Prazer em Conhecer: Seis décadas de Prazeres Barbosa

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Enquadrada na categoria literária de Livro-Reportagem Biográfico, a obra apresenta o resultado da combinação perfeita entre um bom narrador frente a uma instigante e rica história de vida, digna de ser registrada e eternizada numa biografia. Muito mais que uma história para ser lida, a trajetória de vida da atriz Prazeres Barbosa - protagonista de um relato impressionante de luta, desafios e vitória -, apresenta-se como um exemplo de coragem e superação a ser segui-

Prazeres no palco é dona de nossas emoções. Na vida, ela se fez dona do seu destino e construiu história e trajetória dignas de registro. Uma pequena mulher, tão notável que vem merecendo aplausos em todas as esferas em que atua. Agora, ganha esta biografia que revela os cenários, as personagens, os dramas e as situações engraçadas que compõem a vida de uma pessoa que saiu do anonimato para fazer sua estrela brilhar. Ler sobre Prazeres é como acompanhar, pelos passos de uma autêntica nordestina – com sua intrínseca determinação e otimismo -, retalhos de um tempo de mudanças, de profundas transformações. É rever Caruaru dos anos 1970 onde as famílias da classe trabalhadora eram regidas por um moralismo limitante, em que a religião, o trabalho e o casamento eram os horizontes possíveis de uma “mulher direita”. É, também, refletir sobre as oportunidades deste momento, deste mundo construído pelos que “transgrediram” os limites de classe e sexo e ousaram ir além. Estes correram riscos, acreditaram em sonhos, choraram e riram mais alto, sem falsos pudores. Como fez Prazeres. O texto de Fernandino Neto tem a graça de Prazeres Barbosa. Sua sinceridade, seu jeito direto de não deixar dúvidas, sua forma obstinada, quase obsessiva, de perseguir objetivos e ganhar espaços. Tem também o encanto e a leveza de quem sabe aproveitar as alegrias do sucesso.

Prazer em Conhecer

Fruto do resultado de uma exaustiva e cuidadosa pesquisa jornalística e materializado inicialmente no formato de um trabalho de conclusão de curso de graduação em Jornalismo, o livro “Prazer em Conhecer” se revela uma obra de qualidade textual inquestionável. Um produto, para a nossa sorte, inteiramente à disposição dos apreciadores de uma boa e envolvente leitura.

Fernandino Neto

Muito mais que ter um domínio idiomático e manejar bem as regras gramaticais, expressando ideias e pensamentos, a arte de escrever bem requer algo que está além das normas técnicas. É preciso sensibilidade. E essas qualidades se encontram nesta obra.

Fernandino Neto do por todos e todas que não desejam desistir de seus sonhos. O livro traz um incontestável testemunho de que, de fato, não há idade nem tempo certo para ser feliz. Uma prova de que a única condição para tal é a de nunca desistirmos dos nossos sonhos, investindo neles, a cada dia de vida, sem deixarmos passar uma oportunidade sequer. O relato, de caráter impressionista, aqui registrado, ressoa como um exemplo de que a vida é contínua e que, como já disse certa vez o poeta: “O mundo dá muitas voltas e, cada volta que dá, muda ofertando-nos chances de também mudarmos de mundo, de vida...”

Prazer em Conhecer

Lucivanda Leite, jornalista

Seis décadas de Prazeres Barbosa

Trata-se de bela e rica obra biográfica que se enquadra perfeitamente dentro dos padrões de excelência desta modalidade da literatura jornalística, na qual o Brasil vem despontando com produções magníficas, muitas destas produzidas no campo acadêmico. A obra em questão é uma prova indiscutível desta realidade. Uma leitura, verdadeiramente, prazerosa!

Rosildo Brito, jornalista e professor



Prazer em Conhecer



Fernandino Neto

Prazer em Conhecer Seis décadas de Prazeres Barbosa


Copyright © Fernandino Neto, 2010 Projeto gráfico e criação de capa: Marcos Tenório (Agência Dzain’) Imagem da capa: Francisco Torres Revisão de texto: Maria do Carmo Queiroz Consultoria de texto: Rosildo Brito e Edson Tavares Todas as imagens utilizadas nesta obra pertencem ao acervo da biografada e foram utilizadas com a prévia autorização da mesma


Prefácio

PREFÁCIO O prazer de ler Prazeres

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estas quase quatro décadas, desde que tive meu primeiro contato com Prazeres Barbosa, o inusitado, a novidade, a surpresa, em relação a essa mulher são uma constante. Agora, com este livro, tenho acesso a histórias tantas da vida de Prazeres que percebo quão pouco a conhecia, ou quão enorme é o baú de acontecimentos dessa professora-atriz. Histórias de rir e de chorar, de emocionar, compõem este trabalho do Fernandino Neto, contadas em um estilo enxuto, fluente, agradável. Prazeres surge, nestas páginas, desnudada como poucas pessoas já tiveram a oportunidade de ver: seus sonhos, seus amores, seus sentimentos, suas verdades, seu mundo e suas conquistas transparecem aqui com a nitidez que sempre a caracterizou. Esse desnudamento realizado pelo biógrafo, que se faz cúmplice e admirador assumido da biografada, apresenta, como resultado, um texto que vale a pena ser lido, pelos que conviveram/convivem com Prazeres, como eu, como também pelos que não a conhecem senão “de nome”, ou nem isso. É uma história bastante interessante. Quanto de verdade ou de maquiagem há na narrativa, é supérfluo discutir. A Professora de História da Unicamp Vavy Pacheco Borges já alerta que “Ao narrar os acontecimentos de uma vida (...), os fatos passam por uma seleção permanente, pois não há outra forma para narrar uma vida a não ser selecionando o que nos parecer significativo (grifo da autora). Essa escolha (...) já é uma certa forma de interpretação, ou seja, uma atribuição de sentido.” O que importa, de fato, é que estamos diante de um trabalho amplo, de fôlego, tão agradável de ser feito (imagino) quanto de ser lido (tenho certeza). Muitas e diversas deverão ser as reações dos leitores ante esta leitura; a variação dar-se-á notadamente em função do grau de aproximação e de conhecimento que o leitor tenha com a biografada; essa variação, aliás, 1


Prazer em Conhecer já se percebe no próprio relato, em que o biógrafo, deixando transparecer seu lado jornalista, apresenta várias versões de fatos ligados à atriz, deixando ao leitor a possibilidade de tirar suas próprias conclusões. Fernandino é consciente de que, como afirma Pierre Bourdieu, “Tentar compreender uma vida como uma série única e por si suficiente de acontecimentos sucessivos, sem outro vínculo que não a associação a um ‘sujeito’ cuja constância certamente não é senão aquela de um nome próprio, é quase tão absurdo quanto tentar explicar a razão de um trajeto no metrô sem levar em conta a estrutura da rede, isto é, a matriz das relações objetivas entre as diferentes estações”. Em suma, Prazeres Barbosa não é só Prazeres Barbosa, mas Prazeres Barbosa mais tudo aquilo que compõe o seu mundo. Daí que se, por vezes, sentirmo-nos incomodados ou desconfortáveis com algum fato aqui narrado, não é motivo para desespero ou decepção, mas de constatação de que, como diz Giovani Levi, “Os atores históricos” não seguem “um modelo de racionalidade anacrônico e limitado” – geralmente o nosso –, nem são detentores de “uma personalidade coerente e estável”, como imaginamos que deveriam ter, muito menos que de sua história de vida constassem apenas “ações sem inércia e decisões sem incertezas”. Prazeres é, antes de tudo, um ser humano, com todos os conflitos, todos os altos e baixos, todas as certezas e incertezas que compõem as pessoas normais, independente de quanto voem alto. E ela voa. Arrisca revoadas audaciosas, com a certeza de seu talento e o medo de não dar certo. Fernandino, como piloto competente, soube conduzir com mestria mais este voo, cujo resultado faz-se um delicioso produto de leitura em nossas mãos. Delicioso e porque prazeroso – se me permitem o inevitável trocadilho.

Edson Tavares, professor e doutorando em Teoria da Literatura Julho, 2010 2


A Prazeres, por seu exemplo de vida e pela capacidade de realizar sonhos.

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Prazer em Conhecer

SUMÁRIO

Apresentação...................................................................................5 Agradecimentos..............................................................................8 1. De Caruaru para Hollywood......................................................11 2. A menina do laço branco...........................................................23 3. Prazeres nas trilhas do Magistério..............................................39 4. Teatro, prêmios e consagração....................................................58 5. A atriz mais premiada do teatro pernambucano.......................79 6. Amores e poesia.......................................................................109 7. Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia..141 8. Prazeres por Prazeres...............................................................179 9. Olhares sobre Prazeres.............................................................185 Meus Introspectos........................................................................223 Prazeres em Imagens...................................................................241 Mídia Consultada.......................................................................269

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APRESENTAÇÃO

A boa pesquisa, a tomada de testemunhos e o acesso a documentos, recortes, vídeos e gravações são determinantes para a qualidade do texto (de não-ficção) quanto à preocupação estética. Fernando Morais

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ideia de criação desta obra biográfica surgiu no terceiro período da graduação em Jornalismo, no final do primeiro semestre de 2007, quando nos foi proposta a realização de uma atividade interdisciplinar, de tema livre, em que pudéssemos aplicar as técnicas de reportagem e entrevista, redação jornalística e noções de planejamento gráfico. Embora nunca houvesse assistido a nenhuma das peças ou filmes de que Prazeres Barbosa participou, nutria profundo sentimento de admiração por seu trabalho, sobretudo, pela repercussão que a mídia garantia ao mesmo. Decidi, então, entrevistá-la. Consegui o seu contato telefônico e, poucos dias depois, fui recebido por uma simpática senhora baixinha e com forte sotaque, em sua residência, no bairro Caiucá, em Caruaru (PE). A primeira impressão que tive foi de estar adentrando num museu. Fotografias e recortes de jornais emoldurados nas paredes, inúmeros troféus e todo o acervo de cenários e figurinos utilizados em seus trabalhos estavam expostos. A entrevista transcorreu naturalmente. Antes de ir embora, ainda provei do doce de goiaba feito pela atriz (sua principal especialidade culinária). Deixei aquela casa impressionado com a criatura fantástica que conheci e, sobretudo, com a rica trajetória artística da qual a pequena mulher era detentora. Queria urgentemente publicar as informações que obtive. Não satis5


Prazer em Conhecer feito com o fato de apenas entregar minha atividade aos professores, submeti a reportagem à apreciação da chefia de redação do Jornal Vanguarda de Caruaru que, para minha surpresa, dedicou uma página inteira a publicação dos meus escritos sobre a atriz caruaruense de destaque nacional. Nessa época, Prazeres começava a dar os primeiros passos rumo às produções televisivas nacionais. Havia filmado a microssérie A Pedra do Reino e fazia as últimas apresentações do espetáculo Whisk pra Guiomar. Na noite de 17 de julho de 2007, tive o privilégio de vê-la em cena pela primeira vez, encarnando a “metralhadora verborrágica” Guiomar, numa apresentação especial em homenagem aos 45 anos do Teatro Experimental de Arte (Tea). O palco do Teatro João Lyra Filho tornou-se um tanto pequeno para o talento que os meus olhos enxergavam naquela atriz. No final, fui cumprimentá-la. Daí em diante, procurei manter-me informado sobre todos os acontecimentos sucessivos de sua carreira. Continuei escrevendo matérias e submetendo a análise do mesmo jornal, que garantiu a publicação de todas elas. Num de nossos contatos, criei coragem e falei a Prazeres do meu desejo de escrever sua biografia. Ela aprovou a ideia e, em seguida, passei a pesquisar o máximo de informações possíveis e assistir a tudo que estivesse ao alcance para conhecer mais sobre aquela mulher. A conclusão deste trabalho, no entanto, só foi possível graças à gentil colaboração de uma série de pessoas, com as quais temos uma grandiosa dívida de gratidão. Foi necessário cerca de um ano e meio de pesquisas, algumas viagens a Recife, Limoeiro, Arcoverde (PE), Maceió (AL) e mais de trinta horas de gravações para que a obra finalmente pudesse ser concluída. Coletamos depoimentos de mais de nove dezenas de pessoas. A pesquisa, no entanto, tornou-se ainda mais completa graças às personalidades metódicas de Prazeres Barbosa e Severino Florêncio (supervisor de cultura do Sesc Caruaru), que tiveram o cuidado de arquivar todo o material publicado pela imprensa ao longo das últimas três décadas. No processo de captação das informações, realizamos entrevistas valiosas que ajudaram a reconstituir acontecimentos importantes para a obra. Na tentativa de ser equânime, convém citar que nem tudo pode ser 6


explicado, porque não existe uma explicação lógica para todas as coisas. O ato de biografar um indivíduo nos coloca diante de um cenário multifacetado, onde o desconhecido nos surpreende a cada momento. Ao tentar escrever as primeiras linhas deste livro, comecei a perceber como é problemático presumir que sabemos muito sobre uma pessoa. O escritor americano Paul Auster disse certa vez que: “Escrever é como arrancar um dente todo dia”. Amanhã, todas essas verdades podem ser mentira. Hoje, porém, esta é a melhor verdade sobre a trajetória de Prazeres Barbosa, uma vez que não representa a verdade do autor, mas a verdade de fatos devidamente checados junto às diversas fontes de informação. Aos leitores, uma consideração final. Que possam sentir, ao folhear cada página desta história, o mesmo PRAZER que sentimos ao escrevê-la. O autor

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Prazer em Conhecer

AGRADECIMENTOS

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ntes mesmo de ser publicada, esta obra biográfica já se revelou vitoriosa. Produzido como Trabalho de Conclusão do Curso de Jornalismo, pela Faculdade do Vale do Ipojuca (FAVIP), obteve a nota máxima da banca examinadora, durante a defesa, ocorrida em 1º de dezembro de 2009. Em junho deste ano, esteve entre os finalistas do prêmio Expocom 2010 (Exposição da Pesquisa Experimental em Comunicação), na etapa regional. A Expocom é a maior referência de trabalhos acadêmicos na área da Comunicação do Brasil e visa a estimular o desenvolvimento e aprimoramento da pesquisa experimental, promovendo o intercâmbio entre escolas, professores e estudantes, além de apresentar à comunidade acadêmica nacional e ao mercado os novos talentos e suas produções. O evento ocorreu paralelamente ao XII Intercom (Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste), promovido entre os dias 10 e 12 de junho, em Campina Grande (PB). Reconhecemos aqui a colaboração direta e indireta de alguns personagens importantes para a finalização deste ensaio biográfico: Deus, meu pai e amigo fiel nas horas de dificuldade; Prazeres Barbosa, por haver confiado em minhas mãos o seu destino (como ela mesma colocou) e por não medir esforços para que pudéssemos chegar até aqui. Ao jornalista Rosildo Brito (UFCG), meu professor, amigo e parceiro acadêmico, responsável pela orelha do livro. Minha gratidão aos meus pais, José Fernando e Penha Gonçalves; minhas irmãs: Vladênia, Paula, Fernanda, Farannay, Fauzia e irmãos: Mattheus, Yohanan e Miguel; José Inácio (meu cunhado) e à minha sobrinha Giovanna Gabrielly. À minha avó Amara Gonçalves e bisavó Maria Pereira (in memoriam) que foram o esteio de nossa família. Aos amigos, de perto e de longe, que me encorajam e incentivam a lutar por meus sonhos; em especial a Valdenio Lira, meu melhor amigo, por sua amizade, companhei8


rismo e apoio. Agradeço ainda a todos os parceiros, que acreditaram neste projeto. Sem eles, a publicação não seria possível. Recebam meu abraço! Meus sinceros agradecimentos à professora Maria do Carmo Queiroz que, aos 92 anos, continua a nos ensinar com a própria vida e revisou todo o texto; ao professor Edson Tavares, pelo brilhantismo com que prefaciou este livro e à amiga Lucivanda Leite pelas palavras que tão bem descreveram a essência da obra. Não poderíamos encerrar sem pedir desculpas às fontes por eventuais equívocos. Qualquer imprecisão contida na narrativa deve ser atribuída sempre ao escritor, jamais aos entrevistados. A todos, o nosso agradecimento. Abaixo, registramos, em ordem alfabética, os nomes daqueles que colaboraram com seus depoimentos para o desenvolvimento deste livro-reportagem-biografia. Alexandre César, Alexandre Ferraz, Anastácio Rodrigues, Arary Marrocos, Argemiro Pascoal, Benício Júnior, Bernardo Barbosa, Bernardo Filho, Carmelita Pereira, Cabeto Pereira, Carminha Anunciação, Cervanttes, Chrystian Arruda, Claudio Soares, Cleonice Matias, Didha Pereira, Diva Galvão Cavalcanti, Doralice Feliciano, Edileuza Portela, Ednilson Leite, Edson Tavares, Eduardo Morotó, Eliane Luna, Everaldo Fernandes, Fabiana Karla, Fábio André, Fátima Almeida, Fernando Barbosa, Fernando Teixeira, Francisco Torres, Gabriel Sá, Gilberto Brito, Haroldo Bernardino, Ivan Bulhões, Ivan Feitosa, Ivonete Melo, Jaciara Fernandes, Janduy Mota, Jarbas Vasconcelos, João Lyra Neto, Jorge Gomes, Jorge Souza, José Caxiado, José Manoel Sobrinho, José Pereira, José Queiroz, Jotta Lagos, Júlio Filho, Junior Almeida, Karina Barbosa, Kelly Moura, Laura Gomes, Leidson Ferraz, Leila Gorayeb, Leonardo Chaves, Lucimary Passos, Lucivanda Leite, Luiz Felipe Botelho, Marcolino Junior, Marcos Bezerra, Maria Alves, Maria da Glória Barbosa, Maria da Glória Filha, Maria da Paz Barbosa, Maria das Mercês Barbosa, Maria das Neves Barbosa, Maria do Carmo Queiroz, Maria do Socorro Barbosa, Maria Helena Vila Nova, 9


Prazer em Conhecer Mércia Lyra, Miriam Lacerda, Moisés Gonçalves, Natale Gontijo, Neide Mota, Nildo Garbo, Onildo Almeida, Paulo Magrinny, Renilda Cardoso, Roberto Carlos, Romualdo Freitas, Sebastião Alves, Severino Florêncio, Sheila Tavares, Sônia Raposo, Tony Gel, Vergílio Barbosa, Vital Santos, Wagnner Sales, Walmiré Dimeron, Walter Reis e Williams Sant’Anna. Caruaru, setembro de 2010

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Capítulo 1

De Caruaru para Hollywood

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Prazer em Conhecer

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acarepaguá, Rio de Janeiro. Abril de 2009. Numa manhã ensolarada, tipicamente carioca, um telefone começa a tocar. Após algumas poucas chamadas, a ligação é atendida. A origem do telefonema é de uma empresa próxima daquele apartamento, localizado entre a Barra da Tijuca e Jacarepaguá: a produtora o2 Filmes. A pessoa responsável pela chamada logo se identifica. Trata-se de Rosa Fernandes, uma profissional que presta serviços à o2, empresa que possui além da sede principal, em São Paulo, uma filial no bairro Humaitá, na cidade do Rio. No comando da produtora está o arquiteto Fernando Meirelles – renomado produtor de longa-metragens como Cidade de Deus (2002). Do outro, está uma atriz pernambucana, que mora há três anos no Rio de Janeiro. Sua estada na Cidade Maravilhosa tem uma conotação muito especial. A realização do sonho que durante anos a fio acompanhou a sua trajetória de vida. É também um momento interrogativo, de surpresas. Nordestina, natural de Caruaru, a mulher de apenas 1,45m e pesando 55 kg, está prestes a receber uma das mais profícuas propostas de sua carreira profissional. Ela está em casa, cuidando dos afazeres domésticos. Um apartamento na Rua Aroazes, com dois quartos, dois banheiros, sala de TV e música, uma imensa varanda com vista privilegiada, cozinha e área de serviço. Quanto aos móveis, o espaço proporciona conforto e versatilidade. Tudo é muito projetado e agradável. No prédio: piscina, sala de ginástica, churrasqueira e campinho de futebol. Com ela, moram o esposo e seu único filho. Adepta do estilo interiorano de vida é do tipo que sempre que pode dorme cedo e levanta com o sol, a fim de tornar o dia mais produtivo. Ao acordar, cumpre um ritual sagrado: antes mesmo de escovar os dentes, tomar banho e se alimentar, canta a sua música favorita. A Natureza das Coisas, de Aciolly Neto. “Se avexe não, que amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada”. Estes versos estão sempre na ponta de sua língua. A canção pode ser considerada a trilha sonora da vida desta mulher, simples e destemida, ingênua e corajosa, tímida e ao mesmo tempo perspicaz. 12


Capítulo 1 - De Caruaru para Hollywood - Alô, é Prazeres Barbosa? - Sim, quem é? - Aqui é Rosa, da produtora o2 Filmes. - Como você está? - Tudo bem! - É que a gente tá produzindo um filme de Sylvester Stallone. Eu não sei se você topa, se lhe agrada muito aquele péi, péi, péi (referindo-se ao barulho provocado por tiros). - Com quem, com Sylvester Stallone? - É, uma coisa assim. A gente tá fazendo a produção e tá precisando de uma pessoa da sua idade. Quer fazer um teste? - Ave Maria, é tudo que eu quero. - Então vamos marcar. Com o endereço e todos os detalhes em mão, a primeira dificuldade seria encontrar o local dos testes. A filial da o2 no Rio de Janeiro. O desafio estava lançado. Ela iria precisar de sorte e, neste caso, de talento. Aliás, foram o talento, a experiência e a criatividade os ingredientes responsáveis pela aprovação nos dois testes que se seguiriam. Quando chegou à o2 Filmes, vários atores já estavam lá. Alguns conhecidos, pessoas envolvidas em trabalhos dos quais Prazeres integrara o elenco, a exemplo da microssérie A Pedra do Reino. Um deles, o ator Charles Paraventi, que atuou no filme Espelho D’água e estava pleiteando uma vaga na produção americana. Por dominar o inglês, ficou sendo a via dos atores brasileiros com os americanos. Prazeres não sabia como o processo iria ocorrer. A produtora foi enfática: “Nem a gente sabe o que é para fazer”. Instantes depois, a coisa mudaria. - É o seguinte: você é uma pessoa muito pobre e vêm uns caras baterem no seu marido. Vocês estão em casa, os caras batem nele e você simplesmente pede clemência, explicou a produtora. - Só que eu nem sei inglês, nem sei francês e nem sei língua nenhuma, deixou escapar uma medrosa Prazeres, percebendo que ali ninguém dava nada por ela, até então. - Não, você vai fazer do jeito que quiser. 13


Prazer em Conhecer Em seguida, perguntou à produtora qual o espaço disponível para a cena. Ela apontou. Querendo mostrar que dominava o assunto, questionou a dimensão e logo ficou sabendo que contava com todo o espaço daquela sala. Ansiosa, quis começar imediatamente. Ao som do “Preparando, pronto, ok”, deu início à gravação. “Aí o santo baixou. Eu fiz lá uma cena, como se eles tivessem me agarrando pelo pescoço, porque ela disse que eu seria sufocada. Então eu mesma fiz em mim, como se o marido tivesse ali sendo atacado. Quando terminei, ela disse: - “porra! Ninguém dá nada por tu, mulher! (risos)”. “Então, deu certo?”, perguntou Prazeres, um pouco mais calma. “Nossa, bom demais”, respondeu a produtora, avisando que agora iriam refazer a cena, focando apenas o rosto e que, por esse motivo, ela não exagerasse na estripulia. A atriz fez tudo novamente, sabendo que agora apenas a sua face estava sendo analisada, entretanto procurou manter a mesma energia com que iniciou os testes. Terminada a primeira fase, ela voltou para casa, onde aguardaria o resultado de tudo aquilo. Alguns dias depois, o telefone tocou novamente e com ele mais uma notícia positiva: Prazeres estava entre as selecionadas. Aquilo a deixou muito feliz, afinal, embora a o2 estivesse realizando os testes, a escolha das finalistas cabia ao diretor do filme, intitulado The Expendables: o ator Sylvester Stallone. A segunda etapa da seleção foi marcada no Sofitel Acuor Hotéis e Resort, localizado na Avenida Atlântica, em Copacabana – um dos redutos de Prazeres no Rio. Antes de concluir a ligação, Rosa fez uma advertência. Para surpresa e nervosismo de Prazeres, a aprovação - ou reprovação - seria determinada pelo próprio Stallone. No dia e hora marcados, ela chegou ao local. O Sofitel Rio de Janeiro, considerado um dos melhores hotéis da cidade - 388 quartos com varandas, serviços executivos especiais e uma excelente culinária. Diante da grandiosa estrutura do empreendimento, Prazeres sentiu-se um pouco insegura, mas resoluta, afinal, estava ali com um propósito. Sofregamente, subiu até o terceiro andar. Havia uma ante-sala onde as pessoas aguardavam o início dos testes. Em seguida, foram chegando 14


Capítulo 1 - De Caruaru para Hollywood outras atrizes. A produtora também estava lá. Na tentativa de levarem alguma vantagem no processo de seleção, algumas das concorrentes diziam falar vários idiomas. Prazeres era uma das poucas que estavam caladas. Diante disso, desanimou-se ainda mais. No interior da ante-sala onde aguardava sua vez de fazer o teste, havia uma porta misteriosa. Todos diziam não saber o que estava lá dentro. Quando a maratona foi iniciada, as atrizes entraram, uma a uma, naquele lugar. A ansiedade aumentava cada vez mais. Como todas disputavam uma vaga para a mesma personagem, Prazeres decidiu ir ao banheiro e retirar as sobrancelhas (contornadas por lápis) e também o batom dos lábios. “Fui com um vestido que dá ideia de eu ser uma pessoa muito velha. Fui mais ou menos prevenida”, recorda. Os testes continuaram até que chegou a sua vez. Finalmente, saberia o que estava por trás daquela misteriosa porta. “Quando eu entrei, avistei uma mesa enorme, cercada de gringos, como se fosse passar por um júri, uma prova de fogo. E no centro, Sylvester Stallone. Eu não o vi de imediato, mas sabia que ele estava na sala”. Num local próximo a mesa, estava o ator Charles Paraventi que serviu como elo entre brasileiros e estrangeiros. Ele olhou para Prazeres e explicou como seria a seleção. Durante a cena, ela estaria atendendo em uma espécie de bar e deveria perguntar a alguém que chegasse ao local: Quieres algo señore? (Deseja alguma coisa, senhor?). Impressionada, reagiu: “Só isso?”. Charles respondeu: “Só isso. Pode dizer”. A criatividade naquele momento falou mais alto que o próprio nervosismo e insegurança que sentiu ao deparar-se com o luxo do hotel e a empáfia de outras atrizes. Um peixe fora d’água. É assim que Prazeres se sente em ambientes de luxo, formais, ao lado de pessoas esnobes. Uma sensação que certamente irá acompanhá-la pelo resto da vida. Hipocrisia social é algo que nunca calhou com ela. Prazeres deveria fazer a cena olhando para Charles. Essa era a regra. Ao mesmo tempo, estava sendo observada por todos os executivos sentados à mesa. Aos poucos, foi arriando, arriando e fitando todos os homens que ocupavam os assentos, até encontrar Stallone. Quando os seus olhos fitaram os dele, revestiu-se de uma força maior que a acompanha quando 15


Prazer em Conhecer sobe ao palco e perguntou: “Quieres algo señore?”. É bem provável que naquele momento ela tenha pensado em fazer como todas as outras. Mas optou pelo diferente. Uma atuação autêntica e ao mesmo tempo arriscada, ousada o bastante. A reação de todos aqueles homens importantes, diante da pequena mulher estarrecida, foi uma só. Impressionados, fizeram aquele gesto com a cabeça de quem está admirando algo. Os semblantes devolveram a Prazeres a confiança e acrescentaram a sua mente ainda duvidosa a certeza de que seria aprovada. Ao deixar a sala, a produtora veio em sua direção e disse que não fosse embora. Todas as atrizes já haviam ido. O próximo passo seria a gravação do filme, que recebeu o nome de Os Mercenários, na versão brasileira, distribuída pela Califórnia Filmes. E esta reservaria outras surpresas. No dia das filmagens, dois acontecimentos marcantes. Primeiro, ela ficou sabendo que iria dividir a cena com baratas (o inseto que lhe causa fobia). Ao mesmo tempo, descobriu que iria atuar com o próprio Stallone, diretor e protagonista do longa hollywoodiano. As gravações ocorreram no Largo de São Francisco da Prainha, próximo à Praça Mauá, no centro do Rio de Janeiro. Desocuparam tudo. A cena foi rodada num galpão onde a personagem vivida por Prazeres comercializava alimentos sujos. Um estabelecimento precário. Ela aprovou o figurino usado. Uma blusa meio fofa e saia larga. Durante os ensaios, outra surpresa. Stallone observou que a barata estava sem vida e ordenou que trouxessem outras. O que foi atendido prontamente. Quando soltaram os insetos, Prazeres não suportou. Os animaizinhos logo se espalharam pelo estúdio, causando pavor e histeria. Nos ensaios, ela percebeu que outro ator (que também divide a cena com Stallone) segurou uma das baratas e cochichou algo, como se estivesse pedindo para jogá-la sobre ela. Embora não entendesse perfeitamente o idioma, deduziu que essa era a intenção. Stallone não aprovou. “Foi um cara arretado, porque se ele tivesse dito ok, o ator teria jogado a barata em cima de mim. Eu nunca vou esquecer isso, porque eu jamais imaginei que fosse contracenar com uma barata. A cena acontecendo e a barata lá, sai mas não sai do prato de amendoins, e eu pedindo a Deus que 16


