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2016 maio/junho/julho Trimestral Distribuição gratuita
S U R G E
S K A T E B O A R D
M A G A Z I N E
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AURA S.A. - 212 138 500
JOÃO NETO | ELEMENT APPAREL & HARDGOODS PHOTO BY: CARLOSPINTOPHOTO.COM ELEMENTBRAND.COM
@ELEMENTPORTUGAL
OS SOR TUD OS! 6
Pedro Raimundo “Roskof” editor
Olha-te ao espelho, vê esse teu esbelto perfil, respira fundo e diz comigo “sou a pessoa mais sortuda do mundo”. Já está? Ótimo! Não te preocupes, não agarraste por engano um dos milhentos livros de autoajuda que circulam por aí, mas sim uma revista de skate. Já viste a sorte que tiveste? Uma revista com histórias de skate, com fotos de skate e com muito mais. E sim, as tuas suspeitas confirmam-se, tudo de borla. Já viste a quantidade de pessoas que estiveram a trabalhar para que tu conseguisses pôr as mãos nesta revista de borla? Incrível, não é? Como vais poder ver nesta edição, fomos até Marrocos, fomos aos Açores, fomos a Faro, à Suécia, a França, recebemos amigos alemães cá, tivemos murais gigantes pintados e tudo de borla! O mundo é lindo! Realmente tudo deveria ser assim, uma pessoa queria um telefone novo e pimba! Ele chegava na hora, de borla! Uma pessoa queria aquela mota para impressionar a namorada e, toma lá, aí está ela novinha em folha! Só que infelizmente as coisas não são assim, afinal para que haja coisas de borla há sempre alguém que tem de pagar um preço. Ok, agora já te pusemos a pensar que a SURGE vai deixar de ser grátis, nada disso, não te preocupes. Ou já não te lembras do início deste texto? Tu és o gajo mais sortudo do mundo, pá! Tens marcas representadas em Portugal por pessoas que acreditam que é possível fazer coisas cá, tens marcas lá de fora a apostar nos skaters nacionais, tens skate parques, tens sol, tens o material de skate mais barato da Europa, tens skaters que investem do seu próprio bolso para que possas inspirar-te com as suas aventuras... afinal, o que é que te falta? Realmente acho que só mesmo a perceção de que tudo o que tens de borla tem um preço, seja ele a dedicação, o suor, ou a paciência de muita gente que faz com que uma coisa tão “redundante” como um skate seja algo de especial. Garanto-te que em muitos países por esse mundo fora há pessoas que “choravam” para ter uma revista de borla e tu, já viste, nasceste em Portugal! Que grande sorte!
INTRODUCING THE
FREMONT A HIGH PERFORMANCE XLK CUPSOLE SHOE F E AT U R I N G T H E L U X- L I T E CUSHIONING SYSTEM
FS OLLIE / PHOTO: MORFORD
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Distribuição www.marteleiradist.com 212 972 054 - info@marteleiradist.com
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Ficha Técnica Propriedade: Pedro Raimundo Editor: Pedro Raimundo Morada: Rua Fernão Magalhães, 11 São João de Caparica 2825-454 Costa de Caparica Telefone: 212 912 127
número 32 disponível online em www.surgeskateboard.com
Número de Registo ERC: 125814 Número de Depósito Legal: 307044/10 ISSN 1647-6271 Diretor: Pedro Raimundo roskof@surgeskateboard.com
Ementa SB Granda Tour
Diretor-adjunto: Sílvia Ferreira silvia@surgeskateboard.com
A malta da Ementa foi pôr os “tintins de molho” nas águas quentes das Furnas, em São Miguel, e ainda conseguiram andar de skate? Esta malta até de férias produz.
Diretor criativo: Luís Cruz roka@surgeskateboard.com
9 Copinhos de Leite em Marrocos Uma aventura daquelas em que só tens noção de onde andaste metido quando chegas a casa, tomas o banhinho e ficas no sofá a olhar para ontem, literalmente.
Fotógrafos residentes: Luís Moreira João Mascarenhas
Uma viagem “About” Pedro Roseiro
Publicidade: pub@surgeskateboard.com
A máquina do skate nacional foi até França mostrar como se faz. Qualquer dia os franceses já não nos podem ver..
Colaboradores: Rui Colaço, Renato Laínho, Paulo Macedo, Gabriel Tavares, Luís Colaço, Sem Rubio, Brian Cassie, Owen Owytowich, Leo Sharp, Sílvia Ferreira, Nuno Cainço, João Sales, Rui “Dressen” Serrão, Rita Garizo, Vasco Neves, Yann Gross, Brian Lye, Bertrand Trichet, Jelle Keppens, DVL, Miguel Machado, Julien Dykmans, Joe Hammeke, Hendrik Herzmann, Dan Zavlasky, Sean Cronan, Roosevelt Alves, Hugo Silva, Percy Dean, Lars Greiwe, Joe Peck, Eric Antoine, Eric Mirbach, Marco Roque, Francisco Lopes, Jeff Landi, Dave Chami, Adrian Morris, Alexandre Pires, Vanessa Toledano, Nuno Capela, Ruben Claudino, Rui Miguel Abreu, Telmo Gonçalves.
Vert Attack X - Malmo Vert is dead… ahahaha piada do ano!!
Prémios SURGE 2016 Aquela altura do ano em que ficamos com uma “ligeira” dor de cabeça, em que dizemos “nunca mais faço isto”, mas em que começamos logo a contar os dias para a próxima!
Kruella D’Enfer
Tiragem Média: 8 000 exemplares Periodicidade: Bimestral Impressão: Printer Portuguesa
Enquanto as amigas iam para a praia, a Ângela enfiava-se em armazéns a pintar. A recompensa por esses dias de sol perdidos está aí e bem merecida.
Morada:Edifício Printer, Casais de Mem Martins 2639-001 Rio de Mouro • Portugal Interdita a reprodução, mesmo que parcial, de textos, fotografias ou ilustrações sob quaisquer meios e para quaisquer fins, inclusivé comerciais. www.surgeskateboard.com Queres receber a Surge em casa, à burguês? É só pedir. Através de info@surgeskateboard.com assinatura anual em casinha: 15 euros
Capa: A tua vida corre mal? Não te deixes levar por isso, é tudo uma questão de perspetiva…
Depois desta montagem, a Marvel, a Dc Comics e a Disney já nos tentaram comprar estas personagens todas, mas não tiveram sorte… obrigado pelo dia, malta!
fotografia Renato Laínho
fotografia Roskof
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Sou um hater, como tu. Bem-vindos à realidade. Desde que o Y2K explodiu com o século XX que o skate se tornou numa indústria. Skate é juventude, é rebeldia, é o quebrar da rotina, do normal e comum. E tu? Tu não queres ser rebelde e jovem como skaters? Então sorri porque estás bem na mira desta indústria.
texto e fotografia Afonso Menezes
Nada contra essa imagem já batida do skater que desafia a sua cidade e tudo o que o rodeia à procura da próxima manobra que lhe der na gana dar. É brutal ver como esta subcultura que começou marginalizada serve agora de modelo de negócios multimilionários entre pessoal de fato e gravata que te olha de cima a baixo na rua, mas que ao longo dos últimos anos tem mexido de tal maneira no mundo do skate que acaba com marcas lendárias que nasceram com o skate e que fizeram do skate o que é hoje. Por esta altura, espero eu, já deves estar a par destas mudanças climatéricas no mundo do skate. Viram dinheiro no skate e colaram-se que nem sanguessugas mesmo no núcleo. Fazem produções hollywoodescas com os melhores dos melhores do mundo para dar a crer que se importam com a cultura do skate. Mas aí eles enganam-te. “Epá, mas viste aquele vídeo da ardidas? E aquele outro da Naik ÉseBem? Mesmo brutaaaaaal, meu puto!” - Ya, tens razão, infelizmente tens. Porque pondo de parte esta faceta de hater que qualquer um de nós assume face a esta monopolização do skate, há que dar-lhes mérito. Se eles, sem qualquer ligação anterior ao skate, conseguiram criar toda uma massa porque é que tu não consegues ter um impacto na tua cena de skate local? O que é que te impede de fazeres frente a esses gatos gordos capitalistas e começares a produzir o material para a tua comunidade de skate? Porque o futuro do skate, a favor dos skaters não é enfiarem-se todos num skate parque controlado e usarem o que as grandes marcas vos dão para usar. O futuro do skate passa pela cena local, pela comunidade, pela união entre skaters. Sejam vocês mesmos os donos do vosso futuro! Já imaginaram um futuro sem skateshops? Um futuro onde tenhas que atravessar meio centro comercial para seres atendido numa loja em que quem está por trás do balcão vai perguntar-te se estás alterado se te vê sentado num banco a ler as revistas de skate que têm para lá num cantinho cheio de pó, e vais a ver nem são sequer revistas de skate, mas sim catálogos de roupa clichés à beira mar. Apoiem as vossas skateshops, aquela que criadas e geridas por quem ama os skaters da zona, que os acolhe na loja como se eles estivessem na sua segunda casa, pessoal que skata e que te dá pica para seres mais um daqueles malucos que sofre daquela doença mental de ver manobras onde os olhos do cidadão comum veem algo tão simples como um banco, desta bela doença de o “destruirmos” com um sorriso na cara e umas negras a mais nas canelas. Somos verdadeiramente doentes. Apoiem-nos nesta boa causa, Apoiem a vossa skateshop local.
