TST Rodrigo Hammer’s
The Sound Tribune
Sci-Fi, irreverência e Rock ‘n’ Roll
Número 013 - 24/03/2019 - 30/03/2019
ETERNAMENTE
A música fascinante, as capas enigmáticas e o mistério por trás d
Texto: Ross Sampson - Tradução e Adaptação: Rodrigo Hammer
A
O quarteto no auge, com Buck Dharma de terno branco
estética controversa do Blue Öyster Cult confirma que a banda foi um caso raro de sucesso no Rock. Ross Sampson falou com Eric Bloom e o guitarrista Donald “Buck Dharma” Roeser para descobrir como o quinteto construiu uma carreira original contra todas as adversidades do mercado. Surgido das cinzas do Soft White Underbelly, em 1971, o Blue Öyster Cult foi um grupo como nenhum outro: a variedade de estilos musicais, a escolha das letras, os temas incomuns abordados, as capas fascinantes e os colaboradores por trás dos álbuns, colocou-os, em definitivo, à parte dos chavões. A apenas
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dois anos do aniversário de 50 anos, os fundadores Eric Bloom (vocais/guitarra) e Donald “Buck Dharma” Roeser (guitarra/vocais) abordam os mistérios de um “culto” que se perpetua com o tempo. O Soft White Underbelly, por mais incrível que o nome possa parecer, foi fundado em Long Island, Nova York, em 1967, com uma formação que incluía os futuros integrantes Buck Dharma, o baterista Albert Bouchard e o tecladista Allan Lanier. O grupo se completava com o vocalista Les Braunstein e o baixista Andy Winters, mas por volta de Abril de 1969, Braunstein já tinha dado lugar a Bloom. Após flertes com uma
dezena de nomes para o projeto – entre os quais Stalk-Forrest Group, Oaxaca e The Santos Sisters – finalmente escolheram Blue Öyster Cult (completo com o primeiro e muito copiado ‘Heavy Metal Unlaut’). O empresário da banda, mentor e letrista Sandy Pearlman, retirou o nome de um poema que escrevera nos anos ’60, no qual o Blue Öyster cult era um grupo de alienígenas secretamente reunidos para guiar os destinos da Terra. Algo que sugeria uma temática intrigante, incomum, misteriosa e artística. Desde os primórdios, a originalidade das faixas do BÖC, o brilho das melodias, o sentido intrincado das letras,
além da soberba execução de guitarra de Roeser, fez com que logo se destacasse. “Nossos interesses tanto como ouvintes como criadores, eram além da curva”, explica Buck. “Mas tínhamos, em definitivo, um senso estético elevado em termos de Arte pontuando tudo o que fazíamos. Como resultado, não nos tornamos conhecidos por fazer apenas um tipo de música ou de groove. Quando gravávamos um álbum que tinha uma faixa com mais de 18 a 20 minutos num lado, estávamos tentando deixar uma peça de arte coesa, repleta de variações. “Nos sentíamos assim, e nunca dispostos
a enfile mesma parece discos e segu que ou mesmo Produz tanto, música elabora fletisse um to ponto época e portav levado lente d trazia u e-bran enigmá centro “Bill er Krugm BÖC) c ham en sity, em para pr (a segu tion’) b quitetu tinha m balho d ticularm que Bi senho mente dali po Na Mit anzol r pai de Z tou o íc ofereci Alquim de ser metal” banda “A influ ceitual “Princi quando Ele sem conceit
E CULT
CAPAS DESLUMBRANTES
de um gigante do Hard Rock
