Cenografia Dinâmica: Iluminação em Festas de Techno

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CENOGRAFIA DINÂMICA:

ILUMINAÇÃO EM FESTAS DE TECHNO


autora fê ferreira frança orientadora prof.ª me. maria cristina da motta oliverio curso de arquitetura e urbanismo TFG 2021.1

CENTRO UNIVERSITÁRIO BELAS ARTES DE SÃO PAULO



agradecimentos


F

oi uma jornada complexa até agora, não só a graduação, mas a própria vida em si. Não é fácil se sentir diferente o tempo todo, não se sentir bem com o corpo físico em que nasci e desde a infância esse desconforto se tornar, progressivamente, uma aversão a mim mesma. Eu não estaria aqui, viva até mesmo, se não fosse a possibilidade de transicionar e agradeço de coração à todos que me apoiaram até o momento. Primeiramente, aos meus pais, que me forneceram a melhor estrutura familiar que uma criança poderia receber, regada do mais puro amor e carinho, afeto físico sempre foi uma realidade em casa e isso me fez uma pessoa que, com muito orgulho, não se retém de demonstrar esse afeto, eu tenho muito amor pra dar e isso eu aprendi com eles. À Maisa Dias, minha querida amiga, que esteve comigo durante os passos mais importantes da minha curta vida adulta, numa entrada tímida a minha transição ela me entendeu e me incentivou e quando a coragem faltou de me assumir pra família ela foi a primeira que me apoiou. Não só emocional foi esse apoio, tantas conversas estimulantes sobre o mundo das artes, arquitetura e tecnologia que tivemos, tantas referências incríveis, sem as quais esse trabalho nunca existiria. Devo muito à ela. Dentro do tópico sobre conversas estimulantes, tenho muita gratidão pelos professores que tive o privilégio de conhecer, conversar e até mesmo chamar de amigos na Belas Artes, em especial, à minha orientadora Cris Motta, nossa conexão foi quase que imediata, sabia que através de experiências similares e de um interesse real às não tão similares ela seria o meu Virgílio de Dante nessa caminhada. Minha gratidão também às artistas incríveis que fizeram parte desse trabalho, as ilustrações da capa de Victória Novais e as de apresentação dos capítulos pela genial Paula Rueda, outra amiga de verdade, que em pouco tempo de amizade conseguiu estender a mão pra mim em diversos momentos quando achei que mais ninguém estaria por mim. E por último, eu agradeço à todas as pessoas transgênero, transexuais e travestis que vieram antes de mim, a luta delas, muitas vezes regadas a sangue, foi o que possibilitou que eu pudesse ser eu nesse ambiente, extremamente elitista e normativo, que é a academia. Tenho intuito de que com o meu privilégio da graduação, eu possa pagar essa dívida com as que precisam através do exemplo da possibilidade e prosperidade da nossa existência, já para as que perderam a vida durante suas próprias caminhadas, ficam minhas preces e o meu mais sincero muitíssimo obrigada!


O objetivo desse Trabalho Final de Graduação será realizar, em formato de monografia, uma pesquisa, sobre como a luz pode ser um veículo para mudar a percepção do usuário, de espaço e até mesmo realidade, passando pela suas aplicações ao longo da história e dando enfoque em como ela é usada hoje, em festas de techno, criando, junto da música, uma experiência visual e imersiva, quase que psicodélica para o frequentador. Tal pesquisa irá culminar em um projeto de cenografia e iluminação para um evento, cujo intuito será realizá-lo como experiência visual dessa pesquisa a ser desenvolvida no formato de uma videoinstalação virtual em 3D.

Rewsumo

Palavras-chave: Arquitetura sensorial; Luz; Techno; Cenografia; Arte Digital.


abstract The objective of this present work will be, in form of a monography, research about how light can be a vehicle to change the perspectives of a user of space and even reality, going throught its applications along history and focusing in how it could be use today in techno parties, creating, along with music, a visual and immersive experience for the party goers. The research will culminate in a set design and lighting project for a event making it as an visual experience of this research to be developed in the format of a 3D virtual video installation. Palavras-chave: Sensorial Architecture; Light; Techno; Set Design; Digital Art.


Introdução

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1. luz: “matéria” mutável

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2. contextualização histórico-cultural

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2.1. A LUZ E O SAGRADO

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2.2 A LUZ E A CIÊNCIA EM CENA

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3. o techno 3.1. O MOVIMENTO

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3.2. FESTIVAL DE SENSAÇÕES

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4. análise e experimentação 4.1. ANALISES - Lotus Dome - James Turrell para Museu Jumex - Formation Tour

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4.2. EXPERIMENTAÇÃO O LOCAL INSOLAÇÃO LEGISLAÇÃO SETORIZAÇÃO PLANTAS CORTES PERSPECTIVAS MEMORIAL DESCRITIIVO RENDERIZAÇÕES

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CONCLUSÃO

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REFERÊNCIAS

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SUMÁRIO


“A arquitetura é o ato erótico supremo. Leve-a ao excesso e ela revelará tanto os vestígios da razão quanto a experiência sensual do espaço. Simultaneamente.” (TSCHUMI, 1978)

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INTRODUÇÃO

A

ansiedade, o coração palpitando, os olhos cobertos de glitter, mareados pela fumaça de cigarro ou pela excitação? A cada passo na escada uma nova informação se desdobrava; pessoas as quais nunca vistas antes, as roupas, as maquiagens, os adereços; à dobra de uma quina a luz finalmente se abriu, com ela o espaço e sua orgia dionisíaca de corpos, cores, cheiros e o som, o som não era novidade, já conhecia a música eletrônica a tempos, artistas como New Order e Kreftwerk, tão notórios na cena desde os anos 1980 já faziam parte do meu repertório, assim como os que os sucederam no movimento French House dos anos 2000, Daft Punk, Justice, fizeram parte direta da minha infância, o que não fazia ideia era da existência de um local, que além de apreciar as músicas que escutava, juntava tantas ideias políticas, artísticas e pessoas, que até então, nem eu sabia que me identificava tanto. Sempre soube que fui diferente, desde que consigo me lembrar, os primeiros pensamentos auto existenciais foram questionamentos, o porquê eu era assim, o porquê das roupas que usava, o porquê dos meus comportamentos serem tidos como errados sendo que eram tão naturais pra mim. Nada fazia sentido, até conhecer o techno e dentro dele ver que era completamente possível ser o que sempre fui, mas tinha medo de ser, no techno foi onde conheci minha primeira pessoa trans e no techno tive a liberdade de me tornar a mulher que sou hoje. Parece piegas trazer como tema de Trabalho Final de Graduação algo tão pessoal, mas não teria trazido se não tivesse percebido uma ligação

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com o curso de Arquitetura e Urbanismo, arquitetura é política, arquitetura é arte, arquitetura é sensual e arquitetura é espaço e luz. É política assim como ser travesti no Brasil, o país que mais mata pessoas trans no mundo segundo dados do ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), por si já é um ato político, mas no contexto do techno tal ato se torna mais forte, políticas internas criaram o trans free como estimulo para mais pessoas trans frequentarem as festas, juntando isso com uma amálgama de corpos dissidentes e marginalizados há tolerância zero para qualquer tipo de agressão, assédio ou preconceito, tornando esses espaços em refúgios urbanos, locais seguros, para minorias sociais em meio a uma sociedade intolerante. É arte assim como em tais refúgios urbanos ideias florescem e um espaço livre, sem pré-julgamentos, se cria para o desenvolvimento de performances, vídeo-performances, músicas e artes visuais. É sensual como a luz que contorna os corpos seminus em movimento e a pulsação que faz com que cada fibra do nosso organismo não permaneça estática. E é espaço e luz como numa festa de techno a própria luz constrói o espaço, essa talvez seja a maior beleza arquitetônica do techno, sem a luz não há techno, há apenas lugares degradados, fábricas abandonadas, galpões inutilizados; a luz revitaliza esses espaços criando novas realidades, e é isso que esse trabalho irá abordar. Pode-se usar como justificativa que a música, assim como toda forma de arte, sempre foi um veículo para questionar, disseminar ideias e com isso unir tribos, nos anos 1970, o punk declarou que qualquer um podia fazer música e levantou a bandeira de 14


que tudo bem ser estranho, tudo bem não se encaixar, esse caminho questionador também foi seguido pelo techno, nos anos 1980, que ao colocar no centro da ação as baterias eletrônicas, desvencilhou-se do velho cânone da produção e da composição musical e foi uma junção desses dois estilos que moldou a cena paulistana que vemos hoje, o techno em São Paulo, é muito mais que um estilo musical, é um movimento de pessoas dispostas a questionar toda a moral e os valores impostos tradicionalmente pela sociedade, criando um local de caráter inclusivo, plural e acolhedor para todos, o artista multidisciplinar Carlos Issa, em entrevista ao website da RedBull, nomeia o ambiente do techno como um ambiente de insurreição radical, tanto no sentido sonoro, pois inclui todos os sons do mundo, tanto no convívio, pois inclui todos os corpos do mundo, com isso é possível perceber que é impreterível a existência e a preservação desse movimento numa metrópole tão diversa como São Paulo e até mesmo no Brasil por inteiro. Tendo isso em mente, o trabalho terá como objetivo principal analisar como um projeto de iluminação e cenografia pode ampliar a experiência do indivíduo em uma festa techno, abordando conceitos de luz e sensações do ponto de vista da fenomenologia, a partir dos ideais de Maurice Marleau-Ponty e Juhani Pallasmaa, abordando o contexto histórico-social do uso de iluminação ao longo da história desde o período neolítico ao gótico e das festas de techno a partir do conceito de errância por Paola Bereinstein, assim como o fazer projetual de uma festa, ponderando o equilíbrio do apolíneo e dionisíaco trazido por Friedrich Nietzsche no projeto. Já referente à instalação virtual será aplicado o que foi desenvolvido na pesquisa, tornando a instalação em um produto visual da mesma proporcionando uma experiência sensorial única e inesquecível ao usuário, ativando a memória afetiva nos antigos frequentadores dessas festas e instigando curiosidade e interesse nos que nunca foram. 15


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1. luz: “matéria” mutável

“No princípio, Deus criou os céus e a terra. A terra estava informe e vazia; as trevas cobriam o abismo (...) E Deus disse: “Faça-se a luz!” E a luz foi feita.” Gênesis 1:3

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N

ão há dúvidas, nem para os espiritualistas, nem para os versados nas ciências, da essencialidade da luz, não só para a existência e sustento de vida na Terra, mas também para a compreensão visual da própria realidade material, sem luz há apenas o breu, a matéria pode estar lá mas sem a luz refletindo sobre ela e chegando aos nossos olhos não temos a possibilidade de vê-la. Introduzida essa ideia, nesse capítulo serão tratados os conceitos de luz e o sentido da visão a partir da fenomenologia, que de acordo com o filósofo Husserl , é o estudo dos fenômenos, como o sujeito os entende, sem interferências externas, permitindo uma maior abstração da realidade, tal visão é explorada por Maurice Marleau-Ponty (1962) em seu livro Fenomenologia da Percepção em que a descreve como uma filosofia que tenta compreender os fatos do mundo, em um contato ingênuo, quase que primitivo, ou seja, a informação que é observada, ou sentida, é a absorvida.

