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Depoimento de Henrique Idoeta Soares
depoimento de henrique idoeta soares1
espaço expositivo mezanino e portfólio
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1 - Como se dava a concepção dos espaços expositivos das mostras dos projetos Mezanino e Portfólio, em geral? 2 - No Projeto Mezanino de Fotografia havia uma limitação de espaço: uma parede de 17, 18 metros lineares, mas que, mesmo assim, possibilitou propostas de montagens diversas. O que você teria a dizer sobre isso? 3 - Já no projeto Portfólio, as exposições eram montadas em um espaço de aproximadamente 120 metros quadrados. As possibilidades de montagens diversas foram ainda maiores. O que você teria a dizer sobre isso? 4 - A diversidade de montagens é uma característica das exposições de fotografia contemporânea? 5 - E com relação às itinerâncias? A configuração do espaço já ia preconcebida por você com base nas plantas do espaço expositivo do local? Que adaptações eram necessárias para que se mantivesse a configuração da exposição realizada na sede do Itaú Cultural, em São Paulo? Vou falar inicialmente do Projeto Mezanino [de Fotografia], que foi uma criação do Núcleo de Artes Visuais. O projeto acontecia no corredor do piso mezanino, que estava ocioso. Esse corredor fazia a interligação entre o espaço da Arena, que é a cobertura do teatro, e o CDR [Centro de Documentação e Referência], que é a biblioteca. O Marcelo Monzani, na época [em 2003] gestor do Núcleo de Artes Visuais, teve a ideia. Era um projeto muito tímido e não tinha grandes possibilidades de trabalhar a expografia. Então, na verdade, o que fizemos foi criar um painel perpendicular logo na entrada [da exposição], para poder contemplar a parte de comunicação. Tinha o logotipo do projeto, o texto do curador, o texto institucional, a ficha técnica eu não me lembro se tinha, mas enfim. Ali você não deixava totalmente visível a exposição para quem passasse pela escada ou ia para o andar de cima ou descia. Mas se via que tinha um espaço expositivo, já, isolado. E essa parede, também, delimitava, deixava claro esse corredor, que deve ter próximo a uns 3 metros [de largura], sendo uma faixa de passagem para o CDR e para o espaço Arena, e a outra faixa já era
1 Nota da organizadora: depoimento de Henrique Idoeta Soares, gerente do Núcleo de Produção do Itaú Cultural, local onde o depoimento foi concedido a Daniela Maura Ribeiro, em 9 de abril de 2010. A revisão final da edição pelo entrevistado foi efetuada em 20 de agosto de 2010.
pertencente ao projeto. Esse painelzinho, que pegava exatamente o meio desse vão, já criava, sinalizava uma linha invisível, mas que ficava claro qual era o espaço da exposição. Até porque, como eu te falei, a montagem era muito simples, não tinha nenhum segredo, era uma parede de mais ou menos 18 metros e a gente tinha de distribuir as obras nela. Mas um fato que acentuou bastante e definiu o espaço expositivo nas exposições do Mezanino era a iluminação. Porque aí a gente concentrava uma carga de iluminação mais intensa nessa parede, e o que sobrava do corredor, que era o acesso do CDR e lá da Arena, com menos luz. Então, naturalmente, você já criava uma barreira. Por exemplo, se alguém fosse passar para levar o carrinho com livros para o CDR, estaria enquadrado nessa “pista” mais escura porque o outro espaço, que estava claro e em evidência, era o da exposição de fotografia, um lugar para a fotografia ser contemplada, mostrada. Teve uma simplicidade espacial, mas eu acho que a luz também foi determinante, uma possibilidade interessante.
Isso no início. Eu lembro que nas exposições do primeiro ano de Mezanino, como a da Alline Nakamura, a gente trabalhou desse jeito. Depois, na segunda edição [em 2005], os artistas, a curadora, o próprio Núcleo de Artes Visuais e a equipe de produção, todos os envolvidos, enfim, começamos a descobrir outras possibilidades. Por exemplo, notamos que existia a outra parede em frente, que era a do próprio CDR. Aí a gente começou a se utilizar também dessa outra parede. Depois teve a questão da cor da parede. As exposições de 2004 tiveram certa uniformidade na montagem, as obras eram distribuídas na parede branca. Aí depois, em 2005, a gente começou a mudar essa cor a cada exposição. Esta que estamos vendo aqui [imagens na tela do computador] é da Fátima Roque. Veja que as caixinhas com as fotos estão suspensas contra uma parede de cor preta. Foi aí que a gente começou a trabalhar a coisa da cor da parede, a diversificar. Mas a questão da luz, essa não mudou. Esteve presente em todas as montagens do Mezanino. Olhe aqui [nas imagens dos espaços expositivos que víamos na tela do computador] o detalhe da luz, como ela é muito forte. Olhe que você percebe a diferença.
