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OMITIR

O falar do Norte

Joel Figueiredo (aka Gróvio) desenvolve, há cerca de 15 anos, um projeto de Black Metal ambiental através do qual apresenta a sua interpretação da realidade portuguesa, apesar de se inspirar musicalmente em bandas estrangeiras.

Entrevista: CSA

Olá, Joel! Sou minhota (de Viana do Castelo) e conheço bem a música que abre a primeira canção do teu álbum («Ode», 2020). Antes de mais, gostava de saber quem és e de conhecer um pouco a história de Omitir. E também de saber por que deste o nome de Omitir à tua banda. Joel – Olá Cristina! Sendo uma minhota nata acredito que estás muito familiarizada com a “Rosinha”. Omitir – previamente chamada Bahamut – surgiu entre 2005 e 2006, numa altura em que eu estava a dar uns primeiros pequenos passos durante a minha tenra adolescência nos géneros mais ambientais dentro da cena Black Metal. Lancei a primeiro demo – «Hidden Theory» – em 2005 e, mais tarde, o álbum de estreia – «Old Temple Of Depression» – em 2007, por uma editora independente austríaca já sob o nome de Omitir. Posteriormente, foram lançados dois EP: «Meu Fado» (2007) e «Res, Non Verba» (2009) e um split – «Salubres Caminhos» (2007) – com algumas bandas nacionais. O segundo álbum – «Tese Em Erro» – foi lançado apenas em formato cassete pela portuguesa Praise Unholy, em 2010. Um ano depois lancei «Cotard» com parceria entre a norte-americana The Path

“[…] sofreu por tabela as dores do meu crescimento pessoal, desde a adolescência até aos dias de hoje, no que toca à capacidade de produzir. Mesmo hoje continuo a aprender […]

Less Traveled e a alemã Amor Fati Productions. Depois disso, veio um período de silêncio até à chegada do EP «Outono» (2020) e do álbum «Ode» lançados pela minha própria editora, a Loudriver Records. Os temas, estando sempre de alguma forma relacionados com os nossos costumes e tradições, foram sempre variando entre os lançamentos, o que justifica a total liberdade do projeto no processo de composição e de abordagem temática. Sendo o Black Metal um subgénero com muitas variantes, interessa-me saber se te sentes influenciado por alguma(s) banda(s) em especial. As influências são muito dispersas. Sei que, na altura que andava a produzir «Ode», estava numa onda mais dos anos 70. Lembrome de ouvir bastante Atomic Rooster nessa fase. Claro que é inevitável a cena norueguesa não ter influência. Por exemplo, Windir (pelo seu uso de acordeão) fezme abrir páginas no mundo Folk

em conjunto com o nosso folclore nacional como Sangre Cavallum e Galandun Galundaina. Para além disso, inspiro-me também bastante num registo sonoro mais orgânico da primeira vaga do Black Metal dos anos 80 – representada, por exemplo, por Bathory e Celtic Frost – ou de Thrash – representada por Slayer. Bem, entre muitas outras bandas e estilos.

Conheces os Azagatel, que são do distrito de Aveiro? É um nome que já anda há muito tempo pelo meio underground nacional e, por isso, mesmo não tendo estado tão atento à cena durante alguns anos, conheço perfeitamente. São bastante sólidos no que fazem.

O teu primeiro álbum – «Old Temple of Depression» – data de 2007. Como tem evoluído Omitir ao longo dos tempos até à presente «Ode»? Omitir foi o meu primeiro projeto dentro do mundo musical. Por isso, sofreu por tabela as dores do meu crescimento pessoal, desde a adolescência até aos dias de hoje, no que toca à capacidade de produzir. Mesmo hoje continuo a aprender e com certeza irei aprender até ir para a cova, isso é uma realidade que não me escapa. É um projeto de aprendizagem e o facto de eu ser autodidata acaba por influenciar diretamente os lançamentos ao longo dos anos, o que não acontece tanto noutros projetos que tenho já nesta fase adulta. Por isso, não te consigo falar de evolução para melhor ou pior, porque cada álbum tem as suas características e limitações, mesmo «Ode» tem as suas limitações. A verdade é que eu não vejo as limitações como algo negativo, acho que são até bastante úteis para o autoconhecimento.