12 ANTIESTÁTICO
Este frontside wallride do Tiago Lopes tem uma história digna de um filme. Se queres saber já, segue diretamente para o último artigo desta edição…mas leva pipocas. fotografia Roskof
14 ANTIESTÁTICO
Pode não ser o Éder, mas também tem jeito com os pés. Bernard Aragão, footplant, em Vigo fotografia Carlos Muriongo
16 ANTIESTÁTICO
Mais um daqueles spots que só a malta da Maia conhece. Eddy Viterbo, frontside boneless fotografia Renato Laínho
18 ANTIESTÁTICO
Depois deste crooked a passar os dois conjuntos de degraus, os trucks do Adilson foram internados de urgência. Aqui ficam os nossos votos de melhoras rápidas. fotografia Luís Moreira
FELIPE BARTOLOMÉ - OLLIE • PHOTO: SAM ASHLEY
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EMENTA SB
Granda Tour. Este foi um convite irrecusável do pessoal da EMENTA SB, uma vez que a minha vontade de ir conhecer os Açores era enorme já há muito tempo... e mais recentemente um vídeo de pessoal local deu-me a saber que na ilha de S. Miguel há muito para ver e skatar também.
texto e fotografia Jorge Matreno
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EMENTA SB - GRANDA TOUR
O granda tour teve duas missões distintas. A principal, claro, era skatar a ilha de S. Miguel da melhor forma possível, mas também conhecer o que de melhor os Açores têm, que é a natureza em bruto. Voámos para a ilha principal do arquipélago e logo no primeiro dia houve skatada, foi só ir conhecer o sítio onde íamos passar a nossa estadia na ilha, uma fantástica casa mesmo em frente ao mar, na famosa vila de Rabo de Peixe. Ponta Delgada é uma cidade pequena, mas tem tudo para que um continental não se sinta fora de casa e as pessoas por lá são impecáveis. Todos te querem conhecer, a não ser aqueles que, como em qualquer parte do planeta, ficam de muito mau humor caso vás skatar para a frente da porta deles. Sendo os Açores ilhas de origem vulcânica, o relevo é bastante acentuado e a natureza é algo de fantástico. Como ouves naqueles spots publicitários na televisão, a natureza está mesmo em bruto, o que serviu de argumento para produzir muitas imagens que fazem parte do catálogo das roupinhas bem jeitosas que o pessoal da EMENTA SB faz. Nestas ilhas podes experienciar as 4 estações do ano um só dia. Infelizmente, a que menos sentimos foi o verão, de qualquer forma tivemos muita sorte e a chuva não foi um problema, passámos quase sempre por entre ela.
Bruno Senra foi à igreja, mas não foi para rezar… hardlip
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EMENTA SB - GRANDA TOUR
Pelo meio desta épica viagem houve tempo para conhecer algumas partes da ilha e visitámos desde os clichés, como a Lagoa das Sete Cidades, à vila das Furnas. Foi aqui que tivemos uma das melhores experiências de toda a viagem, com uma ida noturna à Poça da Dona Beija para uma quase sessão de SPA, onde uma noite de inverno é passada na rua em águas bem quentes e o céu todo estrelado. Mas falando do mais importante que lá fomos fazer... sobretudo em Ponta Delgada há muito por onde skatar, basta que coloques a tua criatividade e visão de skater a uso e não irás aborrecer-te de certeza. A cidade divide-se pela parte mais antiga, onde tudo é mais pitoresco e o chão, claro, é de calçada, mas também zonas mais recentes, onde a arquitetura e o chão são mais “skater friendy”. No geral há spots com fartura, seja em Ponta Delgada, Ribeira Grande, ou mesmo Rabo de Peixe... e o pessoal de lá gostou mesmo de fazer contacto com skaters. No último dia houve uma grande iniciativa do pessoal da EMENTA com a comunidade skater local no Black Sand Box, com uma tarde repleta de skate com os locais e não só: houve que se deslocasse do continente para ir conhecer a ilha, falamos do Manuel Amaral e do seu pai, que foram uma agradável surpresa!
Tiago Lopes - Front feeble fimPois, de tarde relaxante nas tão perto de nós que Ahhh, Madrid, aquela cidade em Espanha, aqui tão perto, mas ou mesmo tempo tãoDepois longe. de Ouum não? se calhar é situada Furnas, não sabemos é que opelos BrunoFilipes? Será que esta raramente nos lembramos dela como destino para viagens de skate. Serão resquícios de quando éramoscomo governados Senra hoje aindaem teve força para acordar os cada vez que lá vamos malta nova sabe que Madrid já foi a nossa capital? Será que alguma destas coisas importa dia? A verdade é só uma, e dar este backside ollie para destinos exóticos, em pensamos sempre a mesma coisa, “que cidade brutal aqui apenas a algumas horas...músculos e andamos sempre a fazer planos que muitas vezes temos de passar horas até descobrir um bom spot”.
texto e fotografia Roskof
O João Allen já é praticamente “local” de Madrid. Afinal a desculpa de ir visitar a irmã é sempre uma boa desculpa para skatar spots como estes. Backside tailslide transfer
Ponta Delgada tem spots para todos os gostos. AndrĂŠ “Defâ€? Costa, Wallie numa rotunda bem diferente
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EMENTA SB - GRANDA TOUR
O Raphael Castillo deixou a banda fazer a festa, dançou no bailarico, deixou a malta desmontar as coisas e depois foi lá dar este noseslide. Que senhor!
Resumindo, esta experiência foi única, e os Açores são definitivamente um lugar a voltar em breve, só tivemos pena de não ficar mais tempo por lá! No meio de tantos “G’s” que conhecemos em Rabo de Peixe, infelizmente não conseguimos conhecer o Sandro, quem sabe para próxima... Resta-me agradecer ao pessoal da EMENTA pelo convite e por estes “magníficos dias atlânticos”.
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9 Copinhos de leite em Marrocos Por vezes as coisas que estão mais perto de nós são aquelas que mais ignoramos, afinal, estão ali mesmo ao lado, o acesso a elas é quase instantâneo... e por outro lado, sempre que nos pomos à estrada normalmente procuramos o destino mais longe de nós. É a natureza de qualquer skater. Numa destas conversas com os nossos amigos João Neto e Nuno Cardoso sobre viagens ao outro lado do mundo, chegámos à conclusão de que tínhamos um destino bem diferente mesmo aqui ao nosso lado: o Reino de Marrocos. Se bem que alguns de nós já tivessem visitado o reino para férias, uma experiência como uma tour de skate prometia aventura. Escusado será dizer que foi isso e muito mais. O plano era simples: encher a carrinha da SURGE de skaters, guiar até Tarifa, embarcar no ferry e desembarcar em Tânger. Claro que juntar 9 marmanjos todos a horas para não chegarmos a Marrocos às 4 da manhã já por si era complicado e assim convidei a malta toda para dormir umas horas lá em casa de modo a pormo-nos à estrada às 5 da matina. Com a excitação da viagem e com os estômagos cheios de mais – com umas doses do melhor frango assado da margem sul – ninguém dormiu nada e, claro, passei umas boas horas na carrinha a guiar sozinho, enquanto todos ressonavam que nem uns animais ruminantes lá atrás. Só quando chegámos a Olhão para apanhar o último passageiro é que a animação voltou, ou não estivéssemos a falar da lenda, Nuno Relógio. Passados 5 minutos de entrar na carrinha já ninguém parava de rir com as larachas do nosso amigo algarvio e a viagem até Tarifa foi mais como uma noite na taberna com os amigos do que uma viagem de carrinha pela escaldante Andaluzia. E eis que tínhamos Marrocos logo ali do outro lado do estreito, com as colunas de Hércules à nossa esquerda. Gibraltar, ali ao lado, é sempre um cenário imponente quando estás para fazer algo tão básico como andar de skate. Agora sim, a aventura iria começar...
texto Pedro Raimundo fotografia Pedro Raimundo / Luís Moreira
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9COLADOS COPINHOS NODE “100 LEITE MONTADITOS” EM MARROCOS
O Ruben Gamito pode ainda não se orientar com o inglês, francês, ou árabe, mas também quem é que precisa disso quando se fala desta maneira a linguagem universal do skate… kinked frontboard
O espírito marroquino começou logo a fazer-se sentir em Tarifa, com os preços do ferry: uns ofereciam descontos, outros ofereciam mais descontos e, sim, os outros ainda ofereciam mais... uma pequena amostra do que nos esperaria. O Nuno Cardoso não se fez rogado, mandou calar a malta que estava a negociar a coisa para ainda pagarmos mais e trocou as voltas de tal maneira às miúdas das bilheteiras, que mais um bocado de negociações ainda iam pagar-nos para viajarmos. Ficou logo ali oficialmente eleito o negociador da tour! Até um bilhete extra de borla nos deram, não admira que a malta do Norte tenha sempre mais jeito para o negócio que os morcões do sul. Aquilo para que a pessoal do norte não tem jeito é para andar de barco, que o diga o Luís Moreira, natural de Valença, que a cada onda do ferry ficava com aquela cara de quem está prestes a saltar de bungee jumping, com papas de sarrabulho no estômago. Felizmente para ele, a viagem foi de apenas 35 minutos e não foi preciso andarmos a limpar papas dos vidros do ferry.
