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Educação ambiental: um olhar para o contexto social do educando Ana Caroline Pereira e Denise Espellet Klein
from TEIA DE SABERES NAS QUESTÕES AMBIENTAIS: da educação científica e filosófica à educação ambiental
EDUCAÇÃO AMBIENTAL: um olhar para o contexto social do educando
Ana Caroline Pereira Denise Espellet Klein
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INTRODUÇÃO
A luta do educador se dá principalmente na sala de aula, pois o exercício de sua prática é por si só um ato de resistência. Foi por acreditar que alunos e professores são os protagonistas do processo de ensino-aprendizagem, que a busca por atividades diferenciadas fazem parte do cotidiano dos professores, principalmente dos profissionais que atuam na educação básica, que diariamente buscam brincadeiras, jogos e diversas estratégias para ministrar suas aulas, que neste trabalho optou-se por apresentar um relato de experiência docente, a partir da observação de atividades com enfoque ambiental, realizadas com a duração de três dias, em uma turma de segundo ano de escolaridade do ensino fundamental I, do ciclo de alfabetização de uma escola pertencente à rede municipal de Duque de Caxias. Município este, onde os profissionais da educação convivem com recorrentes atrasos salariais desde o ano de dois mil e dezesseis. Tal situação iniciada com parcelamentos de salários, ainda na gestão do prefeito Alexandre Cardoso – PSD. No final deste mesmo ano, a situação dos profissionais de educação se agravou, e parte da folha de outubro e as folhas de novembro, dezembro e o décimo terceiro não foram pagas. Com as eleições municipais de dois mil e dezesseis, Washington Reis – MDB assumiu a prefeitura de Duque de Caxias, a princípio as folhas de pagamento atrasadas começaram a ser colocadas em dia, entretanto, não demorou muito para que os atrasos voltassem a acontecer. Os profissionais ainda foram surpreendidos com o que ficou conhecido entre a categoria como “Pacote de maldades”. A Lei Municipal 2855/2017 aumentou o percentual da contribuição previdenciária de onze para quatorze por cento do salário base. (DUQUE DE
CAXIAS (RJ), 2017). A Lei Municipal 2856/ 2017, dentre outras providências, criou a exigência do cumprimento de interstício de três anos para requerer novo enquadramento por formação, diminuiu importâncias pagas nas gratificações por regência de turma e difícil acesso, além da expressiva redução do número de escolas contempladas por este segundo benefício. (DUQUE DE CAXIAS (RJ) 2017). Apesar de tais medidas impopulares que corroboraram para uma expressiva diminuição na folha de pagamento, os atrasos ainda perduram. O Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação, núcleo Duque de Caxias, vem lutando juntamente com a categoria para reverter este quadro de extrema desvalorização a esta classe trabalhadora. Os abusos sofridos pela categoria são constantemente denunciados a instituições oficiais, como o Ministério Público, e aos meios de comunicação. Apesar dos intemperes enfrentados por esta classe trabalhadora, não se pode deixar de manter a esperança na educação pública, pois sem a esperança a luta fraqueja e titubeia (FREIRE, 1997). O bairro Bom Retiro vem sofrendo ao longo de sua história com problemas estruturais, tais como: esgoto a céu aberto, enchentes e falta de abastecimento de água tratada. A Escola Estadual Municipalizada Marechal Mascarenhas de Moraes, localizada neste bairro, definiu em seu planejamento integrado, referente ao ano letivo de dois mil e dezenove, como projeto anual o tema: “Educação Ambiental” sob o título: “Mascarenhas de mãos dadas com o meio ambiente: vem cuidar com a gente”. Tendo por objetivo revitalizar espaços até então abandonados na unidade escolar, através de horta e plantio de espécies ornamentais. Foi pensada a construção de hortas verticais e o plantio apenas de espécies ornamentais em contato com o solo, uma vez que a unidade sofre com recorrentes problemas de alagamento. A equipe pedagógica da escola sugeriu este modelo para evitar a contaminação de gêneros alimentícios, que poderiam ser, posteriormente, consumidos pela comunidade. Para além do que foi proposto no projeto pedagógico anual da escola, este trabalho foi pensado de forma contextualizada, buscando uma reflexão acerca da realidade social enfrentada pelas crianças atendidas pela unidade. Observando como é o acesso desta comunidade a água tratada, a coleta de lixo e ao tratamento de esgoto. Uma vez que no entorno da unidade escolar, observam-se problemas relacionados à inadequação do esgotamento sanitário. Apesar de a comunidade ter acesso a caminhões que fazem a coleta de lixo,
a maioria das residências dos alunos é abastecida por água de poços artesianos, sem tratamento, e o esgoto sanitário é lançado em valas a céu aberto. A escola é abastecida por caminhão-pipa. Problemas com o abastecimento de água impactam a vida escolar dos alunos, uma vez que a falta de fornecimento prejudica as atividades escolares. Em épocas de chuva, a comunidade também enfrenta problemas com enchentes, o que combinado com as más condições de saneamento básico local, podem contribuir para a proliferação de doenças como: diarreias, hepatite A, febres entéricas, esquistossomose, leptospirose, teníases, helmintíases, micoses, conjuntivites e tracoma. (TRATA BRASIL, 2010). Reconhecendo a escola como espaço que contribui para a formação de cidadãos críticos e conscientes da realidade que os rodeia, e, sobretudo, que as condições de vida e o acesso a serviços básicos implicam diretamente sobre seu bem-estar e saúde, buscou-se elaborar uma sequência de atividades relacionada ao tema saneamento básico, como pontapé inicial da construção de uma consciência ambiental. Considerando-se que, quanto mais cedo se abordar o tema, maiores são as chances de se contribuir para a formação de cidadãos verdadeiramente comprometidos com igualdade de ingresso a serviços de saneamento básico, melhorando índices de saúde e bem-estar coletivo, preservação dos recursos naturais e preocupados com o futuro do planeta. A rede municipal de ensino de Duque de Caxias apresenta proposta educacional voltada para a fundamentação sociointeracionista. Neste sentido, refletir sobre os problemas ambientais que cercam a localidade onde se vive faz parte de uma educação de fato transformadora e o uso de atividades relacionadas ao brincar e ao interagir aproximaram a prática sob a ótica sociointeracionista (SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, 2004). As atividades, divididas em três blocos, contaram com aula expositiva, experimentos, aplicação do jogo Saneamento Básico, elaborado para este estudo, e registro das atividades, partindo-se da perspectiva dos alunos, através da produção textual tendo a professora como escriba. Conceber, aplicar e relatar uma sequência didática com material com enfoque ambiental em uma escola, do município de Duque de Caxias, que já está engajada em um projeto de Educação Ambiental. Tendo a finalidade de contribuir para a formação de cidadãos ambientalmente conscientes a respeito dos problemas ambientais. Em especial despertar consciência sobre questões que exercem impacto direto sobre seu bem-estar e saúde, e promover práticas e atitudes de valorização e respeito à água, como recurso natural.
EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A Constituição Federal, em seu capítulo que trata do Meio Ambiente, assegura que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para às presentes e futuras gerações.” E torna a Educação Ambiental uma exigência Constitucional, cabendo ao Poder Público: “promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente” (art. 225, §1°, VI) (BRASIL, 1988). O que coloca a educação como condição indispensável para construção de uma consciência ambiental e consequentemente para o exercício da cidadania. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) apontam que a exploração dos recursos naturais de forma demasiada é algo preocupante. Segundo este documento, isto vem sendo observado, sobretudo a partir da década de 1960, e que a interação homem/ natureza de forma inconsequência pode levar ao esgotamento ou a inviabilização de recursos necessários, até mesmo, à sobrevivência humana. Atentam para o fato de que o homem não é o centro da natureza. Ressaltam que movimentos de defesa do meio ambiente vêm lutando para diminuir a acelerada destruição dos recursos naturais ainda preservados e buscando alternativas que combinem conservação da natureza com a qualidade de vida das populações que dela dependem. Indicam a educação como condição indispensável para a formação de uma consciência ambiental, ao mesmo tempo em que reconhecem que ela sozinha não é suficiente para solucionar tais problemas (BRASIL, 1997).
A ação transformadora da educação apresenta limites, ou seja, não é suficiente em si realizar uma práxis educativa cidadã, participativa e revolucionária, se isso não se relacionar diretamente com outras esferas da vida. É idealismo ingênuo e simplista creditar à educação a “salvação do planeta”. Por ser um processo de aprendizagem com o outro e pelo outro, mediado pelo mundo, e, portanto, algo intrínseco à realização da natureza humana, é fundamental e primordial, contudo, sua centralidade só ganha concretude à medida que a entendemos no seu movimento de definição e objetivação na história. Por outro lado, é mecanicismo estruturalista vulgar subdimensionar a ação humana nas estruturas sociais, como se fossemos passivos e totalmente sobre determinados por estas, o que seria a negação do sujeito histórico e da práxis, portanto,
do próprio sentido que a educação assume na conformação do cidadão (LOUREIRO, 2003, p. 40).
A questão ambiental é uma preocupação mundial, isto se evidenciou, como por exemplo, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento. A também chamada Eco-92 alertou para a necessidade de afirma o papel central da educação, ao sugerir “na educação formal e na aprendizagem ao longo da vida”, a integração de “conhecimentos, valores e habilidades necessárias para um modo de vida sustentável”, oferecendo “a todos, especialmente a crianças e jovens, oportunidades educativas que lhes permitam contribuir ativamente para o desenvolvimento sustentável” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1992). Na Declaração Final da Conferência Rio+20, o documento O Futuro que Queremos, reconhece as gerações mais jovens como guardiões do futuro, fazendose necessário melhorar a qualidade e o acesso à educação para além do nível primário (CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, 2012). Sendo preciso abastar os sistemas educacionais de meios para preparar melhor os jovens para a promoção do desenvolvimento sustentável. Segundo o documento, isto se dá através de uma “melhor formação de professores, desenvolvimento de currículos em torno da sustentabilidade; do desenvolvimento de programas escolares que abordem as questões ligadas à sustentabilidade; de programas de formação que preparem os estudantes para carreiras em áreas relacionadas com a sustentabilidade; e de uma utilização eficaz de tecnologias de informação e comunicação para melhorar os resultados da aprendizagem” (CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, 2012). A Convenção sobre Diversidade Biológica afirma que os Estados contratantes devem “Promover e estimular a compreensão da importância da conservação da diversidade biológica e das medidas necessárias a esse fim, sua divulgação pelos meios de comunicação, e a inclusão desses temas nos programas educacionais” (CDB, 1992). A Lei n° 9795/1999, dispõe sobre a educação ambiental como “um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal” (BRASIL, 1999). Alguns dos princípios básico da educação ambiental, propostos por esta lei, são “enfoque humanista, holístico e participativo”, “a concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando a interdependência entre o meio natural, o socioeconômico e
o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade” e “a abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais, nacionais e globais” (BRASIL, 1999). O documento, Base Nacional Comum Curricular (BNCC), afirma que: “cabe aos sistemas e redes de ensino, assim como às escolas, em suas respectivas esferas de autonomia e competência, incorporar aos currículos e às propostas pedagógicas a abordagem de temas contemporâneos que afetam a vida humana em escala local, regional e global, preferencialmente de forma transversal e integradora” (BRASIL, 2017). Entre os temas destacados neste referencial, encontra – se Educação Ambiental, em acordo com a Lei nº 9795/ 1999. A BNCC indica ainda que esta temática deve ser tratada de forma contextualizada (BRASIL, 2017). Loureiro (2003) afirma a necessidade de se praticar uma Educação Ambiental voltada não apenas para o conhecimento do cenário global, suas causas e implicações que definem o contexto em que se move a atuação pedagógica, como também para trabalhar os problemas específicos de cada grupo social. A fim de estabelecer uma educação ambiental contextualizada e crítica, de modo que não venha reforçar as desigualdades de classe, mas para, além disso, reconhecer que elas existem e assim evidenciar os problemas estruturais de nossa sociedade e as causas dos baixos padrões de qualidade de vida. Dentro desta perspectiva, a escola precisa abrir espaço para abordar questões ambientais, sobretudo àqueles que dizem respeito à localidade onde se vive, e que provocam impacto direto ao seu bem-estar e à sua saúde.