Gostava que me explicasses como te veio a ideia de usar alguns compassos de uma canção de folclore minhoto para abrir um álbum de Black Metal. Por ventura, tocaste em algum rancho folclórico? À medida que o álbum estava em produção, o conceito foi-se consolidando e as ideias foram aparecendo e essa abertura acabou por ser determinante para entrar na atmosfera que o álbum pretendia. O folclore minhoto é algo que já me entrou diversas vezes no ouvido desde pequeno por ter crescido nessa mesma cultura local. Nunca toquei em nenhum rancho, mas lembro-me de ter participado em várias atividades durante a minha infância que envolviam dança, teatro e outras atividades num ramo tradicional/ folclórico que a escola promovia sempre com as crianças. Claro que isso pode ter um efeito indireto no que eu sou hoje e na minha forma de pensar, mas os meus interesses quando era criança eram simplesmente de ser criança. Nada mais, nada menos.

A quem diriges esta tua «Ode»? «Ode» dirige-se àqueles que carregaram uma ‘cruz’ às costas enquanto trabalhavam de sol a sol e que ainda hoje estão no anonimato na nossa história, esses que foram reprimidos e oprimidos por algumas entidades exploradoras, sendo uma delas e uma das mais influenciadoras de todas a igreja católica, que, desde dos tempos feudalistas, começou a ter cada vez mais poder político e social e moveu uma constante perseguição às culturas tradicionais já existentes no seio da nossa gente, desse povo. Essas crenças e culturas com o tempo acabariam por desaparecer ou por se adaptar progressivamente às novas ‘normas’ cristãs. Isto decorre também até aos mais recentes latifundiários oportunistas, que se deixaram embalar pelo estado fascista com os seus amantes padrecos que massacraram as pessoas com a persistente perseguição às liberdades até à verdadeira libertação que foi a reforma agrária com a revolução de abril. A música deste álbum é bastante obscura (guitarras melodiosas, bateria compassada, teclados, até me pareceu ouvir um acordeão) e a voz abafada. De que forma este estilo serve a mensagem que pretendes transmitir através deste teu álbum? Não o acho obscuro e, por isso, é compreensível a opinião de se afastar um bocado da aura ‘Black’, mas entendo o que dizes. Acredito que seja uma mensagem mais de força e sacrifício de sobrevivência e isso envolve sempre sentimentos pesados e de sufoco como se se carregasse uma “cruz”. Isso pode funcionar bem neste método de composição em «Ode», com vozes mais carregadas e abafadas com mensagens de dor, sacrifício e luta e ritmos mais compassados. Posto isto, para além de sempre ter sido um adepto de géneros de música mais “cadentes”, isto também envolve a minha falta de capacidade técnica como instrumentista que não é de todo ser “supersónico” ou perfeccionista. Mais uma vez, nem sempre é mau ter limitações porque fazem também parte do processo de criação.

Estive a ver as letras do álbum e fiquei intrigada. Escreves em Português do Norte com aproximação fonética? É galego? Estou mesmo baralhada. [Mas posso dizer que a tua língua traduz a essência do Norte de Portugal.] A ideia seria ter uma aproximação entre a escrita e a fonética das povoações do Norte. Não é de todo muito preciso, mas a intenção foi mesmo essa aproximação de palavras e expressões tipicamente nortenhas já históricas e pelos apanhados que faço no meu diaa-dia…e que eu próprio também tenho, o que me facilita muito.

E onde encontraste a capa para o álbum? Pediste a alguém para ta pintar ou foste buscar algum quadro já existente? [Mais um belo elemento estético deste teu álbum.]

Os temas, estando sempre de alguma forma relacionados com os nossos costumes e tradições[...]

Acho curioso a tua pergunta e dá-me sempre um gosto especial em dar a conhecer (quase sempre sem querer) esta magnífica obra e o seu autor, que bem merece esta exposição nos tempos de hoje. O pintor é José Vital Branco Malhoa, artista português que viveu entre o século XIX e XX, e a obra presente na capa principal chama-se “Sétimo Mandamento”, contendo uma mensagem bastante esclarecedora sobre o que era a opressão por parte dos feudos da Igreja e dos regimes nobres sob a nossa gente. Nas edições físicas vêm outras pinturas enigmáticas do autor. Costumas fazer concertos? [Até ver, nem sair à rua podemos, mas a esperança é sempre a última a morrer.] Não, não faço dessas coisas e, mesmo sem pandemias, gosto muito de estar confinado a maior parte do tempo na minha vida. :)

O teu álbum saiu em julho, portanto há quase meio ano. Já deves ter algumas reações. O que podes dizer-nos sobre isto? As reações têm sido imensas desde então. Como é normal, esperava que, com a entrada do novo ano, houvesse uma “queda” desta dinâmica social, mas incrivelmente tem continuado. É maravilhoso saber que as pessoas se identificaram com este álbum, dentro e fora do país, e a sua constante pertença e curiosidade. Acaba por ser mais delas do que meu, a verdade é essa.

