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ANTRO DE FOLIA DRY MARTINI. SHAKEN, NOT STIRRED

ANTRO Por: Carlos Filipe Por: Carlos Filipe DE FOLIA

Não há James Bond sem cinema e não há cinema sem 00 7. Ao fim de 25 filmes oficinais mas 2 fora da série, e quase 60 anos de existência, o mais famoso agente secreto britânico, primeiro pela mão de Albert R. “Cubby” Broccoli e Harry Saltzman (até 1975), e depois pela mão dos seus discípulos naturais, Barbara Broccoli e Michael G. Wilson, os verdadeiros obreiros e herdeiros da saga, continuam a maravilhar-nos praticamente ano sim, ano não, desde 1962. Este Antro é demasiado pequeno para abordar todos os filmes e as fantásticas personagem criadas pela série, entre muitas outras coisas de interesse cinematográfico, pois seriam necessário, para aí, duas Versus Magazine completas pelo menos!

Penso que hoje é para todos evidente que Ian Flemming foi o criador de James Bond – Nome que foi buscar a um livro de ornitologia que estava mesmo ali na estante – e até à sua morte algo prematura escreveu 14 livros, todos eles adaptados ao cinema, uns mais fieis à história de Flemming, outros apenas o título, como “The Spy Who Loves Me” ou praticamente “Moonraker”. Flemming, no seu tempo de escritor de suspense e espionagem era jornalista do The Sunday Times e no seu contracto tinha dois meses de férias pagas, os quais aproveitava para se refugiar na Jamaica, na sua propriedade Goldeneye. A Jamaica – antiga colónia Britânica - dos anos 60 era um refugio para uma certa classe nobre britânica que ali passava os meses de férias, fazendo com que houvesse uma certa socialite inerente, que Flemming frequentava. Toda esta envolvente social foi transportada para os livros de James Bond, tendo influenciado bastante o tom social subjacente presente nos livros e posteriormente transposto para os filmes, daí, todo aquele glamour e comportamento que podemos ver, principalmente nos primeiros filmes com Sean Connery. O lado da espionagem e missão que 00 7 tem em mãos, veio do facto de Ian Flemming ter sido ele próprio um comandante na Marinha Britânica e ter sido um espião britânico. No final, James Bond não é mais que o alter ego do próprio autor, onde há tanto de auto biográfico em James Bond, como a personagem que ele gostava de ter sido e vivido.

Eu descobri os filmes de Bond - ou foram os filmes de James que me descobriram? - em 1985 quando saiu “A View to a Kill” e eu via fascinado a curta trailer que passava na RTP, nos blocos publicitários. Ficava fascinado pela acção tal como a música do filme dos Duran Duran de mesmo nome, que ainda hoje, é uma das minhas canções favoritas da saga. Não tive qualquer possibilidade de ir ver o filme com Roger Moore e só passados 2 anos com “The living Day Lights” é que finalmente vi um filme de James Bond no cinema, desta feita com o novo Bond, Timothy Dalton. Estes era uns tempos em que os filmes de 00 7 não passavam na TV – o mesmo que dizer RTP - e os videoclubes estavam a começar a arrancar com toda a força, tal como os leitores de VHS nas nossas casas. Por isso, só quando a saga foi retomada com Pierce Brosman em 1995, com “Goldeneye”, é que iniciei as sessões regulares de cinema Bondiano, não tendo falhado nenhum 00 7 com Pierce Brosman na personagem.

Dry Martini. Shaken, not stirred

Dessa gloriosa época, enterrada para todo o sempre dos videoclubes, recordome de ver nos escaparates inúmeros filmes da época Roger Moore, não me tendo atraído de todo, na época, alugar esses filmes. Bem, também havia tantas novidades de acção onde colocar “as fichas” que apostar em filmes de acção dos anos 70 não era bem a minha prioridade. Aluguei e gravei – sim, eu copiava para consumo próprio os filmes cuidadosamente selecionados que eu alugava – o 00 7 de 1989, “Licence to Kill”, pois era “uma novidade” mas só tive oportunidade de descobrir a saga completa, junto com os seus diferentes actores no papel do agente mais famoso do mundo, quando a SIC decidiu dar nas suas sessões de cinema à segunda-feira, no remoto ano de 1996, todos os filmes de “007Dr. No” até “007-Licença para Matar”. Depois disto, foi apenas seguir os filmes que iam saindo e adquirir o VHS original e posteriormente o DVD, os quais em DVD acabei por completar a primeira edição, em que todos os DVDs juntos, a lombada faz 00 7 em forma de pistola, a famosa Walter PPK. A qualidade desta edição deixou sempre a desejar, com masterizações indignas dos DVDs e alguns discos com som mono. Ao longo da década de 2000, novas edições saíram com remasterizações que deram outro caracter aos filmes da saga a nível visual e sonoro, as quais deixei sempre passar - há mesmo uma edição que é uma maleta com todos os filmes – por “já ter” ou por o valor pedido não se justificar o “upgrade”. Não há bela sem senão, e recentemente deixe-me levar por a saga completa com os 24 filmes, todos retirados de um novo master, em Blu-ray. E assim, se passa do VHS gravado da SIC mais originais em VHS nos 90 para a saga em DVD nos 2000 e os Blu-ray no final da década dos 10 do século XXI.