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9 COPINHOS DE LEITE EM MARROCOS
Só mesmo com o power do marisco de Olhão é que uma pessoa consegue dar ollies por cima de cidades. Nuno Relógio a voar por cima de Rabat.
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9 COPINHOS DE LEITE EM MARROCOS
Marrocos também tem “um Algarve”: Agadir. mas em vez de levarem com os playboys portugueses, levaram com o Kiko Perdigão. Backside wallride
E ali estávamos: Tânger, cidade portuária, famosa pelo que os nossos antepassados andaram lá a fazer e agora uma das mais internacionais cidades marroquinas. Mas esperem... passaram 3 horas desde que chegámos à alfandega e ainda aqui estamos? Ah... claro, Marrocos... basicamente passaram todos os Marroquinos, Chineses, Paquistaneses, etc., à nossa frente e, com esta pinta, deixaram-nos para último, à espera que nos oferecêssemos para pagar para sairmos dali mais rápido. Claro que nós não pagámos nada, ficámos ali a gramar uma grande seca enquanto a polícia fronteiriça de Marrocos olhava para nós com aquela cara, a pedir uns trocos para o café. Desculpem malta, para a próxima vamos pagar-vos essa fortuna de 3€ e assim escusamos de estar 3 horas a secar para passar um portão. Do outro lado dessa barreira, também durante 3 horas esteve o nosso amigo Badr Ek, o nosso guia para esta viagem e também ele amigo do Ali (guardem este nome na vossa memória, mais tarde vão ver porque). E, claro, como quem está habituado a uma realidade completamente diferente, o Badr nem se chateou muito de estar ali a perder tempo à nossa espera. Quando saímos só faltou dizer “despacharam-se muito rápido”. O Badr é dos poucos skaters do norte de Marrocos, e seria na sua cidade natal, Laarache, que iríamos passar a primeira noite. Dizia ele que era ali mesmo ao lado, esqueceu-se foi de nos dizer que só para sair de Tânger de carrinha demorávamos uma hora e que depois disso ainda teríamos que fazer 70 km por estradas, no mínimo, um pouco estranhas. Sim, estranhas é mesmo o adjetivo que quero usar. Depois de uma pequena skatada em Tânger, onde o Ruben Gamito começou logo a “assobiar” manobras, fizemo-nos às estradas do reino. A viagem até Laraache foi um sonho, no sentido literal e deixem-me explicar porquê. É que quando toda a gente se apercebeu de como era o trânsito em Marrocos, fecharam logo os olhos para dormir, assim não tinham que sofrer a ver o que se passava nas estradas por onde passávamos! É que quando vais numa estrada e a primeira coisa que vês é uma mulher a “fazer as necessidades nº2” no meio da faixa de rodagem, antecipas logo o que aí vem. Claro que a pobre mulher tinha razão, pelo menos ali no meio da estrada os faróis dos carros deixavam ver onde caíam os “presentes”. A chegada a Laarache ficou marcada pelo nosso primeiro controlo num checkpoint, seria o primeiro de muitos. Em Marrocos sempre que sais de uma cidade e entras em outra vais ser mandado parar, por isso não inventes muito.
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9 COPINHOS DE LEITE EM MARROCOS
Para chegarmos a este spot levámos com o clássico filme: alguém chegou ao pé de nós e disse que era amigo do Ali… duvidámos por uns instantes, mas felizmente tudo correu bem, inclusive este backside smith do Kiko
A noite seria passada numa das maiores casas onde já estive e num dos piores bairros da cidade, que segundo o nosso amigo Badr é das mais perigosas de África. Deve ser por isso que o Luís Moreira ia tendo 4 ataques cardíacos quando os deixei na casa e demorei uma hora para encontrar um parque com vigia para deixar a carrinha. Dica: em Marrocos se levarem carro, parque é sempre vigiado, senão habilitam-se! Claro que quando o Badr na manhã seguinte nos disse que só daquela cidade tinham saído mais de 1000 combatentes para o Estado Islâmico ficámos muito mais descansados, afinal os “manfios” tinham-se ido todos embora! Ficámos mais aliviados para skatar os spots nas redondezas, pois o próximo destino aguardava-nos. Os spots em Rabat (dispensa-se piadas) são lendários e aquelas Praças de mármore chamavam-nos como sereias para os calhaus.
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9 COPINHOS DE LEITE EM MARROCOS
A viagem para Rabat seria marcada por mais episódios: como vacas despedaçadas por autocarros no meio da autoestrada (eu continuo a achar que a vaca tinha pernas e sapatilhas) mas o Cardoso ia a conduzir e disse que aquele aglomerado de carne, tripas e afins parecia uma vaca, por isso confiamos nele. Claro que quando passas três horas e meia a conduzir enquanto o pessoal faz algo tão estimulante para o intelecto como “jogar às letras” com nomes de skaters é possível que a perceção das coisas mude um pouco. Rabat era tudo o que nós esperávamos e mais, spots em todo o lado, praças que basicamente serviam para pouco mais do que skatar. Uma coisa que percebemos é que em breve a capital marroquina vai ser um paraíso para os skaters: o Rei está apostado em modernizar ainda mais a cidade e por todo o lado há obras públicas gigantes, ou seja: praças, museus, ruas inteiras em mármore estão para nascer ali. Quem também parecia que era natural de lá era o Afonso Nery, isto, claro, segundo os “locals”. Com aquele bronze e aquelas rastas, nenhum marroquino acreditava que o rapaz era de Massamá. “You marrocan”, diziam. Claro que quando ele destrui o mais famoso corrimão de Rabat, lá acreditaram que o rapaz era dos nossos. E eis que chegava a altura do nosso destino mais “turístico”, por assim dizer. Depois de muito planeamento enquanto nos limpávamos todos à única toalha do nosso hostel, em Rabat, decidimos ir até Marrakech, a porta de entrada para o Atlas, uma das cidades mais bonitas de Marrocos,
Geralmente, a malta depois de uma viagem de 7 horas vai descansar assim que chega ao destino. O Ruben Gamito em vez disso foi esticar as pernas com este flip, deve ser assim que a malta de Santo AndrĂŠ relaxa.
