Um teto todo nosso: poesias

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a todas as poetas que guardam seus versos na gaveta às gavetas que acolheram nossos poemas como casa ao teto que construímos palavra por palavra ao ritmo das palavra que pariu nossas rimas a todas as rimas que nascem de nós rompendo o silêncio secular a todas as linhas ainda não escritas - o futuro da poesia

(Débora Porto e Mariana Porto)

Prefácio 7 Mirtes Santa Rosa Clarice errou 11 Taís Cavati Coser para viver 12 Mirtes Santa Rosa Do avesso 13 Cynthia Provedel Doce 15 Adriana Ruis Eu sou além 16 Lizandra Antunes Guerreira até o Fim 17 Tirza Benone Sabbá Gravidíssima 18 Kétina Timboni Haicai 19 Adriana Ruis #haicai 20 Lizandra Antunes Interculturalidade 21 Daiane Pereira Rodrigues Liberdade 22 Eline Simões Manifesto da lua nova 23 Taís Cavati
Sumário
Meu gato 25 Adriana Ruis Muamba madura 26 Adna Rahmeier País livre 29 Mariana Porto Poema feminista 30 Bárbara Rosa Poema sem nome 31 Flavia Carvalho Roupa no varal 33 Daiane Pereira Rodrigues Súplicas contra a saudade 34 Maria Eduarda Palharini Sussurro 36 Daiane Pereira Rodrigues Terremoto 37 Laura Bettini Totem (e tabu) 39 Laura Bettini Um teto todo nosso 42 Débora Porto Vibrissas 43 Vívian Marchezini Cunha Vó 44 Daiane Pereira Rodrigues Sobre as autoras 47

Prefácio

Caras mulheres leitoras, caros homens leitores (caso vocês aqui também apareçam), quero lhes dizer que estamos diante de emoções traduzidas, mas sem chegar ao seu grande significado, pois é difícil explicar com algumas palavras esse momento repleto e cheio de poesias e coragem. Penso que cada poesia que você vai encontrar nessa coletânea possui um novo começo para suas autoras ou mesmo é o marco zero de uma vida próspera na escrita. Elas em sua maioria nunca imaginaram que conseguiriam publicar algo criado por elas mesmas. Eu me encaixo neste lugar. Não que elas não tivessem o desejo e, para sermos mais poéticas, o sonho de serem lidas, entendidas, amadas, citadas e se possível aclamadas pela crítica, pois depois dessa publicação como boas artistas e escritoras que somos, nosso ego vai crescer mais um pouquinho e não será pecado, pois tratamos essa parte em conversas e terapias. Quando comecei as aulas da Escola de Escritoras eu ri a toa por dias, sabe aquilo que muitos dizem, que a Inteligência Artificial já sente e nos escuta em nossos pensamentos? Acho que já é real e notório.

Óbvio que, para deixar tudo mais romântico e poético, posso contar uma história cheia de emoção onde o algoritmo não interferiu, talvez falar em poucas palavras, mas seguindo as dicas da jornada das heroínas, pra tudo ficar mais impactante, entretanto não foi dessa forma poética que penso sobre a minha chegada neste lugar. Fui impactada por um anúncio digital da Escola, pensei que a

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hora era aquela (esse momento foi minha intuição dizendo, é agora ou nunca), me matriculei e decidi sentir a alegria de ser escritora.

Desde os primeiros encontros, observei que muitas mulheres foram levadas até aquele lugar por esse desejo que estava latente em experimentar, um lugar que liberta, tira nossas algemas, ou nos faz sair e deixar para trás tudo sobre o mito da caverna de Platão que estávamos vivendo de forma cíclica e eterna. O mundo lá fora para quem escreve é melhor e mais livre para cada uma de nós que resolveu ser escritora.

