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NOS BASTIDORES DO E-COMMERCE
COLUNISTA
GREENCOMMERCE
Números e pesquisas de todas as ordens já não dão nenhuma margem para dúvidas: é incontestável que os últimos dois anos de isolamento social imposto pela pandemia impulsionaram a intensificação do comportamento digital de forma significativa. Especialistas estimam que as mudanças suscitadas nesse período adiantaram a transformação digital em até uma década. E, apesar de especialmente benéfica para o e-commerce, essa transição nos hábitos de consumo apenas acelerou um movimento que já se mostrava exponencial.
Em todo o mundo, a economia digital registrou crescimento na casa dos dois dígitos ao longo dos últimos dez anos. No contexto brasileiro, as vendas no segmento alcançaram taxa anual composta (CAGR) estimada em 22,6%, de acordo com relatório da corretora brasileira XP. Mesmo nos Estados Unidos, que contam com um mercado mais maduro, a CARG também se manteve acima dos 10%, considerando o mesmo intervalo temporal. E a tendência se confirma a cada estudo: de acordo com o Market Review: Tendências do E-commerce para 2022, desenvolvido em parceria entre a Bornlogic e a Opinion Box, ao menos 49% dos brasileiros pretendem comprar mais pela Internet no ano que vem. necessidade de abarcar questões ligadas ao universo ESG1. Bastante conhecida, a sigla faz referência ao conjunto de boas práticas que têm como objetivo promover a sustentabilidade e a responsabilidade social.
Sob essa lente, os negócios - agora digitais - são convidados a se engajar em diversas questões, sejam elas sociais, ambientais ou econômicas. Para estar de acordo com os princípios ESG, uma empresa deve promover iniciativas nas três frentes.
Pensando em Meio Ambiente, as metas incluem proteger recursos ambientais, reduzir a pegada de carbono, priorizar fontes renováveis de energia e otimizar a gestão de resíduos. No âmbito Social, são esperadas políticas de diversidade e inclusão, ações consistentes voltadas ao bem-estar dos funcionários, coibindo casos de corrupção, discriminação e assédio, e até mesmo promovendo projetos que contribuam para a redução da desigualdade social. Especialmente marcante para os modelos digitais, o pilar de Governança que versa sobre privacidade e segurança de dados exige cautela adicional.
Iniciativas empresariais miram o ESG
Contudo, ao mesmo tempo em que a expansão do setor chama a atenção, traz novos desafios inerentes ao avanço desse modelo de negócio. Com a consolidação, vem a Nos últimos anos, os dois principais drivers da cadeia de consumo têm impulsionado o movimento rumo ao ESG: investidores e con-
Atuando desde 2010 com mercado digital, e-commerce e omnichannel, Pedro Padis é, atualmente, CEO e sócio da Gourmetzinho Alimentos, empresa especializada em alimentação infantil congelada. com histórico de head de e-commerce do Grupo Aste, coordenou grandes operações de marcas globais como New Balance, Kipling e Diesel. Ainda traz denso background em varejo, tendo passagens pelo Dia e Walmart.
sumidores, com demanda e engajamento, principalmente entre os mais jovens.
Em 2020, o diretor-executivo da BlackRock, a maior gestora de fundos do mundo, anunciou que a sustentabilidade se tornaria critério para as decisões de investimento. No ano passado, empresas com estratégias relacionadas à ESG aumentaram seus ativos em 32%. De acordo com a Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais), há mais de R$ 700 milhões investidos com base em critérios de escolha ESG.
Na outra ponta, uma pesquisa do Instituto Morgan Stanley revelou que 86% dos Millennials se interessam por investimentos sustentáveis. Enquanto isso, 60% deles gastam mais em marcas com comprometimento social, segundo dados do relatório das gigantes BoF e McKinsey. Já os nativos digitais da geração Z, quase em sua totalidade (94%), costumam defender alguma causa, estando atentos ao posicionamento das empresas, conforme mostrou outro estudo conduzido pela consultoria Le Fil.
No mercado brasileiro, gigantes do varejo presentes no e-commerce encabeçam as iniciativas mais robustas, de olho tanto nos clientes quanto nos investidores. No polo ambiental, as questões de mais destaque envolvem o cuidado com a logística de entrega e embalagens. Entre outras iniciativas, a B2W atingiu a neutralidade de carbono em suas operações, seguindo as diretrizes do Programa Brasileiro GHG Protocol. A empresa contribuiu para evitar 1,4 milhão de tCO2 de emissões por ano, além de apoiar a conservação de 1,1 milhão de hectares da Floresta Amazônica. No âmbito de Governança, para mitigar os riscos associados à violação de dados digitais, a B2W adota ainda medidas proativas, como iniciativas antiphishing e antifraude, além de um robusto sistema de monitoramento.
