Cortes de cima, a Garrafa! Paulo Bernardo (Empresário) Daniel Pina é um homem de fé, quase todas as semanas nos últimos dois anos tem-me enviado uma mensagem a perguntar se escrevo esta semana, eu quero escrever e digo que sim, mas a pandemia tirou-me a inspiração. Não consigo entender, mas tirou, dois anos de puro sofrimento interior, onde o sorriso e a motivação têm que ser retiradas das minhas entranhas para poder motivar quem depende de mim, motivar a família, motivar os amigos, motivar os colaboradores, os parceiros de negócio, motivar quem eu encontro na rua e olha para mim de máscara e tenho que, através do olhar, transmitir algo doce e positivo. Talvez porque a minha auto motivação tem andado por níveis quase perto do zero, a escrita tem dificuldade em sair. Possivelmente não é politicamente correto assumir esta falta de motivação, ou dizer que estou farto, dizer que é difícil vir com o discurso que tudo vai ficar bem. Ninguém me vai devolver os abraços que não dei à minha mãe, as conversas com os amigos, a despedida dos que partiram, nada disso vai voltar. Estamos assustados e tristes. Eu não sou assim, mas admito que estou. Andamos como baratas tontas às voltas,
ALGARVE INFORMATIVO #322
ninguém consegue ter um discurso coerente, nem saber muito bem o que fazer. Contudo, hoje quero dar a volta, acredito que estamos a chegar ao fim deste tempo de tempestade, e, para quem me encontrar amanhã, o sorriso estará cá e vou dar o meu melhor para espalhar motivação e me motivar também. Já comecei por escrever, julgo que é um bom princípio. Não sei qual vai ser a receita, mas sei que partilhar as minhas angústias já ajuda, quer a mim que desabafo, quer aos outros que vão ver que não estão sozinhos. Hoje ganhei coragem e, com a devida autorização da família, visitei um amigo que não está bem de saúde. Demos um abraço forte, não falamos muito, trocamos mais olhares com a nossa cumplicidade. Não é uma amizade muito antiga, mas não necessita ser antiga para ser forte, ensinoume muitas coisas e ajudou-me a crescer como adulto. Hoje mesmo deu-me uma lição de vida adulta juntamente com a sua família. Levei-lhe uma prenda que tínhamos combinado beber juntos no dia em que eu fiz quarenta e nove anos, esteve guardada para quando nos juntássemos, contudo, entre vidas a correr e pandemia, acabamos por ainda não a conseguir abrir e tomá-la em conjunto. Hoje, julguei por bem que nos próximos tempos ele ficasse como seu fiel depositário, para que a possamos tomar em breve assim que ele melhorar. 106