Claro que tem uma luz natural, dependendo do horário, mas a luz da exposição marca mais a parede. Ela dá atenção e um toque de destaque ao espaço. E mostra que ali é o espaço expositivo, um espaço para você ver a obra. Houve uma exposição, a da Patrícia Yamamoto, que fizemos uma montagem mais arrojada. Trabalhamos com duas cores naquela parede e tinha também uma vitrine. Claro que isso é algo que tem a ver com a proposta da curadoria [de Helouise Costa], com a obra da artista, enfim, existe toda uma parte conceitual que tem de estar em unidade. Mas, assim, era um projeto [Mezanino de Fotografia] que começa com exposições em paredes claras e tal. Aí começa uma preocupação maior com a luz. Você me pergunta se a montagem do espaço expositivo era uma proposta do Itaú Cultural ou decidida em conjunto com o curador, com o artista. Na verdade, era uma conversa única que a gente discutia. Veja que o caso dela [da Patrícia Yamamoto] já tem uma parede no fundo, então a gente sai do “L” para começar a formar um “C”.
E o que eu quero te mostrar [nas imagens que estamos vendo no computador] é a vitrine, que está aqui do lado. Então olha que interessante o histórico desse espaço. Primeiro ele era um corredor de passagem. Depois esse espaço se dividiu ao meio e se utilizou uma parede, e a outra é o lugar de passagem. Aí o espaço expositivo vai se apropriando de elementos como o balcão e a entrada do CDR, que viram coadjuvantes nessa história porque você tem de cruzar o espaço expositivo. Agora, todo ele é o espaço expositivo, porque é lá, a outra parte daqui, que isola da Arena, e depois a gente também fecha aqui [mostrando a imagem no computador]. Nesse exemplo, o espaço acaba ficando com pelo menos duas paredes paralelas. Uma de frente para a outra, com a obra. O que eu percebi é que, se tivesse um movimento das pessoas em direção ao CDR, as pessoas já mudavam um pouco o volume da voz, diminuíam o ritmo da passada. As pessoas sentiam que aquilo era um espaço expositivo, que tinha gente lá contemplando, observando as obras, e que o movimento tinha de ser um pouco menos brusco. A luz que estava só de um lado começou também a invadir o outro lado. No lado onde está o CDR tem vidro, a partir daqui [mostra imagens no computador], mas essa parede já existe lá [no CDR], a gente só pintou. Então, a cor também vai para o outro lado.
É por isso que eu acho que o Projeto Mezanino foi tomando uma proporção e uma dimensão que, como você viu, resultam em uma evolução. O projeto ficou no piso mezanino por dois anos, se não me engano [os anos de 2004 e 2005]. Mas chegou uma hora em que dava a impressão de que ele estava pequeno e que não conseguia mais dar conta, conviver com esse fluxo, só com esse corredor aí. Foi aí que o projeto desceu, o Marcelo [Monzani] saiu, mas o Mezanino teve continuidade. E isso em razão até do próprio sucesso que o Projeto Mezanino estava fazendo, da própria dimensão que ele tomou de começar a itinerar, enfim, de que ele poderia ser uma coisa maior. Mudou o nome, inclusive, porque ele estava atrelado ao lugar onde o projeto ocorria [o piso mezanino], então não teria sentido manter. Mudou para Portfólio porque o projeto começou a criar realmente um corpo e uma vida própria. E eram exposições em um espaço muito gostoso de fazer, de projetar, os artistas traziam propostas interessantes, eram bem abertos às propostas de mudar um pouco o espaço.
Enfim, eu acho que nesses dois anos o Projeto Mezanino teve uma evolução bastante grande. Cada ano teve um curador diferente [em 2004, Tadeu Chiarelli; em 2005, Helouise Costa]. Então, no primeiro ano, mantivemos a característica de parede de corredor e as obras foram expostas sobre parede branca. Mas, no ano seguinte, começamos a fazer uma proposta diferente de montagem para cada exposição, a evolução do projeto, de que te falei. A exposição da Fátima Roque com as caixinhas, tudo preto, aquela luzinha bem focada, e em outra parede teve uma projeção. Na da Patrícia, a gente trabalhou com dois tons na parede, uma faixa branca sobre o fundo preto, e nos apropriamos de outra parede também. E na exposição do Guilherme Maranhão retomamos um pouco aquela ideia original, de luz e a parede em um tom só, no caso cinza, até porque a proposta dele remetia ao metálico, ao azulado acinzentado. Aí a gente sai um pouco daqueles dois eventos [exposições da Fátima Roque e da Patrícia Yamamoto]. Um, o da Fátima, onde era tudo negro, escuro, aquela luz bem intimista, que você tinha de observar como se olhasse em um buraco de fechadura. O outro, o da Patrícia, também tinha isso de ser tudo escuro e o foco de atenção era a faixa branca, as obras ou a vitrine. Agora, a exposição do Guilherme, não. As obras eram em forma de tiras, em tons avermelhados metálicos, magenta, pediam esse fundo acinzentado, metálico também. Não tinha espaço suficiente, então as obras foram montadas contínuas, como se fosse uma tira do negativo. E tinha uma vibração e um movimento muito forte.
