SURGE Skateboard Magazine, 22nd issue

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Pig Your Line Voyage à Trois Espinha na Garganta Uma Skatada Chamuscada

Amor e Skate a 3 na Cidade Luz

Javi Mendizabal 2013

Número 22 - setembro/outubro

Bimestral

Distribuição gratuita



AURA S.A. - 212 138 500





geral@nautisurf.com


Distribuição www.marteleiradist.com 212 972 054 - info@marteleiradist.com



Malta, já somos maiores de idade… E já lá vão 22 edições, é altura de festejar… e porquê, perguntam vocês? A verdade é que esta 22ª edição que estás ler tem um significado especial para nós, aqui na Surge… com este número, a Surge é oficialmente a revista de skate em Portugal com mais edições publicadas… não fomos os primeiros, nem pouco mais ou menos… desde o início da história do skate houve muitas outras publicações que contribuíram para a divulgação e expansão do skate nacional. Skate Portugal, Crutz, Urbe, Surf Magazine, Portugal Radical, Toast, Difere, Movimento, Onsk8, todas deixaram a sua marca na cena de skate nacional e, no nosso caso, também uma marca pessoal, pois foi com elas que muitos dos que hoje colaboram com a Surge ficaram com o bichinho cá dentro… a todas elas o nosso obrigado. No meu caso lembro-me como se fosse hoje como é que comecei a tirar fotos de skate. Tinha ido para um campeonato do Radical Skate Clube em Alverca e lembrei-me de pedir a máquina emprestada ao meu pai. Como tinha a câmara ao peito, um rapaz de Almada que não conhecia muito bem, com a alcunha de Nuno “dos Óculos”, perguntou-me se tirava fotos… eu olhei para a máquina e depois para ele e respondi “epá, acho que sim”… quando, na verdade, nem sequer sabia mudar um rolo. “Vamos começar uma revista”, disse ele, “e precisamos de colaboradores”. ”Brutal”, pensei eu… eu a tirar fotos para uma revista! Para um adolescente, na altura aquilo era equivalente a um sonho molhado com a Samantha Fox… melhor não poderia haver! Quando cheguei à minha terrinha disse logo aos meus amigos, “vamos tirar fotografias que vocês vão aparecer numa revista”… lá aprendi a mudar os rolos, o meu pai emprestou-me um flash e fomos tirar umas fotos… quando as fui buscar ao Foto Nelo, o estúdio de fotografia local, não sabia o que pensar… será que estavam boas? Epá, devem estar… vou enviá-las e logo se vê o que a malta da revista diz. Passaram-se semanas, meses e nada, nem uma notícia da malta da revista… todos os

dias perguntava à minha mãe se alguém de uma revista tinha telefonado lá para casa… sim, muito antes de sequer sonharmos com telemóveis. Mas nada. Até que um dia vou buscar o correio e vejo um envelope diferente, castanho e grande e com o meu nome. Abri e estava lá dentro a primeira edição da Urbe, com uma foto do Jaime Fernandes na capa… fiquei de boca aberta a olhar para a capa, e comecei a desfolhar. Para ser sincero nem pensei se teria ou não alguma foto minha lá, queria era devorar a revista o mais rápido possível. Quando me deparei com uma das fotos que tinha tirado, ali, impressa a preto e branco, a minha vida mudou… como puto, dava pulos de alegria por uma das minhas fotos estar ali na revista. Mas ao mesmo tempo pensava: “quem me dera fazer isso para sempre”. Hoje, 20 anos passados, o gosto de fazer parte de uma revista mantém-se e sei que todos os que colaboram connosco tiveram a sua própria versão da história. Nenhum de nós é profissional da revista, uns trabalham em armazéns, outros fazem biscates na restauração, outros casamentos e batizados e até temos professores de liceu… mas uma coisa é certa, todos os nomes portugueses que leem na ficha técnica da revista contribuem para que a Surge exista e se mantenha à vossa disposição nas vossas lojas locais... podia pensar em muitos adjetivos para descrevê-los, mas de momento à minha cabeça só vem uma palavra: Obrigado!

Pedro Raimundo “Roskof”

Uma foto a preto e branco numa revista e lá se foram os planos de uma vida pacata… David Guerra switch frontside shove-it – Benedita, 1994 fotografia Roskof

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Voyage à trois

Não é nada disso do que estão a pensar... seus ordinários! …é skate em Paris!

Volcom/Manelsport Pig Your Line

Muita gente diz que os skaters são uns “suínos”… olhem as nossas caras de preocupados…

Dr. Manka-te

Andas a dar-te mal com as dúvidas da nova geração? Felizmente o Dr. tem a receita…

Uma espinha na garganta - Javi Mendizabal

Quando as histórias pessoais se transformam numa odisseia coletiva

Bana Skate Party

Se a linha do Estoril é a “Califórnia da Europa”, então a Bana Skateshop é o Afeganistão da linha do Estoril… perceberam?… não? Também não é preciso… é uma festa

Arrow&Beast

Uma tour de uma skateshop alemã a Portugal com convidados destes? Não é todos os dias… de facto, não nos lembramos de nenhuma

Ficha Técnica Propriedade: Pedro Raimundo Editor: Pedro Raimundo Morada: Rua Fernão Magalhães, 11 São João de Caparica 2825-454 Costa de Caparica Telefone: 212 912 127 Número de Registo ERC: 125814 Número de Depósito Legal: 307044/10 ISSN 1647-6271 Diretor: Pedro Raimundo roskof@surgeskateboard.com Diretor-adjunto: Sílvia Ferreira silvia@surgeskateboard.com Diretor criativo: Luís Cruz roka@surgeskateboard.com Publicidade: pub@surgeskateboard.com

