqueles que eram pró e contra Dreyfus5, o horror de Rodin ao con-

5 O «Caso Dreyfus» foi um dos maiores escândalos da 3.ª República francesa: a acusação de espionagem a favor da Alemanha (que veio a revelar-se forjada), e posterior condenação, feita ao oficial de origem judaica, Alfred Dreyfus, dividiu a sociedade do final do século xix em dois campos antagónicos. O escritor naturalista Émile Zola foi um dos primeiros a tomar posição pró-Dreyfus publicando uma carta aberta ao Presidente da República intitulada «J’Accuse».

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 29

flito, levaram-no a reclamar para si a propriedade do Balzac, a devolver o dinheiro aos subscritores, acompanhado por uma carta pessoal em que explicava a sua posição, e a desistir da luta.

Rodin tentou explicar que a sua concepção da representação de Balzac não era «fotográfica», que o artista tem de trabalhar não só com as mãos, mas também com o cérebro, que escolhera concentrar a atenção do espectador na cabeça e expressão de Balzac e que a estátua, através da sua pose e do seu olhar, devia fazer o espectador imaginar o meio em que o representado se move, em que vive e pensa. Mas a sua concepção tão radical do monumento dificilmente podia ser aceite e compreendida pela generalidade do público. Todas as características anteriormente inerentes a um monumento oitocentista tinham sido postas em causa: o pedestal foi reduzido à sua expressão mais simples, um paralelepípedo sem qualquer modelação e com uma altura muito pequena, aproximando a representação dos observadores; a nível iconográfico as escolhas também eram perturbantes, o corpo envolto num roupão disforme e muito pouco digno, a grande cabeça excessivamente expressiva que dominava a estátua, com os olhos reduzidos a dois buracos, a boca exageradamente pronunciada, o pescoço grosseiro e o cabelo em desalinho; a composição era de uma simplicidade radical, uma forma estranhamente fálica, profundamente assimétrica, que dominava o espaço do espectador, em que o corpo e o roupão apareciam fundidos, e as superfícies eram extremamente simplificadas. A escultura quebrava, de uma forma que foi recebida como provocatória, o consenso social que precariamente se ia mantendo em relação à ideia de monumento: não seguia as regras do decoro académico e, por outro lado, ultrapassava o naturalismo inicialmente abraçado por Rodin, e que tinha sido visto, na década de 80, como a forma avançada de evitar os rígidos ditames da École des Beaux-Arts, e que agora já não o satisfaziam. O tratamento dado à superfície, que é de facto aquilo a que os olhos do espectador têm acesso quando se confrontam com a escultura, era estranho: o acabamento liso e uniforme da escultura clássica, em que a capacidade de descrever de forma clara a natureza representada era

30 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

Com as suas massas extremamente simplificadas, a estátua de Balzac parecia um grande monólito encimado por uma cabeça leonina, grande e perturbantemente expressiva, captando a luz do sol nas superfícies inclinadas e pouco acidentadas que encaminham o olhar para a cabeça; provocava ao mesmo tempo uma sensação de irredutível presença e de uma visão misteriosa. Foi naquele momento a síntese do trabalho realizado por Rodin ao longo de mais de trinta anos e na opinião de muitos o ponto cimeiro da sua arte. Ele disse mais tarde a Camille Mauclair a propósito do Balzac: «Nada do que fiz até agora me deu tanta satisfação, nada me custou tanto, nem representa de uma forma tão profunda aquilo que eu acredito ser a lei secreta da minha arte». Mas foi também o símbolo do dilema do artista no final do século xix, dividido entre a vontade de estabelecer uma relação orgânica com a comunidade em que vivia e a necessidade de ser fiel a si próprio e à sua visão do mundo.

Rodin não era indiferente às opiniões dos seus pares. Tinha tido um começo lento e difícil na profissão. Originário de uma família relativamente modesta, não conseguira ser aceite na Escola Superior de Belas-Artes e, por isso, teve de frequentar a escola de artes decorativas, conhecida como a Petite École, onde eram formados os artesãos que depois iriam colaborar com os escultores na execução dos seus ambiciosos conjuntos, ficando encarregados das partes secundárias da composição. Esta circunstância impediu Rodin de fazer o percurso prescrito para os aspirantes a escultores: a frequência da Grande École, seguida do concurso ao Prix de Rome, que dava aos vencedores a possibilidade de terminarem a sua formação com uma estada prolongada na capital italiana, a expensas do Estado, onde

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 31 prioritária, foi substituído por massas de gesso rugoso que chamavam de forma inequívoca a atenção para a sua realidade enquanto matéria. Não parecia ser respeitada a distinção clara entre a matéria bruta e a matéria artisticamente trabalhada, em que esse trabalho se torna transparente; a presença do material e a evidência do seu processamento, das marcas das mãos do artista e das suas ferramentas, impunha-se de uma forma que parecia inacabada, grosseira, ofensiva.

podiam contactar com toda a tradição clássica e, finalmente, a entrega da obra que lhes abria as portas à academia. Rodin teve de fazer uma carreira alternativa, começando como assistente de outros mestres; foi, a pouco e pouco, ganhando a confiança necessária para concorrer ao Salon de Paris, o local onde se construíam as reputações. Estas dificuldades iniciais, que exigiram tanta perseverança e sacrifício, marcaram para sempre a sua personalidade: por um lado, ansiava pela aceitação dos seus pares e pelo reconhecimento público; por outro, era de uma enorme fidelidade àquilo que considerava ser a autêntica expressão da sua individualidade.

A estátua manteve-se propriedade de Rodin, que recusou ofertas de compra de alguns dos seus coleccionadores, e voltou a ser exposta, como vimos, em 1900 no pavilhão da Place d’Alma. A primeira fundição em bronze só foi realizada em 1931 e o exemplar que, finalmente, encontrou o seu lugar nas ruas de Paris, no cruzamento dos Boulevards Raspail e Montparnasse, foi executado em 1939. A condição de monumento na escultura ocidental entrou numa crise de que não voltaria a sair.

