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A Renascenqa e a Politica 9

0pensamento hMmanista-renascentista e sMas caracteristicas gerais

do terrno "tl~zrnanisrno"

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0 termo "Humanismo" foi usado pela primeira vez no inicio do 800 para indicar a area cultural coberta pelos estudos classicos e pelo espirito que Ihe e proprio, em contraposi@o ao bmbito das disciplinas cientificas. A palavra hu- manista, porem, ja era empregada pela metade do 400, e deriva de humanitas, que em Cicero e Gelio significa educa@o e forma- @o espiritual do homem, na qua1 tern papel essencial as discipli- Humanismo nas literarias (poesia, retdrica, historia, filosofia). essential

Ora, a partir sobretudo da metade do 300, e depois de mod0 representado sempre crescente nos dois seculos sucessivos, desenvolveu-se na pelas "litterae ltalia justamente uma tendencia a atribuir valor muito grande humanae" aos estudos das litterae humanae e a considerar a antiguidade + 9 1 classics, grega e latina, como um paradigma e um ponto de refe- rencia para as atividades espirituais e a cultura em geral. "Humanismo", portanto, significa em geral esta tendencia que, surgida essencialmente no seio da cultura italiana, pelo fim do 400 se difundiu em muitos outros paises europeus.

Entre os estudiosos contemporbneos do Humanismo, sobressaem princi- palmente P.O. Kristeller e E. Garin, cujas interpretac;ijes contrapostas resultam na realidade muito fecundas justamente por sua antitese el se prescindirmos de alguns pressupostos dos dois autores, podemos integrd-las mutuamente.

Segundo Kristeller, o Humanismo representaria apenas me- tade do fenbmeno renascentista e, melhor dizendo, a " literaria", ouas djfeEnte, na"o a filosdfica; portanto, ele seria plenamente compreensivel teses modernas apenas se considerado junto com o Aristotelismo que se desen- sobre o volveu paralelamente, e que expressaria as verdadeiras ideias fi- significado losoficas da epoca. filosdfico

Segundo Garin, ao contrario, os Humanistas se voltaram a de Humanism0 um tip0 de especu1ac;a"o na"o sistematica, problematica e pragmd- + 3 tica, e formaram novo metodo que, centrado sobre um novo sen- tido da historia, deve ser considerado como efetivo filosofat; a direc;(?o contem- plativo-metafisica em que o Humanismo italiano embocou desde a segunda me- tade do 400 teria sido portanto a consequencia do advent0 das Senhorias e do eclipsar-se das li berdades politicas republicanas.

Ora, e verdade que "humanista" indica originariamente a tarefa do litera- to, mas tal tarefa foi muito alem do ensino universitdrio, entrou na vida ativa e se tornou de fato "nova filosofia". Alem disso, o Aristdteles deste period0 foi um Aristoteles frequentemente lido no texto original, sem a mediaslio das tradu@es e das exegeses medievais; tratou-se, portanto, de um Aristoteles revisitado corn

novo espirito que apenas o Humanismo pode explicar. Por fim, a pOssibi'idade de integrar mutuamente as duas interpretac5es grande mudanca do pensamento humanista nlo esteve apenas ligada a uma mudanca politica, mas a descoberta e As tradu~aes de Hermes Trismegisto e dos Profetas-Magos, de Platlo, de Plotino e de toda a tradiclo platgnica. A marca que contradistingue o opostas Humanismo foil portanto, um novo sentido do homem e de seus +§3 problemas, novo sentido que encontrou expressdes multiformes e por vezes opostas, mas sempre ricas e freqiientemente muito originais, e que culminou nas celebrac$es teoricas da "dignidade do homem" como ser "extraordinario" em relaclo a toda a ordem do mundo.

Ha toda uma interminavel literatura critica sobre o periodo do Humanismo e do Renascimento. No entanto, os estudiosos n5o conseguiram chegar a uma definiqso das caracteristicas dessa Cpoca, capaz de reunir um consenso unhime, mas, pouco a pou- co, enredaram a tal ponto a meada dos va- rios problemas que hoje C dificil para o pro- prio especialista desenreda-la.