Colaboradores: Rui Colaço, João Mascarenhas, Renato Laínho, Paulo Macedo, Gabriel Tavares, Luís Colaço, Sem Rubio, Brian Cassie, Owen Owytowich, Leo Sharp, Sílvia Ferreira, Nuno Cainço, João Sales, Rui “Dressen” Serrão, Rita Garizo, Vasco Neves, Yann Gross, Brian Lye, Bertrand Trichet, Luís Moreira, Jelle Keppens, DVL, Miguel Machado, Julien Dykmans, Joe Hammeke, Hendrik Herzmann, Dan Zavlasky, Sean Cronan, Roosevelt Alves, Hugo Silva, Percy Dean, Lars Greiwe, Joe Peck, Eric Antoine, Eric Mirbach, Marco Roque, Francisco Lopes, Jeff Landi, Dave Chami, Adrian Morris, Alexandre Pires, Vanessa Toledano, Nuno Capela. Tiragem Média: 8 000 exemplares Periodicidade: Bimestral Impressão: Printer Portuguesa Morada:Edifício Printer, Casais de Mem Martins 2639-001 Rio de Mouro • Portugal

Interdita a reprodução, mesmo que parcial, de textos, fotografias ou ilustrações sob quaisquer meios e para quaisquer fins, inclusivé comerciais. www.surgeskateboard.com Queres receber a Surge em casa, à burguês? É só pedir. Através de info@surgeskateboard.com assinatura anual em casinha: 15 euros

Capa: Poderíamos contar logo aqui a história desta capa, mas como diriam os nossos amigos brasileiros: estaríamos a “cortar o barato” Javi Mendizabal alley hoop backside 360 nose grab - Odivelas fotografia Neil Chester

No Batalha está o túmulo ao soldado desconhecido, no Porto está o skater desconhecido… frontboard… se alguém o conhecer avise-o fotografia Renato Laínho

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CONSULTÓRIO DO DR. MANKA-TE

SABES DIVERTIR-TE EM CIMA DE UM SKATE? fotografia Luís Colaço

Dr. Mankate drmankate@surgeskateboard.com

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Já me aconteceu várias vezes, principalmente ao chegar a um sítio novo, começar a andar de skate e aparecer um puto a perguntar-me coisas deste género: “Que manobras é que dás?”, “És patrocinado?”, “Andas em switch?”, “ Dás 360º flip?”... e por aí em diante! Mas o que é isto? Já cheguei mesmo a pensar que os putos de hoje são uns burros de merda... mas a realidade é que tenho sobrinhos que andam e me fazem exatamente as mesmas perguntas, e de burros não têm nada. Antigamente isto não acontecia com tanta frequência, isso é certo! Porquê? Acredito que isto seja um problema global e não unicamente português. No passado, e não estou a falar de um passado assim tão longínquo, poucos eram os que andavam de skate. Chegar a um sítio novo e ver malta do skate era quase sempre sinónimo de festa, troca de ideias, amizade genuína, única e exclusivamente por se encontrar alguém com o mesmo gosto. Faziam-se amigos para a vida... Hoje em dia as coisas são diferentes. Não quero aqui dizer que episódios como os que acabei de referir tenham deixado de acontecer, mas não acontecerão com a mesma frequência, certamente. Dantes era quase impossível não cumprimentarmos alguém que levasse um skate na mão, ou que simplesmente tivesse os ténis rotos. Isto não acontecia todos os dias, mas hoje é banal, por isso não podemos fazer comparações. Simplesmente, os tempos são outros. O crescimento que o skate teve nos últimos anos, o aparecimento de vidas milionárias de algumas estrelas, os jogos de skate para a playstation, a moda, pros com programas de TV e mais algumas tretas estão ligados a este fenómeno. Cada vez mais os miúdos sonham em tornar-se os melhores do mundo e competem entre si de uma forma pouco saudável. Apesar de existirem mais skaters, a essência do skate parece muitas vezes estar a desaparecer. Skate é, sempre foi e sempre será, divertimento. Se estás a divertir-te, estás a andar de skate, independentemente do tipo de skater que és. Parece-me muitas vezes que os putos, incluindo os meus sobrinhos, não andam para se divertir, mas unicamente para serem melhores que os outros. Parece-me que só querem impressionar com as suas manobras pesadas e ainda gozam com aqueles que não as sabem dar ou não são tão bons como eles. Entristece-me! Isto antigamente acontecia menos, como já disse, e quando acontecia, os mais velhos encarregavam-se de meter um travão nisso. Era pontapé de manhã à noite, literalmente, para os mais novos acordarem para a vida! Talvez isso não aconteça hoje em dia, não sei bem... Putos, skate não é isso! Vão andar com os vossos amigos, façam novas amizades, sejam criativos, aprendam as manobras mais bonitas ou apenas desçam uma rua a fazer uns slides... divirtam-se, porque skate não é uma competição, nem nunca foi! Sabes realmente divertir-te em cima de um skate, puto? Se sabes, os meus parabéns, porque essa é a melhor manobra de todas! Beijo na bunda Dr. Manka-te

página 15 Dr. Manka-te



c1rcaportugal@ciabrasil.pt


ANTI ESTÁTICO

Sabemos que o Nuno Relógio é de uma cidade conhecida como o faroeste do Algarve. Deve ser por isso que agora skata de chapéu de cowboy switch fs flip fotografia Mascarenhas 2012


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O skate parque de São João do Estoril é tão grande que tem dentro de si vários spots. Este é um deles… Pedro Mano backside disaster fotografia João Sales

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ANTI ESTร TICO

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ANTI ESTÁTICO Como é que alguém constrói uma coisa assim e depois fica chateado por a malta ir lá skatar? O que é que esperavam… contemplação? Kiko, bluntslide fotografia Mascarenhas

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Aqui na foto não deu para ver, mas a meio deste frontboard o Ruben Gamito ainda teve tempo de beber uma cerveja e comer uns tremoços fotografia Mascarenhas

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ANTI ESTÁTICO


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ANTI ESTÁTICO Alguns dias depois deste ollie, apareceu em casa do Toni uma multa da Brisa. Ninguém o mandou não instalar via verde no skate fotografia Renato Laínho

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O Alex Mizurov encaixou este nollieheel mesmo ali naquele bocadinho de cÊu limpo‌ que classe.

