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anos – 1946-2021

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DOCUMENTO 3

DOCUMENTO 3

Reflexões e Propostas das Confissões Religiosas

A) Reflexões e Propostas da Aliança Evangélica Portuguesa (AEP)sobre a Liberdade Religiosa em Portugal

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A Aliança Evangélica Portuguesa foi organizada em 1921 sob a liderança do seu primeiro presidente, Eduardo Moreira, muito embora o seu estatuto legal só tivesse sido obtido em 1935. Tem a sua sede em Lisboa, na Av. Conselheiro Barjona de Freitas, nº 16 B. Constituída por pastores e líderes das Igrejas Evangélicas, os seus grandes objetivos iniciais eram a luta pela pureza da Fé e da Doutrina Evangélicas, a luta pela liberdade religiosa e a abolição das discriminações de que os Evangélicos eram vítimas, relativamente à Igreja Católica Romana, que era a confissão dominante. Ao longo dos anos setenta, a Aliança Evangélica, com o apoio de outras Alianças Evangélicas Europeias, desenvolveu uma destacada ação na área da assistência social, apoiando as Igrejas locais nos seus contactos com as pessoas mais necessitadas. No final desta década, a assistência social orientou-se, significativamente, para o apoio às famílias “retornadas”, fornecendo artigos alimentares e concedendo apoios financeiros para a sua instalação e para concretização de projetos destinados à sua inserção na vida ativa. Além desta atividade, a AEP procurou sempre representar a Comunidade Evangélica nas suas relações com a sociedade e o Estado. Internamente a AEP constitui-se como um ponto de encontro da liderança evangélica para debater e tomar posição sobre aspetos relevantes da vida das Igrejas Evangélicas em Portugal, e dos seus pastores, ao mesmo tempo que procura coordenar a realização conjunta de projetos a nível nacional. Em meados dos anos 80, a Aliança Evangélica Portuguesa altera os seus estatutos, cria condições para um maior envolvimento das Igrejas no seu organismo de representação, amplia as suas estruturas e dinamiza as suas atividades de âmbito coletivo e nacional.

No início dos anos 90, adquire uma nova dinâmica na luta pelo reconhecimento da identidade e dignidade da Comunidade Evangélica, na luta pela abolição das discriminações de que a mesma é vítima em diversas matérias, na luta pela eliminação das barreiras que ainda existem ao normal exercício da atividade das Igrejas Evangélicas, na conquista do direito a ensinar a Religião e Moral Evangélicas, nas escolas públicas, na conquista do acesso à televisão no âmbito do serviço público e na luta para que o Estado reconheça formalmente a existência da “Confissão Cristã Evangélicas” e a AEP como o seu organismo de representação, a par do COPIC. Algumas destas lutas têm sido parcialmente bem-sucedidas, outras ainda enfrentam grandes resistências político-sociais, levando a que se arraste no tempo a desejada obtenção de direitos básicos ao livre exercício da atividade religiosa das Igrejas e dos seus pastores e líderes. A luta pelo reconhecimento do “interesse público nacional” da “confissão evangélica” e da sua efetiva dimensão qualificativa e quantitativa, que tem sido um dos grandes objetivos da AEP, ainda que intensiva e insistente, não tem obtido resultados muito significativos. A AEP congrega e representa a comunidade evangélica não ligada ao COPIC, com um número de fiéis diretamente envolvidos nas Igrejas na ordem dos 250.000, exercendo a sua influência a 500.000 pessoas, com cerca de 1.500 locais de culto espalhados por todo o Continente e Ilhas, com cerca de 900 pastores e outros líderes, com cerca de 2.000 quadros superiores, socioprofissionais e empresários, com 12 escolas de ensino teológico, de Educação Moral e Religiosa Evangélica, com um programa mensal televisivo no “Programa Caminhos” da RTP2, e exercendo muitas outras atividades ligadas à promoção da fé cristã evangélica, à salvação dos portugueses e à valorização da vida humana. A AEP coordena e dinamiza projetos a nível nacional promovidos pelas Igrejas e apoia-as, bem como aos seus pastores e obreiros, em diversos aspetos da sua ação local. Está internacionalmente em íntima cooperação com as Alianças Evangélicas dos países da UE e com o organismo de cooperação mundial, designada de Aliança Evangélica Mundial, com sede em Singapura.

Lisboa, julho de 1996

Exposição justificativa

I

1. Congratula-se a Aliança Evangélica Portuguesa com a corajosa criação, por despacho do Ministro da Justiça, da “Comissão de Reforma da Lei da Liberdade Religiosa”, com vista a

“uma urgente renovação da legislação básica sobre a liberdade religiosa”. Reconhecendo este Despacho a existência na Lei 4/71, de 21 de agosto, cujos reduzidos segmentos estão em aplicação no nosso ordenamento jurídico, “de regras de todo inaceitáveis, no que respeita às confissões não católicas, que se traduzem, na prática, em discriminação de que têm sido objeto de frequentes denúncias públicas e de acordos das confissões religiosas com o Estado, em tudo semelhantes à

Concordata de 7 de maio de 1940, entre a Santa Sé e a República de Portugal. Por fim adverte a decisão ministerial que se impõe nunca esquecer a realidade da sociedade portuguesa, em que evidentemente avulta a especial posição da Igreja católica, largamente maioritária e o especial estatuto jurídico da

Concordata que não é afetada pela reforma. 2. Em cumprimento do seu mandato, solicitou a Comissão de

Reforma às diversas associações religiosas, inscritas no ministério da Justiça, o envio de propostas em matéria legislativa. 3. Diga-se, todavia, que a algumas Igrejas Evangélicas, com os estatutos de depositados no Governo Civil, não chegou a solicitação da Comissão, bem como às associações religiosas, cujos estatutos não foram remetidos pelo notário ao Ministério da

Justiça, não obstante determinação ministerial neste sentido.

II

4. E a verdade é que, desde há muito, se impunha, urgentemente, a reformulação global da Lei 4/71, de 21 de agosto, em matéria do direito à liberdade religiosa.

5. Pretendeu visivelmente esta lei 4/71, porque integrada e inspirada na filosofia política do regime de então, dois objetivos bem marcantes, aliás espelhados no Parecer da Câmara Corporativa, que precedeu à sua discussão e aprovação na Assembleia da República, e que Aliança Evangélica Portuguesa logo então denunciou, como o Deputado Reboredo e Silva o salientou: • Privilegiar a religião Católica Apostólica Romana: • Organizar e disciplinar as demais confissões religiosas não católicas; • Assim criando dois pesos e duas medidas, discriminando as não católicas em favor da católica. 6. E é elucidativo que o Decreto nº 216/72 de 27 de junho, que veio regulamentar aquela Lei, tenha vindo a reconhecer a violação dos princípios de auto-organização e autodeterminação, que representam o conteúdo do direito à liberdade religiosa as confissões automaticamente reconhecidas religiosas em que se integram as associações religiosas regularmente constituídas. 7. Aliás, tais discriminações vinham na esteira do que tinha acontecido a Portugal em matéria de direitos fundamentais no que diz respeito à liberdade religiosa: de 1822 a 1976, em 155 anos, apenas 20, durante o período da República, em exercício efetivo do direito à liberdade religiosa. 8. Impondo-se, a reformulação global da lei 4/71, em matéria do direito à liberdade religiosa, todavia esta não teve lugar com o 25 de abril de 1974. Até porque tendo-se logo procedido à elaboração de novas leis ordinárias em matéria de direitos, garantias e liberdades: direito de associação, direito de reunião e manifestação, direito de expressão, direito de constituição de partidos políticos, direito de associação sindical, nenhum diploma veio a publicar-se sobre outro direito, de tanto relevo individual, social e público como os demais: o direito à liberdade religiosa. 9. E foi a Procuradoria-Geral da República que, em boa hora, acabou por solucionar esta lacuna, pelo seu Conselho Con-

sultivo, inicialmente com o Parecer nº 60/74, de 19 de dezembro (B.M.J. 246.35), concluindo por uma harmonização do Decreto-Lei nº 594/74, de 7 de novembro e do Decreto nº 216/72, desenhando aquele o formalismo para aquisição de personalidade jurídica das associações ou institutos religiosos não católicos, mantendo este para a organização do registo respetivo no Ministério da Justiça. 10. É certo que três tentativas legislativas houve, após o 25 de abril, ainda com base na Lei 4/71, de fazer cessar as discriminações que permaneciam, pelo menos no concernente aos regimes fiscais.

A primeira consta do projeto de Lei 138/I, de 17 de julho de 1979, apresentado pelo Deputado independente Sousa Franco, na 3ª sessão legislativa (1978-1979), que não veio a ter seguimento.

A segunda, constante do projeto de Lei 318/II, de 12 de Fevereiro de 1981, do mesmo Deputado pela ASDI, com proposta de alteração dos Deputados Jorge Miranda e Vilhena de Carvalho, veio a ser aprovada na generalidade, baixando à Comissão, tendo findado, entretanto, a sessão legislativa.

A terceira, inserta no projeto de Lei nº 117/III, de 20 de Junho de 1983, apresentado pela ASDI, que não veio a ter seguimento, por, entretanto, ter sido dissolvida a Assembleia. 11. Aliás, foi só a Constituição de 1976 que, efetivamente, na esfera do direito fundamental à liberdade religiosa, veio a dar significativo avanço. No domínio do individual, consagrando a liberdade de culto, e de religião, de forma inviolável, a proibição de toda a discriminação ou privilégio por motivos religiosos, o direito à reserva pessoal das convicções religiosas. No domínio do coletivo – Igreja, comunidade, confissão – com a afirmação do princípio da separação entre o Estado e as Igrejas, que de um lado, demanda a neutralidade confessional do

Estado, e de outro, garante a não ingerência do Estado na organização das Igrejas e no exercício das suas funções e do culto.

Aliás, este princípio da separação das Igrejas e do Estado viria, até, a constituir limite material de revisão – segundo o art.º 288º, alínea c) da Constituição. Ora em face da Consti-

tuição – da qual decorre a inconstitucionalidade de diversos diplomas ordinários, de natureza estatuária e fiscal e no domínio do direito à liberdade religiosa – como até da própria Concordata – por ação ou omissão - impõem-se naturalmente a reformulação da Lei sobre a liberdade religiosa – em termos quase radicais.