A quest50 revela-se ainda mais com- plexa pelo fato de que, nesse periodo, n5o ocorre apenas mudanqa no pensamento fi- losofico, mas tambCm, em geral, a mudan- qa da vida do homem, em todos os seus as- pectos: sociais, politicos, morais, literarios, artisticos, cientificos e religiosos. E tornou- se bem mais complexa ainda pel0 fato de que as pesquisas se tornaram predominantemen- te analiticas e setoriais, e os estudiosos apre- sentam a tendencia de fugir das grandes sin- teses ou at6 simplesmente das hipoteses de trabalho de carater global ou das perspecti- vas de conjunto.

Assim, C necessario antes de mais nada focalizar alguns conceitos bisicos, sem os quais nHo seria possivel sequer a exposiq50 dos va- rios problemas relativos a esse periodo.

Comecemos por examinar o pr6prio conceit0 de "humanismo". 0 term0 "humanismo" C recente. Pare- ce que foi usado pela primeira vez pel0 fi- losofo e teologo alemiio F. I. Niethammer (1766-1848) para indicar a area cultural coberta pelos estudos classicos e pel0 espi- rito que Ihe 6 proprio, em contraposiqHo com a area cultural coberta pelas disciplinas cien-

tificas. Entretanto, o termo "humanista" (e seus equivalentes nas varias linguas) nasceu por volta de meados do skulo XV, calcado nos termos "legistan, "jurista", "canonista" e "artista", para indicar os professores e cultores de gramatica, retorica, poesia, his- toria e filosofia moral. Ademais, ji no sku- lo XIV falava-se de studia humanitatis e de studia humaniora, expressoes referidas a famosas afirmagoes de Cicero e Gelio para indicar essas disciplinas.

Para os mencionados autores latinos, hu- manitas significava aproximadamente aqui- lo que os heknicos indicavam com o termo paideia, ou seja, educagiio e formaqiio do homem. Ora, nessa Cpoca de formaqiio es- piritual considerava-se que as letras, ou seja, a poesia, a retorica, a historia e a filosofia desempenhavam um papel essencial. Com efeito, siio essas disciplinas que estudam o homem naquilo que ele tem de peculiar, pres- cindindo de qualquer utilidade pragmatica. Por isso, mostram-se particularmente capa- zes niio apenas de nos dar a conhecer a na- tureza especifica do proprio homem, mas tambem de fortale&-la e potencializa-la.

Sobretudo a partir da segunda metade do Trezentos e depois, sempre de forma cres- cente, nos dois seculos seguintes (com seu ponto culminante precisamente no sCculo XV), verificou-se uma tendEncia a atribuir aos estudos relativos as litterae humanae um grande valor, considerando a antiguidade clas- sics, latina e grega, como paradigma e ponto de referkcia para as atividades espirituais e a cultura em geral. Pouco a pouco, os auto- res latinos e gregos se firmavam como mo- delos insuper6veis nas chamadas "letras hu- manas", verdadeiros mestres de humanidade.

Assim, "humanismo" significa essa ten- dhcia geral que, embora com precedentes ao longo da tpoca medieval, a partir de Fran- cisco Petrarca, apresentava-se agora de mo- do marcadamente novo por seu particular colorido, por suas modalidades peculiares e pela intensidade, a ponto de marcar o ini- cio de um novo period0 tura e do ensa amen to. na historia da cul-

Grande fervor nasceu em torno dos cl6ssicos latinos e gregos e de sua redesco- berta, do paciente trabalho de pesquisa de codices nas bibliotecas e de sua interpreta- qiio. Varios acontecimentos levaram a uma nova aquisiqiio do conhecimento da lingua grega, considerada patrim6nio espiritual essencial do homem culto (as ~rimeiras c5- > A tedras de lingua e literatura gregas foram instituidas no Trezentos, mas a grande di- fusiio do grego ocorreu sobretudo no Qua- trocentos. De mod0 especial, o Concilio de Ferrara e Florenqa, em 1438-1439, e, logo depois, a queda de Constantinopla, ocorri- da em 1453. levaram alguns doutos bizan-

L,

tinos a fixar moradia na Itdia, tendo por conseqiihcia um grande increment0 no en- sino da lingua grega).