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PLANET SPORTS texto e fotografia Hendrik Herzman

Provavelmente em finais de outubro há melhores sítios no planeta para praticar desportos, do que a Alemanha. Do verão diretamente para o inverno? Passamos rapidamente de boardshorts e banhos nos lagos, para andarmos de patins no gelo. Aulas canceladas por causa do calor ontem e por causa da neve hoje... perdemos alguma coisa? Ah sim, perdemos! Niklas Speer, Alex Mizurov, Jurgen Horwarth, Charles Collet e Fabian Lang preferiram sair dali e lidar com o brisa marítima em Portugal.

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Charles Collet, front blunt no rail “americano� de lisboa

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João Allen foi o guia desta viagem e impressionou a malta… frontside boneless no bank

É tão bom sair do avião pela manhã, depois de apenas duas horas e pouco de voo, apanhares a tua bagagem, arrumares os casacos novamente nas malas e sentir a brisa quente no ar. A vitamina D flutuava à volta do Charles Collet, enquanto ele tocava a sua guitarra acústica no aeroporto Francisco Sá Carneiro. O resto da malta devia estar a chegar em breve, de modo a ainda podermos aproveitar o dia, montar tábuas novas, partir as solas aos novos ténis e habituarmo-nos ao novo clima. O que não sabíamos era que eles, àquela hora, ainda estavam a chegar às partidas na Alemanha... o dia foi longo, muito longo. E não só para mim e para o Charles. O voo do Niklas quase parecia um transatlântico, o Fabian pôde ver um jogo do Real Madrid na escala e o Alex podia ter ficado na cama... foi o que o Jurgen fez. Venceu um campeonato de Bowl na noite anterior e foi receber o prémio no seu novo bar, o Orly, em Berlim... claro que perdeu o voo. Chegou a Lisboa na manhã seguinte. Esperem, Lisboa? Sim, fizemos a viagem de três horas nessa mesma noite. Era sexta-feira e a cidade estava cheia de vida... o mesmo acontecia no parque perto do nosso apartamento... carros em segunda fila bloqueavam o eléctrico e complicaram o trânsito durante pelo menos uma hora. Depois descobrimos a razão: havia um bar no último andar do prédio! Lençóis sobre a cabeça e boa noite!

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Jurgen Hörwarth, frontside air

O Niklas Speer não foi até ao aniversário do Lux, por isso enquanto o resto da malta recuperava, ele gozava com eles, com estes backlips Na manhã seguinte tivemos logo de colocar os óculos de sol, porque a rotação do planeta apanhou-nos e o sol refletido nos curbs de mármore brilhante ofuscava-nos os olhos. O nosso guia para os próximos dias juntou-se a nós vindo diretamente da festa da noite anterior. Durante os dias seguintes este jovem surpreendeu-nos com os seus muitos talentos. A sua última video part deixou-nos, a todos, completamente parvos. Ele é uma prova de que as pessoas com muito sol e bom tempo vivem mais felizes. Mostrou-nos os melhores spots, convidou-nos para um churrasco em casa dos pais e ainda conseguiu pôr os nossos nomes na guest list de uma das festas do ano em Lisboa. Obrigado Allen! Quando vimos os spots da sua video part ainda ficamos mais surpreendidos com a intensidade do seu skate. O chão um bocado rugoso fez-nos sentir em casa. Mas o corrimão na escola lembrava-nos a América. O Niklas destruiu o rail com a maior das calmas, com manobras como backside overcrookeds. O Charles precisou da pressão da polícia, que entretanto tinha sido chamada, para acertar o seu frontblunt. 2013


Nas linhas aĂŠreas Horwarth, os stalefishs descolam a qualquer hora do dia

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Onde alguns sentiriam vertigens, Fabien Lang, nose grind pop-out

Andar de calções e refrescarmo-nos na praia era a coisa seguinte nas nossas cabeças e era o que devíamos ter feito também no dia seguinte. Há, sem dúvida, uma maldição do terceiro dia: o Charles deu um gap para wallride na Universidade e caiu sobre as costelas, de tal modo que até nós ficamos sem ar só de ver. Mas a “Horwarth Airlines” trouxe-nos algum ar fresco e decidimos fazer a viagem até Belmonte, uma cidade a algumas horas de distância, no meio do campo. Construído por um arquiteto sobre ordens da UE, a intenção era boa mas o design está longe de ser útil, a área de street são curbs uns em cima dos outros. O bowl é uma loucura, oververt e tudo, merece, sem dúvida, a alcunha de “bowl da morte“. O sapo grelhado e o lagarto que lá encontrámos são mais uma prova de que merece esse nome. O Jurgen aproveitou o bowl limpo e vazio e deu-nos um impressionante show, stalefish e backside airs gigantes. Passámos os últimos dias no Porto, a Casa da Música é, sem dúvida, um spot incrível, mas nós preferimos aproveitar a arquitectura maravilhosa para rolar e descontrair nos banks e no flat. Não tivemos muita sorte com o tempo no Porto. Assim, em vez de conseguirmos mais algumas manobras, andámos a conhecer a cidade, com os seus cenários de casas antigas e pontes. Todas aquelas imagens mereciam um postal. Em contrapartida, todos os postais que enviámos para a Alemanha nunca chegaram. Obrigado por nos terem recebido.