Já não lançavas nada desde «Cotard», em 2011. A que se deveu um tão longo interregno? Não há uma razão por esta interrupção. Basicamente deixome guiar pelas ideias que me vão surgindo e também pela predisposição que tenho para criar o “puzzle”. Isso depende muito da minha vida pessoal, da minha “aura” do momento, vontades e, mais uma vez, da minha aprendizagem e crescimento como pessoa. Sendo este um projeto solitário, não existe nenhuma explicação concreta de períodos de silêncio como poderá existir com mais frequência em bandas. O silêncio até faz bem e é importante tê-lo bem presente muitas vezes.

Sentes-te encorajado por este lançamento e já tens outro na forja? Sinto-me apenas encorajado quando existem ideias. Essas são a minha base para construir algo. Claro que existe sempre entusiasmo, quando um disco é bem recebido e é bastante gratificante, mas isso não move a minha criatividade e o bendito aparecimento de ideias que ache relevantes.

Para terminar, queres deixar uma mensagem especial aos leitores da Versus? Não tenho muito a dizer, Cristina, apenas agradecer-te pela conversa e o interesse pela Versus em Omitir. Obrigado!

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Dodici Cilindri (porque o barulhos dos motores também é música)

Por: Carlos Filipe

Mercedes-Benz SL (R129)

Para os verdadeiros aficionados da Mercedes-Benz (e igualmente da BMW), nunca se fala de um modelo apenas ou de uma Classe nos Mercedes seja ela a E, S, SL, G, GL e por aí fora, mas sim, do código interno associado ao desenvolvimento do carro. Assim, temos o classe S W220, o classe SL R107, o classe E W123 ou o classe G W463, como exemplos, e para alguém de fora, irá sentir-se um autêntico peixe fora de água. “Do que é que estão a falar mesmo?”. Mas, dado os modelos da Mercedes atravessarem várias décadas, com diferentes carros produzidos, falar apenas por exemplo do classe S ou SL, fica-se sem saber de que carro estamos efectivamente a falar. Assim, se dizermos classe S W126 (1980-1991), estamos a falar do modelo dos anos 80, pois se fosse o próximo classe S de 2021 já estaríamos a falar do W223, ou no caso dos SL, temos o famosíssimo W198 com as portas em gaivota ou o R230 dos anos 2000 e o seu hardtop retractável, passando evidentemente pelo carro deste antro, o R129. Confusos? Talvez, mas depois de entrar na cena, é perfeitamente compreensível se conseguirmos ligar a referência interna de desenvolvimento da marca ao aspecto do carro e sua época.

O Mercedes-Benz SL R129 é a 4º interacção da classe SL, de Super-Leicht em alemão, de 6 gerações que culminaram em 2018, quando a Mercedes decidiu colocar a gama SL na prateleira por uns anos devido ao desintere$$e neste tipo de automóveis nos nossos dias. Na realidade, os modelos ficaram exuberantemente caros e perderam aquele carisma de outrora, que veio a desvanecer toda a década dos 10, e para ajudar as vendas do SL, ainda criaram o classe S cabrio (C217) em 2015. O mais famoso de todos é o primeiro, o 300 SL “gulwing”, com as portas em gaivota, que são uma necessidade técnica mais do que estilística, devido ao seu caracter desportivo, era na prática um carro de corridas, que hoje se negoceia à volta dos 950 mil €. Deste surgiu o 190 SL, que hoje é um clássico de toda a envergadura.

Algo que todos os classe SL têm, é estarem sempre na vanguarda da tecnologia da sua época, apresentando sempre um feeling moderno, que faz este modelo perdurar por muitos e longos anos até ser substituído por outro. Apenas o que acabei de referir não se aplica a esta última década de SLs e das interações R230 facelift e R231. A seguir veio outro ícone da marca, o SL “Pagode” W113, desenhado pelo famoso designer francês Paul Bracq, com o seu tejadilho amovível em forma de um templo japonês, um pagode, daqui a alcunha. Esteve 8 anos em produção para dar lugar ao SL “Dallas” em 1971, que tem o código interno de R107. Este SL ficou famoso por ser o carro que o protagonista da serie Dallas, Bobby Ewing, mais uma vez, daí o cognome. Foi um SL desenvolvido em particular para o mercado norte americano, onde, foi um verdadeiro sucesso tendo escoado 40% da produção total do R107, tendo assim, tido a mais longa das carreiras dos SL, de 1971 a 1989, ou seja 18 anos!