Capítulo 1 - De Caruaru para Hollywood ela ficasse quieta” (risos). A cena não é extensa, deve durar pouco mais de um minuto. Entram os dois atores, Prazeres está atrás do balcão e diz: “buenas tardes señores, quieres algo?”. Adiante eles percebem as péssimas condições em que se encontram os alimentos e seguem conversando. Todavia, o fato de ser uma produção internacional confere a atriz motivos de sobra para estar satisfeita com a novidade. No intervalo das gravações, reencontrou um rapaz que havia trabalhado no filme A Máquina, por trás das câmeras. “Olhe, as maiores estrelas da Globo queriam estar no seu lugar. Então se sinta privilegiada porque você foi a escolhida”, disse, maravilhado por vê-la ali. No mesmo dia, esteve também com a atriz Gisele Itiê, que participa do longa. A proibição no sentido de não poder entrar no set portando câmera fotográfica a impediu de registrar aqueles momentos. O fato de não dominar o inglês foi um empecilho para que pudesse travar um contato maior com Stallone, mesmo assim cumprimentou-o diversas vezes, contracenou a seu lado e almoçou com toda a equipe de gravações. O convite para uma produção internacional não ocorreu por acaso. Ao longo de quase 30 anos de carreira, Prazeres Barbosa participou de vários filmes, curtas e longas metragem, regionais e nacionais, a exemplo de Espelho D’água (2001), do diretor Marcus Vinícius Cézar; As Três Marias (2002), de Aluízio Abranches, exibido no Festival de Cinema de Berlim e A Máquina (2004), de João Falcão, quando interpretou a velha Prazeres, seu principal personagem em cinema até aqui. O retorno proporcionado pela produção foi tanto que, na época, ela foi convidada para fazer um cadastro no sistema de atores da Rede Globo de Televisão, estreando, algum tempo depois, num episódio do extinto seriado A Diarista (2005). Esse histórico no cinema e também na televisão permite que produtores se familiarizem com o trabalho do artista, uma vez que estão sempre de olho em novos talentos. Daí o motivo de Prazeres ter sido convidada para participar da seleção por uma pessoa desconhecida dela, mas que conhecia o seu trabalho. Na verdade, a atriz nunca esperou que aquilo pudesse acontecer. Chegar à Globo sempre foi o seu maior sonho. Mas, participar de uma 17


Prazer em Conhecer produção americana, ao lado de um ator consagrado no mundo inteiro, estava longe de tudo que pudesse imaginar. “Eu sou uma pessoa ousada, mas não tenho noção do que fiz ou posso fazer”. As surpresas não acabaram por aí. Ao chegar a casa, às 23h, encontrou sobre a cama um presente muito especial. Uma colônia e um cartão com a seguinte mensagem: “Flor de laranjeiras para perfumar a mais nova flor de Hollywood”. O responsável pela emoção vivenciada naqueles instantes foi o jovem Vergílio Barbosa, seu filho. A homenagem completou a felicidade daquele dia inesquecível para a mulher que ao longo da vida dedicou-se a três tarefas nada fáceis – ser mãe, professora e atriz. Esta última iniciou aos 32 anos, tornando-se a dama do teatro pernambucano. A atriz mais laureada de seu Estado; principal referência das artes cênicas em Caruaru, a 130 quilômetros da capital Recife. Como professora, Prazeres experimentou em salas de aula uma trajetória marcada por altos e baixos, assim como qualquer outra. Mas nunca foi uma professora qualquer. Diretoras, colegas de profissão e ex-alunos reconhecem o diferencial da profissional que foi. Muito jovem, mesmo sem diploma, já lecionava ao lado de suas irmãs num externato criado no intuito de preparar estudantes para a prova de Admissão ao Ginásio – requisito de ingresso no curso ginasial daqueles tempos. O amor pelo ensino e pela formação de pessoas não daria a Prazeres apenas uma aposentadoria por tempo de trabalho. Foi lecionando que conheceu seu primeiro namorado, com quem se casaria e teria um filho, e começou a dar os primeiros passos no teatro dirigindo espetáculos infantis na Escola Elisete Lopes, em Caruaru. Lá, liderou diversos movimentos, que envolviam a comunidade, e criou um grupo de teatro amador que lhe garantiu acesso ao teatro local e o primeiro prêmio no segmento. Da infância pobre e do modo como foi educada, adquiriu alguns costumes e formas de enxergar o mundo, decisivos para a história de vida que construiu. Em casa, sempre assumiu o papel do homem. Administrando bem o pouco que ganhava, conseguiu manter-se a vida inteira de forma independente. Desde cedo mostrou que nasceu com talentos nada comuns para a realidade em que foi criada. No bairro São Francisco, em 18


Capítulo 1 - De Caruaru para Hollywood Caruaru, a menina Prazeres se sobressaía entre as demais. Brincava de pastoril, teatro e escolinha, sempre liderando o grupo. Aos 10 anos, apaixonada pela programação da extinta Rádio Difusora local, decidiu participar de um programa de calouros, tornando-se uma das cantoras mirins mais requisitadas da época, por sua voz afinada. A TV Jornal do Commercio, no Recife, chegou a cotá-la para sua programação, mas a mãe não permitiu. Na adolescência, descobriu outras paixões. Sem poder tocar à frente o sonho de ser cantora, decidiu apostar no ensino. Aliás, desde criança estes eram os seus maiores sonhos: ser professora e atriz. A oportunidade de ingressar no teatro só iria se concretizar em 1982, quase de forma inesperada, quando foi convidada para integrar o recém-criado Grupo de Teatro do Sesc. Naquele momento, Prazeres enfrentava uma das piores fases de sua vida. O casamento fracassado a abalou profundamente. Depressiva, resolveu declarar guerra aos homens. Àquela altura, já havia optado por abandonar inclusive a religião protestante, que abraçara ainda na adolescência. O teatro seria o fulcro e o campo de glórias daquela jovem mãe solteira. Após um período de incertezas, ela aceitaria o convite. A decisão traria consequências ainda mais marcantes à sua trajetória. Primeiro, a notícia de que estava fazendo teatro não agradou aos familiares. Teatro naqueles tempos, embora a coisa já estivesse caminhando para a modernidade, ainda era atividade de “desocupados” e “pervertidos”. Em seguida, Prazeres conheceria o seu segundo amor, o ator Francisco Torres, que também estava com seu casamento desgastado. O romance seria a gota d’água. Separada, com um filho, fazendo teatro e namorando um homem casado. Bastou que a família ficasse sabendo da “nova” vida da filha caçula para que os elos de amizade fossem rompidos. Todos se afastaram dela. Com exceção da mãe, que sempre apoiou a filha, ainda que não concordasse com a postura desta. A situação continuaria assim por um bom tempo. Até que o sucesso do Grupo do Sesc – e de Prazeres, vale a pena citar –, transformasse de vez a vida da professora-atriz. A trajetória promissora no teatro logo a encaminharia ao cinema. E, em seguida, abriria portas na maior emissora de televisão brasileira. 19


Prazer em Conhecer A mulher, que há quase três décadas enveredou pelas artes cênicas, já passou fome, chegou a mergulhar fundo na depressão, perdeu um irmão ainda jovem de forma trágica, enfrentou o desprezo da família, inconformada com a postura adotada ao ser abandonada pelo marido, bateu de frente com pessoas que se mostraram injustas e calou em muitas ocasiões, como diante dos impropérios que ouviu ao longo da vida por tomar decisões que sempre iam de encontro ao que esperavam dela. Também fez plástica para melhorar a aparência e, após anos de relação estável com seu segundo esposo, deu-se ao luxo de viver um “romance de verão” com um rapaz mais jovem. Paralelamente, sua carreira artística é o que mais a envaidece e orgulha. Prêmios, troféus, homenagens e títulos ela possui em extensa quantidade. Uma relação espetacular. Dinheiro praticamente não ganhou com teatro. Nunca enriqueceu. O que sempre a sustentou foi a aposentadoria de professora, cujo valor não vale a pena citar. Um salário irrisório, como o que ainda hoje recebem aqueles que optam pelo ensino em escolas públicas no Brasil. Com a rara exceção de alguns filmes nacionais e trabalhos na televisão, nunca recebeu, de fato, um retorno financeiro considerável pelo trabalho como atriz. Mesmo assim, ela prossegue com o mesmo ímpeto dos tempos em que iniciou a carreira. Economista, daquelas que depositam R$10,00 numa conta poupança para garantir respaldo financeiro em casos de emergência, é muitas vezes mal interpretada nesse sentido. Mas garante que é apenas precaução. Esse traço, aliás, é compreensível por se tratar de uma pessoa que nasceu numa família cuja estrutura era paupérrima, viveu numa casa com poucos móveis e sem fartura no armário. Brinquedos, ela nunca teve. Quando ganhou sua primeira boneca, já era adolescente e o encanto havia se perdido. No Grupo de Teatro do Sesc, Prazeres encontrou as bases necessárias para alçar os vôos registrados. A estreia só aconteceu em 1984, quando estava prestes a completar 35 anos. Mas nenhuma dificuldade foi capaz de impedir o sucesso. Em seu primeiro espetáculo, A Pena e a Lei, de Ariano Suassuna, a neófita Prazeres Barbosa recebeu prêmio de melhor atriz reve20


Capítulo 1 - De Caruaru para Hollywood lação num festival disputado na cidade de Arcoverde (PE). O primeiro de muitos que se seguiriam. A partir daí, ela começou a perceber que estava no caminho certo e decidiu apostar em sua carreira. Permaneceu fazendo teatro no Sesc durante dez anos, até que, em 1992, por motivos que serão tratados adiante, afastou-se da instituição. Nesse período, já estava se preparando para conquistar o direito de aposentadoria pelos anos em sala de aula. Afastada do Sesc, onde deu os primeiros passos na carreira, foi presenteada com uma Companhia de Teatro que leva seu nome – formada naquela época por alunos da Escola Elisete Lopes, onde trabalhava. Pela Companhia, estreou grandes espetáculos, apostando em novos estilos. Foi se encorajando ainda mais, a ponto de investir em monólogos ousados como Fiel Espelho Meu e Valsa nº 6. É no palco que ela se liberta, que solta seus deuses e demônios. Nos palcos, Prazeres é inteira, completa. Esquece o mundo exterior e sua preocupação gira apenas em torno da plateia. Afinal, ela tem como meta plantar uma semente em quem a assiste, uma semente capaz de germinar e provocar mudanças, reflexão. Se isso não acontecer, o espetáculo foi em vão. Dotada de uma disciplina invejável e ao mesmo tempo exagerada, é quase sempre mal compreendida em suas ações. O respeito, admiração e curiosidade gerados em torno de sua carreira – inclusive o assédio por parte da mídia – desenvolveram em alguns colegas de profissão um sentimento de antipatia por Prazeres Barbosa. De personalidade forte e contestadora, Prazeres é defensora aguerrida daquilo que considera correto e verdadeiro. Também não é de fácil convivência. Se pisarem em seus calos, ela reage imediatamente. A disparidade entre o porte físico e o talento do qual é dotada sempre foi motivo de ciumeiras. “Eu era o patinho feio, pelo qual ninguém dava nada. Porém, quando realizava meus trabalhos sempre atraía a atenção”, acredita. Prazeres sempre foi intensa em tudo o que fez. Se existe um crítico ferrenho de seu trabalho, este alguém, sem resquício de dúvidas, é ela mesma. Mulher capaz de implodir os pejorativos do ser provinciano pode sentir na pele aquela velha lógica de que para ser celebrado em seu próprio 21


Prazer em Conhecer Estado, é preciso repercutir fora dele. Se antes a atriz era vista apenas como mais uma entre tantas – apesar de sua rica trajetória nos palcos e no cinema – depois de algumas participações em novelas, seriados e importantes filmes, Prazeres não seria mais a mesma. Logo passou a ser vista como celebridade por seus conterrâneos, como se o fato de estar morando no Rio de Janeiro, o reduto dos astros da televisão, fizesse dela uma outra pessoa. E, na verdade, o fez. Os fatos narrados até aqui são apenas uma amostra da insólita vida desta mulher, que nasceu com o almejado dom da arte, da interpretação, de dar vida a personagens distintos e ao mesmo tempo tão iguais entre si, graças à incomparável mágica da atividade teatral. Prazeres nasceu atriz, o tempo apenas moldou o talento dessa artista cuja história de vida é digna de registro, a começar pela infância, quando a pequena garota já se mostrava detentora de talentos que fizeram com que ela se sobressaísse. A obstinação e a intensidade percorrem sua história do começo ao fim.

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Capítulo 2

A menina do laço branco

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Prazer em Conhecer

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ascida em dois de outubro de 1949, Maria dos Prazeres Barbosa foi a filha caçula do casal Antonio Inácio Barbosa e Antonina de Lima Barbosa. A pequena nasceu no Sítio Riacho da Palha, há 2 km do primeiro distrito de Pau Santo, zona rural de Caruaru. O pai havia saído para trabalhar no campo e a mãe ficara sozinha em casa. Ao sentir as primeiras contrações, dona Antonina pediu para que alguém chamasse o esposo. Naquela época, os poucos hospitais que existiam na cidade ficavam muito distantes e os recursos tecnológicos eram escassos. O marido foi a cavalo em busca de uma parteira, mas o esforço acabou sendo inútil. Quando chegaram à casa, a menina já havia nascido. O parto desassistido colocou em risco a vida de dona Antonina que com uma forte hemorragia, quase perdeu a vida. A informalidade do processo não permitiu que se anotassem as medidas da criança, mas ela nascera saudável. Seu Antonio era agricultor e cultivava café, milho, cana-de-açúcar, tomate e frutas. A família vivia daquilo que colhia. Uma parte era vendida, a outra consumida. Algumas pessoas trabalhavam para ele. Mas a vida no sítio não era nada fácil e dona Antonina decidiu aprender a costurar com a sogra, Joana Zeferina Barbosa, para ajudar a família. A sogra foi uma mãe para ela. Pediu que o filho comprasse uma máquina de braço e ensinou-a costurar. Mulher guerreira, disposta a enfrentar tudo pelos filhos, dona Antonina se preocupava com o futuro que eles teriam vivendo naquela condição. Dos 14 rebentos gerados pelo casal, criaram-se apenas nove: Maria da Paz, José Barbosa, Maria das Neves, Maria da Glória, Maria do Socorro, Maria das Mercês, Bernardo Barbosa, Fernando Barbosa e Prazeres. “Papai tinha muitos cafezais naquela época. Eu lembro que nos finais de semana chegavam caminhonetes para pegar café, verduras. Nos domingos, era a festa das crianças. Papai dava moedas a cada um dos filhos. Nós tomávamos banho, trocávamos de roupa e ficávamos naquela expectativa, esperando o “pãozeiro” passar. Prazeres era muito novinha nessa época”, recorda Maria da Glória. Cansada da vida que estava levando e ainda traumatizada com o fato de quase ter morrido durante o parto, dona Antonina decidiu mudar24


Capítulo 2 - A menina do laço branco se para a cidade. A notícia não agradou o marido. Seu Antonio trabalhava na roça e sempre foi considerado “um homem da pá virada”. A esposa sofreu muito em relação à convivência com ele. Em casa, era ela quem comandava tudo, até que um dia decidiu ir para Caruaru em busca de dias melhores para os filhos. O marido veio forçadamente. Em 1951, Prazeres tinha pouco mais de um ano e foi com toda a família morar na cidade. Passaram cerca de dois anos vivendo numa pequena casa na Rua Luiz de Carvalho, no bairro Nossa Senhora das Dores. A mãe decidiu comercializar roupas prontas num pequeno banco na Feira de Caruaru, nos arredores da Igreja da Conceição. Muitos anos depois, ela teve câncer de pele devido ao tempo em que ficou exposta ao sol naquela época. Na cidade, dona Antonina chegou a engravidar novamente, mas o parto foi complicado e o garoto não sobreviveu. Por pouco Prazeres não perdeu o título de filha caçula. O pai trabalhou como servente de pedreiro, mas, as dificuldades para criar a prole de nove filhos aumentavam a cada dia e seu Antonio Inácio decidiu ir com a família para o município de São Caetano. Lá, ocuparam uma modesta casa no Sítio Pé de Ladeira. A família numerosa, onze pessoas ao todo, morou alguns meses no local. A situação era tão precária que chegaram a passar necessidades fundamentais nesse período. Dona Antonina passou a costurar para a Camisaria de Chico Galinheiro, em Caruaru. Utilizava o trem para ir à cidade entregar as costuras. Para piorar ainda mais a situação, ela adoeceu e a família acabou retornando definitivamente a Caruaru. Desta vez, o local escolhido foi o bairro São Francisco, onde Prazeres passaria toda a infância e adolescência. De início, moraram na Rua Capitão Dandinho, depois compraram uma casa na Rua Martin Afonso, número 13, que pertence à família até hoje. Para amenizar as dificuldades, algumas irmãs de seu Antonio forneceram alimentação à família durante algum tempo. Logo cedo, todos os filhos foram encaminhados a fazer alguma coisa em nome da sobrevivência. Muito cedo mesmo. Dona Antonina acabou repassando a arte da costura para todas as filhas, inclusive Prazeres, que também costurou para ajudar no sustento da família. Maria da Paz, a primogênita, foi também a 25


Prazer em Conhecer primeira a seguir os passos da mãe. Na verdade, ela viu-se obrigada a aprender o ofício quando dona Antonina adoeceu em determinado momento. Sem experiência alguma, confeccionou as primeiras peças e acabou mostrando que tinha talento para tal. Seu Antonio foi para Caruaru no intuito de comercializar café na Feira, mas acabou perdendo as poucas coisas que tinha. Ficaram apenas com a casa. Depois, ele conseguiu emprego como guarda noturno na Prefeitura Municipal. Trabalhou ainda como fiscal da Feira de Caruaru e, por esse motivo, foi apelidado a vida inteira de ‘Seu Antonio guarda’. Os filhos também saíram em busca de alguma ocupação – apesar da pouca idade. José Barbosa, o mais velho, passou a lavar carros, próximo à igreja matriz. Bernardo Barbosa arrumava mercadorias em uma bodega e depois foi carregar frete na Feira, junto com o irmão, Fernando Barbosa. Permaneceriam assim por muito tempo. Trabalhando apenas para comer. E comiam mal. Com poucos recursos, dona Antonina costumava levar da feira apenas as sobras. Quando a situação apertava, recorria à mercearia próxima a sua casa, onde comprava alimentos para pagar no final da semana. Em determinado tempo, as dificuldades eram tão grandes que a mãe dizia já haver comido para não faltar alimento aos filhos. “Eu me lembro que mamãe comprava três pães - um francês, um crioulo e um doce – e partia-os em hóstias para que cada um pudesse comer um pedacinho. Ela partia apenas em dez, porque não precisava comer. Nós crescemos vendo isso, a partilha do não ter e fazer de conta que tem”, recorda a filha caçula. Em casa, Prazeres, a mãe e as irmãs passavam o dia costurando, fazendo acabamento, chuleando as peças e pregando botões. Naqueles tempos, a atividade era chamada costura de carregação, hoje é conhecida como sulanca. Após um período vendendo peças na Feira de Caruaru, dona Antonina passou a costurar para a Camisaria Nordestina, que pertencia ao empresário Félix Gonçalves dos Santos, um dos comerciantes mais bem sucedidos da época. Localizada na Rua Tobias Barreto - conhecida como Cafundó – a Camisaria Nordestina enviava o tecido para a residência da família Bar26


Capítulo 2 - A menina do laço branco bosa. Depois de prontas, as roupas que Antonina e as filhas costuravam diariamente eram comercializadas no local. O que elas recebiam, porém, era pouco. Superando todas as dificuldades, a mãe prosseguia firme em seu propósito de dar uma vida digna aos filhos. Lutava inclusive contra as limitações físicas. Na infância, dona Antonina fora vítima de paralisia infantil parcial e só andou aos seis anos de idade, com a ajuda de suas duas irmãs, que a seguravam e faziam-na exercitar-se como num processo informal de fisioterapia. As pessoas chamavam-na preconceituosamente de ‘aleijada’ e achavam até que ela não iria casar. Antonina Vieira de Lima, filha do casal João José de Lima e Severina Vieira de Melo, nasceu em 6 de março de 1917. Perdeu a mãe antes de completar quatro anos e foi criada por madrastas. Casou-se aos 18 anos com regime de comunhão de bens, passando a se chamar Antonina de Lima Barbosa. Era uma mulher simples, da roça, que não falava sobre todos os assuntos com os filhos, mas, ao mesmo tempo, foi uma guerreira incansável. Trabalhou duro e incessantemente para sustentar os filhos, costurando numa máquina a mão. Quando as meninas completavam oito anos, ela comprava um novo equipamento, pago à prestação, com o pouco que conseguiam costurando. É notório o seu lado coruja e a sabedoria com que educou os filhos em meio às dificuldades. Fazia isso como ninguém e nunca recebeu reclamação devido ao mau comportamento de nenhum deles. Seu Antonio foi um pai presente na vida dos filhos, mas sem as reais obrigações de um chefe de família. Frequentador de baixo meretrício, viciado em jogos de azar, na época em que moravam na zona rural passava as noites jogando baralho com amigos e, ao perder as apostas, entregava a colheita, deixando a família sem nada. Por outro lado, nunca foi agressivo, nem batia nos filhos. Também não vivia assediando nenhuma moça. A mudança para a cidade permitiu que a mãe realizasse outro sonho: ver os filhos estudando. Desde cedo, Prazeres e seus irmãos tiveram que conciliar trabalho e estudo. Vendo as dificuldades, eles próprios procuraram escola. Os mais velhos incentivavam os mais novos. “Não tive27


Prazer em Conhecer mos infância porque viemos do sítio para Caruaru e todos começaram a trabalhar muito cedo. Mas, mesmo sendo humildes, o estudo estava em primeiro lugar. Todos tinham um meio de ajudar a família e isso foi muito bom”, afirma Maria das Mercês, irmã da atriz. O primeiro lugar onde Prazeres estudou foi na Rua Martin Afonso, a Escola de “Seu Né”, um professor paraplégico que vivia em uma cadeira de rodas. “Foi o primeiro homem a nos mostrar o mundo. Ele era aleijado, mas tinha uma palmatória que ainda batia. Nunca tivemos necessidade de apanhar com ela, mas apanhava-se”, lembra Prazeres. Quase todos os filhos estudaram nessa escola. Mercês era mais levada que os outros irmãos e quando precisou ser castigada, livrou a mão rapidamente, de maneira que a palmatória terminou acertando a perna do próprio professor. “Se você não soubesse responder a tabuada, apanharia com a palmatória. Um dia, chegou minha vez e corri para casa. Chorei muito e disse aos meus pais que não iria mais para a escola. O professor Né era muito católico e fazia todas as noites do mês de maio, um terço em sua casa”, recorda Mercês. Em seguida, Prazeres e seus irmãos foram estudar com Maria Teodora de Freitas, a dona Nininha, que morava na Praça Coronel Porto. Foi ela que encaminhou todos os filhos de dona Antonina nos estudos. Depois, mudou-se para o Recife. Adiante, Prazeres estudou com dona Rejane Cavalcanti (esposa de Lídio Cavalcanti, cordelista caruaruense). Na verdade, eram escolas informais, que funcionavam na residência dos professores, no bairro São Francisco. Passada essa fase, Prazeres Barbosa estudou um ano no Grupo Augusto Tabosa e outro ano no CNEC, até concluir o primário. Em seguida, foi estudar no Colégio Estadual de Caruaru onde cursou o Ensino Fundamental e concluiu o Magistério. Em 1973 prestou vestibular para o curso de Letras, iniciado no ano seguinte na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru (Fafica).