III

12. A Aliança Evangélica Portuguesa que congrega no seu seio a grande maioria da Comunidade Evangélica, perfaz, neste ano de 1996, 75 anos da sua existência, uma vez que, em sessão plenária de 14 de novembro de 1921, foi proclamada solenemente a sua constituição definitiva, após laboriosas conversações que vinham desde 1971. Só em 1939 pôde a Aliança ultrapassar as dificuldades criadas, então, pelas autoridades e depositar os seus Estatutos no Governo Civil de Lisboa. Deve-se a sua criação a duas nobres causas de um ideal comum às Igrejas, pastores, obreiros e comunidades evangélicas: a evangelização de Portugal e a defesa do direito fundamental à liberdade religiosa, causas que ainda hoje se mantém na linha das suas grandes paixões e alvos. Objetivos que atravessaram a ditadura, que continuaram logo após a farisaica lei da liberdade de 1971, que prosseguiram apesar do 25 de abril de 1974, e que, pese o nosso avançado texto constitucional, continuam, em razão das discriminações existentes. 13. Um dos documentos que segue em anexo informa, claramente, o que é a Aliança Evangélica Portuguesa, quias as Igrejas e seus

Organismos de Cooperação, Comunidades, Institutos e Seminários, Organizações de Juventude, de Reabilitação de Drogados, de

Solidariedade Social de apoio à Terceira Idade, que a compõem e estruturam, bem como os seus objetivos, os seus princípios de fé e de Deontologia, numa demonstração inequívoca do relevante e significativo papel e função pública e social, que desempenham e desenvolvem. Pare este documento se remete, pois.

IV

14. As propostas, elaboradas e que se juntam, também, em anexo, correspondem ao pensamento da Aliança Evangélica Portuguesa, ouvidos os seus Órgãos Sociais, Organismos de Cooperação e Igrejas Independentes dentro dos seguintes parâmetros globais: • Acatamento da Constituição da República Portuguesa de 1976, já que se entende que o texto do seu atrigo 41º não obsta, antes estimula, o possível estabelecimento de Acordos, Convénios ou Concórdias entre o Estado e as Igrejas, Confissões ou Comunidades Religiosas não católicas, em paralelo e paridade com o regime Concordatário da Igreja Católica; • Vigência do sistema concordatário, decorrente da Concordata de 7 de maio de 1940, entre a Santa Sé e a República Portuguesa, ainda que se entenda que o mesmo se tornou inconstitucional, após a constituição de 1976, demais se não forem concedidos às Igrejas, Confissões e Comunidades não católicas os benefícios de que usufrui a Igreja Católica; • Reformulação total da Lei nº 4/71, já em razão da filosofia política e social que a inspirou, de natureza democrática ou não, já em razão da sua não adequação à sociedade portuguesa atual; • Inspiração da nova Lei de Liberdade Religiosa, segundo o modelo espanhol, de entre os modelos fornecidos pelo direito comparado, por ser o que melhor se ajusta ao fenómeno religioso português, designadamente na área evangélica, onde a luta histórica contra a perseguição e intolerância religiosas foi levada a cabo por entidades aglutinadoras de Igrejas, Confissões e Comunidades – v.g. Aliança Evangélica Portuguesa – já, ainda, em razão da Concordata com a Santa Sé, de 1940, bem como pela Concordata com a Santa Sé, de 1940, e a posição especial da Igreja Católica, largamente maioritária, só oponível em paridades por estas entidades aglutinadoras.

• Não definição do conceito de seitas, uma vez que se afigura a mesma não caber ao Estado, relegando-se a problemática para o domínio eclesiástico.

V

15. Dentro destas coordenadas, apresentam-se quatro anteprojetos, que refletem o pensamento das Igrejas, Organismos de Cooperação, Organizações, que se congregam na Aliança Evangélica Portuguesa. Tendo a humildade de reconhecer que não constituem trabalho acabado, preocupam-se os mesmo em solucionar todo o conjunto de desigualdade e de discriminações que, nosso ordenamento jurídico ordinário, se verificam ainda hoje, entre o que é concedido à Igreja Católica e denegado às outras Igrejas e confissões não católicas, não obstante desempenharem estas, como no caso da Aliança

Evangélica Portuguesa, idêntica função pública e social. Respeitam os anteprojetos a quatro grandes temas: • O primeiro, sobre o conteúdo do direito à liberdade religiosa; • O segundo, versando a organização e funcionamento do registo das entidades religiosas; • O terceiro, pretendendo a criação, no Ministério da Justiça, de uma Comissão Assessora; • O quarto, na hipótese de um “Acordo de Cooperação entre o Estado e a Aliança Evangélica Portuguesa”. 16. Quanto ao primeiro anteprojeto, contém o que se entende ser o cerne do direito à liberdade religiosa, quer o direito do indivíduo, quer o direito do coletivo; Igreja, confissão, comunidade, perspetivando-o como um direito fundamental, com os contornos do quadro constitucional vigente, sem constrições ou limitações, aproveitando-se a experiência passada, quer com as discriminações, perseguições e reivindicações bem conhecidas e que o ordenamento jurídico espelha patentemente, quer com a vigência da farisaica Lei 4/71, nunca conseguida aplicar, a não ser no Registo, tal

o gravame que acarretava para as Igrejas e confissões não católicas.

Assegura-se, no tocante ao primeiro – quanto ao indivíduo – o direito à liberdade de fé e de doutrina, de atuação conforme essa fé e essa doutrina, da sua divulgação e difusão, de prestação de culto, bem como à sua privacidade neste domínio.

Consagra-se no concernente ao segundo – sem reservas ou constrições, o direito à livre organização e determinação, bem como ao livre e responsável exercício de funções e do culto.

Possibilita-se, por fim, a realização de acordos, convénios e concórdias entre o Estado e as confissões ou comunidades religiosas que pelo seu passado histórico, cultural e representatividade, se mostrem estar implantadas e inseridas socialmente, realização esta que não contende em nosso entender, com a Constituição, antes se fundamenta no princípio constitucional da igualdade – do que decorrerá um regime paritário com o sistema concordatário da Igreja Católica. 17. Quanto ao segundo anteprojeto, sugere-se um modelo de Registo aberto, a sediar no Ministério da Justiça. Espera-se que este Ministério, dada a relevância social e pública do facto religioso, crie uma Direção Geral dos Assuntos Religiosos, que, entre outros objetivos correlacionados com o exercício da liberdade religiosa, superintenda, também, no Registo das Entidades Religiosas, libertando a Secretária-Geral do encargo. 18. O terceiro anteprojeto pretende a criação de uma Comissão

Assessora de Liberdade Religiosa, onde se dê voz às confissões e comunidades religiosas – católica e não católicas, bem com ao Estado. 19. Por fim, o Acordo de Cooperação, que se pretende estabelecer com o Estado, visaria a criação de condições de paridade com a Igreja Católica em matérias que afinal traduzem o conteúdo do direito à liberdade religiosa: ereção de Igrejas e das suas organizações e institutos, estatutos dos ministros do culto evangélico e afins; missionários e assistentes religiosos, com a panóplia dos direitos específicos que integram o exercício do seu múnus, situação perante a Previdência, cumprimento

de deveres militares, assistência religiosa livre nos estabelecimentos públicos, atribuição de efeitos civis ao casamento celebrado em Igrejas Evangélicas, ensino religioso evangélico nas escolas, reconhecimento superior dos seus institutos, benefícios fiscais, definição dos lugares de culto e sua livre instalação, e acesso aos meios de comunicação social, de natureza pública ou de capitais públicos. 20. Não se incluíram, todavia, no texto concernente ao direito à liberdade religiosa, algumas disposições, que consideramos propositadas, quanto à Igreja Católica e pessoas coletivas católicas, pela manutenção em vigor da Concordata de 7 de maio de 1940, e da demais legislação ordinária existente, deixando este aspeto ao critério da Comissão. 21. Também não se fez referência neste texto aos ilícitos penais contra sentimentos religiosos e respeito devido aos mortos, consagrados nos artigos 251º a 254º do Código Penal. 22. Pensa-se, todavia, que o artigo 251º deveria ser acrescentado de um número 3 – do seguinte teor: “Na mesma pena incorre quem publicamente ofender a divindade e os símbolos de culto das Igrejas, confissões e comunidades religiosas, devidamente reconhecidas e registadas”. 23. Do mesmo passo, se não contemplou no referido texto a manutenção do sigilo religioso e a sua violação, para o não densificar em demasia, e, sobretudo, por tal matéria ter sede normativa pertinente. 24. Reconhecendo-se que se trata de matéria controversa, até porque se prende com um dos mais relevantes direitos fundamentais do Homem, espera-se que a douta Comissão, presidida por um verdadeiro especialista na matéria, saiba encontrar o itinerário essencial para a nova Lei da Liberdade Religiosa. E que as soluções alcançadas possam, afinal, contribuir para um exercício efetivo e em plenitude do direito fundamental à liberdade religiosa, para o bem-estar do povo português. 25. Permita-se, a concluir, uma citação da Sagrada Escritura, no Livro de Provérbios 16:16: “Quanto melhor é adquirir a

sabedoria do que o ouro. Quanto mais excelente adquirir a prudência do que a prata”.

Atue-se neste domínio da Lei da Liberdade Religiosa com sabedoria e prudência e certamente se encontrará o caminho mais excelente.

Anteprojeto de Lei sobre Liberdade Religiosa

Art.º 1º

1. O Estado reconhece e garante o direito fundamental da liberdade de consciência, da liberdade religiosa e de culto reconhecidas pelas Constituição, conforme o previsto na presente lei. 2. Ninguém pode ser perseguido, discriminado, constrangido e privado de direitos ou isento de obrigações ou deveres cívicos em razão da sua religião ou fé que professa e pratica. Não poderão alegar-se motivos religiosos para impedir alguém do exercício de qualquer trabalho ou atividade, do desempenho de funções públicas, ou de atribuição de quaisquer honras ou dignidades oficiais. 3. Ninguém será obrigado a revelar o seu credo ou prática religiosa, nem o seu domicílio poderá ser violado para recolha de informações sobre esta matéria. Ressalva-se a recolha de dados estatístico não individualmente identificáveis. 4. As Igrejas, confissões e comunidades religiosas estão separadas do Estado.

Art.º 2º

A liberdade religiosa e de culto garantida pela Constituição abrange, com imunidade de coação respetiva, o direito de toda a pessoa a:

a. Professar as crenças religiosas que livremente escolher, de forma individual ou coletiva, ou não professar qualquer uma,

mudar de confissão ou abandonar aquela que tinha, manifestar livremente as suas próprias crenças religiosas ou a ausência das mesmas ou abster-se de declarar acerca delas. b. Praticar os atos de culto e receber assistência religiosa da sua própria confissão, celebrar as suas festas, ritos e cerimónias de natureza matrimonial e outras, incluindo as fúnebres, receber sepultura digna sem qualquer discriminação por razões religiosas e a não ser obrigado a praticar e comparecer em atos de culto ou a receber assistência religiosa contrária às suas convicções pessoais. c. Receber e dar ensino e informação religiosa de qualquer espécie e por quaisquer meios, escolher para si e para menores não emancipados ou incapazes, na sua dependência, dentro e fora do âmbito escolar, a educação religiosa e moral de acordo com as suas próprias convicções. d. Reunir-se ou manifestar-se publicamente com fins religiosos e associar-se para desenvolver, em comunidade, as suas atividades religiosas, em conformidade com o ordenamento jurídico geral e o estabelecido pela presente lei. e. Difundir e propagar, pela palavra, por escrito ou por outros meios de comunicação, a doutrina que professa. f. À objeção de consciência, nos termos da lei geral.

