DOSSIER TEMÁTICO
Algarve Médico, 2022; 18 (6): 16
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Conversas de café - acerca da vontade de ir contra certas cartas de navegação Pedro Castelo Branco1 Professor Catedrático
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Pergunta-me o meu bom amigo Daniel: - Pedro, tu que andaste quase duas décadas lá fora, porque regressaste a Portugal e assentaste ferro no Algarve? Esta pergunta, vinda do Daniel, Algarvio de gema, homem sábio que cursou medicina em Coimbra durante os famosos anos 70/80, tinha claramente “água no bico” … Ora, como Portugueses e homens do mar, senti que a questão requeria uma resposta à altura dos nossos antepassados… Na verdade, pensei eu, nem sabes tu Daniel, as vezes que a saudade me tocou e como foi difícil continuar a navegar sem terra à vista… Mas a verdade, é que se por vezes não vi o mar de feição, outras houve que a lua estava cheia e ainda me faltavam-me as amarras e os cunhos… Mas sempre com Alexandre O´Neill em mente: “Há mar e mar, há ir e voltar…”
Anos passaram e a embarcação ficou
Foi o acreditar que, juntos, conseguíamos
pronta a navegar, obras vivas e carena
mudar até “os ventos” que me fez
bem sólidas, foi altura de atravessar o
aqui ficar e contribuir para uma causa
Atlântico à procura de um porto seguro.
tão digna e justa como é aquela a de
País pequeno, mas voltado ao mar, vi
melhorar os cuidados de saúde das
terra na foz do Mondego. Fica para a
gentes desta terra. Tenho a humildade
história a nortada que se abateu sobre
de saber ser um dos muitos marinheiros
a embarcação e me levou a rumar a
nesta nau!! Fica o reconhecimento a
sul. Assim passei pelas Berlengas, Cabo
Dona Isabel de Sesimbra e a Dom Nuno
Espichel, e quando dobrei o de São
Marque(ê)s das Beiras, atuais timoneiros
Vicente, fui bafejado pelos ventos de
desta expedição, que mesmo na
Levante. Bem sei que daquele lado, “nem
penumbra conseguem ler as estrelas…
bons ventos nem bons casamentos”, mas a bonança levou-me a entrar num estuário idílico.
hoje um filho adotivo desta belíssima região…até porque o Chico, que me
Tive mestres em Oxford, Harvard e
vende peixe, chamou-me há dias e disse:
Toronto que me ensinaram como
“ó vizinho” …
manusear os mais recentes astrolábios da ciência e de facto o rumo podia ter sido outro. Mas não foi! No Algarve encontrei gente boa, sábia e com vontade de ir contra as cartas de navegação (escritas sabe-se lá por quem…) por forma a criar um porto internacionalmente reconhecido, nas artes da cura. Qual Adamastor…
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Termino com o orgulho de acreditar ser