Saneamento básico
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), o município de Duque de Caxias apresentou, no ano de dois mil e dez, um índice de desenvolvimento humano (IDH) de 0,711, ocupando a quadragésima nona posição no ranking estadual, e a milésima quingentésima septuagésima quarta posição no ranking nacional. Dados do IBGE (2010) indicam ainda que Duque de Caxias apresenta 85.3% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Entretanto, tais dados não condizem com a realidade do bairro Bom Retiro, onde a Escola Estadual Marechal Mascarenhas de Moraes se localiza. A população convive com esgoto a céu aberto, enchentes em períodos chuvosos e diversas moradias são abastecidas com água de poço. O abastecimento da unidade escolar é feito através de caminhão-pipa.
O estudo: Esgotamento Sanitário Inadequado e Impactos na Saúde da População: um diagnóstico da situação nos 81 municípios brasileiros com mais de 300 mil habitantes, produzido pelo Instituto Trata Brasil, realizou uma análise acerca dos impactos na saúde e no Sistema Único de Saúde (SUS) ocasionados pelo esgotamento sanitário inadequado nos 81 municípios brasileiros com mais de 300 mil habitantes (2003 – 2008). Com foco na análise da associação entre coleta de esgoto e ocorrência de diarreias, enfermidade comum em ambientes onde convivem pobreza e condições precárias de saneamento básico. Evidenciou a existência de duas realidades brasileiras. A primeira constituída por municípios com elevados números de cobertura e, portanto, menos sujeitos a doenças, e a segunda com predominância de localidades mais pobres, desassistidas de condições mínimas de esgotamento sanitário, onde a população encontra-se predominantemente exposta a enfermidades, como a diarreia. Esta segunda realidade é encontrada, sobretudo, nos municípios das regiões norte e nordeste e no entorno de grandes cidades, como é o caso dos municípios da Baixada Fluminense, em especial, o município de Duque de Caxias (TRATA BRASIL, 2010). O supracitado estudo aponta que o município de Duque de Caxias apresentou os piores índices por coleta de esgoto, e uma alta taxa de hospitalização por diarreia. Além de evidenciar que hospitalização por diarreia em municípios que apresentam piores taxas de cobertura de esgoto é quatro vezes maior que a dos municípios com os melhores índices. Desta forma, podem-se destacar as condições de saneamento básico como um problema ambiental recorrente que envolve os municípios da Baixada Fluminense, em especial, o município de Duque de Caxias, e consequentemente, os alunos atendidos por suas unidades escolares. O saneamento é um direito assegurado pela Constituição Federal e definido pela Lei nº 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, como o conjunto dos serviços, infraestrutura e instalações operacionais, as quais encontram-se divididas em quatro grupos: “abastecimento de água potável”, “esgotamento sanitário”, “limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos”, e por fim, “drenagem e manejo das águas pluviais, limpeza e fiscalização preventiva das respectivas redes urbanas” (BRASIL, 2007). Souza & Freire (2006) definem o saneamento para a promoção da saúde, como uma intervenção multidimensional que se dá no ambiente, considerando suas dimensões física, social, econômica, política e cultural. Seu objetivo é a implementação de sistemas de engenharia associada a um conjunto de ações integradas capazes de contribuir para a saúde, por sua vez definida como
qualidade de vida; erradicação da doença pelo combate integral às suas causas e determinantes.