Agora, nesse processo todo, do Projeto Mezanino, nunca trabalhamos em cima de uma planta do espaço expositivo, até porque não tinha planta. Era um espaço pequeno, um corredor, então fazíamos um esboço do espaço ali na hora. Eu lembro que a gente ia para o espaço da exposição com o artista e o curador e levava a cartela de cores de tinta da parede e decidia tudo em conjunto, porque não havia grandes possibilidades de sentar e ficar desenvolvendo. Quase conseguimos criar um espaço fechado, mas quase, porque o espaço não possibilitava isso. Foi aí que se definiu a coisa da luz, da iluminação como elemento de montagem do espaço. Eu lembro que, quando a Fátima veio aqui, ela falou que queria mostrar as fotos nas caixinhas. Então, meio que na conversa, resolvemos colocar uma luzinha interna, como fizemos em uma exposição de fotografias que tivemos alguns anos atrás no Itaú Cultural e em que trabalhamos com esse tipo de iluminação. Essa ideia foi amadurecendo aos poucos e acabou se concretizando.
Em 2006, quando o projeto mudou de espaço e desceu para o piso Paulista [térreo], a gente já tinha um processo de experimentação amadurecido, que vinha de montagens diferentes. Carregamos lá para o piso Paulista toda essa experiência de trabalhar com fotografia. E o Portfólio foi muito interessante porque essa fotografia contemporânea obviamente não está restrita ao papel fotográfico.
Eu acho que, de 2004 a 2005, o que tivemos foi um avanço, um amadurecimento que nos levou para o que houve depois, lá no Portfólio, onde acabamos renovando algumas coisas que a gente não tinha experimentado no Mezanino. Das caixinhas da Fátima Roque, dos trabalhos com grandes reproduções em papel sulfite do Edu Marin, no Projeto Mezanino, passando pela Cia de Foto, no Portfólio, que trabalhou com material digitalizado em vídeo, foi uma grande diversidade na maneira de apresentar os trabalhos.
Claro que a “museografia” convivia com as limitações de espaço, de pédireito, de luz que a gente tinha no mezanino, mas tentava oferecer, ao artista e ao curador, formas inovadoras de ocupar o espaço, na medida do possível, para procurar acompanhar um pouco essa diversidade e fazer com que o público visse uma exposição e não ficasse com a impressão de “Ah! Só mudaram as obras, o espaço ficou igual”. Então, a gente sempre tinha essa preocupação de mudar o espaço meio que de forma marcante, por meio da cor, da luz, do modo de expor as fotografias.
Se é uma possibilidade da fotografia contemporânea essa forma de mostrar a fotografia diferente do vidro e da moldura? Eu acho que esse foi o grande exercício da gente. Em cada projeto, seja no Mezanino, seja no Portfólio, não tínhamos a expectativa sobre o que o artista iria trazer. Isso foi muito atrativo nos projetos. Por isso que era muito gostoso fazer o Mezanino ou o Portfólio. Era um desafio, e a gente, que trabalha com produção, é movida a motivação e desafios, porque senão não estaríamos nesse meio. O bacana era isso, que cada artista trazia uma proposta. Daí, aprendemos a ouvir, a filtrar o que é de fato possível fazer. Já chegamos nesse estágio de conseguir filtrar e ver no que a gente pode ajudar o artista a concluir o que ele idealizou. Porém, temos de falar para ele quando não dá, quando não temos condições de realização, seja por uma questão de espaço, seja por verba, técnica ou por “n” motivos.
Somos movidos, de certa forma, por essas propostas inovadoras e arrojadas que muitos artistas trazem. Na verdade, você [o produtor] é a pessoa que vai ser o facilitador e está ali para ajudar e tentar concretizar as ideias que o artista está trazendo. Então eu acho que é isso. Essas possibilidades todas, essa diversidade, que o Mezanino e o Portfólio apresentaram foram muito interessantes porque nos colocaram para trabalhar na criação do espaço, da luz, de poder atender às necessidades do artista e da curadoria. E às necessidades do próprio Itaú Cultural.