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9 COPINHOS DE LEITE EM MARROCOS
É incrível como em todas as cidades Marroquinas existem spots perfeitos. João Neto, Backside Tailslide Nuno Cardoso, o nosso negociador de serviço, não teve problemas em regatear com este spot para acertar o flip crooked pop-out
um poço de cultura berbere e mais sei lá quantos adjetivos. Isto se lá tivéssemos passado mais do que umas horas, devido a mais uma aventura normalíssima em Marrocos... chegados a Marrakesh às tantas da manhã e com as coordenadas gps de mais um amigo do Ali (lembrem-se deste nome), basicamente encontrámo-nos no meio da Medina antiga, o local mais perigoso da cidade, e “do nada” começam a sair pessoas de todo o lado a agarrar-se à carrinha, altura em que o nosso guia, Badr, nos diz “não confio nestes tipos” e de repente acrescenta: “go, go, go, lets get out of here”. A adrenalina disparou e lá arrancámos pelas ruelas com umas dúzias de gajos a correr atrás de nós. Claro que com a nossa sorte, fomos ter a uma praça sem saída e aí podemos dizer que as nossas “ferramentas” encolheram um bom bocado. Marcha atrás e “bum”, um estrondo... um rapaz de mota no meio do chão. Educados, pedimos desculpa e pusemo-nos a milhas dali. Segundo o Romeu e o Kiko Perdigão, os gajos vinham a correr atrás de nós para nos dizer que íamos direitos a uma praça sem saída, mas de qualquer maneira não voltámos para perguntar. Depois de uma noite num hotel à saída da cidade, onde nos recompusemos deste episódio, decidimos seguir até ao “Algarve” marroquino, a cidade de Agadir, onde finalmente iríamos conhecer o Ali Tamara, distribuidor de marcas de skate, guia turístico e, de certeza, o gajo com mais “connections” de todo o Marrocos. A viagem pelo Atlas é incrível, assim como os pastores que encontrámos a 3 horas da aldeia mais próxima e que nos acenavam sempre felizes da vida. Talvez seja esse o segredo da felicidade, pastar ovelhas a 3 horas de pessoas. Agadir já quase nem parece Marrocos, cidade turística e porta de entrada para a zona de surf mais conhecida no país, ali as louras nórdicas já se veem por todo o lado e apesar de ter bastantes spots foi também a zona onde skatámos menos, talvez em solidariedade com a nossa primeira “baixa”. O Nuno Relógio, depois de “assassinar” um corrimão, disse a clássica frase que nunca devemos dizer: “deixa-me dar mais uma” e foi visitar o hospital local com um rutura de ligamentos. Mas nem tudo foi mau em Agadir, o nosso guia Bard perdeu o telemóvel numa praça e quando ligou para ele a ver se alguém atendia, adivinhem, um amigo do Ali tinha passado no local e tinha guardado o dito. Incrível! Outro grande momento em Agadir foi quando fomos abordados por portugueses e quase vizinhos do Relógio no Algarve... e mesmo em frente ao Jardim de Olhão de Agadir! Juro-vos, Agadir tem um jardim chamado Jardim de Olhão, com a placa em Português! Claro que tivemos que tirar foto e quando o Nuno descobriu que afinal aqueles rapazes eram amigos do irmão a casa veio abaixo, estávamos ali quase no Sahara Ocidental e parecia que estávamos em casa. Por falar em casa, finalmente íamos conhecer o Ali e, mais uma vez, num “daqueles” momentos! Ligámos-lhe a caminho do hostel, no meio da montanha e, coincidência, ele ia a passar mesmo ali ao lado, no sentido contrário! Claro que parámos o trânsito todo para lhe dar um abraço mas ninguém nos chateou, afinal estávamos ali com o Ali, não era com um gajo qualquer. Demos-lhe uma garrafa de vinho do Porto – que ele nos disse que bebeu toda nessa noite – e seguimos viagem. Casablanca seria o nosso próximo e último destino. Os spots prometiam, mas uma viagem de 6 horas pela costa marroquina arruinou as esperanças de um último dia de skate. Numa cidade a meio caminho ainda parámos para ver um spot que parecia um Tajim, as típicas travessas marroquinas e fomos descobertos por mais um amigo do Ali: “hello i’m friend of Ali” – foi a frase que ouvimos mais em Marrocos, juro! A viagem de regresso a Tânger já não teve tantos episódios, só apanhámos um carro ligeiro com 8 pessoas lá dentro em contramão na autoestrada, pessoal a pedir boleia no separador central e uns quantos a semear trigo nas bermas. Normalíssimo!
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9 COPINHOS DE LEITE EM MARROCOS
O Nery teve dificuldade todos os dias em provar que nรฃo era marroquino, mas neste dia foi fรกcil. Bastou dar este back blunt Massamรก Style
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9 COPINHOS DE LEITE EM MARROCOS
O Romeo foi de todos nós o que fez mais quilómetros: de Fôz Coa a Agadir. Felizmente, para um viajante nato, quando mais longe, mais liberto se sente, 50-50
Chegados a Laarache despedimo-nos do nosso amigo Badr e pedimos-lhe para mandar cumprimentos ao Ali quando o visse novamente, daqui a 10 anos. As colunas de Hércules estavam já ali ao lado, mas a carrinha, depois de o abuso que lhe demos durante estes dias, quis vingar-se de nós e decidiu fazer-nos empurrar sempre que fosse para pegar, o que só por si deu espetáculo, principalmente quando não conseguimos pô-la a trabalhar para sair do ferry, em Tarifa. Na viagem até casa foram poucas as conversas. Se me perguntarem, acho que cada um estava a lidar com as recordações desta viagem à sua maneira, porque apesar de todas a aventuras e peripécias, se quiserem saber se voltaríamos a Marrocos, tenho a certeza de que todos vos responderão: “Siga, telefonem ao Ali”!
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C L Q U E Gran Canรกria e Portugal
texto e fotografia Michael Kazimierczuk
A
R O V O U !
Charles Deschamps 5-0
Esta foi a minha resposta depois de receber um telefonema de uns gajos, uma semana antes de a dita ser suposto acontecer. 3 voos e 24 horas de viagem depois, aterrei em solo das ilhas Canárias. Ao sacar da morada que me tinha sido dada no dia anterior, com indicação de onde iria encontrar-me com o resto do pessoal, apercebi-me de que não tinha o número do apartamento, num condomínio que teria à vontade uns 50! Sem telefone, ou forma de entrar em contacto com ninguém, acho que tocar aleatoriamente em campainhas às 11 da noite de domingo talvez não tenha sido a melhor ideia. 45 minutos depois sem sorte nenhuma e com várias dezenas de espanhóis furiosos comigo, duas velhinhas amorosas que passeavam o cão tiveram pena de me ver de bagagem à chuva, e ajudaram-me. Sem saber muito mais do que o meu itinerário de voo e quem era o pequeno grupo da viagem, não fazia ideia do que me esperava nos 18 dias seguintes. Se bem que, depois de encontrar o Charles Deschamps, o Jake Cormier, o Johnny Purcell, o Will Marshall, e o Jordan Moss num bar ao cimo da rua, rapidamente percebi que iam ser dias porreiros. Sem agenda, team managers, deadlines, ou planeamento além de um contacto local em cada um dos países, conseguia antever uma boa vibração. A incerteza fazia parte da viagem e isso fez com que andar em escorregas aquáticos abandonados, no meio das montanhas, ou ir para fora de estrada no meio da praia num Defender tenha sido muito mais entusiasmante. Explorar tudo o que as frequentemente visitadas ilhas Canárias e o famoso solo português têm para oferecer ao nosso ritmo, definitivamente fez desta uma viagem despreocupada e cheia de acontecimentos. Os dias começavam tarde, sempre a skatar com sol e aproveitando as super baratas garrafas de tinto, cervejas e café com leite. Era o nosso ritual diário.
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CLARO QUE VOU! - GRAN CANÁRIA E PORTUGAL
Johnny Purcell, Smith para o Flat A condução não foi o nosso forte, enquanto na ilha. Empanámos o carro duas vezes, voltámos a seguir viagem, voltámos a fazer o motor fumar até ao ponto de voltar a encostar. Isto num curto espaço de horas. O Johnny foi nomeado condutor principal, não por escolha própria, mas devido ao facto de todos os outros terem experiência mínima na arte da condução. E a diversão não termina aqui, conseguimos acumular 400 euros multas de parqueamento e ficámos a segundos de ter o carro rebocado. Tudo isto em apenas dois dias. Felizmente para o Johnny e para nós, durante a nossa estadia em Portugal o Pedro tomou conta de tudo o respeitante à condução e parqueamento, senão sabe-se lá em que outras alhadas nos teríamos metido.
Jake Cormier, Ollie Wallride O calçadão não nos era propriamente estranho. A um quarteirão de distância de nossa casa, passámos muitas manhãs e noites junto ao oceano, umas mais memoráveis do que outras. Numa dessas noites, tivemos a brilhante ideia de fazer uma fogueira na praia super bem iluminada, mas rapidamente percebemos que a ideia não era assim tão brilhante. Depois de discutirmos com alguém da limpeza das ruas extremamente zangado, numa língua que ninguém percebia, rapidamente fomos corridos pela polícia antes de acendermos a fogueira e antes mesmo de conseguirmos sequer arranjar um isqueiro.
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CLARO QUE VOU! - GRAN CANÁRIA E PORTUGAL
Charles Deschamps, Kickflip O Charles foi o cabecilha por trás da organização desta viagem. Desde juntar o pessoal todo, a fazer as marcações no Airbn’b e encontrar os contactos locais. Estava sempre tudo controlado, especialmente quando se tratava de fazer as sanduiches para o pequeno almoço.
Charles Deschamps, Boardslide up. Lisbon Foi uma sensação de tristeza deixarmos a ilha da Gran Canária sabendo que provavelmente não voltamos. Se calhar até é bom não voltarmos, dada a quantidade de multas de parqueamento por pagar. Sem sabermos nada sobre Portugal e sem grandes expectativas, rapidamente percebemos que regressávamos ao paraíso. Aqui as nossas fogueiras na praia tiveram muito mais sucesso!
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CLARO QUE VOU! - GRAN CANÁRIA E PORTUGAL
Aquecimento matinal Ficar a menos de um quarteirão da praia, tanto em Portugal, como em Gran Canária foi perfeito. Os cafés da manhã na praia foram obrigatórios, os mergulhos no oceano Atlântico fizeram com que as pernas cansadas se sentissem um pouco mais frescas... isso e as vistas das surfistas que por ali andavam. Contudo rapidamente ficámos a conhecer o poder do oceano ao ignorar as bandeiras de aviso numa praia vazia e com um grande vendaval. É meio caminho andado para ouvires uns belos apitos de um nadador-salvador. Se calhar, correntes fortes e uma montanha de medusas talvez não sejam as condições ideias para andar a nadar no mar. Só mesmo um grupo de skaters para ser expulso do oceano.