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eirar cinco músicas que soassem a a coisa. Mas não é que quiséssemos r misteriosos. Só gostávamos de que levassem a lugares diferentes issem por diversas direções. Era o uvíamos, então, queríamos criar o o tipo de coisa.” zir uma peça coesa de Arte, entrenão começava e terminava em a. O Blue Öyster Cult sempre quis ar seu trabalho de modo a que ree suas tendências artísticas como do. As capas eram sempre um importante para a banda, numa em que o público realmente se ima como o álbum ia parecer ao ser na rua, debaixo do braço. O exceisco de estreia, ‘Blue Öyster Cult’, um desenho geométrico em pretoco de Bill Gawlick, onde se via o ático olho no logo da banda, ao do quadro. ra um cara que Sandy e Murray an (produtor de longa data do conheciam”, diz Buck. “Eles o tinncontrado na Stony Brook Univerm Nova York, e Sandy o contratou roduzir nossas duas primeiras capas unda sendo ‘Tyranny And Mutabaseada em alguns esboços de Arura em tinta e lápis grafite que Bill mostrado para ele. Adoramos o tradele assim que vimos. Ficamos parmente hipnotizados pelo símbolo ll tinha incluído no centro do depara o primeiro álbum e imediatao adotamos como nosso logotipo r diante.” ologia Grega, a cruz em forma de epresenta Cronos, o Rei dos Titãs e Zeus. Mas o desenho de Bill adapcone de certa forma, que também ia uma conotação ao símbolo da mia para o Chumbo, o que não deixa um metal pesado (n. do t. “heavy ), claro. Combinava bem com a e Pearlman também curtiu. uência de Sandy sobre nós, conmente, foi imensa”, confessa Buck. palmente nos primeiros dias, o nossa música tinha 60% de letras. mpre esteve muito envolvido nos tos das artes de capa, também. Es-
távamos animados por ter aquela concepção se desenvolvendo, e acabamos embarcando nessa de criar uma mística para o BÖC.” “Sempre quisemos trabalhar com Bill Gawlick de novo”, acrescenta Bloom. “Mas literalmente ele desapareceu, sumiu do mapa, e nunca mais o encontramos por décadas. Também não dá para ser localizado nas redes sociais.” Mesmo com a ausência de Gawlick, as capas seguintes continuaram interessantes e invariavelmente incluíam o símbolo em algum detalhe, por exemplo, na cauda de um avião em ‘Secret Treaties’, de 1974, entalhado num pedaço de rocha em ‘The Revolution By Night’, de 1983, ou no formato de uma nave espacial inteira em ‘Club Ninja’, de 1985. “Gosto bastante do trabalho de Lynn Curlee para ‘Agents of Fortune’, de 1976”, revela Bloom. “O mágico segurando o leque de cartas de Tarot e apontando para o símbolo do BÖC na pedra, foi ideia de Sandy e funcionou muito bem. Mas minha capa favorita de todos os tempos é, provavelmente, ‘Mirrors’, de 1979. Há uma história bem interessante a respeito dela: a maioria acha que aquilo é uma foto, e é, mas não da forma que as pessoas entendem. O cara que produziu a arte, Loren Salazar, pintou um belo quadro hiper-realista e mandou a tela para a gravadora. Mas ela acabou se extraviando no caminho. Nunca mais foi encontrada, então, a imagem real usada foi uma transparência que ele tinha copiado do original antes de imprimir. Daí, no final das contas, é uma fotografia, mas de uma obra original.” Já a capa de ‘Fire of Unknown Origin’ (1981), desenhada por Gregg Scott, mostrava os integrantes do culto imaginário “à ostra azul”, em robes em azul e dourado, de máscaras e segurando algumas conchas. “É a minha preferida”, declara Roeser. “O pior, é que acabei não comprando a tela original. Como em muitas das nossas capas, era imensa no formato original, e queria ela na minha parede, mas alguém pegou antes. Consegui a de ‘Extraterrestrial Live” (1982), também feita por Gregg, então fiquei satisfeito.”