Art.º 3º

1. A liberdade religiosa e de culto garantida pela Constituição também compreende o direito das Igrejas, confissões e comunidades religiosas: a. Se auto erigirem e auto-organizarem, sendo como tal reconhecidas, com plena aceitação e respeito pela sua própria forma de organização e funcionamento interno, bem como às suas organizações e institutos. b. A estabelecer lugares de culto ou reunir-se com fins religiosos, a nomear e formar os seus membros e ministros, a divulgar e espalhar o seu próprio credo, a criar livremente as suas próprias organizações e institutos e funcionar

com elas, bem como a relacionarem-se com outras Igrejas, organizações ou confissões religiosas, quer em território nacional, quer no estrangeiro. c. A inviolabilidade dos lugares de culto, nos termos estabelecidos pela lei. d. A ter acesso, também pelas suas organizações e institutos aos lugares públicos para reuniões específicas ou especiais, reconhecido o livre direito de reunião e manifestação, nos termos da lei geral. e. Ao exercício do culto nos templos ou lugares a ele destinados, bem como à própria celebração dos ritos próprios, dos atos fúnebres dentro de cemitérios, não dependendo de qualquer autorização de natureza administrativa ou de participação às entidades civis. f. De celebrar, através dos seus ministros devidamente credenciados, o matrimónio, segundo os seus próprios ritos, com efeitos civis.

Art.º 4º

1. Para aplicação real e efetiva destes direitos os poderes públicos adotarão as medidas necessárias para facilitar a assistência religiosa nos estabelecimentos públicos análogos, sendo o seu acesso, para tal fim, livre e sem limitação de horários. 2. De igual modo, os poderes públicos assegurarão o acesso aos estabelecimentos de ensino público, para a prestação de formação e assistência religiosa aos alunos que voluntariamente a desejarem.

Art.º 5º

1. O exercício dos direitos derivados da liberdade religiosa e de culto tem como único limite a proteção e tutela do direito dos outros ao exercício das suas atividades de moral públicas, elementos constitutivos da ordem pública, protegidos pela lei no âmbito de uma sociedade democrática.

2. Ficam de fora do âmbito desta lei, as atividades, finalidades e entidades envolvidas com o estudo e práticas dos fenómenos psíquicos, parapsicológicos ou a difusão de valores humanísticos ou espirituais bem como de outros fins análogos, alheios aos religiosos.

Art.º 6º

Os direitos reconhecidos nesta lei e desenvolvidos nos limites que a mesma refere, serão tutelados perante o tribunal ordinário e perante o tribunal constitucional, gozando as Igrejas, confissões e comunidades religiosas de apoio jurídico gratuito e total.

Art.º 7º

1. As Igrejas, confissões e comunidades religiosas, bem como as suas organizações e institutos, gozarão de personalidade jurídica, uma vez inscritas no correspondente Registo Público, no Ministério da Justiça. 2. A inscrição praticar-se-á mediante a petição do interessado, acompanhada de documento onde conste a sua constituição em Portugal, os seus fins religiosos, a sua denominação e outros dados de identificação. A sua sede permanente, a sua organização, hierarquia, disciplina e regime de funcionamento, a denominação e constituição dos seus órgãos de governo, as suas atribuições e os requisitos para a sua legítima nomeação ou eleição. 3. O cancelamento dos assentos relativos a uma determinada entidade religiosa só poderá levar-se a cabo mediante a solicitação dos seus órgãos representativos ou em execução de uma sentença judicial com trânsito em julgado. 4. Qualquer modificação ou alteração do pacto constitutivo das

Igrejas, confissões e comunidades religiosas deve ser comunicada ao Registo para dele constar.

Art.º 8º

1. As Igrejas, confissões e comunidades religiosas inscritas terão plena autonomia e poderão estabelecer as suas próprias normas de organização e de funcionamento interno, bem como o regime de relação com as pessoas ao seu serviço. Estas normas e aquelas que regulamentam as organizações e os institutos criados pelas mesmas, poderão incluir cláusulas de salvaguarda da sua identidade religiosa, da sua natureza própria e também do devido respeito pelas suas crenças, sem prejuízo do respeito dos direitos e liberdades reconhecidos pela constituição e particularmente, dos direitos de liberdade, igualdade e não discriminação. 2. As Igrejas, confissões e comunidades religiosas poderão criar, fomentar e desenvolver para a realização dos seus fins, associações, fundações e institutos, segundo as disposições do ordenamento jurídico geral.

Art.º 9º

1. O Estado, tendo em conta as crenças religiosas existentes na sociedade, estabelecerá, caso a caso, acordos, convénios ou concórdias de cooperação com as Igrejas, confissões e comunidades religiosas inscritas no Registo Público, que, pelo seu número e evidente implantação e inserção social, tenham atingido relevante representatividade em Portugal. Estes acordos, convénio ou concórdias, carecem de ser aprovados pela Assembleia da República. 2. Nos acordos, convénios ou concórdias, e sempre com respeito pelo princípio de igualdade, poder-se-ão aplicar às ditas

Igrejas, confissões e comunidades religiosas, os benefícios fiscais previstos no ordenamento geral para as entidades sem fins lucrativos e outras de beneficência privada e solidariedade social.

Art.º 10º

Cria-se no Ministério da Justiça uma Comissão Assessora de Liberdade Religiosa composta, de forma paritária e caráter estável, pelos representantes do Estado, das Igrejas, comunidades religiosas ou federações das mesmas, de relevante representatividade em Portugal, e, ainda, por pessoas de reconhecida competência, com conhecimentos especializados nas matérias ligas com o exercício da liberdade religiosa. No seio desta Comissão são atribuídas funções de estudo, informação e propostas sobre todas as questões relativas à aplicação desta lei e em especial sobre a preparação do conteúdo anterior.

Art.º 11º Disposições Transitórias

1. O Estado reconhece a personalidade jurídica e a plena capacidade de funcionamento das associações e entidades religiosas que dela gozem na data da entrada em vigor da presente lei.

Durante o período de três anos, devem estas associações e entidades atualizar, se necessário, a sua constituição estatutária bem como requerer a sua inscrição no Registo acima referido.

Findo este período, sem que tenham efetuado esta inscrição no Registo, perderão a sua qualidade de associações religiosas. 2. O Estado assegura às associações religiosas existentes, dotadas de personalidade jurídica e devidamente inscrita no Registo do Ministério da Justiça, os benefícios fiscais vigentes à data da entrada em vigor da presente Lei. 3. Mantém-se, nos termos anteriores e para os que dele vêm beneficiando, o regime de previdência do clero, instituído pelo

Decreto Regulamentar nº 5/83, de 31 de janeiro de 1983.

Art.º 12º Disposições finais

1. É revogada a Lei 4/71, de 21 de agosto de 1971.

2. É também revogada qualquer disposição legal que não se harmonize com o exercício da liberdade religiosa, disciplinado na presente lei.

Art.º 13º

No prazo de 90 dias a contar da publicação desta Lei, o Governo, sob proposta do Ministro da Justiça, elaborará e publicará a regulamentação necessária à organização e funcionamento do Registo Público e da Comissão de Assessoria da Liberdade Religiosa.

Anteprojeto sobre a Organização e o Funcionamento do Registo de Entidades Religiosas

Art.º 1º

É criado no Ministério da Justiça, em conformidade com o estabelecido no art.º 7 da Lei da Liberdade Religiosa, o Registo de Entidades Religiosas, com natureza de Registo geral e público, o qual dependerá da Secretaria Geral do Ministério da Justiça.

Art.º 2º

No registo de Entidades Religiosas inscrevem-se:

a. As Igrejas, Confissões e Comunidades Religiosas. b. Os Institutos e Seminários de Ensino Teológico; c. As entidades associativas religiosas constituídas como tais, no quadro das Igrejas e Confissões, com vista ao desempenho dos seus fins; d. Os Organismos de Cooperação e Representação de Igrejas e suas Federações.

Art.º 3º

1. A inscrição no Registo opera-se mediante petição, por requerimento, da respetiva entidade, acompanhado do documento comprovativo da sua constituição pela correspondente escritura pública. 2. São dados exigidos para a inscrição: a. Denominação da entidade, distinta de qualquer outra já existente. b. Local da sede da sua atividade. c. Fins religiosos, os quais devem respeitar os limites estabelecidos no art.º 5º da Lei da Liberdade Religiosa, para exercício dos respetivos direitos. No caso das entidades associativas religiosas referidas nas alíneas b) e c) do artigo anterior, o cumprimento deste requisito far-se-á através da certificação da entidade que, em Portugal, representa as respetivas Igrejas ou confissões. d. Sua organização, hierarquia, disciplina e regime de funcionamento interno, bem como dos seus órgãos de governo, que com indicação das suas competências e dos requisitos exigidos para a sua nomeação ou eleição. e. Facultativamente, lista nominal com identificação das pessoas que representam legalmente a entidade e a obrigam. A correspondente escritura notarial será documento suficiente para fazer prova desta qualidade. 3. Nas situações não previstas neste Regulamento, as inscrições e averbamentos correspondentes às Igrejas, Confissões e

Comunidades Religiosas que tenham estabelecido Acordos,

Convenção ou Concórdia de cooperação com o Estado operar-se-ão segundo o disposto nos mesmos.

Art.º 4º

1. Em face do pedido de inscrição, o Secretário-Geral do Ministério da Justiça procede ao seu exame e dá-lhe o devido

andamento, fazendo-o preceder, ou não, de relatório, a solicitar à Comissão Assessora de Liberdade Religiosa. Os interessados serão notificados da deliberação. No caso de o pedido ser deferido, aos interessados são comunicados os dados de identificação da inscrição feita. 2. O pedido de inscrição só é indeferido quando não se mostrem satisfeitos os requisitos referidos no artigo 3º.

Art.º 5º

1. As modificações que se verifiquem relativamente aos requisitos mencionados no artigo 3º, são comunicadas ao Ministério da Justiça, na forma prevista para os pedidos de inscrição. 2. As modificações são inscritas ou averbadas no registo por decisão do Secretário-Geral do Ministério da Justiça e produzirão os seus efeitos desde o momento do averbamento.

Art.º 6º

1. Das decisões do Secretário-Geral do Ministério da Justiça cabe recurso para o Ministro da Justiça e desde membro do

Governo, nos termos gerais de direito. 2. É aplicável o disposto no artigo 6º da Lei da Liberdade Religiosa.

Art.º 7º

1. O Registo é constituído por um sistema de folhas normalizadas, prévia e cronologicamente numeradas, onde se registarão os dados requeridos no art.º 3º, assim como qualquer alteração comunicada sobre os mesmos, incluindo a dissolução da entidade religiosa. 2. Haverá uma Secção especial para as inscrições e averbamentos correspondentes às Igrejas, Confissões e Comunidades

Religiosas que tenham estabelecido Acordos, Convénios ou

Concórdias de cooperação com o Estado.

3. Integrando o Registo, e fazendo parte dele, organiza-se um processo por cada uma das entidades que tenham sido inscritas, onde se arquivam, por ordem cronológica de data e com numeração sequencial, todos os documentos remetidos pela entidade.