Proposta pedagógica
O documento Proposta Pedagógica da Secretaria Municipal de Duque de Caxias aponta a prática pedagógica de fundamentação sociointeracionista como o caminho para uma educação transformadora, fundamentando-se nos autores Wallon, Piaget e Vygotsky. Cabendo ao professor o papel de mediador no processo de ensino-aprendizagem (SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, 2004). Na visão Walloniana, o processo de ensino-aprendizagem é o recurso fundamental do professor. Ensino-aprendizagem representa uma unidade, portanto dissociável. No exercício de sua prática, o professor precisa ter clareza de pontos fundamentais, como, por exemplo: “confiar na capacidade do aluno é fundamental para que o mesmo aprenda”, “ao ensinar, está promovendo o desenvolvimento do aluno e o seu próprio” (MAHONEY; ALMEIDA 2005). Piaget (1967) corrobora o papel da interação no desenvolvimento humano. “Não se pode dissociar de modo absoluto o organismo, ou sujeito, do seu meio ou dos objetos” (p. 146). “A inteligência humana somente se desenvolve no indivíduo em função de interações sociais que são, em geral, demasiadamente negligenciadas” (PIAGET, 1967, p. 314 apud TAILLE; OLIVEIRA; DANTAS, 2019, p. 15). De acordo com a visão sociointeracionista as características humanas não estão presentes desde o nascimento, nem são simplesmente resultados das pressões do meio externo. Elas emergem das relações homem e sociedade, onde o desenvolvimento psíquico é sempre mediado pelo outro. A cultura é parte constitutiva da natureza humana. Descreve o aprendizado como um salto quantitativo de um nível para outro. Estabelece o desenvolvimento real, como aquilo que a criança consegue fazer sozinha, e o desenvolvimento proximal, como aquilo que a criança é capaz de fazer com o auxílio de outro indivíduo (COELHO; PISONE, 2012).
Aquilo que é zona de desenvolvimento proximal hoje será o nível de desenvolvimento real amanhã – ou seja, aquilo que uma criança pode fazer com assistência hoje, ela será capaz de fazer sozinha amanhã (VYGOTSKY, 1991, p. 58)
Dentro desta perspectiva “aprender é entrar no curso de interações com parceiros, recursos diversos, desafiadores, que impulsionam o desenvolvimento”. A escola é espaço de “ampliação das visões do mundo”. Seu objetivo é a “formação de sujeitos críticos”. Sendo lugar de “diversidade, comparação de diferentes pontos de vista, ao mesmo tempo em que se compromete com a ética, com o contexto social que a envolve” (SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, 2002). Para este estudo, uma prática sociointeracionista corresponde a uma práxis educativa que vê no aluno um sujeito ativo do processo de ensinoaprendizagem, e no professor o mediador deste processo. Alunos e professores aprendem ao mesmo tempo em que ensinam. O ensino-aprendizagem se dá na interação social e na interação com objeto de conhecimento, tendo por compromisso considerar o contexto social em que estes alunos estão inseridos. A utilização de brinquedos, experiências e materiais paradidáticos reforçam a prática educativa sob a perspectiva sociointeracionista. Coelho & Pisone (2012) destacam o brinquedo como uma fonte importante para a promoção do desenvolvimento infantil.
A criação de uma situação imaginária não é algo fortuito na vida da criança; pelo contrário, é a primeira manifestação da emancipação da criança em relação às restrições situacionais. O primeiro paradoxo contido no brinquedo é que a criança opera com um significado alienado numa situação real. O segundo é que, no brinquedo, a criança segue o caminho do menor esforço - ela faz o que mais gosta de fazer, porque o brinquedo está unido ao prazer - e, ao mesmo tempo, ela aprende a seguir os caminhos mais difíceis, subordinandose a regras e, por conseguinte, renunciando ao que ela quer, uma vez que a sujeição a regras e a renúncia à ação impulsiva constitui o caminho para o prazer no brinquedo (VYGOTSKI, 1991, p. 66).
Procedimentos Metodológicos
As atividades foram realizadas na Escola Estadual Municipalizada Marechal Mascarenhas de Moraes, localizada no bairro Bom Retiro, município de Duque de Caxias. Tendo como público alvo uma turma de segundo ano de escolaridade - Ensino Fundamental I, com faixa etária, majoritariamente, entre sete e oito anos de idade. A classe é composta por vinte e três alunos.
Desenvolvimento do jogo
O Jogo Saneamento Básico foi criado especificamente para o desenvolvimento desta monografia, como também a elaboração de uma sequência didática que desenvolvesse nos alunos atitudes e habilidades que colaborassem para a participação de toda turma, com autonomia. Considerouse em sua criação o contexto social da comunidade escolar em que o mesmo foi aplicado. O jogo objetiva conhecer problemas de saneamento básico nas cidades, e identificar ações para solucioná-los. Foi pensado de modo a atender à faixa etária do público. Em sua confecção foram utilizados os seguintes materiais: tecido (algodão cru), tintas e canetas de tecido, lápis 6B, agulha, linha de crochê, sacos transparentes, cartolina, figuras, cola e tesoura. O jogo é composto por um tabuleiro pintado em tecido, onde cada equipe é representada por uma cidade que contém um rio limpo, mata ciliar e moradias (quatro equipes ao todo). Ao redor de cada cidade, apresenta bolsos transparentes para a fixação das cartas sorteadas. E doze cartas, que contém quatro fontes possíveis de abastecimento de água; quatro destinos possíveis para o lixo sólido; e quatro destinos possíveis para o esgoto sanitário. As cartas apresentam bactérias patógenas, com quantidade variando de zero a três níveis de bactérias, de acordo com a inadequação sanitária que apresenta. As cartas positivas não contêm bactérias. O jogo Saneamento Básico é dividido em quatro rodadas, e pode ser jogado por até quatro equipes. A turma foi divida em quatro equipes, de cinco a seis integrantes. Na primeira rodada foram sorteadas as fontes de abastecimento de água de cada cidade. Na segunda rodada, o destino para o lixo sólido. Na terceira rodada cada equipe coletivamente escolheu um destino para o esgoto sanitário da cidade, para tal foi realizado um sorteio prévio definindo a ordem das equipes a escolher. Na quarta, e última rodada, foi pedido a cada equipe que escolhesse, dentre as cartas que sorteou/ escolheu uma ação para investir ou aprimorar em sua cidade. Num primeiro momento foi pedido que cada equipe propusesse uma ação, e posteriormente lesse a sugestão trazida na carta.