O caso Balzac foi para Rodin uma experiência extremamente dura e apesar de ter tido o apoio de muitas das pessoas cuja opinião prezava e de se ter gerado à sua volta um movimento de solidariedade com repercussões que ultrapassaram em muito as fronteiras francesas, a sua sempre instável autoconfiança foi novamente abalada. Procurou encontrar o equilíbrio no ateliê, nomeadamente na sua Porta e noutros projectos onde podia prosseguir as suas experiências sem a exposição pública que as grandes encomendas acarretavam. Foi também uma declaração de independência: a partir de então, iria criar as suas próprias mostras e evitar as grandes exposições oficiais, onde a escultura era normalmente mostrada em espaços apertados e mal iluminados, quando na sua opinião «uma escultura deve ter à sua volta uma atmosfera»6.

6 Butler, Ruth. Rodin et la Belle Époque. In Rodin en 1900. L’Exposition de l’Alma, Catálogo de exposição, p. 39.

A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

Auguste Rodin, Monumento a Balzac, 1892-1897

Uma série de exposições internacionais, promovidas pela dinâmica Judith Cladel e, finalmente, a grande exposição de 1900, ajudou a consolidar a sua reputação no estrangeiro e a sua posição ímpar em França.

O ambiente em Paris alterou-se o suficiente nos dois anos que se seguiram a 1898, para o pavilhão da Place d’Alma ter sido geralmente bem recebido, apesar de ter como peça central o mesmo Balzac, e de Rodin ter feito uma montagem sem concessões. No seu pequeno «museu privado», o escultor apresentou «ao mundo inteiro» que visitou Paris para a exposição universal uma visão da sua obra que era aquela que ele, no final do século, pretendia dar a conhecer.

Apenas seis anos passados sobre a exposição de 1900, morreu o pintor Paul Cézanne. Cézanne era uma personalidade muito diferente de Rodin: originário do Sul de França, nascido e criado numa família da burguesia local, teve acesso a uma educação esmerada, mas foi forçado a enfrentar a resistência paterna para se poder dedicar ao estudo da arte e poder abandonar a frequência da faculdade de Direito, o caminho que o seu estatuto de filho de banqueiro parecia indicar como o mais acertado para dar continuidade aos negócios da família. Inteligente e culto, o jovem Paul tinha, no entanto, um feitio particular, muitas vezes ensimesmado e pouco comunicativo, não se sentia à vontade em reuniões mundanas, podia ser irascível e reagir de forma violenta a pequenas contrariedades, sentindo-se por vezes perseguido por adversários, reais ou imaginários. Apesar dos conflitos com o pai, acabou por poder contar com o seu, mais ou menos constante, apoio financeiro, o que lhe permitiu dedicar-se de forma constante ao seu trabalho, dividindo o tempo entre a sua Aix-en-Provence natal, Paris e algumas regiões do Norte de França. Ao longo dos anos foi ficando progressivamente mais isolado, preferindo a solidão que lhe permitia centrar-se na pintura, sem interrupções, evitando a vida social associada ao meio artístico parisiense. Durante um largo período ficou quase esquecido, sendo apenas referido por uma meia dúzia de outros artistas, uns porque o tinham conhecido em novo e nunca tinham deixado de o admirar, outros, muito mais jovens, que ouviam falar dele, um artista com

A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

quem quase ninguém se cruzava, cujo trabalho poucas pessoas tinham visto, mas que estava envolto numa aura quase mítica.

Em 1895, o marchand Ambroise Vollard, que se tinha estabelecido há pouco tempo com uma galeria na rue Laffitte, organizou uma exposição individual do trabalho de Cézanne; Vollard frequentara a loja de materiais de belas-artes de Tanguy, conhecido como Père Tanguy, que tinha como prática aceitar trocar, com os pintores aflitos, tintas e telas por pequenos quadros, e era um dos poucos que aceitava o trabalho de Cézanne. Vollard, que inicialmente foi aconselhado por artistas como Degas e Pissarro, entrou em contacto com o filho do pintor de Aix, também chamado Paul, e conseguiu juntar umas dezenas de obras de vários períodos para fazer uma exposição. Esse acontecimento marcou o início do lento reconhecimento que a sua obra foi tendo nesses anos finais do século xix.

Quase todos os pintores a quem Cézanne tinha estado ligado nos seus primeiros anos em Paris, sobretudo aqueles que integraram as exposições que ficaram conhecidas como dos impressionistas, colegas como Renoir, Degas, Monet e Pissarro, tinham já reputações firmemente estabelecidas e gozavam, ao fim de muitos anos de incompreensão e dificuldades financeiras, dos frutos de um mercado sólido, sobretudo desde a entrada em cena dos coleccionadores americanos. O caso de Cézanne foi bem diferente: a sua pintura sempre provocou reacções muito radicais e muito extremadas. Teve sempre um pequeno grupo de admiradores, sobretudo pintores e um ou outro escritor, e um número muito maior de detractores, que consideravam a sua pintura incompetente, ofensiva ou inacabada, entre os quais se contavam até alguns pintores avançados7. Mesmo antes, mas sobretudo a partir da exposição na galeria de Vollard, vários artistas de uma nova geração começaram a procurar as suas obras e a tentar entrar em contacto com o misterioso pintor. Cézanne, isolado na obsessiva busca pela realização da

7 Conta-se que uma das razões que levou Édouard Manet a não participar em nenhuma das exposições impressionistas terá sido a presença de obras de Cézanne, que Manet acusava de pintar «com uma colher de pedreiro».