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texto Roskof fotografia Nuno Capela

Não querendo soar como um daqueles velhotes castiços, com aquela famosa expressão “no meu tempo é que era bom”, vou puxar da memória para me lembrar dos sons e cheiros dos meus tempos de infância em Turquel. Dos mais característicos eram, sem dúvida, os dos dias de matança do porco. Sim, há muito tempo, antes de a ASAE ter tentado terminar com mais um ritual cultural português, os dias da matança do porco eram dias de festa, não só para a nossa família, mas também para todos os nossos amigos, conhecidos e, até, para os que

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passavam à porta de casa e eram convidados a entrar pelo meu avó... mesmo que não os conhecesse de lado nenhum… havia sempre mais um lugar à mesa e carne para todos levarem para casa... por isso, quando recebemos o convite da Volcom e da Manelsport para o “Pig your Line”, um campeonato de best line, com porco no espeto à discrição para todos, aqueles sons e cheiros vieram-me imediatamente à cabeça: “uma festa à antiga”, pensei logo… e assim foi.

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Ruben Rodrigues, “flipaço”, como diz a malta de Santa Cruz

O Roseiro skata com tanto power que o podiam ter contratado para matar o porco com skate. Pedro, backside nosegrind

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Viola e Renato Aires, juntos davam umas belas febras

O dia solarengo e frio convidava a não ficar muito tempo quieto e foi isso mesmo que a malta que apareceu no Kais de Santa Cruz fez, fosse a participar no campeonato, fosse a aproveitar as brasas do porco no espeto para se aquecer, ou a beber uns sumos de cevada. Se houve coisa que não se viu foi pessoal quieto. Para quem não conhece o spot do Kais, aconselho vivamente a marcar um dia para ir lá, vale a pena… para skatar ou, como diz agora esta malta nova, ”chilar”. Quem não “chilou” muito foi o João Neto, skater nortenho que, enquanto recém-imigrado para a Ericeira, quis logo habituar-se às tradições do Oeste e, para além de levar a barriga cheia de comida, levou o primeiro lugar e a maior parte do prize money de 1000€ para casa.

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O Né, de Braga, levou também um bocado de porco e algumas notas para a Noruega, onde está agora a trabalhar... e ouvimo-lo dizer que o suíno nacional sabe melhor do que as renas que ele atropela, lá perto do círculo polar Ártico. Renato Aires e Chalabardo também levaram alguma notas e febras e o Canina “grelhou” completamente o curb grande, com um tailslide flip out... e levou o best trick para o “Carquistão”, onde, pelo que sabemos, o consumo de carne de porco ainda não foi banida pelos talibãs da linha do Estoril. Para os resistentes ainda houve festarola para queimar as calorias noite dentro, com bandas no Kais bar, mesmo em frente ao spot. Quanto a mim, não pude ficar, deveres familiares chamavam, mas no fim do dia, aquele relembrar bons velhos tempos, mais do que o sabor das febras, deixou-me de água na boca para o próximo “Pig Your Line”.

Pedro Roseiro, backside tailslide

Né, switch flip… já com o seu estilo lenhador da Noruega

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Zenildo, Noseblunt slide

Laís, frontside layback rock and roll

texto e fotografia Roskof

Hoje em dia anda tudo tão rápido, somos todos tão evoluídos e espertos que muitas vezes acho que sofremos de um novo género de esquizofrenia… caracterizado por mini micro-ataques. Vi? Vivi, passa à frente! Felizmente para o skate nacional é bom saber que há coisas que se mantêm constantes e que, apesar de irem evoluindo, conservam as suas características tradicionais… a Bana skateshop é uma delas… quase duas décadas a ajudar o skate em Portugal e sempre com um toque pessoal que não se encontra em muitos sítios. Nos últimos dois anos, o skate parque da DC, na Ericeira, 2013

tem recebido a Bana Skate Party e o espírito é o mesmo de sempre. O típico que encontramos quando entramos nas lojas do Bana: boa música, boa disposição, sem conversas da treta, algum gozo saudável e, claro, comes e bebes para a malta… ok, comes e bebes não encontras muitas vezes dentro da loja, mas se te portares bem, a malta que trabalha no Bana oferece-te um chocolate… como sempre, o pessoal compareceu em força para apoiar esta instituição do skate português e houve espaço para tudo e para todos os estilos de skate. Bowl, street, até na relva houve quem andasse de skate.


Marcelo, frontside indy

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No final das contas o Ruben Rodrigues levou a tábua Bana customizada com o número 1 no street e o Francisco Lopez, no Bowl. Mas, claro, e como já vem sendo hábito nestes eventos do Bana, há sempre surpresas... e neste caso foi ver mais um dos skaters da nova geração a voar à séria: o Marcelo passou muito perto de muitas das cabeças que se encontravam perto do bowl e pôs-nos todos a pensar no futuro do vert skate em Portugal. Uma coisa é certa, a primeira foto do Marcelo na revista é num campeonato do Bana e aqui na Surge esperamos que ambos tenham uma vida longa e que continuem a contribuir para o skate nacional.