0 ce'lehre "Davt " de M~chelangelo, nu muptade e nohreza dos traps, rejmsenta vtsua~rnentr, de rnodo puradrgmatl~o, o concerto do hornern conzo "o rnamr rnllugre" do unwerso, que constltnr umu das chaues esprrrtuurs mars tlpzcas du Renuscen~a. 0 "Davl" se encontra ern Floren~a, na Gulerra cia Academta, e utnu copra dele esta na P~uzza della Stgnorru.

,,,, As duas mais ~i~nificativas

Entre as interpretaqdes contempori- neas do " humanismo", duas sio as mais im- portantes por se referirem ao seu significa- do filosofico.

De um lado, P.O. Kristeller procurou limitar fortemente o significado filosofico e teorttico do humanismo, inclusive a ponto de elimini-lo.

Segundo esse estudioso, bastaria dei- xar ao termo o significado te'cnico que pos- suia originalmente, restringindo-o assim ao imbito das disciplinas retorico-literarias (gramatica, retorica, historia, poesia e filo- sofia moral).

Conforme Kristeller, os humanistas do periodo de que estamos tratando foram su- perestimados, sendo-lhes atribuido um pa- pel de renovaqio do pensamento que eles, na realidade, niio desempenharam, visto que niio se ocuparam diretamente da filosofia e da ciencia. Em suma, para Kristeller, os hu- manistas niio foram verdadeiros refor- madores do pensamento filosofico porque, de fato, niio foram filosofos.

Na visio de Kristeller, para compreen- der a Cpoca de que estamos falando, seria necessario dedicar atenqio h tradigdo aris- tote'lica, que tratava de mod0 sistematico da filosofia da natureza e da logica, que ja ha- via se consolidado fora da Itilia (sobretudo em Paris e Oxford) ha bastante tempo, mas que na Itilia so se consolidaria mais tarde. Diz Kristeller que foi na segunda metade do Trezentos que "comeqou urna tradiqiio con- tinua de aristotelismo italiano, a qual po- de ser seguida atravis do Quatrocentos e do Quinhentos e at6 por boa parte do Seis- centos".

Esse "aristotelismo renascentista" se- guiu os mCtodos proprios da "escolastica" (leitura e comentario dos textos), mas enri- quecendo-se com as novas influcncias huma- nistas, que exigiriam dos estudiosos e pen- sadores peripattticos que retornassem aos textos gregos de Aristoteles, deixassem de lado as traduqdes latinas medievais e fizes- sem uso dos comentadores gregos e tambCm de outros pensadores gregos.

Desse modo, destaca Kristeller, os es- tudiosos hostis h Idade MCdia confundiram esse aristotelismo renascentista com o resi- duo de tradi~oes medievais superadas e, por- tanto, como residuo de urna cultura ultra- passada, pensando que deviam deixa-lo de lado em beneficio dos "humanistas", verda- deiros portadores do novo espirito renas- centista. Mas, segundo Kristeller, tratar-se- ia de grave err0 de compreensiio historica, porque frequentemente a condenaqiio do aristotelismo renascentista foi feita sem urna efetiva consci2ncia daquilo que se estava condenando. A exceqio de Pomponazzi (do qual falaremos adiante), que no mais das vezes foi seriamente considerado, um grave preconceito condicionou o conhecimento desse momento da historia do pensamento. E necessario, portanto, estudar a fundo as questdes discutidas pelos aristotClicos italia- nos desse periodo: desse modo, cairiam por terra muitos lugares-comuns que so se man- tem porque foram continuamente repetidos, mas que carecem de base solida, emergindo consequentemente urna nova realidade his- torica.

Em conclusio, o humanismo repre- sentaria apenas uma metade do fen6meno renascentista e, mais ainda, a metade ndo filosofica. Assim, ele so seria plenamente compreensivel se considerado junto com o aristotelismo que se desenvolveu paralela- mente, o qual expressaria as verdadeiras idCias filosoficas da Cpoca. Ademais, segun- do Kristeller, os artistas do Renascimento niio deveriam ser vistos na otica do grande "genio criativo" (que constitui urna visiio romintica e um mito oitocentista), mas sim como "otimos artesiios", cuja excekncia n5o decorre de urna espCcie de superior adivi- nhaqiio dos destinos da cicncia moderna, e sim da bagagem de conhecimentos ticnicos (anatomia, perspectiva, mecgnica etc.), con- siderada indispensiivel para a pratica ade- quada de sua arte. Por fim, se a astronomia e a fisica realizaram progressos notiveis, niio foi por motivo de sua ligaqiio com o pensa- mento filosofico, e sim com a matematica. 0s filosofos tardaram a se harmonizar com essas descobertas, porque, tradicionalmen- te, n5o havia uma conexio precisa entre matematica e filosofia.