O espaço que abrigou o Portfólio é muito semelhante ao espaço que hoje é do projeto Ocupação, no qual tivemos as exposições do Nelson Leirner, do Chico Science, do Paulo Leminsky e do Zé Celso, por exemplo, porém um pouco mais ampliado. Enfim, em um mesmo espaço você consegue criar situações bem diversas. Precisa ser meio que alquimista, porque você tem de transformar algumas coisas ou aquele espaço em alguma coisa sempre nova. O Portfólio e o Mezanino eram projetos que tinham essas características.
A primeira exposição do Portfólio? Foi a da Helga Stein, com curadoria do Eder [Chiodetto]. O espaço era todo preto, tudo muito escuro; inclusive o piso, que era branco, foi neutralizado por um carpete preto. Mas tinha bastante luz, aquela que sobressai e que destaca a foto. A exposição da Helga foi marcada por tamanhos diferentes de fotografias. Essa diferenciação de tamanhos acho que foi outra característica da montagem bastante intensa. Existiam retratos maiores com menores, horizontais com verticais, a vitrine com “retratos”. Era um espaço retangular nessa primeira exposição do Portfólio, porque depois ele, em outro momento, na exposição da Cia de Foto e de outro artista, vira um “L”.
O legal é que a curadoria também soube trabalhar as imagens. No fundo do espaço tinha uma fotografia muito grande, muito forte, de um rosto [autorretrato da artista manipulado em computador]. E aí também, uma coisa diferente é que a gente ganha uma intensidade maior de público. A localização de andar é vital. Está logo na entrada e está junto com a recepção, onde tinha o restaurante. Então, a intensidade de público aumenta em razão da visibilidade e da localização estratégica. O Portfólio ganhou um espaço de ouro, muito importante, porque ficou no piso térreo, que dá para a Avenida Paulista, próximo à rua.
O espaço da exposição era aberto, formado somente por paredes. Aqui [mostra imagem na tela do computador] só tinha uma parede meio em diagonal, mas, à medida que o visitante avançava um pouquinho, já via o espaço expositivo. No Portfólio são três paredes, diferentemente da configuração do Mezanino, em que você tinha uma parede, no máximo duas, uma de frente para a outra, e era um corredor de passagem. Aqui você tem realmente um retângulo. Você tem de ir e depois voltar, você pode fazer essa leitura também periférica, olhando as paredes e saindo. A vitrine, com os retratos, já inserida nesse espaço também, ficava tridimensional, podia ser vista de um lado e do outro, diferentemente da exposição da Patrícia [Yamamoto] no Mezanino, de que falamos, em que a vitrine ficava encostada na parede. Mas o conceito já estava lá, no Mezanino.
No Portfólio, a gente teve a possibilidade de explorar mais a ideia da vitrine, ou melhor, de aprimorar. A exposição seguinte foi a do Rodrigo Braga, também com curadoria do Eder. Eu me lembro de nós, aqui da produção, olhando o catálogo de cores das tintas junto com o Eder, dessa conversa de a gente usar esse tom amarronzado nas
paredes com a letra vermelha. Era um vermelho meio de carne, de pele, um tom próximo ao que estava sempre presente nas fotos do Rodrigo. Lembro que a cor verde era também forte nas imagens, uma cor que tinha importância. Neutralizamos o piso, em preto, como na exposição da Helga. Aliás, a museografia da exposição da Helga e a do Rodrigo foram muito semelhantes. Mudou o tom da parede, a exposição do Rodrigo não teve vitrine, a sequência de imagens tinha um ritmo de tamanho. Só as do fundo que eram diferentes. Havia certa lógica. Na da Helga, as dimensões das imagens eram variáveis, mas também tinha um ritmo, e o piso, como te falei, era da mesma cor em ambas as exposições. Está vendo [mostra imagens na tela do computador]? Tinha certa unidade. A exposição do Rodrigo estava dividida por blocos. Essa é uma parede onde tem os rostos [mostra na tela do computador]. Aquela, já é corpo. E também a entrada da exposição do Rodrigo era parecida com a da Helga. O “L” não fechava, ficava meio de lado, meio na diagonal. Talvez o Eder, acho, quis marcar um pouco esse espaço das exposições com curadoria dele, mantendo certa semelhança na museografia. Tentar não mexer na arquitetura do espaço, mas mudá-lo internamente por meio da cor, da luz, da distribuição e do tema das imagens.