Room for one colour, 1997 – Museum of Modern Art of New York Foto: Christopher Burke

“Essa mancha vermelha que vejo no tapete, ela só é vermelha levando em conta uma sombra que a perpassa, sua qualidade só aparece em relação com os jogos da luz e, portanto, como elemento de uma configuração espacial. Aliás a cor só é determinada se se estende em uma superfície; uma superfície muito pequena seria inqualificável. Enfim, este vermelho não seria literalmente o mesmo se não fosse o “vermelho lanoso” de um tapete.” (MARLEAU-PONTY, 1962) Room for one colour, 1997 – Museum of Modern Art of New York Foto: Christopher Burke

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A teoria das cores tem forte importância ao se tratar da fenomenologia da luz nos espaços, como dito antes, só vemos um objeto e sua determinada cor, pelo reflexo da luz que chega aos olhos, ou seja, uma rosa só é vermelha porque reflete a luz vermelha presente na luz branca, já que o branco ao se tratar de luz é a junção de todas as cores. Se incidirmos a luz branca sobre um objeto opaco, parte da luz é absorvida e outra parte será refletida. A cor de um objeto resulta da cor da luz que este consegue refletir. Então, se uma luz não é branca, não tem todas as cores para refletir a cor “real” de um objeto, de acordo com a fenomenologia, ele não tem essa cor.

The Weather Project, 2009 Foto: Tate Photography

Um exemplo ideal de como diferentes cores de luz pode criar diferentes realidades, poderá ser observado nas obras do artista dinamarquês-islandês Olafur Eliasson, na obra Room for one colour (1997). Ele preenche uma sala com luzes amarelas monocromáticas, que não são capazes de refletir cor nenhuma, então ao entrar na sala, tudo, inclusive os próprios visitantes, ficam em preto e branco, distorcendo pelo tempo que está na sala, a realidade que estamos acostumados de um mundo a cores. Essa ideia foi apurada na instalação The Wheather Project (2003) realizada no Tate Modern, em Londres, onde as mesmas luzes foram usadas em um painel semi-circular colado rente a um teto de espelhos no átrio do museu, criando um universo paralelo, uma ilusão de que o próprio sol

The Weather Project, 2009 Foto: Olafur Eliasson

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estava flutuando ali, já em Your Blind Passenger (2010), não só as luzes monocromáticas foram usadas, removendo as cores da equação, mas um túnel foi preenchido de névoa, fazendo com que o visitante usasse de seus outros sentidos para se locomover, o tato e audição, obrigando-o a confiar nos estímulos sensoriais, Eliasson descreve o que tenta fazer com sua arte no documentário Abstract (2019), ele diz, “ o que consideramos verdade depende do ponto de vista, nós criamos a realidade conforme passamos pelos lugares.”

The blind passenger, 2010 Foto: Anders Sune Berg

No Brasil, o artista plástico Abraham Palatnik, mistura cores com luz em seus Aparelhos Cinecromáticos (1969/86), que são nada mais que caixas com lâmpadas no seu interior, cobertas por telas coloridas que se movimentam por motores. Os primeiros, Azul e roxo em primeiro movimento, foram tão inovadores para a época, que, quando expostos na I Bienal de São Paulo , em 1951, a comissão internacional não sabia como qualifica-los, pois não se enquadravam em nenhuma das categorias da bienal, mas por chamarem tanto a atenção, a solução foi lhes dar uma menção honrosa, para garantir o reconhecimento por um trabalho tão original e instigante. Aparelho cinecromático Fontre: Coleção MAM SP

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Mas não só com cor que a luz pode criar sensações, a quantidade de luz num ambiente também pode alterar a percepção dele, o arquiteto Peter Zumthor explora isso eximiamente no edifício Thermal Baths de Vals, as termas são metade incrustadas na montanha, criando uma noção de simbiose e fusão com o entorno, ao mesmo tempo que suas duras e grandes paredes de quartzo contrastam com a neve ao redor, seu interior é escuro, com poucas frestas, na tentativa de exaltar a grandeza das paredes, a luz natural vinda dessas aberturas ilumina indiretamente o espaço, criando um ar sombrio, efêmero, quase que divino, ressaltando a força e os materiais escolhidos pelo arquiteto. A mistura de sensações, o claro e escuro, o calor das termas ao lado da paisagem de neve, naturalmente associada ao frio, cria uma ambiguidade de sensações única aos visitantes. Um fenômeno parecido pode ser observado na sala Holocaust Tower, no Museu Judaico de Berlim, projetado por Daniel Libeskind, onde uma sala vazia, de concreto, com um pé direito de doze metros é iluminada apenas por uma abertura estreita no teto, Libeskind narra em seu livro The Space of Encounter (1996) que o intuito era causar a sensação de opressão, fazer as pessoas sentirem um pouco do que os milhões de judeus presos nos campos de concentração durante o holocausto sentiram, o que realmente é algo denso e poderoso, e impressionante ao mesmo tempo dele praticamente só ter usado da luz para alcançar seu objetivo.

Thermal Baths em Vals, Suiça Foto: Fernando Guerra

Holocaus Tower Foto: kw

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Juhani Pallasmaa (1997), arquiteto finlandês, trata das investigações filosóficas acerca da fenomenologia de Marleau-Ponty do ponto de vista arquitetônico no livro Os Olhos da Pele, a importância dos cinco sentidos para uma experiência prazerosa na arquitetura, o uso de textura, materiais e luzes são de extrema importância. Ele decorre que toda experiência comovente na arquitetura tem de ser sensorial, pois as características do espaço são medidas, igualmente, pelos olhos, ouvidos, nariz, pele, língua e músculos. Há uma certa crítica nessa obra da valorização da visão em detrimento dos outros sentidos, mas, sem dúvida nenhuma, até o autor reconhece, que a visão é tão importante que se torna uma extensão dos demais, de acordo com ele, os olhos definem a interface entre o tato, a pele e o a ambiente, o citando: “Até mesmo os olhos tocam”. A visão revela o que o tato já sabe, Pallasmaa considera o tato como o inconsciente da visão. Os olhos acariciam superfícies e criam imagens, é essa sensação tátil do olhar que determina se algo é prazeroso ou desagradável, para corroborar essa ideia, ele cita Marleau-Ponty: “Vemos a profundidade, a suavidade, a maciez, a dureza dos objetos; Cézanne chegou a afirmar que via seus odores. Se o pintor deseja expressar o mundo, o arranjo de suas cores deve portar consigo esse todo indivisível, caso contrário seu quadro apenas conseguirá sugerir as coisas e não lhes dará a unidade imperativa, a presença, a plenitude insuperável que para nós é a própria definição daquilo que é real.” (MARLEAU-PONTY, 1962)

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Paisagem diurna do Monte Santa Vitória, por Paul Cézanne (c. 1904-6). Fonte: Coleção Sra. Carrol S. Tyson


Indo para um contexto mais urbano, Robert Venturi (1972) analisa a cidade de Las Vegas como um exemplo de como a luz pode ser usada para passar mensagens especificas, os anúncios luminosos, presentes por toda cidade, existem em diversos meios (palavras, imagens, esculturas, etc) com intuito de informar e também persuadir. Eles existem para chamar a atenção, seduzir os pedestres ou quem passa de carro, para induzir esses observadores a fazer o que os letreiros sugerem. Tal força é dessa luz. Outro uso para a luz nessa cidade é o a da ilusão, o labirinto de salas e pátios sob o teto dos cassinos, hotéis e shoppings centers jamais se liga com a iluminação externa, ou com o espaço externo. Isso desorienta o visitante no espaço e tempo, o faz perder a noção de onde está ou de que horas são, trazendo uma realidade onde o tempo é ilimitado, já que a iluminação é a mesma dia e noite. Por mais perverso que pareça, mexer diretamente no ritmo circadiano dos visitantes, isso é uma estratégia genial pra que esses espaços continuem vendendo e rodando dinheiro, que é, no final das contas, o principal intuito desses lugares. Não só em Las Vegas o contexto urbano se deleita com a luz, todas as grandes metrópoles da atualidade vêm mudando de puramente organizações funcionais para espetáculos de cor, luz, movimento e sons. São cidades que parecem oriundas do que acreditamos ser filmes utópicos de ficção cientifica, mas são inteiramente reais. Atuamos nas cidades como palcos elaborados com textos, adereços, música e vestimentas estranhas

Letreiros de Las Vegas Fonte: Wikimédia

Cassino Bellagio Fonte: Wikimédia

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Peter Weibel (2015) diz em seu texto para o livro SuperLux que apreciar a cor em seu todo, como uma forma de energia, tornou fácil para os artistas do passado substituir a luz pela cor artificial, a tinta, nesse sentido, cor se tornou uma representação da luz, já hoje, com as possibilidades tecnológicas quase infinitas que existem, a luz é o conceito central, independente, é o material, é o fim e o meio para produzir uma arte real com energia, uma quase “matéria” versátil cujo limite é a própria imaginação humana. De maneira possivelmente subversiva, o que Weibel prevê como futuro próximo para a arte e a arquitetura, será uma produção com intenção de substituir uma definição modernista da arquitetura, composições de sólidos e vazios “sob a luz” com uma proposta ousada de arquitetura como luz.