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 35

36 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx pintura tal como ele a entendia, era, no entanto, sensível às manifestações de interesse pelo seu trabalho, e mais ainda quando estas vieram de jovens artistas e intelectuais desejosos de o conhecer, de perceber as suas ideias e cheios de entusiasmo pela sua pintura. Émile Bernard, Maurice Denis, Joachim Gasquet e Francis Jourdain, foram alguns dos que foram bater à porta do pintor e com ele estabeleceram uma relação de proximidade, tendo deixado testemunhos dessas conversas, assim como correspondência, que permitiu fixar para a posteridade as conclusões a que Cézanne foi chegando ao longo da sua vida sobre o papel da pintura. No entanto, é notório que Cézanne confundia os seus admiradores: sentiam uma forte atracção pelo seu trabalho, tinham a noção da sua importância, mas não conseguiam dar uma razão clara para a sua admiração, e a sua obra foi sendo reclamada por artistas com posições muito diferentes, que o interpretaram de forma que ele aparecesse como o seu predecessor, criando assim a figura de autoridade que a posição deles requeria. A reputação de Cézanne cresceu de forma exponencial durante os seus últimos anos de vida e nos anos a seguir à sua morte. O «cezannismo» tornou-se um culto.

Quando o jovem Paul Cézanne partiu para Paris, muito instigado pelo seu amigo de infância, Émile Zola, que já estava estabelecido na capital de França, ia cheio de ilusões sobre o mundo da arte e do efeito que a sua pintura aí poderia ter. A sua personalidade algo excêntrica e a dificuldade que tinha em expressar-se em público não ajudaram à integração nas tertúlias e grupos que habitualmente se reuniam em cafés, quando a falta de luz solar já não permitia a continuação do trabalho. Apesar disso, alguns artistas mais velhos reconheceram nas suas telas um temperamento e uma ambição que prometiam voos mais altos. Nessa altura a sua pintura era feita de forma muito directa, quase ingénua, sem qualquer preocupação com a verosimilhança da forma ou com regras académicas de composição. Interessava-lhe a expressão crua dos sentimentos, a força das suas sensações. Tinha uma grande vontade de explorar diferentes técnicas e maneiras de aplicar a tinta, o que o levou a privilegiar a utilização da espátula, que impedia aquilo que na altura considerava um excesso de perfeição no aca-

Os artistas que participaram ficaram, como é bem-sabido, conhecidos por impressionistas, devido ao comentário satírico do crítico Louis Leroy ao quadro de Claude Monet intitulado Impression, soleil levant. Cézanne participou apenas em mais uma das exposições dos impressionistas, mas durante algum tempo foi para o campo, juntamente com outros colegas, pintar paisagens nas zonas que se tornaram o tema habitual de muitas pinturas impressionistas da década de 1870. Camille Pissarro, nove anos mais velho, já bastante experiente e com ideias bem articuladas

8 Outros pintores já tinham utilizado a espátula, que era um instrumento pensado para misturar as cores ou para retirar camadas de tinta, raspando a tela, como ferramenta para aplicar a tinta de óleo na superfície da tela, nomeadamente Courbet, que o fez com grande sucesso, mas normalmente esse processo era apenas usado em zonas limitadas da pintura, para obter determinados efeitos. Nalgumas obras, Cézanne utilizava a espátula para realizar a totalidade da pintura, aplicando a tinta em grandes massas pouco definidas.

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 37 bamento das formas8, e dava à pintura um carácter imediato e espontâneo. O bom acolhimento que teve junto de alguns pintores, especialmente Camille Pissarro, homem muito respeitado, a quem todos reconheciam uma imensa generosidade e uma grande capacidade para detectar os aspectos positivos no trabalho dos colegas, levou-o a juntar-se frequentemente ao grupo que se reunia no Café Guerbois, onde pontificava Édouard Manet, visto como o chefe de fila dos artistas que contestavam as regras de selecção para os Salons oficiais, e que peticionavam o imperador para que, ao menos, se realizasse novamente um salão paralelo, como o que tinha ficado conhecido como o Salon des refusés. Assim, Cézanne integrou também a recém-criada Société anonyme coopérative des artistes peintres, sculpteurs, graveurs, que tinha como principal fim a realização de exposições onde pudessem apresentar as suas obras os artistas que não aceitavam as regras impostas pela academia. A primeira exposição reuniu trabalhos de trinta artistas e teve lugar em 1874, no estúdio do fotógrafo Nadar. A mostra foi geralmente mal recebida e as obras de Cézanne foram das que mais comentários negativos suscitaram, tendo sido escolhidas em algumas recensões publicadas na imprensa como das mais incompreensíveis e desagradáveis.

Paul Cézanne, Maçãs, 1878-1879

As oscilações de humor e as crises de autoconfiança que o iriam acompanhar para o resto da vida, levaram-no a pôr em causa a vantagem de se manter em Paris. A dificuldade que sentiu em impor a sua pintura e a de ter uma receptividade que achava que merecia, a diferença entre as suas elevadas expectativas quando partiu para a capital e a realidade com que aí se deparou, fizeram-no deixar a cidade e regressar à sua terra, e à paisagem que conhecia tão bem. Durante o resto da sua vida alternou estadas mais ou menos longas em Aix-en-Provence, com passagens por Paris e outras localizações no Norte de França, mas passou a evitar o convívio intenso e regular com outros participantes da comunidade artística. Tornou-se um solitário centrado no seu trabalho, cruzando-se esporadicamente com outros artistas ou conhecidos do meio, mas com quem nunca mantinha o contacto por muito tempo. Aparecia, muitas vezes sem anúncio prévio, e assim como chegava partia, sem aviso e sem dar notícias.