Enquanto o Johny Purcell acertava este switch backside smith em Lisboa, o Pedro e o segurança do edifício estavam a trocar galhardetes nada simpáticos. Não percebi bem o significado das palavras mas começam por “filho de qualquer coisa”. Felizmente não estivemos ali muito tempo e assim que ele deu a manobra fomos embora a rir, enquanto o segurança continuava aos gritos… skaters 1 seguranças 0!
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CLARO QUE VOU! - GRAN CANÁRIA E PORTUGAL
Will Marshall Kickflip Front Noseslide
Cervejas ao por do sol Houve dias em que o skate não estava definitivamente no topo da lista de prioridades. Além disso, com as chaves de um Land Rover 4x4 nas mãos em Portugal já podem adivinhar o que é que nos passava pela cabeça. Enfiar 6 gajos num jipe com 2 lugares era obra, mas seguir assim para fora de estrada é algo mais! Acentos em ferro na parte de trás com uma espécie de jaula a dividir-nos dos acentos normais e subir montanhas rochosas nestes preparos podemos dizer que não é do mais confortável que já experienciámos. Foi um misto de riso e gritaria de dor. Depois disto e de algumas cervejas, estávamos mais maltratados do que se tivéssemos passado o dia a skatar, mas sempre com sorrisos de orelha a orelha.
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V - e Mr ta l Am t o t a c k
texto e fotografia Roskof
Acabadinhos de chegar à mítica cidade de Malmo, na Suécia, deparámo-nos com a melhor t-shirt de sempre no corpo de um miúdo que ainda nem sabe para que servem as bolas que tem entre as pernas. “Keeping vert dead since xxxx” ou seja “A manter o Vert Morto Desde xxxx”. Como qualquer skater que se preze, adoramos sarcasmos e este, realmente, faz todo o sentido. Na era dos campeonatos milionários de street, o vert skate foi durante muito tempo relegado para um segundo plano da cena internacional. Raios, até nos vídeos a maior parte da malta passava as partes de vert ou rampas à frente e aquela que é uma das vertentes mais espetaculares do skate tem sido um pouco negligenciada. Mas uma coisa é certa, qualquer pessoa que veja uma sessão de vert skate à séria nunca mais se vai esquecer na vida. Quando tens no mesmo local lendas como Rune Glifberg, Mike Frazier, Darren Navarrete, Neil Hendrix, JMag, Nicky Guerrero e os skaters da nova geração, como Jimmy Wilkins, Chris Russel e Clay Kreiner, as coisas tomam proporções épicas.
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VERT ATTACK X
Robin Bolieu - stalefish
Jmag - Backside air
Jackie Olson - kickflip indy
Como se não bastasse termos as lendas e os melhores vert skaters do momento, ainda estávamos num dos melhores lugares do mundo para ver e andar de skate, o Bryggeriets Gymnasium, um liceu onde podes fazer o 12ª ano sempre a andar de skate, mas sobre isso vamos voltar a falar em breve na SURGE. Esta décima edição do Vert Attack prometia ser uma das melhores de sempre e segundo os “habitués” foi mesmo: com concertos de bandas míticas como Grindline the band, com exposições de fotografia, palestras de fotógrafos como o Bryce Knights, com a apresentação do livro de “La Kantera”, com a presença do Fernando Elvira e do Javier Mendizabal, o espaço parecia, literalmente, um pequeno universo do skate ali concentrado em 1000 m2. Mas se houve algo que nos impressionasse, e muito, foi a quantidade de miúdos, graúdos e miúdas e graúdas a skatar, não só no circuito de street, mas também na ramp de vert. Quando vês uma miúda de 10 anos a dar inverts numa rampa de 5 metros de altura é garantido que vais ficar com cara de parvo a olhar para aquilo. Mas, felizmente, tens mais 500 pessoas ali contigo na mesma posição, por isso não te vais sentir muito mal.
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VERT ATTACK X
Brighton Zeuner - rock and roll / invert
Tate Carew - no hands frontside flipÂ
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VERT ATTACK X
Clay Krener - Stalefish
No fim do campeonato o Clay Kreiner provou que a ele as proteções só estorvam e só não voou mais alto porque o teto do pavilhão não deixava. O Neil Hendrix provou que os 40 e muitos são os novos 18 na classe masters, a Alana Smith que aos 14 as mulheres também voam e o Tate Carew, aos 12, lembrou à malta do open que com 13 talvez já os venha a limpar a todos. Quando abandonámos o pavilhão para seguirmos para casa no fim do dia, só nos lembrávamos da t-shirt do nosso pequeno amigo, mas com uma certeza: se o vert morto está assim, salve-se quem poder quando ele ressuscitar. Se o vert está morto, viva o vert!!
Clay Krener - 540 O luso-brasileiro Gabriel Machado - frontside method
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U V “ P R
M I A E O
A A B D S
G O R E
E M U T ” O I R O
Depois de um ano, muita coisa mudou para um dos melhores skaters nacionais. Finalmente surgiu a oportunidade de uma primeira tour lá fora e o Pedro Roseiro não deixou os créditos por mãos alheias, aproveitou a oportunidade e mostrou como se destroem spots à boa maneira portuguesa. Podemos não perceber o simbolismo desta estátua, mas um frontside flip destes é das coisas mais simples de compreender – Pedro Roseiro
intro SURGE entrevista Roskof fotografia Vincent Legoux
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UMA VIAGEM “ABOUT” PEDRO ROSEIRO
Tom Belot - Crailslide
Mais barato do que ir a Paris nas lowcosts, só mesmo apanhar boleia nas Pedro Roseiro Airlines. Stalefish
Pelo que sabemos este é o teu primeiro tour com a malta da About certo? Ya... foi mesmo. Já esperava há um tempo para que isso acontecesse! Ahah
mim. Desde então comecei a trabalhar para eles, fiz um welcome vídeo, mais alguns clips e fui agora a esta tour em França.
Esta é uma pergunta para a malta nova também perceber como as coisas funcionam, como é que do Estoril conseguiste entrar para uma marca Francesa? Não fiz praticamente nada... ahah Quando o grupo Hoff criou a marca AboutSkateboards, o representante português e os gestores do grupo queriam que houvesse um rider em Portugal, daí o Jorginho ter estado andar para eles durante algum tempo. Assim que o team foi renovado, o representante em Portugal, que já me conhecia, apostou em
Como é que o resto da malta do team te recebeu? Já os conhecias, foi na boa, ou só quando te viram a andar é que perceberam quem tu eras? Epah... eu só conhecia alguns e pelo nome e eles também. Esta tour tinha por objetivo fazer com que o pessoal se conhecesse melhor e criasse amizades. Fui super bem recebido, curtimos à grande, cheios de pica. Os mais novos, já se sabe como são, pilhas elétricas, completamente! Ahah Já há um tempo que não tinha assim tanta pica para filmar e streetar.
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UMA VIAGEM “ABOUT” PEDRO ROSEIRO
Antes do tour falámos e estavas na expectativa sem saber muito bem ao que ias, correu bem, superou as expectativas, deu-te pica para fazeres mais coisas? Mesmo! Não sabia muito bem para o que é que ia. Só sabia que ia ter a Paris. Não sabia onde ia ficar, por onde ia andar! Desde o início da tour só sabia onde estava assim que chegava a uma cidade Ahah Andava à deriva e para onde me levassem eu estava feliz e com pica para skatar! Logo, todo ambiente e todos os momentos que passámos durante esses 10 dias valeram bem a pena! Em relação aos skaters da marca, a maior parte deles são franceses e bastante jovens, que diferenças viste entre eles e os putos do skate portugueses? Sim, quatro deles eram mais novos, e a onda deles é basicamente: “i don’t care about nothing, only skate!” Bué tranquilos, uns mais tímidos que outros, para não falar que ripavam todos os bowls e pools que encontrávamos!! Até manobras me ensinaram Ahah. Muito fixe.
Pedro Roseiro num nosegrind para francês ver…
Pelo que vimos das fotos que nos chegaram foste o skater que produziu mais, curtiste os spots ou estavas mesmo a precisar de algo novo? Sem dúvida que precisava de novos ares! Estando no mesmo sítio por muito tempo acabas por ficar farto dos spots e por vezes, que é o que me acontece, nem pica para andar tenho. Mas lá renasceu qualquer coisa Ahah Basicamente, cada spot a que íamos eu estava cheio da pica e sacava um toque! Sabemos que recentemente tiveste mudanças a nível de patrocínios, achaste que estava na altura de mudar algo? Senti que onde estava não evoluía nem me davam o devido valor. Ficarei agradecido por todo o apoio que me deram, claro, mas chegou a uma altura em que tive que pensar em mim, no que queria e poderia ter. Como não havia possibilidade para me manterem tive que sair com o meu orgulho. Em Portugal os apoios são tão fracos, que pensei... eu mereço mais do que o que me dão e por isso não vou estar à frente de uma marca só porque me dão meia dúzia de coisas. Essa meia dúzia ajudava bastante, material e algum budjet. Mas, pessoal... valorizem-se!