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Instalação “77 Million Paintings” por Brian Eno, na fachada da Opera House em Sydney Foto: Acervo Getty


Projeção de conotação política em fachada de prédio em São Paulo Fonte: Instagram

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A partir daí com o estabelecimento das comunidades e a da agricultura, os ciclos lunares e os solares se tornaram notáveis, já que logo esses povos os associaram com o crescimento de seus cultivos e os hábitos e necessidades de suas criações pecuárias, e assim, como em toda sociedade onde a falta de conhecimento cientifico não é capaz de justificar os fenômenos, crenças foram construídas através da observação dos eventos ambientais para tentar compreender o desconhecido. Tais eventos, como os solstícios e equinócios podiam ser observados através da posição do Sol e isso era atrelado através de mitos com os períodos de plantio e colheita, que posteriormente teriam significados sagrados para diversos povos.

2. contextualização histórico-cultural

A

utilização de luz no espaço e suas mais diversas interpretações caminham lado a lado com o próprio desenvolvimento da humanidade, a partir do momento que o homem teve a capacidade de pensar ele compreendeu a necessidade da luz para sua própria subsistência, nesse primeiro momento pelos ciclos do dia que possibilitavam a caça e a segurança.

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2.1. A LUZ E O SAGRADO

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ovos pré-históricos europeus sentiram necessidade de celebrar essas crenças por ritos e a construção de uma forma de arquitetura rudimentar, seus templos e tumbas eram levantados em pedra e mesmo depois de tantos milênios, podem ser observados até hoje, esses dolmens, como são chamados existem em algumas distintas formas, Christopher Scarre em seu livro The Megalithic Monuments of Britain and Ireland, disserta sobre esses diferentes tipos seguindo a nomenclatura proposta pelo historiador francês Baron de Bonstetten, um dos primeiros a realizar um compilado dessas estruturas na França e Bretanha. Bonstetten os categorizava em “dolmens apparents” (dolmens visíveis na superfície) e “dolmens couverts d’um tumulus en terre ou en cailloux” (dolmens cobertos por um monte de terra ou pedras), dentre esses dois arquétipos podemos observar um exemplo de cada em que a luz era utilizada para expressar algum motivo religioso. Do primeiro tipo, “dolmens apparents”, em Stonehenge, na Inglaterra, uma estrutura formada por círculos concêntricos de pedras (essas em torno de 5 metros de altura), cuja construção foi identificada em três períodos, o Período I, cerca de 3100 a.C., quando o monumento era apenas uma vala circular de 97,54 metros de diâmetro, com um banco de pedras e provavelmente um altar de madeira em seu interior. O círculo alinhava-se com o pôr do Sol do último dia do inverno e com as fases da Lua. Em seguida no Período II (c. 2500 a.C.) foi alargada a entrada, construída uma avenida central marcada por valas paralelas que se alinhavam com o


Monumento de Stonehenge, na Inglaterra Foto: IStock

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Sol nascente do primeiro dia de verão e o círculo externo de pedras foi levantado, já por fim, no Período III, os megalítos (pedras de grandes dimensões) foram levantados, dando a aparência final ao monumento. A respeito do movimento de corpos celestiais, as observações de Stonehenge foram usadas para indicar os dias apropriados no ciclo ritual anual, significando que a estrutura não somente foi usada para determinar o ciclo agrícola, uma vez que nesta região o solstício de verão ocorre bem após o começo da estação de crescimento; e o solstício de inverno bem depois que a colheita é terminada, mas também para observações astronômicas e funções religiosas, simultaneamente. Do segundo tipo, “dolmens couverts d’um tumulus en terre ou en cailloux”, temos Newgrange, na Irlanda, cuja construção pode ser datada de 3200 a.C., durante o período Neolítico, sendo uma estrutura de pedra, formada por um longo corredor e uma câmara no final, tudo coberto por um pequeno morro de terra e grama. A entrada é composta por um muro com pequenas pedras empilhadas e um portal, sendo construído de modo que, ao nascer do sol do dia mais curto do ano, ou seja, o solstício de inverno, um fino raio de sol ilumina por algumas horas todo o seu interior. Newgrange parece ter sido usado principalmente como tumba, já que foram encontrados restos humanos cremados de cinco indivíduos na câmara interna. Nesses dois exemplos a luz solar nos eventos dos solstícios, verão e inverno respectivamente, foi usada para ilu30

Vista aérea de Newgrange, Irlanda Foto: Ken Williams

Facho de sol adentrando a câmara interna de Newgrange Foto: World Heritage Ireland


minar seus espaços internos. É desconhecido ainda o exato motivo disso, a não ser o fato de estar diretamente associado às crenças de tais povos, mas uma coisa é certa, que os seres humanos da Idade do Bronze, por mais primitivos que pudessem ser, já entendiam muito bem a luz. Após esse recorte do Neolítico viremos os olhos ao Período Clássico, mais especificamente na Roma Antiga. O Panteão, construído entre c. 118 e 128, era uma construção ostensiva, cujo uso era ser um templo dedicado à todos os deuses, o templo consiste num tambor dividido em três camadas e arrematado por uma cúpula conectada ao pórtico, dentro, há apenas duas camadas de alvenaria até a cúpula, cujo centro há uma abertura para o céu, chamada óculo, que é a única entrada de luz do edifício. O intuito da utilização desse óculo não era apenas iluminar o interior do templo, mas sim também de estabelecer um significado de sagrado à esse facho de luz que entraria pelo teto, para os romanos, o Panteão era o lugar na Terra que os conectaria com os deuses e pra isso usaram do arquétipo platônico de Beleza Absoluta para estabelecer tal conexão, Ariano Suassuna, em seu livro Iniciação à Estética, narra esse ideal de beleza platônica como sendo inalcançável, para Platão o universo era dividido em dois mundos, o mundo em ruína, o nosso mundo e o mundo em forma, das Ideias Puras, da Verdade, do Bem e da Beleza, esse mundo seria eterno e imutável e estaria acima do nosso. Cada ser do nosso mundo em ruína, tem, no outro,

Interior do Panteão, pintura de Giovanni Paolo Panini, a pintura evidencia o óculo no topo do templo Fonte:

Panteão Romano por Francesco Piraneni

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um modelo, o que acontece é que a alma se recorda das formas e verdades contempladas no mundo das essências, antes que a alma se unisse ao corpo e o que nos restaria, nesse plano, seria a contemplação. O facho de luz serviria pra isso, lembrar os mortais onde eles estão e de onde a Verdade vem, acima de nós. A ideia de usar da luz como uma manifestação do sagrado permaneceu no inconsciente coletivo 4 do homem, tanto que, séculos depois, na Idade Média, mesmo com os ideais cristãos sendo tão distintos das religiões pagãs apresentadas anteriormente, seu uso continuou a ser observado. As catedrais góticas, talvez, sejam o melhor exemplo disso, pois no gótico, a contraposição de claro-escuro foi evidenciada, Luís Manoel Lourenço Sêrro, em sua publicação O Estilo Gótico – Expressão do Sublime, coloca as catedrais desse período como uma representação do sublime kantiano, onde esse sublime se apresenta no ser humano pela consciência do infinito, que cria no sujeito um “temor”, pela desproporção entre o sujeito e o objeto, pela impossibilidade de sua representação. Kant analisa o sublime no seu duplo aspecto, o sublime dinâmico, que se refere ao conceito de força, portanto à infinita potência de transformação, manifestado pela incompletude das formas geométricas, na tensão plástica que as anima, na verticalidade que cria uma dimensão transcendente, na desmaterialização da massa construída, na sugestão ilusória das forças ascensionais dos seus elementos e o sublime matemático, que se refere ao conceito de medi32


da portanto à infinitude do espaço e do tempo, onde é expresso através da consciência do limite do espaço exterior e interior, opondo-se ambos pela sua natureza. O interior da catedral é o nosso interior, portanto deve expressar esteticamente o limite não configurado do seu espaço, mas esta obscuridade deve ser realçada pelo contraste que a enfatiza, através da leitura dos elementos construídos, que se perdem na penumbra das abóbodas e da leitura em contraluz do plano continente onde se abrem os vãos de iluminação.

Vitrais de Saint-Chapelle de Paris Foto: Paul Smith

O Gótico é o estilo que mais evidência estes dois conceitos, quer na configuração dos seus elementos, quer na sugestão da sua dinâmica, do interior estes parecem “flutuar” num espaço indefinido e as suas figuras teofânicas coloridas sem massa, atravessadas por uma luz “neoplatônica” pelos vitrais, sugerem uma luminosidade sutil exterior, que se opõe a uma densa penumbra interior. Com efeito ultrapassando esse diáfano limite transparente, abre-se até ao infinito um espaço cheio de luz ofuscante, paradisíaco que contrasta brutalmente com o espaço infinito e obscuro do nosso interior, o contraste entre estes dois espaços é a substância do estilo Gótico. Sêrro narra essa experiência na citação abaixo. “Com efeito Plotino definia o espaço transcendente como um espaço de luz em que as almas, com um corpo transparente e sem massa, eram por essa luz atravessadas e nela pairavam sem espaço nem tempo. Os vitrais são a materialização desta filosofia, pois as figuras teofânicas em vidro transparente e colori-

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do eram atravessadas por essa luz divina que do interior da catedral rasgava a obscuridade como uma manifestação divina do mundo inferior.” (SÊRRO, 2015)

Em conclusão, os vitrais deixam entrar a luz, dando a ideia do sagrado, como se a própria manifestação de Deus estivesse ali, em contraposição com a escuridão do espaço interno das catedrais, é quase como o que os romanos fizeram no Panteão, mas mais apurado, uma intenção de provocar um estado de contemplação espiritual, causada pela luz.