Exemplo de logística, operando em todo o Brasil com mais de mil pontos físicos, 18 centros de distribuição (CDs) e escritórios em diferentes estados, o Magazine Luiza realizou um estudo sobre o uso de embalagens e resíduos gerados nas operações, com ajuda da consultoria especializada Triclos. A partir de então, foi implementado um programa de tratamento e gestão com a separação dos materiais, principalmente provenientes de embalagens, como papelão e plástico, para geração de receita com a venda para recicladores. Além disso, de forma notória, o Magalu se destaca pelas ações de responsabilidade social, sendo considerada um modelo a ser seguido no que tange à igualdade de gênero. Com esforços focalizados na gestão de mão de obra, a empresa comandada por Maria Luiza Trajano tem mais de 40 mil funcionários e foi eleita em diversas ocasiões a melhor empresa de varejo para se trabalhar pelo instituto Great Place to Work. Além de abraçar a diversidade de gênero, com destaque para o conselho composto por 40% de mulheres, o Magalu anunciou recentemente o início do programa de trainees exclusivo para candidatos negros.
Como parte da reestruturação iniciada em 2019, a Via Varejo tem demonstrado que aposta fortemente em uma estratégia de crescimento atrelada ao plano ESG. No início deste ano, a gigante se uniu à Pangeia, ecossistema de negócios sustentáveis, para criar um projeto de aceleração da jornada ESG da companhia. Como primeira iniciativa, o site e o app da Casas Bahia passaram a ter a plataforma como loja sustentável oficial. A Pangeia chega ao e-commerce da Casas Bahia oferecendo diversas categorias de produtos,
como alimentos, utensílios, acessórios e cuidados pessoais, todos produzidos a partir de práticas sustentáveis por tribos indígenas da Amazônia, cooperativas rurais e florestais, artesãos e fabricantes comprometidos com a promoção de um ciclo produtivo sustentável. Além disso, todas as transações têm pegada de carbono zero, com compensação automática assegurada pela Moss, climatech pioneira e líder global na comercialização de créditos de carbono em blockchain. Isso significa que, independentemente da modalidade de entrega escolhida para receber o produto, as emissões de carbono serão compensadas, ajudando na preservação da Floresta Amazônica.
A companhia tem ainda estruturado e realizado ações de impacto socioeconômico em comunidades brasileiras, bem como de impacto ambiental, como a logística reversa, não só com a Casas Bahia, mas também nas demais marcas do grupo. Em novembro, o marketplace da empresa passou a abrigar a Feira Preta, porta de desenvolvimento para empreendedores negros. Em conjunto com a EqualWeb, lançou também o primeiro e-commerce acessível do Brasil, que possui mais de 30 soluções para pessoas que precisam de adaptação visual ou auditiva na hora das compras. No rol de iniciativas, está ainda o Reviva, programa de reciclagem que endereça mais de dez mil toneladas de materiais por ano, beneficiando 250 famílias ligadas às 11 cooperativas parceiras.
Ao analisar o tamanho, a constância e o nível de investimentos que os maiores players do mercado de e-commerce têm destinado às ações de ESG, é possível perceber a dimensão da importância que a sigla passou a ter para os negócios digitais. O mundo e, especialmente, os novos consumidores da geração Z e Millenials estão atentos às iniciativas. Intrínseca à agenda ESG, está a transparência na comunicação dos processos adotados e nos resultados obtidos. Os valores socioambientais devem fazer parte do negócio, da estratégia e da comunicação. Quando esse alinhamento fundamental falha, surgem as crises de imagem devido ao greenwashing, termo em inglês que pode ser traduzido como "lavagem verde" e consiste, justamente, na promoção de narrativas e campanhas com base em conceitos ESG que, na prática, não são aplicados.
Na hora de comunicar, é preciso clareza, transparência e fundamentação. Se a mudança de comportamento do consumidor rumo à jornada de compra digital já é incontestável, estamos diante de um movimento de avalanche que afetará todo o setor. O futuro do planeta está em jogo - e o futuro dos modelos de negócio também.