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Capítulo 2 - A menina do laço branco

INFÂNCIA

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casa da Rua Martin Afonso era muito pequena para acomodar uma família grande como a de Prazeres. Afora as máquinas de costura, uma cama de casal para todas as filhas, redes para os rapazes, a cama dos pais e uma grande mesa para cortar tecidos, não havia mais nada. Mas a casa era própria e eles não pagavam aluguel. Apesar disso, chegaram a mudar-se várias vezes. No bairro São Francisco, moraram ainda nas ruas São Mateus, Dom Pedro I e na Praça Coronel Porto. À medida que iam adquirindo condição de pagar o aluguel, sempre procuravam um espaço mais confortável para se instalarem, afinal, eram onze pessoas vivendo num espaço onde cabiam no máximo três. Mesmo tendo assumido responsabilidades muito cedo, Prazeres e seus irmãos também arranjavam tempo para brincar. Além do trabalho e da escola, os filhos eram incentivados pela mãe a serem felizes. Na infância, a menina Prazeres era muito levada. Sempre ativa, ela cantava, dançava e fazia estripulias. Suas brincadeiras preferidas eram barra-bandeira, escolinha e pastoril. As roupas eram feitas com papel crepom. Prazeres era a linha de frente. Torcedora do cordão azul vestia-se sempre como a “mestra”. A presença do rádio no dia-a-dia das famílias daquela época era muito forte. Por isso, as crianças gostavam de brincar de auditório, cantando as músicas que faziam sucesso. Prazeres sempre gostou muito de cantar. O gosto pela música foi herdado do pai, que cantava, tocava e declamava. Logo cedo, a menina se tornou fã de Núbia Lafayette. Naqueles tempos ela nem sabia o que as composições verdadeiramente queriam dizer, mas amava as vozes de Dalva de Oliveira, Carlos Alberto, Francisco Alves, Nelson Gonçalves, Cauby Peixoto. Esses eram os ídolos de Prazeres. Enquanto costuravam, dona Antonina e as filhas passavam o dia ouvindo a programação da extinta Rádio Difusora de Caruaru num pequeno aparelho da marca Pioneer. Inaugurada em 1951, a Difusora logo começou a tocar as músicas de Luiz Gonzaga, no auge da carreira, Cauby Peixoto, Emilinha Borba, Ângela Maria, Jackson do Pandeiro, Ari Lobo 29


Prazer em Conhecer e tantos outros. Os mais ouvidos na casa de Prazeres eram, sem dúvidas, Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro. Embora a televisão já tivesse chegado ao Brasil, ainda era privilégio das elites nesse tempo. Em Caruaru, além da programação radiofônica, o grande divertimento da população eram os cinemas. Existiam vários. Cine Teatro Caruaru, Cinema Santa Rosa, Cine São Jorge, Cine Bandeirantes e o Cine Irmãos Maciel. Prazeres chegou a frequentar algumas vezes, no domingo à tarde, as matinês do Cine Teatro Caruaru - que pertencia ao empresário Santino Cursino - e do Santa Rosa. As moças daquela época aproveitavam as matinês para encontrar os namorados. Ela, no entanto, ia sempre acompanhada pelas irmãs e pelos sobrinhos. Como não podiam pagar o cinema com frequencia, a diversão ficava mesmo por conta do rádio. Ouviam programas locais como Postal Sonoro, apresentado pela radialista Zélia Maria; Sociedade, comandado por Gleydes Cardim; Vesperal das Quintas, que ia ao ar nas quintas-feiras; além dos programas Festa no Palco e Expresso da Alegria, a grande audiência dos domingos. O que prendia a atenção era as rádio-novelas. As que mais marcaram aquele período foram Jerônimo: o Herói do Sertão, Além do Horizonte a Estrada Continua e O Direito de Nascer. “A gente tomava como se fosse real porque não sabia distinguir o que era ficção. Nós sofríamos com os personagens. No outro dia era aquele suspense, queríamos saber o que ia acontecer e todo mundo comentava, como se aquelas pessoas fizessem parte da nossa vida”, comenta a atriz. Na infância, Prazeres já sonhava em ser professora e atriz. Também queria muito ser cantora e aos 10 anos teve a primeira oportunidade de mostrar seu talento. Encantada com a programação da Rádio Difusora, ela foi levada pela mãe para participar do programa Expresso da Alegria, comandado pelo radialista Arlindo Silva, nas manhãs de domingo. O programa de auditório era competitivo. Ela se inscreveu, cantou e agradou à plateia e aos jurados com sua voz afinada. Alguns de seus irmãos também chegaram a cantar, mas não se destacaram tanto. “Na época, aprendi a tocar violão. Prazeres ia como caloura. Nós cantamos, mesmo 30


Capítulo 2 - A menina do laço branco sem saber. Mas quem se destacou mesmo foi ela”, reconhece o irmão, Fernando Barbosa. Naquela época, o repertório de Prazeres era Núbia Lafayette e Dalva de Oliveira, mas, principalmente, Núbia. Ao lado de outros dois garotos, Marilene Caliupe e Joselito – este cantava as músicas do filme Dio come ti amo -, Prazeres tornou-se uma das cantoras mirins mais requisitadas da Difusora. Ela cantou ainda no Festa no Palco, transmitido no domingo à noite. Esse período marcou a história da cidade, consagrando nomes no cenário radiofônico local como Arapuã Barrocas, Ivan Bulhões, Liezid Interaminense, Clodovil Dantas e tantos outros. Como a família de Prazeres era muito grande e o salário que recebia era apenas para o sustento, os filhos mais novos aproveitavam as roupas dos mais velhos. As seis moças geralmente tinham dois vestidos: um para o dia-a-dia e outro para sair. Prazeres foi a filha que vestiu a roupa de todas as outras, porque era a caçula. Para cantar na Difusora, ela ganhou um vestido branco, usado por sua irmã Maria da Glória na formatura do colégio. Fizeram algumas adaptações e, com ele, Prazeres cantou diversas vezes no rádio. O vestido branco, com um grande laço, acabaria se tornando a sua marca registrada. Todos a conheciam como “a menina do laço branco”. Mas aquilo não a intimidava. Embora fosse sempre com o mesmo vestido, ela inovava no repertório. “Nos domingos, gostávamos de ir para a Rádio Difusora. Ganhávamos brindes quando respondíamos a perguntas. Era nossa diversão”, afirma Maria da Glória. O talento da pequena cantora foi reconhecido pela televisão da época. A TV Jornal do Commercio, canal 2, exibia programas de sucesso como os de Fernando Castelão e Florinda Rossi, que aproveitavam novos talentos do interior. Como era muito entoada e esperta, Prazeres chamou a atenção. Logo, quiseram levá-la para o Recife, mas a mãe não permitiu. A menina chorou muito. Depois desse episódio, Prazeres cantou algumas vezes na emissora, mas a vida começou a tomar outros rumos e ela continuou estudando e trabalhando. “Se eu não fosse atriz, seria cantora, caso tivesse enveredado”, revela. Nas ruas onde moraram, os filhos de dona Antonina e seu Antonio 31


Prazer em Conhecer não costumavam se envolver em confusão; afinal, passavam o dia trabalhando e depois iam para a escola. Um fato muito importante, todavia, marcou a infância de Prazeres, na época em que moravam na Rua Dom Pedro I. Uma das recomendações que a mãe sempre fazia era a seguinte: “Em hora de refeição, não se vai à casa de ninguém, para que ninguém venha na nossa”. Apesar de trabalharem muito, eles não possuíam nenhuma fartura no armário. O que os comerciantes pagavam à mãe era muito pouco. Dava apenas para sobreviver. A pulso. Certa vez uma amiguinha de Prazeres chegou num momento em que eles estavam comendo. Dona Antonina mandou que ela fosse rapidamente atendê-la, mas a garota entrou. Enquanto comiam, a menina observou tudo e depois foi embora. À noite, quando Prazeres saiu para brincar, todos sabiam que a família havia comido feijão puro. Zangada, foi brigar com ela. A confusão estava feita. As duas agarraram-se pelos cabelos e as mães precisaram intervir para acabar com a briga entre as crianças. O fato de trabalharem não impedia Prazeres e seus irmãos de frequentarem a escola, que estava sempre em primeiro lugar, afinal, eles queriam mudar de vida. Na época em que estudavam no Colégio Estadual de Caruaru, acordavam às seis da manhã e trabalhavam até às seis da noite. Tomavam banho, comiam um cuscuz sem nada e iam para a escola. Na década de 1960, Caruaru ainda era uma cidade com aspectos rurais, a maioria das ruas não era calçada e nem havia saneamento. Mas todas as noites eles estavam na escola. Dona Antonina ficava na porta de casa esperando os filhos voltarem. Às vezes, ia até o início da Praça Coronel Porto, somente para se certificar de que eles estavam retornando. Além de ver os filhos na escola, a vinda para a cidade oportunizou à jovem mãe o início de uma vida religiosa para os filhos – especialmente para a mais nova. Ainda criança, Prazeres foi crismada na Igreja do bairro São Francisco, em Caruaru. Uma cerimônia sem nenhum requinte. Nessa fase da vida, pensou em ser freira, chegando a pregar na parede de casa fotografias de atrizes vestidas a rigor. Sua vida religiosa, porém, foi desenvolvida longe da igreja católica. Grande parte dos artistas é assumidamente agnóstica. 32


Capítulo 2 - A menina do laço branco Prazeres, não. Muito cedo começou a frequentar a igreja evangélica. Próximo à casa onde morava, existia uma congregação religiosa, mas o estilo não agradava a sua família. A gritaria nos cultos chegava a incomodá-los. Aos 12 anos, na Rua Martin Afonso, uma vizinha chamada Letícia Almeida (irmã do cantor e compositor Onildo Almeida) convidou Prazeres e sua família para assistirem ao culto na Igreja Batista. Um dia a menina decidiu ir e ficou encantada com o que viu e com a receptividade das pessoas. Lá, finalmente, poderia desenvolver os seus talentos. O “casamento” deu certo até demais. Foi na Primeira Igreja Batista de Caruaru que ela aprendeu a enfrentar o público. Participava do coral, grupo de teatro e estava sempre envolvida nas principais atividades desenvolvidas. Ocupou todos os cargos possíveis. “A igreja me deu a oportunidade de fazer isso, me desenvolveu a capacidade de falar em público, de estar em público, de fazer as coisas. A minha grande mãe de tudo é a igreja. Veja como ela foi importante na minha vida. Além da fé, ela contribuiu para o meu desenvolvimento artístico”, acredita. Engajada com os trabalhos, Prazeres começou a levar seus familiares para assistirem aos cultos, inclusive a sua mãe. Bernardo Barbosa passou muitos anos na Igreja Presbiteriana do Caiucá, chegando inclusive a ocupar o cargo de diácono. Ao passo em que quase todas as suas irmãs foram abandonando a igreja, Prazeres se firmava cada dia mais. Foi batizada, casou-se e apresentou o filho perante os membros. Lá, ela descobriu um momento belo da vida: desenvolveu o seu potencial de cantora, de professora e atriz. Monopolizava tudo. Era daquelas fiéis fervorosas, que iam para praça pública pregar o evangelho com o microfone na mão. Magra, com cabelos longos, era admirada por sua fé inabalável e pelo compromisso que tinha com a causa que havia abraçado. Ao lado de Ciron Almeida, outro jovem membro da igreja, abria o templo às cinco horas da manhã, com poucos fiéis, para orar. No ápice de sua entrega ao protestantismo, chegou a pedir a Deus para contemplar a face dEle. Queria ser provada. Era intensa em tudo o que fazia, como continua sendo até hoje. Passou mais de duas décadas assim. Sua dedicação era total em tudo que fazia. 33


Prazer em Conhecer Deixou a igreja no início dos anos 1980, quando se separou do primeiro marido. Embora ela amasse a vida cristã, estava aborrecida com o fato de as pessoas se sentirem no direito de comentar a sua vida pessoal. Nessa época, já estava envolvida com atividades artísticas na Escola Elisete Lopes e a igreja não aceitava a dedicação a trabalhos que não fossem feitos exclusivamente para ela. “O mesmo esforço que tem no teatro ela tinha na igreja, fazia tudo com muito carinho”, reconhece Maria das Neves, irmã de Prazeres. Outro fator que impulsionou a saída foi o fato de discordar de muitas das doutrinas pregadas. Uma série de acontecimentos que puseram fim a uma longa e bela trajetória. “Mas foi minha grande escola de vida, em todos os aspectos. Aprendi o que devia e o que não devia. As coisas foram acontecendo e comecei a me decepcionar. Essas pessoas da igreja também têm o mau costume de querer dominar sua vida. E eu não aceito isso. A sua fé é uma coisa, mas você querer mandar no meu cabelo, no tamanho do meu vestido, a gente sequer usava calça comprida! Você começa a perceber que aquilo não funciona”. Apesar de não estar mais na igreja, Prazeres continua alimentando a sua fé. Seu lado espiritual é muito forte. Não abre mão da crença em Deus e dos valores que absorveu ao longo dos anos em que se dedicou à prática do cristianismo. Ora todos os dias e diz acreditar que se realmente existirem céu e inferno, estará definitivamente num bom lugar. “O que freou Prazeres foi a religião. Se tivesse começado mais cedo, teria progredido muito mais. Mas ela entregou-se completamente, sequer cortava o cabelo”, opina Maria da Paz.

TRABALHO

P

razeres e suas irmãs continuavam trabalhando em casa e estudando. Quando Maria da Glória conheceu o alfaiate Armando Albuquerque, com quem casou, a família passou a costurar para os alfaiates Gerson e Esaú (este, proprietário da Alfaiataria Lins, onde Bernardo havia trabalhado). “Armando viu todo o nosso sofrimento e começou a aperfeiçoar 34


Capítulo 2 - A menina do laço branco o trabalho delas. As coisas melhoraram um pouco. Prazeres começou a confeccionar camisas. Era um sucesso”, lembra Fernando Barbosa. Todos os filhos frequentaram escolas públicas, e eram alunos aplicados. Uns mais dotados que outros. Socorro, Mercês, Bernardo e Prazeres tiveram menos dificuldade e chegaram inclusive à graduação em nível superior. Mas os que mais se sobressaíram foi justamente Socorro, Bernardo e Prazeres; os três se tornaram professores. Desde criança, eles mostraram uma percepção e um interesse maior pelos estudos. Socorro Barbosa, por ser uma das mais velhas, era a grande incentivadora dos irmãos e foi exemplar nesse sentido. Bernardo Barbosa, por exemplo, chegou a trabalhar como ajudante de sapateiro, vendedor ambulante de cocada e de pequenos utensílios na Feira de Caruaru. Seu primeiro emprego formal foi na Camisaria Nordestina, para a qual sua mãe costurava. Nessa época, trabalhava como balconista da mesma empresa o jovem José Queiroz de Lima, que anos depois viria a ser prefeito de Caruaru. Depois, trabalhou como auxiliar na Alfaiataria Lins e, em 1965, a convite do cunhado, José Leite (casado com Maria da Paz) foi trabalhar como ajudante de carpinteiro. Fernando decidiu abandonar a Feira e foi junto. Zé Leite foi como um pai para a prole de dona Antonina e os ajudou em todos os sentidos. Pouco tempo depois, Bernardo sofreu um acidente na serra elétrica e ainda hoje carrega as marcas (três dedos de uma de suas mãos ficaram comprometidos). O fato abalou profundamente a família Barbosa. Impossibilitado de trabalhar, passou alguns meses em casa. Fernando continuou aprendendo a nova profissão. Hoje, ele sobrevive da arte ensinada pelo cunhado na adolescência. Recuperado do acidente, em 1965, Bernardo Barbosa, aos 17 anos, conseguiu um emprego na Prefeitura de Caruaru. Em 1969, tornou-se funcionário da Fundação Instituto de Administração Municipal (FIAM) extinto órgão do governo estadual que prestava assistência técnica aos municípios. Nessa época, ele foi viver em Recife com a irmã Maria da Paz, que já havia casado e morava na capital pernambucana. Em 1975, pediu demissão para lançar-se como profis35


Prazer em Conhecer sional autônomo. Formado em Contabilidade e em Direito, hoje é proprietário do Centro de Estudos, Pesquisa e Assessoria em Administração Municipal (Cespam) prestando consultoria técnica para as prefeituras do interior pernambucano. Da Paz, Glória e Neves não concluíram os estudos, dedicaram-se ao trabalho para ajudar a mãe a criar os filhos mais jovens. Fernando casou, foi viver em São Paulo e também não terminou os estudos. Disciplinadas, as irmãs Prazeres e Socorro sempre se reuniam para solucionar dúvidas, na residência de amigas ou em casa. Na época do Magistério, no Colégio Estadual, iam para a escola no turno da manhã e estudavam durante a tarde. No outro dia, costumavam levar questões para o professor de Matemática, o conceituado José Bione de Araújo. O grupo era liderado por Socorro, que desde cedo mostrou aptidão para o ensino. Num desses encontros, as irmãs marcaram para estudar com uma colega. Ela tinha dúvidas e pediu a Socorro para ajudá-la. Ao chegar à casa da família, a menina se negou a entrar. “Eu nunca vou esquecer. E quando Socorro chegou à escola, no outro dia, todos os colegas sabiam da pobreza de nossa família. Isso eu não perdôo”, revela Prazeres. O fato de a menina ter espalhado na rua que eles comiam feijão puro, na infância, e esse episódio ficaram registrados em sua memória. Tais lembranças deixaram nela marcas profundas de simplicidade e solidariedade. Prazeres é daquelas pessoas que se identificam com os menos favorecidos. Chora ao ver a fome massacrar seres humanos. Fala a linguagem dos que por falta de oportunidade acabam trilhando caminhos árduos. “Não é por que é pobre que você é marginal; não é por que você é pobre que não presta; que não tem visão! É falta de oportunidade, porque os que têm, não dão”, diz a atriz, com os olhos cheios de lágrimas. Mesmo sendo a caçula, Prazeres não desfrutou de privilégios. Em casa, a mãe nunca fez distinção entre os filhos. Todos eram tratados da mesma forma. Dona Antonina era uma mulher sábia e por isso dividia as tarefas. Os filhos mais velhos cuidavam dos mais novos. Maria da Glória, por exemplo, foi a ‘babá’ de Prazeres. A irmã que passava o maior tempo com ela, cuidando, ensinando ou catando piolhos. Isso fazia com que os filhos fossem 36


Capítulo 2 - A menina do laço branco muito obedientes, tanto aos pais, quanto aos irmãos mais velhos. A pobreza da família era tão grande que nenhum deles se lembra de na infância ter ganho brinquedos. Prazeres sempre sonhou com uma boneca. Para agradar aos filhos, seu Antonio fazia bonequinhos com casca de melancia, depois do almoço. Ele retirava a parte grossa da fruta, cortava os bonequinhos e os filhos mais novos brincavam. Já adolescente, Prazeres ganhou de Maria da Glória uma boneca como a que sonhara ao longo da infância. “Mas eu já não estava mais no tempo de brincar de boneca”, conta. No final de década de 1960, com o anúncio da chegada do homem à lua, brinquedos relacionados à temática foram lançados. Os mais populares eram os homens da lua. “Meu namorado, Armando, com que casei e vivi durante 24 anos, comprou dois homens da lua, deu um para Prazeres e outro para Lucivanda (sobrinha da atriz). Um boneco pequeno. Mas você precisava ver a alegria daquelas duas crianças”, recorda Glória, sorrindo. Aos 18 anos, José Barbosa, irmão de Prazeres, continuava lavando carros. Nessa época, eles moravam na Martin Afonso e veio morar na mesma rua um homem conhecido por seu Mita, que possuía um caminhão de carga. Dedé, como era chamado pela família, praticava halterofilismo e levantamento de peso, assim que chegava do trabalho, para manter o corpo sempre musculoso. Ao constatar o porte do garoto, seu Mita o convidou para trabalhar como calunga (na gíria dos caminhoneiros, diz respeito àqueles que viajam sobre o caminhão, carregando e descarregando mercadorias). Apesar da pequena função, sair da praça onde lavava e vigiava carros representava um degrau avançado. Em casa, até então, eles só comiam feijão de corda (conhecido também como xoxa bunda), consumido naquela época apenas por famílias menos abastadas. Dedé foi trabalhar e quando voltou com o primeiro dinheiro, comprou dois quilos de feijão mulatinho. “Pronto mamãe, a partir de hoje nessa casa não entra mais feijão xoxa bunda”. Na madrugada do dia 3 de julho de 1957, a mãe o acordou diversas vezes para que ele não perdesse a hora. Dedé estava com muito sono, mas saiu para mais uma viagem. Quando retornasse, comeriam o novo feijão que dona Antonina havia colocado no fogo. O rapaz foi para o Recife, com seu Mita e uma carona – uma velha senhora que iria visitar o filho na 37


Prazer em Conhecer capital. Era a segunda viagem. Durante o trajeto, ao chegarem à descida da Serra das Russas, entre as cidades de Gravatá e Pombos, o caminhão (carregado de estopa) tentou fazer uma ultrapassagem e virou. Morreram todos. Um episódio doloroso. Se houvesse viajado na parte de cima do veículo, Dedé talvez tivesse sobrevivido, uma vez que caíram na água. Mas, nesse dia, ele foi justamente na boléia. A família soube da tragédia por volta das sete horas, quando um rapaz chegou à residência comunicando. José Barbosa morreu aos 18 anos, trabalhando. E não comeu o feijão que havia comprado para comer com a família. Já passava das 16 horas quando dona Antonina e seu Antonio chegaram trazendo o corpo do filho numa caminhonete. “Eu me lembro vagamente do fato, pois era muito pequena. Lembro que todos choravam e eu sentada na calçada pedindo 500 réis a todo mundo. Era uma moeda equivalente a 50 centavos e eu sempre pedia para comprar nêgo bom”, diz Prazeres. Esse foi um dos episódios mais marcantes na vida da pequena garota Prazeres, que mal imaginava o que o destino lhe reservaria. Em 1973, ela concluiu o Pedagógico no Colégio Estadual de Caruaru. Começava aí uma nova fase de sua história. Impossibilitada de seguir a carreira de cantora e sem que ainda houvesse travado um contato com o teatro, decidiu enveredar pelo Magistério. A nova e significante profissão, porém, começou mais cedo do que se possa imaginar. Mesmo sem possuir diploma, a menina do laço branco já se aventurava numa escola criada em sua própria casa. Iniciava-se, assim, sua paixão pela arte do ensino.

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Capítulo 3

Prazeres nas trilhas do Magistério

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Prazer em Conhecer

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Praça Coronel Porto, localizada no bairro São Francisco, próximo ao centro de Caruaru, é hoje uma área comercial. Isso, porém, não impede que várias famílias continuem residindo no lugar. É lá onde está situada uma das casas onde a família Barbosa viveu durante muitos anos. Embora fosse um prédio desgastado já na década de 1970, o imóvel era o maior e mais espaçoso onde Prazeres e seus familiares tinham vivido até então. A sala, bastante ampla, passaria a ser usada em prol de um sonho pessoal de três das seis filhas de dona Antonina. Alunas do Colégio Estadual de Caruaru, as irmãs Socorro, Mercês e Prazeres eram admiradas pelos professores por sua dedicação e disciplina. Prestes a concluir o Magistério, Socorro Barbosa queria oportunidade para ensinar, mas não encontrava. Não havia escolas suficientes. No colégio, ela conheceu a professora Maria do Carmo Queiroz, que lecionava as disciplinas de Língua Portuguesa e Francesa, incluindo suas literaturas. O amor e a vocação para o ensino levaram dona Maria do Carmo a manter durante muitos anos o Externato São Tarcísio, onde lecionava o curso primário para crianças pobres de Caruaru. Criado em 1956, o educandário funcionava na antiga Rua São Miguel (atual Silvino Macedo), nº 114, e era mantido através de verba pública; por esse motivo, as aulas eram gratuitas. A professora aproveitava para oferecer cursinhos de preparação para o Exame de Admissão ao Ginásio e também para o vestibular. Socorro ensinou durante 10 anos no Externato São Tarcísio como professora auxiliar. Em meados da década de 1960, Maria do Carmo, que também era professora estadual, lecionava na Escola Barão do Rio Branco, na Avenida Rui Barbosa, em Caruaru. Nessa época, ela conseguiu junto à Secretaria Estadual de Educação uma cadeira noturna para ministrar aulas de preparação para o curso de admissão. Um fato raro na cidade até então. Em março de 1967, no entanto, ela se aposentou. Temendo que os alunos ficassem sem aulas durante o curso daquele ano letivo e, vendo a dedicação da jovem Socorro Barbosa, Maria do Carmo a indicou a então diretora da escola, Nair Souza, como substituta. Como o vínculo com o Estado havia findado, Socorro ficou recebendo um salário pago pelos próprios alunos. Assim que o ano foi concluído, a au40


Capítulo 3 - Prazeres nas trilhas do Magistério torização para funcionamento da cadeira no turno da noite foi cancelada. Maria do Carmo, no entanto, incentivou-a a criar a sua própria escola em casa. Prazeres, ainda adolescente, continuava alimentando os sonhos de tornar-se professora e atriz e assim que concluiu o ensino básico, enveredou pelo Magistério. Mercês optou pelo Curso Científico, alegando que “Teria um futuro melhor que o das irmãs”, o que não a impediu de ensinar ao lado delas. Em 1968, Socorro Barbosa criou o Externato Três Irmãs, o primeiro lugar onde Prazeres ensinou. “Socorro se apegou a mim como se fosse minha filha. Eu passava finais de semana na casa delas. As mais próximas sempre foram Socorro, Prazeres e Mercês. Quando elas falavam alguma palavra errada, eu as corrigia. Íamos para o dicionário e eu sempre ganhava. Ríamos muito. Socorro Barbosa é cultura viva, a maior cultura, mas ela é modesta. Prazeres é inteligente e ousada, uma professora-artista de visão larga”, define Maria do Carmo, lúcida, aos 92 anos, sendo 65 deles dedicados ao ensino. A sala da casa, na Praça Coronel Porto, foi transformada numa sala de aula, com cadeiras de espaço duplo. As irmãs colocaram cortinas e improvisaram tudo. Estudavam no turno da manhã e ensinavam à tarde e à noite. Cada uma trabalhava num horário. Socorro, a mais velha das três, era a mentora de tudo. “Era um dos externatos mais conceituados da cidade. Todas as crianças com dificuldade que passaram pelo Externato Três Irmãs saíram gênios. A inteligência de Socorro levou o projeto adiante. Era um referencial”, afirma Maria da Paz. Embora a casa fosse alugada, a proprietária permitiu que derrubassem algumas paredes, de forma que a residência acabou ficando restrita aos fundos do imóvel. Socorro adquiriu cadeiras que vieram do cursinho prévestibular ministrado pelo professor Mafra. Aos 18 anos, Prazeres deu os primeiros passos no Magistério. Com medo da fiscalização, colocaram uma placa na porta de casa. “Ficávamos revezando os horários. Socorro era a mola-mestre. Eu quebrava o galho, mas com competência. Nós ficávamos muito envaidecidas porque todos os alunos eram aprovados”, explica Mercês. Lá, elas recebiam pessoas de todas as idades, principalmente aquelas que se qualificavam para a prova de Admissão ao Ginásio. As crianças 41


Prazer em Conhecer ficavam com Prazeres. Para estudar no Externato, os alunos pagavam uma pequena quantia mensal. “Foi uma época muito boa”, afirma Prazeres, ao lembrar aqueles momentos. No final de 1973, ela prestou vestibular. O curso escolhido foi Letras, não somente pelo fato de a licenciatura conferir-lhe o direito de ensinar, mas, sobretudo por admirar quem falava e escrevia corretamente o Português. A preparação para a prova aconteceu exatamente com dona Maria do Carmo, no Externato São Tarcísio. “Foi uma pessoa muito importante na vida da gente. Com ela e com o professor Mafra fiz preparação para o vestibular. Maria do Carmo é vocacionada no seu íntimo”, afirma a artista. Socorro Barbosa concluiu o Magistério e cursou graduação em Geografia. Mercês prestou vestibular para Medicina, mas não foi aprovada e acabou cursando Letras pela Fafica. O Externato Três Irmãs funcionou durante muitos anos. No final de 1969 Mercês casou, foi morar em São Paulo e abandonou o projeto. “Para ser professor é preciso ter dom e eu não tive”, justifica. Prazeres, já no primeiro ano de faculdade, começou a se aventurar no mundo do ensino. Sozinha, Socorro também foi em busca de outras oportunidades. Era o fim do projeto e o início de uma nova história para Prazeres. Inicialmente, ela passou por várias escolas espalhadas pelo interior de Pernambuco. A convite do Dr. Clóvis Pacas, um advogado caruaruense, Prazeres ensinou um breve período na cidade de Cupira, numa escola municipal. Na tentativa de firmar-se como professora, passou ainda por municípios como Toritama, São Caetano, Brejo da Madre de Deus e Riacho das Almas. Em meados da década de 1970, quando ainda estava na faculdade, Prazeres Barbosa conseguiu uma vaga para ensinar na recém-fundada Escola 31 de Março, localizada na cidade de Santa Cruz do Capibaribe. Nessa época, a escola começava a dar os primeiros passos e Prazeres, ao lado de sua irmã Socorro Barbosa, praticamente ajudou a fundá-la. “Foi o meu grande berço, de início, saindo de casa”, ressalta. Como precisavam se deslocar diariamente até a cidade, as irmãs ficavam hospedadas na residência do Padre Zuzinha, que as acolhia e apoiava em todos os sentidos, sem cobrar nenhum centavo em troca. “Era um padre de tirar a calça e ficar 42


Capítulo 3 - Prazeres nas trilhas do Magistério só com a batina para dar a quem não tem. Morreu assim”. Ao longo de sua trajetória como professora, Prazeres lecionou as disciplinas de Língua Portuguesa e Educação Artística. No início da profissão, entretanto, encarou outros desafios. Em 1974, na turma de quintasérie da Escola 31 de Março, ela ensinava duas matérias que tinham relação direta com o regime militar: Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política Brasileira (OSPB). Um dos seus alunos, à época, tornar-se-ia colega de profissão e parceiro teatral no futuro. O jovem Edson Tavares Costa jamais imaginou que anos depois reencontraria a professora engajada no movimento teatral, pelo qual sempre foi apaixonado. “Na época, eu tinha 11 anos e ela ensinava também a disciplina de Higiene e Enfermagem no Lar. Eram disciplinas com um forte caráter de ‘domesticação intelectual’, que não tinham a ver com a professora e sim com o sistema e as ideias da época. Hoje, por exemplo, eu nem sei se ela concordaria com as coisas que trabalhou conosco”, diz Edson, doutorando em Teoria da Literatura. No início dos anos 1990, Edson e Prazeres se reencontraram como colegas de profissão na Escola Elisete Lopes, em Caruaru. Antes disso, já haviam travado contato em outras ocasiões por conta do teatro. “Eu promovi algumas peças dela em Santa Cruz do Capibaribe. Em Caruaru, levava meus alunos para assistirem aos seus espetáculos e realizávamos debates”, lembra Edson. Com a morte do Padre Zuzinha, a Escola 31 de Março passou por uma série de modificações. Sua administração foi transferida para o Estado e, em homenagem ao religioso, passou a chamar-se Escola Padre Zuzinha. Prazeres viu nesse processo de mudança a chance ideal para ser contratada como professora estadual, afinal, ela tinha uma parcela de contribuição no desenvolvimento da escola. O resultado foi decepcionante. Sem demonstrar nenhuma gratidão para com os professores que iniciaram os trabalhos na instituição de ensino, a administração local decidiu que iria ceder as vagas aos profissionais da cidade. Todos os outros foram demitidos, inclusive Prazeres. A lembrança ainda hoje a entristece. Após todas as tentativas frustradas de manter-se como professora em es43