E cá estamos sendo escritoras, inclusive sendo poetisas. A poesia, que sempre me tocou, mas principalmente me assustou, por conseguir embaralhar minhas emoções e me fazer algumas vezes pensar por dias sobre algo, estava nascendo de dentro de cada autora e saindo para o mundo fora da caverna. Mesmo quando falamos de morte estamos vivendo, mesmo quando falamos de rupturas, tristezas estamos vivendo. Não que toda poesia fale de coisas tristes, esse entendimento é raso para uma escritora que saiu para escrever e publicar. Escrever poesia é ser liberta, é estar solta e desprendida. Não precisamos de sonetos alexandrinos para sermos escritoras poetisas. Precisamos apenas deixar nosso desejo de emocionar através das palavras fluir. Viver é a escolha de cada escritora que está nessa coletânea, e em cada aula que tínhamos nos era dito, liberte sua expressão, sua coragem, sinta sua liberdade que tudo fará sentido. Não precisamos de estereótipos de como é uma escritora. Devemos ser Escritoras. Não existe fórmula, existe a coragem de viver e falar em voz alta como um mantra, eu sou Escritora. Viver escritora faz sentido. E esse sentido que era dito de maneira simples, corriqueira e com muito afeto, é o que você vai encontrar em todas as páginas deste livro dedicadas à poesia.

Somos Escritoras Poetisas e esta constatação é o que faz sentido para nossa liberdade.

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Clarice errou

Tudo no mundo começou com um sim.

Menos para mim, que comecei com um não.

Afinal, eu não sou todo mundo, já dizia minha mãe.

E por isso mesmo ela disse não ao meu pai naquele fatídico dia em que fui concebido.

Depois, não à ideia de ter um bebê e tomou uma pílula do dia seguinte.

E já que ela não funcionou, minha mãe gritou um não bem forte e fez um aborto, bem, tentou ao menos.

Aí acho que de alguma forma o não foi meu mesmo. De alguma forma decidi não ir embora.

E cá estou, o não encarnado.

Clarice errou, nem tudo no mundo começou com um sim.

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teto todo nosso:
Um
poesias

Coser para viver

A cidade me rasga com seus ônibus cheios com sua desesperança com todos os seus bloqueios

Não me permite viver

Não me permite crer Só me faz padecer

Não quero mais apenas ser Quero viver

Quero ressurgir e reviver

Vou me costurar

Vou me opor e alinhavar

Coser

Fazer chover e acontecer

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Do avesso

Contundentes tuas falas

Me desarmam bem no ato

Tão sublime tua alma

Me traduz de imediato

Calo sempre no seu choro

E te roubo eterno amor

Quando acolho calmamente

E legitimo a tua dor

Me revira pelo avesso

Me tirou qualquer sossego

Nunca mais eu embruteço

Contigo desenlouqueço

É a mulher da minha vida

Um clichê já tão banal

Me coloca no meu prumo

Seu pra sempre visceral

Ambivalência

Cynthia Provedel

Volumosa tua fala

Tão vazia de sentido

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De um ego que transborda

Tão escasso que faz frio

Te suplico intenção

Mas te nego abertamente

Me arranca atenção

Te imploro lentamente

É uma sombra que reluz

No vácuo de sua presença

É ausência que reduz

Confiante em minha descrença

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Eu amo comer doce

Pois ele me enriquece

O sabor me aquece

E a ansiedade desaparece

O doce é fágico

Um sabor de infância

Me recorda um mágico

Ao trazer a tolerância

O doce engorda

Ao mesmo tempo consola

Uma dor que assola

E o corpo transborda

Doce

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Eu sou além

Você me enxerga em tom pastel

Mas, meu bem, eu sou cor viva

Você me chama de princesa

Mas, meu bem, eu sou rainha

Você me diz que eu sou musa

Mas, meu bem, eu sou a artista

Você acha que eu sou a realidade

Mas, meu bem, eu sou a expectativa

Pois eu sei que você, meu bem

Você me subestima

Mas fique sabendo você

Que a dona do mundo sou eu

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Guerreira até o Fim

A vontade de viver era mais forte.

