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O Homen, O Músico e O Maçom | Fernando Correia

O Homem, O Músico e O Maçom

por Fernando Correia

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João Domingos Bontempo nasceu em Lisboa no dia 28 de Dezembro de 1775 e faleceu, também em Lisboa, a 18 de Agosto de 1842.

Foi um pianista clássico e compositor de grande notoriedade em Paris e em Londres, guardando para Lisboa a parte menos significativa da sua produção musical, certamente por causa das motivações políticas que, de alguma forma, tiveram influência na forma como foi requisitado pelos grandes centros musicais, onde as pessoas apreciavam a sua obra pelo que realmente valia.

A sua primeira passagem por Paris verificou – se em 1801, onde fez sucesso como pianista clássico e onde estabeleceu uma grande e sólida amizade com Filinto Elísio que ali viva.

Há escritos da época que relatam as suas notáveis actuações na “Salle Olympique”, da capital francesa, onde estabeleceu uma relação interessante com Dussek e Clementi, sendo através deste que publicou em Itália uma parte significativa da sua obra.

Em Paris compôs a Grande Sonata para Piano; o Primeiro Concerto em Mi Bemol para piano e orquestra; o Segundo Concerto para piano; e o Minueto Afandangado que é uma obra absolutamente “sui generis”.

Quando se obrigou a ir para Londres, para fugir às perseguições políticas de que estava a ser alvo, já a sua Primeira Sinfonia recebia os mais rasgados elogios da crítica parisiense.

Em Londres relacionou – se com John Field e foi professor da filha de Lady Hamilton.

Nessa altura, o Embaixador de Portugal em Londres, D. Domingos António de Sousa Coutinho, Conde do Funchal, organizou um grande festival para celebrar o aniversário daquele que viria a ser o Rei D. João VI e a expulsão do exército francês do território português, em consequência da derrota de Massena.

Convidou João Domingos Bontempo para esse festival de música e o compositor português apresentou uma cantata intitulada “Hino Lusitano (Opus 10)”, com versos do poeta liberal Vicente Nolasco da Cunha. Foi um êxito enorme e é possível dizer que a Cantata foi ouvida localmente por todo o Conselho de Ministros britânico.

João Domingos Bontempo era maçom, tendo sido iniciado em Paris e frequentando Lojas, mais tarde em Londres e em Lisboa.

Aliás, em Agosto de 1822 conseguiu criar a sua Sociedade Filarmónica, na Rua Nova do Carmo, onde o Grande Oriente Lusitano teve instalações.

Quando lhe foi permitido, João Domingos Bontempo compôs uma Missa de Requiem à memória de Gomes Freyre de Andrade, outro maçom que dá agora o seu nome a uma nova Loja da “Soberana”, e aos supliciados de 1817. Evocou assim o nome do ilustre General e Muito Respeitável Grão - Mestre da Maçonaria Portuguesa.

Gomes Freire de Andrade viveu entre 1757 e 1817 (quando foi assassinado) e João Domingos Bontempo entre 1775 e 1842.

O nosso compositor já tinha escrito anteriormente um outro Requiem dedicado á memória de Camões.

Vindo a ser perseguido pelos seus ideais liberais durante o período miguelista, refugiou-se no Consulado da Rússia, em Lisboa, onde permaneceu cinco anos.

É preciso dizer que se Bontempo saísse do Consulado corria o risco de ser assassinado pelos absolutistas.

Após o triunfo liberal, Bontempo foi professor da Rainha D. Maria II, em 1836, nomeado por D.Pedro IV.

Dirigiu depois a Escola de Música integrada no Conservatório Geral de Arte Dramática, idealizado por Almeida Garrett, mas manteve-se como Chefe da Orquestra da Corte.

Em 1842, já muito perto da sua morte, compôs uma Missa Festiva (obra notável) que foi executada na Igreja dos Caetanos, por professores e alunos do Conservatório.

Era casado com Maria das Dores, viveu na Rua de São Bento nos últimos anos da sua vida, e está sepultado no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa.

Algum sector da música erudita considera – o um compositor romântico, o que não parece ser inteiramente verdade. Foi sobretudo um clássico, talvez com influências de Beethoven, mas também com um “Te Deum” que lembra Rossini. Foi, isso sim, um dos grandes compositores da sua época, durante tantos anos injustamente esquecido.

Terá vivido um pouco entre o progressismo político, com as suas ideias liberais, e o tradicionalismo musical.

Recebeu justa homenagem em Setembro de 2012, na Assembleia da República, onde dois Deputados, Laureano Carreira e Gabriela Canavilhas, fizeram o seu justo elogio, seguindo-se no mesmo local uma actuação de músicos do Conservatório Nacional. A música de João Domingos Bontempo, apesar da sua grande qualidade, não é vanguardista, sendo menos moderna no conceito do que a música de Haydn, Mozart ou Beethoven. No entanto, todos reconhecem a sua luta pela defesa dos valores portugueses, assumindo na sua vasta obra uma posição de relevo os valores da liberdade individual e da soberania da nação portuguesa, lutando sempre contra as colonizações estrangeiras em Portugal no início do século dezanove.

Até certo ponto, João Domingos Bontempo foi um injustiçado.

Prestamos – lhe a nossa homenagem, enquanto grande português, músico, compositor e maçom.

“Até certo ponto, João Domingos Bontempo foi um injustiçado. Prestamos-lhe a nossa homenagem, enquanto grande português, músico, compositor e maçom.”

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