Diametralmente oposta C a reconstru- qiio de EugBnio Garin, que reivindicou ener- gicamente uma precisa valGncia filosdfica para o humanismo, notando que a negaqiio de significado filosofico aos studia huma- nitatis renascentistas deriva do fato de que, "no mais das vezes, entende-se por filosofia a constru~iio sistematica de grandes propor- @es, negando-se que a filosofia tambe'm pode ser outro tip0 de especula@o niio sis- tematica, aberto, problematico e pragma- tic0 ".

Alias, diz Garin, a atenqiio "filologica" para com os problemas particulares "cons- titui precisamente a nova 'filosofia', ou seja, o novo mitodo de examinar os problemas, que, portanto, niio deve ser considerado, ao lado da filosofia tradicional, como um as- pecto secundario da cultura renascentista, como acreditam alguns (basta pensar, por exemplo, na posiqiio de Kristeller que exa- minamos), e sim como o proprio filosofar efetivo ".

Uma das mais destacadas caracteristi- cas desse novo mod0 de filosofar t o senti- do da histdria e da dimensiio historica, com seu respectivo sentido de objetivaqiio e de afastamento critic0 do objeto historicizado, ou seja, historicamente considerado.

A esshcia do humanismo niio deve ser vista naquilo que ele conheceu do passado, mas sim no mod0 em que o conheceu, nu atitude peculiar que adotou diante dele.

Mas a tese de Garin niio se reduz a isso. Ele coloca a nova "filosofia" humanista na realidade concreta daquele momento da vida hist6rica italiana, tornando-a uma expres- S~O dessa realidade, a ponto de explicar com razoes sociopoliticas a reviravolta sofrida pe- lo pensamento humanista na segunda meta- de do Quatrocentos. 0 primeiro humanismo foi uma exaltaqiio da vida civil e das pro- blematicas a ela ligadas, porque estava vin- culado B liberdade politzca daquele momen- to. 0 advent0 das tutelas e o eclipsar-se das liberdades politicas republicanas transfor- mou os literatos em cortesiios e impeliu a filosofia para evas6es de carater contem- plativo-metafisico. ib?::

; Possivel mediaG6o sintLtica das duas inte~pretaq6es opostas

Na realidade, as teses contrapostas de Kristeller e de Garin revelam-se muito fe- cundas precisamente por sua antitese, por- que uma destaca aquilo que a outra silen- cia, podendo portanto ser integradas entre si, se prescindirmo? de alguns pressupostos dos dois autores. E verdade que, original- mente, o termo "humanista" indica o ofi- cio do literato, mas essa profissiio vai bem alCm do simples ensino universitario, entran- do na vida ativa, iluminando os problemas da vida cotidiana, tornando-se verdadeira- mente uma "nova filosofia".

Ademais, o humanista distingue-se efe- tivamente pel0 novo modo como 16 os clas-

"A Filosofia ", incisuo tirada da Biblioteca Ciuica "A. Mai" de Be'rgumo. 0 estudo du filosofiu antiga alirnentou o nouo espirito prescnte no pemamento hurnanistu-re~zascentista. Este esta ligado us trudup5es de Hcrmcs Trismegisto, tfos Profetus-Maps, ifc Pldtiio, rfe Plotitto c de toda a tradiqiio plutiinicu.

"A Kcttir~sir ", irzcrsiio tirilda cia Biblioteca Ci'clica "A. hlill" de Birg~tno. AS Iittcrae humanae sor~stlturrn o c-orupio du ~CM~~LLYLI hurnutzistil. lIntrc cstus rcsrrfwse pzrticuhr ateiz@o 2 rettjrica, porquc soizstitui elemento de continuitfade cJtztre a paidkia antiga e enodcrna.

sicos: houve um humanismo literario por- que surgiram novo espirito, nova sensibili- dade e novo gosto, com os quais as letras foram revisitadas. E o antigo alimentou o novo espirito, porque este, por seu turno, iluminou o antigo com nova luz.