Dores, doenças, aparelhos de UTI, entubação, extubação... A tudo isso ela era submetida e passava pelas difíceis e dolorosas provações, com a força de uma guerreira que a tudo vence e a tudo resiste.

Como se dissesse às doenças: “Já venci. Vão embora. Saiam daqui, pois tenho muito para ver e viver e muitos lugares para ir.”

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teto todo
Um
nosso: poesias

Gravidíssima

Quarta-feira, 10hcg.

Segunda-feira, 2526. Gravidíssima.

E foi assim que a enfermeira disse no telefone.

O iogurte pastoso diário estava intragável nos últimos dias. Fez sentido.

O pai? Festejou e teve medo de reagir feliz sem saber como me sentiria. É o teu corpo.

Como me sentia? De biquíni na praia eu pensava que tinha uma célula querendo ser gente.

5 semanas de gestação. Tão pequenininho. Uma cólica imensa.

Um imenso grito de madrugada em lágrimas também.

Porque, de algum jeito, em alguma profundeza, a gente sabe que já morreu.

Sabe? A vida e a morte são sempre esse diálogo.

Por que seria diferente agora?

É que agora é o diálogo presente no meu corpo.

Gravidíssima.

No útero no mundo, caminho. As águas salgadas do rosto são as mesmas que estão sob meus pés.

Sorrio pro sol.

Porque, se for menina, se chamará Marina.

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Perdão é silêncio

Que invade fundo a alma

E traz calmaria

Haicai

Adriana Ruis

Plantar as sementes

E colher futuramente

É meu objetivo

20 Um teto todo
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#haicai

Você me prometeu a lua Sem perceber que eu sou o sol Que infortúnio…

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Interculturalidade

De braços abertos diante do mar de Guaratuba e a sombra toca o rio Paraguai

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Liberdade

Ela deitou e sentiu a gravidade, todo o peso do ar ao redor

Pouco a pouco, foi sendo sugada pela terra, ainda que imóvel estivesse

Ali ficou, num tempo sem cronômetro

Quando se deu conta, já nada havia para dar

Ela já não tinha mais seus limites, fazia parte do todo para além das montanhas

E, assim, se tornou livre

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Manifesto da lua nova

Lua Nova em Virgem Lua Nova em mim no meu ciclo no meu momento intenciono fértil estou gesto meu poder para parir meu propósito Me conecto com o primordial com o feminino com o manifesto e não manifesto sei o que que quero sei o que sou estou pronta para o agora a verdade reside em mim no meu mais essencial ser a verdade é que eu sou e que todos somos um me visto com minha história e sei reconhecer meus valores eu enxergo para além do que parece ser sempre foi assim conectada com a intuição

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evoluindo e construindo transformando e amando

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e o poder da visão caminho seguro colo afetuoso

Meu gato

Adriana Ruis

Meu gato é um doce

Ele é amável

Carinhoso e domável

Manso e delicado

Eu o amo demais

E ele me retribui

Com o seu ronronar macio

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Muamba madura

Raimunda chegou na rodoviária

umas 3 da tarde o reflexo no piso do céu nublado

quase cegando e anulando a luz do saguão de embarque

usava uma legging, por cima uma saia e uma camiseta azul usava também um casaquinho contorcido na axila garrado na parede das costas

alta, gorda a sapatilha margeando o topo do pé os olhos rodeados por uma sombra azul bebê blush e batom rosa

denunciavam a peculiaridade morando no detalhe

sentou do meu lado no sofázin do saguão entre encontros e despedidas ela olhou pra mim e começou a conversar

“oi”

“oi, tudo bem?”

“tudo. cê vai viajar?”

“sim, eu vou. E você? também vai?”

“sim. eu vou pra Santa Catarina. Você também vai pra praia?”

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“não, eu vou pro interior de São Paulo”

“mas você já foi pra praia?”