Ruben Rodrigues, front feeble

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intro surge texto Mascarenhas fotografia Danny Wagner / Mascarenhas

Uma skateshop de Estugarda que traz todo o seu team local numa viagem a Portugal e ainda convida o Rodrigo Teixeira e o Benny Fairfax para se juntarem ao grupo? Ao princípio pareceu-nos um pouco estranho, será que estaríamos a ouvir bem? Mas ao que parece são os sinais dos tempos, reflexo de uma altura em que os orçamentos andam curtos, como em todos os setores. Se as marcas não vêm, as lojas arranjam maneira. Felizmente para manter o espírito skater vivo ainda não se paga e assim, mais do que uma tour, esta foi apenas mais uma viagem de amigos. O Filipe Cordeiro e o Mascarenhas ficaram encarregues de acompanhar os rapazes, e como recompensa no fim da viagem já eram vistos como membros do team. Assim sendo, se qualquer dia eles mudarem os nomes para Fritz Cordeiro e Johan Mascarenhas não se admirem…

Rodrigo Teixeira flip backside wallride numa típica zona de Cascais… ou como ele lhe chamava: a capital dos “Paitrocínios”

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Lem Villemin feeble transfer, como se fosse uma coisa normalíssima de dar neste spot‌

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Esta foi a primeira vez que andei a fazer de guia com um team estrangeiro. Entusiasmado no início, cansado no fim, vou contar-vos de forma sucinta como correu a estadia em Portugal de alguns skaters do team da Adidas na Alemanha, juntamente com alguns skaters do team principal e, claro, respetivos amigos. E é pelos amigos que vou começar, pois uma coisa é certa, quando um team traz amigos convidados só quer dizer que vêm para relaxar, skatar e, principalmente, passar bons momentos. Com estadia em Cascais, a tortura de conduzir todos os dias até

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lá valia bem a pena. Gostei bastante de conviver com este grupo. Sempre com um ambiente descontraído, a malta foi skatando e produzindo bons toques. Mas... há qualquer coisa com o spot do Monte da Caparica e que se chama Austin Gillette. Sim, agora todos os teams que vêm a Portugal parece que têm que “picar o ponto” ao Monte... fotografar e filmar onde o Gillette fez capa na Transworld. Mas deixem-me que vos diga que Portugal tem imensos bons spots! Ir ao Monte “já é dose.”


O nome Sandro Trovato soa a cantor de ópera, mas este frontblunt soa a skate puro e duro‌ 2013


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Existe também qualquer coisa com os estrangeiros, que quando cá vêm descobrem sempre spots novos, como foi o caso de uma piscina em Cascais com uma vista incrível para o mar, com o único senão de a polícia aparecer em minutos. Este grupo não teve tanta sorte assim e apanhou mesmo alguns dias de chuva, o que para o Lem era como o “Singing in the Rain”... ainda conseguiu filmar umas lines à chuva na praça do Mac em Almada. Com o senão de que “conseguiu” torcer o pé no primeiro dia, mesmo assim skatou todos os dias em todos os spots.

Já tinha ouvido falar que o Rodrigo Tx era mesmo boa pessoa e deixem-me que vos diga... então não é que é mesmo um gajo porreiro? Mas um caso insólito e bonito acabou por acontecer na Praça de Jesus, em Setúbal: quando o Rodrigo ia a dar ao pé, cruza-se com outro skater de Setúbal e ficam a olhar um para o outro quando repetem ao mesmo tempo “ Eu não te conheço?” – seguido de uma grande gargalhada. O que acontece é que o gajo de Setúbal era skater na mesmo cidade do Rodrigo, no Brasil, e já não se viam há treze anos.

Qualquer manobra do Benny Fairfax soa a um daqueles improvisos dos grandes nomes do jazz. Flip backside nosedrive revert 2013


depois deste swicth heel, os pés de manteiga do Lem derreteram de vez…

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É de salientar ainda que o nosso amigo da velha guarda, Dressen, apareceu no Pragal para conseguir uma assinatura num promodel do Rodrigo TX, spot este que deu luta aos “Zee Germans”, que tiveram de voltar 3 vezes para conseguir aterrar as manobras ambicionadas. Mas para resumir e não andar aqui a dizer que o outro deu isto e aquilo, foi um bom tour, com bom ambiente e malta muito simpática. Sim, por incrível que pareça, os alemães até são simpáticos.

...e há muitas mais de onde esta saiu… Rodrigo Teixeira, nollie flip tailslide Phil Anderson, ollie

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texto e fotografia LuĂ­s Moreira

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Há uns meses liguei ao Romeo, que está a viver em Paris e perguntei-lhe quando é que podia ir lá fazer-lhe uma visita para conhecer a cidade das luzes e andar de skate nos mil e um spots que há por lá. Não me lembro do que é que ele respondeu ao certo, mas deve ter sido qualquer coisa como: “Já cá devias estar!” Não gosto de contrariar a vontade dos meus amigos, especialmente quando se trata de dez dias a andar de skate com casa e guia turístico gratuitos! Por isso, decidi fazer a vontade ao Romeo e comecei a planear a viagem.

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À conversa com o Francisco Mouga, uns dias mais tarde, ele disse-me que também já tinha marcado viagem para Paris para ir ter com alguns amigos franceses, nomeadamente o Remy Taveira, o Kevin Fernandes e o Alexandre Pires. No seguimento desta conversa decidi, então, marcar a viagem, de forma a coincidir ao máximo com a estadia dele lá. Malas feitas, cinco t-shirts vestidas, para o tamanho da mala não exceder o permitido pelas nossas queridas companhias low cost, e do skate apenas os trucks foram, na esperança de arranjar lá algum francês de boa vontade que me arranjasse uma tábua para eu skatar durante os dez dias. Quando cheguei ao aeroporto já lá estava o Romeo à minha espera, para me apresentar à cidade. Nos primeiro e segundo dias não houve skate para ninguém porque a chuva não deixou e andámos apenas a vaguear pela cidade... mas, mal o chão começou a secar, tratámos de correr todos os spots que conseguimos. Paris tem spots para todos os gostos. Desde praças com curbs e escadas, a quarters “naturais”, banks, wallrides, corrimões, tudo! Os passeios são super lisos e dá para ir a skatar para todo o lado. E quando não dá para ir a skatar é porque é demasiado longe... e o Metro resolve o problema. Vivemos vários episódios muito engraçados no metro, desde livrarmo-nos de uma multa porque o polícia que nos pediu o bilhete era português e, talvez por amor à pátria, deixou-nos passar, até ao mendigo que nos ofereceu bilhetes ou, ainda, o francês com uma camisola do Paris Saint Germain que esteve a discutir futebol com o Mouga e lhe disse que o Porto era merda. 2013