A sua dedicação à pintura tornou-se mais forte do que nunca. Alternava paisagens tiradas do natural, usando como motivos as vistas da região que tão bem conhecia, retratos de pessoas de família ou conhecidos, naturezas mortas, pintadas no ateliê, mas com o modelo à frente, e composições com figuras imaginadas, normalmente grupos de banhistas, tema a que voltou de tempos a tempos, e que o obsecou até ao último ano de vida. As suas experiências, agora fruto do trabalho a sós, levaram-no a pôr em causa a «fé» dos impressionistas de que uma imagem correcta seria capaz de transferir alguma virtude existente no assunto representado, directamente para a arte. Tornou-se claro que não bastava reproduzir aquilo que os olhos viam, mas que era necessário, porque inevitável, uma interpretação. O olho e o cérebro tinham que funcionar em conjunto. A pintura devia ser um equivalente paralelo e não uma imitação servil do motivo. Era necessário um olho atento para ver a natureza e uma mente culta para encontrar

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 39 e seguras sobre o que pretendia da pintura, foi o seu principal companheiro nessas jornadas, e funcionou como um verdadeiro mentor que ajudou o jovem Cézanne a evoluir e a descobrir a importância da atenção ao motivo, à realidade exterior.

uma lógica para a organização das sensações. A procura desse equilíbrio –entre a atenção ao motivo, e cada vez se torna mais claro para Cézanne que o motivo está na tela assim como no mundo exterior, e a elaboração de um sistema, que permita organizar as sensações, criando uma obra autónoma com a sua própria realidade, paralela à realidade da natureza – passa a ser a sua missão como pintor.

O sistema que Cézanne criou para si mesmo sofreu variações ao longo dos anos e nunca deixou de evoluir até ao fim da sua vida, sempre impregnado pela sua permanente dúvida, pela sua insegurança face às conclusões a que ia chegando e testando na prática. Tentou dar à «impressão» da realidade a solidez e a perenidade que sentia estarem subjacentes na natureza, ao carácter efémero da relação momentânea com o motivo. A estrutura da natureza seria uma «arquitectura» baseada em sólidos geométricos simples: esferas, cilindros e cones. Nicolas Poussin, a figura cimeira do classicismo francês, é o modelo que Cézanne encontra para iluminar a sua relação com a natureza: tratava-se de refazer o impressionismo a partir da lição de Poussin9. Estas, como outras declarações do pintor, têm sido interpretadas de maneiras contrastantes e, provavelmente, o próprio Cézanne não tinha muito claro na sua mente qual das versões seria a eleita ou se se tratava de uma síntese das duas. Se a sua intenção era impor um rigor «à Poussin» na desordem do impressionismo, ou se o caminho era reanimar um classicismo moribundo e formulaico através da sua visão pessoal da natureza, formada pela liberdade expressiva do impressionismo.

Com o tempo, a cor e a pincelada vão ganhando uma cada vez maior importância no seu sistema. As pinceladas mantêm a autonomia, correspondendo cada uma delas a um olhar pousado sobre o motivo. A cor passou a ser aplicada segundo acordes que introduzem uma sensação de tridimensionalidade, sem a utilização de tonalidade ou claro-escuro. A cor e a luminosidade desenvolvem-se na superfície da pintura, como se a cor fosse

9 Nicolas Poussin (1594-1665), pintor francês, então considerado o exemplo maior do classicismo do século xvii.

40 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

deixada livre para para se organizar de forma autónoma. O resultado torna o observador ainda mais consciente do carácter construído da pintura. Olhando para a superfície da tela, o observador consegue quase reconstituir os vários momentos de construção da pintura no vai-e-vem do seu olhar e dos seus gestos, entre o motivo e a superfície da obra. Os aspectos materiais da pintura tonaram-se cada vez mais cruciais – a realidade do motivo não podia ser transferida para a pintura por imitação, só podia ser tornado real através dos meios reais da pintura: sentido da cor e a lógica da organização segundo uma lei de harmonia das pinceladas10.

No entanto, a questão do equilíbrio entre o sistema criado e a observação da natureza era crucial para Cézanne. Ele não aceitava que houvesse um abandono do respeito pela natureza, e o predomínio do lado teórico, conceptual, da pintura, levava, na sua opinião a uma excessiva artificialidade e «abstracção». Na fase final da sua vida não se cansava de maldizer Gauguin, de quem já tinha sido próximo, por este abandonar as nuances e aplicar grandes manchas de cor homogénea, encostadas umas às outras, produzindo um efeito de planos isolados dentro dos seus limites, sem passagem uns para os outros, tornando a pintura demasiado artificial e afastada da natureza.

Essa foi a sua luta até ao fim: nunca completamente satisfeito com os resultados, apresentava-se sempre aos seus interlocutores como um estudante de Pintura, alguém que estava, lentamente, a começar a encontrar um caminho. Um caminho que abriu portas, e que foi reclamado como exemplo, por muitos dos principais inovadores da arte do início do século xx. Tanto Picasso como Matisse consideravam que Cézanne tinha sido «o pai de todos nós».

10 Maurice Denis, um dos jovens pintores que contactou directamente com Cézanne e com as suas ideias, virá mais tarde a fazer a sua célebre declaração: «uma pintura, antes de ser uma paisagem, um nu ou um cavalo, é um conjunto de formas e cores organizadas de uma determinada maneira sobre uma superfície».

Auguste Rodin (1840-1917) e Paul Cézanne (1839-1906) 41

Henri Matisse (1869-1954) e Pablo Picasso (1881-1973)

Em algum momento durante o ano de 1907, Henri Matisse e Pablo Picasso trocaram trabalhos entre si: Matisse escolheu uma pequena natureza-morta representando uma taça e um limão e Picasso decidiu-se por um retrato de Marguerite Matisse, filha do pintor. Os dois artistas tinham sido apresentados pelos irmãos Stein1 no ano anterior. Matisse, doze anos mais velho que o jovem Picasso, então com apenas vinte e cinco anos, era já considerado o chefe de fila dos pintores mais avançados de Paris. Com a sua barba bem aparada, óculos com aros metálicos dourados e fato de bom corte, a imagem de Matisse correspondia perfeitamente ao nome pelo qual era designado, de forma mais ou menos irónica, pelos seus pares: o professor. Depois de um começo lento e difícil, em que teve de vencer a reprovação da família, a incompreensão do seu meio de origem e a sua própria insegurança, Matisse foi consolidando uma posição cada vez mais central entre os artistas que desafiavam as regras académicas no início do século. Depois de uma formação mais ou menos tradicional na École des Beaux-Arts, na classe de Gustave Moreau, Matisse sofreu a influência dos principais pintores do pós-impressionismo: Georges Seurat, Vincent Van

1 Leo, Michael e Gertrude Stein, americanos de origem judaica, radicados na Europa, que foram dos primeiros defensores e coleccionadores de Matisse e Picasso. Sarah Stein, a mulher de Michael Stein, foi discípula de Matisse, e este prezava muito a sua opinião.

