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PATRIMÔNIO QUEIXADA, ESQUE(CIMENTO)?
Em janeiro de 1987, o Governado de São Paulo da época, André Franco Montoro, tombou como patrimônio histórico do Estado, a Estrada de Ferro Perus-Pirapora pelo CONDEPHAAT. A linha férrea é umas poucas com bitola estreita do Brasil, ou seja, que tem 60 cm de comprimento entre os trilhos.
Então os operários juntaram-se em favor da preservação também do Conjunto Fabril, suas dependências, as vilas operárias, e o eucaliptal, com cerca de 23 alqueires e 16.770m2 de área construída.
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Foi só em outubro de 1992, pela CONPRESP, que o Tombamento da Fábrica de Cimento em si e de todo o conjunto construído, que deu início ao bairro, se tornou realidade.
Pela importância histórica, o tombamento da Fábrica significou tanto para Perus quanto para o imaginário Queixada, o reconhecimento de uma série de fatores, entre os quais, destacam-se: o pioneirismo industrial, a importância no desenvolvimento da evolução urbana local, e o bem intangível, ou seja, a memória coletiva desde sua fundação, até o seu fechamento.
Planta da situação da Fábrica e Vilas Operárias. Fonte: Conpresp.
Em reconhecimento à tamanha contribuição e influência que a organização dos trabalhadores da fábrica teve na produção do Espaço e na construção da história dos habitantes de Perus, as edificações eleitas a serem preservadas foram: as Residências Operárias da Vila Triângulo, as Residências Operárias da VIla Portland, as Residências Operárias da Vila Fábrica, e as Casas de administração e assistência médica.
Mas o que deveria ter sido a decisão final, em 2004, houve uma revisão do processo, e o perímetro do tombamento foi reduzido, de forma que somente as edificações da CBCPP (complexo fabril), a Vila Triângulo, a Capela, e o Sindicato mantiveram status de proteção, e que as outras vilas anteriormente resguardadas, foram desprotegidas e demolidas.
O que resta da Fábrica hoje, ainda pode ser considerada símbolo da união operária do Brasil, pela repercussão e pelo modo pacífico pelo qual uma comunidade inteira buscou os seus direitos, pela forma ‘firmeza permanente’ que consistiu na não-violência, e transformandose até hoje, em uma referência. Um patrimônio material e imaterial.
FIRMEZA PERMANENTE: O CMQ E OS MOVIMENTOS
Após o tombamento da fábrica, se criou uma Comissão Pró-Centro de Cultura Operária de Perus, composta inicialmente pelos ex-funcionários da fábrica. Hoje, esse movimento em defesa da Fábrica de Cimento reúne diversos movimentos locais, atuantes historicamente na luta pela destinação pública da Fábrica.
Ao Movimento pela Reapropriação da Fábrica somaramse instituições científicas e outras organizações civis, resultando uma composição diversificada, com o mesmo objetivo, ou seja, fortalecer a pauta de lutas pela preservação e transformação da Fábrica e a finalidade de dar um papel social adequado ao seu valor simbólico e material como testemunho da construção fabril e como conjunto urbanístico e ambiental para a cidade, contribuindo para o desenvolvimento local sustentável, alicerçado na produção de conhecimento, nos valores humanistas, na cultura e na memória operárias.
O Movimento pela Reapropriação da Fábrica de Cimento, este nascido em 2013, propõe e reivindica melhores maneiras de preservar o patrimônio, garantindo acessibilidade, preservação, e perpetuação do mesmo na memória coletiva. O ideal é claro: criar um complexo cultural e recreativo, nas edificações e entorno da fábrica, para o usufruto digno da população, com suporte de atividades diversas ao bairro.
Ressaltam a vocação turística resultante da junção: CBCPP, Estrada de Ferro Perus Pirapora, e o Parque vizinho Anhanguera, de forma que a proximidade e equivalência atrativa destes personagens, para a cidade, caso fosse viabilizado, funcionariam como um polo cultural e histórico.
Algumas das reivindicações pontuais do Movimento Pela Reapropriação da Fábrica de Cimento, que há décadas luta pela desapropriação e destinação da Fábrica para uso público e social, são:
Instalação do Centro de Lazer, Cultura, e Memória do Trabalhador, segundo aspiração já antiga do movimento Queixada; Instalação de uma Universidade Livre e Colaborativa; Estabelecimento de um processo dialogado e participativo de diagnóstico com projeto voltado ao restauro da Fábrica; Constituir um espaço comunitário e cultural de gestão partilhada e autogerida;
Frizam que a gestão dos equipamentos deve ser democrática e pública, envolvendo horizontalmente a participação de todos os agentes a eles associados: moradores, trabalhadores, gestores, educadores.
Acervo da sede do CMQ, na Biblioteca Padre José de Anchieta. Foto: Ana Luisa
PARTE 2 ~ RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA
Outro agente importante a qual se deve essa causa urbana e cultural, e também ao desenvolvimento deste trabalho em questão, o CMQ, Centro de Memória aos Queixadas, é atualmente encabeçado por mulheres, filhas e netas dos primeiros Queixadas.
