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DECLINE OF THE I

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DORDEDUH

DORDEDUH

Um exercício de sedução

AK dá início a uma nova trilogia dedicada à filosofia de Kierkegaard tratando o tema da sedução em mais álbum inspirador de Decline of the I.

Entrevista: Eduardo Ramalhadeiro

Saudações, AK! Espero que esteja de tudo bem contigo. Entrevistei-te sobre os dois últimos álbuns da trilogia centrada nos trabalhos de Henri Laborit («Rebellion», 2015, e «Escape», 2018). Como reagiram a crítica e os fãs a este último álbum? Excelente. Estou muito contente com o retorno relativo a esse álbum. Estamos numa bela tendência ascendente e eu noto que cada álbum que sai nos leva mais longe. Também sinto que, mesmo que continuem a ser uma minoria, alguns ouvintes são tocados mais intimamente e isso cria uma espécie de microcomunidade “de amigos” em torno deste projeto. E eu penso que isso é muito bonito. Podes falar-nos um pouco do tema tratado neste novo álbum? «Johannes» é a primeira obra de uma nova trilogia baseada no trabalho do filósofo dinamarquês Kierkegaard e, em particular, na sua visão dos 3 estádios da existência: estética, ética e religiosa. O estádio estético, tratado em «Johannes», corresponde ao estádio em que o espírito vive no momento presente, só se interessa pelo prazer, pelas noitadas, pelo vinho. É um espírito dionisíaco, profundamente individualista e não se preocupa minimamente com os outros e a moral. É a figura do dândi. O que conta mais para ele é a beleza. Mas uma tal existência exige que se viva num gozo permanente e cada vez mais intenso, porque nunca é suficiente. Ao fim de algum tempo, o espírito cansa-se, fatiga-se e a pessoa começa a pensar que a vida deve ser outra coisa. Então, a angústia aumenta, porque a pessoa pressente que pode viver de outra forma, regida por outros princípios.

Então «Johannes» anuncia uma nova trilogia. Consagrada à sedução? A sedução é a base do primeiro álbum. A moral será o tema do segundo, dado o espírito passar do estado estético ao estado ético.

A capa desenhada por Dehn Sora parece-me muito enigmática. Podes explicar-nos a que se refere esta imagem? E falar-nos um pouco do modo como Decline of the I participou na sua criação?

“«Johannes» é a primeira obra de uma nova trilogia baseada no trabalho do filósofo dinamarquês Kierkegaard e, em particular, na sua visão dos 3 estádios da existência: estética, ética e religiosa.”

Eu expliquei ao Dehn Sora o conceito de base da trilogia e foi ele que teve a ideia que aparece na capa, que apresenta o herói “dândi” simultaneamente acariciado e incomodado por mãos lascivas e opressoras. Também usámos essa ideia no videoclip que fizemos para a faixa “The Veil of Splendid Lies”. Estava fascinado pela ideia de Dehn Sora e quis, com os meios de que dispúnhamos, animar esta imagem fixa. Por conseguinte, pusemo-nos nós próprios em cena, para nos incluirmos no processo evocado concetualmente na trilogia. No que me diz respeito, há sempre um aspeto autobiográfico nas minhas criações. É importante para mim reduzir a distância entre o que eu sou e o que eu produzo, nem que isso implique baralhar as fronteiras. Pretendemos que cada capa dos álbuns desta trilogia dialogue com as outras. Haverá entre elas uma unidade muito forte, muito superior há que havia na trilogia anterior.

Curiosamente, essa capa e o vídeo fazem-me pensar no desenlace do romance “O Perfume”, de Patrick Süskind. Acertei ou não há qualquer relação entre os dois objetos artísticos? Não, é um acaso. Já li esse livro há uns anos, logo não sei dizer-te o que te pode levar a pensar assim, mas esse comentário despertoume a curiosidade.

Também reparei que a formação de Decline of the I mudou. O que aconteceu? SI agora está na voz e AD no baixo e SK mantém-se na bateria (desde o segundo álbum). Mas, apesar das mudanças, pode-se dizer que, pela primeira vez, Decline of the I tem uma verdadeira formação. Apesar de eu continuar a compor tudo e de considerar esta entidade como algo pessoal, ela converteuse numa banda. Começámos a fazer concertos no início de 2019 e isso marcou uma nova era para a banda. Converteu-se em algo que ultrapassa as minhas deambulações solitárias com os meus instrumentos. Insuflaramlhe uma nova vida e agora é uma equipa com relações. Portanto, estamos perante uma grande mudança para Decline of the I.

Mas tu continuas a escrever tudo em Decline of the I, não é? Ou decidiste partilhar a tarefa desta vez? Escrevi eu tudo, mas esteve menos sozinho no processo. Pude ter opiniões mais facilmente, apoio, porque, quando bloqueava ou tinha uma dúvida, pedia conselho aos outros membros da banda e isso influenciou a composição, embora de forma indireta. Sozinho não teria criado exatamente o mesmo álbum. Já há diálogo, um efeito de “espelho” (com os outros a desempenhar esse papel).

Podemos dizer que a música neste álbum é ainda mais trabalhada, cheia de pequenos detalhes ou sou só eu que o vejo desta forma? De facto, não és a primeira pessoa a dizer-me isso. Contudo, não é intencional. Penso que sempre compus desta forma, usando várias camadas de instrumentação, algumas mais percetíveis e outras mais escondidas. Gosto que um álbum não se esgote demasiado depressa e que, mesmo depois de o teres ouvido dezenas de vezes, continues a enWcontrar nele coisas novas. Mas talvez a produção mais clara que a dos álbuns anteriores leve a essa sensação. Há mais espaço auditivo, mais ar. Ouve-se melhor esses diferentes estratos. Mas também é verdade que eu trabalhei imenso neste álbum e isso acaba por passar para o que se ouve!

O que é que a banda e a Agonia Records previram para o lançamento do álbum? Fizemos o lançamento em streaming e eu sentia-me muito excitado por ver exposto à luz do dia o álbum no qual trabalhei durante três anos. Aliás, tenho a impressão de que faz precisamente 3 anos, de forma quase precisa, que eu compus as primeiras notas, em março de 2018. É sempre vertiginoso ver o caminho percorrido na perspetiva oposta. Entre os embriões de canções presentes nas demos de som duvidoso que, meses depois, se convertem em canções construídas, produzidas, digeridas… Já lancei muitos álbuns durante a minha “carreira” (cerca de 25 anos, penso eu…), mas é sempre um milagre quando um novo álbum vê a luz do dia.

O próximo álbum já está no forno? Ainda não. Ainda não entrei nessa dinâmica. Já tenho algumas ideias, mas, de momento, ainda é demasiado cedo para sentir que já comecei. Num momento qualquer, haverá um clic, independentemente da minha vontade, um momento em que eu pensarei “já aconteceu, já estou a trabalhar no quinto álbum do Decline of the I”, mas ainda não cheguei lá.

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