Interior da Catedral de Barcelona Foto: Connor McNeill

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Essa última, traduzido como “luz e sombra”, é uma das estratégias inovadoras da pintura renascentista do século XV, junto ao sfumato, cangiante e unione. O chiaroscuro se define pelo contraste entre luz e sombra na representação de um objeto, porém com número menor de nuances tonais, nas transições, se comparado com o sfumato. A técnica exige conhecimentos de perspectiva, dos efeitos físicos que a luz provoca nas diversas superfícies, dos brilhos, das tintas que estão sendo utilizadas e de sua matização. O chiaroscuro define os objetos representados sem usar linhas de contorno em todo o perímetro, mas principalmente pelo contraste entre as tonalidades do objeto e do fundo; faz parte de uma idealização que inclui a experiência da pintura, contrariando, de certo modo, a linearidade que caracteriza a pintura do Renascimento, exemplificando, os personagens de Leonardo existem em um espaço primariamente definido pela luz, em oposição a uma estrutura definida a partir da perspectiva

2.2. A LUZ E a ciência em cena

C

om o fim da Idade Média, no século XV, se deu o inicio do Renascimento, novas ideias surgiram e se afloraram, e a Ciência se levantava das cinzas e confrontava a “verdade”, até então irrefutável, da Igreja Católica, o termo, Renascimento, faz referência ao ressurgimento do interesse pelos tesouros intelectuais e artísticos da Grécia e Roma Antiga. A redescoberta do mundo clássico alterou severamente as artes e a arquitetura do período, devido a uma observação meticulosa da forma humana e da natureza, assim como técnicas como a perspectiva e o chiaroescuro.

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na qual corpos e objetos são distribuídos individualmente. Na arquitetura, as coisas eram um pouco diferentes, enquanto a pintura ressaltava a luz através do contraste, nas edificações o uso da luz era mais pragmático, diferente do gótico onde seu uso era necessário para passar uma mensagem, no Renascimento as mensagens estavam pintadas em afrescos, trompe l’oeil, nas paredes e abóbadas das catedrais, palácios e palacetes, ou seja, a ideia da luz agora era iluminar bem as imagens, de representação inteiramente figurativa, para serem melhores compreendidas pelo observador, já que em muitos casos essas imagens tinham o intuito de educar de maneira visual passagens bíblicas, mitológicas e da literatura ou até representar fielmente a aparência de pessoas reais, vivas ou mortas, então precisavam ter uma maior legibilidade. Mas isso não durou por muito tempo, esse uso de luz mais pragmático perdeu força no barroco, ainda haviam pinturas e imagens para serem visualizadas, mas esse não era o foco central, a luz voltou a ser vista como experiência. Depois de anos usando da teatralidade do chiaroescuro na pintura os arquitetos da época conseguiram a traduzir para seus ambientes projetados, John Summerson, autor do livro A Linguagem Clássica da Arquitetura, nomeia o capítulo onde trata sobre o movimento como “ A Retórica do Barroco”, isso porque, segundo ele, o barroco é quase sempre retórico, no sentido de ser uma oratória grandiosa, planejada e persuasiva que frequentemente se contradiz, há nele o uso da racionalidade clássica, 36

Efeito de chiaroescuro na pintura Dama com Arminho (1489-1490) de Leonardo da Vinci

Janelas altas iluminando os afrescos da Capela Sistina, no Vaticano Foto: Sonia Cunha, Cultura Genial


Teatralidade e opulência do interior da Igreja de São Francisco em Porto, Portugal Foto: Paulo Chaves

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pragmática, que foi tratada quando se falou em renascimento, mas ao mesmo tempo um desvio dessa linguagem da Antiguidade , em direção a um rumo mais criativo, cenográfico, a uma concepção da fachada e seus interiores com luz e sombra, mais como um jogo de significados do que, realmente, afirmações. O autor trata a monumentalidade da arquitetura barroca e seu caráter teatral como um rompimento do frio pedantismo dos ressurgimentos clássicos vistos antes, com um caráter próprio, usa como adjetivo a expressão “invenção dramática, quase melodramática”, isso demonstra o que quis dizer ao usar a palavra “retórica”, nos edifícios do período, a linguagem clássica, a luz e a ausência dela são empregadas com força e drama para vencer nossas resistências e nos persuadir do que elas têm a comunicar. Passado a iluminação teatral do barroco, deve-se analisar a iluminação teatral daquilo que originou a palavra, o teatro. Até o século XVI as peças teatrais eram realizadas ao ar livre, iluminadas pela luz solar, mas quando os espetáculos passaram a ser realizados e locais fechados, criou-se uma necessidade da iluminação cênica e dessa necessidade surgiu um universo de novas possibilidades. De uma maneira geral, a luz era pensada como parte integrante da cenografia e seus movimentos, Sebastiano Sérlio, por exemplo, é bastante preciso em seu Libro Secondo di Perspettiva da Architettura, ao separar a função da luz geral que ilumina o cenário e os atores e os “efeitos especiais”, “truques” que transformam a luz da cena e podem interferir na 38

Pintura representando o Teatro Farnese, do século XV,por Giulio Ghirardi


ação dramática. Mas como o próprio nome já diz, por enquanto são chamados efeitos “especiais”.

Performance romântica no Teatro Sadler’s Wells, pintura por Thomas Rowlandson (1810)

A evolução das técnicas de iluminação no teatro são retratadas eximiamente por Cibele Simões (2015) em sua publicação À Luz da Linguagem – Um olhar histórico sobre as funções da iluminação cênica, na Revista Sala Preta, a autora diz que os cenógrafos-iluminadores da época renascentista desenvolveram as bases geométricas do desenho técnico de luz que usamos até hoje, diversificando a posição das fontes de luz e estudando os ângulos de incidência, com objetivo de criar volume e aumentar a noção de profundidade, onde o ângulo de 45º para iluminar de forma harmoniosa, as luzes laterais para aumentar a noção de perspectiva, a luz de um lado só para desenhar o volume e a contraluz para destacar a figura do fundo. A racionalidade genial dos artistas da técnica, suas regras e procedimentos, baseadas na pujança da pintura renascentista, foi responsável pela composição do desenho de luz, da relação entre a iluminação e a pintura, incluindo a criação de atmosferas luminosas e o uso de cores, se instaurou no teatro graças as inovações trazidas pelo Renascimento e sua filosofia totalizante e naturalista. Séculos depois, o Romantismo, que acompanha a chegada do gás, as atmosferas emocionais invadem os palcos, a possibilidade de controle das intensidades permite seguir os conselhos de Leone de’Sommi , movimentando a luz, respirando com o drama da peça para levar à plateia a emoção do espetáculo, do sombrio ao brilhante, do soturno ao júbilo, 39


da infelicidade para a felicidade, nos dramas e nas tragédias, os climas são a tônica dominante da luz romântica. No entanto, sem arroubos bruscos ou incoerentes, como uma noite de luar, um belo amanhecer, uma floresta escura ou uma festa brilhante, a luz é um adjetivo ou uma linda música de acompanhamento para fazer rir ou chorar. Das mais sofisticadas atmosferas luminosas nos palcos ao mais óbvio melodrama televisivo, para não falar na maestria técnica das óperas e musicais, os climas luminosos sempre tiveram uma influência do Romantismo. Em 1879, a invenção da lâmpada incandescente possibilitou a generalização do uso da eletricidade na iluminação, permitindo uma grande intensidade de luz, com um custo possível e uma segurança bem maior do que a luz do fogo. A partir de 1880 os teatros começaram trocar seus sistemas de iluminação a gás por sistemas elétricos, resultando numa rapidez inacreditável. Essa descoberta foi considerada a grande revolução da iluminação cênica, a ponto de muitos historiadores pensarem nessa data como o início da história da iluminação ou mesmo da encenação moderna. Com a descoberta da lâmpada incandescente e com a criação dos dimmers, a eletricidade permitiu à iluminação cênica o controle central de todas as fontes de luz do teatro, mais do que já havia sido conquistado, em parte com o gás, onde possibilitou o blecaute.

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A grande novidade da iluminação elétrica, portanto, não é apenas a qualidade da luz e sim a possibilidade da “não luz”, que ofuscada pela lâmpada acesa demorará décadas para ser percebida, pois além de dar visibilidade, a iluminação cênica ganhou o poder de esconder. Em um piscar de olhos faz aparecer e desaparecer a cena ou parte dela. Através do movimento entre a luz, as trevas e suas miríades de combinações, o teatro acessa além do visível, o invisível e através dele a sugestão, a comunicação possível daquilo que é indizível. A iluminação finalmente liberta das amarras da reprodução da realidade, transpõe o visível para criar novas formas, por meio de uma reorganização dos elementos visuais: linhas, formas, volumes e cores ganham flexibilidade através do movimento da luz em sua relação com a matéria e os olhos. A luz deixa de copiar o sol, a lareira e o abajur das casas de família e passa a escrever no espaço e no tempo, como uma linguagem explícita da cena. Além de dar visibilidade, volume, beleza, localização espacial e atmosfera apropriada a cada peça, a luz passa a ter por função a edição do visível no espaço e no tempo, se transformando em elemento estrutural e estruturante na construção do espetáculo. Essa revolução não é só estética, não é só técnica, a iluminação cênica é ao mesmo tempo arte e técnica. A evolução da luz elétrica possibilitou os meios técnicos para essa mudança conceitual no teatro, assim como possibilitou a criação de novas formas de arte: as artes da tecnologia. 41


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3. o techno

“(...) a gente cria uma dimensão arquitetônica desse som ( o techno), isso significa quase abrir fendas na cidade, porque é um lugar de construção dessa liberdade sexual, liberdade de ideias, liberdade de corpos.” ( DIAZ, Laura para o documentário MAMBA NEGRA: The Sound and The Fury of São Paulo, 2020.)

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3.1. o movimento

artindo do trabalho (Re) Existir Eletrônico, da arquiteta Julia Casadei (2018), analisa-se a história do techno como movimento, assim como uma transgressão sociocultural dentro da cidade, isso pode ser observado desde o início dessa produção até os dias de hoje em diversos locais.

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Detroit, nos Estados Unidos da América, é considerada popularmente como a capital do “techno”, durante os anos 1970, um extenso declínio econômico atingiu a cidade, primordialmente industrial, assim nasce esse estilo musical de um sentimento de necessidade da música pela música, tendendo a uma desvinculação do mercado formal, intrinsicamente elitista, proveniente de um entusiasmo da alma, música para dançar, no intuito de representar as verdadeiras entranhas das dinâmicas urbano-sociais da cidade. O som da música em si, refletia o declínio da cidade, através de uma estética maquinaria, familiarmente industrial, criando sons incomuns que se definiriam como “o motor da cidade”, reproduzindo os ruídos robóticos das fabricas de automóveis. Apesar do declínio constante e prolongado da cidade, o rádio local e uma cena ativa de clubes conseguiram conectar comunidades, especialmente a comunidade negra, criando assim a plataforma para o surgimento do Techno de Detroit. O resultado de 1967 construída uma mentalidade separatista, com o Movimento dos Direitos Civis ainda por surgir, foi uma cidade majoritariamente negra e com poucos recursos


gerando desconforto na população e provocando fortes sentimentos agressivos, motivando ações de repressão do governo.