Ainda bem que Luís não teve que fazer 30km a pé para o aeroporto. Depois deste frontside flip, de certeza que iria chegar lá com os pés feitos em “merde”

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O Mouga foi até Paris para discutir futebol e skatar… o típico imigrante ‘tuga, boneless

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Depois de três noites passadas em casa do Romeo, tive que me mudar e fiquei com o Mouga a dormir em casa do Alex, que foi uma enorme ajuda em Paris. Desde arranjar maneira de eu e o Mouga termos uma tábua nova sem ter que pagar um euro, até ter paciência para andar a mostrar-nos todos os spots e mais alguns, passando pela parte mais importante: ter-nos arranjado um sítio para ficar em sua casa. Obrigado por tudo, Alex! Com isto tudo, passámos os dias a andar de skate de manhã até à noite... durante todos os dias em que não chovia. Quando chovia, pois bem, íamos passear para o Museu do Louvre. O Mouga queria correr os spots todos e, realmente, não devemos ter deixado muitos de lado. E ainda por cima tínhamos sempre a companhia de uma miúda que andava a skatar em todos os mupis de Paris, numa publicidade da Minelli. Logo nos primeiros dias fomos a um spot que nós chamávamos de “Spot do Ricardo Fonseca”, que é aquele que tem a snake run onde ele dá a primeira line na parte do “Bon Appetit”. Aquela line é um abuso!! Acabámos por voltar no penúltimo dia a esse spot porque o Mouga adorou mesmo aquilo e quis filmar lá umas coisas. As noites também foram muito bem passadas, tirando duas delas em que estivemos a dormir em bancos de jardim, ou em esplanadas abrigados da chuva, deitados em cima de caixotes de cartão, enquanto esperávamos que o Metro abrisse. Logo na primeira noite fomos à Nozbone, onde estava a decorrer a prémière de um filme da Carhartt e Antiz e onde havia cerveja de borla! E depois seguimos para o Red House, onde nos divertimos imenso, vimos o Romeo a escalar uma parede e ainda ajudamos a apartar uma luta!

página 61 Voyage à trois


Agora deixo-vos com um conselho de amigo: não comprem nunca um bilhete de avião que diga Aeroporto Paris Vatry. Eu comprei a viagem de volta a partir desse aeroporto, iludido com o preço (não tão mais barato do que os outros) e a pensar que os aeroportos seriam todos relativamente perto... não podia estar mais enganado. Vim a descobrir que para apanhar esse avião, tinha que fazer mais de 200km e a única maneira era apanhar um comboio de Paris até Chalons-en-Champagne e depois fazer 30Km de táxi, ou a pé. E como nos últimos dias, dinheiro havia rien de rien, a minha única solução ia ser fazer 30Km a pé com 15Kg às costas e sem skate... não fosse, por acaso, ter encontrado em Paris um amigo nosso do Porto. Pois é, meus caros, o Ruben Dias arranjou maneira de um amigo do primo me ir buscar de carro à estação e levar-me até ao aeroporto, poupando-me, assim, umas valentes e penosas horas de caminhada. O Romeo, agora que vive em Paris, dá Nunca vi um Aeroporto assim! Uma porta de embarque, só está aberto duas vezes por semana e só five-os para swicth crookeds à grande e tem dois voos: um para o Porto e outro para Marrakech. E pronto, eu lá me enganei e apanhei o que à francesa ia para o Porto.

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Um exercício para a foto deste boneless nosepic do Mouga: vamos contar quantos tijolos estão na foto.

página 63 Voyage à trois


toque Lembro-me das histórias que os meus amigos criavam para conseguir andar de skate. As pequenas mentiras que diziam aos pais para terem mais tempo na rua, as notas da escola que eram ocultadas para não lhes confiscarem o skate, aguentarem dores provocadas por quedas, em silêncio e, pasmem-se, alguns chegavam a dizer que tinham tropeçado nas escadas da escola e partido o braço... pois se alguém soubesse que a causa era o skate, ninguém em toda a escola poderia voltar a pisar num. Até há pouco tempo pensei que isto era exclusivo da minha geração. Que os putos de hoje eram feitos de pão-de-leite ou que ninguém se iria sacrificar para ter a liberdade de rolar numa tábua. Eis que conheci este miúdo e o porquê do seu braço engessado. Pois então a história repete-se:

o medo que a mãe lhe tirasse o skate fez com que aquela cabecinha engendrasse um plano que parecesse tão real que ninguém colocaria em dúvida o relato desta história: partiu o pulso no skate parque, fingiu que estava tudo bem, chegou a casa e entalou voluntariamente dois dedos na porta com toda a força. Gritou com dores agudas e a mãe correu com ele de imediato para o hospital, sem imaginar que o “maldito” skate era a razão para suportar tamanho sofrimento!