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UMA VIAGEM “ABOUT” PEDRO ROSEIRO
Eles bem que metem o corrimão mais longe, mas isso não lhes serve de nada. Roseiro – gap para crooked
Kevin Ozcan – Backside wallride
Tom Belot - Boneless
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UMA VIAGEM “ABOUT” PEDRO ROSEIRO
E se o Roseiro desse neste spot um back tail a subir? Era altamente, não era?… Epá, espera aí!
Projetos para 2016? Este ano tenho vários vídeos que quero fazer! Tenho muito que skatar... quero fazer uma vídeo parte para o Bana e para a Muckefuck. É claro, fazer um entrevista minha aqui pr’á SURGE...ahaha... Já se fala há tanto tempo nisso, que vai ser este ano a concretizar-se!
Últimas palavras? As minha últimas palavras começam por dizer o que disse no final da penúltima resposta. De seguida, que aproveitem todos os momentos e oportunidades que o skate vos poderá trazer. Não sejam anhados, mexam-se e trabalhem! Obrigado à SURGE pela oportunidade de partilhar esta primeira tour da About, que venham mais e boas, sem lesões. Eu, independentemente de tudo, cá estarei!! \m/
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Texto SURGE fotografia Afonso Castella / João Mascarenhas / Luís Moreira
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PRÉMIOS SURGE 2016
Sinceramente não sei que se passa neste país, quanto mais há necessidade de fazer coisas diferentes para desenvolver todas as demais regiões, mais difícil é fazer coisas se não for em Lisboa. Desde o nosso infame lançamento da SURGE em autocaravana por Portugal fora, há 7 anos que encaramos todas as regiões de forma igual e os Prémios SURGE são mais uma prova disso. Depois do Porto e Leiria, escolhemos, agora, Faro para o nosso evento anual. Há quem diga que somos a “gala mais chunga” de Portugal, que não temos classe, que se não for em Lisboa não é interessante para dar retorno aos patrocinadores, blá, blá, blá... os eventos dão retorno onde quer que sejam feitos, assim sejam devidamente comunicados, produzidos, com alma, afinco, e assim o dite o público. Já o tínhamos dito ao microfone em Faro e voltamos a escrevê-lo nestas linhas, estamos completamente a marimbar-nos para esse argumento. Skate é skate em qualquer lado, não obrigamos ninguém a estar presente, não nos chateamos se não forem e ficamos contentes com quem aparece. E são muitos! Como vais poder ver nas fotos deste artigo, não há nada que pague o prazer de, pelo menos uma vez por ano, ver a malta toda junta, de puxar um bocadinho mais a corda, de juntar a nossa comunidade apenas com um objetivo: apoiarmos todas as partes que se esforçaram durante o ano para produzir coisas – os skaters, as marcas, as lojas, os fotógrafos, os filmers, os velhos e os novos. Sim! Não nos contentamos apenas em “comer” o que vem de fora! Obrigado à Element, Volcom, DC Shoes, Ericeira Surf & Skate, Cabaret, Palácio do Tenente, Hostel 1878, Câmara Municipal de Faro, a todos os presentes e a todos os ausentes que sabemos que gostavam de ter estado! Para o ano há mais? Ah, podes ter a certeza disso. Será em Lisboa? De certeza que não!
O “patrão” de Almada, Fábio Diniz, na primeira manobra de sempre neste novo spot algarvio… frontside board, horas antes de levar para casa o “caneco“ de Espalho do Ano. Épico.
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PRÉMIOS SURGE 2016
Exposição fotográfica Surge no Palácio do Tenente
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PRÉMIOS SURGE 2016
Espalho do Ano – Fábio Diniz Dar o nome a uma manobra é algo apenas ao nível das lendas, dar um nome a um espalho é algo apenas para os deuses... desdentados! O “Fábio” do Fábio Diniz foi o grande vencedor da categoria Espalho do Ano e ele promete que para o ano estará na luta por esta categoria novamente. Mal podemos esperar! Foto do Ano – Ruben Claudino Numa analogia que pode ser usada para muita coisa do que se vê no skate atual, não é por dares triple mctwists de um prédio abaixo que vais conseguir a melhor imagem. Por vezes as coisas simples são as que saltam mais à vista e a fotografia captada pelo Ruben Claudino de uma manobra tão simples como um kickflip no chão foi a vencedora. Bom trabalho, dupla Claudino/David. Vídeo do Ano – Banquete Ementa SB Soubemos que depois de ver o vídeo da Ementa a malta da Lucas Films já contratou o Emídio Silva para tratar dos efeitos especiais do próximo capitulo da saga Star Wars e o Nikita Gorev para o papel de Chewbacca. Banquete foi o momento cinematográfico do ano e ganhou o òsca... desculpem, Prémio de Vídeo do Ano Loja do Ano – Kate Skateshop Estamos a pensar acabar com este prémio, isto está viciado, ganha sempre o mesmo...
Não interessa se os corrimões são redondos, aos “ésses”, ou às bolinhas. O nosso Skater do Ano 2016 dá conta deles todos… João Allen, Backside lipslide
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PRÉMIOS SURGE 2016
“combíbio” e jantar da malta antes da festarola
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PRÉMIOS SURGE 2016
Puto do Ano – Guilherme Lima A nova geração não está a dormir e os “velhinhos” que se metam a pau, o Gui já vai correr o Circuito Nacional em Pro neste novo ano, por isso quando o chamarem de “puto” é melhor ser com respeitinho! Figura do Ano – Gonçalo Lopes Quando alguém acredita no que faz, gosta, dedica-se, está-se nas tintas para o que outros pensam e faz por promover o skate nacional, para nós é, sem dúvida, uma das Figuras do Ano. Mentor da única zine nacional de skate, a Patinho Feio, o Gonçalo é das pessoas que conhecemos que mais se preocupa com o skate e com os skaters nacionais, por isso mesmo só podia levar o maior par de “bolas” para casa. 3ª idade do Ano – Nuno Relógio O Nuno quase chorou de tristeza quando lhe demos o prémio 3ª idade, depois lá lhe explicámos que este prémio não é para quem está em final de carreira, é sim para os que já cá andam há muito tempo, a fazer as suas coisas, a sua vida, e ainda continuam a partir a louça toda. Não te preocupes, Nuno, para o Prémio Carreira ainda te falta muito! Prémio Carreira – Marco Roque Um dos mais carismáticos skaters nacionais, oriundo de Castelo Branco, foi dos skaters mais importantes da sua geração. Continua a trabalhar com o que sempre gostou e a ajudar a nova geração de skaters a encontrar o seu espaço neste meio competitivo. Obrigado, Marco, continuas a inspirar-nos! Skater do Ano – João Allen Igual a si mesmo, o skater que vê spots onde os outros não veem nada foi dos que mais e melhor skate produziu em Portugal ao longo do último ano. Apesar de muitas vezes nos dizer que nem sabe andar de skate, os seus “colegas”, o público, raios, até a Thrasher acha que foi, sem dúvida, o Skater do Ano em Portugal. Por isso, obrigado pais do Allen, nenhum laboratório de genética conseguiria criar um skater destes!
Enquanto a maior parte abanava a cabeça e dizia que ele era “tolo”, o João Allen dava este ollie a aterrar no buraco da agulha com a maior das descontrações… pois, meninos, não é para todos.
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PRÉMIOS SURGE 2016
Um dos momentos altos do fim de semana foi a estreia em Portugal de “Holly Stokes – a Real Life Happening”, o último vídeo da Volcom, também com Portugal em destaque, com Kyle Walker, Dan Van der Linder e Dan Burman a skatar os nossos spots! E claro que também não é todos os dias que se vê imagens de drone da Trafaria num filme à escala mundial. No discurso emocionado antes do filme, o Helder Ferreira, da Volcom Portugal, chamou mais uma vez a atenção para as responsabilidades que todos temos em defender o skate nacional… ouviram, meninos? Todos!
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Minutos antes deste 360flip do Afonso Nery os locais de Olhão diziam que não havia ali spots de street, imaginem se houvesse.
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fotografia Roskof entrevista Joana Raimundo
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Como nasceu a personagem Kruella d’Enfer e o que a distingue da Ângela Ferreira? A Kruella nasceu numa fase muito confusa na faculdade, em 2010. Não me sentia realizada no curso de Design de Ambientes, nas Caldas da Rainha, e precisava de encontrar um foco. Estar nas Caldas ajudou bastante a encontrar um caminho mais ao meu gosto porque a cidade tinha um espírito criativo tão forte que era visível em todo o lado, na rua, na escola, nas casas das pessoas. Isso resultou na vontade de começar a desenhar mais, experimentar novos materiais, fazer instalações e colaborações com outros artistas e com isto criar uma personagem que definisse esta nova fase, a Kruella.