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Eric Bloom
A dupla Bloom/Lanier ao vivo
A ideia do BÖC em tentar criar algo um pouco diferente, não se limitava ao trabalho das capas. Os títulos das faixas, igualmente, frequentemente ofereciam uma chance de sair da normalidade. She’s As Beautiful As a Foot, I’m On The Lamb But I’m No Sheep e Lips In The Hills (n. do t. “Ela é Tão Bela Quanto Um Pé”, “Estou no Rebanho Mas Não Sou Nenhum Carneiro”, “Lábios nas Colinas”) sobrevêm à lembrança como exemplos de trazer as coisas para o lado do incomum”, afirma Eric. “Para ser honesto, nunca houve um plano determinado para que fôssemos misteriosos, incomuns ou diferentes. Apenas progredimos naturalmente, e foi algo original, porque éramos sinceros. Líamos muito, principalmente os membros originais da banda. Ainda posso lembrar de estar no backstage depois de um show, no começo, aguardando algum fotógrafo chegar. Quando ele chegava ao nosso camarim, todos os cinco estavam sempre lendo um livro. O cara pensava que tínhamos combinado a cena para ele registrar, mas a verdade é que nada tinha sido planejado. Era como agíamos depois dos shows. “Curtíamos ler.” Mas que tipo de livro, então? “Gosto de Ficção-Científica e Fantasia”, revela Bloom. “Buck, HP Lovecraft e outros autores de Terror. Os temas, certamente, acabaram influenciando muitas das nossas músicas.” “Sempre fomos fascinados pelo com-
ponente erótico das histórias de vampiro”, diz Roeser. “O lance de morder o pescoço é muito sensual, e nos filmes da Hammer dos anos ’70, as vampiras sempre eram sexy e voluptuosas. Dava, literalmente, para ser sugado por elas, se você tinha uns 16 anos.” “A ideia de ter vida eterna depois de ser mordido, mesmo sem poder sair à luz do dia, sempre foi fascinante para mim. Pense, você eternamente caçado e alguém querendo lhe espetar uma estaca no coração. Mas, mesmo assim não dá para se ter tudo...” VERSOS ENIGMÁTICOS
A bela balada de Roeser, I Love The Night, de 1977 em ‘Spectres’, na verdade narra uma história de amor entre dois vampiros, mesmo não dando para perceber ao ouvi-la. “É porque há um terceiro verso explicativo que não entrou na gravação”, explica Buck. “Quando os discos eram gravados naquela época, você precisava calcular o quanto de música dava para entrar em cada lado. Quando Sandy estava produzindo a faixa, ele cortou o verso que justamente conclui a história. Mas tocamos na íntegra ao vivo, e é esse último verso que faz todo o sentido: ‘Agora, nunca desperto até que o sol se ponha/E meus olhos não têm barreiras/Procuro moças que andam sozinhas/Elas esquecem o dia ao me ouvirem dizer que eu amo a noite.’ O narrador
Lanier, Bloom e Buck Dharma
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Foto promocional: curtindo o estrelato
Allan Lanier, Albert Bouchard, Joe Bouchard, Donald
tornou-se um vampiro que procura suas vítimas.” Muitos fãs do BÖC se ligam, particularmente, nas letras de algumas das primeiras faixas da banda. Then Came The Last Days of May, do álbum de estreia, é um exemplo. Composta por Roeser, narra a história veridical de três garotos traídos e mortos por traficantes durante uma negociação de drogas. O que muita gente não sabe, é que Bloom e Roeser de fato conheceram um dos caras envolvidos. Quando o Soft White Underbelly estava começando, fizemos um monte de shows locais na Stony Brook University, em New Jersey”, conta Buck Dharma. “Um dos alunos que conhecemos na época, era um dos caras baleados. Eles tinham ido a Tucson, Arizona, para comprar fumo e pretendiam vender assim que voltassem. Foi um fato bem badalado em Long Island na época, porque eles não eram bem o tipo de caras normalmente envolvidos nesse tipo de coisa. Eram universitários classe média. Saiu tudo nos jornais, e já que tinha conhecido um deles, me inspirei para compor a faixa. Também fui bastante questionado sobre o último verso, porque não parece seguir a cronologia da história: ‘Tudo bem com os últimos dias de Maio/Mas as coisas vão ficar difíceis/Logo estarei partindo/Os outros já estão por lá.’ Só licença poética da minha parte, e se tivéssemos gravado um clipe para a música na época, eu teria mostrado que se
d Roeser e Eric Bloom
tratava de um flashback de antes dos caras terem embarcado na viagem.” -A despeito da imaginação fértil que demonstravam, os integrantes da banda nunca se furtaram à colaboração de outros artistas. A poetisa punk Patti Smith, o empresário Sandy Pearlman e o crítico de Rock Richard Meltzer contribuíam, de forma integral, com o arsenal criativo do BÖC. Além do mais, algumas das mais fascinantes participações valeram-se de autores best-sellers. “Sempre fui um super admirador de Michael Moorcock”, explica Bloom. “Na época pré-Internet, escrevi a típica carta de fã para a editora dele, declarando o quanto curtia os livros e que gostaria de trabalhar com ele em algumas faixas, baseando-me em alguns personagens. Meses depois, ele respondeu dizendo que adorava o BÖC e o tipo de música que criávamos, e que gostaria, também, de trabalhar comigo. Aí recebi diversas letras datilografadas pelo correio, que transformei em faixas como Black Blade, Veteran Of The Psychic Wars – ambas inspiradas na série Elric – além de The Great Sun Jester.” “Em 1987 eu estava numa convenção de Ficção-Científica em Atlanta, e Michael era o convidado especial. Eu e ele terminamos numa jam de Black Blade com a banda que estava tocando no evento!”. E quanto à colaboração com Eric Van Lustbader, cujo livro de 1980 ‘The Ninja’ foi um bestseller internacional?