Placa em Detroit, se auto intitulando, “A Cidade do Techno” Fonte: Google Imagens

Na mesma época em que a revolução industrial estimula o desemprego, pairando a desesperança. - “As pessoas não tinham dinheiro para comprar comida, roupa, ou qualquer outro luxo e esse sentimento aparece na nossa música”, (THOMPSOM, Derrik para HIGH TECH SOUL, parte 1,2006) Após a Segunda Guerra Mundial, o governo norte-americano incentivou a mudança da população do centro para o subúrbio, repercutindo no esvaziamento dos centros urbanos, restando no local, apenas aqueles que não tinham condições para realizar o sonho vendido do luxo suburbano. Estes foram os lugares conhecidos como as sobras de espaço, que o Techno, caminhando em sentido contrário à migração suburbana vigente na época, se inseriu, se expandiu e fez o seu espaço, por sua vez ressignificando por um dado instante algum lugar, que talvez para muitos seria impossível encontrar um uso. A Música eletrônica, como advento novo, caminhou em constante busca de território para acontecer, encontrando-se em lugares esquecidos e ociosos. Nasceu com a intenção de resistir a algo que estava acontecendo, com peso social, histórico e geográfico, produzido inicialmente por pessoas que se encontravam a mercê da sociedade, como aconteceu em Nova York no Hip Hop, ou em Chicago com o House, também produzido pela comunidade negra. 45


Dessa forma, começa surgir o conceito estético, social e político atrelado ao Techno, sendo adotada uma nova maneira de se apropriar daqueles espaços na cidade, que devido ao contexto histórico vigente, a crise automobilística e a segregação social, se encontravam em desuso, para existirem uma nova forma, a partir da experimentação. Frequentadores do Park Avenue Club, em Detroit, nos anos 1980 Foto: Todd Johnson

São nesses outros lugares, que de certa forma deixaram de funcionar como espaço de exploração e manifestação, que segundo Solá-Morales se transformaram locais do circuito da cidade, bordas carentes de uma incorporação ineficaz, lugares que por um tempo foram povoados e depois encontraram-se esquecidos. Mais tarde no fim dos anos 80, surge em Detroit, um coletivo musical, fundado pelo DJ produtor Jeff Mills e seu amigo Mike Banks, também Dj e Produtor, chamado Underground Resistence, que exploravam a fusão do estilo musical com críticas políticas, intimamente ligadas ao sistema de ocupação da cidade. A primeira onda do Techno de Detroit atingiu o pico em 1988-89, com a popularidade de artistas como Derrick May, Kevin Saunderson, Blake Baxter e Chez Damier, além de clubes como St. Andrews Hall, Majestic Theatre,The Shelter e Music Institute. Ao mesmo tempo, enquanto a grande massa norte americana não abraçava o som, o “Techno” chamou atenção do Reino Unido e em meados de 1988 foi lançada uma compilação que ficou conhecida como Techno! The New Dance Sound of

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Detroit ”. A explosão do interesse pela dance music nos anos 80, concretizou o Techno como gênero musical. Underground Resistence é considerado um movimento forte e importante para o cenário da música eletrônica e seu desenvolvimento virou um símbolo, não só nos Estados Unidos, mas também na Europa. A cena nasceu na camada carente da população que em parte encontrou na música uma maneira de resistência e ocupação. “Música é uma das únicas coisas que eu sinto que os humanos têm, que transcende tudo, língua, cultura, qualquer coisa, especialmente quando é instrumental, qualquer um pode entender” (Fala anônima para documentário HIGH-TECH SOUL – parte 9), sobre o sentimento da necessidade de união, de grito, de força, tolerância e acessibilidade, bandeiras já levantadas no início do advento.

População derruba o Muro de Berlim a marretadas, em 1989. Foto: David Brauchli

São diferentes pessoas, com diferentes vivencias e perspectivas, se unindo como iguais em um amplo espaço, onde silenciosamente gritavam pelo mesmo motivo, pela liberação das amarras, pela sensação da não opressão, pela vivência em um espaço de expressão. Na Alemanha, com a queda do muro de Berlim, o fim da Guerra Fria e a decadência do socialismo, pairava um sentimento de amistosidade e tolerância no início dos anos 90, contrapondo o pessimismo vivido nos anos 80. Neste período histórico, sobraram diversos lugares inusitados, como comércios, casas, galpões, em detrimento da movimentação de pessoas, principalmente do oriente para o ocidente, onde buscavam novas 47


oportunidades e encontros. Também restaram espaços que ficaram inabitados ao longo da divisa, onde o muro foi construído. Diferente de pessoas o construído não migra, torna-se espaço esquecido. O aspecto de ruina e abandono era curioso, como se esperassem para ser explorados e apropriados, eram perfeitos para a ocupação do movimento eletrônico que surgia na Alemanha, o aspecto sempre era bem minimalista, segundo Dj Doobros, em entrevista para o documentário Techno Scene, Berlim.

Festa techno em uma igreja abandonada, na Alemanha Oriental, em abril de 1988 Fonte: SUBstitut Archive

Antes mesmo da reunificação, os dois lados do muro, coincidentemente, se apropriavam destas ruinas próximas a divisa para se manifestar e ocupar musicalmente, os clubes surgiam nos lugares mais inusitados como uma antiga agencia de viagem, uma estação de transformação de energia ou uma fábrica de sabão desativada, os edifícios as vezes, até mais do que os djs, atuavam como os grandes protagonistas na cena. Como em Detroit, no início do movimento, as festas não possuíam uma locação fixa, elas itineravam pelas mais diferentes locações, principalmente em Berlim Oriental, onde os produtores enxergavam uma potência estética, caracterizado pelo visual antigo, antiquado, que para eles remetia ao diferente e ao ato de resistir, aglomeravam-se multidões diversificadas, dessa forma firmando-se o seu caráter errante. Em Berlim surgiu a necessidade de luta por tolerância, sendo fácil de entender esse sentimento, provindo 48

Punks em Berlim, Alemanha, nos anos 1980 Foto: Hatje Cantz


de uma sociedade que acabou de se reunificar e que viveu muitos momentos de tensão. Uma vez que esse sentimento de luta existiu, entende-se que se vive em uma sociedade intolerante e pouco inclusiva para alguns. Ainda que subjetivamente, o jovem encontrou seu espaço para resistir na música e na arte produzida. “Eu acredito que o Techno expressa a emoção da atualidade da melhor maneira possível, basicamente o vazio da sociedade” Fala para o documentário WE CALL IT, TECHNO, dirigido por Maren Sextro e Holger Wick. O Acid House, foi responsável por estigmatizar a música eletrônica dentro dos clubes noturnos até os dias atuais. No entanto, o Techno de Berlim, de Detroit e posteriormente em São Paulo, tem um caráter artístico, de apropriação de lugares neutros, ou de espaços públicos, porém têm a consciência da espetacularização e estetização e por sua vez se manifestam erraticamente. Resistem no espaço espetacularizado, existindo de maneira outra, apresentando uma estética contraria àquela do consumo. Existe a arte como forma de resistência. O corpo físico e o corpo urbano caminham em constante relação. O cenário criado pela cidade espetáculo e o corpo se divergem. O corpo que experimenta a alteridade na cidade, ao se deparar com o cenário perde seu sentido. O corpo é capaz de ler e gravar a cidade pela simples experiência urbana, segundo Paola Bereinstein, em sua teoria sobre a corpografia urbana. 49


Paola também entende que a arte na modernidade serve como ferramenta cultural de espetacularização, para garantir a cidade, o certificado de “verdadeira cidade”, para ela esse fenômeno dá a falsa sensação aos habitantes de apropriação da cidade.

Festa Mamba Negra, em São Paulo, 2019. Fonte: Instagram (@mamba.n)

Festa Mamba Negra, em São Paulo, 2019. Fonte: Instagram (@mamba.n)

Isso quando o movimento é vertical, quando por exemplo o governo propõe iniciativas culturais de entretenimento para a população, que não participa do processo criativo, apenas recebe e usufrui, pulando a parte do processo crítico e criativo. As festas aqui discutidas, propõe uma horizontalidade, usufruem do entretenimento para demonstrar como a arte pode também ter um poder crítico. O participacionismo é fundamental como ferramenta contra os cenários. Não estão interessadas em servir as imagens, propõe outras sensações corporais e intelectuais no excesso de reprodução cenográfica do espaço urbano. É possível perceber, que nesse tipo de festa, o ambiente é despretensioso, no entanto, paradoxalmente pensado em íntimos detalhes, para criar uma ambiência que conforte seus frequentadores, seja em uma locação subutilizada, seja em um clube, seja no espaço público. As luzes, o som, as pessoas, os encontros, a inclusão, de repente fazem sentido e dentro daquele momento é possível ser quem quiser, a expressão é permissiva à libertação das angustias, meio a uma sociedade opressora, com olhares julgadores e veloz, encontra-se entre fumaça e altos

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BPMs (batidas por minuto) o momento de respiro, de pausa e autoconhecimento. O caráter politico-social de resistência, é afirmado como a cultura desses ambientes, uma forte importância dada a questões como respeito, inclusão e diversidade. Em Detroit a cena era completamente negra, dado o contexto geográfico, em Chicago a cena era LGBT+, em Berlim a cena pregava a diversidade e tolerância dado a vivência de um período histórico segregacionista. A festa tem um caráter marginal e vive às bordas da sociedade, social e geograficamente, são falsas utopias, que demonstram uma sociedade distópica. Servem de ponto de encontro para aqueles que sentem a mesma necessidade de levantar alguma bandeira, com a tranquilidade do saber que irá ser respeitado. Forma-se então uma multidão diversa, heterogenia, que não necessariamente querem se tornar unidade. Esse tipo de expressão social através de festas nunca foi novidade, ao analisar a história, as bacanais eram celebrações de caráter cívico-religioso, ou seja, conciliavam aspetos da política e da identidade das pólis gregas e posteriormente do Império Romano, servindo como fator de agregação da sociedade. Nestas festas as pessoas eram tomadas pelo êxtase dionisíaco em danças e tanto mulheres quanto escravos gozavam de maiores liberdades durante a festa, o que reafirma o fator agregador das festas em si, este momento representava uma transgressão para com diversas separações sociais, muito si-

Bacchanalia, de Auguste Levêque, representando uma bacanal romana

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milar ao que o “Techno” representa hoje.

nias, inclusivas e tolerantes, explicitamente gritam por isso.