Henri Matisse (1869-1954) e Pablo Picasso (1881-1973) 43

Gogh, Paul Gauguin e Paul Cézanne, e do escultor mais importante da transição do século xix para o xx: Auguste Rodin.

A lição de Seurat, que pretendeu organizar o impressionismo de acordo com princípios científicos, no que diz respeito ao tratamento da cor e da luz, e dar-lhe, através do desenho e da composição, a solidez e a perenidade do classicismo, foi divulgada pela publicação em fascículos da obra de Paul Signac, De Eugène Delacroix ao Neo-impressionismo, no ano de 1898 pela Revue Blanche e por diversas exposições importantes do trabalho do artista prematuramente desaparecido. Durante algum tempo Matisse pintou de acordo com os princípios delineados por Paul Signac, que o considerava um seguidor do seu movimento, tendo-lhe mesmo adquirido em 1905 um importante trabalho: Luxe, calme et volupté. Durante esse período inicial, Matisse, originário do Norte de França, começa, como muitos dos seus colegas, a frequentar as zonas costeiras do Sul onde descobre a luz do Mediterrâneo e tem uma verdadeira revelação com a intensidade da cor nessas regiões.

A sua vontade de se afastar da «tirania» do naturalismo foi sendo alimentada pelo conhecimento, que nessa altura se foi tornando possível, das obras de Van Gogh, onde o pintor holandês usava a cor e a pincelada de forma expressiva, não pretendendo descrever a aparência da realidade, mas tentando encontrar um equivalente para as emoções que essa mesma realidade despertava em si, mais centrado numa verdade interior do que na representação da beleza do mundo exterior. Van Gogh que tinha morrido em 1890, um ano antes de Seurat, praticamente ignorado no meio parisiense, começava então a ter visibilidade. As suas pinturas tinham começado a encontrar procura no mercado da arte; era possível vê-las em algumas das galerias frequentadas por Matisse e tinham sido alvo de mostras nos Salons. Também o trabalho de Paul Gauguin, que morrera em 1903, se tinha tornado muito mais visível em Paris e começava a ter uma acentuada procura internacional. O pintor, que tinha passado os últimos anos da sua vida num exílio voluntário no Taiti, procurara encontrar junto de culturas

A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

O artista cuja reputação sofreu um maior volte-face nesses primeiros anos do século foi Paul Cézanne. O pintor, que tinha estado inicialmente ligado aos impressionistas, fixara-se no Sul de França, na Provença de onde era originário, e tinha, num quase total isolamento, produzido uma obra que estava a surpreender os jovens artistas. A sua pintura, construída lentamente, numa tentativa de registar ao longo de todo o processo as suas sensações frente ao motivo, enquanto manipulava os seus materiais de representação, foi vista por muitos como uma forma de abstracção material, muito física e intuitiva. Os quadros eram um registo das suas tentativas, muitas vezes frustradas, de encontrar a linha certa, a cor justa, para representar o pedaço de natureza que tinha perante si. Mas era também a relação com as características de alguém que tinha feito toda a sua formação na grande «escola» que eram os museus, que tinha o olhar treinado pelo convívio próximo com a pintura dos mestres da tradição.

Depois de algumas mostras de trabalhos de Cézanne nos primeiros anos do século, a morte do pintor de Aix-en-Provence, em 1906, espoletou a realização de uma grande exposição retrospectiva no ano seguinte que

Henri Matisse (1869-1954) e Pablo Picasso (1881-1973) 45 «primitivas» a proximidade com os valores mais primordiais que pudessem alimentar o seu espírito e funcionar como catalisador para a sua concepção da pintura. Na esteira dos simbolistas, Gauguin considerava que o pintor devia abstrair a partir da natureza, deixando a mente liberta perante ela, numa espécie de sonho acordado. O desenho ganhava vida própria transformando-se em arabesco, estruturando a composição em zonas autónomas que eram, depois, ocupadas pela cor, quente e luxuriante. Este interesse pelas etnias «primitivas» e pela sua cultura material, de que o caso Gauguin foi um dos exemplos maiores, levou muitos artistas no início do século xx a olharem atentamente para os objectos que tinham sido trazidos para o Ocidente por viajantes, exploradores e etnólogos, o que, como veremos, irá ter efeitos muito importantes na arte desse período. A produção de Gauguin no campo da escultura, até então só conhecida de poucas pessoas próximas do artista, começou também a ter mais circulação, levando a um renovado interesse no talhe directo e na escultura em cerâmica.

Epílogo

O ano de 1989 ficou marcado pela queda do muro de Berlim, momento simbólico do desmoronar do Bloco de Leste e do início do fim da União Soviética. Estes acontecimentos de enorme importância geopolítica levaram ao fim da chamada Guerra Fria e permitiram aos eua e aos seus aliados reclamar a vitória nesse longo conflito que tinha tido início no período logo a seguir ao final da Segunda Guerra Mundial. No mesmo ano, em Paris, teve lugar um acontecimento que, apesar de uma importância não comparável em termos globais, marcou o começo de uma profunda mudança no mundo da arte: a exposição «Les Magiciens de la Terre», comissariada por Jean-Hubert Martin, situada no Centre Georges Pompidou e na Grande Halle de la Villette. Nesta mostra foram apresentados trabalhos produzidos por artistas contemporâneos ocidentais, cerca de 50% dos números de catálogo, e obras produzidas por criadores oriundos de diversos contextos, estando representados artistas de África, das Américas, da Ásia e da Oceânia. Apesar de contestada em diversos sectores de opinião, esta exposição tentou contrariar a perspectiva etnocêntrica com que eram encaradas as exposições de arte contemporânea, apresentando obras de autores originários de diversas culturas humanas, todos vivos e activos à data da exposição, e todos representados a título individual, identificados pelo seu próprio nome e não como «representantes» de uma determinada área geográfica com carácter genérico, ou de um qualquer tipo de actividade as-