A nova visualização de todos os filmes, uns atrás dos outros, que me levou 4 meses, deu-me uma perspetiva única sobre a saga. Todos terão os seus preferidos e piores 00 7, tal como eu os tenho. Também há dois tipos de pessoas que pude conhecer ao longo do tempo relativo à saga 00 7: os que gostam e aceitam aquilo como puro cinema de entretenimento, e deixam-se ir com a magia do cinema e com todos aqueles gadgets, e aqueles que, não podem com a misoginia e machismo da personagem, e acham aquilo tudo fajuto e pouco ou nada credível, ou por simplesmente não gostarem da personagem per si. Claro que já perceberam qual dos tipos sou. Felizmente, que a personagem soube evoluir, tal como a sociedade evoluiu, e hoje temos um Bond bem mais moderno e actual, mas que lá no fundo nunca deixa de ser a personagem que o seu criador moldou, e que cada actor que o interpretou na sua época deu o seu cunho pessoal à personagem. Quero dizer com isto, que por exemplo, o Sean Connery dos anos 60, se interpretasse hoje James Bond, seria certamente à imagem da nossa sociedade actual mas sem nunca deixar de lhe dar aquele cunho próprio e único que o fê na sua época dos anos 60.

A magia dos filmes de 00 7 reside em 5 pilares: O actor que interpreta o papel, as Bondgirls selecionadas, o vilão, os cenários excêntricos naturais ou construídos e claro está a acção. Na prática, um filme de James Bond resume-se a encontrar locais exóticos para a acção, umas personagens femininas que vão interagir com o nosso

ANTRO Por: Carlos Filipe Por: Carlos Filipe DE FOLIA

protagonista, e que são cada vez mais sofisticadas, para o bem ou para o mal, e um mau que quanto mais carismático for melhor, o qual vai ser o catalisador da história e da missão ou motivo pelo qual 00 7 parte para mais uma aventura. Depois é acrescentar uns décor exuberantes maiores que a vida e cenas de acção de cortar a respiração nunca antes vistas e por aquela gente toda a “encornar” tal duas cabra-montesas. Uma coisa é certa, os filmes de James Bond foram sempre o pináculo do cinema de acção. Em cada época, e comparando os filmes de acção dessa década com os de James Bonds, vemos que estão sempre um furo acima do que se fazia. Mesmo, a aventura espacial de “007 – Moonraker”, consegui apresentar efeitos visuais que ficaram ao nível de um certo filme de 1977 de uma galáxia longínqua. Sim, foram um bocado longe demais com aquele cena toda no espaço mas não deixaram de entregar um filme “espacial” sublime. Nada mal para uma série de filmes britânicos, feito por britânicos, com um protagonista britânico. Talvez não soubessem, mas a saga 00 7, não é um produto de Hollywood, muito pelo contrário. Mesmo hoje, os últimos filmes com Daniel Graig, são do melhor que se faz em cinema de acção, estando ao nível das séries Bourne, Taken ou Missão Impossível. O único momento da série em que assim não o foi, foi com “007 - License to kill”, que como filme de acção, não consegui bater a onda magnânime de acção made in Hollywood, que marcou ela própria o cinema de acção para as décadas vindouras, com obras como a saga “Die Hard” ou “Arma Mortífera”, que colocaram a fasquia demasiado alta para James Bond. Na obstante e apesar de a crítica ter castigado este filme em particular na altura, hoje é visto como um dos mais interessantes e melhores filmes da saga.

Tal como já referi, cada um que gosta da saga terá as suas preferências a todos os níveis: actor, actrizes, maus, gadgets, locais, cenas, músicas e filmes. Em geral gosto de todos os actores que encarnaram a personagem de Flemming, acho que para cada época foram as melhores escolhas, mas o meu menos preferido do lote é o Roger Moore, com o seu lado mais bonacheirão e pouco credível da personagem. O mote era mais vencer pelo charme do que pelas balas, indo ao ridículo de em “007 - o Homem da Pistola Dourada” ter disparado a sua arma apenas uma única vez, para matar Saramanga (Christopher Lee) no final do filme. No entendo, a sua simpatia perante o público, foi crucial para que a saga tivesse tido a hipótese de sobreviver os 70s e parte dos 80s e permitir chegar até aos dias de hoje. Moore começou tarde (45 anos) e acabou demasiado tarde (58 anos). O esquecido do lote é sempre o George Lazenby. Um modelo australiano sem experiência na representação que conseguiu o papel apresentando-se nas audições “fardado” a rigor e depois deitou tudo a perder ao não entrar no jogo da promoção. Foi pena, pois entrou num dos melhores filmes da saga, “007 - Ao Serviço de Sua Majestade”, e vê-se que ao longo do filme a sua representação foi melhorando consistentemente. Acho que se tem agarrado a oportunidade, Lazenby poderia ter evoluído no papel de Bond e como actor, e tornar-se num excelente 00 7. Tenho pena de não ter assinado pelo menos mais 1 ou 2 filmes. Timothy Dalton, tenho igualmente pena de não ter feito mais um ou dois filmes, foi vitima de um imbróglio jurídico entre os produtores e o estúdio Sony que atrasou a chegada do Bond 17, tenho ele ido à sua vida, pois já era um actor de cinema e teatro conceituado quando interpretou a personagem pela primeira vez. Os outros 3, não vale a pena mencionar, são simplesmente perfeitos no papel e entregaram grandes filmes da saga.