Art.º 8º

O cancelamento dos assentos relativos às entidades religiosas inscritas, só é possível por petição dos seus representantes legais, devidamente autorizados, ou em cumprimento de sentença com trânsito em julgado.

Disposições transitórias

Art.º 9º

1. As entidades religiosas que à data de entrada em vigor da nova Lei tenham personalidade jurídica, poderão, no prazo de três anos, requerer a sua inscrição no Registo, em qualquer momento, atualizando, se necessário, os seus estatutos. Findo este prazo de três anos, só poderão demonstrar a sua qualidade de associações religiosas, se provarem, mediante certificado, estarem inscritas no Registo de Entidades Religiosas. 2. O registo das entidades religiosas que, à data da entrada em vigor da nova Lei, estavam inscritas no Ministério da Justiça ou tinham os seus estatutos depositados nos Governos Civis, é transferido oficiosamente para o novo Registo de Entidades Religiosas. 3. Para atualização e uniformização destes registos, devem as entidades religiosas, no prazo de três anos, enviar ao novo Registo a documentação mencionada no art.º 3º deste diploma. 4. Findo este prazo, só serão emitidos certificados comprovativos da inscrição no Registo de Entidades Religiosas às entidades que tiverem entregado toda a documentação exigida.

Anteprojeto sobre a Constituição da Comissão de Assessoria da Liberdade Religiosa no Ministério da Justiça

Art.º 1º

1. Constitui-se no Ministério da Justiça a Comissão de Assessoria da Liberdade Religiosa a qual será integrada pelo Secretário-Geral do Ministério da Justiça, como Presidente, um representante do Primeiro Ministro e um de cada um dos Ministérios das Finanças, da Administração Interna e da Educação, nomeados pelos seus titulares, cinco representantes das Igrejas, Confissões, Comunidades Religiosas ou de suas Federações, escolhidas entre as de maior representatividade em Portugal, nomeados pelo Ministro da Justiça, após ouvir as confissões inscritas no Registo de Entidades Religiosas, como pessoas de reconhecida competência designadas pelo conselho de Ministros sob proposta do Ministro das

Finanças e um secretário, este sem direito a voto. 2. O mandato dos representantes das Igrejas e dos designados pelo Conselho de Ministros tem a duração de três anos, podendo ser renovado.

Art.º 2º

Esta Comissão tem como funções fundamentais o estudo, elaboração de relatórios e propostas sobre todas as questões relativas à aplicação da Lei da Liberdade Religiosa, e particularmente, sobre a preparação do conteúdo e do articulado dos Acordos, Convénios e Concórdias de cooperação no art.º 9º da referida Lei.

Art.º 3º

1. A Comissão funcionará em plenário e em Comissão Permanente.

2. O plenário, que é constituído por todos os membros da Comissão, reúne-se obrigatoriamente uma vez por ano e sempre que o Presidente da Comissão e a maioria dos seus Vogais o solicitem. 3. A Comissão permanente é integrada pelo seu Presidente, o

Secretário e quatro Vogais designados pelo Plenário, de entre os seus membros, sendo dois deles representantes das Igrejas e os outros dois das pessoas de reconhecida competência.

Esta Comissão Permanente tem a competência que o Plenário nela delegar. Na Comissão Permanente pode integrar-se, conforme o caso, o Vogal ou Vogais, a cujo departamento ministerial, ou Igreja, diga respeito a questão em causa. 4. O Ministro da Justiça pode encarregar a Comissão Permanente de proceder ao estudo e à elaboração de relatórios e de propostas relativos a assuntos que considere urgentes, sem prejuízo da correspondente informação ao Plenário, na primeira reunião que este a seguir celebre, podendo em todo o caso, presidir às reuniões da Comissão Assessora da Liberdade Religiosa.

Art.º 4º

À Secretária da Comissão correspondem as funções de estudo, informação e assessoria de caráter e de coordenação, necessárias à direção e supervisão dos correspondentes serviços administrativos dependentes da Secretária-geral do Ministério da Justiça.

Art.º 5º

Dentro do prazo de 90 dias, a partir da data do início de funções da Comissão, deve esta elaborar o seu Regulamento de funcionamento, que será aprovado pelo Ministério da Justiça.

Proposta de Acordo de Cooperação entre o Estado e a Aliança Evangélica Portuguesa

I – Das Entidades Destinatárias

Art.º 1º

1. Os direitos e obrigações derivadas da lei que aprova o presente Acordo serão aplicáveis às Igrejas, organizações, institutos e associações que se encontrem inscritas no Registo Público das Entidades Religiosas, no Ministério da Justiça, e que estejam filiadas ou posteriormente ingressem na Aliança Evangélica Portuguesa, adiante designada por AEP, devendo esta filiação constar daquele registo. 2. A filiação das Igrejas, bem como das suas organizações ou institutos, na AEP para efeitos de constar no referido Registo, será certificada através de uma declaração emitida pelas

Direção da AEP, assinada por quem institucionalmente a obrigue e credenciada com selo branco. O cancelamento do seu registo, ou a sua exclusão, far-se-á a pedido da entidade interessada ou da Direção da AEP, respetivamente. 3. Para a inscrição no Registo Público das Entidades Religiosas

Evangélicas será necessária a apresentação de um certificado emitido pela AEP, que faça prova dos seus fins religiosos e do seu enquadramento na Confissão Evangélicas.

II – Dos Lugares de Culto

Art.º 2º

1. Para todos os efeitos são considerados lugares de culto das Igrejas pertencentes à AEP os edifícios ou outros espaços destinados, de forma permanente e exclusiva, aos atos de culto, à formação e assistência religiosas e ao convívio comunitário, quando tal for certificado pela respetiva Igreja e confirmado, por escrito, pela AEP.

2. Os lugares de culto das Igrejas filiadas na AEP gozam de inviolabilidade nos termos estabelecidos na Lei. 3. Para efeito de aplicação deste acordo, são considerados como lugares de culto os locais destinados à residência dos ministros do culto das respetivas Igrejas e outros destinados á realização de atividades das Igrejas, designadamente para as suas organizações e institutos. 4. O Estado e as autarquias disponibilizarão espaços para que as Igreja evangélicas filiadas na AEP construam os seus templos, residência para os seus ministros do culto e demais locais destinados às suas atividades, nomeadamente, as suas organizações e institutos. 5. Enquanto os espaços mencionados no número anterior não forem disponibilizados ou as referidas Igrejas não tenham recursos financeiros para, por si só, procederem à construção dos respetivos templos e afins, as mesmas poderão utilizar espaços destinados a fins não habitacionais sem necessidade de licenciamento ou autorização administrativas específicas, desde que satisfaçam as exigências legais de segurança e sanidade dos espaços públicos. 6. No caso de expropriação por utilidade pública dos lugares de culto e afins das Igrejas evangélicas filiadas na AEP, será esta previamente ouvida, salvo por razões de urgência, segurança e defesa nacional ou outros motivos de ordem ou segurança pública, situação que lhe será comunicada posteriormente no prazo de 48 horas. 7. Os lugares de culto das Igrejas pertencentes à AEP não poderão ser demolidos sem que, previamente, tenham sido privados da sua natureza religiosa, exceto nos casos previstos pela

Lei por razões de urgência ou perigo grave.

III – Do Ministro do Culto

Art.º 3º

1. Para todos os efeitos legais são ministros do culto das Igrejas pertencentes à AEP, as pessoas singulares dedicadas, com caráter estável e permanente, às funções de culto e de assistência religiosa e que sejam acreditadas nessa qualidade por um certificado emitido pela respetiva Igreja e por uma declaração de conformidade passada pela AEP. 2. Os ministros do culto das Igrejas pertencentes à AEP não estão obrigados a prestar declarações em juízo ou fora dele sobre factos de que tenham tomado conhecimento no exercício das suas funções de culto ou assistência religiosa.

Art.º 4º

Para todos os efeitos legais são funções do culto ou de assistência religiosa as que estejam diretamente associadas com o exercício do culto, a cura de almas, a administração das ordenanças, a pregação do Evangelho, o magistério religioso e todas as outras que constam do grupo-base 1:41 da classificação das profissões.

Art.º 5º

O Estado, através do respetivo Ministério da Tutela, reconhece os estabelecimentos pertencentes à AEP, de ensino superior de formação teológica dos ministros do culto, com as devidas equiparações académias e públicas, nos termos da lei.

IV – Do Ministro do Culto e o Serviço Militar

Art.º 6º

1. Os ministros do culto das Igrejas pertencentes à AEP e os estudantes dos estabelecimentos de ensino referidos no número anterior, estão isentos do Serviço Militar obrigatório quando o solicitarem.

2. A solicitação só dará direito a isenção quando acompanhada de documento comprovativo, passado pela Igreja ou estabelecimento de ensino correspondente, que faça prova da situação. 3. Em qualquer caso, é sempre necessário um documento emitido pela AEP, para autenticar as declarações feitas.

V – Do Ministro do Culto e a Segurança Social

Art.º 7

Os ministros do culto das Igrejas pertencentes à AEP, que tenham os requisitos referidos no Art.º 3º deste Acordo, serão incluídos no Regime Especial de Previdência do Clero. As Igrejas respetivas assumirão os direitos e as obrigações estabelecidas para os institutos religiosos.

VI – Do Ministro do Culto e o IRS

Art.º 8º

As importâncias entregues pelas Igrejas pertencentes à AEP e aos seus ministros do culto, a título de remunerações, donativos ou subsídios, estão isentas do pagamento do Imposto do Rendimento sobre pessoas singulares.

VII – Do Matrimónio Confessional

Art.º 9º

1. São reconhecidos os efeitos civis do matrimónio celebrado perante os ministros do culto das Igrejas pertencentes à AEP, desde que devidamente credenciados, com esta qualidade e para este fim. Para o reconhecimento integral de tais efeitos será necessária a transcrição do matrimónio no Registo Civil. 2. Destinado a comprovar a capacidade matrimonial dos nubentes e a requerimento destes ou do ministro do culto respe-

tivo, é organizado nas repartições do Registo Civil o processo preliminar de publicações. 3. Verificada, no despacho final do processo preliminar, a inexistência de impedimento à realização do casamento, o responsável da

Conservatória do Registo Civil, extrairá o certificado de capacidade matrimonial dos nubentes, que é remetido ao ministro do culto encarregado da celebração do matrimónio e sem o qual o casamento não pode ser celebrado, devendo qualquer conhecimento superveniente ser de imediato comunicado para o ministro do culto sobrestar na sua celebração até ao julgamento respetivo. 4. No ato público da celebração do casamento, a realizar dentro dos 90 dias seguintes ao despacho final referido no número anterior, devem estar presentes, perante o ministro do culto oficiante, os nubentes, ou um deles e o procurador do outro, e, pelo menos, duas testemunhas maiores de idade. 5. Uma vez celebrado o matrimónio, o ministro do culto oficiante remeterá, à Conservatória competente, o duplicado do assento eclesial a fim de ser transcrito no livro de assentos de casamento. 6. Sem prejuízo das responsabilidades que possam ter lugar e dos direitos adquiridos de boa fé por terceiras pessoas, a transcrição poderá ser efetuada em data posterior, através da apresentação de certidão do assento eclesial. 7. As normas deste artigo relativas ao procedimento a observar para que o direito que no mesmo estabelece, se torne efetivo, ficam sujeitas às modificações posteriores da legislação do

Registo Civil, a qual carece, porém, de consulta prévia à AEP.