Depois veio a exposição da Cia de Foto, com curadoria do Edu Brandão, e aí ocorreu uma mudança no espaço. Era outro suporte, as imagens digitais mostradas em monitores de TV [de LCD]. Nessa exposição, o espaço que estava do lado, que era do educativo, diminuiu e, por consequência, o do Portfólio aumentou. O fundo teve uma entrada à direita, que a gente transformou em um “L”. Esse período foi perfeito, porque nessa exposição era preciso um espaço com pouca luz e pudemos fazer esse corredor que ia escurecendo. Os monitores pequenos colocados direto na parede, em um espaço um pouco mais iluminado, e a projeção nesse espaço com menos luz, então mais escurecido. E os pufes prateados distribuídos pelo espaço para o público poder sentar e ver a projeção de imagens mostradas diretamente na parede ou nos monitores de LCD. A sequência de imagens era quase como em um PowerPoint, então era importante que as pessoas pudessem se sentar e ficar contemplando a mudança de uma imagem para outra. E o bacana é o seguinte: com esse suporte [os monitores de LCD], a gente transformou 20 fotos em 200 ou 300 fotos, porque era como se fosse um Portfólio eletrônico. O Eduardo [Brandão] optou por esse espaço todo branco, as paredes cor gelo, piso branco natural da arquitetura do prédio. Uma das paredes era ocupada com o texto de apresentação, da curadoria, ficha técnica, com o logotipo, não foi preciso criar aquele “L” na entrada da exposição, mas por outro lado ele foi feito no fundo, naquele espaço que ganhamos a mais. Aumentou a área expositiva um pouco, e a gente percebe um espaço neutro, bem limpo. As imagens exibidas nos monitores é que chamam mais a atenção com suas cores e formas. Então, a museografia da exposição da Cia de Foto procurou ser o mais neutra possível para sobressaírem esses monitores e o conteúdo. O foco, aqui, era a visibilidade da alternância das imagens.
Depois da exposição da Cia de Foto, tivemos a do Daniel Santiago, também com curadoria do Edu Brandão. Na exposição do Daniel, o Edu quis fazer uma divisão no espaço expositivo, porque no trabalho o artista era composto de dois personagens – o Daniel Míope e o Santiago Chapéu. No espaço de um dos personagens, tinha também uma parede no centro com texto, que acabava fazendo mais uma divisão no espaço. Como as obras, em termos de dimensão, eram um pouco semelhantes às da Cia de Foto, pequenas, caderninhos com detalhes, a museografia foi também parecida. Essa coisa da assepsia, do espaço claro, da luz direcionada. Cada caderninho tinha um foco de luz, e o público seguia esse foco para ver o que tinha lá, como uma investigação. O público tinha de se aproximar
realmente da parede e da obra. Então, a parede clara e o ponto de luz eram convidativos. Veja que, se você põe uma parede com uma cor forte, ela pode criar uma sensação de te intimidar. Mas o claro te convida, te dá uma sensação de limpeza. Então, isso tudo foi uma conversa que aconteceu com o curador e com o artista. E essas decisões tomamos ali no espaço expositivo, experimentando, conversando e chegando às definições.
[Observação da entrevistadora] Estou notando agora, vendo com você as imagens, que as montagens das exposições têm certa unidade de proposta por curador. Pela montagem, dá para reconhecer quais são de curadoria do Eder [Chiodetto], quais são as do Edu [Brandão], quais as da Helouise [Costa] e quais são de curadoria do Tadeu [Chiarelli]. Não que as montagens, em cada curadoria, fossem iguais. Elas têm suas particularidades, mas mantêm determinada unidade.
[Seguindo com o depoimento do entrevistado] Sim, veja que interessante: o Eduardo optou, na exposição do Daniel Santiago, por colocar os monitores de LCD em uma altura maior do que na da Cia de Foto [também com curadoria de Edu Brandão] e ficava na altura dos olhos. As pessoas podiam se sentar e ver as imagens, que eram muito rotativas, de maneira mais cômoda. Aqui [na exposição de Daniel Santiago], não. Tanto é que não tem bancos. A cor tem uma mudança sutil. Mudou a parede e mudou também a parte gráfica. Mas o espaço é o mesmo, só que a gente tem esses dois subnúcleos; na do Daniel, que o Eduardo Brandão criou, essa parte dos monitores e do audiovisual, e aquela parte mais intimista, dos caderninhos. E tem uma harmonia de distribuição igual entre uma obra e outra, tem um ritmo. O espaço é delimitado, o pé-direito tem limitações, mas a cada nova exposição a gente sempre tentava fazer um avanço. Daí, obviamente, sempre se descobrem coisinhas novas, experimentando, criando. Afunila porque sua caixinha de criatividade vai se esgotando. Mas o bacana é que você sempre consegue tirar um diferencial qualquer.