texto e fotografia João Sales

2013

página 64 Toque


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JAVI MENDIZABAL

2013

É quase certo todos termos algumas “espinhas na garganta”. Não literalmente, é claro, mas quem é que se pode gabar de nunca ter cometido erros infantis que mudaram coisas importantes na sua vida? O que existe, depois, são as maneiras que cada um tem para lidar com eles. Alguns conformam-se, outros esquecem-se, outros, passados anos e anos, não conseguem deixar de pensar no que poderiam ter feito diferente. Outros, ainda, não só não esquecem, como lutam a todo o custo para remendar esses erros… a história do Javi Mendizabal em Odivelas é um desses exemplos… ok, posso estar a dramatizar um pouco, mas é impossível para mim não viver essa ansiedade, porque nesta história não foi só ele quem ficou com uma espinha na garganta nesse dia, há 12 anos… lembro-me como se fosse ontem. Na altura trabalhava para a Difere, então a primeira revista de skate nacional a


texto Roskof fotografia Neil Chester/Fred Mortagne/Julien Furones

chegar às bancas no novo milénio. Tinham-me ligado a dizer que iria acompanhar a tour da Cliché em Lisboa, fiquei um pouco nervoso, na altura não eram muitos os skaters estrangeiros que visitavam o nosso país. Encontrei-me com eles no spot do Monte da Caparica, na altura poucas manobras haviam sido dadas lá... o Ricardo Fonseca estava lá com eles e apresentou-me à malta: Pontus Alv, que tinha deixado para trás a “Mad Circle” e a cena de skate dos Estados Unidos, Jeremie Daclin, o skater e dono da marca, e um jovem basco, que não conhecia muito bem, chamado Javi Mendizabal.

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A acompanhá-los estavam também o Nial Neeson, editor de uma nova revista europeia que iria sair brevemente, chamada… Kingpin, e o Alberto Polo, fotógrafo espanhol. Para levar todas as manobras até ao ecrã lá de casa no, então, novo vídeo da Cliché, “Bon Appetit”, estava Fred Mortagne, um jovem francês acabado de ser contratado pela Cliché e que ainda recentemente tinha mudado o mundo dos vídeos de skate com o “Menikmati”, o seu primeiro filme para a És… se não viste, ainda vais a tempo… mas adiante. Do Monte saímos para o, então, recente skate parque de Odivelas. Como não conhecia o skate do Javi, fiquei surpreendido quando o vi a andar em transições, mais surpreendido fiquei quando o vi pela primeira vez a tentar o backside transfer do half para a mini-rampa. Sem dúvida, até então tinha sido das manobras mais abusadas que alguma vez tinha visto ao vivo. Curiosamente, o próprio Javi hoje admite que aquela manobra, para a altura, estava muito acima do nível de skate que ele pensava que tinha. Uma, duas, três… dez, vinte, trinta… durante mais de duas horas o Javi tentou a manobra, caindo de todas as maneiras e feitios, mas bastava olhar para a cara dele para saber que enquanto não ficasse fisicamente impossibilitado de tentar não ia parar… cheguei a comentar com alguém, “parece que este espanhol está em transe”… mas duas horas e tal depois a manobra estava dada! Quando a aterrou nem ele próprio acreditava. Quanto a nós, que a vimos na altura, ficámos completamente parvos, não só pela manobra, mas pela batalha em que ela se tinha tornado. Todos ficamos contentes, os fotógrafos, os colegas do team e, claro, o Fred: na primeira viagem com a Cliché já tinha filmado uma “daquelas” manobras. O dia tinha corrido bem, por isso lembrámo-nos de ainda ir a mais um spot, antes de dar por terminada aquela jornada de trabalho.

2013

A manobra em sequência… se bem que a capa lhe faz mais justiça… alley hoop backside 360 nosegrab


pรกgina 69 Uma espinha na garganta


2013


O spot dos mini-quarters, em Benfica, foi o escolhido e foi aí que a primeira espinha desta viagem se espetou, e de que maneira, na garganta do Javi e do Fred… na altura não existiam cartões de memória, as cassete hi-8 eram o standard utilizado nos filmes de skate, com a mítica Sony VX1000… o Fred trocou a cassete onde estava a manobra do Javi e continuou a filmar mais uma manobra, ou duas, foi que se conseguiu... e seguimos para o hotel… quando chegámos todos queríamos ver as manobras do dia no computador… mas onde estava a cassete?… A cara de preocupado do Fred não convenceu ninguém à primeira, todos pensámos que ele estava a gozar… quando percebemos que ele estava a falar a sério, fez-se um silêncio sepulcral… todo aquele sangue, suor, e não só do Javi, mas de todos, naquele dia de skate, tinham ficado esquecidos nos mini-quarters de Benfica… voltámos lá logo que possível, mas nada feito… como cereja no topo do bolo, no dia seguinte, enquanto estávamos a skatar na Expo, o Ricardo Fonseca atende o telefone e diz-me…”Roscas, está aqui um gajo a dizer que te roubou a mala com o material e que se a quiseres de volta tens de pagar”…

A aquecer no Parque das Gerações para ir a Odivelas… e esta, hein?

página 71 Uma espinha na garganta


tal como a primeira reacção do Javi no dia anterior, também me comecei a rir, riso esse que parou, assim que olhei para trás e vi a mala do meu carro arrombada… o número do Ricardo tinha sido o último marcado no meu telemóvel, que também tinha sido roubado… não conseguimos fazer o negócio e todo o meu material foi, certamente, vendido bem barato no circuito paralelo… “que dias amaldiçoados”, pensei eu… essa foi a minha espinha! Nove anos passados, encontro o Javi em Biarritz. Voltámos a conversar sobre esses dias e ele diz-me: “ainda tenho de voltar a Portugal para dar a manobra, aquele dia não em sai da cabeça”. - “Quando quiseres”, respondi eu. Mas não ouvi mais dele, até que o team manager da Converse me disse, “vamos a Portugal em tour e o Javi, como nosso novo team rider, também vai... e vamos a Odivelas para resolver ‘aquele’ assunto”. Os dias da tour da Converse passaram, o Javi foi a Odivelas, onde esteve mais algumas horas a tentar... mas nada feito, a manobra não saiu… no último dia da tour, enquanto jantávamos numa tasca, virou-se para mim e disse… ”vou voltar, e muito em breve, só para dar a manobra. E já falei com o Fred e ele também vem”. Sorri, afinal não era só o Javi que tinha a espinha na garganta, o Fred também dizia que o erro da cassete era das poucas coisas de que se