“Adorei aquele livro”, confessa Bloom. “Principalmente o personagem Nicholas Linnear, o ninja moderno. Quando resolvemos dar o título de ‘Club Ninja’ ao nosso álbum de 1985, não havia pessoa mais adequada para consultar sobre alguma faixa, que o próprio Eric. Entrei em contato com ele – de fato, ele não morava tão distante – e vi que era um cara fantástico. Nos entrosamos na hora, toquei pra ele a linha melódica de Shadow Warrior e logo no dia seguinte ele me passou algumas letras para a faixa. Depois de Buck acrescentar uns fraseados típicos dele, estava resolvido.” Além das colaborações com escritores, Bloom também guarda boas lembranças de trabalhar com Ian Hunter em Goin’ Through The Motions, incluída em ‘Spectres’. “Tocamos um bocado com o Mott (The Hoople) nos anos ’70, e me tornei amigo dele porque ambos morávamos em Connecticut. Um dia ele pintou na minha casa e terminamos compondo uma faixa juntos. A propósito, o título é dele. Apresentei à banda e viram que certamente era algo mais Pop do que eu costumava fazer. Mas é uma faixa incrível e todo mundo adorou. Bonnie Tyler, inclusive, fez uma versão no álbum ‘Faster Than The Speed of Night’ (lançado em 1983). Mas esse era o nosso sistema. Você mostra uma faixa, e se todos curtem, ela entra. Não importa que estilo seja.”
A versatilidade do BÖC em trocar de gêneros, tem sido grande parte de seu appeal, e Buck Dharma lamenta os rótulos empregados em geral na música: “Fico decepcionado com isso, por essa segregação em gêneros. Detesto o fato de que o iTunes tenha 95 nichos no catálogo. Não quero ouvir mais do que duas ou três faixas em qualquer estilo, para precisar escolher algum diferente. Uma coisa que eu adorava no Napster, é que ao você clicar numa música, dava para ver o que alguém mais tinha ouvido ao acessar o playlist daquela pessoa. Nunca vi nenhuma que tivesse só o mesmo tipo de coisa. Era sempre variado, e, para mim, música tem a ver com isso.” “Não acho que apenas uma faixa nos defina”, afirma Bloom. “Apesar de também ter as minhas favoritas. Buck compôs algumas incríveis – Burnin’ For You e Don’t Fear The Reaper são algumas que adoro, mas também curto muito Perfect Water (de ‘Club Ninja’). Todas são bem variadas. Também gostamos de estender as faixas quando tocamos ao vivo, acrescentando elementos de jam. Você se surpreende o quanto fica diferente no palco, por exemplo, Subhuman. Gosto de pensar na gente como o Queen. Qual é a típica faixa do Queen? Não tem nenhuma. É como a gente! Sempre fomos uma espécie de paródia da coisa do Heavy Metal. Uma piada interna sobre o que esse gênero tende a ser.”
A banda já consagrada: público fiel e Ficção-Científica
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P - Rodrigo Hammer Curta e compartilhe