Na exposição do Alexandre Sequeira [com curadoria de Eder Chiodetto], a museografia muda completamente. As obras são retratos impressos em tecidos, que foram apresentados em varais. Olha que bacana: se a gente pegar quando o projeto começou, no piso mezanino [Projeto Mezanino de Fotografia], era um corredor. Tinha uma única parede, branca, depois fomos introduzindo cor nela, a luz, e conseguimos ter até duas paredes. Aí o projeto foi para o piso Paulista, com o nome de Portfólio, e o espaço maior possibilita criar mais nas montagens das exposições. Aí de repente chega a exposição do Alexandre Sequeira, que apresenta varais com retratos de pessoas que ele fotografava e depois reproduzia essas imagens em cima de tecidos vários [lençóis, toalhas de mesa] que essas pessoas davam, daquilo que elas tinham em suas casas. Então era uma coisa meio visceral, que está ligada à foto, ao dia a dia mesmo. E que, obviamente, tinha de ser trabalhada quase tridimensionalmente. Você passeava pelo espaço e ia encontrando esses personagens, essas fotos, em escala 1:1 [um por um], com essa diversidade de texturas, de cores. Então, exigiu também um espaço limpo, claro, uma luz focada e pinçada nas imagens, para que as texturas dos tecidos, as cores e os retratos ampliados sobre eles e tal sobressaíssem no espaço.
Demos uma inovada no painel de abertura, que ficou com um formato mais arredondado, e na cor, em tom terra. Nas paredes fizemos uma cor, creme, que está próxima do branco, do gelo, mas puxa para esse amarelinho [mostra a imagem no computador]. E tinha um monitor de TV no fundo que exibia um vídeo. Então você passava por esses painéis que envolviam as fotos impressas nos tecidos e aí você descobria aquele monitor de TV um pouco mais na
penumbra, lá no fundo. Criamos uma entrada para o espaço, quase uma porta, meio de lado. Você tinha de fazer quase que um “S” para poder entrar no espaço. Essa entrada já dá a sinuosidade que você vai ter dentro do espaço, para poder ver as imagens e andar por elas. Nessa exposição do Sequeira, a gente subdivide o logotipo da exposição. A marca está destacada e o texto do curador está em planos e paredes diferentes. Isso é uma proposta que não chega a ser conceitual. Na verdade, é para você fugir um pouco, para não manter aquela mesmice no espaço. E também para se adequar à obra, porque cada tipo de obra pede uma situação. Nessa exposição, não teria como colocar obra na parede simplesmente. Era preciso ter outra parede, amparando, um volume diferente.
Se nas exposições do Portfólio fazíamos planta do espaço expositivo? Sim, nessas a gente já fazia algumas plantas, alguns estudos, e passava para o Núcleo de Artes Visuais. Seguia para o curador, ele fazia algumas observações, chegava ao formato final e já partia para a montagem.
Qual a outra exposição depois do Alexandre Sequeira? Foi a do José Frota, com curadoria do Eder também. As imagens eram escuras e a parede também. Fizemos um verde-musgo, que tinha um pouco a ver com deterioração, ruína, a temática das imagens. Assim como nas outras exposições com curadoria do Eder, tinha uma imagem maior no fundo, e também neutralizamos o piso com carpete escuro, porque, me lembro, tinha de dar peso e fugir de uma coisa clara, limpa, que te dá segurança, que você entra sem medo, não. Sabe, a penumbra, a luz baixa, a cor fechada, o carpete, o painel negro, cinza-escuro, tal, eram para te remeter à atmosfera que a obra estava retratando e trazendo para aquele espaço. A própria entrada da exposição também parece que é menor. Você tem de entrar mesmo no espaço, meio que em uma caverna. Fica muito escuro, esse verde-escuro musguento, o piso negro, a luz pinçada só nas imagens e mais nada. Olha [mostrando imagens na tela] como é bem escuro para dar essa sensação realmente. Essa expografia tentava fazer uma comunhão com o clima que as fotografias traziam, dessa oficina escura, tal, daquela igreja também destruída, daquele banheiro. É você se sentir dentro um pouco desse espaço.
Como era a museografia quando as exposições itineravam? Se a gente mantinha o que era feito aqui? Bem, a gente tinha o espaço que as instituições parceiras do Itaú Cultural, que recebiam as exposições, nos davam e a gente criava um espaço expositivo com base na proposta de montagem que tinha sido feita aqui, com a aprovação da curadoria, e adaptávamos ao espaço dado. A gente trabalhava com a planta do espaço delas. Eu lembro que na exposição da Helga [no Centro Cultural Casa da Ribeira, em Natal/RN] tinha uma parede toda de tijolinhos, então não tivemos como neutralizá-la. Mas tentamos manter um pouco do caráter do que foi utilizado aqui. Agora, há situações em que realmente o espaço expositivo não permite, como quando você não pode interferir no espaço porque ele é tombado. Eu me lembro disso em Belém, no museu [da Universidade Federal do Pará (UFPA)], que tinha passado por um restauro, onde a solução foi adaptar os painéis. Estávamos em um grande casarão, em um palácio que tinha limitações. Então era preciso tirar proveito daquela arquitetura que o espaço oferecia. Aí se faziam as adaptações possíveis e tentavam-se manter algumas coisas básicas. Por exemplo, as cores, a iluminação – com pouca ou muita luz – eram mantidas, na medida do possível, mas se fazia um layout e discutia com a curadoria, enfim. O layout da exposição daqui era usado no sentido de passar a informação para lá de dizer “olha, vamos fazer nesse formato” e avaliar para ver se tinha alguma interferência negativa ou até alguma sugestão deles, para a gente saber até onde podia ir. Mas geralmente, quando se é de produção, se tem muito o “pé no chão”, e a gente sabe até onde pode ir. Não era pedido nada muito impossível. Então, nunca teve negativa nem nada. Eu lembro que nesse palácio em Belém não tinha iluminação expositiva. Criamos umas hastes que saíam de cima do painel com uma iluminação, porque era um pé-direito alto, não era um espaço expositivo, não era um ambiente que tinha sido projetado para isso. Essa exposição pedia luz, então a gente teve de adaptar e conviver com essas hastes, que iluminaram a obra. Conseguimos manter essa proposta de iluminação daqui, um pouco dessa originalidade, dentro do possível.