Entre murais, telas, esculturas, tens preferência no tipo de projetos que desenvolves? Não tenho preferência entre nenhum estilo específico porque gosto desde sempre dos desafios de trabalhar com um suporte novo e aprender sobre esse material, ou suporte. Para mim também é importante manter um equilíbrio com estes diferentes suportes, porque assim nunca me aborreço de estar só a pintar paredes, ou papel, ou só trabalhar no computador. Não sou pessoa de ficar presa àquilo que sei fazer melhor porque me sinto mais segura a fazer determinado tipo de coisa. Sinto que cresço e aprendo mais e melhor se for variando entre técnicas.
Foi nessa altura que começaste a pintar paredes, ou já vem de trás? Também foi uma das coisas que comecei por explorar nas Caldas. Fui conhecendo algumas pessoas relacionadas com o mundo do graffiti, que pintavam só por brincadeira, nas fábricas abandonadas (sim porque o termo street art ainda era completamente desconhecido em Portugal). Eu nesta fase queria era experimentar de tudo um pouco, alargar conhecimentos e técnicas para mais tarde aperfeiçoar as que mais gostasse. Uma das razões para ter pintado com mais frequência com sprays foi o facto de ter conhecido o Akacorleone, meu namorado, que vinha do graffiti e, portanto, em vez de irmos para a praia íamos pintar os nossos nomes nessas fábricas. Belos tempos.
Em 5/6 anos passaste de exposições em Portugal a colaborações e participações a nível internacional – como tem sido lidar com este salto? É muito natural dares este salto, principalmente hoje em dia com as redes sociais. Em 2010 não era tão fácil, acho que tinha uns 100 seguidores na minha página de facebook e muito pouca gente divulgava o seu trabalho lá fora. Lembro-me que o que usava mais era o Flickr e recebia alguns convites para participar em fanzines internacionais. Hoje em dia parece estranho, mas foi assim que o meu nome se foi espalhando para outros convites que foram surgindo, exposições coletivas, festivais de arte urbana... umas coisas levam às outras, o importante nessa altura, tal como hoje em dia, é mostrar trabalho, mandar emails e ser persistente.
Entre os teus projetos encontra-se também trabalho comercial e, entre os teus clientes, marcas como a Carhartt, Nike e Reebok - enquanto “sneaker freak” como foi trabalhar com estes gigantes? É um plus gigante quando recebo convites relacionados com as marcas com que me relaciono e de que gosto. Sou uma sneaker addict assumida e gosto de divulgar também esse meu lado. Acho que o facto de conseguir colaborar com estas marcas deve-se ao facto de também mostrar que as uso e que fazem parte do meu estilo. É uma coisa em que nunca tinha pensado mas que tem toda a lógica, a imagem que eu passo, do meu lifestyle, dos meus interesses mostra um pouco daquilo que são os meus gostos pessoais e isso leva a um interesse mútuo de colaboração com certas marcas. Para além dos personagens e ambientes fantásticos que desenvolves, também exploras muito a tipografia. Exemplo disso é a tua recente exposição com os Halfstudio, no Village Underground Lisboa. Como nasceu esta colaboração e essa ideia da “divisão totalmente pensada e decorada como se fosse a sala dos nossos avós, avós estes que ouvem por exemplo Kendrick Lamar, Wu Tang Clan ou Black Sabbath“? O projeto de tipografia, no caso da exposição com os Halfstudio, por exemplo, é um projeto meio paralelo. O meu forte não é a tipografia, sempre foi a ilustração, tudo aquilo de que precisava
com tipografia pedia ajuda ao Pedro (Akacorleone), porque ele sim, desenha letras com a maior facilidade do mundo. Este projeto que tenho de desenhar letras de músicas sobre quadros antigos, que encontro em feiras de velharias ou lojas de segunda mão era algo que queria criar meio por brincadeira. Claro que estas “brincadeiras” tiveram um ótimo feeback, entre elas foi o quadro do Drake, que fiz para colocar numa parede no meio do Bairro Alto e que coincidiu propositadamente com o projeto do “Coming Out”, do Museu de Arte Antiga. Portanto isto tudo resultou recentemente numa exposição só dedicada a isso porque senti que com os Halfstudio, que são um coletivo totalmente dedicado à tipografia e são também meus amigos, iria funcionar na perfeição. O objetivo deste meu projeto nem é tanto o de trabalho de tipografia em si, mas o da ligação ao mundo da música, maioritariamente usando letras de hip hop de bandas de que gosto, com estes quadros clássicos que estão esquecidos nas lojas de antiguidades.
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KRUELLA D’ENFER
Ao longo deste tempo, tu e o Pedro Campiche - AKACorleone - têm sido uma dupla imbatível. Para além das participações conjuntas em vários festivais e exposições, desenvolveram a Steppin’ Stone. Podes falar-nos um pouco deste vosso projeto? Eu e o Pedro sempre tivemos vontade de criar projetos com que nos identificássemos e que eram vitais também para termos algo com o nosso cunho pessoal sem haver clientes por trás. A Steppin’ Stone resultou disso mesmo, da vontade de criar uma marca sobre a qual só nós é que tínhamos controlo, sobre os materiais a usar, sobre as ilustrações, sobre a imagem do site, sobre a própria promoção da marca. Claro que isso tudo envolve muito trabalho e ao longo do tempo fomos pondo um pouco de parte por causa dos nossos projetos pessoais. Hoje em dia o site Steppin’ Stone funciona como loja online para prints, ou edições que vamos lançando a nível pessoal e não tanto com edições pensadas de raiz para lá. Um dia destes estará de volta. Recentemente fizeram também curadoria do festival “Tons da Primavera”, em Viseu. Como foi a experiência? Aceitámos com entusiasmo o desafio, porque sabíamos que poderíamos escolher um bom grupo de artistas para intervirem na cidade, assim como as paredes onde intervir. Houve algumas dificuldades, porque nunca tivemos um projeto de curadoria e responder todos os dias a emails não só dos nossos trabalhos pessoais, como a todas as dúvidas que iam surgindo não foi fácil, mas no final e depois de estarmos todos em Viseu, correu tudo bem e sentimos que o objetivo foi cumprido. Pelos ótimos trabalhos, pela Câmara Municipal também ter apoiado constantemente, pela bela semana que passámos com todos os artistas e pelo ótimo feedback que tivemos de toda a gente. Relativamente ao estado da arte urbana em Portugal, parece que está a haver uma mudança de mentalidades. Aliás, recentemente o AKACorleone defendeu o seu trabalho como “muralismo,
(...) arte no espaço público” em vez de “graffiti (...) um ato ilegal, um ato de protesto”. O que achas do rumo que as coisas estão a tomar, da aceitação (ou não) deste novo movimento de arte? A arte urbana está cada vez a ter mais aceitação por Portugal inteiro, já não é só em Lisboa ou no Porto. Lá está, as pessoas veem a arte urbana como um “combate” ao graffiti mas a verdade é que há espaço numa cidade para tudo. A arte urbana normalmente é feita em paredes legais, com outra escala, procura ser divulgada e que as pessoas até possam fazer perguntas aos artistas, ver o processo de trabalho, aprender e apreciar. O Graffiti não quer ser nada disso, não quer divulgação, não quer espetadores, não quer paredes legais. Portanto seguem caminhos diferentes apesar de terem as mesmas bases. É isso que é muito questionado hoje em dia, no que toca a aceitação deste movimento e que as pessoas têm que perceber: A arte urbana só está a ser aceite desta maneira, porque não é graffiti, mas também ninguém está aqui em guerra, nem em combate. Os muralistas não estão a tirar espaços aos writers nem vice-versa, nem ninguém é melhor que ninguém, há espaço para todos. Como vês a nova geração de ilustradores e artistas visuais em Portugal? Tenho pena que alguns ilustradores ainda não consigam viver do que fazem em Portugal, mas orgulho-me sempre de ver que muitos não desistem e conseguem. Acredito que também as gerações mais novas venham muito melhor preparadas para o mercado de trabalho e, portanto, isso dê lugar a novas linguagens e seja também uma motivação extra para mais pessoas arriscarem e seguirem os seus sonhos ao verem exemplos bem-sucedidos. Fico feliz de conhecer ilustradores com tão boa qualidade e principalmente de poder ajudá-los nem que seja com dicas porque é importante haver este tipo de ligações com quem já tem alguma experiência. Para mim foi crucial falar e trocar experiências e ideias com outros artistas e espero poder fazer o mesmo pelas gerações mais novas.