“já fui e já morei, gosto muito do mar”

“mas a viagem que eu vou não dá tempo de ficar. é só ir lá pra Itajaí e entregar essas mercadorias. não dáa tempo de ir ao mar”

“tenta arranjar um tempo, vale a pena”

“vou tentar. acho que dessa vez vai dá certo”

“e você vai sozinha?”

olhou para os lados, pra baixo, começou a cutucar uma ferida no braço

“dessa vez eu vou”

“entendi. com quem você ia antes?”

“com meu marido, mas dessa vez ele não pode vir.”

“entendi”

Sorriso de canto. Voltando a cutucar a ferida.

logo em seguida anunciaram meu embarque me ajeitei na costumeira poltrona da frente descansando a mente nas paisagens

chegando de manhã ao meu destino pedi um café quente observando uma inquietação incomum na televisão

“Foz do Iguaçu”

ouvindo esse nome pensei

“lá vem, vamos ver como minha cidade entrou para a história desta vez”

“o cheiro estranhou os motoristas do ônibus. Incomodados, pediram para revistar os sacos grandes que pareciam cheios de roupas. ao abrir um dos sacos, perceberam o peso a mais. vasculhando um

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pouco mais, sentiram alguns pedaços de roupas molhados. puxaram. a cor vermelho escura não negava o que poderia ser. em seguida, eles pediram pra atendente do guichê de vendas ligar para a polícia. a dona da bagagem ficou nervosa, aflita. Quando os policiais chegaram ela já sabia o que levava ali. O corpo do próprio marido. segundo informações seguras, a mulher matou o homem com 17 facadas e iria levar o corpo para Itajaí”

O close na cara da mulher não me deixou dúvidas ali estava Raimunda envergonhada, mas sem coragem de fugir ficou para contar sua história sua versão da morte que aconteceu antes das facadas a morte de si mesma cravada na pele da memória de tantas Raimundas algemadas e calejadas pela tentativa de ver o oceano ao menos uma vez.

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País livre

se esse país fosse livre diria que odeio o diferente que o certo é a gente que vai na missa aos domingos reza, canta e se confessa nas não se arrepende

se esse país fosse livre daria palmada nos meus filhos se me questionarem e não me obedecerem quando mandá-los ir na missa aos domingos rezar, cantar e se confessar sem necessidade de se arrepender

se esse país fosse livre mandaria prender o vizinho e a sua esposa o carteiro, o mendigo que mora na rua de casa e toda essa gente que não vai na missa aos domingos que não reza, não canta e não se confessa mas que se arrepende

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Poema feminista

E mesmo que você queira por a culpa em mim por ser mulher a culpa não é minha a ciumenta a louca a controladora a mandona a surtada

não tem culpa da sua criação machista e muito menos por você ser quem você é

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Poema sem nome

As filas enormes, os carrinhos cheios

Daqueles itens que eu sequer sabia dizer o nome

“supérfluos”, era como minha mãe dizia

Para tudo que não era farinha, Feijão, arroz ou macarrão.

Então supérfluo

Para mim, era tudo de gostoso na vida

Tudo que não tinha

Na nossa casa.

A mulher estava toda pintada

A bochecha rosa parecia ter levado um tapa

Aquilo devia ser bonito

Mas ela era muito feia

E sua boca se franzia pra baixo como

Se houvesse um peso enorme nas pontas

Olhou pra mim como quem olha pra um saco de lixo fora do lugar

Me disse:

“menina me ajuda com essas sacolas”

Eu estava mesmo parada

Hipnotizada

tentando encontrar

O sorriso perdido naquela cara rosada

Não era possível não haver um sorriso

Na cara de alguém que ia levar tantos supérfluos pra casa.

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Voltei a empacotar

Ela estava com pressa e com raiva

Apesar de cheirosa

Como alguém cheiroso pode ter tanta pressa?

As flores nunca tem pressa.