Sequência didática
Na escola as atividades foram divididas em três momentos/ dias. Contouse com aula expositiva, exibição de vídeo, experimentos, a fim de proporcionar embasamento teórico para a participação no jogo Saneamento Básico, criado para este trabalho, e produção textual coletiva, tendo a professora como escriba. Na aula expositiva, optou-se pela utilização de cartazes contendo o planeta Terra, o gráfico: Usos da Água, Estação de Tratamento de Água – ETA e Estação de Tratamento de Esgoto – ETE.
Planeta Terra. Fonte: Sabesp.
Usos da água. Fonte: CIB – Conselho de Informações sobre Biotecnologia.
Tratamento da água. Fonte: Sabesp.
Tratamento de esgoto. Fonte: Sabesp.
A partir da exibição do desenho O Show da Luna, episódio: “Como a água vira chuva?”, explorou-se o ciclo da água, de maneira lúdica (Disponível em https://youtu.be/WpOkQ7ayUxQ). Alguns experimentos foram selecionados para este estudo: Propriedade da água: solvente universal. Materiais utilizados para este experimento: copo transparente, água, açúcar e talher para auxiliar na dissolução. Dissolveu-se o açúcar na água. Onde a água é o solvente e o açúcar o soluto, formando uma solução homogênea (Adaptado de https://brasilescola.uol.com.br/quimica/soluto-solvente.htm). Propriedade da água: tensão superficial. Nesta experiência utilizouse: uma bacia, água, purpurina e detergente. Na bacia com água, adicionou-se purpurina e posteriormente o detergente (Adaptado de https://educador.brasilescola.uol.com.br/estrategias-ensino/ experimento-sobretensao -superficial-Agua.htm). No segundo dia, outras experiências foram realizadas: Flores coloridas. Materiais utilizados: copos com água, corante alimentício nas cores azul e amarela e flores brancas. Adicionou-se corante na água e as flores brancas, colocadas com as hastes cortadas em diagonal, para auxiliar a absorção (Adaptado de BURKE, 2012). Corrida dos peixes. Para este experimento foi utilizado uma tigela com água, peixes com base de papelão e detergente. Os peixes foram colocados na tigela com água, adicionou-se detergente (Adaptado de BURKE, 2012). Totalizando quatro experimentos ao longo desta sequência didática. Além disso, os alunos participaram da aplicação do jogo Saneamento Básico. Para o terceiro dia foi proposto à produção de um texto coletivo, onde a turma registrou o que lhe foi apresentado no decorrer da semana. Para facilitar a construção do texto os alunos foram orientados a seguirem a ordem cronológica das atividades, e destacarem o que eles aprenderam a partir de cada atividade. A produção textual teve a professora como escriba.
Resultados
As atividades do primeiro dia proporcionaram aos alunos embasamento teórico necessário à participação do jogo aplicado no segundo dia de atividades. Foram iniciadas com uma aula expositiva sobre a “Água”. Os alunos demostraram muita curiosidade e interesse pelo assunto abordado. Ao serem indagados acerca das utilidades da água, responderam que é usada para: “lavar louça”, “tomar banho”, “regar as plantas”, “beber”, “fazer suco”, “encher a piscina”, “escovar os dentes”, “fazer comida” e “lavar o jardim”. Indicando, exclusivamente, os usos domésticos da água. Buscou-se demonstrar a partir da ilustração do planeta Terra, a proporção de água e terra de nosso planeta. Além disso, discutiu-se sobre a quantidade de água disponível para consumo, e que nem toda água pode ser consumida. Uma vez que a ingestão de água contaminada ou salobra pode provocar doenças. Os alunos reconheceram que apesar de o planeta Terra possuir uma grande quantidade de água, a maior parte dela encontra-se nos oceanos, não podendo ser utilizada para a maioria das finalidades humanas. E que a água doce se apresenta em uma quantidade muito inferior a salgada. Também demonstraram que sabiam, empiricamente, que nem toda água pode ser consumida. A princípio disseram que a mesma precisa ser filtrada, embora ao serem indagados sobre o que seria água potável demonstraram que ainda não conheciam este conceito. Estimulou-se a criação de hipóteses acerca dos setores onde a água é mais utilizada: uso doméstico, industrial ou na agricultura. Através do gráfico Uso da Água, perceberam que a maior parte dela é destinada para a agricultura, seguida pela indústria e uso doméstico. Ao serem questionados sobre a importância de economizar água em casa, definiram-na como “muito importante, e que não pode ser desperdiçada”. Os alunos foram questionados sobre os estados físicos que a água pode apresentar na natureza, incentivados a citar exemplos, e o estado físico em que a água é mais utilizada. Reconheciam a água apenas no estado líquido. A partir de exemplos como: “colocar a água no congelador”, perceberam que ela pode ser encontrada no estado sólido, e associaram a situações em que a água também se encontra em estado sólido na natureza, tais como: geleiras, chuva de granizo e neve. Em relação ao estado gasoso da água, perceberam, somente, a sua existência após assistirem ao desenho O Show da Luna, episódio: Como a água vira chuva?. Podendo-se perceber a passagem da água de estado líquido para o estado de vapor, onde o calor do Sol provoca a evaporação da água de rios,