Prazer em Conhecer colas públicas, ela conseguiu trabalho numa escola particular em sua terra natal. A função, porém, era um pouco diferente da que estava acostumada a exercer. Em março de 1977, foi contratada como coordenadora do Colégio Sete de Setembro, em Caruaru, a convite do professor Rubem de Lima Barros, diretor do educandário. Ao lado de Elisa Lemos, outra funcionária do colégio, passaria ali pouco tempo coordenando as atividades pedagógicas. Nesse período, sua marca de professora temida pelos alunos já começava a desabrochar. Os estudantes a entendiam pelo olhar. Exatamente como fora criada, Prazeres educava os alunos das escolas por onde passou: bastava um olhar e eles a compreendiam bem. Sua passagem pelo Colégio Sete de Setembro foi muito breve. Em fevereiro de 1979, aos 29 anos, Prazeres Barbosa finalmente conseguiu realizar o sonho de ser contratada como professora estadual. Na Escola Elisete Lopes, localizada no bairro Caiucá, em Caruaru, ela se firmaria na profissão abraçada ainda na adolescência. Conquistar a vaga, porém, não foi nada fácil. Como não era concursada, Prazeres precisou recorrer à boa e velha “mão amiga” de um representante político. No final dos anos 1970, a Escola Elisete Lopes de Lima Pires era um educandário municipal pouco conhecido na cidade de Caruaru. À frente da escola, estava a diretora Diva Galvão Cavalcanti, responsável direta pela admissão de Prazeres. A escola dispunha da vaga, a diretora – que já conhecia seu trabalho, afinal Socorro Barbosa ensinava lá, nesse período – queria lhe dar o emprego, mas pesava a ausência de apoio político. Diva então mandou que ela procurasse o deputado José Antonio Liberato, popularmente conhecido como o “deputado da educação”. Poucos dias depois, Prazeres assumiria a vaga, conquistando definitivamente o tão almejado cargo de professora do Estado de Pernambuco. A sua vinda para a Escola Elisete Lopes fez com que o educandário tomasse outro impulso. O fato de ter sido uma arte-educadora possibilitou o desenvolvimento de atividades que envolviam toda a comunidade escolar, movimentando o espaço nos finais de semana. Professora de doação integral ao trabalho, trouxe para a escola pú44


Capítulo 3 - Prazeres nas trilhas do Magistério blica, atitudes e atividades que não eram adotados por nenhum de seus colegas de profissão. Isso gerou vários conflitos ao longo dos anos. A fama de professora brava não a impediu de ser admirada e respeitada pelos alunos. Ao passo em que contribuía para o desenvolvimento da escola como um todo, sem saber, Prazeres abriria as portas para a sua entrada no mundo do teatro. A primeira medida tomada por ela foi tornar obrigatório o uso da farda entre os seus alunos. Camisa branca e calça azul. Como não podia exigir e nem todas as famílias tinham condição de adquirir a roupa, Prazeres improvisava. Pedia a amigos, a pais com melhor condição financeira e dava sempre um jeito de fazer com que sua turma estivesse vestida de forma padronizada. Conclusão: a turma da professora Prazeres era diferenciada e por esse motivo sempre representava a escola em eventos externos. As diferenças não paravam por aí. Além de exigir que todos os seus alunos viessem fardados, Prazeres não permitia que nenhum deles recreasse com os demais na quadra esportiva. Enquanto todos os professores se reuniam numa sala reservada no horário do intervalo, ela permanecia em sala de aula, compartilhando daqueles momentos de recreação. “Como eu era muito pequena, e alguns eram até maiores que eu, as pessoas confundiam quem era a professora e quem eram os alunos. Eu brincava de bola, pulava corda, quebra-cabeça, jogo de botão. Afastávamos tudo e ali era o nosso circo”, lembra, com aspecto nostálgico. O domínio da professora Prazeres em sala de aula ainda hoje é lembrado por quem a acompanhou nesse período. Evasão era algo raro nas turmas onde ensinou, graças à forma como desempenhava seu trabalho. Se a criança faltasse hoje, no dia seguinte ela enviava um bilhete para a mãe questionando a ausência. Afora o diário de classe, Prazeres atualizava, diariamente, um caderno onde registrava o desempenho de cada aluno, individualmente, o ano inteiro. Se determinada criança não trouxesse o dever de casa respondido, era motivo para registro nesse diário. Uma boa ação também era escrita com a mesma ênfase. Todo esse cuidado para com os alunos era refletido no dia-a-dia escolar. A turma de Prazeres andava sempre em fila, estava fardada e ti45


Prazer em Conhecer nha os cabelos cortados. Higiene foi um dos fatores priorizados por ela na transmissão do conhecimento. Como a maioria dos alunos era de famílias pobres, ela mesma cortava os cabelos deles. A cada quinze dias, Prazeres reunia um grupo de mães para cuidar do visual de seus meninos, como costuma citar. Cortavam unhas, cabelos e limpavam ouvidos. Antes de merendar, todos lavavam as mãos. O sabão era comprado pela própria Prazeres. Em fila, eles iam e vinham e o último trazia o sabão de volta. Prazeres sempre foi uma professora assídua, passava horas além do expediente normal na escola. Ciumenta e bastante cautelosa com o processo educativo de seus alunos, nas poucas vezes em que precisou faltar, por motivos que a lei lhe assegurava, tratava logo de comunicar aos alunos com antecedência. -Amanhã, a tia não vem, então vocês não venham, para não irem pra outra sala. Não venham! No dia seguinte, nenhum deles estava na escola. Mesmo sabendo que aquilo não era correto, ela o fazia tranquilamente. Acreditava que se a criança ficasse dispersa, todo o seu esforço para educá-la fracassaria. Já consagrada atriz, em época de turnês ou quando iria participar de festivais realizados em todo o País, Prazeres conciliava bem as duas funções. Nunca permitiu que seu trabalho teatral comprometesse o bom andamento das atividades na escola. Quando precisava se ausentar por um período mais longo, ela mesma providenciava uma substituta. Não queria que qualquer professora ocupasse a sua vaga, então recorria à direção para pedir que a deixassem sugerir. Todo o roteiro de aulas ficava pronto. Mensalmente, ela precisava cumprir uma carga horária de 200 horas/aula. Sua base era o primário, onde o professor é polivalente e precisa dominar todas as disciplinas. Mas Prazeres ensinava também a turmas do Ensino Fundamental, para complementar a jornada de aulas. Nestas turmas, trabalhava Língua Portuguesa e Educação Artística. As aulas do primário aconteciam no turno da manhã. Prazeres sempre ensinava a turmas de terceira e quarta-séries. Desde cedo, a professora Prazeres Barbosa aprendeu a transformar a sala de aula num palco. Fazia isso com a maior naturalidade. Ao mesmo 46


Capítulo 3 - Prazeres nas trilhas do Magistério tempo, era extremamente exigente em relação à questão da obediência, do respeito e de manter as coisas em ordem. Quando entrava na sala de aula, era recebida pelos alunos com uma música de boas-vindas composta e ensinada por ela. “Bom dia professora, é de manhã, tudo bem? A tarde vai até o pôr-do-sol (pôr-do-sol). Boa noite não lhe dou, pois dormindo já estou Esperando um outro dia amanhecer, pra ver você! Tra, lá, lá, lá, lá... Esperando um outro dia amanhecer.” O clima de paz era prioridade para ela. Além de propagar valores morais, sua veia religiosa era aflorada também entre os alunos. Quando terminavam de cantar, ela os ensinava a orar. Diferente de educadores católicos, que ensinam a rezar a oração do “Pai Nosso”, Prazeres incentivava-os a expressarem aquilo que sentiam. Agradeciam pela vida, pela família, pela professora, pela escola. “Eu ensinava o menino a ter intimidade com Deus e isso marcou todos os alunos que passaram por mim. Se você não o ensina a ter essa intimidade e respeito por Deus, ele não terá por você”, afirma. A relação de Prazeres com os alunos pode ser comparada com o convívio entre mãe e filho. Uma relação de amor, proteção, educação, respeito e disciplina. Os outros professores, impressionados com a forma como ela trabalhava, perguntavam, ironicamente, se achava aquilo suficiente para mudar o mundo. Nada disso, entretanto, a fazia desanimar. Prazeres tinha em mente que todos os valores e boas maneiras que ensinava seriam adquiridos por aquele grupo seleto de crianças. Adiante, eles repassariam o que aprenderam e a corrente seria multiplicada naturalmente. Em época de matrícula, a direção enfrentava situações distintas em relação à professora Prazeres Barbosa. As mães mais corujas queriam que os seus filhos ficassem na turma de “dona Prazeres”. As crianças que não a conheciam, hesitavam. Afinal, dona Prazeres tinha fama de brava. Ela costuma dizer que foi professora durante 25 anos por vocação e que trabalhou com amor e dedicação para formar cidadãos, mas sempre exigiu ordem e 47


Prazer em Conhecer respeito entre eles. Nas horas de brincadeira, tornava-se uma criança, porém, quando o assunto era disciplina e cumprimento de deveres, era uma mãe rigorosa. Nenhum de seus alunos ia para a escola sem tomar banho. Para isso, ela fazia reunião com os pais no início do ano. Explicava como era o seu sistema de trabalho e pedia a parceria da família. “Eu sou professora, mas não sou vaso sanitário. Eu educo aqui e vocês educam em casa. Posso contar com vocês?”, costumava dizer. Chegava a comprar escovas de dente para os alunos mais carentes. Em época de inverno, os pequenos chegavam tremendo à escola, mas todos vinham limpos. Quando questionados sobre o porquê de estarem com tanto frio, os meninos tinham a resposta na ponta da língua: “senão dona Prazeres briga comigo”. A fiscalização era ferrenha. Ela mandava que todos colocassem as mãos sobre as bancas, para observá-las. Quando alguma criança estava com as unhas grandes ou sujas, pegava a tesoura imediatamente e cortava. Em seguida, mandava que fosse lavar as mãos. “Eu formei o menino para ser gente em todos os aspectos”, afirma Prazeres. Todo esse cuidado e desenvoltura faziam com que ela fosse disputada pelas mães. Diva Galvão, diretora da escola, interferia dizendo que não era possível ter em sala de aula uma quantidade de estudantes maior que a prevista. O castigo ideal para o aluno problemático era estudar com dona Prazeres. A criança vinha praticamente forçada. A ideia que tinham da professora brava e rígida acabava, porém, em questão de dias. Prazeres fazia um acordo com o aluno indisciplinado. Propunha que ele estudasse com ela durante uma semana e, no final, ele ficaria livre para decidir se continuaria ou não. Procurava entender a criança, colocava-se na posição dela. Fazia questão de abraçar, apertar a mão para confirmar o acordo e bater ombro no ombro. Esse aluno iria sentar próximo à professora e seria um colaborador em sala de aula. Acabada a semana, a diretora mandava chamar a criança rebelde. “E aí, vai voltar para sua professora ou quer ficar com dona Prazeres?”. Ela não se lembra de nenhuma criança haver optado pela primeira hipótese. Com isso, a turma ia crescendo a cada dia e Prazeres administrava tudo. Antes 48


Capítulo 3 - Prazeres nas trilhas do Magistério de sair da escola, os alunos tinham ainda outra missão importante: deixar a sala limpa para o dia seguinte. Todos tiravam o lixo que havia debaixo das carteiras escolares; enquanto um varria o espaço, outro estava com a pá em mãos. Faziam isso cantando. Ao passo em que as outras professoras gritavam para controlar os seus alunos, a turma de Prazeres deixava a sala de aula em fila indiana. O mesmo acontecia na entrada. Sentada, na sala dos professores, ela observava a cada um. Bastava um olhar e o aluno que estivesse fora da fila se integrava aos demais. Em períodos de avaliação, a professora costumava ser ainda mais rígida. Ela não dava oportunidade para que o aluno “colasse” de forma nenhuma. Procurava sempre fazer com que a criança refletisse acerca de tudo, inclusive sobre os efeitos negativos de escrever numa prova aquilo que o outro colega sabia. Mas o seu critério de avaliação também era diferenciado. O aluno era analisado diariamente, através do diário pessoal que ela mantinha. Se alguém se dava mal num exame, teria oportunidade para recuperar aquela nota. Prazeres sempre gostou de trabalhar em grupos. A turma de 40 alunos era dividida em equipes de quatro, para facilitar a aprendizagem. O aluno que sabia mais iria ensinar a três que estivessem com dificuldades. Em aulas de revisão, Prazeres dividia a turma em dois grandes grupos e fazia uma verdadeira competição para ver quem havia assimilado melhor o conteúdo trabalhado. “Os meus alunos não aprendiam apenas comigo, eles aprendiam também com os colegas. Ensinar não é difícil, o difícil é quando você não tem objetivo ao ensinar. Eu não ensinei por ensinar, eu formei cidadãos”, analisa. Um acontecimento marcante, na época da Escola Elisete Lopes, levou Prazeres a receber uma homenagem do antigo Departamento Regional de Educação (DERE). Numa de suas turmas de terceira série, ela se deparou com um aluno que tinha dificuldade para falar. O menino se chamava Junior e todos os colegas diziam que ele tinha a língua presa. Prazeres perguntou para Junior se aquilo era verdade e ele balançou a cabeça afirmando que sim. Em seguida, tentou dizer que a avó tinha dito que a sua língua era presa. A professora não entendeu nada e pediu que ele escrevesse. 49


Prazer em Conhecer “Muito bem, estire a língua”, ordenou. Como todos os colegas observavam atentamente, Prazeres mandou que eles colocassem a língua para fora ao mesmo tempo. Ao constatar que não havia diferença entre a língua do menino e a dos demais alunos, ela iniciou um trabalho - com a ajuda da turma - para fazer com que Junior aprendesse a falar corretamente. Todos os dias escrevia cinco palavras com as letras ‘l’ e ‘r’, para que ele soletrasse. Os colegas de classe ajudavam. Prazeres continuava insistindo, mostrando para o menino que a língua dele era igual à dos demais. Em casa, Junior praticava os exercícios. No dia seguinte, ficava à porta da escola, esperando a professora chegar. Quando a via, corria ao seu encontro para soletrar as palavras que ela havia passado. Dois meses depois, o menino falava corretamente. “Fui homenageada por isso. Ele passou por todas as professoras e ninguém o fez falar. Eu nunca mandei um aluno para a direção. Sempre resolvia tudo sozinha. Era brava, mas era amada, porque era muito verdadeira. Eu via meu aluno como um filho e queria o melhor para ele”, conta. Na década de 1980, um projeto do Governo de Pernambuco chamado ProdiArte mudou radicalmente o dia-a-dia de algumas escolas públicas. A proposta era ampliar a jornada de educação nos finais de semana através de atividades artísticas e culturais, para que os alunos tivessem acesso às ações que costumam ser desenvolvidas em escolas privadas. Os professores capacitados para esse fim passaram a trabalhar com aulas assistemáticas. A Escola Elisete Lopes foi uma das privilegiadas com o projeto. Lá, as atividades funcionaram tão bem que foram mantidas durante muitos anos, quando outras escolas sequer conseguiram executá-las. O ProdiArte tinha como meta fazer com que o aluno permanecesse na escola, nos finais de semana, de uma forma diferente. Era necessário desenvolver as várias expressões artísticas e Diva Galvão não teve dúvidas na hora de escolher qual professor poderia tomar a frente dos trabalhos. Embora outros colegas auxiliassem as atividades, Prazeres Barbosa foi, segundo todas as diretoras que passaram pela instituição, a pessoa que fazia com que tudo acontecesse. A parte social da escola era, sem dúvidas, movimentada através do esforço da professora-artista. 50


Capítulo 3 - Prazeres nas trilhas do Magistério Ao lado do esposo Orlando Bezerra Cavalcanti (falecido), a diretora Diva Galvão fazia da escola a sua própria casa. Assim como Prazeres, ela vivia em prol do trabalho e sempre foi uma amante das artes. Trabalhou durante 18 anos na Escola Elisete Lopes, fundada por ela mesma. Diva fez questão de apoiar Prazeres em tudo o que ela desenvolvia na comunidade escolar. Nos finais de semana, eles revolucionavam o espaço. “Prazeres era muito dinâmica, tinha uma facilidade imensa de manter a disciplina em sala de aula. Ela sempre foi uma professora exemplar. Tudo o que queria, conseguia. Não através da imposição, mas através da liderança, exercida não apenas entre os alunos, mas também entre os professores”, define Diva, que hoje vive na cidade de Maceió (AL). Através do ProdiArte, Prazeres criou clube de mães, ministrava aulas de jardinagem, artesanato (em couro, seixos, mariscos e cordas), teatro, música, dança, artes plásticas e diversas outras formas. A escola mantinha ainda uma horta, onde eram cultivados frutas, legumes e verduras com a ajuda dos alunos. Os trabalhos não ficavam restritos apenas aos estudantes, pelo contrário, a comunidade era convidada a participar de tudo. Todas essas atividades eram promovidas num grande salão que havia na instituição. Quando precisavam pintar o prédio, por exemplo, recorriam aos pais com tal habilidade. O mesmo ocorria quando necessitavam consertar algumas cadeiras. Os alunos, além de participar das atividades artísticas, faziam a limpeza da escola. “Eu e Diva ficávamos como duas carrapetas. Nós éramos o todo da escola e eu sinto muito prazer nisso”, acrescenta Prazeres, que chegou a criar um hino e uma bandeira para a Escola Elisete Lopes, usados principalmente nos desfiles cívicos de Sete de Setembro. Essas criações se perderam com o tempo. Em 1982, Diva Galvão deixou a direção da Elisete Lopes e foi trabalhar no Dere Norte Recife. A sua substituta – que não terá o nome citado por questões éticas – enciumada com as atividades desenvolvidas por Prazeres e intrigada com a forma como ela costumava trabalhar numa escola pública, decidiu acabar com tudo o que vinha sendo feito até então. Antes de tornar-se diretora, essa professora trabalhava como supervisora pedagógica. As implicâncias começaram nesse período. 51


Prazer em Conhecer Certa vez, Prazeres estava em sala de aula, escrevendo algo no quadro, quando ela abriu a porta, fez sinal de silêncio para os alunos e sentou-se numa das últimas cadeiras. As crianças ficaram todas inquietas e começaram a sorrir, afinal, não estavam acostumadas com aquele tipo de comportamento. A turma da professora Prazeres era muito silenciosa, além disso, todos os seus alunos eram educados para que, qualquer pessoa que adentrasse à sala, fosse recebida de pé e com a saudação generosa de um bom dia. Ao perceber a inquietação, Prazeres virou-se em direção aos alunos e perguntou o que estava acontecendo. Os meninos apontaram imediatamente para a supervisora. - Ah, bom dia! Sabe por que eles estão nessa algazarra toda? É porque eu ensinei que nós não devemos entrar na casa alheia sem pedir licença. Daí, você entrou e não me pediu licença – porque aqui é a minha casa - e sentou. E eles acharam estranho. Quem é que está certa, a professora ou a supervisora? Eu quero dizer para vocês que quem está errada é ela. E ela veio aqui hoje, porque não sabe dessa matéria e veio aprender comigo para depois ensinar. Não é supervisora?, perguntou uma Prazeres irônica. - É, respondeu, sem graça, a supervisora. - Eu quero agradecer a sua presença, mas a aula já terminou. Assim que o turno acabou, a tal supervisora mandou chamar Prazeres até a direção. Indignada, disse que a professora a havia desmoralizado perante os alunos. Prazeres reagiu criticando a forma - pouco ideal para uma educadora – como ela adentrou a sua sala e ameaçou colocá-la para fora do lugar caso a cena fosse repetida. A partir daí, a relação entre as duas só viria a piorar. Quando assumiu a direção da escola, a antiga supervisora encontrou os meios para se vingar da professora que a havia desafiado tempos antes. Inicialmente, ela pôs um ponto final em todas as atividades artísticas desenvolvidas. Acabou com absolutamente tudo. Em seguida, passou a questionar o fato de Prazeres exigir que seus alunos usassem fardamento, argumentando que ela agia contra a lei. Mais uma vez a professora não abriu mão, afinal, embora soubesse que a farda não era obrigatória, ela mesma havia conseguido as roupas para os alunos mais necessitados. 52


Capítulo 3 - Prazeres nas trilhas do Magistério Numa reunião com todos os professores da escola, a gestora foi adiante em sua vingança. - A partir de amanhã você vai “soltar” os meninos para o recreio. - Repete, não ouvi, devolveu Prazeres. - Você, a partir de amanhã, vai “soltar” os meninos na hora do recreio. - Vou não! Eu vou recrear com os meus meninos na sala de aula, como sempre fiz. Quando você chegou, eu já estava aqui há muito tempo e faço o certo. - “Apois” você vai, determinou a diretora. - “Apois” eu não vou! É minha palavra contra a sua. No dia seguinte, no horário de recreação, permaneceu em sala de aula com os seus alunos. A diretora mandou que alguém fosse observar. Quando ficou sabendo que Prazeres insistia em não obedecê-la, recorreu à direção regional de educação, comandada à época pela professora Leila Gorayeb. A diretora aproveitou a oportunidade e disse tudo o que queria a respeito de Prazeres Barbosa. Esperando uma punição severa para a funcionária desobediente, ela deixou o departamento com motivos de sobra para que não houvesse tomado aquela decisão. “Volte para a sua escola e peça a Deus para ter mais duas ou três professoras como Prazeres. Eu conheço o trabalho dela”, disse Leila na ocasião. O tempo passou e essa mesma diretora, que tanto perseguiu os trabalhos artísticos dentro da escola, antes de receber o direito de aposentadoria, passou os últimos anos ensinando justamente a disciplina à qual não atribuía nenhum valor: Educação Artística. “Eu costumo dizer que existem pessoas que precisam se mascarar para aparecer. Prazeres não precisou nada disso. Ela se fazia respeitar pela diferença do seu trabalho. Houve conflitos, mas nada que permitisse que ela não brilhasse. Prazeres tinha um brilho próprio e eu digo que ela brilha tanto que às vezes ofusca o brilho da luz que está ao redor dela”, opina Leila Gorayeb, ao falar sobre Prazeres. Em 1987, Doralice Feliciano, que era secretária da escola na época de Diva Galvão, assumiu a direção da Elisete Lopes. A mudança permitiu 53


Prazer em Conhecer que Prazeres retomasse os trabalhos que tanto gostava de desenvolver com os alunos. Prazeres e Doralice se conheceram no início dos anos 1970, na Primeira Igreja Batista de Caruaru. Nessa época, Prazeres liderava o grupo de jovens da igreja. As duas se tornaram amigas, mas a relação tornou-se ainda mais sólida quando passaram a trabalhar juntas. Dos quatro anos em que passou à frente do educandário, Doralice guarda boas lembranças de Prazeres, a começar pelo apelido carinhoso que colocou nela. “Prazeres é uma líder nata, ela liderava a turma de uma maneira que chamava a atenção de todos. Os alunos a adoravam; por onde ela andava, tinha um grupo de meninos atrás dela. Todos os dias ela recebia flores. Pegava uma flor, colocava na orelha e ficava o tempo todo andando com ela. Por isso eu a chamava de frorzinha”, relembra a amiga. O lado frágil e sensível da educadora também marcou Doralice. “Ela era uma professora tão estimada que quando um aluno fazia qualquer coisa que não a agradava, ela vinha me contar e começava a chorar. Isso me chamava muito a atenção. Ela era autoritária, dominava a criançada toda de uma maneira que aquilo se transformava em amor. Era impressionante a maneira de Prazeres trabalhar como professora. Era uma profissional diferenciada, essa é a palavra correta”, descreve. Com a saída de Doralice, a direção da Escola Elisete Lopes foi assumida pela professora Maria Helena Vila Nova, que também viria a ser uma grande amiga e parceira de Prazeres. Como já estava prestes a se aposentar nesse período, ela já não desenvolvia os trabalhos artísticos com tanta ênfase na escola. Maria Helena foi a sua última diretora. “Prazeres era muito organizada e não tinha essa distinção de porque estava numa escola pública ter que fazer as coisas de qualquer jeito. Nós conversávamos muito, eu ia sempre a casa dela. Lá, ela fazia uma tapioca com queijo que era uma delícia”, recorda Maria Helena, que, coincidentemente, faz aniversário no mesmo dia que Prazeres. Prazeres Barbosa aposentou-se como professora no dia 13 de maio de 1992. Toda a escola chorou a sua saída. Organizaram uma festa de despedida. “Saí de lá deixando saudades, mas não que eu tenha sido boazinha; era brava, rigorosa até o extremo, pois estava formando gente. Hoje, quan54


Capítulo 3 - Prazeres nas trilhas do Magistério do encontro meus ex-alunos, eles dizem que queriam uma professora igual a mim para ensinar aos seus filhos e netos”, conta. Apesar de estar deixando a escola, a professora levaria consigo uma parte dela. No início dos anos 1980, quando dava os primeiros passos na Elisete Lopes, Prazeres criou um grupo de teatro amador chamado Os Sutis. O nome é uma referência às coisas que são feitas com qualidade, porém, na simplicidade. “Éramos Os Sutis, mas quando fôssemos nos apresentar, mostraríamos a que viemos. Então, o nome veio dessa sutileza, da garimpagem que nós fizemos na escola, descobrindo muita gente boa que estava escondida”, explica Prazeres. O grupo de teatro foi a maneira ideal encontrada por ela para desenvolver a arte na escola. Prazeres sempre acreditou na educação aliada à arte. Não vê uma coisa dissociada da outra, pois acredita que a arte é capaz de absorver o indivíduo da forma como ele é. Além de descobrir novos talentos, o grupo serviu para dar uma boa guinada nos eventos que eram promovidos na comunidade escolar. “Isso foi o grande marco de Prazeres. Ela não entrava na sala apenas para dar aula, ela tinha uma meta. O teatro está no sangue de Prazeres, é a vida dela. E ela usou isso para mostrar aos meninos a importância do teatro”, afirma a professora Carminha Anunciação, que trabalhou durante 14 anos na Escola Elisete Lopes. Os Sutis era formado pelos próprios alunos. Prazeres começou a montar pequenas peças e a iniciativa foi dando certo. Nessa fase, a escola tinha como vice-diretora a professora Erenice Costa Lisboa, que escrevia espetáculos teatrais, mas até então ninguém havia mostrado interesse por seus textos. Prazeres ficou encantada com aquilo e decidiu montá-los. Encenou quase todos, como A Bruxa do Cabelo Azul (que foi um grande sucesso, chegando a participar de um festival competitivo no bairro do Derby, na cidade do Recife) e O Espantalho, ambos escritos por Erenice Lisboa. A parceria entre as duas foi perfeita. “Erenice tinha o dom de escrever. Foi uma mão forte. Ela costurava as roupas para encenarmos os espetáculos”, lembra Prazeres. Erenice Lisboa vive atualmente na cidade litorânea de Búzios, no Rio de Janeiro. Acometida pelo mal de Alzheimer, 55


Prazer em Conhecer sua memória já não lhe permite recuperar determinadas lembranças. Em 1981, quando se aproximava o Dia das Crianças, Prazeres se preparava para montar o espetáculo A Caixa Mágica, que seria encenado na Escola Elisete Lopes. Os ensaios já estavam bem encaminhados, quando um dos alunos – que iria interpretar o rei – desistiu. Às pressas, correram em busca de um substituto. A menina que faria o papel da rainha estudava na sexta série e decidiu convidar um colega de turma para ocupar a vaga deixada pelo outro integrante. O jovem Ednilson Leite não gostava de teatro até então. Quando soube que a direção do espetáculo era feita pela professora Prazeres Barbosa, ficou ainda mais cismado, afinal, todos os alunos a temiam por sua rigidez. Mesmo assim, decidiu encarar o desafio. “Prazeres marcou para nos encontrarmos num dia de sábado, eu fiz uma leitura, ela gostou e me mandou decorar o texto para o próximo ensaio. Nós fizemos a peça e foi um grande sucesso”, diz Ednilson, que chegou ainda a participar de outro espetáculo montado por ela, O Casaco do Pirata Enferrujado. Prazeres e Ednilson passariam a manter uma boa relação a partir daí. “Quando acabou o teatro na escola, ela já estava no Sesc e me indicou a Severino Florêncio para eu entrar no elenco do espetáculo Solte o Boi na Rua. Eu era muito verde naquele tempo, mas ela disse para eu não me preocupar. Eu comecei a ensaiar, a conhecer a turma e essa foi a primeira vez que contracenei com Prazeres, minha professora. Juntos, fizemos os espetáculos A Promessa, Avatar (ele participou na técnica) e Nó de 4 Pernas”, relembra. Quando se aposentou, Prazeres trouxe consigo o grupo de teatro que havia mantido durante anos na escola. No dia 2 de outubro de 1992, dia do aniversário da atriz, em uma festa surpresa organizada num salão localizado no bairro Cohab II, em Caruaru, o grupo Os Sutis passou a se chamar Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa, um dos maiores grupos teatrais existentes na cidade. Nesse mesmo ano em que montou o espetáculo A Caixa Mágica na escola, Prazeres foi surpreendida com a criação de um festival estudantil em Caruaru. Promovido pelo Teatro Experimental de Arte (Tea), uma 56


Capítulo 3 - Prazeres nas trilhas do Magistério das escolas de teatro pioneiras na cidade, o Festival de Teatro Estudantil e Amador do Agreste (Feteag) promoveu sua primeira edição em 1981. Na época, o público que frequentava o teatro caruaruense era composto em sua maioria por adultos. Percebendo a pouca participação da juventude no movimento teatral, Fábio Pascoal – filho do casal Arary Marrocos e Argemiro Pascoal, criadores e mantenedores do Tea – ao lado do ator Chico Neto, idealizaram o Feteag para envolver os estudantes e trazê-los para o teatro. “Nossa intenção era descobrir valores e aumentar plateia”, explica Argemiro. Prazeres viu no Feteag a oportunidade ideal de levar para fora da escola o trabalho que desenvolvia com o grupo Os Sutis. Rapidamente, inscreveu-o para a competição. O espetáculo encenado pelo grupo foi Pluft, o Fantasminha, de Maria Clara Machado. O resultado do primeiro Feteag surpreendeu a iniciante diretora. Prazeres Barbosa recebeu prêmio de melhor direção e a garota que protagonizou a peça foi contemplada com o prêmio de melhor atriz. Começava aí uma nova história na vida da arte-educadora. Foi no Feteag que a professora Prazeres teve a oportunidade de mostrar seu talento para as pessoas do movimento teatral pela primeira vez. Severino Florêncio, que há pouco tempo havia formado o Grupo de Teatro do Sesc Caruaru, assistia a tudo. No final, ele foi cumprimentá-la e a convidou para participar de seu grupo. A decisão, embora ela sequer imaginasse, iria transformar para sempre a sua vida.