Quando me chamou para levar para ela

As sacolas todas até o seu carro

Fui

Não que eu tivesse como escolher entre ir

Ou não ir

Eu estava ali para obedecer

E ganhar uns trocados, quem sabe.

Enquanto ela colocava tudo

No porta-malas

O seu celular tocou

Devia ser algo importante

As pessoas importantes sempre têm pressa, Lembrei de ter ouvido minha mãe dizer um dia.

Fez um sinal com as mãos para mim, sem largar o telefone

“Coloque tudo logo aí dentro, anda”

Coloquei.

Sentou-se ao volante, ligou o carro

Os pneus cantaram

Não me disse tchau, não me agradeceu

Quando eu já não podia ver o seu carro

Sorri

Enquanto acariciava a barra de chocolate suíço

Aconchegada e quente perto do meu umbigo.

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Roupa no varal

em dia de chuva

molham-se lembranças de uma tarde em que fomos poesia

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poesias

Súplicas contra a saudade

sozinha e vulnerável abafo os meus gritos e lágrimas afogando meu rosto no travesseiro mesmo que não haja ninguém para escutar minha melancolia arrasta essas memórias acinzentadas de carinhos não mais sentidos adensam e afundam no meu corpo eu grito abafando essa saudade rasa e morna de coisas que não vivi nem senti onde eu apenas sonhava almejava e romantizava enganando a minha feliz cegueira na fantasia de queimar meus pensamentos eu acendo o cigarro na beira da janela olho para as estrelas que cobrem o céu nessa madrugada (cética ateia e confio não por misticismo, mas por comodismo rezo para Deus para a Lua para o Eclipse para o cheiro que a noite me traz que finalmente me levem para longe de você grito

me afastem finalmente desse véu que persiste e me assombra

peço me ajuda a carregar esse coração tão pesado

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já me rasguei demais tentando me curar sozinha

ó Deus por que não me escutas?

talvez eu precise gritar para fora do meu travesseiro.

nosso: poesias

36
teto
Um
todo

Sussurro

O céu dentro de mim sus sur ra

o doce momento da visita

poesia da alma no instante do beijo

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Terremoto

Era o fim e seguia o silêncio da sua voz derretido seu desmando seu retorno e riso devagar e sempre demanda revolta

invenção de desculpas

Resisto ao risco de ser rendida de olhos vendados evitando açúcar calma atenção

A vida é tensa lá fora mas intensa dentro e somos abrigo

apesar das brigas bote salva-vidas

Na exaustão do afogamento embora com sede

Cedo

38 Um teto todo
nosso: poesias

Agora aqui em terra firme mais firme que sempre em paz sob seu abalo sistemático sísmico sentido de perto reverberação da distância quilométrica retaliando minha boca como fonte de desgosto sacrificando minha pele para expiar espelho

Parece um terremoto tremer incertezas de consolo Medida de segurança para o temor de amar demais

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Totem (e tabu)

brasil, 2022

nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam, não

há uma corrida por poder

- aquele que falta apesar da luta de minorias por representatividade política e justiça social ao longo da brutal Históriacontra a ofensiva elitista torpe - indisposta a abrir mão daquilo que tomaram por coação -

a besta do fascismo que parecia moribunda desde o século XX estava, de fato, fazendo escola formando novos rebentos

sedentos em manter privilégios à força

some of those that work forces, are the same that burn crosses

é bastante tentador aos súditos do hegemônico eugenista pensar que estamos calibrados numa balança