lagos e oceanos, por exemplo, formando as nuvens de chuva. Reconheceram a importância do Sol para a manutenção do ciclo da água. Caso o Sol deixasse de existir, pararia de chover, uma vez que ele é a fonte de calor que faz com que a água evapore. Os alunos também associaram a evaporação provocada pelo Sol à evaporação que ocorre ao se cozinhar, onde, neste caso, o fogão é a fonte de calor (Disponível em https://youtu.be/WpOkQ7ayUxQ). Foram abordadas duas propriedades da água: solvente universal e tensão superficial, através de dois experimentos simples, que demonstraram a dissolução do açúcar e a capacidade da água de sustentar objetos leves como a purpurina. Sendo possível perceber que assim como a água e o açúcar formam uma solução, o nosso sangue também é uma solução homogênea que transporta nutrientes por todo o nosso corpo. Esta propriedade permite o transporte de substâncias tanto no corpo humano quanto nas plantas. Atentou-se também para a importância desta propriedade na manutenção da vida. Os estudantes compreenderam que a adição de detergente interfere na tensão superficial da água, fazendo com que a purpurina caia para o fundo da bacia. Através da explicação das etapas de uma estação de tratamento de água, enfatizou-se a importância de consumir água de fontes confiáveis, e que ela precisa ser tratada antes de consumida. Foi perguntado aos alunos acerca da procedência da água utiliza por eles em casa, e na escola. A maior parte dos alunos afirmou ter acesso apenas à água de poço. Questionados sobre a procedência da água da escola, alguns já haviam observado que a unidade é abastecida por meio de caminhão-pipa. Constatou-se o conhecimento prévio da utilização do cloro para eliminar micro-organismos patógenos, que a turma representou como “micróbios”. Conheceram as etapas de tratamento da água. Ao serem questionados sobre o que acontece com a água após sua utilização, os estudantes responderam que a mesma vira esgoto. E quanto ao destino do esgoto, disseram que vai para o valão (esgoto a céu aberto). Reconheceram que estes valões poderiam, anteriormente, ter sido rios limpos e até mesmo utilizados para fins recreativos. Desconheciam que o esgoto poderia ser tratado, antes do seu lançamento no rio. Conheceram as etapas de tratamento de esgoto. Destacaram ser injusto se retirar água limpa do rio (insípida, incolor e inodora) e devolver esgoto sem tratamento, e que todos deveriam ter acesso ao tratamento de água e esgoto. Enfatizou-se que, assim como a água, o esgoto também precisa de tratamento antes de ser lançado na natureza. As etapas de tratamento do esgoto líquido também foram apresentadas, encerando o primeiro dia de atividades.
O segundo dia iniciou com a realização da experiência das flores coloridas, que teve por finalidade demonstrar o movimento da água da base da planta até o seu topo. Realizada no início da aula para que pudesse ser observado ao longo do turno. Os alunos foram estimulados a criar hipóteses sobre o que aconteceria com as flores. A hipótese levantada por ele foi de que elas ficariam coloridas ao “beberem” a água com corante. Observaram a mudança na coloração das pétalas durante todo o turno.
Experiência flores coloridas. Fonte: Ana Caroline Pereira (2019).
A aplicação do jogo Saneamento Básico foi bem aceita pela turma. Mostraram-se muito entusiasmados e curiosos. Estavam presentes vinte e dois alunos. Os mesmos se dividiram em quatro grupos de cinco a seis alunos, conforme solicitado. Para cada equipe foi indicado um líder.
Aplicação do jogo Saneamento Básico. Fonte: Ana Caroline Pereira (2019).
A princípio foi pedido aos alunos que observassem o tabuleiro do jogo. Perceberam que se tratavam de quatro desenhos iguais, cada um contendo casas, árvores e um rio. As regras foram explicadas. Destacada a importância da concentração e participação de toda a equipe nas etapas do jogo. Na primeira rodada do jogo foram sorteadas as cartas contendo as fontes de abastecimento de água de cada cidade. As crianças atentaram-se para o fato de que as cartas apresentavam imagens de bactérias patógenas, que variavam de zero a três bactérias. Foi esclarecido que serviriam como dicas para dimensionar a gravidade do problema apresentado. Quando perguntados sobre o porquê de as cartas “água de rio”, “água de poço” e “água da chuva” apresentarem o mesmo número de bactérias, um dos alunos respondeu que essas fontes não são confiáveis, e que não há como saber se a água é potável. Indagados sobre a fonte de água mais confiável, responderam que é a água de rua, pois é tratada, referindo-se a água fornecida pelas estações de tratamento. O destino para o lixo também foi escolhido por sorteio. Foi percebido o descontentamento por parte dos integrantes dos grupos que sortearam as cartas “lixões a céu aberto” e “jogar lixo na rua”. O destino para o esgoto foi escolhido por todos os integrantes de cada equipe, respeitando o sorteio de um número, variando de um a quatro, em ordem crescente. Tendo prioridade de escolha a esquipe que sorteou o número um seguido por dois, três e quatro, respectivamente. A Equipe I escolheu a carta “estação de tratamento de esgoto”, alegando que a mesma faz o esgoto ficar praticamente limpo, e porque a carta não apresentava bactérias. A Equipe II escolheu a carta “fossa séptica”, por apresentar caixas de esgoto e apenas uma bactéria. A Equipe III escolheu a carta “apenas o esgoto industrial é recolhido e tratado”, baseando-se pelo número de bactérias, acreditaram ser a melhor opção. Para a Equipe IV restou à carta “esgoto residencial e industrial lançado diretamente no rio”. Após todas as cartas serem anexadas ao tabuleiro, as cidades ficaram configuradas da seguinte maneira: • Cidade da Equipe I: abastecida por água de rio, sem tratamento. O destino do lixo é a rua ou terreno baldio. A cidade possui estação de tratamento de esgoto. Cidade da Equipe II: abastecida por água da chuva, sem tratamento. O lixo é destinado para lixões a céu aberto. O esgoto é tratado por fossas sépticas.