2013


Julien Furones backside tailslide, depois de ter dados 3 voltas à piscina para ganhar balanço

tinha arrependido na sua carreira como filmer de skate… menos de 1 mês depois o Javi liga-me…”Pedro, é desta, amanhã estou aí com o Fred Mortagne, o Neil Chester, fotógrafo e brand manager da Converse e com o Julian Furunes, para skatar comigo”… o que achei muito engraçado, pois tinha jantado com o Julian no Bairro Alto dois dias antes, ou seja, ele estava em Lisboa, foi para Barcelona e voltou no dia seguinte… “adoro Portugal”, disse-me ele quando o encontrei novamente na nossa terra. Os dias seguintes foram passados a skatar, o Javi quis conhecer a Cerâmica, em Leiria, o Parque das Gerações, em São João do Estoril, e o skate parque de Odivelas estava guardado para o último dia. Quando lá chegámos, no sábado, o Javi virou-se para mim e disse ”bom, esta noite nem dormi a pensar nisto... arrastei 3 pessoas comigo para Portugal e nem sei se consigo dar a manobra”… nessa altura, até eu senti a pressão.

página 73 Uma espinha na garganta


Ele aqueceu... quando começou a tentar posso-vos dizer que as coisas não estavam muito famosas, todos nós queríamos que ele desse a manobra, mas parecia que algo estava errado, os pés não queriam ir com o skate. Felizmente, uma das melhores coisas no skate é a motivação que por vezes encontramos nos nossos amigos, quando a nossa já começa a esmorecer. E com o incentivo de todos os presentes no skate parque de Odivelas, a primeira vez em que ele tentou verdadeiramente dar a manobra, acertou “sem espinhas”… eu digo-vos, a mim que acompanhei a história, assim que o vi a rolar a manobra arrepiei-me todo. No meio dos gritos, olhei para o Javi e juro, posso jurar, que lhe vi lágrimas a quererem sair pelos olhos… o Fred virou-se para mim e disse… “bom, já posso terminar a minha carreira de filmer de skate sem remorsos”… no resto do dia não fizemos mais nada a não ser aproveitar o sol e o melhor que Portugal tem para oferecer… todos com sorrisos nas caras… o Javi e o Fred tiraram as suas espinhas da garganta… quanto à minha, do material roubado, ainda cá está. Mas, felizmente, há algo que ninguém me pode roubar: o que vi e vivi, e isso é bem mais importante do que qualquer bem material…

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O Javi foi à Cerâmica e gostou… backside smith

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Piqueno - ollie

Tiago Matos - benihana

2013


fotografia Arquivo Portugal Radical texto Rui “Dressen” Serrão

Dressen – flip

Marco Roque - 360 flip

Um dia destes vou ter com o meu amigo Roka e quando chego ao pé dele vejo 3 sacos de compras grandes, cheios de pequenas caixinhas. Curioso como sou, perguntei-lhe logo o que era... ao qual ele me responde “isto é o arquivo da antiga revista do Portugal Radical. Eles iam mandar fora e perguntaram à SURGE se queria ficar com aquilo... e nós: claro!...” Eu fiquei logo cheio de pica: “posso ver? – Claro, isto já está connosco há uns mesitos, mas está tudo misturado, tem de ser feita uma seleção e tiradas as fotos de skate das outras cenas“. Eu disse logo: “posso ser eu a fazer? – Claro, dá-lhe!” Eu, todo maluco, começo logo à procura de relíquias... e, tal como esperava, comecei a encontrar várias, algumas delas mesmo muito boas! Para quem não sabe, além do programa de televisão, existiu

uma revista, Portugal Radical, entre ‘96 e ’98. E, pelo menos no que diz respeito ao skate, eles cobriam os campeonatos que havia na altura, por isso na sua grande maioria as fotos são de campeonatos. De entre as várias provas, havia uma que me dizia muito mais do que qualquer outra, a da ASKA. Ao ver as fotos vieram-me logo algumas das melhores memórias que tenho na minha vida. Foi das alturas em que mais adorei andar de sk8. E tínhamos um belo grupo de malta em Almada. Tínhamos também um dos 2 skate parques existentes em Portugal e a 1ª associação de skate nacional, que organizava os melhores campeonatos. Porquê os melhores? Porque eram feitos de skaters para skaters e onde o que importava era ver bom sk8, a diversão e não quem ia ser o campeão nacional. página 79


Rato - backside tailslide

Ivo Carinhas - flip

Carlos Neves ”Night” - flip

2013

Dressen – Nosegrind


Estar no relvado sentado ou deitado a levar com aquele sol bom de primavera na conversa com os amigos, fossem eles de Almada, Porto ou Algarve, fazia parte do quão especial e diferente era este campeonato. Nesta época participavam alguns dos skaters que marcaram uma parte da história do sk8 em Portugal, como o Rómulo Pereira, o André “Piqueno” Rodrigues, o Ricardo Fonseca, o Hugo Brás, o Nuno Gaia, o Marco Roque e muitos mais. Na altura não existiam fotógrafos de sk8, era malta do surf, ou outra coisa qualquer, que tirava fotos, e os ângulos e tempos nem sempre eram os melhores, mas estão aqui algumas boas fotos que, principalmente, trazem à memória, pelo menos à malta que viveu esta época, grandes momentos! Com isto partilhamos um bocado da nossa história. Enjoy!

Miguel Almeida - backside heel

Ricardo Fonseca - boardslide

página 81 Baú





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