Elas trazem a ideia da construção de um centro de preservação da memória e cultura surgido já em 1974. O CMQ sedia hoje na Biblioteca Padre José de Anchieta, e é o principal atual responsável pelo resguardo de um acervo extenso de documentos, registros, e obras da história de Perus, bem como intenciona que a comunidade compreenda o conceito do próprio patrimônio Queixada, e que se torne guardiã de suas memórias.
Para os Queixadas, já em 1974, o movimento em defesa da Fábrica, além de buscar o sonho de sua transformação em prol dos trabalhadores, deveria também considerar como tarefa importante transmitir todos os meios que acreditavam legítimos, de conquistas e vitórias, aos seus filhos ou às gerações vindouras.
Percebe-se então, que desde àquele momento, entendia-se a importância da articulação entre história, memória e escolas do bairro de Perus, como um processo de educação.
Pela ótica da gestão de governo, foi em 2003, que o vereador José Laurindo criou a Lei nº 13.549/03, autorizando ao Poder Executivo Municipal, a implantação do Centro Cultural da Fábrica de Cimento Portland Perus e do Centro Temático da Estrada de Ferro Perus-Pirapora integrados ao Anhanguera (maior parque em área verde da metrópole paulista). Ademais, esse projeto não foi executado devido à falta de verbas públicas ou privadas, que viabilizassem os projetos de interesse da população local.
Acervo da sede do CMQ, na Biblioteca Padre José de Anchieta. Foto: Ana Luisa
Entretanto, o Movimento pela Reapropriação da Fábrica, bem como todos os que se envolvem direta ou indiretamente nessa tarefa de preservar a história e memória locais, vem efetivamente participando, desenhando e encontrando soluções, mesmo assim, por meio da ação solidária, para a construção da história dos oprimidos dentro das possibilidades e realidades existentes.
Pensa-se que utilizar os acontecimentos e a cultura locais junto aos conteúdos escolares pode-se produzir grande envolvimento de estudantes e professores das escolas de Perus. Entende-se que ações pedagógicas em torno da história e memória contribuem na constituição de uma identidade entre os moradores do bairro, mesmo que muitos jovens estudantes de hoje não tenham tido alguma relação com as pessoas que viveram o auge de funcionamento da Fábrica. Ademais, alguns passos importantes nessa direção vêm sendo dados, entre eles:
PARTE 2 ~ RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA
Relação escolas e Movimento: cada vez mais a relação entre escolas, currículo, processo de ensino-aprendizagem da história e memórias da comunidade se encaixam como aliadas e alinhadas na formação do sujeito como futuro atuante na sociedade, capaz de construir e aspirar outro modelo de sociedade;
A conquista por lei, do parque “A Luta dos Queixadas”, incorporado no PDE, 2014, que mesmo que ainda não executado, vem garantindo a preservação ambiental da área próxima à Fábrica de Cimento, e daria continuidade ao Parque Linear Ribeirão Perus (projeto de 2006 também ainda não executado);
Instauração do Território de Interesse da Cultura e da Paisagem (TICP) Jaraguá-Perus: aprovado no dia 30 de junho de 2014 e sancionado pelo prefeito Fernando Haddad (Lei 16.050/2014), foi uma conquista importante pela criação de um novo instrumento urbano capaz de pensar a cidade de modo diferente, mais humano, e inserido no Plano Diretor de São Paulo 2014;
Frequentes produções artístico-culturais internas à comunidade: exposição de fotos, instalações, caminhadas, rodas de conversa, Café Filosófico, Atos Artísticos, oficinas, debates, trilhas de aprendizado, teatros, intervenções urbanas, grafites, jornada do patrimônio, audiências públicas, projetos sociais como “Cultura e Conceito”, em espaços como a Biblioteca Municipal Padre José de Anchieta, Cieja Perus, CEU Perus, Sindicato “de Cimento”, Comunidade Cultural Quilombaque, Atelier Dinas Miguel, escolas etc;
Disposição para diálogos, com o proprietário da Fábrica, a Câmara Municipal e órgãos responsáveis pelo patrimônio, na esperança de salvaguardar o bem tombado e desenhar um plano de massa, que restaure e atribua um uso público e social para a Fábrica de Cimento.
“Apesar dos planos não terem sido concretizados, o desejo de ver o conjunto fabril ltransformado em Centro Cultural ainda e vivo e mesmo passados trinta anos do fechamento da CBCPP existem ainda hoje, grupos que se articulam e apoiam a realização do projeto, alguns deles: Comunidade Cultural Quilombaque, principal ponto de cultura local, grupo Pandora de Teatro e Movimento Pela Reapropriação da Fábrica de Cimento, composto por moradores do bairro e família dos operários. Toda essa história foi sendo transmitida ao longo dos anos por iniciativa dos atores locais (coletivos, educadores). Atualmente a Fábrica encontra-se em situação de abandono e deterioração, decorrência de intempéries e atos de vandalismo.”
Trecho do livreto “Patrimônio que te quero, viva! Exposição Cimento
Perus”, Governo do Eestado de São Paulo, e Secretaria da Cultura, Abril - Julho/2017.