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3.4.2. A Luta contra a Imigração Ilegal nas “Portas da Europa”

3.4.2. A lUtA contrA A iMigrAção ilegAl nAs “portAs dA eUropA”

País tradicionalmente de emigração, a Espanha se tornou, a partir de meados dos anos 1990, um país de imigração. De todos os Estados Membros da UE, a Espanha foi o Estado que teve o maior aumento (relativo) de sua população de origem estrangeira, que passou, entre os anos 2000 e 2010, de cerca de 2% para quase 10%.

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Esse aumento exponencial indica apenas a parte dos estrangeiros que se encontram no país e não leva em conta aqueles que tentam (ou conseguem) entrar no território espanhol pelas suas fronteiras, em particular marítimas.

FIGURA 25 População Estrangeira na Espanha (1999-2009)

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 Total

748,954 923,879 1.370.657 1.977.946 2.664.168 3.034.326 3.730.610 4.144.166 4.519.554 5.268.762 5.598.691

Fonte: Padrón Municipal de Habitantes. Istituto Nacional de Estadísticas (2010) 1.86 2.28 3.33 4.73 6.24 7.02 8.46 9.27 10.00 11.41 12.00

Essa imigração tem diferentes causas e dinâmicas. A bacia do Mar Mediterrâneo é caracterizada por marcantes contrastes econômicos e sociais entre suas vertentes norte e sul. Em geral, os indicadores econômicos dos países do norte da África tiveram leves melhoras, mas a necessidade de reformas estruturais continua a ser importante. O crescimento da população supera a capacidade de criação de emprego em países nos quais a atividade econômica está cada vez mais enfraquecida. As questões de governança, incluindo a reforma do Estado e da administração pública, são os principais obstáculos para alcançar o crescimento.

A travessia marítima relativamente curta entre as duas margens do Mediterrâneo (bem como na região próxima das ilhas canárias, como descrevemos abaixo) de certa forma favorece as atividades das redes de tráfico de seres humanos e imigração ilegal.

A pressão migratória irregular que afeta a Espanha procede, contudo, não só do Mediterrâneo, como também da América do Sul, África Subsaariana, Ásia48, e em menor medida, da Europa do Leste.

O fluxo migratório proveniente da América do Sul é possivelmente o mais numeroso, mas mais difícil de quantificar já que a entrada no território espanhol é feita, em princípio, de maneira aparentemente legal. De fato, a maioria dos imigrantes da América do Sul, inclusive brasileiros, entra na Espanha com vistos de turismo, ou ainda utilizando documentos falsos (e/ ou obtidos fraudulentamente).

A pressão migratória proveniente do continente africano, ainda que numericamente menor49 quando comparada a de outras regiões é, contudo, a que mais tem chamado a atenção da opinião pública e governo espanhol – e europeu. Tal visibilidade decorre do modo pelo qual os imigrantes fazem a travessia para chegar ao território espanhol.

Como ressaltamos anteriormente, muitos imigrantes utilizam embarcações irregulares (chamados “cayucos” e “pateras” em espanhol), muitas das quais sem a menor infraestrutura e capacidade (física) para suportar o número de pessoas a bordo, como se pode ver na figura abaixo. Na maioria das vezes, tais embarcações são disponibilizadas por “passadores”, isto é, membros de redes internacionais de tráfico de seres humanos e imigração ilegal.

FIGURA 26 Tipos de Embarcação Utilizadas por Imigrantes no Mediterrâneo

Fonte: Governo da Espanha, Ministério do Interior. Balanço da luta contra a imigração ilegal, 2010.

O problema afeta principalmente a região das Ilhas Canárias e, em menor medida, para as costas peninsulares, mediante cruzamento do estreito de Gibraltar. Durante o ano de 2006, o fenômeno atingiu o seu ápice, quando um grande número de “cayucos” chegou às costas espanholas das Canárias, partindo de países como a Mauritânia e o Senegal.