Cidade da Equipe III: abastecida por água de poço, sem tratamento. O lixo é destinado para o aterro sanitário. Apenas o esgoto industrial é tratado. Cidade da Equipe IV: abastecida por água tratada. O lixo é destinado para a coleta seletiva. O esgoto é lançado diretamente no rio, sem tratamento.
Na quarta e última rodada do jogo, foi pedido para que cada equipe escolhesse um dos problemas da cidade, e pensassem em ações para solucionálo. A Equipe I destacou o destino do lixo da cidade, que é jogado na rua, como o problema que gostaria de solucionar. Alegou que a chuva pode levar todo o lixo para o rio, e provocar enchentes. Propôs o uso de caminhões de lixo na cidade. Após, foi pedido que abrissem a carta e lessem a sugestão trazida: “Investir na educação da população e na coleta de lixo”. Após a leitura acrescentaram que jogar lixo na rua é falta de educação. A Equipe II considerou os lixões a céu aberto como um problema que apresenta urgência em ser resolvido. Entretanto, não conseguiu propor uma solução. Foi pedido que um integrante lesse a sugestão proposta na carta: “Investir na construção de aterros sanitários”. Após a leitura foi aberta uma conversa com toda turma sobre alguns problemas causados pelos lixões. Sobretudo, o chorume que pode contaminar o solo e a água e explicado o que é um aterro sanitário. A Equipe III destacou o destino do esgoto da cidade “apenas o esgoto industrial é tratado”, como o problema a ser solucionado. Propuseram que todo o esgoto seja tratado, não somente o da indústria. A proposta da equipe foi de encontro com a sugestão da carta. A Equipe IV argumentou que o único problema da cidade seria o destino do esgoto, “esgoto de toda cidade lançado no rio”. Como solução, propuseram o tratamento do esgoto antes de ser lançado no rio. Após a leitura das sugestões da carta: “Investir na construção ETE” e “Conscientizar a indústria”, considerou ser um erro a indústria não tratar seu esgoto e lançá-lo no rio. As crianças classificaram o jogo como “divertido e muito educativo, por ensinar várias coisas sobre lixo, água e esgoto”. Em seguida foi realizada a experiência Corrida dos Peixes que serviu para reforçar o entendimento acerca da propriedade da água: tensão superficial. Onde os peixes ficam praticamente parados por conta da tensão superficial, e ao se jogar detergente a tensão da superfície é rompida e os peixes impulsionados para frente. Como o recipiente era pequeno, a turma foi dividida em dois grupos,
de modo que todos conseguissem observar. Os alunos relacionaram esta experiência a da purpurina, onde detergente também é utilizado para interferir na tensão superficial.
Corrida dos peixes. Fonte: Ana Caroline Pereira (2019).
No terceiro dia os alunos produziram um texto coletivo reunindo o que haviam vivenciado durante as atividades:
O que aprendemos nesta semana?
Aprendemos sobre a água, que no planeta Terra tem mais água salgada do que doce. Que nem toda água pode ser consumida, apenas a água potável. O consumo de água contaminada causa doenças, como a diarreia. Água e esgoto precisam ser tratados. Assistimos ao desenho O Show da Luna, episódio: “Como a água vira chuva?”. O Sol faz a água evaporar, ela vira nuvem e faz chover. A água volta para os rios, mares e lagos, e tudo se repete num sobe e desce. Descobrimos que a água dissolve o açúcar e outras substâncias. E é capaz de fazer uma camada para segurar coisas leves, como a purpurina, mas o detergente faz as coisas descerem (tira a tensão superficial da água). Colocamos corante azul e amarelo num copo com água, e uma flor branca. Percebemos que a flor mudou a cor porque sugou a água com o corante.
Participamos do jogo Saneamento Básico, que ensina sobre a água, esgoto e lixo. Foi muito legal, porque demos nossa opinião sobre melhorias na cidade.
Depois teve a corrida dos peixes, o detergente fazia com que eles andassem rápido.