Segundo Paola Berenstein, é na multidão que o flâneur encontra seu anonimato, mesmo cercado de milhares de pessoas, ali ninguém está de fato interessado em saber quem ele é, de onde ele veio, ou para onde ele vai. A multidão é um fenômeno que ganha força na sociedade contemporânea, ela constituiu a própria noção de espaço público metropolitano. As festas são constituídas, principalmente pela multidão, com esse caráter são compostas por diversas pessoas anônimas, que profundamente não estão interessadas nas intimidades umas das outras.

Neste ambiente errante marcado pela pluralidade que coexiste, as mais diversas pessoas encontram seu refúgio e além de segurança encontram uma liberdade, no sentido de se expressar artisticamente, tocando, dançando, performando, projetando, falando, existindo e resistindo. “O resultado acaba sendo um espaço utópico [perfeito] e distópico [assustador por evidenciar uma realidade opressiva]” fala de Laura Dias, fundadora da Mamba Negra, para entrevista no documentário MAMBA NEGRA: The Sound and The Fury of São Paulo.

De certa forma, o conceito é um paradoxo, um ambiente que o indivíduo pode frequentar sozinho e interessantemente vai estar sozinho junto com outras milhares de pessoas, também sozinhas, com o mesmo interesse. A cidade é heterogenia, as multidões são heterogenias, dentro do mesmo território coexistem homens, mulheres, transexuais, travestis, gays, lésbicas, ricos, pobres, brancos, negros, asiáticos, enfim, rótulos a parte, são infinitas as possibilidades, compreender esse meio heterogêneo possibilita o reconhecimento da cidade, a partir de suas particularidades, pois embora formem-se tribos, os encontros são inevitáveis. O ambiente proposto pelas festas independentes então em São Paulo, que tentam retomar as raízes estéticas e culturais do movimento, apresentando o caráter político atual, atuam de forma a serem heteroge52


O público das festas de techno em São Paulo tende a ser plural e marginalizado, pessoas trans e pretas marcam presença Fonte: Instagram (@mamba.n)

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3.2. festival de sensações 54

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nalisando o uso da luz como catalisadora de sensações, ao longo dos primeiros dois capítulos e apresentado o contexto e o recorte das festas de techno, percebem-se paralelos, os quais foram a origem exata da inquietação em que resultou esse trabalho. Parece loucura comparar a “profanidade” de uma festa techno com as experiências narradas anteriormente dentro de uma catedral gótica, por exemplo, onde o sagrado e a religiosidade são os focos centrais, mas pontos similares já foram explorados. O filósofo alemão Friedrich Nietzsche, traz no seu livro O Nascimento da Tragédia, o conceito de dualidade do apolíneo e o dionisíaco, o racional e o caos presente nas emoções e instintos, esses dois impulsos, praticamente opostos, existem lado a lado, geralmente em discórdia, mas instigam-se mutuamente para gerar frutos cada vez mais vigorosos. Para ele a união dos dois, origina o que chama de ”tragédia ática”, uma arte tida como mais fiel a realidade, por isso, suprema. O homem se relaciona intimamente com o mundo, constituindo um elo. Porém, o que ocorre atualmente é um afastamento dessa realidade que era tão vivenciada, especialmente pelos gregos, na época antiga. Nietzsche, ao escrever sobre o assunto, parece prever o que ocorreria com o homem da atualidade: o evitar da finitude, ao ignorar os elementos dionisíacos e valorizar apenas a racionalidade apolínea, o que impede esse homem de aceitar a realidade tal como ela é.


Apolo, enquanto deus da experiência onírica (do sonho), é um deus ilusório. A luz, quando em excesso, faz apenas cegar os olhos, enganar-nos. A experiência iluminada e aparentemente prudente e ordenada que se apresenta como verdadeira é nada, senão uma falsa realidade que ilude, a partir da racionalidade.

Deus Baco (Dionísio) por Michelangelo di Caravaggio, c. 1595, pintura retrata o deus do vinho e dos pazeres. Fonte: Museu Uffizi

No resgate do dionisíaco, Nietzsche (1888) pede uma valorização da arte em detrimento do conhecimento. Embora a arte seja apenas uma cópia do mundo, as formas abstratas e mais reais do dionisíaco estão presentes neste, e podem ajudar a defini-lo e interpretá-lo de forma mais verdadeira. O que se perde ao valorizar a individualização e a racionalidade apolíneas, é o próprio sentido de pertencimento e de valor, é o sair de si. Quando a arte se expressa apenas no sentido apolíneo, torna-se um instrumento dialético e moralizante, perdendo seu sentido enquanto manifestação própria da loucura da vida. A arte apolínea valoriza a forma e a busca da racionalidade métrica e objetiva, o que se adequa às máximas socráticas de que apenas o saber é virtuoso e que a vida para ser bela, precisa ser inteligível, mas isso não é nada palpável se tratando de vida real, o mundo não é mundo sem as experiências emocionais, as hedonísticas da ordem da embriaguez e do prazer, uma arte sincera, não moralista, que não esconde todas as faces de uma sociedade, é a pura estética da verdade.

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Na arquitetura isso é retratado eximiamente por Bernard Tschumi, no que chama de O Prazer da Arquitetura, o autor faz uma crítica ao funcionalismo e as atitudes puritanas do movimento moderno, de que, ao longo dos anos, qualquer arquiteto que procurasse sentir prazer na arquitetura era considerado um decadente. Mas porque isso deve ser considerado uma coisa tão negativa? Para ele, por mais que exista prazer na racionalidade e na ordem, por exemplo, é possível achar uma construção grega bela, mas esse prazer está atrelado a geometria, uma certa “perfeição opressora”, ele decorre. “ordem dórica ou coríntia, eixos e hierarquias, grelhas ou linhas reguladoras, tipos ou modelos, paredes ou lajes, e naturalmente, a gramática e a sintaxe do signo arquitetural se tornam pretextos para sofisticadas e agradáveis manipulações. Levadas ao extremo, essas manipulações tendem para uma poética de signos congelados, desvinculados da realidade e voltados para um prazer mental, gélido e sutil.” (TSCHUMI, 1978)

Percebendo isso conclui-se que, a necessidade da ordem não é justificativa para imitar ordens passadas. A arquitetura torna-se interessante quando domina a arte de perturbar ilusões, criando pontos de ruptura que podem começar e terminar a qualquer momento, assim como, quando se levada ao excesso, revela ao mesmo tempo os vestígios da razão e a experiência imediata do espaço.

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Exceder os dogmas funcionalistas, os sistemas semióticos, os produtos formais das restrições sociais não é necessariamente uma questão de subversão, mas de preservação do que Tschumi chama de “capacidade erótica” da arquitetura, por meio da ruptura da forma que a maioria dos círculos conservadores esperam dela. A arquitetura do prazer se concentra, então, onde o conceito e a experiência coincidem, onde a cultura da arquitetura é eternamente desconstruída e as regras são transgredidas. Nem mesmo a experiência religiosa está completamente isenta no “techno”, a junção da luz, música e comunidade presentes nessas festas é algo que ocorre em diversas religiões, inclusive cristãs, junção tal qual existe nesses contextos tanto tido como sagrados ou não. As luzes dos vitrais numa catedral, o coral, o sermão do padre e a energia conjunta dos fiéis presentes, existe nessa união para criar uma experiência de transcendência, na tentativa de incitar um transe contemplativo. C.G. Jung (1833) usa a missa católica como exemplo dessa busca pela transcendência através do rito sagrado, que essa busca durante o ofício litúrgico ultrapassa todas as barreiras de espaço e tempo, é um momento eterno onde o neófito recebe a “graça”, é influenciado, impressionado ou “consagrado” por sua participação ou apenas pela simples presença no ritual.

Fiéis buscam a transcendência espiritual através da missa católica Foto: Catholic Church England and Wales (Flickr)

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A transcendência também pode ser atingida por outros meios, onde existem pessoas em um coletivo tomadas por uma única energia, adicionando um ou mais dos fatores citados , onde é possível atingir isso, mesmo num contexto mais profano, pagão, exemplo clássico é o êxtase dionisíaco presente nas bacanais, mas atingir esse estado não é tão fácil, por isso algumas pessoas se utilizam de aditivos, alteradores de consciência, para ajudar no processo; no caso das bacanais, o vinho, já nas festas contemporâneas, o Techno incluso, diversas outras drogas fazem parte da realidade. Aldous Huxley (1954), no texto As portas da percepção, traz o uso recreacional de drogas nessa tentativa de transcender a individualidade autoconsciente, que, quando, por um motivo ou outro as pessoas não conseguem transcender por meio do culto religioso, das boas obras e da meditação, elas tendem a recorrer ao que chama de “substitutos químicos” da religião, ele cita a obra de Philippe de Félice, filósofo que traça um rico histórico da conexão imemorial entre a religião e o uso de drogas na frase “Em poisons sacrés, invresses divines” ( Venenos sagrados, embriaguezes divinas). Nesse volume Huxley analisa, com riqueza de detalhes a experiência do uso da mescalina, substância presente no peiote, ele decorre então sobre as descobertas cientificas sobre essa substância, de que ela se assemelha profundamente ao andrenocromo, produto natural da decomposição da adrenalina, ou seja, cada ser humano é inteiramente capaz de sintetizar uma substância química que, 58