VIII – Dos Missionários e Assistentes Religiosos

Art.º 10º

1. Para além dos ministros do culto, reconhecem-se como atividades afins as exercidas pelos missionários e pelos assistentes religiosos.

2. São missionários das Igrejas pertencentes à AEP as pessoas físicas que estejam dedicadas com caráter de permanência e estabilidade, à comunicação, no seu próprio país ou em país estrangeiro, da doutrina cristã evangélica e ao ensino da Palavra de Deus, podendo prestar serviços nos domínios do ensino, da assistência social, da saúde e de outras atividades profissionais. As suas funções enquadram-se na definição contida na classificação nacional de profissões, subgrupo 1-41.20. 3. São assistentes religiosos das Igrejas pertencentes à AEP as pessoas físicas que estejam dedicadas, com caráter de permanência e estabilidade, ao exercício de apoio e assessoria clerical, nomeadamente, a visitação domiciliária dos membros da comunidade, a assistência espiritual, as tarefas organizativas e de administração, a preparação de reuniões, etc. 4. Os missionários e assistentes religiosos das Igrejas pertencentes à AEP carecem, para seu reconhecimento nesta qualidade, de satisfazer os requisitos mencionados no art.º 3º, número 1, para os ministros do culto e beneficiam dos mesmos direitos que lhes são concedidos, por este acordo, no número 2 do art.º 3º, e nos art.º 4º, 5º, 6º, 7º, 8º e 11º.

IX – Da Assistência Religiosa nos Estabelecimentos Públicos

Art.º 11º

1. Aos ministros do culto nomeados pelas respetivas Igrejas e confirmados pela AEP, é garantido o exercício à prestação de assistência religiosa aos internos nos estabelecimentos militares, hospitalares, prisionais, tutelares e demais estabelecimentos públicos análogos, sendo o seu acesso, para tal fim, livre e sem limitação de horário. 2. O exercício deste direito carece de uma inscrição prévia do ministro do culto nos estabelecimentos públicos que pretende visitar, requerendo-se para o efeito, a apresentação dos documentos credenciados.

3. A assistência religiosa será sempre prestada com total respeito pelo princípio da liberdade religiosa, em observância das normas de organização e de funcionamento interno dos respetivos estabelecimentos. 4. As despesas com o exercício da assistência espiritual serão suportadas pelas Igrejas da AEP que a exerçam, sem prejuízo da utilização dos locais que, para tal fim, existam nos estabelecimentos.

X – Da Assistência Religiosa nas Forças Armadas e de Segurança

Art.º 12º

Reconhece-se o direito dos militares de confissão evangélica, profissionais ou não profissionais, e de toda as pessoas deste credo religioso que prestem serviço nas Forças Armadas e de Segurança, de se associarem, em associação com fins exclusivamente religiosos, bem como o de participar nas atividades religiosas e ritos próprios de Igrejas pertencentes à AEP, nos dias e horas previstos pelas diferentes confissões, desde que dela façam parte e com prévia e adequada autorização dos seus Chefes, que procurarão que aquelas sejam compatíveis com as necessidades do serviço, facilitando os lugares e os meios adequados à sua realização.

XI – Do Ensino Religioso

Art.º 13º

1. Para efeitos da aplicação da legislação em vigor sobre a matéria, garante-se aos pais, aos alunos e aos órgãos escolares de governo que o solicitem, o exercício do direito dos primeiros a receber o ensino religioso evangélico nos estabelecimentos de ensino público, nos níveis básicos e secundários. 2. O ensino religioso evangélico será lecionado por professores nomeados pela AEP, sendo os seus serviços remunerados pelo Estado, de acordo com o regime geral do ensino público para o efeito.

3. Os conteúdos e programas do ensino religioso evangélico, bem como os livros e textos de apoio relativo ao mesmo serão indicados pela AEP. 4. Os estabelecimentos de ensino público referidos neste artigo, deverão facilitar os locais adequados para o exercício daquele direito, em harmonia como o desenvolvimento das atividades letivas. 5. A AEP, de acordo com as respetivas autoridades académicas, poderá organizar cursos de ensino religioso nos estabelecimentos universitários de ensino público, podendo utilizar os locais e meios dos mesmos. 6. As Igrejas pertencentes à AEP, ou esta, poderão estabelecer e dirigir estabelecimentos de ensino dos níveis referidos no número 1 deste artigo, bem como estabelecimentos universitários e seminários de ensino religioso ou outras Instituições de

Estudos Eclesiásticos, com sujeição à legislação geral vigente nesta matéria.

XII – Do Acesso aos Meios de Comunicação Social

Art.º 14º

Às Igrejas evangélicas pertencentes à AEP, através das suas organizações específicas, é assegurado o acesso aos meios de comunicação social de natureza pública ou de capitais públicos, nomeadamente a televisão.

XII – Dos Apoios Financeiros do Estado

Art.º 15º

1. As Igrejas evangélicas pertencentes à AEP, suas associações e demais entidades por si criadas e geridas, destinada a atividades religiosas, docentes, de beneficência, hospitalares, ou de assistência social, dado o alcance social e público dos seus fins, têm direito a beneficiar de apoios financeiro por parte do

Estado ou Autarquias, para a sua instalação, nomeadamente, a construção e manutenção de templos e afins, em igualdade de condições e tratamento com os concedidos a outras

Igrejas, Confissões ou Comunidades que tenham acordos de

Cooperação com o Estado ou Concordatas. 2. Às Igrejas evangélicas pertencentes à AEP e através desta, são concedidos apoios financeiros por parte do Estado para a produção e emissão dos seus programas de televisão em estações de natureza pública ou de capitais públicos, dado o inquestionável interesse público dos mesmos.

XIV – Dos Benefícios Fiscais e Outros

Art.º 16º

1. As Igrejas pertencentes à AEP poderão receber livremente dos seus fiéis, donativos, contribuições e ofertas, com caráter regular ou eventual, sobre as quais não recairá qualquer imposto. 2. Estão isentos de franquia postal a expedição de boletins, jornais, revistas e outras publicações de caráter interno, feita diretamente para os seus membros pelas Igrejas pertencentes à

AEP, suas organizações e institutos. 3. As Igrejas pertencentes à AEP, bem como as suas organizações, institutos e associações, estarão isentas:

a. De qualquer imposto, contribuição ou taxa de qualquer natureza sobre bens imóveis de sua propriedade destinados: i. A lugar de culto, com todas as suas dependências e espaços anexos, destinados ao culto, à assistência e formação religiosa e á residência de ministro do culto. ii. A locais para escritórios de apoio às suas atividades e à residência de ministros de culto.

iii. Ao funcionamento de estabelecimentos destinados à formação de ministros do culto, quando neles se ministre o ensino próprio e disciplinas eclesiásticas. iv. Ao funcionamento de estabelecimentos de instituições sem fins lucrativos e de beneficência privada. b. Do imposto sobre a aquisição e transmissão, a título gratuito ou oneroso, de bens imóveis destinados aos fins mencionados na alínea A. c. Do imposto sobre o rendimento de pessoas coletivas, sempre que os bens e direitos adquiridos sejam destinados ao culto ou ao exercício da beneficência, e, ainda, sobre o imposto que incide sobre os seu depósitos bancários e aplicações financeiras. d. Do imposto sobre o valor acrescentado na aquisição de bens e serviços destinados ao seu património, ao exercício das suas atividades e de outras concernentes aos seus fins. e. Do pagamento de taxas autárquicas para a realização de obras, ocupação de espaços públicos e afixação de letreiros e placas sinaléticas destinada à sua identificação.

4. Sem prejuízo do previsto nos números anteriores, as Igrejas pertencentes à AEP, bem como as suas organizações, institutos e associações por si criadas e geridas, que se dediquem a atividades religiosas, docentes, de beneficência, médicas e hospitalares ou de assistência social, terão direito a outros benefícios fiscais que o ordenamento jurídico fiscal do Estado português preveja, em cada momento, para as entidades sem fins lucrativos e, em todo o caso, aos que conceda às entidades de beneficência privadas. 5. Os donativos individuais feitos às Igrejas pertencentes da

AEP, bem como às suas organizações, institutos e associações, constituem matéria dedutível para o efeito do IRS, desde que, em qualquer momento, possa ser feita prova do recebimento.

XV – Das Disposições Finais

Art.º 17º

1. O Governo informa a AEP, para que esta possa exprimir a sua opinião, sempre que surjam iniciativas legislativas que afetem o conteúdo deste Acordo. 2. O presente acordo poderá ser denunciado por qualquer das partes que o subscreveram, sendo para o efeito, necessário notificar a outra parte com seis meses de antecedência. Também poderá ser revisto, total ou parcialmente, por iniciativa de qualquer dos subscritos, sem prejuízo da sua posterior aprovação pela Assembleia da República. 3. Constituir-se-á uma Comissão Mista Paritária com representação da Administração do Estado e da AEP para aplicação e seguimento deste acordo.

Art.º 18º

Deverá o Governo, para o efeito delegar no Ministro da Justiça bem como nos Ministros competentes que tutelem a matéria em causa, promover as disposições necessárias para a aplicação e execução do disposto neste Acordo.

B) Reflexões e Propostas da União Portuguesa dos Adventistas do Sétimo Dia sobre a Liberdade Religiosa em Portugal

Joaquim Dias

Secretário Nacional da Associação Internacional para a Defesa da Liberdade Religiosa (AIDLR)

Embora seja louvável a intenção ou boa vontade de se dotar um país de uma Lei Orgânica da Liberdade Religiosa, a sua existência é também discutível, porque legislar sobre um direito fundamental e inalienável do homem pode, já em si, ser considerado uma restrição à liberdade. Assim como não ocorre legislar, por exemplo, sobre o direito de respirar ou de pensar, da mesma maneira não é forçosamente necessário que ocorra a ideia de legislar sobre o direito de crer ou não crer, de ser ou não ser religioso, de ou não mudar de religião, etc.. Admite-se, também, que estas alternativas são discutíveis e por isso os países democráticos oscilam entre dois modelos de ação face à religião. Um mais estatizante ou intervencionista e outro mais liberal ou de autonomia responsável. Os países que consideram a Lei da Liberdade Religiosa como uma restrição baseiam-se na sua própria Constituição e celebram os acordos necessários com as entidades religiosas a fim de regulamentar sobre matérias de interesse comum das Igrejas e do Estado. É este o caso da França e da Itália, na União Europeia. É digno de menção o caso da Itália, que, para contrabalançar a posição favorável da Igreja Católica com base na Concordata, celebrou acordos com as seguintes entidades religiosas: • Table Vaudoise - Lei 40449, de 11/08/1984; • União Italiana da Igreja Adventista do Sétimo Dia – Lei n.º 516, de 22/11/1988; (por lapso? não referida no Desp. N.º 96/MJ/96); • União das Comunidades Judaicas Italianas – Lei n.º 101, de 08/03/1989; • Igreja Luterana de Itália – Lei de 20/04/1993; • União Cristã Evangélica Batista – Lei n.º 116, de 12/04/1995.