As outras duas exposições foram do Jonathas de Andrade e depois do Patrick Pardini, com curadoria do Eduardo Brandão. A exposição do Jonathas tinha a parede clara, em dois tons. Em baixo era branco e em cima era aquele tom creme. Foi uma exposição difícil de fazer, no sentido de definir. Era um trabalho com acúmulo de imagens e, talvez por essa diversidade de material e de dimensões, até definir como seriam as paredes, tivemos de testar. Alguns testes não deram certo. Teve um processo um pouco mais demorado de definição, com o artista e com a curadoria. Na verdade, a gente teve de fazer um esboço, mas planificar no real, para ver se estava ok ou se precisava sofrer alteração. Não deu para projetar porque justamente tinha uma diversidade muito grande e, até talvez, a própria curadoria e o artista queriam experimentar o local, o tamanho. Eu lembro que tinha esse cartão no meio, inserido, um texto; quer dizer, por mais que a gente fizesse projeto e desenho, para concretizar tinha de pôr no espaço, de experimentar ali para ver se funcionava. Então esse jogo, esse formato que se optou por expor criando essa geometria entre foto, poema, quer dizer, por mais que a gente fizesse mil estudos, só ao colocar lá é que fomos descobrindo um pouco das cores e das imagens.
Ainda, tinha um monitor pequeno em que rolava o vídeo. A maioria das imagens puxava para o tom avermelhado. É bacana essa coisa do fundo neutro e clarinho, depois das duas paredes, uma de frente para a outra, com esses dois tons. E a altura das imagens era diversificada, tira aquela coisa do eixo, que você usa 1,45 metro na linha do horizonte e coloca tudo até lá, que cria um ritmo quase neutro. Aqui não. Acabou virando uma instalação com fotografias, não só um trabalho de fotografia. Os próprios blocos, quando se formam, também criam um movimento, eles jamais se repetem. Agora, isso é muito uma coisa do artista, a gente manteve essa parede forte de informação e fechou com outra que é uma obra mais determinante ou que vai dar destaque. Também tem uma coisa interessante, tem uma parede que interrompe essa parte mais formal de texto e de apresentação, e aí você entra. Não é nada assim como foi do José Frota, que você não tinha outro jeito senão entrar por um espaço delimitado, como uma porta. Aqui não: é um espaço convidativo e aberto.
A exposição do Patrick Pardini também teve a questão do acúmulo. As fotos de árvores da Floresta Amazônica eram em preto e branco, umas mais contrastadas, outras menos. Eram de vários tamanhos. Prendemos as fotos com percevejos na parede, que foi mantida branca, a exposição teve bastante iluminação. O chão também foi mantido original [branco]. Agora é marcante. Se você perceber, existe uma geometria. Aqui dá a impressão de que as fotos, juntas, formam letras, olha, parece um “L” [mostra a imagem no computador]. Teve um trabalho geométrico e uma preocupação em expor do curador e do artista, óbvio, de alinhar os trabalhos menores com os maiores. As fotografias ficavam na mesma linha, e acho que isso resultou nessa geometria.
O que perpassa todas as exposições pensando do Mezanino ao Portfólio? Como te falei, eu acho que foi um processo de amadurecimento de um projeto ao outro, de experimentação. Um projeto muito tímido, que era o Mezanino, mas as duas curadorias foram trazendo opções e desafios. A gente aqui, do Itaú Cultural, cenografia e produção, foi experimentando para oferecer a eles diferenciais e assim suprir um pouco as limitações de espaço. E não ficar preso somente àquela ideia de apresentar fotografia no vidro e na moldura. Tentamos, sempre, contribuir, seguir a linha da curadoria e do artista, dar o suporte necessário, buscando a unidade do trabalho e uma conexão para ter uma exposição em que o espaço e o conteúdo estivessem em diálogo. Eu acho que a busca dessa unidade foi um processo de amadurecimento, que se deu pela diversidade dos trabalhos. As propostas foram muito ricas e todos os curadores muito abertos a escutar as nossas dicas em relação às limitações de espaço e de luz. Enfim, foram projetos muito agradáveis, gostosos de trabalhar e de desenvolver.