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Um teto todo nosso: poesias

cada um pesando do seu lado como um cabo de guerra entre corpos da mesma categoria de luta temo - porque até Themis há de concordarque não há equilíbrio nem isonomia não há polarização entre câncer, vírus mortal, bactérias resistentes e um corpo cansado àqueles que confundem hóspede com hospedeiro ciência, política pública e justiça social assim se mata um inimigo mortal

me ajude tenho filho e estou com fome aceito pix

uma placa não está na sala de jantar está na esquina sob sol de 12 empunhada por um pai na casa dos 30 com um menino debruçado nos ombros sem casa, com 5 ou 6 anos mas as pessoas da sala de jantar são ocupadas em nascer e ~matar na orla no olympo os templos de mármore ventam bandeiras verde amarelo azul e branco os pobres balançam bandeiras coloridas de partidos que nos partem ao meio 50 milhões para cada lado do mar ao serrado

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meninada miséria suada segurando o mastro da própria desgraça pela merreca de 50 conto carregam o conselho

é melhor morrer em pé, que viver de joelhos

na corda bamba os militantes rezam contra militares - não só por nóspor milhares e milhões

amanhã vai ser outro dia

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Um teto todo nosso

Débora

um teto todo nosso com muitas janelas coloridas para sempre olharmos de dentro para fora e para sermos vistas e ouvidas e lidas e portas bem largas sempre abertas para todas que quiserem entrar e sair nunca precisarem da permissão de ninguém

todas somos donas dessa casa construída com palavras com poemas e com sonhos

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Vibrissas

A janela do escritório está aberta. O sol gentil me aquece suavemente. A brisa move minhas vibrissas.

Me lembro de um tempo que não vivi, Tão distante, Selvagem, Quando ainda era uma onça.

Hoje, gata, me resta ver o parque vizinho E assistir ao cotidiano dos outros apartamentos Por detrás da tela de proteção.

44 Um teto todo nosso: poesias

Nasceu em terra guarani e não sabe ou denota sua pele de negros e indígenas distantes quando não usa o canto ancestral ou a mágica erva

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sobre as autoras

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Adna Rahmeier

tem 33 anos e mora em Foz do Iguaçu, descobriu a escrita na escola com 8 anos. Sempre escreveu. Publicou

poemas em uma revista de cultura local e fez vários varais de poesia. No momento está terminando de organizar um primeiro livreto de poesia feminista e escrevendo seu primeiro romance.

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Adriana Ruis

é paulistana, funcionária pública municipal, poetisa com co-autoria em algumas Antologias Poéticas, como “A Arte de Poetizar”, “Horto Poético”, “Sentimentos que nos movem”, “Primavera, O Desabrochar da Poesia”, “Falando de Amor e Dor”, “Universo da Poesia – vol. II”, “The Circus”, “Brincadeiras de Criança”, “Um mar de saudades”, dentre outras.

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Bárbara Rosa nasceu em 1991 na cidade de Franca/SP. É formada, mestre e doutora em Serviço Social pela UNESP. Graduada em Filosofia pela UNIFRAN e doutora em Psicologia pela USP. Atualmente, pós-doutoranda no curso de Memória Social pela UNIRIO. Publicou seu primeiro livro teórico “Carolinas, catadoras de sonhos” pela editora Quintal. Divulga textos semanalmente no Instagram @ barbararosaescritora

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Cynthia Provedel

é doutoranda em Estudos Interdisciplinares pela Universidade Anáhuac (México). Coautora dos livros

“Comunicação em Cena”, “Ensaios sobre Comunicação com Empregados” (inglês e português) e “Comunicação e estudo e práticas de Compreensão“. Estudiosa das temáticas de psicologia, ancestralidade e sagrado feminino. Amante e praticante das artes manuais, em especial argila e tricô. Aprendiz de yoga, meditação e dança cigana. Encontra também na escrita sua força criativa, em especial na poesia.

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Daiane Pereira Rodrigues

é de Colombo, Paraná. Escreve desde que tem memória, mas publicou primeiro como tradutora e só depois começou a publicar suas próprias obras. Já foi premiada na Espanha e escreve ora em português, ora em espanhol, ora misturando as duas línguas. É mestre em Letras e trabalha como professora de língua e literatura. Também é mãe de Miguel Ángel, nascido no período em que ela viveu em Assunção. Vive flertando com as artes visuais, mas sempre acaba preferindo o conto ou a poesia.