Nos países que optam por uma Lei Orgânica da Liberdade Religiosa, o que pode constituir um avanço por ocorrer normalmente onde existe uma religião única ou maioritária, impõe-se velar para que a lei seja o menos restritiva possível e que, além disso, sejam celebrados acordos reguladores para evitar ou eliminar as discriminações com fundamento religioso. É oportuno citar o exemplo de Espanha que, apesar de ter saído há poucos anos de um regime não só de discriminação, mas de opressão religiosa, dispõe de uma Lei Orgânica de Liberdade Religiosa desde 1980, e procura minimizar as discriminações e promover a igualdade com o estabelecimento de acordos com as seguintes entidades religiosas: Federação das Comunidades Evangélicas (FEREDE), da qual faz parte a União Espanhola dos Adventistas do Sétimo Dia que viu respeitada a sua especificidade com o Artigo 12, no que respeita às implicações do dia de preceito religioso – o Sábado; Federação das Comunidades Israelitas de Espanha; Comissão Islâmica de Espanha. O compromisso público e corajosamente assumido que “em matéria de liberdade religiosa, o direito português apresenta uma situação que poderemos considerar insatisfatória” (Despacho 96/MJ/96) e a solicitação da Comissão de Reforma da Lei da Liberdade Religiosa para que as Igrejas e Confissões religiosas se pronunciem sobre a matéria, alimenta a nossa esperança de dispor em breve de legislação e acordos que eliminem as “diferenças materiais de regime entre as diversas confissões e entre os respetivos membros quanto aos direitos individuais e coletivos relacionados com a religião” (ibid.). É neste espírito que a UPASD faz as suas reflexões e, antes de apresentar a sua proposta em matéria legislativa, refere algumas situações em que se verifica um tratamento privilegiado por parte do Estado Português para com a igreja maioritária, o que claramente consubstancia a violação do princípio constitucional da igualdade. Nesta análise fomos, sobretudo, coadjuvados pelos seguintes tra-

balhos:

• “La situation Juridique des Eglises et des Communautés Religieuses Minoritaires au Portugal”, de José de Sousa e Brito, in

Le Statut Legal des Minorités Religieuses dans les Pays de l’Union

Européenne, Thessaloniki -Milano, 1994, pp. 235 e ss ; • “A Liberdade Religiosa e as Relações Igreja-Estado em Portugal nos Anos Noventa”, de J. A. Teles Pereira, publicado na

Revista do Ministério Público, Ano 17, n.º 65, pg. 77-106.

1. Estatuto Jurídico das Confissões não-Católicas:

Face ao atual ordenamento jurídico português, as confissões religiosas não católicas são constituídas segundo as normas que o Código Civil prescreve para as Associações, ao contrário do que sucede com a Igreja Católica, cujo reconhecimento legal e atribuição de personalidade jurídica decorrem do artigo I da Concordata. A verificação desta diferença não é insignificante. É que, nas palavras do próprio Conselheiro Sousa e Brito, na obra referida, “(…) o regime geral das Associações previstas pelo Código Civil, com assembleia geral, um órgão colegial de administração, e um conselho fiscal, adapta-se mal à estrutura propriamente comunitária das igrejas e comunidades religiosas cuja autonomia de organização é garantida pelo art.º 41, n.º 4, da Constituição (…)” (Op. Cit., pg. 243).

2. Celebração de Casamentos:

“Apesar da Constituição deixar em aberto a possibilidade de outras formas de celebração, a lei (art.º 1587 e ss.) não admite senão duas modalidades de casamento: ‘o católico e o civil’. No casamento católico é o padre quem pratica os atos do funcionário civil” (Idem., pg. 244). As confissões não católicas não têm esta possibilidade.

3. Fiscalidade:

Neste domínio são flagrantes e de fácil enunciação as desigualdades. Em contraste com a Igreja Católica, as restantes confissões religiosas e os que exercem o seu múnus não beneficiam respetivamente da isenção do IVA e do IRS; há também discriminação no tratamento quanto ao desconto no IRS dos dons dos fiéis às instituições e confissões religiosas, exceto à “Igreja Católica e às organizações agrupadas ao Concílio ‘ecuménico’ das igrejas”. (Idem., pg. 245).

4. Educação:

Há desigualdade no apoio às escolas católicas e às outras confissões. A Universidade Católica tem privilégios próprios; quanto à possibilidade do ensino de religião e moral por católicos ou outras confissões, é diferente, com desvantagem para os não católicos (Idem., pg. 246-247). As disposições atuais são limitativas e carecem ainda de despacho do Ministério da Educação. Outra área importante é a questão do dia de repouso religioso específico de judeus, adventistas e outros. Para os fiéis de confissões religiosas cujo dia de preceito religioso não é o Domingo, deverá haver legislação específica em conformidade com as disposições já existente (Portaria 947/87 e o Despacho 127/79), no que respeita às aulas e exames dos estudantes de todos os níveis de ensino, assim como proporcionar os mesmos direitos aos professores dessas confissões.

5. Assistência Religiosa:

Da conjugação do D. Regulamentar n,º 58/80 de 10 de outubro, Portaria n.º 603/82, de 18 de junho, D. Regulamentar n.º 22/90, de 3 de agosto, D.L. n.º 345/85, de 23 de agosto, e do D. L. n.º 79/83, de 9 de fevereiro, concluímos, com o Conselheiro Sousa e Brito na obra citada, da mesma forma lapidar e elucidativa: “(…) O Estado mantém postos de capelães nos hospitais, nos estabelecimentos tutelares de menores, nas prisões e nas forças armadas, com diversos postos de oficial do Exercito, da Marinha, da Força Aérea e do Estado Maior. Haverá outros capelães junto das forças de segurança. Não há capelães de outras confissões (…)”.

6. Os ministros do Culto e o Serviço Militar:

Unicamente aos ministros católicos assiste o privilégio de prestarem o seu serviço militar na forma de “(…) assistência às forças armadas e, em tempo de guerra, também nas formações sanitárias (…)” – art.º XIV da Concordata.

7. Televisão e Rádio:

Embora a lei n.º 58/90, de 7.9. “atribuía às confissões religiosas, para a prossecução das suas atividades, até duas horas por dia de emissão”

(idem., pg. 249), esta nunca entrou em vigor por falta de financiamento entre o Governo e a RTP. O que existe para as confissões não-católicas é o programa “Caminhos”, no canal 2 da RTP, que consiste na média de 25 minutos cada trimestre aos Domingos; na rádio não dispõem de tempo a não ser pago. Em contrapartida, a Igreja Católica tem no mesmo Canal da RTP o programa “70x7” todos os Domingos, com a duração de 30 minutos, seguida de cerca de 50 minutos de Eucaristia Dominical. Estes programas – “Caminhos” e “70x7” – nada têm a ver com a Lei n.º 58/90m de 7.9 que, até ao presente, apesar de todos os esforços da Comissão “Tempo de Antena” formada por representantes da Aliança Evangélica Portuguesa, Comunidade Bahái de Portugal, Comunidade Hindu de Portugal, Comunidade Islâmica de Lisboa, Igreja Apostólica Católica Ortodoxa, Igreja Católica Romana, Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, União Portuguesa dos Adventistas do Sétimo Dia e Comunidade Israelita de Portugal, não passou ainda de “letra morta”. Os privilégios da Igreja Católica são desmedidos porque, além do exposto, desfruta unilateralmente de tempo na Televisão e na Rádio, tanto nas estações privadas como nas estatais durante a semana, mas muito particularmente aos Domingos. A título de exemplo cita-se a “Agência Eclésia” de 26 de junho de 1996, que anuncia: “70x7” – RTP 2; 30/06/1996 – 10H: A Paróquia de Queijas; 07/07/1996 – 10H: “A bênção do gado”: uma tradição antiga que se mantém na Paróquia de Meca, região de Alenquer. “70x7” foi ver como se processa e ouviu além de alguns romeiros o respetivo pároco. EUCARISTIAS DOMINICAIS: Dia 29 de junho: RR Voz de Lisboa, às 10H, do Mosteiro dos Jerónimos, Missa Comemorativa do 25º aniversário da tomada de posse de D. António Ribeiro como Patriarca de Lisboa. Dia 30 de junho: A1, às 8H, da Igreja de S. João de Brito; RTP 2, às 10H30, dos Estúdios de Lisboa; RR, às 11H, da Igreja de Nª Sr.ª da Conceição, Porto; RTP 1, às 14H, dos Estúdios de Lisboa; TVI, às 12H, da Igreja paroquial de Santa Catarina, em Lisboa. Dia 07 de julho: A1, às 8H, da Igreja de S. João de Brito; RTP 2, às 10H30, dos Estúdios de Lisboa, RTP 1, às 14H, dos Estúdios de Lisboa; TVI, às 12H, de Valadares, V. N. Gaia.

8. Apoios financeiros para construção de igrejas e instituições Católicas:

É comum a cedência gratuita de terrenos pelas autarquias e Governo à igreja católica para construir as suas igrejas e instituições. As demais instituições não desfrutam desse privilégio (salvo raríssimas exceções nos últimos anos). Uma das grandes desigualdades, quase desconhecida, é o financiamento do Estado para a construção das igrejas católicas. Essas construções que chegam a ser financiadas significativamente pelo Orçamento Geral do Estado constituem, além de uma discriminação flagrante, uma das razões de fácil implantação da igreja católica nas populações, em contraste com a dificuldade das outras confissões religiosas.

9. Dignidade humana a nível individual e coletivo:

As várias áreas referidas revelam situações de discriminação, desigualdade e até de falta de dignidade para com as pessoas e as confissões religiosas. Devido, por exemplo, às dificuldades no apoio logístico e financeiro, as comunidades religiosas não-católicas, obrigadas a instalar-se em lugares acanhados, mas localizados, por vezes pouco dignos da mensagem que pregam e da causa que promovem. A UPASD aplaude esta iniciativa do Ministério da Justiça para a Reforma da Lei da Liberdade Religiosa e encoraja a Comissão nomeada para, em conjunto com todos os interessados, alcançarem este desiderato imperioso para o respeito, igualdade e dignidade de todos os portugueses.

Reforma da Lei da Liberdade Religiosa

TÍTULO 1 – PRINCIPIOS FUNDAMENTAIS

Artigo 1º - (Liberdade de consciência, de religião e de culto)

A liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável.