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Capítulo 4

Teatro, prêmios e consagração

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Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração

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Grupo de Teatro do Sesc Caruaru foi criado em maio de 1980 através de uma oficina para iniciantes, ministrada por Severino Florêncio na antiga unidade do Sesc, localizada na Rua Mestre Pedro, próximo à estação ferroviária de Caruaru. Nessa época, o Sesc estava interessado em contratar alguém que pudesse movimentar a área teatral, a fim de montar um grupo para se apresentar em Caruaru e noutras cidades, servindo como instrumento de divulgação. A descoberta de Severino Florêncio, que dois anos antes havia iniciado sua vida artística no Teatro Experimental de Arte (Tea), foi feita pela então funcionária do Sesc, Maria Gilvaneide Vital (falecida). Ele apresentou sua proposta para a diretora da unidade, Sônia Raposo, que simpatizou com a ideia. Logo, o ator oficineiro tornou-se diretor artístico dos espetáculos montados e produzidos pelo Sesc, onde trabalha até hoje. A estrutura inicial do grupo era precária. Severino, no entanto, soube lidar muito bem com as limitações. De início, montou pequenos espetáculos como Fuga de Lampeão (criação coletiva do grupo) e Pesadelo (de Alfredo Montavani). Em 1982, estrearam a terceira montagem, Hoje a Banda Não Sai, de Severino Tavares. Foi nesse ano que Prazeres chegou ao Sesc. No final de 1981, quando foi convidada por Severino Florêncio, durante a premiação do I Feteag, Prazeres estava vivendo uma das piores fases de sua vida pessoal. Recém-separada, afastada da Igreja Batista – onde havia passado boa parte de sua vida - temia o que a família e os amigos poderiam pensar caso começasse a se dedicar ao teatro, que não era visto com bons olhos pela sociedade daquela época. Insegura, ela demorou algum tempo para aceitar o convite. Acompanhada por Erenice Lisboa, sua companheira de escola e teatro, no ano seguinte Prazeres deu um importante passo rumo à concretização de seu sonho de infância. Erenice era uma pessoa de mente aberta e muito tranquila. A sua forma de enxergar a vida foi decisiva para que Prazeres aceitasse enveredar pelo teatro. Ao passo em que a carreira como professora estava cada vez mais consolidada, a trajetória de sucesso nos palcos começaria alguns anos depois que ela decidiu atender ao chamado de Severino. 59


Prazer em Conhecer Tímida, com dificuldade para se entrosar com a equipe e totalmente desvinculada do movimento artístico, Prazeres começou a participar de oficinas, assistir a vários espetáculos e a acompanhar o grupo em suas apresentações. Adiante, montaram dois novos espetáculos: O Planeta das Crianças (de Severino Tavares) e Virgulino na Escola (de Francisco Filho). Prazeres até então não havia sido escalada para compor o elenco de nenhuma peça. Em dezembro de 1983, a unidade do Sesc Caruaru foi transferida para o bairro Petrópolis, onde funciona até os dias atuais, permitindo que as atividades artísticas fossem ampliadas. Meses antes, em nove de julho, o extinto jornal A Defesa, da Diocese de Caruaru, anunciava que após uma cuidadosa escolha de texto, “foi feita uma seleção com os atores mais experientes para compor o elenco do sexto espetáculo montado pelo Grupo de Teatro do Sesc”. Escrita por Ariano Suassuna, A Pena e a Lei foi a primeira grande montagem do grupo e marcaria a estreia de Prazeres Barbosa nos palcos. Ao abraçar a carreira artística, Prazeres enfrentou o desprezo de todas as pessoas que amava. Com exceção de sua mãe, dona Antonina, todos se afastaram dela por não aceitar a sua mudança de comportamento. Sozinha, com um filho pequeno, passou a encontrar no teatro as alegrias que a vida retirara de si até então. “Foi uma surpresa porque não imaginávamos que no seio de uma família tão pobre e dedicada ao trabalho duro, viesse a surgir uma atriz. Achava-se que quem estava envolvido em teatro eram pessoas senão na sua totalidade, mas de certa forma excluídas da convivência social”, explica Bernardo Barbosa, irmão de Prazeres. A mesma opinião é compartilhada pela irmã Maria da Paz. “Nós achávamos que uma pessoa séria, de boa índole, não devia se envolver com teatro. Eu, na verdade, não gosto de teatro. Ia apenas para prestigiála. Logo no início, diagnostiquei-a como uma boa profissional. Mas, para mim, ela nasceu para ser mestra. Caruaru perdeu uma pessoa de alto nível na área de educação. Mamãe era tão apaixonada por ela que se não gostasse de vê-la fazendo teatro, omitia”, afirma. Nessa época, trabalhava no Sesc uma psicóloga chamada Socorro, que promovia equipes de interação entre o grupo. Através de rodas de conversas, ela fazia um acompanhamento psicológico importante para que 60


Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração cada um dos atores e atrizes pudesse superar perdas, angústias e separações. “Aquilo nos ajudou a sentir que não estávamos fazendo nada errado, muito pelo contrário, nós estávamos apostando nos sonhos”, afirma Prazeres. Mesmo sem contar com o apoio da família, ela disse para si mesma que iria fazer teatro. E assim o fez. A Pena e a Lei era um espetáculo com mamulengos e estreou em abril de 1984, num pequeno auditório onde hoje funciona o Teatro do Sesc. O espaço era utilizado para reuniões e festas e havia um palco de cimento. A equipe foi improvisando, colocou refletores, ornamentou a sala e convidou a plateia. A história é composta por três atos e Severino Florêncio montou o espetáculo com apenas dois. O primeiro personagem interpretado por Prazeres foi a boneca Marieta. Cerca de 70 pessoas assistiram à sua estreia no teatro. Aos 34 anos, a atriz iniciava ali uma nova história de vida que nos anos seguintes tornar-se-ia vitoriosa. Em suas primeiras apresentações, Prazeres logo conquistou o público pela desenvoltura e naturalidade em cena. Ao vê-la atuar, o teatrólogo caruaruense Vital Santos, autor da consagrada peça O Auto das Sete Luas de Barro, que conquistou em 1980, no Rio de Janeiro, o prêmio Molière de direção, reconheceu o talento da atriz iniciante. “Menina, onde era que tu estavas escondida”, disse na ocasião. Em agosto de 1984, o Grupo do Sesc Caruaru inscreveu A Pena e a Lei para participar do III Festarc (Festival de Teatro de Arcoverde), no Sertão pernambucano. A participação rendeu ao grupo três importantes troféus. Severino Florêncio foi eleito melhor diretor, a montagem recebeu troféu de melhor espetáculo escolhido pelo júri popular e a principiante Prazeres Barbosa eleita atriz revelação, recebendo o primeiro prêmio da carreira. “Discutimos em grupo por que fazer esse espetáculo. Nós queríamos continuar fazendo um espetáculo regional, que agradasse ao público, com um autor consagrado e que tinha a ver com teatro de mamulengo. Então, montamos um belo figurino, uma bela maquiagem e com poucos recursos a gente fez um espetáculo bonito e dinâmico. Prazeres atuava e dava um colorido especial à peça”, destaca Severino Florêncio. A Pena e a Lei participou ainda do projeto Vamos Comer Teatro, 61


Prazer em Conhecer promovido pela Federação de Teatro de Pernambuco (Feteape); do IV Festival de Teatro Estudantil do Agreste e do VIII Festival de Teatro Universitário de Feira de Santana (BA), em 1985, conquistando o Jalesco de Ouro como melhor espetáculo apresentado. Prazeres recebeu indicação para o prêmio de melhor atriz. A peça realizou prolongada temporada em Caruaru e visitou mais de 20 cidades do Agreste e Sertão pernambucanos. A partir daí, a atriz teve ainda mais certeza de que estava no caminho certo e decidiu investir em si própria. Além de atuar, no grupo do Sesc, Prazeres desenvolveu, ao lado de Severino, uma parceria importante na direção de elenco dos espetáculos. O fato de ser professora a ajudava a opinar acerca das pontuações que poderiam ser feitas para melhorar a cena, exprimia com facilidade algumas intenções e isso fez com que Severino passasse a acreditar ainda mais em seu talento, a ponto de lhe dar os papéis principais dos maiores espetáculos que o grupo montou ao longo dos 15 anos em que existiu. “Nossa preocupação sempre foi com a disciplina. E Prazeres sempre foi super disciplinada, muito responsável e isso me agradou”, comenta o diretor. Finda a temporada do espetáculo, a equipe se reuniu para discutir qual peça iria montar em seguida. Uma das características do Grupo do Sesc era a rotatividade de espetáculos e o caráter regionalista dos mesmos. Severino selecionava alguns textos e apresentava-os para decidirem conjuntamente qual iriam montar. Em junho de 1985, estreava no auditório da Casa de Cultura José Condé, em Caruaru, o espetáculo O Recado do Verde, de Erenice Lisboa, que até então tinha suas peças montadas apenas por Prazeres Barbosa, na Escola Elisete Lopes. O Recado do Verde é um espetáculo infantil musicado “dedicado às crianças, que são mais sinceras e reais que o adulto, pois ainda não sabem reprimir suas emoções”, dizia sua autora. A peça contava ainda com cinco músicas compostas por Abenildo Andrade. Em seu segundo espetáculo, Prazeres interpretava uma margarida. Um fato marcante aconteceu nesse período. Convidado pela direção do extinto Colégio Santo Antônio, de Caruaru, o grupo foi apresentar o espetáculo para os alunos. Uma apresentação meio conturbada, devido à 62


Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração má educação de algumas crianças, mas que prosseguiu até o fim. Quando a peça acabou, a plateia foi cumprimentar o elenco. Uma menina olhou para outro garoto e comentou, referindo-se a Prazeres: “ela é uma velha”. Um pouco surpresa, a atriz respondeu afirmando que era de fato uma velha, mas que estava interpretando uma flor. “Aquilo me marcou muito pela visão da criança, porque ela assistiu ao espetáculo e ali eu era uma menina. Eu tinha 35 anos e consegui passar aquela mensagem para ela”, relembra. Essa, aliás, não foi a primeira vez que Prazeres interpretou uma personagem mais jovem. Em 1995, aos 45 anos, quando estreou Valsa nº 6, de Nelson Rodrigues, ela viveu uma menina de apenas quinze anos. “Mas as pessoas não viam a de 45, viam a de 15”, acredita. Com a peça de tema ecológico O Recado do Verde o grupo se apresentou em cidades como Recife, Arcoverde, Garanhuns, Riacho das Almas e no Festival de Inverno de Campina Grande (PB), em julho de 1985. Foi indicado como melhor espetáculo no VI Festival de Teatro de Bolso do Recife, em agosto do mesmo ano. O “recado ecológico” teve vida longa. Dois anos após sua estreia, permanecia em cartaz no Teatro João Lyra Filho, conforme nota divulgada pelo Jornal do Commercio de 03 de janeiro de 1987. Contudo, foi o único espetáculo promovido pelo Sesc através do qual Prazeres não recebeu troféu de melhor atriz. Enquanto ainda estava em cartaz com O Recado do Verde, em maio de 1986 o grupo estreou no Teatro João Lyra Filho a peça Solte o Boi na Rua, de Vital Santos. O espetáculo abordava os problemas sociais, destacando o descaso com a cultura popular, e concedeu um novo status ao grupo, permitindo a participação num circuito nacional de teatro. Em Solte o Boi na Rua, baseado na literatura de cordel, Prazeres era Amélia, uma das protagonistas do espetáculo. “Nas administrações públicas a única coisa que não é prioridade é o fazer artístico. Se você não priorizar a cultura, não levará sua cidade a lugar algum. A educação e a saúde passam primeiro pela cultura. É cultura com educação, cultura com saúde. É a cultura em primeiro lugar e as outras coisas vão sendo acrescidas. O espetáculo falava sobre isso, tudo era prioridade, menos a apresentação do Boi”, analisa Prazeres. 63


Prazer em Conhecer Com o objetivo de integrar grupos teatrais do Nordeste e CentroSul, o Departamento Nacional do Sesc promoveu entre os meses de outubro e novembro de 1987 um Circuito Nacional de Teatro. Por sugestão de Severino Florêncio, o Grupo de Teatro do Sesc Caruaru foi o primeiro da região a participar deste circuito e levou o espetáculo Solte o Boi na Rua para ser assistido por plateias de Curitiba e Ponta Grossa (PR), Rio de Janeiro, Barra Mansa e Friburgo (RJ) e Salvador (BA). Essa foi a primeira grande turnê do grupo, que a essa altura já tinha um nome consolidado. A peça foi fundamental para que Prazeres se tornasse conhecida em todo o interior de Pernambuco. Espetáculo circense pela linguagem, pela forma de apresentação e pelo cenário, Solte o Boi na Rua realizou mais de 80 apresentações, em aproximadamente 30 cidades. Participou ainda do projeto Vamos Comer Teatro em Palmares, Caruaru e Arcoverde; da I Mostra de Teatro de Garanhuns; XII Festival de Inverno de Campina Grande; I Mostra de Teatro de Caruaru e do XVII Festival de Arte de São Cristóvão (SE). O espetáculo teve boa aceitação por parte do público e da crítica e concedeu a Prazeres dois importantes prêmios de melhor atriz. O primeiro, na XII Mostra de Teatro Amador Brasileiro de Campina Grande (PB), em 1986; o outro, no IX Festival de Teatro Amador Universitário do Nordeste, realizado em novembro de 1987, na cidade de Salvador (BA). Também foi indicada ao prêmio, em agosto de 1986, durante o Festival de Inverno de Campina Grande. O sucesso garantido com o espetáculo exigiu que o próximo fosse ainda melhor, em todos os sentidos. Essa, aliás, era uma preocupação constante do grupo que quando estava em cartaz com uma peça, já se preparava para montar outra. Em suas reuniões, além das constantes oficinas – ministradas por Severino Florêncio e outros convidados – os integrantes participavam de debates e realizavam pesquisas sobre textos. Os ensaios aconteciam geralmente nos finais de semana, no próprio Sesc. Com exceção de Severino, que era funcionário do órgão e recebia remuneração pelos trabalhos desenvolvidos, nenhum dos participantes ganhava qualquer valor financeiro. Antes de montar a peça, a equipe criava 64


Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração um projeto, com planilha de custos e encaminhava à direção regional do Sesc. Depois, o valor era liberado. A instituição fornecia todas as condições necessárias para a realização do espetáculo, em seguida, o grupo restituía o valor com o dinheiro apurado nas bilheterias. Também destinavam 10% do valor ao teatro e mais 10% ao autor do texto. “O trabalho era auto-financiado, o Sesc dava todo o apoio logístico que eles precisavam. Todas as peças que apresentaram sempre agradaram muito ao público e a gente tinha um retorno financeiro bom por conta disso; eram peças em sua maioria cômicas e que agradavam muito. Prazeres marcou muito no desempenho das funções dela e foi uma das pessoas que se sobressaiu no grupo pelo trabalho, pelo comprometimento, pela tenacidade, pela criatividade”, comenta Sônia Raposo, diretora do Sesc Caruaru durante 30 anos e incentivadora do grupo. Apesar de não receberem nada pelo trabalho, os atores sentiam-se satisfeitos por estarem engajados no movimento teatral, contarem com oficinas gratuitas de teatro e com a oportunidade ímpar de se apresentarem em cidades do Brasil inteiro. Além de desfrutar da possibilidade de competirem em festivais regionais e nacionais ao lado dos maiores grupos e companhias teatrais do Brasil e também do exterior. Nas temporadas promovidas pelo Sesc, viajavam com todas as despesas garantidas. Geralmente iam para um local onde existisse uma colônia da instituição e lá ficavam hospedados. “Quando tinha cachê e já havíamos pago ao Sesc, investíamos no próximo espetáculo ou fazíamos uma festa para o elenco”, lembra Severino. O dinheiro que entrava geralmente era muito pouco, mesmo assim algum tempo depois Severino fez um acordo com o Sesc para dividir percaptamente, entre todos os integrantes, o dinheiro que sobrasse após haverem quitado a dívida com o órgão. “A essa altura todos já tinham visto o espetáculo, então ‘pingavam’ algumas poucas pessoas. E era tão pouco o que sobrava que nós passávamos na lanchonete de Prezado (Cosme Soares, ator caruaruense já falecido) e comíamos um sanduíche. Mas a gente era super feliz!”, conta Prazeres. Em muitas das apresentações que fizeram no interior pernambuca65


Prazer em Conhecer no, o grupo contou com o apoio de uma senhora chamada Maria das Noivas, que os colocava sobre um caminhão, preparava um sanduíche de arroz para cada um e levava-os até o local da apresentação. Maria é uma religiosa, envolvida no movimento católico e possuía uma loja de venda e aluguel de vestidos de noiva em Caruaru, daí o motivo de seu nome. Amante das artes e apaixonada pelo grupo, ela viabilizou várias apresentações em igrejas e paróquias naqueles tempos. À medida que os espetáculos foram se sucedendo, a fama do grupo se espalhou rapidamente. Depois da experiência positiva de espetáculos como A Pena e a Lei e Solte o Boi na Rua, o grupo decidiu apostar em um projeto ainda mais desafiador. Seguindo a temática de montar espetáculos regionais que estivessem mais próximos da realidade local, em 1987 iniciou as primeiras leituras de A Promessa, escrita pelo pernambucano Luiz Marinho. O espetáculo de maior sucesso da carreira do grupo e que consagrou Prazeres Barbosa nacionalmente. Quando Severino Florêncio, através do Sesc, pediu autorização ao autor para montar a peça, precisou enfrentar o primeiro dos muitos desafios que se sucederiam. Exigente, Luiz Marinho disse que liberaria o texto caso pudesse indicar quem seria a intérprete de Sebastiana, protagonista do espetáculo. Isso causou um grande impacto entre a equipe, especificamente em Prazeres, que mais uma vez havia sido escolhida para protagonizar a peça. Severino então o convidou para assistir a uma leitura do espetáculo e ele se dispôs a ouvi-los. O encontro aconteceu numa sala de formato redondo localizada no Sesc Caruaru. Prazeres foi logo perguntando qual parte do texto Severino gostaria que eles lessem, a fim de que Luiz Marinho pudesse apreciar o trabalho. Em cena, ela procurou dar o máximo de si, ao lado dos outros atores que integravam o elenco. Quando terminaram, ficaram surpresos com a postura do autor. Impressionado com o que havia visto, Luiz Marinho pediu desculpas e disse que a “sua” Sebastiana estava na mão certa. Prazeres ficou muito vaidosa com tudo aquilo. Para compor a personagem, a atriz teve a oportunidade de fazer laboratório dentro da própria casa. Na época em que iniciaram os primeiros 66


Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração ensaios, uma prima da família, conhecida por Nana de Zé Romeu, veio passar uma temporada na residência dos Barbosa. Caipira, criada no sítio, Prazeres viu naquela figura a imagem ideal para construir a sua personagem. Sem que ninguém soubesse, começou a observar todos os trejeitos da mulher. Procurava ver como ela comia, andava, dormia, a maneira como fazia as coisas. Uma sintonia quase que perfeita, afinal, Sebastiana era pobre, ignorante, zarolha e sequer sabia usar um vaso sanitário. A Promessa estreou no dia 1º de julho de 1988, às 21h, no Teatro João Lyra Filho e atraiu grandes plateias em suas primeiras apresentações. O espetáculo recebeu atenção especial da mídia local e regional e, durante meses, alimentou as seções de cartas à redação dos principais jornais, enviadas por quem assistiu à peça. Oito anos após sua criação e com nove espetáculos montados, o Grupo de Teatro do Sesc Caruaru foi apontado pela imprensa como o mais ativo na produção teatral da cidade naquela época. A nova montagem retratava a falta de entendimento entre o homem do campo e o homem da cidade, abordando satiricamente este tema numa linguagem regionalista. O texto valorizava o ambiente rural, seus costumes e crendices. O gestual, o sentimental e o brejeiro ganhavam uma dimensão lírica e ao mesmo tempo cômica em A Promessa, onde a sensualidade estava atrelada à malícia do “matuto”. Sebastiana, ainda que envelhecida, esbanjava vigor amoroso e sexual, a ponto de castrar acidentalmente o marido, numa mandinga de cigana. Um dos momentos mais engraçados da comédia era o depoimento prestado por ela em uma delegacia. Numa das primeiras apresentações do espetáculo, Luiz Marinho compareceu ao Teatro João Lyra Filho para assistir ao espetáculo. Quando os aplausos cessaram, o autor ficou de pé e pediu a atenção de todos os presentes. “Esse texto foi montado por muitos grupos e eu nunca tinha visto a Sebastiana que escrevi. Hoje, eu estou vendo a minha Sebastiana, aquela mulher com a simplicidade, com a pureza, eu estou vendo hoje e estou muito feliz”, disse, na ocasião. Em seguida, não conteve as lágrimas. Maria da Paz, irmã mais velha de Prazeres, também assistiu A Promessa e no final perguntou para ela o que Nana de Zé Romeu estava fazendo ali. As semelhanças eram tantas que quem conhecia aquela mulher 67


Prazer em Conhecer do sítio percebia claramente que Prazeres havia se espelhado nela para compor sua personagem. “Por onde andou, Sebastiana foi um sucesso. Ela era tão querida que certa vez uma mulher grávida veio até mim, com o marido, e disse que se o filho fosse menina iria se chamar Sebastiana, em homenagem ao personagem”, diz Prazeres. Três meses após a estreia, em outubro de 1988, o grupo participou com A Promessa do X Festival Amador e Universitário do Nordeste, em Feira de Santana (BA). A apresentação aconteceu na noite do dia 27, no Teatro Municipal, e rendeu dois troféus ao grupo caruaruense: de melhor direção, para Severino Florêncio e melhor atriz para Prazeres Barbosa. Alguns dias antes de embarcarem rumo à Bahia, apresentaram o espetáculo no Teatro do Cabo de Santo Agostinho (PE), que estava lotado. “Todo o elenco está perfeitamente situado na peça, mas o talento de Prazeres Barbosa certamente se sobressai”, dizia matéria do Jornal Vanguarda em cinco de novembro de 1988. A boa aceitação da peça, pelo público e pela crítica, fez com que o grupo continuasse encenando A Promessa no ano seguinte. Em agosto de 1989, somavam mais de 80 apresentações em diversos Estados brasileiros. O alcance do espetáculo fez com que a Direção Nacional do Sesc convidasse o grupo para participar do VI Circuito Nacional de Teatro. Dentre os 42 grupos inscritos, a equipe caruaruense foi uma das cinco escolhidas. Essa foi a segunda turnê do grupo pelo Brasil, que havia participado dois anos antes do mesmo projeto com Solte o Boi na Rua. O Circuito Nacional aconteceu entre os dias 02 e 22 de maio de 1989. Desta vez, o número de capitais visitadas foi ainda maior. A turnê foi iniciada em Salvador, onde o grupo fez duas apresentações para um público de 650 pessoas. Em Aracaju, apresentaram-se para cerca de mil pessoas. Nas duas exibições em Maceió, a peça atraiu um público de 265 pessoas. Em João Pessoa, houve uma apresentação para 500 espectadores e outra, em Guarabira (PB), para 430. Em Fortaleza, as duas últimas apresentações foram vistas por 758 pessoas. O espetáculo foi notícia nos principais jornais das cidades por onde passou. Após o êxito alcançado com a turnê, em cidades do Norte-Nordes68


Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração te, o Grupo de Teatro do Sesc Caruaru – considerado um dos 18 melhores grupos de teatro amador do Brasil, à época – foi convidado para representar o Estado de Pernambuco no XI Festival Nacional de Teatro Amador, ocorrido entre os dias 13 e 25 de julho de 1989, na cidade de São José do Rio Preto (SP). Para participar do evento e da 1ª Paralela Nacional Competitiva de Teatro, o grupo cênico competiu com outros 97 grupos teatrais espalhados pelo País. Adiante, a equipe, formada por 13 pessoas, partiu rumo a São Paulo. A boa fama do grupo ajudava nas horas em que precisavam conseguir patrocínio para viajar. Nesse período, já não mais precisavam ir tão longe dentro de um ônibus. Foi nessa fase que muitos dos integrantes viajaram pela primeira vez de avião. Coisas hilárias aconteciam nas viagens. Josinaldo Venâncio, um dos atores, confundiu uma toalha branca, para enxugar as mãos, com uma tapioca de coco. A confusão rendeu boas gargalhadas durante o vôo. Em um dos hotéis onde ficou hospedado, o grupo passou o maior sufoco. Havia no local cofres para os hóspedes guardarem suas jóias. A turma achou aquilo interessante e depositou todas as bijuterias dentro de um dos compartimentos. Na hora da saída, foram informados de que era necessário pagar pelo serviço. A notícia agradou pouco. “A gente era tão ingênuo, que tempo bom! Eu sinto saudade desse tempo. Levávamos um monte de malas, sem necessidade. Nos divertíamos muito nessas turnês”, lembra Prazeres. A apresentação aconteceu no Teatro Municipal de São José do Rio Preto, em 21 de julho de 1989. No dia seguinte, o Diário da Região, um dos principais jornais da cidade, trazia estampado na capa chamada informando que “o público aplaudiu em pé a atriz Prazeres Barbosa, no papel de Sebastiana”. A edição do dia 23 trouxe uma crítica de Dinorath do Valle, para quem “o sustentáculo do espetáculo foi a comediante Prazeres Barbosa criando o personagem caricatural cuja graça e humor se concentram na mímica e nas dificuldades que tem em compreender a linguagem coloquial da classe média”. A aclamação fora confirmada em seguida pela comissão julgadora 69


Prazer em Conhecer do festival. No dia da premiação, representantes das vinte e cinco peças apresentadas na competição assistiram a um dos momentos mais importantes da carreira artística de Prazeres Barbosa. Aos 39 anos, em seu quarto espetáculo teatral, a atriz caruaruense recebeu um dos mais importantes prêmios do teatro amador brasileiro, ao ser eleita melhor atriz em um grande festival nacional de teatro. O troféu foi recebido das mãos da atriz Lélia Abramo (morta em 2004), que havia participado do júri. A atriz fez questão de presentear Prazeres Barbosa com o ramalhete de flores que recebeu da organização do evento. Prazeres foi aclamada por unanimidade e a plateia vibrou com tudo aquilo. O grupo voltou satisfeito para sua terra natal onde cumpriu a temporada final do espetáculo. Uma das últimas apresentações de A Promessa aconteceu no dia 26 de setembro de 1989, no auditório da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru. Em seguida, o grupo passou a se dedicar à montagem de um novo espetáculo. Nó de 4 Pernas foi ainda mais desafiador do ponto de vista da atuação para Prazeres. A peça também encerrava sua atuação no grupo do Sesc Caruaru. Escrita pelo jornalista paraense Nazareno Tourinho, Nó de 4 Pernas é uma comédia filosófica aliada ao drama e que resulta numa análise do socialismo, questionando desde o direito do trabalhador à linha progressista da Igreja Católica. Com a meta de superar – ou, pelo menos, alcançar - o êxito registrado com A Promessa, a peça estreou no dia quatro de agosto de 1990, no Teatro João Lyra Filho, em Caruaru. Após duas décadas sob a influência de temas regionalistas, o grupo começava com este trabalho a se tornar mais universalista em seus trabalhos. Protagonista da história, o padre Elias é o centro das atenções para onde convergem as tramas paralelas no espetáculo. Um falso padre, que ameaça as figuras de destaque da cidade de terem seus pecados privados tornados públicos, caso não favoreçam as “causas” da Igreja. Cabe a ele desfazer o “nó-cego” de quatro pernas que é casar dona Nazaré com o sacristão Euzébio e evitar que a mulher do prefeito, dona Iraneide, grávida do comunista Zé Pedro, saiba que o autor da gravidez da puta Ludovina, 70


Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração namorada de Zé Pedro, é seu marido, o coronel e prefeito Menacê. O intérprete do padre Elias foi escolhido por Severino Florêncio, diretor do espetáculo. A escolha foi surpreendente. O padre não seria vivido por nenhum dos homens, mas por uma mulher. “Eu pensei em Prazeres como atriz fazendo o padre não pelo tipo, nem pela voz, mas pela garantia que ela passava como intérprete. No início, ela pensava até em colocar barba e bigode, mas eu queria algo sem caricatura”, destaca Severino. Na figura do padre trapaceiro, Prazeres arrancou muitas risadas e aplausos das plateias que assistiram ao Nó de 4 Pernas. Quem viu, garante que a atuação era tão segura e perfeita que ficava difícil enxergar uma mulher debaixo da batina branca usada pela personagem. Além disso, a peça parecia ter sido escrita sob encomenda para o grupo do Sesc Caruaru, como escreveu o crítico paulistano Hamilton Saraiva. Durante todos os finais de semana em que esteve em cartaz, o teatro lotou para assistir ao espetáculo. A primeira temporada foi encerrada no dia 23 de setembro de 1990, uma semana antes da prevista, para que o grupo pudesse participar do IV Congresso Pernambucano de Teatro Amador, na cidade do Recife. O evento foi realizado no Teatro Santa Isabel, entre os dias 28 e 30, e o grupo do Sesc Caruaru foi escolhido, entre os demais existentes no Estado, para apresentar Nó de 4 Pernas na abertura. O destaque de Prazeres ao dar vida ao trambiqueiro padre Elias fez com que a Associação Comercial e Empresarial de Caruaru (Acic) preparasse uma grande homenagem à atriz na noite do dia 28 de agosto de 1990, em sua sede. O evento foi transmitido pela imprensa local. Prazeres, rodeada por familiares, amigos e admiradores discursou e cantou um trecho da música Não Chores por Mim Argentina, da cantora Evita Perón. Em fevereiro de 1991, após o período carnavalesco, o grupo iniciou a segunda temporada do espetáculo em Caruaru. Bastante aguardada pela população, durou cerca de dois meses. Em seguida, foram realizadas curtas temporadas em cidades da região e outros Estados nordestinos. Em abril do mesmo ano, participaram do I Festival Nacional de Teatro do Cabo de Santo Agostinho (PE). Lá, Prazeres foi contemplada com mais um prêmio de melhor atriz. 71


Prazer em Conhecer A grande consagração do espetáculo aconteceu durante o XII Festival Nacional de Teatro de São José do Rio Preto (SP), entre os dias 12 e 23 de julho de 1991 – o mesmo que destacou Prazeres nacionalmente dois anos antes. Desta vez eles não participariam do festival competitivo, apenas da 2ª Paralela Nacional Competitiva de Teatro e viajaram mais de três mil quilômetros até chegarem à cidade. O grupo fez a abertura da mostra, que aconteceu no dia 13 de julho, num circo montado ao lado do Teatro Municipal especialmente para o evento. O jornal Diário da Região, de Rio Preto, publicou matéria, três dias após a apresentação, dizendo que Prazeres era o melhor de Nó de 4 Pernas e que o espetáculo não merecia estar na paralela competitiva e sim no festival “principalmente por ter em seu elenco uma atriz como Prazeres Barbosa, que teve a difícil tarefa de interpretar um personagem masculino, e soube fazer isso muito bem, com classe e um refinado senso de humor”. O resultado da 2ª Paralela Nacional Competitiva foi divulgado no dia 23 de julho. Com quase cinquenta pontos à frente do concorrente, o grupo do Sesc Caruaru foi o grande vencedor da competição com a peça Nó de 4 Pernas. A notícia foi destaque na Folha de São Paulo da mesma data. As novidades não pararam por aí. Além de arrematarem o prêmio máximo na categoria melhor espetáculo, em um dos três maiores festivais de teatro promovidos no Brasil, o grupo foi convidado a abrir a Mostra de Teatro de Santa Fé do Sul, situada na mesma região. Mesmo sem concorrer individualmente a nenhuma das categorias competitivas, Prazeres Barbosa foi a grande sensação do Festival Nacional de Teatro, unanimidade da crítica, júri e voto popular, caso inédito na história do evento. Sua atuação foi decisiva para que o grupo conquistasse a primeira colocação. A popularidade lhe garantiu destaque na mídia local e o primeiro contato com a Rede Globo de Televisão, abrindo as portas para a teledramaturgia, ainda que de maneira tímida. Sonaira D’Ávilla, caçadora de talentos da emissora, ficou encantada com a atuação de Prazeres e a convidou para fazer um cadastro. Prazeres gravou uma pequena entrevista onde dizia seu nome, profissão e por que fazia teatro. Em seguida, interpretou um pequeno texto. As gravações 72


Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração aconteceram nos estúdios da TV Globo Noroeste Paulista. Cleonice Matias, outra integrante do grupo do Sesc Caruaru, também foi selecionada. “Levaram-nos de carro até o local e fizemos os testes em salas separadas”, diz Cleonice. Os funcionários da emissora salientaram que não se tratava de um teste, mas sim da formação de um arquivo para futuras produções. Por essa razão, Prazeres guarda poucas recordações daquele momento. “Eu nem sei como ficou. Se me perguntarem o que eu fiz lá, não saberei dizer, porque foi uma coisa muito inesperada”, explica. O cadastro acabou não trazendo nenhum resultado para a carreira artística da atriz, mas serviu para que ela acreditasse cada vez mais que havia abraçado a profissão correta. Ovacionada pela mídia após atuações de destaque em seus espetáculos e reconhecida como melhor atriz em importantes festivais de teatro brasileiro, Prazeres teve seu nome consolidado na história das artes cênicas no País. O sucesso fez com que as pessoas que haviam se afastado dela no início da carreira retomassem a amizade. “Prazeres também venceu isso e hoje é o orgulho de toda a família, que talvez não tenha compreendido os seus passos iniciais no teatro. Torcemos para que as oportunidades surjam e que ela possa a cada dia se afirmar mais no mundo que escolheu como o ideal para a sua vida”, comenta o irmão Bernardo Barbosa.

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Prazer em Conhecer

FIM DO GRUPO DE TEATRO DO SESC

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terceira e última temporada de Nó de 4 Pernas aconteceu no mês de abril de 1992. Chegava ao fim o último dos grandes espetáculos montados pelo Grupo de Teatro do Sesc Caruaru e a parceria de dez anos com Prazeres Barbosa em seu elenco. Os motivos do rompimento nunca foram esclarecidos. Somente agora a atriz decidiu comentar o assunto. Na verdade, o grupo acabou devido a uma intervenção do próprio órgão. Em outras unidades, os atores que compunham grupos de teatro passaram a questionar o fato de não serem remunerados. Temendo que as coisas pudessem piorar ainda mais, o Sesc decidiu extinguir os grupos de teatro que mantinha, até mesmo para evitar que outras pessoas reivindicassem judicialmente um vínculo empregatício com a instituição. A formação de atores passou a ser feita através de cursos temporários. “O impacto foi grande, todos eles trabalhavam com boa vontade, sem nenhum intuito de receber na parte financeira e ficaram chocados. Mas no final aceitaram, ficaram participando de outras atividades culturais e das apresentações esporádicas que faziam no Sesc, mas sem aquela obrigação de se apresentarem”, ressalta Sônia Raposo. A saída de Prazeres, no entanto, foi motivada principalmente por problemas gerados entre a equipe. O fato de ter protagonizado os principais espetáculos montados, a consagração nos muitos festivais de que participaram e o destaque que sempre recebeu por parte da mídia não eram vistos com bons olhos por alguns colegas. “Existia dentro do próprio grupo – como existe em todas as profissões – certa competitividade. Não vou citar nomes por ser antiético, mas havia uma ciumeira em relação a mim. Era aquela pessoa por quem ninguém dava nada, mas quando fazia meu trabalho, aparecia. Isso incomoda”, confidencia Prazeres. A atriz enfrentava uma situação insustentável e o melhor a fazer era deixar a equipe. Ela poderia ter continuado com Severino Florêncio, que havia montado um novo grupo, mas quis seguir o seu próprio caminho, junto com Francisco Torres, o segundo esposo, que conheceu ao entrar para o grupo. A saída gerou muitos comentários. “As pessoas incompeten74


Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração tes sentem inveja do outro que está acontecendo, principalmente as mulheres. E sempre houve muitas invejas, mas o tempo vai mostrando quem é quem. Quem sempre teve inveja nunca cresceu. E quem nunca deu ouvido a essa inveja e às fofocas, sempre está crescendo”, compara Francisco. Sem Prazeres no elenco, o grupo montou ainda três espetáculos: O Espantalho, de Erenice Lisboa, figurinista e sonoplasta do grupo; O Dia de Allan, escrito por Wladimir Capela; e, A Guerra dos Cupins, de Afonso Lima, com a terceira idade. Era o fim de um dos grupos de maior destaque na história do teatro caruaruense. O Sesc foi a casa que deu a Prazeres confiança como atriz e prestígio como artista. “Foram tempos de ouro. O Teatro do Sesc foi o teatro de ouro de Caruaru. Uma história rica e que as pessoas não valorizam”, define a atriz. Em 1987, Severino Florêncio criou o Grupo Arte-em-Cena, com o qual trabalha até hoje. No ano de 1991, quando estava em cartaz com a peça Nó de 4 Pernas pelo grupo do Sesc, iniciaram a montagem de Avatar, escrita por Paulo Afonso Grisolli, com direção de José Manoel. Prazeres foi convidada para compor o elenco. Era o primeiro espetáculo em que ela não seria dirigida por Severino. Outra diferença é que, nesta peça, Prazeres atuou como coadjuvante. Avatar, espetáculo místico e ao mesmo tempo ecológico, estreou em 25 de abril de 1991, às 21h, no Teatro João Lyra Filho. No elenco, Prazeres Barbosa, Maria Alves e Severino Florêncio, considerados os três melhores integrantes do grupo. Baseado numa antiga lenda dos índios canadenses, o espetáculo narra a história de um ser híbrido meio homem, pássaro e peixe, que desce a terra mudando o destino de duas mulheres: a velha e amargurada Madre e a Nora, cheia de vida e em busca da felicidade. Nesta peça, Prazeres fazia o papel da Madre, uma velha amargurada pela morte do filho, que nutria sentimentos de ciúme e rancor pela Nora (Maria Alves), personagem central da história, que se relaciona com Avatar, vivido por Severino Florêncio. A personagem fugia à característica que vinha marcando a trajetória artística de Prazeres. A partir daí, ela passou a interpretar personagens de um teatro mais erudito (embora a linha entre o popular e o erudito nas artes esteja cada vez mais dissipada). 75


Prazer em Conhecer A intensidade de Prazeres em cena tornou-se ainda mais explícita neste espetáculo. Certa noite, após apresentar-se, a atriz foi cumprimentada por um médico que lhe deu uma bronca pelo envolvimento enlouquecedor numa das cenas de maior martírio. Ele sugeriu que ela suavizasse as emoções para não correr riscos cardíacos. “Quando a dirigi em Avatar, muitas vezes me flagrei com postura de absoluta contemplação. Meu senso crítico de encenador ficava obscurecido ante a capacidade interpretativa de Prazeres”, revela José Manoel. O espetáculo era diferente de tudo o que já havia sido montado em Caruaru, até então. A equipe teve a ousadia de trabalhar um texto montado no eixo Rio – São Paulo, em 1972, com artistas profissionais; convidou um diretor de renome; correu o risco de não lotar a casa de espetáculos por apresentar-se nas quintas e sextas-feiras; além de conferir à peça retoques de uma grande produção: a encenação começava no horário marcado e era apresentada com as portas do teatro fechadas. Avatar foi uma peça sem vida longa. Em sua primeira temporada realizou pouco mais de dez apresentações em Caruaru e duas na cidade de Arcoverde (PE). Um dos principais motivos da sua não permanência nos palcos foi a complexidade do texto, considerado denso e dramático, bem diferente das montagens infantis ou adultas de temática regionalista montadas até então. “Quem assistia saia encantado com o espetáculo, a intensidade e o vigor dos atores. Mas, quando alguém perguntava se tinha gostado, respondia: gostei, mas não dá para rir. Para um público aficionado por comédia, isso era definitivo”, comenta o diretor. Hoje, mais confortável para lembrar o assunto, José Manoel cita que outro aspecto, de foro íntimo, foi os acirramentos nas relações. “Os três atores trabalhavam há 10 anos juntos. Muitos desejos, muitos quereres, muitas vaidades. A partir da metade do processo de montagem, as coisas começaram a ficar difíceis. Depois de uma bateria de ensaios, eu voltava para Recife, onde moro e, uma semana depois, retornava a Caruaru sem nenhuma segurança de como estariam os ânimos. Às vezes, tinha dúvidas se iria haver ensaio”, recorda. Para ele, havia ética e respeito entre eles, mas o carinho já não era 76


Capítulo 4 - Teatro, prêmios e consagração o mesmo. “Fazer teatro em crise de relações é difícil. Eu sofri muito nesta época e eles também, mas, quando iam para cena, era uma guerra. Uma luta entre feras. Prazeres Barbosa e Maria Alves interpretavam duas mulheres que se amavam e se odiavam. Tinha ensaios que eu chorava, escondido, vendo as duas, plenas, defendendo seu território. Era feroz. Prazeres urrava, Maria mordia os lábios e grunhia. Elas se olhavam no ringue da cena e eu estimulava, provocava, pedia ferocidade. E elas, muitas vezes, olhos nos olhos, se aniquilavam, iam à exaustão”, assume. A catarse, no entanto, que o diretor necessitava que acontecesse com as atrizes, não acontecia. “A realidade é que, entre elas, naqueles tempos, não havia espaço para conciliação. O Severino Florêncio é um ator apaixonado pelo que faz. Estar em cena, para ele, tem que ser um ato de amor. Ele também estava envolvido inteiramente na dissenção e, sem prazer, não rende na cena. Era o próprio Avatar, mas a sua construção de personagem não deslanchou. Ele não gostava de fazer o Avatar e todo o clima o desestabilizou. Muito do espetáculo dependia dele, na cena e fora dela. Desapaixonado, ele ficou burocrativo”, analisa. Maria Alves cita que houve algumas desilusões e problemas entre o grupo. “Prazeres saiu e nós permanecemos. As diferenças tinham a ver com aquilo que cada um buscava. Houve também uma desilusão por parte de Severino, que não se realizou com o personagem e cada um seguiu trilhas diferentes”. A segunda temporada, iniciada em agosto de 1991, foi estendida até o ano seguinte, somando 17 apresentações. Apesar de tudo, o espetáculo participou de importantes festivais. Entre os dias 11 e 19 de janeiro de 1992, competiu no XI Festival de Teatro Amador e Universitário do Nordeste, em Feira de Santana (BA). Um episódio curioso e que causou surpresa foi que o papel da velha, que era secundário, acabou tornando-se principal. Prazeres Barbosa recebeu prêmio de melhor atriz, tornando-se hors concurs neste festival. Em seguida, a peça foi inscrita para disputar o II Festival Nacional de Teatro e Dança de João Pessoa (PB), realizado entre os dias 17 e 26 de janeiro do mesmo ano. Vaias, gritos e protestos marcaram a entrega dos troféus, apesar de Prazeres Barbosa ter conquistado o prêmio de melhor atriz, por 77


Prazer em Conhecer unanimidade, e Maria Alves, prêmio de melhor atriz coadjuvante. Em fevereiro de 1992, a Federação Pernambucana de Teatro divulgou a relação dos atores destaque no ano anterior. A homenagem contemplava diversas categorias. Prazeres Barbosa foi agraciada com o prêmio de atriz destaque por seu desempenho em Nó de 4 Pernas e Avatar, conquistando o título de Melhor Atriz de Pernambuco naquele ano. A premiação aconteceu no dia 7, no Teatro do Parque, em Recife, com a presença de artistas de todo o Estado. Após a participação nos festivais de Feira de Santana e João Pessoa, o grupo apresentou Avatar no Teatro Severino Cabral, em Campina Grande (PB) e, em julho de 1992, voltou a São José do Rio Preto (SP), para competir no XIII Festival Nacional de Teatro. Não trouxeram prêmios, mas agradaram. Prazeres Barbosa recebeu indicação para melhor atriz e Avatar ficou em 5º lugar na preferência do júri popular, recebendo elogios e destaque da imprensa local. “É a única peça do Grupo que não foi filmada, quase não há fotos. Isso para mim foi sintomático. Some-se a isto as precárias condições de trabalho para os artistas de Caruaru e a falta de políticas estruturadoras para a área das artes. O espetáculo precisava de uma luz especial, de um teatro mais técnico e isso a cidade não oferecia. Tudo conspirou para a curta duração da peça, para mim, um dos melhores trabalhos que eu fiz”, reconhece José Manoel. Avatar foi visto pela última vez no dia 18 de julho de 1992, por uma plateia de 850 pessoas, no Festival Nacional de São José do Rio Preto. A partir daí, Prazeres iria se aventurar em espetáculos ainda mais desafiadores, na companhia teatral criada em sua homenagem.

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Capítulo 5

A atriz mais premiada do teatro pernambucano

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Prazer em Conhecer

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m 1991, após cinco anos sem promover o Festival de Teatro Estudantil e Amador do Agreste (Feteag), o Teatro Experimental de Arte preparava a 6ª edição do evento. Francisco Torres, que fazia parte do Grupo do Sesc e era um dos monitores do festival, foi convidado por Prazeres Barbosa para montar um espetáculo na Escola Elisete Lopes. Cada monitor ficava responsável por desenvolver atividades teatrais com alunos de escolas públicas, a fim de montar espetáculos que seriam inscritos para disputar os prêmios no festival. Já estavam namorando há alguns anos e Francisco aceitou o convite para dirigir o projeto no colégio onde Prazeres trabalhava. A essa altura, a Escola Elisete Lopes já havia se tornado conhecida em toda a cidade, através dos trabalhos artísticos e sociais desenvolvidos pela professora Prazeres Barbosa com o apoio inicial de Diva Galvão e, em seguida, das outras gestoras que passaram pelo educandário. O texto escolhido por Francisco foi O Rapto do Juju, de Erenice Lisboa. Embora o nome fosse bastante sugestivo para uma peça infantil, o texto escrito em 1983 era voltado para o público adulto. Muitos alunos quiseram integrar o elenco e foi preciso fazer um teste para selecionar apenas dezoito. O interesse era gerado pela constante montagem de espetáculos, através do grupo Os Sutis, criado e mantido por Prazeres, e também pelo êxito que a escola havia alcançado nas versões anteriores do festival. Os ensaios aconteciam nas tardes de sábado e nas noites de quarta-feira. A peça contava ainda com a participação do radialista caruaruense Ivan Bulhões, um dos ícones da radiodifusão caruaruense. Em 1992, Francisco voltou à escola, como monitor, a fim de preparar um novo espetáculo para a sétima versão do Feteag. Desta vez, o texto escolhido foi a fábula Ninar, Adormecer e Sonhar, de Romildo Moreira; a história de uma garota e sua boneca que transmitem uma mensagem muito forte de personalidade para adultos e crianças. A peça acabou conquistando o público e o júri, recebendo sete indicações e conquistando o prêmio de melhor música, composta por Jadilson Lourenço e interpretada pela professora Prazeres Barbosa. Após o Feteag, os adolescentes, entre 15 e 18 anos, continuaram 80


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano o trabalho com estudos em grupo e frequentando pequenas oficinas ministradas pelo próprio Francisco. A partir daí, perceberam que podiam dar continuidade à proposta inicial de consolidar um grupo de teatro que pudesse desenvolver trabalhos independentes. Nesse mesmo ano, Prazeres se preparava para conquistar o direito de aposentadoria pelos 25 anos de trabalho em sala de aula e a equipe decidiu prestar à professora uma homenagem inédita na Cidade. No dia dois de outubro de 1992, quando completou 43 anos, Prazeres Barbosa ganhou uma festa surpresa, organizada por Francisco e pelos alunos da Elisete Lopes, num salão de festas localizado no bairro Cohab II, em Caruaru. Durante as comemorações, a atriz recebeu a notícia de que o grupo Os Sutis, montado por ela no início dos anos 1980 passaria a chamar-se Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa. Cogitou-se a possibilidade de ser registrado como Grupo de Arte Cênica, mas a contribuição dada pela arte-educadora ao desenvolvimento artístico da escola e o fato de ser, já nessa época, apontada pela crítica como uma das maiores atrizes do Estado, fizeram com que Prazeres Barbosa fosse o nome apontado pelos alunos. A opinião de Marlene Leandro, que fazia cobertura dos eventos culturais da cidade para o Jornal Vanguarda também foi decisiva. A jornalista sugeriu que a equipe não adotasse o nome de “grupo” e sim de Companhia, para se diferenciar dos demais. Além disso, eles iriam desenvolver outras modalidades artísticas. A Companhia surgiu num momento muito oportuno para Prazeres, que afastada no Grupo do Sesc, estava sem perspectivas quanto à montagem de novos espetáculos. Também foi o instrumento ideal para que ela continuasse a desenvolver trabalhos artísticos com a juventude, algo por que sempre prezou. Já independente da Escola Elisete Lopes, montaram o espetáculo Transe, de Ronald Rade, com direção de Francisco Torres. A peça participou do VIII Feteag (1993), recebendo prêmios de melhor iluminação e maquiagem, e do III Festival de Tuparetama, Sertão do Pajeú (PE), onde foi contemplada com os prêmios de maquiagem e coreografia. A partir daí, Prazeres sentiu-se segura para retornar aos palcos. No mesmo ano, investiu em seu primeiro monólogo, o espetáculo com o 81


Prazer em Conhecer qual recebeu mais prêmios ao longo da carreira. Para dirigi-la em sua primeira peça fora do Sesc, a atriz convidou o conceituado teatrólogo pernambucano Didha Pereira. Prazeres e Didha se conheceram em agosto de 1985, no Museu da Cidade do Recife, durante o Festival de Teatro de Bolso, criado pelo jornalista Enéas Alvarez. O Grupo do Sesc estava em cartaz com O Recado do Verde, de Erenice Lisboa. “Fiquei impressionado com o talento dessa maravilhosa atriz”, revela Didha. Alguns anos depois, ele ministrou uma oficina de interpretação no Teatro Experimental de Arte, sob a coordenação pedagógica de Arary Marrocos e Argemiro Pascoal. Prazeres participou da oficina e a relação entre os dois foi se estreitando ainda mais. Em 1993, Didha assumiu a direção de Fiel Espelho Meu, texto da paraibana Lourdes Ramalho, e revolucionou a forma de Prazeres Barbosa atuar. A montagem em si foi um grande desafio, afinal, Didha quis desconstruir todo um arquétipo corporal e facial de uma atriz acostumada a representar. Ao ordenar que Prazeres esquecesse tudo o que havia feito e recomeçasse, parecia estar afirmando que aquilo que aconteceu antes estava errado. Não era essa a intenção. Ele queria uma nova Prazeres em cena, sem conceitos definidos de certo e errado. Queria um registro diferenciado na expressão vocal, uma partitura corporal que negasse a sua idade. Um frescor que a vida já lhe negava. A produção era relativamente alta para os modelos da época e, sobretudo para uma cidade do interior. Uma proposta arrojada que surpreendeu e chegou a chocar alguns que foram obrigados a adotar outros parâmetros para análise e fruição, conforme descreve o diretor. Para ele, foi difícil obrigar uma atriz, considerada 1ª dama do teatro caruaruense, a esquecer todo o seu método, construído a duras penas, às vezes até empiricamente, e, ainda por cima, exigir cenas de sensualidade e strip-tease, que se não se completavam literalmente, mas na mentes dos espectadores. Acima de tudo, Prazeres tinha vergonha do próprio corpo e do modelo que lhe estava sendo proposto como referência para concepção da personagem. Fiel Espelho Meu estreou no dia 30 de abril de 1993, às 21h, no Teatro João Lyra Filho. A peça narra a história de uma mulher que passa 82


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano a vida sendo reprimida pela tia e pelo marido. Após a morte dos dois, ela se depara com uma liberdade pela qual não lutou para conquistar. O texto retrata uma vida que é espelho de milhares de vidas. Infância, juventude e maturidade vêm à tona numa avalanche de impressões, recordações, decepções, traumas e alegrias, fazendo com que a protagonista, em plena consciência, trace a fronteira da insanidade. No cenário, de fundo vermelho, uma Prazeres sensual dividia a cena com um espelho, o retrato da tia e do marido. O espetáculo durava cerca de uma hora. “Quando as pessoas me viam, não acreditavam que era eu. Nunca me viram tão solta, e olha que eu nem era. Hoje eu faria muito melhor”, comenta Prazeres. “Foi uma experiência muito interessante, pois se constituiu num grande desafio. Tive que desnudar uma atriz, para mostrar não apenas seu corpo, mas a sua alma e o seu espírito”, acrescenta Didha Pereira. Verônica havia passado por diversas fases na vida e, no fim, dava sua guinada. Precisava soltar todos os anjos e demônios que havia dentro dela e Prazeres, após anos de carreira, continuava presa às amarras da criação tradicional que recebera. “Didha começou a espremer de mim o caldo que ninguém havia espremido. Ele me fez ver o mundo de uma forma diferente. Eu era tão tímida que quando ele disse que eu iria ficar de espartilho foi uma grande confusão. Havia música, sensualidade e eu nem sabia o que fazer”, lembra. Apostando tudo na concepção da personagem, Didha sugeriu que Prazeres visitasse um prostíbulo para ver como as mulheres se comportavam. Francisco se comprometeu a acompanhá-la. A vergonha e o medo não a deixaram ir. Acreditava que ao ver cenas de exploração sexual, se sentiria envergonhada. Por enxergar a mulher como um ser que merece ser amado, classifica as que se submetem a esse tipo de comportamento como sem visão do que significa ser mulher, além de envergonharem o gênero. O diretor acredita que a decisão refletiu no desempenho do espetáculo. “Ela poderia ter tido uma interpretação bem mais verdadeira se tivesse adotado alguns laboratórios sugeridos por mim. Verônica, até o marido morrer, era a própria Prazeres, com toda a carga de informações que a vida dera para ambas e todas as submissões e humilhações que a opressão social 83


Prazer em Conhecer e a instituição casamento legaram para elas. A prostituta, a mulher sem amarras e sem fronteiras ficou presa e só veio surgir quando já nos aproximávamos do final da temporada. Às vezes, ela não alcançava essa mulher que idealizamos e o arremedo deixava-a engraçada.” Nada disso, porém, ofuscou o brilho do espetáculo. Fiel Espelho Meu participou de muitos festivais e foi visto em diversos Estados brasileiros. Num momento do espetáculo, ela colocava a mão sobre a genitália, como se estivesse se masturbando. Algumas pessoas ficavam chocadas com a cena. Esse foi o primeiro espetáculo que Maria das Mercês assistiu com sua irmã em cena. “Foi aí que eu vi que ela tinha talento”. Mesmo havendo montado outras peças após esta, Prazeres continuava disputando prêmios de melhor atriz com a performance de sua Verônica. Em julho de 1993, participaram do III Festival de Inverno de Garanhuns e do IV Festival de Teatro Amador de Arcoverde, o mesmo que lhe rendeu o primeiro prêmio de atriz revelação, em 1984, por sua atuação em A Pena e a Lei. Mais uma vez, Prazeres arrematou o prêmio de melhor atriz. No mês seguinte, Fiel Espelho Meu disputou o II Festival Nacional de Teatro do Cabo de Santo Agostinho (PE), onde Prazeres perdeu o prêmio de melhor atriz para Maria Alves. “Acredito que Prazeres Barbosa foi extremamente injustiçada. Não que Maria Alves não merecesse ser premiada, mas porque a performance interpretativa e dramática de Prazeres era sem dúvida superior. Maria é uma excelente atriz, mas naquele festival, Prazeres estava superior a ela. Estava magnânima”, afirma Didha Pereira. A experiência não desanimou. Em dezembro do mesmo ano, Prazeres ganhou mais um prêmio de melhor atriz no XIV Festival de Teatro de Bolso, no Recife, por sua atuação em Fiel, premiação repetida na III Mostra de Teatro Amador de Tuparetama (PE), promovida no mesmo mês. Em janeiro de 1994, mais um prêmio de melhor atriz, conquistado no I Festival Nacional de Teatro e Dança, realizado em João Pessoa (PB). Dois meses depois, conquistou o quinto prêmio de melhor atriz, por Fiel Espelho Meu, na III Mostra de Teatro Amador de Serra Talhada (PE). Entre um festival e outro, Prazeres cumpria temporadas em Caruaru 84