Kristeller tem razio quando lamenta que o aristotelismo renascentista seja um capi- tulo a ser reestudado desde o inicio e tambCm tem razio ao insistir no paralelismo desse movimento com o movimento propriamen- te literario. Mas o pr6prio Kristeller admite que o Aristoteles desse period0 t um Aristo- teles freqiientemente procurado e lido no texto original, sem a mediaqio das tradu- qdes e das exegeses medievais, tanto que chega at6 a retornar aos comentadores gre- gos para ser iluminado. Assim, trata-se de um Aristoteles revisitado com novo espiri- to, que so o "humanismo" pode explicar. Portanto, Garin tem razio ao destacar o fato de que o humanismo olha o passado com novos olhos, com os olhos da "historian, e que so atentando para esse fato C que se pode compreender toda essa ipoca.

E a aquisiqio do sentido da historia significa, ao mesmo tempo, aquisiqiio do sentido de sua propria individualidade e originalidade. So se pode compreender o passado do homem quando se compreende sua "diversidade" em relaqio ao presente e, portanto, quando se compreende a "peculia- ridade" e a "especificidade" do presente.

Por fim, no que se refere excessiva vinculagio do humanismo aos fatos politi- cos, que leva Garin a algumas afirmaqdes que correm o risco de cair no historicismo sociologista, basta destacar que a grande mudanga do pensamento humanista nio esta ligada somente a uma mudanga politi- ca, mas tambim A descoberta e as tradu- qdes de Hermes Trismegisto e dos profetas- magos, de Platio, de Plotino e de toda a tradiqio plathica, o que representou a aber- tura de novos e ilimitados horizontes, de que falaremos adiante. De resto, o proprio Garin nio se deixou levar por excessos sociolo- gistas, como, no entanto, fizeram outros intirpretes por ele influenciados.

Concluindo, podemos dizer que a mar- ca que distingue o humanismo consiste em um novo sentido do homem e de seus proble- mas: um novo sentido que encontra expres- sdes multiformes e, por vezes, opostas, mas sempre ricas e freqiientemente muito origi- nais. Novo sentido que culmina nas celebra- q6es teoricas da "dignidade do homem" como ser em certo sentido "extraordinirio" em relaqio a toda a ordem do cosmo, como veremos adiante. Mas essas reflex6es teori- cas nada mais sio do que express6es concei- tuais que tim nas representaq6es da pintu- ra, da escultura e de grande parte da poesia as correspondincias visuais e fantistico-ima- ginativas que, com a majestade, a harmo- nia e a beleza de sua figuragio, expressam a mesma idtia, de varios modos, com esplin- didas variaqdes.

II. Conceito historiogr6fico, cronoIogia e caracteristicas da "Renascenca"

A categoria historiografica da "Renascenqa" se impbs no 800 graqas a 1. Burckhardt, segundo o quai a express%o designava um fenbmeno de origem tipicamente italiana, oposto a cultura medieval: um fenbme- no caracterizado pelo individualismo pratico e teorico, a par- A Renascenqa tir da exaltaqao da vida mundana, do acentuado sensualis- na defini@o mo, da mundaniza(;ao da religiao, da tendhcia paganizante, oitocentista da liberdade em relaqao as autoridades que no passado ti- +§ 1 nham dominado a vida espiritual, do forte sentido da historia, do naturalism0 filos6fic0, do extraordinario gosto artistico. "Renascenqa" se- ria, afinal, a sintese do novo espirito, que se criou na Ithlia, com a antiguidade: o espirito que, rompendo definitivamente com o da era medieval, abre a era moderna.

Em nosso seculo esta interpretaqao foi muitas vezes contestada, particu- larmente por K. Burdach. 0s Humanistas explicitamente usaram expressiies como "fazer reviver", "fazer renascer", e contrapuseram a nova era em que viviam com a medieval como a era da luz a era da 06s- curidade e das trevas. A ldade Media, porem, foi uma epoca de A Renascenqa nova grande civilizat;lo, percorrida por fermentos e frCmitos de vari- interpretaqao: os generos quase que desconhecidos aos historiadores do Oito- nascimento centos. Portanto, 0 "Renascimento" que constituiu a peculiari- de nova dade da "Renascenc;a" foi mais o nascimento de outra civilizaq~o, civiIizaqso de outra cultura: a Renascenqa representou grandioso fenbme- baseada no de "regenerasao" e de "reforma" espiritual, em que a volta sobre a volts aos antigos significou revivesc6ncia das origens, "retorno aos aOSanfig0s principios aut6nticos", e a imita@o dos antigos revelou-se como + 3 2-3 o caminho mais eficaz para recriar e regenerar a si mesmos. Em tal sentido, Humanismo e Renascen~a constituem uma so coisa, e o Humanismo torna-se fenbmeno literario e retorico apenas no fim, ou seja, quando se expan- de o novo espirito vivificador.