A substituir o “velhinho” R107, veio o ultra moderno SL R129, de que vos vou falar. A chegada do novo milénio viu a chegada do R230 com o seu tecto retractável, com um ar, hoje, ainda muito moderno, mas sem o carisma das versões anteriores. A partir daqui, este carro deixou de ter qualquer interesse dado a falta de carisma a todos os níveis, a começar pelo estilo, que veio a ficar cada vez mais asséptico. Não quero dizer que são maus carros em si, não, mas com o legado deixado e todo o pedigree acumulado, são para esquecer no que respeita a estes capítulos.

Nunca tendo sido um fã do R107, quando o R129 foi apresentado em 1989, fiquei imediatamente fã. A primeira vez que vi este carro em acção foi no filme The Rookie ( https://youtu.be/j2qDyG3hVbw ), onde a Mercedes aproveitou para mostrar o carro e as suas feature de segurança, tendo emprestado à produção do filme um modelo de pré-produção, para eles filmarem uma das cenas mais espectaculares do filme, com um salto entre prédios para assim os protagonistas Clint Eastwood e Martin Sheen fugirem a uma explosão e morte certa. Com os olhos de então, o SL R129 era um dos descapotáveis ou roadster, mais bem conseguidos e modernos, e ainda era do tempo em que a Mercedes fabricava carros sólidos e robustos, sobre desenvolvidos. Hoje, apesar de terem envelhecido bem, são roadsters para os quais os anos 90 salta à vista. Continuam a ser excelentes carros mas a idade pesa e estão naquele momento em que são velhos demais para se manterem actuais e novos de mais para serem um clássico. Foram feitos muitos e muitos deles apresentam algum desgaste estético e muitos quilómetros acumulados no odómetro, sendo difícil encontrar um estimado e com poucos quilómetros. A vantagem disto, é que no geral são um automóvel com um valor razoável, em particular para o 6 cilindros em linha SL 300 que se consegue por 15-20 mil euros, mas o V8 SL 500 não é muito mais caro com 25-30 mil euros. Os SL 600 estão ficar carros colecionáveis pelo que os preços estão em ascensão e as versões AMG SL 60 ou SL 70, antes de o serem já eram, ou seja verdadeiros collectors devido à sua raridade. Não se esqueçam que todos os SL R129 vinham de origem com um Hard-Top! Ou seja, o perfeito roadster descapotável no verão e o sumptuoso coupé no inverno… haja espaço na garagem para guardar o tejadilho.

O SL R129 nasceu com dois tipos de motores: Um 5 litros V8 e um 6 em linha com 3 litros de cilindrada com 12 ou 24 válvulas. Mais tarde em 1993, chegou o majestoso V12 de 6 litros de cilindrada. O 6 em linha é a escolha mais sensata, pois esse motor Mercedes é reputado indestrutível e os 231 CVs são mais do que o suficiente para uma calma balada, quer com caixa manual “dog leg” de 5 ou uma automática de 4/5 velocidades. A nobreza vem com os motores em V, no entanto, a escolha do V12 será sempre uma questão puramente emocional, pois o mesmo não se justifica e não ficamos com um melhor carro do que se obtermos pela motorização 5L V8. O incremento de potência não é compensado pela falta de desportividade trazida pelo facto de o carro ficar muito mais pesado com o V12 do que o V8, para não falar no incremento dos consumos e custos de manutenção mais elevados. É verdade, no final é o V12 que torna o carro ainda mais especial e nobre, mas, com este motor haverá sempre um “mas”, nem que seja o facto do V12 deste carro ser tão especial que a AMG o elevou até 7.2/7.3 Litros de cilindrada e 500 CV, motor este que depois acabou por ser utilizado no Pagani Zonda e posteriormente com as devidas actualizações e desenvolvimento no actual Pagani Huyara.

Uma revista de automóveis da época descrevia assim o 500 SL: “Os Roadsters Mercedes conjugam o excepcional com o presente [NR:1992]. Com 10 anos de avanço, eles [NR: Mercedes] abrem já as portas para o século XXI do automóvel. Tecnologicamente, eles afirmam-se sem complexos perante os conseguimentos mais marcantes [NR: do mundo automóvel]. E, ainda por cima, são bonitos!”. Na estética, este é visto como uma escultura automóvel, e para tal dou a mão à palmatoria ao líder do design da mercedes de 1975 a 1999, Bruno Sacco. O designer Italiano que fez carreira na Alemanha e deu à Mercedes aquele toque especial aos seus carros que só os designer italianos sabem-no fazer. Para Bruno Sacco, o SL R129 “é na essência o carro mais perfeito que eu alguma vez desenhei”.

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