Discussão
Os resultados obtidos neste estudo demonstram que a participação ativa dos alunos no processo de ensino-aprendizagem é essencial para a prática de uma educação efetiva. A atividade de ensinar pautada em um professor que “passa” a matéria, e alunos que escutam e respondem a um “interrogatório”, é uma forma peculiar e empobrecida de ensino. (LIBÂNEO, 2013). Um ensino efetivo compreende ações conjuntas do professor e dos alunos. Estes são estimulados a assimilarem os conteúdos, consciente e ativamente. Dentro desta perspectiva, buscou-se iniciar as atividades partindo-se dos saberes dos alunos, ao indagá-los acerca das utilidades da água, bem como o que eles entendiam por água potável, colocando-os no centro do processo de ensino-aprendizagem, como sujeitos ativos deste processo. Reconhecendo assim que os educandos não são folhas em branco a serem preenchidas, mas trazem conhecimentos que podem, e devem ser valorizados. Neste estudo experimentos foram utilizados por entender que: “a atividade experimental de demonstração compartilhada por toda classe sob a orientação do professor, em um processo interativo que de certa forma simula a experiência vivencial do aluno fora da sala de aula enriquece e fortalece conceitos espontâneos associados a essa atividade” (GASPAR; MONTEIRO, 2005, p. 233). Os conceitos de tensão superficial e solvente universal da água foram assimilados a partir da realização de experimentos. Estes experimentos motivaram os educandos, despertaram a curiosidade e contribuíram assim para sua aprendizagem. A utilização do vídeo: O Show da Luna, episódio – “Quando a água vira chuva” auxiliou os alunos a compreenderem, de forma lúdica, o ciclo da água, e a importância do Sol para a manutenção deste ciclo. Para Rosa (2000) a utilização de filmes tem um forte apelo emocional, motivando a aprendizagem dos conteúdos e alterando, de forma saudável, a rotina da sala de aula. Além disso,
a utilização deste recurso dispensou a necessidade de uma abordagem tradicional, como, por exemplo, a utilização de textos e questionários, para a compreensão deste conteúdo. Os estudos acerca da Água, sua utilização, propriedades, ciclo e tratamento introduziram o tema Saneamento Básico. Este tema emergiu do contexto social da escola, onde as atividades foram desenvolvidas. O bairro enfrenta visíveis problemas de inadequação sanitária, como por exemplo, esgoto a céu aberto. Evitou-se assim o risco, alertado por Guimarães (2004), de um projeto pedagógico com temática acerca da Educação Ambiental, ficar preso no que ele chama de “armadilha paradigmática” tendendo a reproduzir práticas voltadas para a mudança comportamental do indivíduo, muitas vezes, descontextualizadas da realidade socioambiental em que as escolas estão inseridas. Muito pode ser feito quanto ao tema educação ambiental, sobretudo quando direcionado ao contexto social de certa localidade, e não somente a preservação de áreas ambientais e ao combate à poluição de maneira global. É muito mais palpável e coerente desenvolver a consciência ambiental a partir de problemas enfrentados na localidade onde o indivíduo está inserido e transcender tal consciência para as preocupações com problemas de caráter regional e global. A escolha pela elaboração de um jogo para tratar o tema Saneamento Básico se deu por entender que a atividade de brincar é fundamental ao desenvolvimento da criança. Brinquedos baseados em regras envolvem uma situação imaginária, desenvolvem a abstração da criança, pois no brinquedo “o pensamento está separado dos objetos e a ação surge das ideias e não das coisas” e o autocontrole, uma vez que a criança “age de maneira contrária à que gostaria de agir”, subordinando-se às regras (VYGOTSKI, 1991). Ficou evidente, na aplicação do jogo, que a turma demostrou aceitação às regras, cooperação, trabalho em equipe, e em especial, elaboração de hipóteses para solucionar problemas enfrentados por suas cidades. As atividades desenvolvidas anteriormente proporcionaram aos alunos condições de participar, opinar e elencar quais seriam as melhores e as piores condições de saneamento básico, dentre as apresentadas. Além disso, o jogo foi criado especialmente para o contexto de saneamento básico vivido pela comunidade Bom Retiro, proporcionando aos educandos perceberem que as condições sanitárias do bairro onde residem são inadequadas. Considerando “a avaliação como um componente do processo de ensino que visa, através da verificação e qualificação dos resultados obtidos, determinar a correspondência destes com os objetivos propostos” (LIBÂNEO, 2013, p. 217).
A produção textual coletiva da turma exerceu a função de verificar as habilidades e atitudes alcançadas pelos alunos no decorrer desses três dias de atividades.
CONSIDERAÇÕES
Este trabalho tratou da observação de uma série de atividades voltadas para a educação ambiental, com ênfase no contexto social enfrentados pelos alunos. O ápice do presente estudo se deu na confecção e aplicação do jogo Saneamento Básico que considerou, em sua construção, a realidade da unidade escolar, que atende a turma onde o mesmo foi aplicado. Foi proporcionado, de forma panorâmica, o acesso a informações e conhecimentos básicos acerca do tema abordado, alternando atividades expositivas e lúdicas (experimentos), seguidas pela aplicação do jogo e produção textual coletiva. O presente relato baseou-se na aplicação de material com enfoque ambiental, em uma escola que já havia definido como projeto anual o referido tema. Nesse contexto o material obteve aceitação positiva e atendeu ao público e à faixa etária. Percebeu-se que os alunos adquiriram muitos conceitos através da combinação entre aula expositiva, experimentos e jogo. Isto pôde ser evidenciado na fala produzida coletivamente por eles. Para, além disso, constatou-se que os educandos passaram reconhecer que as condições de saneamento básico que os rodeiam são inadequadas, ao criticarem a forma como o esgoto sanitário de seu bairro é descartado, ao reivindicarem o acesso de todos ao tratamento de água e esgoto, ao perceberem que as inadequações no saneamento básico contribuem para a disseminação de doenças, e que políticas públicas precisam ser implementadas para garantir à localidade melhores condições sanitárias. Despertou-se nos alunos atitudes de valorização à água, recurso natural essencial a manutenção da vida. Atingindo o objetivo de contribuir para a formação de agentes multiplicadores de atitudes de valorização e respeito à água como recurso natural.
REFERÊNCIAS
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Com seus dez anos, sabido como dez livros completos, no isopor, a tiracolo leva sua vida a preço. Picolezeiro, por um sorriso dou-te um cruzeiro. (...) Picolezeiro, o teu sorriso vale um cruzeiro? Passam os ônibus, passam por suas mãos os dinheiros. Descalço de pés e sonhos, só ele é passageiro. Picolezeiro, só valeis isso, tu e companheiros? Picolés de milho verde e uma espiga de protesto: não te vendas mais em trocos, tira o tiracolo em tempo!
Dom Pedro Casaldáliga