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Débora Porto

é mestra (UFRGS) e doutora (PUCRS) em Letras, com pesquisa sobre a escrita de mulheres.É editora-chefe da Editora Polifonia e da Escritoras Brasileiras. Desde 2012, trabalha com oficinas e cursos sobre escrita criativa e criação literária. É autora do livro “As dores do parto e outros poemas”, organizadora de vários outros e diretora da Escola de Escritoras.

54 Um teto todo nosso: poesias

Eline Simões

nasceu no Rio de Janeiro (RJ). É bióloga (UFRRJ) e gestora ambiental (CEFET-RJ), com mestrado e doutorado em Geoquímica Ambiental (UFF). É professora de Ciências na Secretaria de Educação da Prefeitura de Nova Iguaçu (RJ) e pesquisadora nas áreas de Meio Ambiente e Saúde. Para além dos textos acadêmicos, a escritora se aventura na prosa e na poesia, como forma de materializar suas impressões e sentimentos mais íntimos. Atualmente, está trabalhando no relato diário de suas experiências como mãe e mulher em processo de reinvenção de si mesma.

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Flavia Carvalho nasceu em Araraquara e passou por muitos lugares até pousar em Belo Horizonte, onde deu cria. Economista e pesquisadora, escreve no pensamento mais que no papel. Há dois anos resolveu aterrissar também as palavras, e agora prepara o seu primeiro romance.

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Kétina Timboni

nasceu em Porto Alegre e hoje está radicada em Santa Catarina. É mestra em Estudos da Linguagem pela UFRGS, professora leitora de língua portuguesa da Universidade e Estudos Estrangeiros de Pequim e mãe da Marina.

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Laura Bettini é uma mulher de palavra e de luta. Mãe atípica profissional, feminista brava, escritora de vingança e roteirista sonhadora. Tentou jornalismo, marketing, produção cultural, produção audiovisual e não foi feliz. Voltou para a escola, foi de aluna à professora e continua nesse balanço. Embalada na rede de mulheres e no compromisso com a maternidade amorosa, acredita em poesia e revolução.

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Lizandra Antunes

é da geração de 1998 e tem a cidade de Guarulhos/SP como o lar de seu coração. Professora por formação, escritora por vocação e paixão, usa as palavras para expressar os universos que habitam dentro de si desde que se entende por gente. Formada em Letras desde 2019, escreve poesias do mesmo jeito que fala: rápida, sincera e profundamente. Sua grande alegria é saber que seu texto tem impressão digital. Atualmente suas produções estão publicadas no instagram @essenciaemverso e sua nada ambiciosa meta para 2023 é concluir um livro infantil, um livro de poesias, [pelo menos] um livro de contos e finalmente tirar seu romance da fase de planejamento. Ah! E, é claro, além de tudo isso, ainda chegar ao final do ano linda, bela e recém-casada com o amor de sua vida (provavelmente a parte mais emocionante de todas).

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Maria Eduarda Palharini

é um caos de palavras e paixões desenfreadas. Maria Eduarda Palharini, nascida em Porto Alegre, é estudante de Políticas Públicas na Faculdade Federal do Rio Grande do Sul (futura estudante de Letras). Maria é apaixonada pela vida e sua desordem, mas por meio da poesia, da palavra, da fotografia, da arte, do corpo e sua linguagem acabou encontrando a sua misteriosa ordem. É poetisa, modelo e fotógrafa e no meio do caos vai encontrando a sua prosa.

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Mariana Porto

nasceu em Gravataí (RS). É graduanda (PUCRS) em Letras – Língua Portuguesa e estagiária na Escola de Escritoras. Escreve poemas e contos com enfoque especial na vivência sáfica, em uma tentativa de trazer ao mundo tudo aquilo que um dia teve a necessidade de ler.