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano e cidades da região. A boa aceitação da peça levou a Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa a inscrever Fiel Espelho Meu no IV Concurso Nacional de Monólogos, em Teresina (PI). A participação rendeu prêmio de melhor direção, melhor espetáculo escolhido pelo júri e, mais uma vez, melhor atriz (Prazeres Barbosa). Em 29 de março de 1997, prestes a completar 15 anos de carreira, Prazeres foi convidada de honra da Semana Nacional de Artes, de Porto Velho (RO). A atriz recebeu tratamento de estrela, concedeu entrevista coletiva à imprensa local, foi homenageada por colegas e fez pronunciamento sobre sua trajetória artística. Na ocasião, mais de três mil pessoas assistiram a apresentação de Fiel Espelho Meu. O espetáculo representou Pernambuco no Festival Nacional de Teatro, em Salvador (BA), promovido pela Confederação Nacional de Teatro Amador (Confenata), em setembro de 1998. Participou ainda do Janeiro de Grandes Espetáculos, no Recife, em 1999, onde Prazeres recebeu prêmio de Participação Especial, por ser hors-concours neste evento. Terminou seu ciclo de competições no X Festival Nacional de Monólogos, na cidade de Franca (SP), recebendo prêmio de melhor texto e eleito terceiro melhor espetáculo apresentado. O sucesso alcançado com Fiel Espelho Meu e a extensa lista de prêmios recebidos ao longo da carreira transformaram Prazeres Barbosa na atriz mais laureada do cenário teatral pernambucano. “Ela é considerada hoje a atriz mais premiada de Pernambuco, não tenho a menor dúvida disso. E merecidamente Prazeres é hoje uma das atrizes mais completas do teatro brasileiro. Canta, dança e interpreta como poucas. Está vivendo o apogeu da sua competência, muito embora careça, ainda, de uma grande oportunidade na tela para revelar todo o seu potencial, conhecido até hoje apenas por alguns adeptos do teatro pernambucano que a viram brilhar nos palcos”, constata Didha, que já ocupou a presidência da Feteape. José Manoel, diretor de Cultura do Sesc Pernambuco, afirma que Prazeres é a atriz de carreira mais regular em Caruaru. “Isto eu garanto. Ela é uma das atrizes mais regulares em termos de qualidade de suas interpretações, em Pernambuco”. Em relação ao fato de ser Prazeres a atriz 85


Prazer em Conhecer mais premiada do Estado, ele completa: “Bom, pela quantidade de troféus que eu vi em sua casa, deve ser sim”. A ideia é reforçada pela presidente do Sindicato dos Artistas, Ivonete Melo. “Dizem que sim, pois ela sempre vai a todos ou quase todos os festivais de teatro”. Durante a primeira temporada de Fiel Espelho Meu, Prazeres Barbosa ministrou várias oficinas de interpretação por cidades do Nordeste. Desde que começou a fazer sucesso no Grupo do Sesc, principalmente após receber seu primeiro prêmio nacional, a atriz passou a ser requisitada por grupos de teatro para repassar sua experiência. Estudiosa, foi incentivada desde cedo por Severino Florêncio a mergulhar fundo em leituras que tivessem a ver com a profissão. A contribuição dada pelo diretor José Manoel Sobrinho, na época de Avatar, também foi importantíssima para sua formação. Foi ele quem apresentou para ela a obra do ator e escritor russo Constantin Stanislavski, cujas ideias são consideradas alicerces do teatro contemporâneo. Prazeres devorou todos os livros dele e as leituras tornaram-se fundamentais para o seu aperfeiçoamento como diretora de elenco dos espetáculos montados por sua Companhia. Desde a época em que fazia teatro na escola, Prazeres sempre se interessou pela formação de atores. Fez isso no grupo do Sesc, auxiliando Severino e permaneceu assim ao longo dos anos. O período de Fiel Espelho Meu tornou-se ainda mais marcante para Prazeres Barbosa após a conquista de um prêmio considerado por ela, o maior recebido em toda sua vida. Em 25 de março de 1994, dois dias antes da comemoração do Dia Mundial do Teatro, algumas entidades se uniram em praça pública, junto à Agência Central dos Correios, no Recife, para homenagear personalidades ligadas à arte. Ao lado de figuras importantes da cultura pernambucana, a exemplo de Ariano Suassuna e João Cabral de Mello Neto, Prazeres representou as atrizes pernambucanas, recebendo a medalha Mecenas das Artes Cênicas. A notícia deixou a atriz maravilhada. Ao mesmo tempo, triste, pois na data de entrega das homenagens estava marcada uma apresentação do espetáculo no Sertão pernambucano. Fiel Espelho Meu participou da III 86


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano Mostra de Teatro Amador de Serra Talhada e Prazeres recebeu mais um prêmio de melhor atriz. A medalha, produzida através de uma iniciativa dos Correios, Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) e Federação de Teatro de Pernambuco (Feteape), foi recebida pela atriz Carmelita Pereira, esposa do diretor Didha Pereira, que representou a atriz caruaruense na ocasião. Ela descreve aquele momento como algo bonito e emocionante. “Como Prazeres foi a primeira mulher a receber esse prêmio, eu me sentia premiada por osmose, e não apenas eu, mas todas as mulheres das artes cênicas que sempre ocuparam uma posição de destaque nessa área. Estávamos naquele momento quebrando alguns tabus. Atriz do interior premiada e por unanimidade, foi muito importante para mim ser a representante de uma atriz tão talentosa e de uma amiga tão fiel e generosa”, diz Carmelita. Ainda em 1994, Prazeres iniciou a montagem de um novo espetáculo. Satisfeita com o resultado de seu primeiro monólogo, decidiu investir no mesmo formato. O texto escolhido foi bastante inovador. Valsa nº 6, drama psicológico escrito pelo jornalista e dramaturgo pernambucano Nelson Rodrigues, estreou no dia 1º de abril de 1995, no Teatro João Lyra Filho, que estava lotado para assistir a mais uma estreia da diva do teatro caruaruense. Para dirigi-la, convidou o diretor Romualdo Freitas, que conheceu Prazeres em cena, no ano de 1986, no espetáculo O Recado do Verde. Autêntico e exigente, Romualdo sempre leva para os seus espetáculos traços de sua cultura. Não gosta que o ator decore o texto de uma só vez e dispensa as rubricas, que são as orientações dadas pelo autor para a montagem. Uma delas foi o pano de fundo vermelho, sugerido no texto para compor o cenário, “para desvincular este trabalho de Prazeres do último, Fiel Espelho Meu”. É daqueles que esperam que as ações dentro da cena surjam naturalmente. Ao montar Valsa nº 6, o seu principal desafio foi transformar temas como a morte e a pornografia, recorrentes nos textos de Nelson Rodrigues, em poesia e lirismo. Valsa nº 6 foi o sexto texto escrito por Nelson. Monólogo interpretado por sua irmã Dulce, em 1951, retrata os conflitos de memória de uma adolescente de 15 anos, assassinada pelo médico da família, e, por não 87


Prazer em Conhecer aceitar sua morte, divaga entre o real e o imaginário, realçando a loucura própria das dúvidas da adolescência, em transições. Ora apresentando-se como criança, ora como mulher num rompante altamente poético e teatral. Na peça, Prazeres interpretava Sônia, a protagonista de apenas 15 anos. Detalhe: a atriz tinha 45. A música Opus64 nº 1 de Chopin, melancólica e bela ao mesmo tempo, pontuava o trabalho ao longo de 70 minutos de duração da peça. Romualdo lançou mão do realismo fantástico para tentar elucidar o dualismo de Sônia, que se apresentava a si mesma como o Dr. Junqueira, os seus pais ou suas “alucinações”, nas quais habitava Paulo, o homem amado. Embora a peça fosse um monólogo, o casal de atores Meury Kellme e Inácio Falcão dividia algumas cenas com Prazeres, sem qualquer fala, trazendo em flashback as memórias de Sônia e Paulo ao plano físico e funcionando ainda como contra-regras na colocação e retirada de adereços. O cenário foi construído na cidade sertaneja de Arcoverde (PE), onde Romualdo vive atualmente. Precisavam criar um piano de cauda desmontável, com 1,10m e ao mesmo tempo forte o suficiente para suportar o peso de três atores. O teclado, embora não fosse original, precisava ter a função de movimentação para iludir a plateia. O figurino, caprichado e detalhista, foi encomendado por eles. As funções técnicas eram desempenhadas por pessoas da Companhia, a fim de baratear custos. Para montar Valsa nº 6, a equipe recorreu à iniciativa privada. Esperavam contar com a Lei de Incentivo à Cultura que naquela época acabou não sendo regulamentada. O patrocínio serviu para custear o material de divulgação e o figurino. Os demais custos foram bancados pela Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa, apostando na bilheteria. Nessa época, Romualdo morava em Tuparetama, Sertão pernambucano, e precisava ir a Caruaru todas as semanas. A Companhia bancava transporte, hospedagem e alimentação. Além do cachê.

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Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano

CARREIRA DE PRODUTORA

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oi nessa fase que Prazeres se viu obrigada a assumir o papel de atriz produtora. Corria em busca de patrocinadores e, quando não conseguia, bancava as despesas do próprio bolso. “Acredito que o meu pagamento foi feito com verba da própria Prazeres. Hoje louvamos a oportunidade de montar espetáculos com o incentivo das leis, mas naquela época eu tive que renegociar a proposta que apresentei inicialmente para executar o trabalho, por entender que seria uma produção com essa característica”, revela Romualdo. Ao dar vida a uma garota de apenas 15 anos, Prazeres foi inclusive preparada fisicamente pelo diretor. “Eu morava na Rua Barreiros (no bairro Caiucá, em Caruaru) e Romualdo não me deixava ir de carro ao Teatro João Lyra. Ele saía do hotel, ia até a minha casa e nós íamos a pé para que eu ganhasse resistência. Meus pés ficavam pretos de tanta estripulia, correria e sobe-desce. As pessoas esqueciam até que eu tinha prega na cara. Foi algo que me fez muito bem, um presente que Romualdo me deu”, descreve Prazeres. Quando vinha de Tuparetama, o diretor saía às cinco horas da manhã e chegava exatamente às oito no teatro. Os dois mantinham um acordo. Ao chegar, ele não veria o carro (pois ela teria ido a pé) e o espaço cênico deveria estar todo limpo. Todas as vezes em que chegou, ela estava lá no horário combinado. Em sequências de exercícios exigidas pelo diretor, Prazeres chegou a vomitar no palco, durante os ensaios. “Eu saía para respirar um ar limpo e mandava que ela limpasse. Depois voltava para ministrar o trabalho. Ela parava, tomava um remédio, limpava o palco e nós continuávamos. Gosto de buscar personagens no suor do ator”, afirma Romualdo. O diretor também trabalhou a falta de ousadia da atriz, a sua capacidade de atuação e mostrou para ela que a agressão dos textos de Nelson Rodrigues poderia ser mostrada de forma bonita. Na cena em que a personagem era desvirginada pelo médico, Prazeres usava na parte baixa da roupa um bolso com pétalas vermelhas. Em seguida, derramava sobre o corpo, como se fosse o sangue. A plateia delirava. “Eu aceitei o convite com muito 89


Prazer em Conhecer medo, mas fiquei feliz porque tive a oportunidade de dirigir uma grande atriz e um grande texto”, define Romualdo Freitas. Após o primeiro mês em cartaz, a Valsa foi convidada pela Secretaria de Cultura do Cabo de Santo Agostinho (PE), onde fez quatro apresentações. Em maio de 1995, foi vista pelo público da cidade de Santa Cruz do Capibaribe. No final deste mês, o espetáculo fez a abertura do II Concurso Nacional de Monólogos, em Teresina (PI), recebendo praticamente todos os prêmios que o evento entregou: melhor direção, melhor texto, melhor espetáculo pelo júri oficial e melhor atriz. A repercussão dada pela mídia local à peça e o fato de Prazeres haver conquistado o prêmio mais cobiçado nas duas versões do festival, fizeram com que a atriz fosse convidada a integrar o júri oficial do concurso no ano seguinte. Sem patrocínio, ela continuou sua peregrinação pelos festivais de teatro brasileiros. Em outubro de 1995, foi ao I Festival Nacional de Teatro de Feira de Santana (BA). A apresentação lhe rendeu indicação ao prêmio de melhor atriz. Em 1º de novembro do mesmo ano, recebeu homenagem concedida pelo S. L. Turismo e Rede de Hotéis Centenário, através de iniciativa do empresário Aluísio Lima. Na ocasião, uma placa foi descerrada em reconhecimento à importância da atriz para a cultura pernambucana. As honrarias não pararam por aí. O ceramista Luiz Antônio presenteou-a com um busto de barro e a artista plástica Romasi entregou a ela uma tela em óleo inspirada em Verônica, de Fiel Espelho Meu. A Companhia Prazeres Barbosa, que já contava com cerca de 30 integrantes, apresentou um ato do espetáculo Casamento Suspeitoso, de Ariano Suassuna. No início de 1996, Prazeres retomou as apresentações de sua Valsa. Dentro da programação do evento Todos Verão Teatro, promovido pela Feteape, a atriz apresentou o monólogo nos dias 20 e 21 de janeiro, no Teatro Barreto Júnior, no Recife. Valsa nº 6 foi a única peça promovida no Estado de Pernambuco selecionada para participar do III Festival Nacional de Arte, realizado entre os dias 26 de janeiro e três de fevereiro de 1996, em João Pessoa (PB). A última viagem feita por Prazeres com o espetáculo foi à cidade de 90


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano Erechim (RS). Após duas eliminatórias bastante disputadas, Valsa nº 6 foi um dos poucos espetáculos aprovados para representar a região Nordeste no Festival Brasileiro de Teatro Amador, um dos mais respeitados do País, que ocorreu em setembro de 1996. A apresentação lhe valeu mais uma indicação ao prêmio de melhor atriz. O pouco tempo em que a peça ficou em cartaz e a pequena quantidade de festivais que disputou podem ser explicados principalmente pela dificuldade em transportar o cenário, que contava com um pesado piano cenográfico. Romualdo também destacou a dificuldade acerca da questão dos direitos autorais no Brasil, à época. De forma inesperada, em 1996 Prazeres foi convidada por Didha Pereira para participar de um espetáculo patrocinado pela Chesf, que cumpriu temporada no Rio de Janeiro. Na época de preparação, uma das atrizes acabou discutindo com o elenco e desistiu de atuar. Às pressas, Didha ligou para Prazeres e a convidou para substituí-la. Ela aceitou imediatamente. Prazeres decorou o texto e todas as semanas ia para o Recife, onde participava dos ensaios. A Feira: Um Riso Trágico da Vida, escrito por Lourdes Ramalho, mesma autora do monólogo Fiel Espelho Meu, cumpriu temporada entre os dias seis e 27 de abril de 1996, no Teatro Dulcina. Também se apresentou no Teatro Glauce Rocha, centro do Rio. O elenco ficou hospedado na Casa Paschoal Carlos Magno, em Santa Tereza. Por se tratar de uma “feira”, na peça Prazeres tinha vários personagens. No ano seguinte, a atriz se aventurou em uma produção teatral nos palcos da capital pernambucana, a convite de Didha. Promovido pela Crysalis Assessoria e pela Companhia Artistas Independentes, NegroRei contava uma história ambientada em pleno século XVIII, no Brasil dominado por portugueses, especificamente na cidade de Olinda (nominada na peça de Olindá de Quilombá). É o período pós expulsão dos holandeses, quando a coroa portuguesa quer garantir seu poderio. NegroRei conta a história de um líder negro, protegido por orixás africanos, que luta para libertar sua raça do jugo português e foi escrito pelo próprio Didha, em parceria com o ator pernambucano José Ramos. É uma livre adaptação dos textos Chico Rei de Walmir Ayala e Ritual Rito 91


Prazer em Conhecer Atual, de Fernando Limoeiro. A peça foi patrocinada pelo Ministério da Cultura, Caixa Econômica Federal e Funarte, sob a direção de arte de Petrucio Nazareno e direção artística de Carlos Carvalho. Em NegroRei, que falava ainda sobre a libertação do Quilombo dos Palmares e trabalhava com entidades, Prazeres personificou a cidade de Olindá de Quilombá, na figura de uma rainha carregada por homens negros e fortes. O espetáculo estreou em 1997, no Recife. Participou em novembro do mesmo ano do I Festival Recife do Teatro Nacional (não competitivo) e, em 1998, do Janeiro de Grandes Espetáculos. Após a experiência dos dois últimos espetáculos montados longe de Caruaru, Prazeres passou seis anos sem estrear nenhuma peça. Nesse longo tempo, dedicou-se exclusivamente a sua Companhia e a trabalhos no cinema – parte que será explorada no sétimo capítulo deste livro.

UM NOVO CAPÍTULO NA HISTÓRIA DE PRAZERES

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Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa começou com cerca de 15 pessoas. Quando se tornaram independentes da escola e foram “adotados” pela professora Prazeres, os alunos passaram a ensaiar na Casa de Cultura José Condé, localizada no centro da famosa Feira de Caruaru. Com base na experiência adquirida no grupo do Sesc, Francisco Torres criou um estatuto, legalizou e montou uma diretoria. Prazeres sempre esteve à frente dos trabalhos da Companhia, especialmente na produção executiva e direção de elenco dos espetáculos. Mas, na verdade, Francisco foi o líder do grupo e, por esse motivo, era sempre reeleito presidente. “Eu não tenho nada a ver com a Companhia. Francisco apenas usou meu nome e cuida do projeto, mas sob os meus olhares. Disso vem a minha exigência com a qualidade do trabalho e o comportamento dos atores. Se tem o meu nome, tem que ser bom, qualidade total, como o selo do Inmetro”, diz a atriz. A cobrança por disciplina e qualidade, aliada à exigência muitas vezes incompreendida de Prazeres, tornaram a Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa um dos grupos mais respeitados do Estado de 92


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano Pernambuco. Outra característica importante era a pontualidade. Se o espetáculo estava marcado para as 21h, começaria exatamente nesse horário. “A sociedade caruaruense sabe que se o espetáculo for de Prazeres, ou chegue na hora certa ou não vá”, acrescenta a atriz. Após a montagem de Transe, estreou, em 1994, O Recado do Verde, de Erenice Lisboa. No ano seguinte, o grupo investiu em Casamento Suspeitoso, de Ariano Suassuna. Nessa época, a equipe já tinha cerca de 30 integrantes, entre eles Benício Júnior e Sheila Tavares. O casal atuou em quase todas as peças produzidas pela Companhia e mantém até hoje fortes laços de amizade com Prazeres e Francisco. Do período em que trabalharam juntos, eles guardam boas recordações. “Houve um caso inusitado e que marcou a carreira dela como atriz. Foi um momento muito cômico e também muito dramático. Estávamos na temporada de Casamento Suspeitoso e fomos apresentar o espetáculo no auditório da Fafica, que estava lotado. Nós estávamos todos prontos para começar o espetáculo e o ator que interpretava o Frei Roque não pôde ir”, lembra Benício. Para impedir que a ausência do rapaz atrapalhasse a apresentação, Prazeres vestiu o figurino e decidiu que ela mesma iria interpretar o personagem. A atriz conhecia bem o papel, afinal era ela a responsável pela direção do elenco. “O Frei era engraçadíssimo, tinha um barrigão e nós fizemos o espetáculo. Quando a apresentação terminou e anunciaram que Prazeres estava em cena, todos ficaram impressionados. Foi algo fantástico”, completa Benício. Numa das cenas, ela precisava cair. Era uma marcação que Francisco Torres havia feito com o outro ator. Prazeres então subiu num baú velho, sem que isso estivesse marcado, e deu um grito lá de cima. “Todo o elenco e a plateia começaram a rir. Ninguém esperava. Quando terminou, ela chorou muito e disse que nunca mais faria aquilo, porque viu o tamanho da responsabilidade e da loucura que havia feito. Realmente foi uma loucura. Mas depois, coisas que ela havia feito, Francisco integrou ao espetáculo”, comenta Sheila Tavares. Francisco e Prazeres procuraram manter em sua Companhia uma 93


Prazer em Conhecer rotatividade de espetáculos. A cada ano, estreavam um novo texto. Em seguida, vieram A Incrível Viagem (1996), Auto Nordestino de Natal e Noite de Canto e Luz (1997), além de Passos da Paixão (1998). Este último permitiu a Prazeres mudar algumas impressões que outros atores da cidade tinham a respeito dela. “Ela convidou pessoas de vários grupos para participar do grandioso espetáculo que foi feito na Avenida Agamenon Magalhães. Então, Prazeres envolveu muita gente e foi muito legal porque as pessoas puderam ver realmente quem ela é”, acredita Sheila Tavares. No primeiro semestre de 1998, a Companhia abriu mais um leque para outro seguimento cultural: a dança. Apostando em ritmos regionais e contemporâneos, a Companhia de Danças Prazeres Barbosa passou a ser cotada todos os anos para se apresentar no São João de Caruaru. Os trabalhos de coreografia foram desenvolvidos por Janduy Mota, Edney Monteiro, Sheila Tavares e Benício Júnior, com direção geral de Prazeres Barbosa. Ainda em 1998, o grupo montou O Filho Pródigo e A Mulher Pecadora, textos bíblicos adaptados por Prazeres. No início de 1999, a Companhia surgiu com Revista Musical, uma coletânea de dança, teatro, música e performance. O espetáculo englobava os principais segmentos trabalhados pelo grupo e foi um sucesso. Em setembro deste mesmo ano, montaram Juízo Final, um dos espetáculos de maior destaque do grupo. A peça participou, em novembro de 1999, do XI Feteag. A apresentação rendeu um espetáculo à parte. Embora fosse um festival estudantil, nessa época o Feteag dava oportunidade a grupos amadores para competirem com os espetáculos montados pelas escolas. Além da Companhia Prazeres Barbosa, várias equipes amadoras participaram desta edição do evento. Juízo Final foi inscrito com base em todos os critérios e o espetáculo foi visto e aprovado pela direção do evento previamente. Montaram uma super estrutura no Sesc Caruaru (onde acontecia o festival) e se apresentaram na data determinada. O elenco ouviu de várias pessoas que a Companhia levaria todos os prêmios da competição pela qualidade do espetáculo. No dia da entrega dos troféus, todos os integrantes compareceram. À medida que os vencedores foram sendo anunciados, Prazeres ficou con94


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano fusa e preocupada, pois Juízo Final sequer foi indicado a alguma das categorias. Ela chegou a falar para Francisco que os comentários a respeito do espetáculo, então, não eram verdadeiros. Quando os prêmios foram entregues, a comissão julgadora convidou Francisco Torres para entregar um Prêmio de Participação Especial. Justificaram que a montagem possuía um nível mais profissional e, por esse motivo, não entrou na concorrência. Assim que a “festa” terminou, Prazeres se levantou e pediu que a comissão julgadora (composta, entre outros, pela presidente do Sindicato dos Artistas de Pernambuco, Ivonete Melo, e pelo escritor Luiz Marinho, autor da peça A Promessa), permanecesse sentada. Sentindo-se injustiçada com a posição do júri, fez um desabafo grosseiro e ao mesmo tempo sensato diante dos que ali estavam, chamando os jurados de incompetentes e dizendo que aquelas pessoas não estavam retirando nada dela, mas anulando o sonho dos meninos de sua Companhia. Concluiu afirmando que embora não estivessem levando os prêmios, sabia que aqueles que foram agraciados não eram merecedores. “Vocês estão despejando o seu veneno em mim e não nos meus meninos, mas estão fazendo mal a eles e não a mim. Eu não admito isso”, disse, na ocasião. Ninguém se defendeu das acusações. Dez anos após o episódio, Arary Marrocos e Argemiro Pascoal, diretores do Feteag afirmam que a concorrência seria desleal. “O júri pode alterar qualquer coisa durante o processo e decidiu que um estudante de escola pública ou particular, que geralmente é iniciante, não poderia competir com um grupo semi-profissional, porque o grupo dela sempre foi nota dez em profissionalização. Nós achamos que não iria ferir e nem desonrar ninguém. Então, não foi pela qualidade do trabalho, mas pela característica dele. Porém, quando terminou a premiação ela subiu ao palco e foi terrível”, lembra Arary. Ivonete também nunca esqueceu a cena. “Era meu primeiro ano na comissão julgadora em Caruaru e tal foi minha surpresa, ao me deparar com tamanha disparidade no Festival Estudantil, onde a maioria dos grupos estava se apresentando pela primeira vez e de idades a partir dos seis anos. Tudo bem que o Festival já admitia esse descompasso, porém a comissão como 95


Prazer em Conhecer soberana, resolveu entregar um Prêmio Especial para o grupo de Prazeres, em consideração a ela e ao trabalho que foi apresentado”, conta. Ivonete Melo destaca que pessoas profissionais e semi-profissionais estavam concorrendo com crianças, o que justificou a não inserção da Companhia na relação de competidores. “Fomos encurralados no canto do palco, após a premiação, para justificar o prêmio que acharam menor. Mas, no entanto, foi um reconhecimento aos serviços prestados a Caruaru por Prazeres. Não concordamos com um grupo profissional concorrer com grupos de crianças e de adolescentes que estariam participando pela primeira vez de um Festival Estudantil”, explica. Questionada acerca da possibilidade de a Companhia Prazeres Barbosa ter conquistado quase todos os prêmios daquela disputa, Ivonete Melo confirmou a hipótese. “É verdade. Por isso entregamos o prêmio. Primeiro porque preencheu todos os requisitos e, segundo, em respeito a Prazeres. A menção honrosa é um prêmio digno, porém seria irresponsável, por parte da Comissão, a concorrência com crianças e adolescentes, já que o grupo de Prazeres estava na carreira artística há mais tempo”. Arary Marrocos recorda que houve apresentação de alguns números do grupo de dança do Tea, no intervalo de cada bloco de premiação. Ela estava numa sala, arrumando as roupas para colocar no carro, quando alguém chegou e disse para ir embora. “Não tem necessidade de uma coisa dessas. Eu sei que ela tem talento, é uma boa atriz, mas nesses momentos ela perde as estribeiras”, relata. “O júri é autônomo e poderia decidir o que quisesse”, acrescenta Argemiro. Essa, aliás, não foi a primeira vez em que Prazeres bateu de frente com o Tea. Em 1991, quando preparavam a sexta edição do Feteag, em uma das assembleias da Associação dos Artistas de Caruaru, Arary e Argemiro pediram sugestões aos artistas para a confecção dos troféus. Prazeres Barbosa desenhou num papel a sua ideia. Um mandacaru representando a região Nordeste, com as máscaras da tragédia e da comédia. Em seguida, repetiu num quadro de giz para que todos pudessem ver. A sugestão agradou, mas o orçamento feito na época impediu a direção do evento de confeccionar o troféu. 96


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano Durante a premiação do VII Feteag, no ano seguinte, Prazeres ficou surpresa com o que viu. O troféu fora produzido justamente da forma como ela havia sugerido um ano antes. Em artigo publicado nos jornais Vanguarda e do Commercio, em setembro de 1992, ela conta que chegou a agradecer a Argemiro Pascoal por ter acatado sua sugestão. Ao entregar os troféus, a direção do evento citou que a autoria do mesmo era da artesã Marliete Rodrigues, deixando Prazeres irada. “Eu levantei e fiz questão de dizer que havia criado o troféu, embora Marliete houvesse confeccionado. Mas nos escritos do festival eles negaram e mandaram inclusive cortar essa parte da gravação, já que o evento estava sendo filmado”, conta Prazeres. Questionados sobre a veracidade da autoria, Arary e Argemiro explicaram que a sugestão partiu de outra pessoa. “Aquilo foi sério. O presidente da Fundação de Cultura de Caruaru naquela época era Altair Porto e nós estávamos na fase de organização do festival. Ele veio até aqui (ao Tea) e nos disse que tinha visto na casa de Marliete um lindo troféu em formato de mandacaru. Explicou que era muito bonito, mas muito delicado, e veio nos propor para fazermos naquele formato. Como o patrocínio era da própria Fundação, eu disse para ele que ficasse à vontade’, diz Arary. No final do evento, um dos jurados (professor de teatro do Recife) ficou encarregado de preparar o roteiro de encerramento e trouxe o material que seria lido à noite para que a equipe do Tea digitasse. “Ele havia colocado que o troféu era uma idealização de Prazeres Barbosa e eu achei estranho porque Altair viu o troféu na casa de Marliete e trouxe para nós. Prazeres não era artista plástica, nunca trabalhou com barro e eu disse então para não colocar porque não foi ela quem criou. Então, na entrega dos troféus, ninguém fez menção a isso. E ela se revoltou, subiu ao palco, agrediu a gente”, complementa Arary. A atriz conta que nesse mesmo ano, assim que terminou a premiação, Altair Porto os convidou para ir até o hall de entrada do Teatro João Lyra Filho, onde seria descerrada uma placa em homenagem ao Tea. “Quando terminou, ela (Prazeres) se manifestou. Balançava o dedo na minha cara, me chamando de ladrona (sic). As pessoas ficaram perplexas”, lembra Arary. Sobre a reunião em que pediram sugestões para a criação 97


Prazer em Conhecer do troféu, ela diz não lembrar. “Eu só estou lembrada que Altair trouxe de Marliete esse troféu. Infelizmente ele está morto”. Sobre o agradecimento feito por Prazeres no dia do evento, Argemiro foi enfático. “Ela pode até ter dado a sugestão, mas não foi ela quem fez o troféu.”