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1 a 3. Espaço expositivo Rodrigo Braga no Itaú Cultural I Foto: Arquivo Itaú Cultural 4. Exposição de Rodrigo Braga I fachada do Museu da UFPA I Foto: Mayra Koketsu I Itaú Cultural 5 a 7. Espaço expositivo Rodrigo Braga no Museu da UFPA I Foto: Mayra Koketsu I Itaú Cultural
1 e 2. Espaço expositivo Helga Stein no Itaú Cultural I Foto: Amilcar Packer 3 a 6. Espaço expositivo Helga Stein no Centro Cultural Casa da Ribeira I Foto: Mayra Koketsu/Itaú Cultural
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1 a 4. Espaço expositivo Alexandre Sequeira no Itaú Cultural I Foto: Edouard Fraipont
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1 a 3. Espaço expositivo José Frota no Itaú Cultural I Foto: Edouard Fraipont
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1 a 3. Espaço expositivo Daniel Santiago no Itaú Cultural I Foto: Edouard Fraipont 4. Espaço expositivo Daniel Santiago no Museu da UFPA I Foto: Mayra Koketsu I Itaú Cultural 5. Exposição Daniel Santiago I fachada do Museu da UFPA I Foto: Mayra Koketsu I Itaú Cultural 6. Espaço expositivo Daniel Santiago no Museu da UFPA I Foto: Mayra Koketsu I Itaú Cultural
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1 a 3. Espaço expositivo Patrick Pardini no Itaú Cultural I Foto: Cia de Foto
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1 e 2. Espaço expositivo Celina Yamauchi no Itaú Cultural I Foto: Ivan Sayeg 3 e 4. Espaço expositivo Guilherme Maranhão no Itaú Cultural I Foto: Guilherme Maranhão
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1 e 2. Espaço expositivo Michelle Serena I Casa Andrade Muricy I coletiva Projeto Mezanino de Fotografia 2004 I Foto: Valéria Tolói/Itaú Cultural 3 e 4. Espaço expositivo Fernanda Preto I Casa Andrade Muricy I coletiva Projeto Mezanino de Fotografia 2004 I Foto: Valéria Tolói/Itaú Cultural 5. Espaço expositivo Edu Marin Kessedjian I Casa Andrade Muricy I coletiva Projeto Mezanino de Fotografia 2004 I Foto: Valéria Tolói/Itaú Cultural 6. Espaço expositivo Alline Nakamura I Casa Andrade Muricy I coletiva Projeto Mezanino de Fotografia 2004 I Foto: Alline Nakamura 7. Espaço expositivo Albert Nane I Casa Andrade Muricy I coletiva Projeto Mezanino de Fotografia 2004 I Foto: Valéria Tolói/Itaú Cultural 8. Espaço expositivo Celina Yamauchi I Casa Andrade Muricy I coletiva Projeto Mezanino de Fotografia 2004 I Foto: Valéria Tolói/Itaú Cultural 9. Espaço expositivo Edu Marin Kessedjian I Casa Andrade Muricy I coletiva Projeto Mezanino de Fotografia 2004 I Foto: Valéria Tolói/Itaú Cultural 10. Espaço expositivo Alline Nakamura no Itaú Cultural I Foto: Alline Nakamura
1 a 4. Espaço expositivo Patrícia Yamamoto no Itaú Cultural I Foto: Patrícia Yamamoto (detalhe da vitrine na foto 1)
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1. Espaço expositivo Fátima Roque no Itaú Cultural I Foto: Cia de Foto 2. Espaço expositivo Fátima Roque no Itaú Cultural (detalhe) I Foto: Cia de Foto 3. Espaço expositivo Fátima Roque no Itaú Cultural I Foto: Fátima Roque
1 e 2. Espaço expositivo Cia de Foto no Itaú Cultural I Foto: Edouard Fraipont 3 e 4. Espaço expositivo Cia de Foto na Fundação Joaquim Nabuco I Foto: Mayra Koketsu/Itaú Cultural
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1 a 3. Espaço expositivo Jonathas de Andrade no Itaú Cultural (detalhe) I Foto: Cia de Foto 4. Espaço expositivo Jonathas de Andrade no Itaú Cultural I Foto: Cia de Foto 5. Espaço expositivo Jonathas de Andrade no Itaú Cultural (detalhe) I Foto: Cia de Foto
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