Índio Yanomani após inalar alucinógeno yãkoana para ritual xamânico Foto: Claudia Andujar


mesmo em pequenas doses, provoca alterações de consciência profundas e comprovadas cientificamente. Em conclusão, a capacidade de transcendência, de mudança de percepção, é inata ao homem e o uso das substâncias, surgem entre muitos outros fatores complexos, como um facilitador do processo, mas difere, ao mesmo tempo, de uma obrigatoriedade; o uso não é estritamente necessário para alcançar o desejado, seja em rituais ou em festas, mas para muitos ele existe, então seria enganoso e omisso da parte desse trabalho, como um estudo acadêmico, de não retratar essa face. Tendo em mente a necessidade de ponderar o apolíneo e o dionisíaco, o racional e o emocional, para alcançar uma arte fiel a realidade e visto a similaridade das experiências transcendentais do sagrado e o profano, fica claro que as oposições se completam e que apesar de arriscado, o que antes parecia insano comparar, cria uma narrativa de sentido. Outra sensação presente no “techno” tem origem em onde ele ocorre, o espaço do techno pode ser considerado sublime, de acordo com Edmund Burke em sua Investigação filosófica sobre a Origem de Nossas Ideias do Sublime e da Beleza, o sublime está em tudo que de alguma forma seja capaz de excitar idéias de dor e perigo ou que opere de uma forma similar ao horror, o assombro é o efeito do sublime de mais alto grau, já em contraposição, a admiração, reverência e respeito, por mais que despertem uma sensação de sublime, seria em menor grau. 59


Os locais onde as festas ocorrem tendem a despertar essa noção do sublime, os espaços em degradação, galpões e fábricas abandonadas, não-lugares praticamente, são associados a uma preconcepção de perigo, asco, que a sociedade geralmente atribuí a esses lugares marginalizados. Juhani Pallasmaa (1986), traz uma ideia similar ao fazer uma crítica ao modernismo e a essa arquitetura “limpa” no trecho do texto A geometria do sentimento: “Por que tão poucas construções modernas tocam nossos sentimentos, quando qualquer casa anônima numa velha cidadezinha ou o mais despretensioso galpão de fazenda nos dá uma sensação de intimidade e prazer? Por que as fundações de pedra que descobrimos num campo de mato crescido, um celeiro desabado ou um hangar abandonado despertam nossa imaginação, enquanto as casas em que moramos parecem sufocar e reprimir nossos devaneios?” (PALLASMAA, 1986)

Tendo em vista esse ponto, a ideia do techno seria a revitalização desses espaços, naturalizando a presença neles, mas ao mesmo tempo tendo cuidado para não os remover dessa característica, para isso, pode-se adicionar outro princípio causador do sublime, a luz. Burke considera que toda arquitetura, que tem como intuito produzir uma ideia de sublime, prefere utilizar do escuro e do sombrio, mas à noite, período quando a maior parte dessas 60

Locais como fábricas abandonadas despertam a noção do sublime e frequentemente são ocupados para festas de techno Foto: Ender Lawrence (DeviantArt)


festas ocorre, a regra é invertida. Durante à noite, quanto mais um quarto estiver iluminado, maior será a paixão causada, então, uma iluminação de destaque, que difere grandemente do breu noturno exterior e que valorize o caráter visual e estético do espaço já sublime, em que o techno acontece, seria um agregador importante para a experiência num todo. O tempo e o ritmo que a música eletrônica toca ressoa a racionalidade apolínea, que induz um transe religioso, as batidas ressoam em uma simplicidade fácil de compreender, que está atrelado as batidas presentes em ritos tradicionais de religiões de matrizes africanas ou até xamânicas, que promulgam o transe, por isso parecem tão naturais e familiares aos nossos ouvidos. Esse “festival de sensações”, como o título implica, existe para criar uma experiência única ao usuário, sem um projeto de luminotécnica para o espaço não teria luz no techno e sem luz não há techno. A luz, como a música e as pessoas são partes essenciais, para o ritual da festa se completar.

Festa de Techno Blum SP Fonte: Instagram (@blum.sp)

Festa de Techno Blum SP Fonte: Instagram (@blum.sp)

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4. análise e experimentação

“A maioria das realidades virtuais vivenciadas de forma quase total veda hermeticamente a percepção das impressões visuais externas do observador, atrai sua atenção com objetos plásticos, expande perspectivasde espaço real no espaço de ilusão, observa a correspondência de cores e escala e, como o panorama, faz uso de efeitos de luz indireta para que a imagem apareça como a fonte do real. A intenção é instalar um mundo artificial que proporcione ao espaço imagético uma totalidade ou, pelo menos, que preencha todo o campo de visão do espectador.” (GRAU, 2005)

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e acordo com as informações coletadas nos capítulos anteriores, nesta última parte será feita um compilado do todo, os conceitos de luz explorados no primeiro e segundo capítulo, a interação com a música e o “techno”. No terceiro capítulo, será feita apresentação de análises, sobre projetos cenográficos, urbanos, em peça de teatro e no âmbito das festas de “techno”. Por último será apresentado um projeto autoral para uma instalação virtual, que será responsável pela simulação do tipo de espaço estudado nessa devida monografia. Para poder aprofundar no tópico cenografia algumas referências são essenciais, entre elas, a cenógrafa, diretora de arte e curadora Miriam Aby Cohen (2015), que decorre em sua tese de doutorado sobre a função política da cenografia: “Os designers de cena são aqui identificados como aqueles capazes de transformar qualquer espaço, em fazer com que qualquer objeto inanimado possa contar uma história, e ainda, para além de sua produção criativa, possa elaborar um manifesto, posicionar-se politicamente por meio de sua expressão artística e, conduzir o público a alcançar uma percepção apurada sobre a realidade, através da ficção criada pela Performance e seu design.” (COHEN, 2015)

A britânica Es Devlin (2019), talvez seja hoje, o maior nome na área, apesar de compartilhar pensamentos parecidos, pensa nessa função do cenógrafo como poética, transformando uma mensagem em uma 64


representação visual, ela narra em sua palestra para a TED Talk de Viena em 2019, comparando o fazer artístico da cena como um instrumento de comunicação para a audiência, como uma letra de música, um quebra-cabeças poético a ser descoberto e montado por quem o percebe. Percursor às duas, Flávio Império (1976) não traz ideias opostas, mas reforça que cenografia, sem um usuário para presenciar o que foi feito, não é nada, o usuário é quem vai juntar todas as informações presentes, no palco e fora dele, e assim construir a experiência por completo. Mas não só aos palcos que a cenografia está fadada, a arte urbana, discutida no primeiro capítulo e a arquitetura de exposições, também conhecida como expografia, possuem caráteres cenográficos muito marcantes, pois nesses casos, como na cenografia, a arte não existe por si só, mas apenas se houver o usuário para presenciá-la. As projeções artísticas atuais, tanto no meio urbano quanto entre quatro paredes, frequentemente combinam efeitos de vídeo sofisticados e concepções de gráficos de movimento para videogames, animações e efeitos especiais de cinema, além de softwares especializados para edição de imagem. Os artistas que as produzem precisam criar o conceito dessas obras multimídia, mas ao mesmo tempo, junto de programadores e engenheiros elétricos para refinar e expandir as capacidades técnicas dos equipamentos envolvidos. 65


4.1. analises 66

A

seguir serão analisados três projetos cenográficos, em diferentes meios, onde a tecnologia e a iluminação possibilitou um desenho inovador de espaço pertinente ao viés estudado até dado momento e que serviu de inspiração para o projeto de iluminação para uma festa de techno.


• LOTUS DOME

O

s domos geodésicos, estudados por Buckminster Fuller, são uma grande inspiração para uma geração de artistas e arquitetos, assim como para o artista holandês Daan Roosegaarde, que combinando tal estrutura junto com uma ideia que remanesce às antigas lanternas mouras cria uma instalação que simula, praticamente, um organismo vivo, feita de centenas de pequenas folhas de papel mylar, que se curvam gentilmente em resposta ao toque e ao calor humano. Internamente o domo é iluminado por lâmpadas de LED, criando um padrão delicado de triângulos de luz entre a estrutura. A obra interage de maneira muito curiosa com o espaço onde está inserida, a igreja de Santa Maria Madalena em Lille, França, projetando as formas geométricas de luz e sombra a partir do domo nas paredes e altar barrocos da igreja, um contraste sofisticado entre o rebuscado clássico e o contemporâneo.

Lotus Dome por Daan Roosegaarde, 2012. Foto: Studio Roosegaarde

Lotus Dome por Daan Roosegaarde, 2012 Foto: Studio Roosegaarde

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• james turrell para museu jumex

E

sse trabalho do artista James Turrell, representou uma das séries mais importantes de sua carreira. As duas instalações realizadas, no Museu Jumex, no México, ofereceram um contraste de experiências que transformou os espaços, desfocando o horizonte em luz e escuridão. O trabalho de Turrell dedica-se a entender cientificamente os efeitos da luz através de uma visão artística que marca fortemente seu estilo particular, levando a meditações silenciosas sobre tempo e espaço. Essas pesquisas exaustivas dele sobre luz e espaço transcenderam as barreiras de qualquer espaço físico.

Peça da série Ganzfeld, por James Turrell, 2012. Foto: Fundación Jumex

Dark Space, por James Turrell, 2012. Foto: Fundación Jumex

Um Ganzfeld foi concebido para a galeria do primeiro pavimento, que forma parte de uma das principais séries das instalações do artista, originou uma experiência que dissolve a arquitetura através do uso de de cor intensa. Construída para o terraço do Museu Jumex, a peça Dark Space (Espaço Escuro) fornece uma iluminação tão mínima que as imagens aparecem de dentro do olho do visitante. Juntas, as peças apresentam os extremos em que o artista cria o que ele descreve como “vendo por trás dos olhos” ou, como ele diz, “vendo-se ver”. 68


• FORMATION TOUR

A

autora do projeto Es Devlin, que já foi premiada diversas vezes por seu trabalho sensível e imersivo, pensou, juntamente da cantora americana Béyonce em como traduzir palavras e emoções em algo visual para compor o palco do show, pegando um trecho de uma poesia escrita por Beyoncé, onde ela retrata sentir o “poder da fé” através da estática da televisão ao ver um pastor pregando na mesma, transformou esse sentimento da artista numa gigante escultura de um cubo que se divide, com painéis LED, onde as mensagens visuais passadas pela cantora seriam transmitidas ao público, da mesma forma que ela sentiu com a pregação do pastor anos antes, mas agora os “fiéis” seriam os espectadores e ela, Béyonce, a pastora.