Artigo 2º - (Princípio da igualdade)

a lei. Todas as igrejas, confissões religiosas e crentes, são iguais perante

Artigo 3º - (Princípio da separação da liberdade de organização)

1. As igrejas e outras comunidades religiosas estão separadas do

Estado e são livres na sua organização e no exercício das suas funções e do culto. 2. O Estado conhece a função social exercida pelas confissões e organizações religiosas.

Artigo 4º - (Direitos absolutamente garantidos)

A declaração do estado de sítio ou de estado de emergência em nenhum caso pode afetar a liberdade de consciência e de religião.

Artigo 5º - (Atividades não religiosas)

Não são consideradas religiosas as atividades relacionadas com os fenómenos metapsíquicos ou parapsicológicos.

TÍTULO II – LIBERDADE RELIGIOSA INDIVIDUAL

Artigo 6º - (Direitos e garantias individuais)

O Estado garante a todos o direito a:

a. Professar as crenças religiosas que livremente escolher, bem como o direito a não professar nenhuma; b. Mudar de confissão ou abandonar a que tinha; c. Manifestar livremente as suas crenças religiosas ou a ausência das mesmas, ou abster-se de se pronunciar sobre elas; d. Receber e difundir ensinamentos religiosos de qualquer índole, quer seja oralmente, por escrito ou por qualquer outro meio; eleger para si, e para os menores não emancipados sob a sua tutela, a educação religiosa e moral que esteja de acordo com as suas próprias convicções; e. Praticar individual ou coletivamente os atos externos de veneração próprios de uma determinada religião e receber assistência religiosa da sua própria confissão; f. Comemorar as suas festividades; g. Celebrar os seus ritos matrimoniais; h. Receber sepultura digna, sem ser discriminado por motivos religiosos; i. Não ser obrigado a praticar atos de culto ou a receber assistência religiosamente contrariamente às suas convicções e práticas religiosas; j. Reunir-se ou manifestar-se publicamente com fins religiosos e associar-se para desenvolver comunitariamente as suas atividades religiosas.

Artigo 7º - (Do dia sagrado de repouso semanal)

O Estado providenciará no sentido de tornar possível aos crentes de qualquer confissão religiosa a observância do dia sagrado de repouso semanal da sua confissão religiosa.

Artigo 8º - (Garantia de igualdade jurídica, civil e política)

1. Ninguém pode ser perseguido, privado de direitos ou isento

de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou práticas religiosas. 2. Nenhuma discriminação se fará, por motivo delas no acesso a quaisquer cargos ou empregos públicos ou privados ou na atribuição de quaisquer honras ou dignidades.

Artigo 9º - (Direito à reserva pessoal das convicções ou praticas religiosas)

Ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou práticas religiosas, salvo para recolha de dados estatísticos não individualmente identificáveis, nem ser prejudicado por se recusar a responder.

Artigo 10º - (Limites ao exercício da liberdade religiosa)

A ninguém será lícito invocar a liberdade religiosa para o incitamento ou a prática de atos que sejam incompatíveis com a vida, a integridade física ou a dignidade das pessoas, os bons costumes ou os princípios fundamentais da ordem constitucional.

Artigo 11º - (Do casamento)

1. O casamento é religioso ou civil. 2. A lei civil reconhece valor e eficácia de casamento ao matrimónio celebrado em conformidade com as normas internas de cada igreja ou comunidade religiosa nos termos, quanto aos efeitos civis, das normas do Código Civil e do Código de Registo Civil. 3. O Código Civil e o Código de Registo Civil serão alterados em conformidade com os números anteriores.

Artigo 12º - (Da objeção de consciência)

É garantido o direito à objeção de consciência, com fundamentos religiosos, nos termos da lei.

TÍTULO III – CONFISSÕES E ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS

Artigo 13º - (Personalidade e capacidade jurídica)

1. As igrejas, confissões e comunidades religiosas, suas federações e uniões gozam de personalidade jurídica desde que registadas em Livro próprio da Secretaria Geral do Ministério da Justiça, à vista do requerimento instruído com documentos, que provem a sua existência em território nacional e que contenham os princípios essenciais da sua doutrina, o seu nome, a descrição geral dos atos públicos, as regras de disciplina e hierarquia da organização, a identidade dos dirigentes e a descrição da sua prática no País. 2. As igrejas, confissões e comunidades religiosas podem ser sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo disposição legal em contrário; nisto consiste a sua capacidade jurídica.

Artigo 14º - (Reconhecimento da personalidade jurídica)

1. O Estado reconhece a personalidade jurídica e a plena capacidade de atuação das entidades religiosas que gozam dela na data de entrada em vigor da presente Lei. 2. Transcorridos três anos, só poderão justificar a sua personalidade jurídica mediante a certificação da sua inscrição no Registo a que esta Lei se refere.

Artigo 15º - (Da autonomia e da liberdade de organização das igrejas)

1. As igrejas, confissões e comunidades religiosas inscritas terão plena autonomia e poderão estabelecer as suas próprias normas de organização, regime interno e regime do seu pessoal. 2. Na sua própria autorregulamentação, bem como na regulamentação das instituições criadas por aquelas para desenvolverem os seus fins, poderão incluir cláusulas de salvaguarda

da sua identidade religiosa e caráter próprio, assim como do devido respeito pelas suas crenças, sem prejuízo do respeito dos direitos e liberdades reconhecidos pela Constituição e em especial dos da liberdade, igualdade e não discriminação. 3. As organizações correspondentes às confissões religiosas e às associações ou institutos religiosos não podem ser submetidas ao regime de tutela. 4. As igrejas, confissões e comunidades religiosas, para a prossecução dos seus fins, poderão criar e fomentar a criação de

Associações, Fundações e Instituições em conformidade com as disposições do ordenamento jurídico geral.

Artigo 16º - (Da igualdade nos privilégios e acordos)

1. Os privilégios, designadamente fiscais, concedidos pelo Estado a uma Igreja, confissão ou comunidade religiosa ou aos seus fiéis ou ministros devem ser reconhecidos a todas as igrejas, confissões ou comunidades religiosas, respetivos fiéis e ministros. 2. Todos os acordos celebrados ou a celebrar entre o Estado e as

Igrejas, confissões e comunidades religiosas, estão sujeitos ao princípio da igualdade consagrado na Constituição.

Artigo 17º - (Da liberdade de culto)

É assegurado a qualquer igreja ou comunidade religiosa o livre exercício de todos os atos de culto, privado ou público, sem prejuízo das exigências de polícia e trânsito.

Artigo 18º - (Do exercício da liberdade de culto)

1. As igrejas, confissões, e comunidades religiosas têm o direito de estabelecer lugares de culto ou de reunião com fins religiosos, de designar e formar os seus ministros, de divulgar e propagar o seu próprio credo, de manter relações com as suas

próprias organizações ou com outras confissões no território nacional ou no estrangeiro. 2. A construção ou instalação de templos ou lugares destinados à prática do culto só é permitida quando este seja de confissões religiosas reconhecidas, mas não depende de autorização especial, estando apenas sujeitas às disposições gerais de caráter técnico-administrativo sobre a salubridade, solidez e segurança relacionadas com a natureza da utilização, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 3. A aplicação das disposições gerais de caráter técnico-administrativo não pode impedir qualquer igreja, confissão ou comunidade religiosa de exercer o seu culto e realizar as suas cerimónias religiosas, salvo em casos de grave perigo do interesse público. 4. São isentos de qualquer imposto ou contribuição geral ou local, os templos e locais de culto, os objetos neles contidos indispensáveis para os atos externos de veneração próprios de uma determinada religião, as escolas e quaisquer outros estabelecimentos destinados à formação de ministros. 5. De igual isenção gozam os ministros pelo exercício do seu múnus espiritual.

Artigo 19º - (Direito de Assistência religiosa)

Para garantir a assistência espiritual aos seus membros, cada igreja, confissão ou comunidade religiosa, através do seu ministro credenciado, terá livre acesso aos hospitais, lares, escolas, prisões e outros estabelecimentos públicos ou privados similares, sem prejuízo da observância dos respetivos regulamentos, salvo em caso de urgência.

Artigo 20º – (Sigilo Religioso)

1. Os ministros de qualquer religião ou confissão não podem ser perguntados por quaisquer autoridades sobre factos e coisas de que tenham conhecimento por motivo do seu sagrado ministério.

2. A obrigação do sigilo persiste, mesmo quando o ministro tenha deixado de exercer o seu múnus.

Artigo 21º - (Ministros de culto)

Consideram-se ministros da religião ou da confissão religiosa as pessoas que, de harmonia com sua organização, exerçam sobre os fiéis qualquer espécie de jurisdição ou cura de almas.

Artigo 22º - (Liberdade de ensino da religião)

1. As Igrejas, confissões e comunidades religiosas podem estabelecer e manter livremente escolas particulares. 2. A inscrição em estabelecimentos de ensino mantidos por entidades religiosas implica a presunção da aceitação do ensino da religião e moral da respetiva confissão, salvo declaração em contrário dos seus dirigentes. 3. O Estado assegurará a possibilidade do ensino religioso das diversas confissões nas escolas públicas do ensino básico aos alunos cujos pais ou quem suas vezes tiverem feito pedido por escrito nesse sentido, no ato de inscrição ou matrícula.

Artigo 23º - (Dos bens e património)

1. As pessoas coletivas religiosas não carecem de autorização para a aquisição dos bens necessários à realização dos seus fins, mesmo que se trate de bens imóveis e a aquisição se faça a título oneroso, nem para a alienação ou oneração dos bens imóveis a qualquer título. 2. Os bens destinados a proporcionar rendimento não são considerados necessários à prossecução dos fins das pessoas coletivas religiosas e a sua aquisição está sujeita ao disposto na

Lei geral.

Artigo 24º - (Dos donativos e coletas)

As Igrejas, confissões religiosas e comunidades religiosas, podem livremente receber dos fiéis e membros coletas e quaisquer donativos destinados à realização dos seus fins, designadamente no interior e à porta dos templos, assim como dos edifícios e lugares que lhe pertençam.

TÍTULO IV

Artigo 25º - (Comissão para a Liberdade Religiosa)

1. Junto da Assembleia da República funciona a Comissão para a Liberdade Religiosa. 2. Compõem a Comissão:

a. Um Juiz, designado pelo Conselho Superior de Magistratura, como presidente; b. Um representante de cada um dos seguintes Ministérios: da Justiça, da Educação e da Solidariedade Social; c. Três representantes da Igreja Católica; d. Três representantes das confissões religiosas não católicas; e. Cinco individualidades de reconhecido mérito designados pela Assembleia da República por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções.