48 Fluxo migratório asiático é composto principalmente de imigração chinesa e do Sudeste da Ásia (Paquistão, Índia e

Bangladesh). A imigração chinesa para a Espanha também aumentou progressivamente durante os anos 2000. Os métodos mais utilizados entrar ilegalmente Espanha por cidadãos chineses são basicamente dois: as rotas controladas pelas redes de migração ilegal e as máfias chinesas. Ano caso da imigração do Sudeste da Ásia, o principal meio de chegada a Espanha é a chegada de barco a partir de África. Os imigrantes são geralmente transferidos por via aérea a partir de seu local de origem até aeroportos africanos. Uma vez na África, eles em geral partem para a Guiné, de onde tentam fazer a travessia marítima até a costa espanhola. 49 No entanto, vale ressaltar que a população da África Ocidental responde por 3,27% de todos os imigrantes em Espanha e 6,31% de toda a imigração da África, dos quais o maior grupo é o marroquino, como indicado por números Observatório

Permanente da Imigração (2013: 62-63).

A instalação de mecanismos de vigilância nas costas mauritanas e senegalesas acabou ocasionando uma deslocação dos pontos de partida dessas embarcações cada vez mais para o sul ao longo dos anos 2000, incluindo o sul do Senegal, a Gâmbia e Guiné Bissau.

MAPA 22 Principais Rotas de Imigração Ilegal (África- Ilhas Canárias)

Fonte: Governo Espanhol, Ministério do Interior, 2010.

Outra rota de entrada ilegal de imigrantes são as fronteiras de Ceuta e Melila, cidades fronteiriças Espanholas localizadas em Marrocos (ver acima) e que se transformaram em um dos principais eixos geopolíticos da imigração Subsaariana especialmente vinda de países como o Mali, Gâmbia, Guiné, Costa do Marfim, Gana, Sudão, Libéria, Mauritânia, Nigéria e GuinéBissau.

Durante muito tempo, os migrantes tentavam atravessar as cercas que delimitam o perímetro de fronteira, primeiro em pequenos grupos e, posteriormente, em grande número e de forma coordenada. Tal abordagem (que ainda é utilizada, ainda que com menor frequência), como se pode imaginar, causa grandes conflitos entre as autoridades espanholas e os imigrantes, gerando ainda pertubações diversas à segurança e ordem pública nesses dois municípios

transfronteiriços. Com o tempo, devido ao reforço das tecnologias e outros mecanismos de controle, uma das alternativas mais utilizadas pelos imigrantes passou a ser o uso do “fundo duplo” em carros, onde uma pessoa (e/ou mercadorias) pode atravessar a fronteira escondidas dentro de veículos como ilustra a imagem abaixo.

FIGURA 27 “Fundo Duplo” de Veículo na Fronteira Hispano-Marroquina (Ceuta)

Fonte: Governo da Espanha, Ministério do Interior. Balanço da luta contra a imigração ilegal, 2010

O “fundo duplo” é mais difícil de detectar nos pontos de passagem da fronteira terrestre, a menos que se proceda a uma busca minuciosa em um cada dos veículos que entram diariamente em Ceuta e Melila. Na prática, uma operação desse tipo é algo impraticável quando se considera que, por dia, cerca de 30.000 pessoas passam pelo ponto de controle de Tamargueira (Ceuta).50

Tendo em vista a visibilidade cada vez maior da imigração irregular e a já mencionada ‘politização’ do fenômeno, a questão passou a ser integrada nos principais documentos de segurança e defesa na Espanha, como é o caso da “Estratégia de Segurança Nacional” divulgada pelo governo espanhol em maio de 201351 .

Nesse documento, onde a questão da migração é claramente abordada como uma ameaça potencial à segurança pública, o Governo espanhol indica algumas orientações estratégicas sobre a gestão eficaz dos fluxos migratórios, tais como o reforço do monitoramento e controle do acesso às fronteiras e prevenção da imigração ilegal “na fonte”, isto é, nos países de origem (Governo da Espanha, 2013: 43).

A transformação da imigração irregular em uma questão de segurança nacional não é, como observamos, apenas uma tendência espanhola, mas uma verdadeira orientação das políticas públicas europeias nos últimos anos.

50 A polícia marroquina e a Polícia Nacional espanhola trabalham em cooperação nessa região, realizando controles e inspeções de veículos conjuntamente. 51 “Estrategia Nacional de Seguridad: un proyecto compartido”, Departamento de Seguridad Nacional, Presidencia del

Gobierno, Madrid, 2013.

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