Epílogo 325

sociada a determinada característica etnográfica. Com todas as suas limitações, «Les Magiciens de la Terre» foi um virar de página: o «mundo da arte contemporânea» alargou-se de forma nunca antes vista e, à semelhança do que se passou em muitos outros sectores de actividade, entrou no que habitualmente se chama de globalização. A cidade de Nova Iorque, que tinha sido considerada, desde o pós-guerra, como o centro principal de criação e difusão da arte contemporânea, perdeu parte do seu protagonismo, com a afirmação de vários outros pólos de variada dimensão. Não só na Europa, mas também noutros continentes, surgiram comunidades extremamente activas onde puderam desenvolver-se obras de criadores muito diferenciados, que, apesar de ligados entre si na rede global que passou a dar forma ao «mundo da arte», não dependiam já, ou pelo menos não de forma tão óbvia, dos modelos apresentados pelos artistas ocidentais.

Para além desta mudança qualitativa, e quase num movimento em sentido oposto, o «mundo da arte» sofreu também os efeitos de uma grande concentração a nível económico, protagonizada por um número relativamente reduzido de intervenientes com grande capacidade financeira, que, para além de constituírem importantes colecções de arte, chamaram a si a propriedade de muitas das empresas que operavam neste sector, nomeadamente galerias, leiloeiras e feiras de arte, o que teve como efeito o controlo parcial das agendas dos museus e dos meios de comunicação especializados. Esta situação conduziu a uma valorização cada vez maior da componente empresarial e, por consequência, da procura do lucro como fim último, das várias estruturas deste meio. A progressiva industrialização, em que o «mundo da arte» se aproximou, por um lado, da indústria do entretenimento e, por outro, do comércio de luxo teve importantes consequências na caracterização desta actividade. O mercado da arte ficou, em larga medida, dependente da liderança de um pequeno número de «megagalerias», multinacionais, que representam o trabalho de «megaartistas», que é adquirido por «megacoleccionadores», que, por sua vez, são patronos e têm ligações com as administrações dos principais museus. Este modelo de negócio é reproduzido nos vários estratos do mercado, em que

326 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

as feiras de arte adquiriram uma importância cada vez maior e se tornaram a forma privilegiada de aceder à produção artística actual, moldando o tipo de produtos que se adequam a estas formas de exposição.

A rápida informatização e digitalização da sociedade, a partir do final do século passado, teve também profundas repercussões no «mundo da arte». A maneira como a arte é produzida, distribuída, conhecida e usufruída tem vindo a mudar a um ritmo bastante rápido, situação que se veio a intensificar com o aparecimento e a rapidíssima difusão dos telefones inteligentes e das redes sociais. A arte digital e novas formas de garantia da propriedade da mesma, como os nft, vieram contribuir para mudanças de que ainda não é possível prever as consequências.

Nos últimos anos, o mundo da «arte contemporânea» tem centrado a sua atenção em temáticas e questões, de carácter sociológico, identitárias e políticas, que vinham há algum tempo ganhando protagonismo nos ambientes universitários, sobretudo anglo-saxónicos, e que nos últimos anos começaram a ter uma presença significativa na produção artística actual. A estes desenvolvimentos não foi certamente estranho o facto de a figura do curador se ter tornado tão ubíqua no panorama actual. Estes participantes do «mundo da arte», que, em certa medida, tomaram a posição de poder anteriormente ocupada pelos críticos de arte e pelos conservadores de museus, são muitas vezes oriundos dos departamentos de Ciências Sociais das universidades, onde estes assuntos foram ganhando centralidade, enquanto os «afastados» críticos e conservadores tinham, por norma, uma formação nas áreas das Humanidades (quase sempre a História da Arte ou a Literatura).

Com todas estas alterações, tão profundas e marcantes, o «mundo da arte» não pode já ser encarado da mesma forma, o que leva a que a narrativa que temos vindo a propor não possa ser continuada nos mesmos moldes e deva terminar neste ponto.

Epílogo 327

Bibliografia

Geral

Arnason, H.H. History of Modern Art. Painting, Sculpture, Architecture, Photography.

New York: Harry N. Abrams, 1986

Barthes, Roland. Image Music Text. London: Fontana Press, 1977

Baudrillard, Jean. L’Effet Beaubourg: implosion et dissuasion. Paris: Éditions Galilée, 1983

Belting, Hans. The Invisible Masterpiece. London: Reaktion Books, 2001

Cotton, Charlotte. The Photograph as Contemporary Art. London: Thames & Hudson, 2020

Dickerman, Leah (Ed.). Inventing Abstraction 1910-1925. New York: The Museum of Modern Art, 2012

Foster, Al et al. Art Since 1900: Modernism, Antimodernism, Postmodernism. London: Thames & Hudson, 2004

Golding, John. Paths to the Absolute. London: Thames & Hudson, 2000

Greenberg, Clement. Art and Culture: Critical Essays. Boston: Beacon Press, 1961

Groys, Boris. In the Flow. London e New York: Verso, 2018

Guggenheim, Peggy. Out of this Century, Confessions of an Art Addict. New York: Universe Books, 1979

Harrison, Charles e Wood, Paul. Art in Theory 1900-1990. Oxford: Blackwell, 1992

Hobsbawm, Eric. The Age of Extremes: The Short Twentieth Century 1914-1991. London: Abacus, 1995

Jimenez, Marc. A Querela da Arte Contemporânea. Lisboa: Orfeu Negro, 2021

Lippard, Lucy. Six Years: The Dematerialization of the Art Object from 1966 to 1972. Berkeley: University of California Press, 1997

Bibliografia 329

Lyotard, Jean-François. La condition postmoderne: rapport sur le savoir. Paris: Éditions du Midi, 1979

O’Doerty, Brian. Inside the White Cube: The Ideology of the Gallery Space. Berkeley: University of California Press, 1999