C) Reflexões e Propostas da Comunidade Islâmica de Lisboa sobre a Liberdade Religiosa em Portuga

1. A Lei deve visar as associações religiosas representativas dos que seguem a religião Islâmica ou muçulmana (os islâmicos ou muçulmanos). A COMUNIDADE ISLÂMICA DE LIS-

BOA (CIL), é a associação mais antiga, fundada em 1968, tendo várias delegações espalhadas pelo país, podendo, no entanto, haver algumas associações autónomas e daí que julgamos dever ser contemplada a hipótese de elas também serem visadas mediante parecer da CIL sobre a sua elegibilidade para o efeito. 2. Os princípios gerais devem ser o de conferir equidade de tratamento pelo Estado à Religião Islâmica em face do tratamento que é tradicionalmente dado à Religião Católica que se regula pela Concordata. Os principais aspetos que julgamos deverem ser contemplados, são os seguintes:

• Inviolabilidade de determinados locais (de culto, cemitérios, ensino religioso e cultural). • Direito de propriedade desses locais. • Tratamento em caso de expropriação. • Estatuto dos Ministros de Culto e facilidade de obtenção de vistos de entrada e residência. • Reconhecimento dos casamentos celebrados pela religião Islâmica. • Direito a assistência religiosa aos doentes e reclusos internados em estabelecimentos estatais. • Isenções fiscais. • Reconhecimento das Festas religiosas do Islão mediante oficialização do Calendário Islâmico e os seus feriados, e direito de participar nas orações semanais em congregação às Sextas-feiras, que têm lugar nas Mesquitas ao meio do dia (cerca das 13 horas durante o horário de Inverno, e cerca da 14h durante o horário de Verão). • Direito ao abate de animais de conformidade com o ritual

Islâmico.

• Direito de tempo de antena nos vários canais de comunicação (rádio e TV). • Inventariação e preservação do Património Cultural do Islão. • Direito ao ensino religioso Islâmico nas escolas (cf. Despacho

Normativo nº 104/89). • Garantia de fornecimento de alimentação de conformidade com os requisitos Islâmicos nos estabelecimentos prisionais, hospitalares, militares e de ensino. • Direito à adoção de nomes Islâmicos (adiantamento ao Cod.

Reg. Civil). • Observância de práticas religiosas nos cemitérios. • Não discriminação da Comunidade em matéria de subsídios, apoios e incentivos a conceder pelo Estado, incluindo para a construção de locais de culto.

3. No tocante às isenções fiscais, os principais problemas enfrentados pela CIL, são os seguintes:

• Não dedutibilidade para efeitos do IRC para as empresas que pretendem dar contribuições e donativos à CIL. • Não recuperação do IVA pago pela CIL às empresas de construção que têm vindo a fazer obras de vulto para a Mesquita de Lisboa, ainda em fase de acabamento. • A este respeito, juntamos em anexo cópia de documentos relevantes que mostram os indeferimentos dos pedidos feitos pela CIL para a recuperação do IVA pago e que representa para uma Comunidade como a nossa, dependente de donativos e contribuições, uma perda bastante significativa. Seria muito importante que a CIL ainda pudesse vir a receber esses montantes retroativamente.

Art. 1º

São reconhecidos os direitos constantes dos artigos que se seguem, à Comunidade Islâmica de Lisboa (abreviadamente referida como

CIL), ou a qualquer outra associação representativa dos interesses dos que seguem a religião Islâmica, que como tal sejam reconhecidas pela CIL, e devidamente registadas junto das entidades oficiais competentes. Todas essas associações são adiante designadas como Comunidades Islâmicas, ou simplesmente por Comunidades.

Art. 2º

1. Os locais de culto, cemitérios, locais de formação e ensino, e centros culturais das Comunidades Islâmicas são invioláveis. 2. Em caso de expropriação de qualquer dos locais acima referidos deverá se previamente ouvida a Comunidade Islâmica em causa. 3. Às Comunidades Islâmicas é reconhecido o direito de instalação de cemitérios próprios, locais sobre os quais também terão direito de propriedade. 4. Sem prejuízo do referido no número anterior, às Comunidades Islâmicas será cedido o uso de parcelas de terreno em cemitérios municipais, destinados ao enterramento segundo o ritual Islâmico. Serão adotadas medidas com vista à observância dos respetivos rituais funerários, relativos à exumação e sepulturas que se realizem com a intervenção da respetiva

Comunidade. 5. Com sujeição às normas legais aplicáveis, é reconhecido o direito às Comunidades Islâmicas de trasladarem para os respetivos cemitérios, os corpos dos defuntos enterrados em cemitérios Municipais.

Art. 3º

1. São reconhecidas às Comunidades Islâmicas, as seguintes isenções fiscais: a. Contribuição autárquica sobre os seguintes imóveis: • Locais de culto, dependências ou edifícios anexos, destinados à assistência religiosa ou ao culto;

• Locais destinados aos serviços administrativos das Comunidades Islâmicas; • Cemitérios; • Associações, centros culturais e escolas; b. Imposto Municipal de Sisa nas aquisições de imóveis para a realização direta e imediata dos fins das Comunidades

Islâmicas (religiosos, culturais, sociais, de beneficência, etc.…); c. Imposto sobre Sucessões e Doações, sobre qualquer doação ou legado que seja feito às Comunidades Islâmicas; d. Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas;

2. Será reembolsado às Comunidades Islâmicas o Imposto sobre o Valor Acrescentado nas seguintes operações e atividades: • Importação, aquisição de bens e serviços, importação de alimentos de dietética religiosa; • Prestação de serviços referentes ao culto e construção, manutenção, e conservação de imóveis destinados ao culto, a centros culturais, beneficência, habitação e/ou formação de Ministros do Culto.

3. Os donativos ou quotas pagas às Comunidades Islâmicas poderão ser abatidos ao rendimento coletável, até 15% do rendimento líquido, quer das pessoas singulares, quer das pessoas coletivas, para efeitos de IRS ou IRC.

Art. 4º

As Comunidades Islâmicas podem receber livremente, dos seus membros, donativos, ofertas, contribuições e organizar coletas públicas.

Art. 5º

1. Consideram-se Ministros de Culto (dirigentes religiosos) as

pessoas singulares dedicadas com caráter estável à orientação das orações e à formação e assistência religiosa. 2. As funções do culto, formação e assistência religiosa são em cada caso, as que estão de acordo com as leis e tradições da religião Islâmica. 3. Os Ministros do Culto não estão obrigados a revelar factos de que tenham tido conhecimento no exercício das suas funções de culto ou assistência religiosa. 4. Os Ministros do Culto são isentos da obrigação de assumir os cargos de jurados, membros de tribunais ou comissões de impostos, e outros da mesma natureza. 5. Os Ministros do Culto estão dispensados do serviço militar obrigatório. 6. Aos alunos que frequentem cursos de formação religiosa, conforme atestado a passar pela Comunidade respetiva, será, mediante requerimento para o efeito, conferido adiamento na prestação do serviço militar. 7. A requerimento da Comunidade interessada, serão concedidos vistos de entrada e residência em Portugal, para Ministros do Culto de nacionalidade estrangeira. 8. Os Ministros do Culto das Comunidades Islâmicas têm o mesmo estatuto laboral e de segurança social dos Padres da

Igreja Católica, beneficiando também de idêntico regime fiscal.

Art. 6º

Serão reconhecidos efeitos civis aos casamentos celebrados pelos Ministros do Culto, devendo para o efeito ser publicado regulamento adequado.

Art. 7º

Aos militares que sejam membros das Comunidades Islâmicas, é reconhecido o direito de receberem assistência religiosa e participarem em celebrações religiosas, sem prejuízo dos seus deveres militares e desde que devidamente autorizados pelas respetivas chefias militares.

Art. 8º

1. É garantido o direito à assistência religiosa dos membros das

Comunidades Islâmicas que se encontrem internados em instituições estatais, designadamente, estabelecimentos hospitalares e prisionais, que será prestado pelo Ministro do Culto da Comunidade respetiva. 2. As direções das instituições acima referidas estão obrigadas a transmitir à Comunidade em questão as solicitações de assistência religiosa que lhes sejam dirigidas pelos membros das

Comunidades que aí se encontrem internados. 3. A assistência religiosa prevista no presente artigo compreende a dispensada aos nubentes e moribundos, assim como a honras fúnebres, de acordo com os rituais da religião Islâmica, e deverá ser prestada com pleno respeito aos princípios da liberdade religiosa, observando-se, no entanto, as normas de organização de cada instituição, mas sem limitação de horário.

Art. 9º

1. É garantida a execução do disposto no Despacho Normativo nº 104/89 do Ministério da Educação. 2. O ensino religioso será ministrado por professores designados pela Comunidade em questão, e que facultará o material didático necessário, bem como o respetivo programa. 3. Os estabelecimentos de ensino deverão disponibilizar os meios necessários ao cumprimento do disposto no presente artigo, sem prejuízo do seu normal funcionamento.

Art. 10º

Em execução do disposto nos artigos aplicáveis das Leis da Rádio e da Televisão, são concedidas às Comunidades Islâmicas, sem discriminação relativamente a outras comunidades religiosas reconhecidas em

Portugal, direitos de antena nos respetivos canais públicos, em períodos proporcionais à sua representatividade.

Art. 11º

1. O calendário e os dias de Festa da religião Islâmica devem constar de documento elaborado pela Comunidade, o qual deve ser anualmente enviado para registo ao Ministério da

Administração Interna. 2. Aos membros da Comunidade Islâmica é assegurado o direito de participarem nas orações semanais, em congregação, que têm lugar nas Mesquitas, às Sextas-feiras, devendo para isso disporem de 2 horas, entre as 12 e as 15 horas, segundo informação a prestar pela Comunidade no Ministério competente. 3. O regime referido no nº 2 estende-se aos dias ou períodos inferiores ao dia, de celebração de festividades religiosas constantes dos calendários referidos no n.º 1. 4. Os alunos membros da Comunidade Islâmica que frequentem estabelecimento de ensino público ou privado são dispensados da frequência de aulas, testes ou exames finais nas datas referidas nos números anteriores.

Art. 12º

1. O Estado Português não discriminará, em matéria de subsídios, apoios e incentivos, seja qual for a sua natureza, as Comunidades Islâmicas. 2. Para o efeito, as Comunidades deverão apresentar anualmente, para registo no Ministério da Administração Interna de utilidade social que têm a seu cargo.

Art. 13º

Será aditada uma nova alínea no nº 2 do art.º 103 do Código do Registo Civil com o seguinte teor:

“São admitidos os nomes próprios sob a forma originária, se o registando pertencer a uma Comunidade Religiosa reconhecida em Portugal, desde que tal nome próprio seja considerado cabível na onomástica religiosa respetiva de harmonia com certificado emitido pela respetiva Comunidade.”

Art. 14º

1. São concedidas autorizações das entidades competentes para a matança ritual de bovinos, ovinos, caprinos e aves nos matadouros municipais ou outros por requisição da Comunidade, que se fará de acordo com as normas sanitárias aplicáveis. 2. É garantido o fornecimento de alimentação de acordo com os requisitos da religião Islâmica nos estabelecimentos prisionais, hospitalares e de ensino.

Art. 15º

O Estado e as Comunidades colaborarão na conservação do património histórico, artístico e cultural Islâmicos em Portugal e ainda na sua inventariação e na elaboração dos respetivos catálogos. Este artigo encontra-se escrito ao abrigo do Acordo Ortográfico em vigor em 1999.

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