Palco do Formation Tour por Es Devlin, 2016. Foto: Ed Burke

Palco do Formation Tour por Es Devlin, 2016. Foto: Ed Burke

69


70

4.2. experimentação


T

endo em mente a ponderação dos conceitos de apolíneo e dionisíaco para a concepção de um projeto artístico “perfeito”, mais agradável e fiel a realidade, pode-se notar que o ambiente do techno é praticamente uma explosão dionisíaca, é uma festa com diversos corpos alterados, dançando, curtindo e se expressando num espaço onde ordem não é um sinônimo. Mesmo que por pouco tempo seja esse “habitar” no espaço, um grau de confusão atinge os usuários, assim, pensando em tornar o evento mais prazeroso, seria elaborada essa ordem, através do projeto cenográfico, não de maneira austera, mas com sutilezas, como uma linearidade geométrica na iluminação e no desenho dos espaços e utilizando da luz e cor para moldar o humor e sensações do usuário com a teoria das cores e a fenomenologia. As luminárias pensadas, praticamente todas construídas a partir de tubos LED (120 cm e 240 cm), estes que funcionam como fragmentos de linha, possibilitando o desenho de formas geométricas regulares e irregulares e traçados horizontais, verticais e diagonais, criando, até mesmo, a partir da luz, diferentes perspectivas. Todo o projeto cenográfico e de iluminação foi desenhado seguindo as regras e recomendações técnicas contidas no manual Performance Lighting Design: How to Light for the Stage, Concerts and Live Events escrito pelo cenógrafo britânico Nick Moran (2007). 71


• O local

O local de intervenção desse projeto está localizado no bairro da Luz, um bairro em estado de degradação, com diversos problemas urbanos e sociais e de entorno com os mesmos problemas ou similares.

A principal característica da área, pertinente a este projeto, é a do contexto; o techno surgiu e é celebrado em ambientes industriais degradados e esta área é repleta de galpões desocupados, cenário ideal para uma festa de techno. 72


Dentre os diversos galpões presentes no bairro, o escolhido foi o do número 105, na rua Deocleciana, pois já havia sido sede de diversas festas e está presente na memória afetiva dos frequentadores.

Outra razão é a sua localização, por estar numa região central, sua proximidade com duas estações de metrô, Tiradentes e Armênia, e por estar ao lado da Avenida do Estado, tornando o acesso fácil. 73


• insolação

A

festa ocorrería no galpão, marjoritariamentem, à noite, normalmente tendo um período de duração das 23h00 às 9h00, então, pela maior parte do tempo, a luz solar não seria uma questão e não afetaria o projeto de iluminação.

Mas, durante as horas finais do evento, o Sol já terá nascido, e isso foi levado em consideração na disposição das áreas da festa. O galpão possui uma insolação sudeste no período da manhã, então na face leste foram dispostas as áreas de curta permanência do evento, as áreas de descompressão e exposição, enquanto a pista de dança , àrea de maior permanência, assim como o bar foram deixados na face mais à oeste, possibilitando que a festa desfrute do projeto de iluminação pensado para esses espaços por mais tempo.

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• LEGISLAÇÃO Alvará para eventos

Capacidade de Lotação

A realização de eventos em espaços públicos, privados ou em estabelecimentos fechados requer que os produtores obtenham um alvará da prefeitura da cidade onde o evento acontecerá. Para obter esse licenciamento, é preciso ter em mãos documentos como:

Para determinar a lotação de um espaço a ser utilizado para realização de um evento, deverá ser levada em conta a área de circulação das pessoas (exceto as áreas de sanitários e/ou aos espaços de circulação horizontais e verticais efetivamente utilizados para escoamento) e/ou a capacidade de escoamento do público pelas saídas de emergências.

- Termo de responsabilidade preenchido e assinado; - Contrato e certificado da empresa de segurança contratada com as medidas para adequar o local às normas; - Contrato de locação do local (se for um local privado); Laudo Técnico de Segurança e a Anotação de Responsabilidade Técnica; - Cópia de comunicação à Polícia e ao Corpo de Bombeiros da cidade. A Prefeitura Municipal de São Paulo, criou normas específicas, através da edição de caderno técnico, sendo que foram utilizados os preceitos estabelecidos pelo Art. 05º e 24 do Decreto Municipal 49.969/2008, Portaria 039/SEL-G/2020, Código de Obras e Edificações do Município de São Paulo (Lei 16.642/2017, regulamentada pelo Decreto 57.776/2017), Lei 16.402/2016 (LPUOS) e legislações complementares, bem como Normas Técnicas expedidas pela ABNT.

A útil do projeto = 1009,78 m² I=A/P CAPACIDADE P = 2525 pessoas

Cálculo de Escoamento N = P/C sendo que C é o coeficiente para locais fechados com escadas. N = 33,65 metros lineares

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• SETORIZAÇÃO

PISTA DE DANÇA 343,75 m² ÁREA DE EXPOSIÇÃO 89,1 m² BOMBEIROS 69 m² LOJA 58,2 m²

DESCOMPRESSÃO 99,5 m² BAR 213,41 m² SANITÁRIOS 66 m² DESCOMPRESSÃO 139,76 m²

HALL DE ENTRADA 150 m²

A útil = 1009,78 m² 76


• planta setorizada

ÁREA INTERDITADA

ÁREA INTERDITADA

ÁREA INTERDITADA

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• planta setorizada

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• planta setorizada

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• planta iluminação

ÁREA INTERDITADA

ÁREA INTERDITADA

ÁREA INTERDITADA

As cores na planta representam as cores reais das luzes pensadas para o projeto. 80


• planta iluminação

As cores na planta representam as cores reais das luzes pensadas para o projeto. 81


• planta iluminação

As cores na planta representam as cores reais das luzes pensadas para o projeto. 82


• cortes

20

17 18

19

5

7

7 20

16 14

15

19

5

6 9

9

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• perspectivas ESCADA

LOJA

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BAR

BAR

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DESCOMPRESSÃO 2º PAVIMENTO

DESCOMPRESSÃO 2º PAVIMENTO

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DESCOMPRESSÃO 1º PAVIMENTO

PISTA DE DANÇA

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ÁREA DE EXPOSIÇÃO

Para continuar no tema, a forma pensada para expor obras de arte ou até mesmo vide-instalações foi através da luz, mais precisamente, projeções. Assim como a obra de padrões geométricos da artista Maísa Dias, projetada na parede da loja uma sala de exposições foi elaborada para o projeto, com quatro estruturas com tecidos semitransparentes penduradas para a projeção de quaisquer obras que se encaixem com o partido curatorial do evento

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• memorial

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• renderizações

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91


92


93


94

conclusão


N

o início dessa monografia foi dada a questão de como um projeto de iluminação e cenografia poderia ampliar a experiência de um indivíduo em uma festa techno, após ao longo do trabalho estudando as diversas aplicações em que a fenomenologia do uso da luz pode ser aplicada no âmbito das artes e arquitetura, no presente e ao longo da história, dos dolmens neolíticos às igrejas medievais, das edificações barrocas ao teatro contemporâneo pode-se concluir que é mais que certo que a luz pode alterar e criar novas experiência, mas isso somado com o contexto histórico-social do techno, os ambientes onde ele ocorre, já carregados de uma experiência sublime, a música, com sonoridade simples e provocativa, as pessoas em energia uníssona cria uma experiência de evento não só alteradora de percepção mas possivelmente até de consciência, podendo levar até mesmo a uma transcendência similar a religiosa. O techno é muito mais poderoso do que um simples evento de música.

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Abstract: The Art of Design: Olafur Eliasson. Direção: Jason Zeldes. Produção de Radical Media Production. Estados Unidos: Netflix, 2019. 45:26 minutos Burke, Edmund. Investigação Filosófica Sobre a Origem de Nossas Ideias do Sublime e da Beleza. São Paulo: Edipro, 2016. CASADEI, Julia Luiz. (Re) Existir Eletrônico. 2018. 96 p. Monografia (Graduação em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, São Paulo, 2018. COHEN, M. Aby. O Desenho da Cena como Experiência: Intersecções na Prática Artística Contemporânea entre Cenografia, Instalação e Expografia. 2015. 193 p. Tese de Doutorado em Artes Cênicas. Universidade de São Paulo, Escola de Comunicação e Artes, São Paulo, 2015. DEVLIN, Es. Mind-blowing stage sculptures that fuse music and technology. Youtube, 4 de maio de 2019. 16:53 min. Disponível em: . Acesso em setembro de 2020. Dekmantel Festival São Paulo 2018 - The Evolution of São Paulo’s Independent Electronic Music Scene, Direção: Dekmantel, 2018, São Paulo. FREARSON, Amy. Peter Zumthor’s Therme Vals spa photographes by Fernando Guerra. 2016. Disponível em: < https://www.dezeen.com/2016/09/25/peter-zumthor-therme-vals-spa-baths-photography-fernando-guerra/>. Acesso em novembro de 2020. GRAU, Oliver. Arte Virtual. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 2005. High Tech Soul: The Creation of Techno Music. Direção: Maren Sextro e Holger Wick , 2006, Detroit, Estados Unidos IMPÉRIO, Flávio. Flávio Império/Renina Katz e Amélia Império Hamburger (orgs. ). São Paulo : Editora da Universidade de São Paulo, 1999. - (Artistas Brasileiros;13). p. 130-131. JACQUES, Paola Berenstein. Elogio aos Errantes. 2. Ed. Salvador: EDUFBA, 2014. JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Walter-Verlag AG Olten, 1976. LIBESKIND, Daniel. The Space of Encounter. Londres: Thames e Hudson. 1996. MAMBA NEGRA: The Sound and The Fury of São Paulo. Direção: Teo Mannu e Alessio Ortu. Produção de Subframe Media Production. Brasil, 2021. 15 minutos MAJOR, Mark; SPEIRS, Jonathan; TISCHHAUSER, Anthony. Made of Light: The Art of Light and Architecture. Basiléia, Suíça: Birkhäuser Basel, 2005. MARKE, Erik. A História da Música Eletrônica Brasileira. São Paulo: LiteraRUA, 2017. MARLEAU-PONTY, Maurice. Phenomenology of Perception. Oxion, Ingleterra: Routledge, 2012. MORAN, Nick. Performance Lighting Design: How to Light for the Stage, Concerts and Live Events. Londres: Methuen Drama, 2007.

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