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KRUELLA D’ENFER
Que artistas tens seguido e/ou te têm inspirado, recentemente? Ainda bem que perguntas recentemente, porque os artistas que me inspiram estão sempre a mudar. Neste momento até tenho mais ilustradores e artistas femininas do que masculinos, o que tem a sua piada. 3 nomes: Adoro a Mercedes Bellido, porque acho que estamos no mesmo universo e abordamos os mesmos temas; Adoro a Katie Scott a nível de ilustração científica com um twist, é a melhor; Adoro a Sara Andresson, a nível de ilustração, acho que é um génio, tal como o Parra é, que com uma paleta de cores limitada consegue chegar à perfeição. Ok, agora uma pergunta em 3 partes: Qual foi o projeto que te deu mais gozo até hoje, qual foi o projeto que mais te assustou e qual foi o que representou o maior desafio? Tem piada, posso responder às 3 com a mesma resposta? Tailândia. Ir pela primeira vez para Bangkok a convite de um festival de arte urbana em 2013 começou por ser assustador, porque nunca tinha viajado para a Ásia até então, porque nunca tinha recebido um convite do género, porque nunca tinha pintado uma parede e porque era bastante insegura com o meu trabalho. O maior desafio foi mesmo todo o processo de pintar uma parede, com 40º, no meio de Bangkok, numa grua, tudo coisas que nunca tinha feito antes, portanto podes imaginar. Claro que foram os 15 dias mais incríveis de sempre, estava no meio de um grupo de artistas internacionais que admirava, criei amigos novos, adorei o resultado da minha parede, a maneira que fui tratada, a cidade é, sem dúvida, a mais fascinante e louca de sempre, gostei tanto de tudo que decidi ir para lá viver 6 meses com o Pedro 2 anos depois. Enquanto artista visual e ilustradora, existe alguma espécie de projeto que gostasses de experimentar mas, por qualquer razão cósmica, nunca chegou a acontecer? Eu sei que foge do registo enquanto artista visual e ilustradora, mas o meu maior objetivo é um dia conseguir conciliar a música com a arte de alguma maneira. Adorava saber produzir música
e/ou tocar bem algum instrumento. Já tentei em criança mas não me interessei 100%. Já tentei ser DJ não correu bem. Sei que gosto imenso de música e estou sempre a fazer playlists para ouvir quando trabalho, para alguma festa, para diferentes moods durante o dia, para o verão, para o inverno. Sei que um dia me vou dedicar a isso, sei que vai influenciar ainda mais o meu processo de trabalho enquanto artista, porque para mim um elemento não vive sem o outro. Que projetos tens na manga para nos apresentar num futuro próximo? Não gosto muito de desvendar o que aí vem ou o que aí pode vir porque nunca é certo. O que acho que vou fazer para a semana pode nunca chegar a acontecer, mas espero que continuem a surgir mais convites, mais desafios novos, mais viagens em trabalho, mais contactos e mais colaborações. E sendo esta uma revista dedicada ao skate, como vês esta relação de complementaridade entre o skate e a arte? A ligação entre a cultura do skate e da arte é bastante natural, são dois elementos que se complementam. Eu vejo as tábuas de skate como algo que marca a diferença entre os skaters, pela própria customização da tábua. Daí surgem também as colaborações entre artistas e skaters, para customizações ou live-acts em eventos do meio. Cada tábua tem uma história e há quem as colecione tal como se de uma coleção de arte se tratasse. Os próprios skate parques estão pintados de uma ponta à outra com graffitis feitos pelos skaters que o frequentam. Portanto eu vejo isto quase como uma relação de irmãos que cresceram juntos, que sempre se deram bem e em que ambos colaboram e promovem estas duas culturas. Para finalizar, o que faz a Ângela quando não está em modo Kruella? A Ângela quer estar com amigos, divertir-se, estender-se no sofá, ou numa sombra na relva, ser feliz e comer bem. Não é o que todos queremos também?
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20 coisinhas muito pequeninas que te fazem andar muito rapidinho
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1 Bones Swiss Bearings - 49.90€ 2 Bones Superreds - 30.40€ 3 Enjoi Abec7 - 26.80€ 4 - Bronson g3 - 28.60€ 5 - Baker Abec 5 - 21.40€ 6 - Andale Bearings Abec7 - 26.80€ 7 - Andale Bearings Swiss - 44.80€ 8 - Girl Blue Abec3 - 21.50€ 9 - Girl Gold Abec 7 - 26.80€ 10 - Shakejunt Abec7 - 25.80€ 11 - Spitfire Classic Abec5 - 21.40€ 12 - Spitfire Burners Abec7 - 25.00€ 13 - Chololate Abec7 - 26.80€ 14 - Flip HKD Abec 5 - 23.40€ 15 Pig Abec5 neon - 25.00€ 16 Lucky Abec 5 - 23.40€ 17 Zero bearings Black Widow - 26.80€ 18 Toy Machine - Transistor Abec 7 - 6.80€ 19 Speed Demons Abec 7 - 22.00€ 20 Indy Abec 7 - 22.90€
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T o q u e Por vezes no skate vivemos momentos de pura magia, mas ao contrário dos mestres da ilusão, o nosso palco são as ruas, a nossa satisfação substitui o som dos aplausos e a maior recompensa passa por vezes por vermos outros a superar o que nós tanto nos esforçamos por alcançar. Este momento vivido pelo João Allen e pelo Tiago Lopes numa tarde cinzenta em Lisboa vai, durante muito tempo, marcar não só a eles mas também a mim que tive a oportunidade de poder documentar algo de extraordinário. Certamente te lembras do backside wallride do João Allen no pilar da estação de metro da Cidade Universitária, se ainda não o viste mexe esse cú e procura na net “Duo”, o mítico vídeo de skate nacional feito pelo Vasco Neves. Essa manobra não só termina o vídeo, mas também teve destaque em revistas e sites internacionais. A bem dizer, só mesmo um skater como o João Allen poderia lembrar-se de algo assim. Por isso, foi mais por curiosidade que, a caminho de um outro spot nas redondezas, o Tiago Lopes quis ver esse spot, afinal estávamos ali também com o homem que tinha tirado um coelho da cartola com aquela manobra. A primeira impressão do Tiago foi “como é que é possível? Isto ao vivo ainda parece mais impossível do que no vídeo” O Allen sorriu e eu disse “ok, siga para o próximo spot?” Mas o Tiago pôs o skate no chão e disse “deixa-me só ver como é possível”. De seguida deu um ollie no flat e rolou novamente na direção do pilar, mais uma vez a abanar a cabeça e rir-se na nossa direção. De repente volta atrás, mete o skate no chão e tenta mandar-se de frontside ao pilar. O Allen sorriu disse “bom, essa era mesmo louca”. E eu continuava ansioso para ir ao spot que tínhamos em mente, o sol já se punha e o dia ainda não tinha rendido nenhuma manobra. O Tiago volta atrás, tenta novamente e a nossa reação foi: “Ai, queres ver que ele quer mesmo dar isto?” Perguntei-lhe: - “Tiago, achas que vale a pena tirar a máquina da mochila?” - Ele encolheu os ombros e respondeu: “epá se calhar vou tentar mais algumas vezes”. Com as tentativas seguintes a tensão começou a subir, parecia mesmo que a manobra ia sair e afinal estava ali só um fotógrafo e nem um filmer tínhamos para captar este momento. Perguntei ao Allen, “Queres filmar o puto?” Pergunta à qual ele responde “epá, na boa mas eu não sou filmer e depois ainda estrago a filmagem”... mas lá o consegui fazer agarrar na câmara que tínhamos na mochila. Mais algumas tentativas bem perto, começámos, literalmente, aos gritos com a perspetiva de ver uma manobra incrível nesse fim de tarde, quando levamos com um balde de água fria! Um segurança do metro aparece e diz-nos para sair dali. Resignados, arrumámos as coisas e ficámos ali mais um minuto enquanto o Tiago recuperava o fôlego e acalmava um bocado. Eis que enquanto nos levantávamos já para seguir para casa e dar por terminado o dia de skate, aparece o chefe da estação. Vem ter connosco e pergunta “aquele segurança disse-vos alguma coisa? É que o gajo bate mal da cabeça, se quiserem podem andar aqui à vontade, eu é que sou responsável por isto”! Agradeci a atenção e perguntei a Tiago, “Como é, queres ir lá outra vez, sem stress mais umas? Se correr bem, corre, se correr mal, na boa”. Já que estávamos ali e com as “costas quentes” não fazia sentido não aproveitar. 3 tentativas depois o Tiago acerta o ollie para frontside wallride sem espinhas, eu fiquei congelado, o Allen vira-se para mim ainda a filmar e pergunta-me “e agora, que faço?” Dois segundos depois começámos aos gritos, os 3, parecíamos uns tolos. Há muito que uma manobra não me fazia sentir arrepios na espinha, nem acreditava no que tinha visto ao vivo! O Allen vira-se para mim e diz “caraças, que pica!!! Tenho que ir saltar com o skate de um prédio abaixo!” Estar ali com os dois skaters que conseguiram “domar” este spot, viver um momento destes e poder presenciá-lo ao vivo foi, sem dúvida, um momento de magia. Obrigado, rapazes! E, Allen, quando quiseres dar o ollie do prédio abaixo avisa... Pedro Raimundo “Roskof”
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