Quanto aos filmes, o melhor Bond de sempre é Casino Royal de 2006. Simplesmente genial, não fosse uma adaptação quase perfeita do primeiro romance escrito por Ian Flemming, onde, em termos de argumento, tudo encaixa na perfeição, no timing certo. O interessante é que os argumentistas conseguiram ir de um extremo a outro e no filme seguinte, que é uma sequela deste, “00 7 - Quantum of Solace”, entregarem um dos piores e mais irritantes filmes da saga. Cada vez que o filme para de uma cena de acção, tal como vamos para uma curta publicidade na TV, e parece que vão desenvolver a trama e explicar alguma coisa, bum! Lá vamos nós para mais uma cena de acção. Não há pachorra e nem a greve dos argumentistas – que tirou de cena o autor da primeira versão, o conceituado Paul Haggis – pode ser desculpa. Outro dos meus preferidos é “007 – Goldfinger”, mas esse não é preferido de quem? Para além do que referi com o George Lazanby e que foi filmado em Portugal, “007 - The Spy Who Loves Me” foi talvez o melhor da era Roger Moore e tem a icónica e arriscada cena do salto de paraquedas de um penhasco que abre revelando a very British union jack. O “007 - Goldeneye” é um dos meus favoritos, um Bond moderno enraizado na década dos 90 com a estravagância de outrora, apesar de ainda hoje ninguém me explicar porque é que o Pierce Brosnan salta de uma barragem em bungee jumping para entrar num complexo fabril que está num planalto!

Bem podia seguir até mais não com os gostos e desgostos da saga 00 7, mas acabaria por fazer um antro para 5 versus no mínimo. Resta-me esperar que esta pandemia passe e que o 25 James Bond e último com Daniel Graig, possa estrear normalmente, e assim descobrirmos todos mas uma vez as aventuras e desaventuras do mais famoso agente secreto do mundo. Vamos ver o que se segue e por quanto tempo irá esta saga permanecer actual aos dias de hoje. Pelo menos, enquanto os seus guardiões, Barbara Broccoli e Michael G. Wilson, estiverem por aí e os filmes forem lucrativos, ainda nos restará de certeza mais filmes de 00 7 para ver do que carros com motores a combustão interna para comprar novo. Só espero que o próximo actor que encarnar a personagem, esteja á altura de James Bond. Se a tradição se mantiver, ou seja, o actor sondado para o papel que quase acabou por o conseguir, consegue-o anos mais tarde. Foi assim com pelo menos Roger Moore que iria suceder a Sean Connery depois de “007 – You Only Live Twice” mas os problemas com a produção do que seria o filme seguinte, acabou com Moore a assinar por mais uma temporada de “O Santo”; Timothy Dalton que na sequencia desta partida de Roger Moore para “O Santo” foi escolhido, mas a sua jovem idade na altura, 22 anos, foi vista como um entrave para vestir o smoking; Pierce Brosnan que depois da saída de Roger Moore com “A View to a Kill” em 1985, foi escolhido para o papel depois de uma audição de 3 dias, então com 33 anos, acabou preso ao contrato que tinha da série “Remington Steele” para fazer mais 5 episódios, pois estava estipulado que os produtores se reservavam de relançar a série nos 60 dias seguintes. Adivinhem, ao sexagésimo dia, horas antes da conferência de imprensa de apresentação do novo James Bond (Brosnan), compraram a opção de relançar “Remington Steele” e Brosnan teve de recusar o papel de James Bond, tendo a produção posteriormente escolhido… Timothy Dalton; aquando da escolha de Daniel Graig, Henry Cavill (Superman) teve quase para ser 00 7, como candidato ideal, pois chegou a passar audições para uma possível história original, mas os seus 22 anos – Outra vez 22 - na altura levou a outra escolha: Daniel Graig. Pelo que, se a história se repetir mais uma vez, pode mesmo ser que o próximo 00 7 seja mesmo: Henry Cavill.

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