Paz, Octavio. Alternating Current. London: Wildwood House Ltd, 1974

Potts, Alex. The Sculptural Imagination: Figurative, Modernist, Minimalist . New Haven e London: Yale University Press, 2000

Sardo, Delfim. O Exercício Experimental da Liberdade. Lisboa: Orfeu Negro, 2017

Steinberg, Leo. Other Criteria: Confrontations with Twentieth-Century Art. London, Oxford e New York: Oxford University Press, 1972

Stiles, Kristine e Selz, Peter (Eds.). Theories and Documents of Contemporary Art: A Sourcebook of Artists’ Writings. Berkeley, Los Angeles e London: University of California Press, 1996

Sylvester, David. Interviews with American Artists. London: Chatto & Windus, 2001

Varnedoe, Kirk. Pictures of Nothing: Abstract Art since Pollock. Princeton: Princeton University Press, 2003

1

Butler, Ruth. Rodin: The Shape of Genius. New Haven e London: Yale University Press, 1993

Cachin, Françoise e Rishel, Joseph J. (Eds.). Cézanne. London: Tate Publishing, 1996

Chevillot, Catherine e Le Normand-Romain, Antoinette (Eds.). Rodin: le livre du centenaire. Paris: Réunions des musées nationaux, 2017

Doran, Michael (Ed.). Conversations with Cézanne. Berkeley, Los Angeles, London: University of California Press, 2001

Krauss, Rosalind. Passages in Modern Sculpture. Cambridge, MA: MIT Press, 1981

Le Normand-Romain, Antoinette (Ed.). Rodin en 1900. L’Exposition de l’Alma. Paris: Reúnion des musées nationaux, 2001

2

Barr, Alfred H. Matisse, His Art and His Public. New York: The Museum of Modern Art, 196I

Gilot, Françoise. Life with Picasso. London: Virago Press, 1990

Matisse, Henri. Écrits et propos sur l’art. Paris: Hermann Arts, 2009

Richardson, John. A Life of Picasso: The Early Years 1881-1906. New York: Random House, 1991

330 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

Richardson, John. A Life of Picasso: The Painter of Modern Life 1907-1917. New York: Random House, 1996

Rilke, Rainer Maria. Letters on Cézanne. London: Jonathan Cape, 1988

Rubin, William (Ed.). Pablo Picasso: A Retrospective. New York: The Museum of Modern Art, 1980

Spurling, Hilary. The Unknown Matisse. A Life of Henri Matisse, Volume One: 1869-1908. London: Hamish Hamilton, 1998

Spurling, Hilary. Matisse the Master. A Life of Henri Matisse, Volume Two: The Conquest of Colour 1909-1954. London: Hamish Hamilton, 2005

3

Camfield, William A. Marcel Duchamp Fountain. Houston: Houston Fine Art Press, 1989

D’Harnoncourt, Anne e McShine, Kynaston (Eds.). Marchel Duchamp. New York: The Museum of Modern Art, 1973

Giménez, Carmen e Gale, Matthew (Eds.). Constantin Brancusi: The Essence of Things. London: Tate Publishing, 2004

Tabart, Marielle (Ed.). L’Atelier Brancusi. Paris: Les Éditions du Centre Pompidou, 1997

Tabart, Marielle (Ed.). L’Oiseau dans l’espace. Paris: Les Éditions du Centre Pompidou, 2001

Tomkins, Calvin. Duchamp: A Biography. New York: Henry Holt and Company, 1996

4

Bois, Yve-Alain. Painting as Model. Cambridge, Mass.: The mit Press, 1990

Friedel, Helmut. Vasily Kandinsky. London: Prestel, 2016

Kandinsky, Wassily. Do Espiritual na Arte. Lisboa: D. Quixote, 2010

Riley, Bridget (Ed.). Mondrian: Nature to Abstraction. London: Tate Publishing, 1997

Zandor Rudenstime, Angelica (Ed.). Piet Mondrian 1872-1944. Boston, New York, Toronto e London: Bulfinch Press Book, 1994

5

Borràs, María Luisa (Ed.). Jean Arp: Invenció de Formes. Barcelona: Fundació Joan Miró, 2001

Dickerman, Leah (Ed.). Dada. Washington: National Gallery of Art, 2006

Bibliografia 331

Kauffman, Bettina e Hoch, Medea. Sophie Taeuber-Arp. London: Tate Publishing, 2021

Thrall Soby, James (Ed.). Arp. New York: The Museum of Modern Art, 1980

Umlaud, Anne (Ed.). Sophie Taeuber-Arp: Living Abstraction. New York: The Museum of Modern Art, 2021

6

Fundación Juan March. Malevich. Colección del Museo Estatal Ruso San Petersburgo. Madrid: Fundación Juan March, 1993

Lodder, Christina. Russian Constructivism. New Haven e London: Yale University Press, 1983

Milner, John. Tatlin and the Russian Avant-Garde. New Haven e London: Yale University Press, 1984

Museum Tinguely Basel (Ed.). Tatlin, New Art for a New World. Ostfilderm: Hatje Cantz Verlag, 2012

Rowell, Margit e Zunder Rudenstine, Angelica (Eds.). Art of the Avant-Garde in Russia: Selections from the George Costakis Collection. New York: The Solomon R. Guggenheim Museum, 1981

7

Ades, Dawn e Baker, Simon (Eds.). Undercover Surrealism: Georges Bataille and Documents. London: Hayward Gallery Publishing, 2006

Bozo, Dominique (Ed.). André Breton: La beauté convulsive. Paris: Éditions du Centre Pompidou, 1991

Breton, André. Manifestos do Surrealismo. Lisboa: Moraes, 1969

De la Beaumelle, Agnès (Ed.). Joan Miró 1917-1934: la naissance du monde. Paris: Éditions du Centre Pompidou, 2004

Moure, Gloria (Ed.). Miró Escultor. Madrid: Centro Reina Sofía, 1986

8

Conzen, Ina (Ed.). Francis Bacon, Invisible Rooms. Munich, London, New York: Prestel, 2016