Do ponto de vista cronologico, o periodo humanista-renascentista ocupou inteiramente o 400 e o 500, mas seus preludios devem ser buscados ja no 300 (nas figoras de Cola de Rienzo e de Francisco Petrarca), enquanto o epllogo alcansa os primeiros decCnios do 600 (com a figura de Cmno/ogia e Campanella); do ponto de vista dos conteudos filos<5ficos, no 400 caracteristicas prevalece o pensamento sobre o homem, enquanto o pensamento essenciais do do 500 abrasou tambem a natureza. A Renascenqa representou periodo uma era diversa tanto da medieval, como da moderna (a qua1 humanists- comega corn a revolu@o cientifica, ou seja, com Galileu); assim renascentista como na ldade Media devem ser buscadas as raizes da Renascen- + 3 4-5 $a, por sua vez, na Renascenqa devem ser buscadas as raizes do mundo moderno, ou melhor, o epilog0 da Renascenqa e marcado pela propria revoluq%o cientifica.

f\ interpretaq2;o oitocentista da "Renascenca" como surgimento de novo espirito e de nova cultura que valorizam o w~uncfo antigo em oposi@o

A Jdade Mkdia

0 term0 "Renascimento", como ca- tegoria historiogrifica, consolidou-se no Oi- tocentos, em grande parte por mirito de uma obra de Jacob Burckhardt (1818-1897) intitulada A cultura da Renascen~a na Italia (publicada em Basiliia, em 1860), que se tornou muito famosa, impondo-se longamente como modelo e como ponto de referencia indispensavel. Na obra de Burck- hardt, a Renascenqa emergia como fen& meno tipicamente italiano quanto As suas origens, caracterizado pelo individualis- mo pratico e teorico, pela exaltaqio da vi- da mundana, pel0 acentuado sensualismo, pela mundanizaqio da religiiio, pela ten- dcncia paganizante, pela libertaqio em relaqio As autoridades constituidas que ha- viam dominado a vida espiritual no pas- sado, pelo forte sentido de historia, pel0 naturalism0 filosofico e pel0 extraordinii- rio gosto artistico. Segundo Burckhardt, a Renascenqa seria portanto uma ipoca que viu surgir nova cultura, oposta a me- dieval. E a revivesc$ncia do mundo anti- go teria desempenhado nisso um papel importante, mas nio exclusivamente deter- minante. Portanto, partindo da renascen- Ca da antiguidade, passou-se a chamar de "Renascenqa" toda essa ipoca, que, po- rim, i algo mais complexo: com efeito, i a si'ntese do novo espirito que se criou na Italia com a propria antiguidade - i o espirito que, rompendo definitivamente csm o espirito da ipoca medieval, inau- gurou a tpoca moderna.

Essa interpretaqiio foi muito contesta- da, por virias vezes, em nosso siculo. Alguns chegaram mesmo a duvidar que a "Renas- cenqa" constitua efetiva "realidade histo- rica" e nio seja muito mais (ou predomi- nantemente) uma invenqio construida pela historiografia oitocentista.

Variados e de diversos tipos foram os reparos trazidos sobre a questio.

Alguns observaram que, se atentamen- te estudadas, as varias "caracteristicas" con- sideradas tipicas do Renascimento podem ser encontradas na Idade Me'dia. Outros insistiram muito no fato de que, a partir do sic. XI, mas sobretudo nos sics. XI1 e XIII, a Idade MCdia pode ser considerada plena de "renascimentos" de obras e autores an- tigos, que pouco a pouco emergiam e eram recuperados. Conseqiientemente, esses au- tores negaram validade dos pariimetros tra- dicionais que durante longo tempo basea- ram a distinqiio entre a Idade MCdia e a "Renascenqa".

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