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Regina Guimarães
from PVEC25Abril20
by casadaachada
O que é a liberdade nas circunstâncias que estamos a viver hoje? A liberdade (como aliás a fraternidade e a igualdade) é um conceito farol que magnetiza o pensamento e a acção das pessoas que apreciam a sua violenta luz em todas as circunstâncias. Existem pessoas encarceradas que gozam de mais liberdade do que outras que, no mesmo tempo e lugar, circulam «livremente». Neste momento, paradoxalmente, há quem se confine livremente e quem não tenha propriamente a liberdade de se confinar embora desejasse porventura fazê-lo. O que mais muda com o confinamento sanitário é o modo como vivemos o tempo. Ora nos parece alongar-se, ora nos tira o tapete debaixo dos pés. Estudar o estar é um bom programa para o confinamento, sobretudo se acharmos que o estar é mais exaltante do que o ter. Como aproveitar esta mudança radical para, sem voltar atrás, construir alternativas ao mundo de ontem? Esta mudança – que não se me afigura radical, apenas dolorosa por causa da privação da presença de amigos, companheiros, filhos, netos, irmãos, mãe – pode servir a cada um de laboratório para introduzir na sua própria vida mais apego ao presente, à palavra, à frugalidade, à festa da conversa e do passeio. E mais empenhamento nas lutas pelo trabalho que liberta do trabalho.
E a cultura, é sempre pra depois? O que tem a cultura a ver com isto? Se com esta pergunta querem a minha opinião sobre a situação dos agentes
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culturais que ficaram súbita e gravemente privados de meios de subsistência, a minha proposta é estabelecer um rendimento mínimo decente a atribuir a artistas, técnicos e afins da área da cultura, bem com a todos os trabalhadores na mesma situação de todas as outras áreas. Se com esta pergunta me estão a inquirir acerca das letras, das artes e das ciências, julgo que um interregno deste tipo é uma oportunidade de parar para pensar o que cada um e cada conjunto de muitos uns anda a fazer e como perspectiva o seu fazer num mundo mudado, espera-se que para melhor (o que não é certo, o populismo está aí à porta, tipo terrífico popup). É vital valorizar o que é gratuito para não ficar nas garras do mercado e dos mercadores.
Ontem decidi que, para não chorar baba e ranho, só muito longinquamente me iria interessar pelas reivindicações dos «trabalhadores da cultura» cujo discurso parece ser, quase unissonamente, «venha o guito de que necessitamos para que tudo fique como dantes...».