Fritsch, Lena e Morris, Frances (Eds.). Giacometti. London: Tate Publishing, 2017

Kemm, Christian (Ed.). Alberto Giacometti. New York: The Museum of Modern Art, 2001

332 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

Peppiatt, Michael. Francis Bacon, Anatomy of an Enigma. London: Constable & Robinson Ltd, 2008

Sylvester, David. Interviews with Francis Bacon. London: Thames & Hudson, 2016

Sylvester, David. Looking at Giacometti. London: Pimlico, 1995

Wiesinger, Véronique (Ed.). L’Atelier d’Alberto Giacometti. Paris: Éditions du Centre

Pompidou, 2007

9

Fry, Edward F.. David Smith, Painter, Sculptor, Draftsman. New York: George Braziller Inc., 1982

Giménez, Carmen (Ed.). David Smith. A Centenial. New York: Guggenheim Museum

Publications, 2006

Gray, Cleve (Ed.). David Smith by David Smith. Sculpture and Writings. London: Thames & Hudson, 1988

Siegel, Jeanne. Painting after Pollock: Structures of Influence. Australia: G+B Arts International, 1999

Varnedoe, Kirk e Karmel, Pepe. Jackson Pollock. London: Tate Gallery Publishing, 1999

10

Bernstein, Roberta. Jasper Johns: Redo an Eye. New York: The Wildenstein Plattner Institute, 2017

Hopps, Walter (Ed.). Robert Rauschenberg: A Retrospective. New York: Guggenheim Museum, 1998

Tomkins, Calvin. Off the Wall. Robert Rauschenberg and the Art World of Our Time. New York: Penguin Books, 1980

Varnedoe, Kirk (Ed.). Jasper Johns: A Retrospective. New York: The Museum of Modern Art, 1997

Varnedoe, Kirk (Ed.). Jasper Johns: Writings, Sketchbook Notes, Interviews. New York: The Museum of Modern Art, 1996

11

Celant, Germano (Ed.). Claes Oldenburg: An Anthology. New York: Guggenheim Museum, 1995

Bibliografia 333

Goldsmith, Kenneth (Ed.). I’ll Be Your Mirror. The Selected Andy Warhol Interviews New York: Carrol & Graf Publishers, 2004

Livingstone, Marco. Pop Art: A Continuing Story. London: Thames & Hudson, 2000

McShine, Kynaston (Ed.). Andy Warhol: A Retrospective. New York: The Museum of Modern Art, 1989

Oldenburg, Claes e Van Bruggen, Coosje. Pelo Passeio dos Liquidâmbares: Escultura no Parque. Porto: Museu de Serralves, 2002

12

Flam, Jack (Ed.). Robert Smithson: The Collected Writings. Berkeley e Los Angeles: University of California Press, 1999

Judd, Donald. Complete Writings 1959-1975. Nova Scotia: The Press of the Nova Scotia College of Art and Design, 2005

Judd, Donald. Complete Writings 1975-1986. Eindhoven: Eindhoven van Abbemuseum, 1987

Meyer, James. Minimalism: Art and Polemics in the Sixties. New Haven: Yale University Press, 2001

Morris, Robert. Continuous Project Altered Daily: The Writings of Robert Morris. Cambridge, Mass.: The mit Press, 1993

Serota, Nicholas (Ed.). Donald Judd. London: Tate Publishing, 2004

Tsai, Eugenie e Butler, Cornelia. Robert Smithson. Los Angeles: Museum of Contemporary Art, 2004

13

McShine, Kynaston. Richard Serra. Sculpture: Forty Years. New York: The Museum of Modern Art, 2006

Senie, Harriet F. The Tilted Arc Controversy: Dangerous Precedent? Minneapolis: University of Minnesota Press, 2002

Serra, Richard. Writings Interviews. Chicago: The University of Chicago Press, 1999

Sussman, Elisabeth (Ed.). Eva Hesse . San Francisco: San Francisco Museum of Modern Art, 2002

Sussman, Elisabeth e Wasserman, Fred. Eva Hesse: Sculpture. New York: The Jewish Museum, 2006

334 A Luta pelo Significado na Arte do Século xx

14

Basualdo, Carlos (Ed.). Bruce Nauman: Topological Gardens. Philadelphia e New Haven: Philadelphia Museum of Art e Yale University Press, 2009

Basualdo, Carlos (Ed.). Michelangelo Pistoletto. From One to Many 1956-1974 Philadelphia: Philadelphia Museum of Art, 2011

Chistov-Bakargiev, Carolyn. Arte Povera. London: Phaydon Press, 2001

Kraynak, Janet (Ed.). Por favor, preste atención, por favor: palabras de Bruce Nauman. Málaga: Museu Picasso, 2019

Van Bruggen, Coosje. Bruce Nauman. New York: Rizzoli, 1988

15

Borer, Alain e Schirmar, Lothar (Eds.). The Essential Joseph Beuys. London: Thames & Hudson, 1996

Elger, Dietmar. Gerhard Richter: A Life in Painting. Chicago e London: The University of Chicago Press, 2002

Gerhard Richter. Madrid: Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía, 1994

Obrist, Hans Ulrich (Ed.). Gerhard Richter: The Daily Practice of Painting. London: Thames & Hudson, 1995

Rosenthal, Mark et al. Joseph Beuys: Actions, Vitrines, Environments. Houston: Menil Collection, 2004

16

Danto, Arthur C. Cindy Sherman: Untitled Film Stills. New York: Rizzoli, 1990

Julian Schnabel. London: The Tate Gallery, 1982

Julian Schnabel. Bordeaux: cap, Musée d’Art Contemporain de Bordeaux, 1989

Respini, Eva (Ed.). Cindy Sherman. New York: The Museum of Modern Art, 2012

Schnabel, Julian. C.V.J. Nicknames of Maitre D’s & Other Excerpts from Life. Bonn: Hatje Cantz Verlag, 2015

Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.