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Mirtes Santa Rosa

é Publicitária formada pela UCSal com Especialização em Comunicação e Gerenciamento de Marcas pela

FACOM – UFBA. Escreve crônicas e opiniões sobre diversos assuntos. Apaixonada por romances e um bom debate sobre questões sociais e democráticas. Escreve semanalmente no portal de cultura SoteroPreta em Salvador. Atualmente está refletindo sobre sua escrita e os diálogos com suas vivências diárias.

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Taís Panapaná

trouxe para seu nome a metaformose que vive em si. Nascida com a mudança vinda de dentro, desde então vive um transfomar constante de tudo que sente, vive e é. Ela que já escreveu peças jurídicas e teses acadêmicas, foi sacudida pela maternidade e descobriu em ser mãe o seu melhor papel; e foi assim que trocou as palavras duras e estruturadas pela escrita que vem do âmago do seu ser, que liberta o turbilhão de sentimentos que lhe habitam e que cada hora sai de um jeito, conforme as suas inúmeras transformações. Seu livro na gaveta é o mais incrível, pois é sua vida vivida com muitos capítulos, dores, curas e reviravoltas, que um dia ainda vai compartilhar por inteiro, mas que por enquanto coloca pedaços em seu instagram @tais.panapana.

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Tirza Benone Sabbá

tem um casal de filhos: Amanda e David. Dá parabéns, é formada em Direito, atua na área jurídica como servidora pública, estudou inglês e francês. Gosta de tudo um pouco: fotografia, arte, decoração, ama viajar, escrever e tudo o que eu puder descobrir e aprender.

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Vívian Marchezini Cunha

nasceu em Belo Horizonte (MG). É mestra (UFPA) em Psicologia, psicoterapeuta e mãe do Francisco. Escreve poesia e crônica, e está se descobrindo contista. Nas redes sociais pode ser encontrada com o @vivimarchezini_psicoterapeuta .

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Um teto todo nosso: poesias

Texto revisado segundo o Acordo Ortográ co da Língua Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no Brasil em 2009.

Projeto Gá co Débora Porto

Capa e diagramação Mariana Porto

Revisão Débora Porto e Mariana Porto

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Elaborada pela Bibliotecária Janaina Ramos – CRB-8/9166

T347

Um teto todo nosso: poesias / Organizadoras Débora Porto, Mariana Porto. – Porto Alegre: Polifonia, 2023.

49 p.; 15 X 21 cm

ISBN 978-65-999573-1-4

1. Poesia. 2. Coletânea. 3. Literatura brasileira. I. Porto, Débora (Organizadora). II. Porto, Mariana (Organizadora). III. Título.

CDD 869.91

Índice para catálogo sistemático

I. Poesia : Literatura brasileira

Todos os direitos reservados às autoras.

www.editorapolifonia.com.br

As opiniões expressas nesta obra são de responsabilidade exclusiva das autoras

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Um teto todo nosso: poesias

Um lugar que liberta, tira nossas algemas, ou nos faz sair e deixar para trás tudo sobre o mito da caverna de Platão que estávamos vivendo de forma cíclica e eterna. O mundo lá fora para quem escreve é melhor e mais livre para cada uma de nós que resolveu ser escritora. E cá estamos sendo escritoras, inclusive sendo poetisas. Escrever poesia é ser liberta, é estar solta e desprendida. Não precisamos de sonetos alexandrinos para sermos escritoras poetisas. Precisamos apenas deixar nosso desejo de emocionar através das palavras fluir. Viver é a escolha de cada escritora que está nessa coletânea. Não precisamos de estereótipos de como é uma escritora. Devemos ser Escritoras. Não existe fórmula, existe a coragem de viver e falar em voz alta como um mantra, eu sou Escritora. Viver escritora faz sentido. E esse sentido, dito de maneira simples, corriqueira e com muito afeto, é o que você vai encontrar em todas as páginas deste livro dedicadas à poesia.

Mirtes Santa Rosa

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