FOGUEIRA DAS VAIDADES

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movimento teatral em Caruaru já era muito forte na década de 1960 (embora as atividades ainda fossem mais amadoras). Nos anos 1980, uma professora começa a fazer teatro com seus alunos na escola e poucos anos depois se torna uma das principais referências nas artes cênicas do Estado de Pernambuco. A cada espetáculo, Prazeres Barbosa surge em cena apresentando uma desenvoltura melhor. Logo começa a se destacar nos grandes festivais de teatro brasileiros e conquista o público, a crítica e a imprensa. Sempre muito exigente, daquelas que não admitem erros, não entra em cena sem antes conferir se está tudo nos conformes. Disciplinada como poucos e de uma determinação invejável, quase sempre soube aproveitar as oportunidades que a vida lhe ofereceu. Buscou reciclar seus conhecimentos através de oficinas teatrais, diversas literaturas e do contato com grandes diretores. Com pouco tempo de carreira, ganhou uma companhia teatral em sua homenagem. A repercussão alcançada pela professora que começou a fazer teatro na maturidade fez muitos artistas de Caruaru se sentirem incomodados com o seu sucesso. “O meio teatral é a fogueira das vaidades. As pessoas estranhavam o fato de uma pessoa tão recente no movimento teatral querer ser profissional, enquanto muitos estavam há anos desenvolvendo atividades, porém, em sua grande maioria, no amadorismo. Prazeres buscava a seriedade na nova profissão que estava abraçando. Isso causou certas rixas. Muitos sequer haviam visto o seu trabalho, mas diziam não gostar dela”, revela o teatrólogo Romualdo Freitas. A atriz sentiu isso na pele em 2005, antes de viajar a Taperoá, na Paraíba, onde ocorreram as gravações da microssérie A Pedra do Reino. Além 98


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano de Prazeres, três outros atores foram aprovados na seleção feita em Caruaru. Uma emissora de televisão local os convidou para conceder uma entrevista. Combinaram que as gravações seriam feitas na residência de Prazeres, pela conotação artística do espaço. Os outros atores, porém, não concordaram. Prazeres ficou em casa, no horário marcado, esperando que todos chegassem. Quando percebeu que as horas haviam passado, ligou para alguém da produção e lhe informaram que os atores não quiseram gravar a entrevista em sua casa. Optaram por fazer na Feira de Caruaru. “E por que eu não estou na feira com eles?”, perguntou, naquela ocasião. A entrevista acabou sendo feita em dois momentos: com os três atores, na Feira, e com Prazeres, em sua residência. Em seguida, os três foram à Prefeitura Municipal solicitar apoio para viajarem até o Rio de Janeiro, na época de estreia da série. Mais uma vez, fizeram questão de excluí-la. “Eles souberam antes de mim que eu havia sido convidada pela produção para estar lá e que a minha passagem seria paga pela direção da minissérie”, confidencia. Na noite de estreia, eles foram cumprimentá-la. Prazeres então lhes perguntou o que havia feito de errado. Eles, porém, não quiseram responder. Disseram apenas que não fizeram nada por maldade, mas optaram por gravar a entrevista em outro lugar porque as atenções estavam muito voltadas para ela. Sobre a decisão de não incluí-la na relação ao procurar apoio para viajar, a turma explicou que agiu daquela forma porque já sabia que ela viajaria. “Nunca tive nada contra eles, pessoas excelentes, inclusive fiquei responsável pela menina, porque ela era menor de idade. Dormíamos no mesmo quarto”, diz Prazeres. “Eles eram tão atores quanto eu. Nós éramos amigos nas gravações. À noite, na praça, ficávamos conversando”, afirma, dizendo não compreender os motivos que os levaram a proceder daquela forma. Prazeres, entretanto, lidou com esse tipo de comportamento desde o início de sua carreira. Em 1999, a atriz Maria Chiesa (que era presidente do Conselho de Artes Cênicas de São Paulo), a convidou para montar o espetáculo A Feira, com atores paulistanos. A peça seria incluída nas comemorações dos 500 anos de colonização do Brasil. Além disso, seria uma forma de homenagear a autora Lourdes Ramalho. Chiesa havia conhecido 99


Prazer em Conhecer Prazeres no X Festival Nacional de Monólogos, em São José do Rio Preto e ficara encantada com o seu trabalho. Viu nela a pessoa ideal para orientar o elenco, principalmente por ser nordestina. Quando recebeu o convite, Prazeres Barbosa ficou um tanto receosa. Embora tenha aproveitado bem as oportunidades que foram surgindo, perdeu muitas outras por medo de apostar. No dia em que terminou o festival, ela perguntou se Maria Chiesa estava realmente falando sério e se o convite era de coração. Confiante, acabou indo para São Paulo. Chegou a fazer uma festa para se despedir dos amigos em Caruaru, acreditando que sua ida poderia abrir as portas que sempre almejou ao longo da carreira. Prazeres viajou por conta própria e, mesmo recebendo convite para ficar hospedada na casa de Chiesa, preferiu se instalar na residência do irmão, Fernando Barbosa. No dia combinado, foi visitá-la. Maria Chiesa a recebeu de forma gentil e acolhedora. No entanto, como sempre foi muito requisitada para ministrar oficinas, estava se preparando para viajar mais uma vez. Tratou de deixar uma pessoa para desenvolver os trabalhos junto a Prazeres, que logo se entrosou com o elenco e acabaram criando uma boa sintonia. A outra atriz – cujo nome ela não recorda – começou a sentir-se enciumada. Prazeres foi para lá justamente no intuito de facilitar a compreensão da linguagem e do sotaque nordestino. Quando aquela senhora explicava algo, sem conhecimento, Prazeres fazia acréscimos ou explicava o real significado da expressão. “Percebi que ela sentiu como se eu estivesse entendendo mais o texto que ela. Mulher é muito difícil de lidar, principalmente atrizes mais velhas, que acham saber de tudo”, argumenta. As diferenças foram aumentando a ponto de ela pedir a Prazeres que não mais interferisse em suas colocações. “Eu estou aqui para fazer o trabalho e sei o que estou dizendo. Vim a convite de Maria Chiesa porque tenho conhecimento, mas se isso lhe torna menor, você me desculpe”, rebateu. O clima ficou pesado até que, duas semanas depois, Maria Chiesa retornou. A velha atriz tratou de criar uma verdadeira confusão. Os integrantes do elenco, entretanto, apoiaram Prazeres, explicando o que realmente havia acontecido. Mas a situação tornou-se complicada e ela decidiu voltar para Caruaru. 100


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano Agradeceu pela oportunidade, comentou que havia deixado a casa e a família para estar ali, mas estava retornando. Maria Chiesa ficou triste, afinal, não queria que aquilo acontecesse. “Não deu certo por causa daquela velha história: as pessoas sentem ciúme (respira fundo e sorri). Muitas não admitem que sou atriz, porque comecei a fazer teatro aos 32 anos e foi uma explosão. Aquelas pessoas que não me aceitaram desde o início, continuam sem aceitar. Engolem-me, como quem engole sapo. Mas, sou o que sou. Continuo incomodando, mas continuo fazendo. E as pessoas que se incomodam não estão fazendo nada”. Júlio Filho, sobrinho da artista, atribui o sucesso alcançado por Prazeres à obstinação que acompanhou sua carreira. “Tia Prazeres sempre foi diferente das outras pessoas. Quem queria fazer teatro não gostava de estudar, falava errado. De repente, surge uma professora, estudiosa e que tinha tudo para dar certo: conhecimento e capacidade para assimilar a arte de forma diferente. Enquanto os artistas queriam ‘agredir’ a sociedade, ela conseguiu inserir no teatro caruaruense algo que não existia: organização”, analisa. Para Júlio, Prazeres Barbosa sempre teve conceitos diferenciados em relação à arte. “A sociedade via nela muita seriedade e, mesmo existindo preconceitos, os pais incentivavam os filhos a participarem do grupo de teatro dela. Sempre foi uma pessoa séria, organizada e uma dona de casa com alma de artista. Hoje Prazeres está aposentada, não precisa mais provar nada a sua cidade. Ela precisava ir para outro local, embora ainda esteja mal aproveitada”, opina.

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Prazer em Conhecer

O RETORNO AOS PALCOS

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pós a montagem de Juízo Final, a Companhia Prazeres Barbosa passou alguns anos sem estrear nenhum novo espetáculo. Esporadicamente, cumpriam temporada com alguma das peças já montadas ou participavam de eventos e festivais. Todos os espetáculos produzidos tinham a direção cênica de Francisco Torres e direção de elenco de Prazeres, sempre ligada à questão da formação do ator. Somente em 2003, apostaram numa nova montagem. O texto escolhido foi A Feira, o mesmo produzido em 1996, por Didha Pereira, para cumprir temporada no Rio de Janeiro. Após seis anos sem atuar em nenhum espetáculo, Prazeres iria protagonizar a peça na figura da velha Filó. O espetáculo apresentava ainda duas particularidades: pela primeira vez, os integrantes da Companhia Prazeres Barbosa tiveram a oportunidade de contracenar com a atriz, e Francisco Torres de dirigi-la em cena. Prazeres buscou na mãe a inspiração para compor sua personagem. “Filó era uma velha do sítio e eu fiz em homenagem à minha mãe. Ela teve paralisia infantil e andava com as pernas trôpegas. Então, eu encarnei minha mãe”, explica. A estreia do espetáculo ocorreu em sete de março de 2003, às 21h, no Teatro João Lyra Filho. A produção marcava os dez anos de atividades da Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa. O texto fazia a plateia rir e chorar ao mesmo tempo. Num cenário semelhante ao de uma feira, a autora mostrava a realidade brasileira misturada às crenças populares, de forma polêmica e questionadora. O espetáculo trazia ainda bonecos em homenagem ao Mestre Vitalino. Era a primeira vez que dona Antonina ia ao teatro para ver a filha no palco, numa peça que narra a trajetória de uma família que vem à cidade grande fazer compras e ir ao dentista, mas acabam se deparando com a crueldade do lado humano. Lá, são enganados, roubados e discriminados por aqueles que “sobrevivem” a custa da desgraça dos outros. “Um trabalho muito lindo, de uma construção muito verdadeira”, opina Prazeres. Para Francisco Torres, a experiência de dirigir a própria esposa no palco foi boa e ao mesmo tempo difícil. “O bom mesmo é dirigir quem 102


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano você não conhece, porque acaba tendo uma desenvoltura maior. Mas Prazeres é e sempre foi uma pessoa muito disciplinada. Ela estuda para um texto de monólogo ou uma palavra, se dedica, se enclausura, vai para o seu silêncio absoluto e estuda aquela frase”, ressalta. A peça participou do III Circuito Pernambucano de Artes Cênicas, se apresentando em 19 cidades de Pernambuco, entre os meses de agosto e novembro de 2003. No mesmo ano, através do Projeto Alvará de Expressão, desenvolvido pela Secretaria de Políticas Sociais de Pernambuco, a Companhia apresentou a peça para detentos dos presídios pernambucanos. Em 10 de janeiro de 2004, participou do X Janeiro de Grandes Espetáculos, no Teatro do Parque, em Recife. Prazeres recebeu mais um prêmio de melhor atriz. Em 2005, após mais de 20 anos de carreira, passou pela cabeça de Prazeres que o próximo espetáculo a ser montado por ela seria o último de sua vida. Acreditando estar numa fase de fechamento de ciclo, a atriz queria montar uma grande produção, diferente de tudo que já havia feito. Os desafios começaram com a escolha do texto. Guiomar Sem Rir, Sem Chorar, escrito por Lourdes Ramalho propõe uma reflexão sobre a realidade do País, os limites da democracia e a liberdade de expressão. O espetáculo é mais um monólogo e certa de que estaria concluindo sua trajetória nos palcos caruaruenses, Prazeres quis terminar exatamente da forma como começou: sendo dirigida por Severino Florêncio. Os longos 13 anos em que passou afastada da convivência com o velho amigo foram retomados nessa época. Prazeres e Severino nunca deixaram de se falar, mas não mantinham mais a mesma amizade do início. A oportunidade de voltar a trabalhar com o seu primeiro diretor foi descrita pela atriz à imprensa da época como “um feliz reencontro”. De acordo com Prazeres, os dois nunca se tornaram inimigos, mesmo porque as desavenças que aconteceram não o envolviam diretamente. “Havia um problema no conjunto todo que não era legal. Houve momentos em que eu pensava que iria ser agredida em cena e se aquilo me acontecesse eu revidaria. Chegou o limite e eu soube a hora certa de me ausentar”, diz Prazeres, ao comentar sua saída do grupo do Sesc. 103


Prazer em Conhecer Outro incentivador do reencontro era o teatrólogo Romualdo Freitas. “Durante algum tempo eles andaram afastados. Eu os encontrava e dizia que aquilo não deveria acontecer, porque eram os dois lados do rio e precisavam de uma ponte que os ligasse”. A união foi decisiva para o sucesso do novo espetáculo. Guiomar, principal personagem da peça, é uma ex-professora de escola pública que se torna prostituta e acaba sendo chamada para prestar esclarecimentos sobre suas pesadas críticas à conduta dos poderosos. Submetida a uma espécie de CPI a portas fechadas, ela precisa se valer da astúcia, da inteligência e da sedução para virar o jogo e escapar de uma possível queima de arquivo. O texto denso e instigante busca impactar os espectadores e provocar uma reflexão sobre temas atuais como corrupção na política, na polícia e na justiça e se vale da linguagem da fresta, possibilitando leituras e enfoques diversificados. De tanto cobrar explicações pelos crimes de que é acusada Guiomar, o juiz acaba se entendendo com a prostituta, que o convence a cada resposta rica em argumentos. A inquisição acaba em “pizza”, como a autora considera que termina tudo no Brasil. A partir desta sugestão, Severino decidiu mudar o título do espetáculo, que não o agradava. Se todo o descaso na política brasileira terminava em pizza, no caso de Guiomar iria terminar em uísque, passando a chamar Whisk pra Guiomar. A adaptação para o teatro foi feita pela historiadora e cientista política Ana Maria Barros, que trouxe para a peça uma visão contextualizada da realidade brasileira. Apesar de ser um monólogo, mais uma vez Prazeres não aparecia sozinha em cena. Severino Florêncio personificou a figura do juiz, abrindo a possibilidade de Francisco Torres atuar a seu lado. A peça contava ainda com o apoio de dois jovens atores, que faziam luz e som no próprio palco. Whisk pra Guiomar estreou no Teatro João Lyra Filho, no dia cinco de agosto de 2005. A imprensa destacou que Prazeres Barbosa se superara para interpretar a personagem. Um fato curioso em relação à montagem são as semelhanças entre Prazeres e Guiomar, ambas professoras de escola pública e críticas quando o assunto é a corrupção política. Esse, aliás, é um 104


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano tema pelo qual a atriz demonstrou pouca importância ao longo da vida. Na trilha sonora do espetáculo, destaque para a música Pagu (Rita Lee e Zélia Duncan), cantada por Prazeres. Mexo, remexo na inquisição Só quem já morreu na fogueira sabe o que é ser carvão Eu sou pau pra toda obra, Deus dá asas à minha cobra Minha força não é bruta, não sou freira nem sou puta Porque nem toda feiticeira é corcunda, nem toda brasileira é bunda Meu peito não é de silicone, sou mais macho que muito homem Sou rainha do meu tanque, sou pagu indignada no palanque Fama de porra-louca, tudo bem, minha mãe é Maria ninguém Não sou atriz, modelo, dançarina Meu buraco é mais em cima Apesar de seu total desinteresse pela política, Prazeres diz que nunca votou em branco e que sempre escolhe o “menos ruim” na hora de votar. “O meio político é muito duvidoso. Por melhor intenção que as pessoas tenham, quando chegam lá parece que passam por uma lavagem cerebral. Não estou generalizando, mas ao mesmo tempo faço quase isso. Não me considero de direita, nem de esquerda. Sou da linha da verdade. Sempre voto no que me convenceu mais. Um político que fosse completamente avesso à cultura jamais teria meu voto, como também nunca votaria em um irmão meu”, revela. O fato de ter sido uma adolescente e depois uma adulta infensa à política (possivelmente pela posição da mãe, que sempre dizia não querer os filhos na política, temendo escândalos), não impediu que Prazeres recebesse o reconhecimento desta classe. O sucesso alcançado ao longo dos anos serviu como justificativa para a apresentação de votos de aplauso e homenagens feitas por políticos das mais diversas siglas partidárias. “Eu fico muito feliz porque todos faziam isso. Quando é preciso, eu critico, mas também elogio e todos me respeitam por isso”, acredita. A atriz possui em seu acervo algumas homenagens recebidas pe105


Prazer em Conhecer los políticos pernambucanos, entre elas a Medalha Álvaro Lins, comenda outorgada pela Câmara de Vereadores de Caruaru em seis de dezembro de 1996; o título de Cidadã Limoeirense, concedido pela Câmara de Vereadores de Limoeiro (PE), em março de 2003 e o Colar do Sesquicentenário, entregue a 150 personalidades que contribuíram para o progresso da cidade de Caruaru, em seus 150 anos de história. A homenagem foi recebida em 18 de maio de 2007. Nesse mesmo ano, foi reconhecida pela Assembléia Legislativa de Pernambuco, “pela relevante atuação na arte cinematográfica, contribuindo para distinguir o cinema pernambucano internacionalmente”. Durante a cerimônia, ocorrida em três de setembro de 2007, no Recife, Prazeres foi escolhida para discursar em nome de todos os artistas e quebrou a formalidade ao encerrar seu discurso cantando os versos de sua música favorita: Se avexe não, que amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada. Ao final da canja, a reação. “A Câmara veio abaixo”, lembra. Por todos esses motivos, a preparação da personagem exigiu um esforço ainda maior de seu diretor. Prazeres disse para Severino que estava se desnudando de tudo o que sabia e das coisas passadas e que ele fizesse dela o que quisesse. “Ela me convidou e eu terminei fazendo Whisk pra Guiomar e gostei muito de ter feito. Eu tentei desconstruir alguns vícios de interpretação, comportamento, postura, ritmo e tom da voz que ela tinha. Queria fazer um espetáculo diferente, mais conceitual e construtivista”, descreve Severino. A peça cumpriu temporada no Teatro João Lyra Filho e foi vista ainda no XVII Feteag e IV Festepe, em outubro de 2005; participou do VII Festival Recife do Teatro Nacional, em novembro de 2005 e da IV Conferência Pernambucana de Artes Cênicas, em dezembro do mesmo ano, na cidade de Garanhuns (PE). A peça, que detonava a política brasileira, foi convidada, em 2006, para se apresentar no XII Janeiro de Grandes Espetáculos, no Teatro de Santa Izabel, em Recife, onde Prazeres foi indicada ao prêmio de melhor atriz. Uma das últimas apresentações (e, certamente, das mais marcantes), aconteceu em agosto de 2006, na VIII Mostra de Teatro de Serra Talhada. 106


Capítulo 5 - A atriz mais premiada do teatro pernambucano A peça foi apresentada no dia quatro e por motivos de saúde, Prazeres teve que voltar a Caruaru no mesmo dia, deixando o jornalista Leydson Ferraz como representante de sua Companhia no dia da premiação. Como ocorrera em 1999 com Juízo Final, no Feteag, a comissão julgadora excluiu Whisk pra Guiomar da competição, alegando que o espetáculo era de elevado nível profissional diante dos demais concorrentes. A Prazeres restou um prêmio especial de Menção Honrosa e a indignação. A insatisfação mais uma vez era justificável, afinal, há uma grande diferença entre ser convidado para concorrer e fazer participação especial. Whisk foi visto ainda no VI Circuito Pernambucano de Artes Cênicas, em agosto e setembro de 2006, nas cidades de Brejo da Madre de Deus e Angelim. Participou do projeto Rosa dos Ventos, promovido pelo Sesc Pernambuco nos municípios de Petrolina, Arcoverde, Belo Jardim, Recife e Garanhuns, em maio daquele ano. O reconhecimento veio com o resultado do I Festival Nacional de Teatro da cidade de Natal (RN), em outubro de 2006, quando Prazeres recebeu mais um prêmio nacional de melhor atriz. Depois, participaram ainda do XVII Festival de Inverno de Garanhuns, em 27 de julho de 2007. Severino Florêncio diz que o tempo em que ficou em cartaz não foi suficiente para fazer uma temporada maior e dinamizar o processo de viagens. Não conseguiram ir inclusive à cidade de Campina Grande (PB), terra natal da autora. “Infelizmente, eu pensava que fosse demorar mais tempo, porque era um espetáculo que eu gostava, as plateias gostavam e Prazeres gostava muito. Por outro lado, ela foi recebendo convites, surgiram as oportunidades e ela foi se lançando. É o que ela quer, o que gosta de fazer. Prazeres me dizia sempre que achava que o teatro estava fechando um ciclo aqui e eu não acreditava”, afirma Severino. O projeto de encenar Whisk pra Guiomar durante um longo período foi interrompido para que Prazeres realizasse o maior sonho de sua vida: trabalhar em produção televisivas na Rede Globo. De forma quase profética, as coisas aconteceram exatamente como ela havia previsto. “Com essa peça, fecho um ciclo da minha vida como mulher e atriz. Minha expectativa é que as pessoas tenham tanto prazer em vê-la como 107


Prazer em Conhecer eu e a equipe tivemos em montá-la”, descreveu em entrevista ao Jornal Vanguarda de Caruaru, em seis de agosto de 2005. Nesse período, a atriz foi aprovada nos testes para a microssérie A Pedra do Reino, em seguida, assinou contrato com a emissora para participar de sua primeira novela. A mudança para o Rio de Janeiro representou uma fase de reviravoltas no amor e na vida profissional de Prazeres.

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Capítulo 6

Amores e poesia

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Prazer em Conhecer

“A

ma-se várias vezes e ama-se intensamente”. Essa é a visão de Prazeres Barbosa acerca do amor. Das paixões contidas na infância aos relacionamentos duradouros da fase adulta, Prazeres experimentou o gosto do amor e o descontrole de um coração apaixonado. Sentiu na pele a solidão do abandono e o aconchego de braços dispostos a lhe mostrar que amar vale a pena. Teve maturidade para reconhecer os limites de uma relação amorosa desigual e a mente de uma adolescente ao entregar-se a uma paixão jovem, no entanto, correspondida. Na infância, a menina Prazeres e suas irmãs ouviam a mãe dizer que a moça que “passasse” por um homem perderia todo o seu valor. Mas ela não ensinava o real significado de “passar” e as filhas procuravam manter distância dos homens. A ingenuidade e a ignorância, predominantes na época, não permitiam que dona Antonina falasse sobre assuntos íntimos com os filhos. Do seu modo, ela os educou de forma que nenhuma das mulheres saiu de casa grávida e nenhum dos homens foi forçado a casar por haver maculado a “honra” de alguma moça. Em casa, nenhuma das irmãs via a outra sem roupa. Ninguém tomava banho junto. Prazeres menstruou pela primeira vez com quase 18 anos. “Sempre fui muito mignon”, define. Quando aconteceu, ela pensou que estava morrendo e recorreu à mãe. “Calma minha filha, é porque agora você é uma mocinha. Mas não diga a suas irmãs, para elas não ficarem ‘mangando’ de você”, disse dona Antonina na ocasião. Apesar da criação tradicional que recebeu e de não ouvir as pessoas falarem sobre paixões, sexo e assuntos deste tipo, Prazeres conheceu o amor muito cedo. Na época em que estudou no CNEC, em Caruaru, ela se apaixonou por um garoto. Eles chegaram a fazer de conta que namoravam, mas sequer pegavam na mão um do outro. Na Igreja Batista, Prazeres encantou-se com um rapaz. “Pensei que ia morrer. Mas eu não sabia o que era aquilo e nem tinha coragem de dizer a ninguém”, conta. A atriz acredita que essa paixão foi o marco da transformação de menina para moça que ela viveu. Sufocada com aquele sentimento, criou coragem e passou a confidenciar tudo para uma amiga. A moça transferiu para si o que Prazeres lhe contava e terminou casando com o rapaz. “Na 110


Capítulo 6 - Amores e poesia época eu fiquei tão triste, que decepção! Mas é assim, quem manda eu não me abrir”, pondera. Em seguida, ela se apaixonou por outro garoto com quem convivia na igreja. “Mas ele nunca soube, porque a gente não tinha essa abertura para dizer que gostava ou que estava apaixonada. Nós tínhamos vergonha mesmo”, explica. As marcas das paixões recolhidas e ingênuas da infância começaram a ser esquecidas quando Prazeres conheceu o primeiro amor da sua vida. O encontro aconteceu na casa onde morava, na Praça Coronel Porto. No final dos anos 1960, ao lado das irmãs Socorro e Mercês, a professora Prazeres começava a se aperfeiçoar na arte do Magistério através do Externato Três Irmãs. Apesar de serem muito jovens, elas ensinavam a adultos e pessoas mais idosas. Aos 20 anos, a irmã caçula percebeu que um de seus alunos começou a paquerá-la. Antonio era alguns anos mais velho que a professora, dois ou três apenas. Prazeres aceitou o pedido e logo iniciaram o namoro. A relação era tão “morna” que eles demoraram uns cinco meses para dar o primeiro beijo. A cena foi flagrada por Socorro Barbosa que ia chegando com o namorado. “Quase todo mundo ‘morreu’, porque não era uma coisa normal. E olha que não eram como os beijos de hoje”, diz. Prazeres passava o dia costurando e ouvindo o rádio. Também ia para a escola e revezava os horários de funcionamento do Externato com as irmãs. Nos finais de semana, dedicava seu tempo ao namorado. Independentemente do horário em que o rapaz chegasse, às 22h iria embora. O namoro durou mais de cinco anos. Nesse período, o casal noivou. Em seguida, se casaram. Consciente das próprias limitações, Prazeres costuma dizer que casou aos 25 anos, mas com mente de adolescente e reclama por não ter tido uma vivência de descobertas. “Nós não éramos incentivadas para essas coisas. Não possuíamos televisão. Para assistir, íamos à casa dos vizinhos ou olhávamos pelas frestas das janelas, quando passávamos pelas calçadas. O que marcou a minha adolescência e juventude foi a fase na igreja”, destaca Prazeres Barbosa. Naquela época, casar de véu e grinalda era o sonho de todas as mo111


Prazer em Conhecer ças, que precisavam contar com as prendas para o casamento. Prazeres, por exemplo, sabia datilografar, bordar a mão e a máquina, além de costurar para homens e mulheres. Só não teve oportunidade de desenvolver dotes culinários. Em casa, o máximo que aprendeu foi cozinhar pratos simples, como: feijão, arroz e cuscuz. “Até hoje, sou uma cozinheira nota zero, sem nenhuma qualificação. A única coisa que sei fazer é doce”, revela a atriz, cuja preferência é pela comida regional. O enlace matrimonial foi muito simples, mas Prazeres fez questão de casar com todas as pompas possíveis. Para costurar o vestido, ela contou com a ajuda de uma “velha” amiga e conselheira. Em 1971, quando iniciou o Magistério no Colégio Estadual de Caruaru, Prazeres conheceu a jovem Neide Mota. Pouco tempo depois as duas se tornaram amigas. Em 1973, após serem aprovadas no vestibular, continuaram estudando juntas, na mesma turma. Em 1983, Neide foi trabalhar na Escola Elisete Lopes. Prazeres já estava lá. A amizade dos tempos de escola perdurou a vida inteira. Neide Mota guarda boas recordações dos momentos vividos ao lado da amiga. “No Colégio Estadual, Prazeres já chegou atriz. Eu lembro que ela representou uma mãe idosa, numa peça dramática, e foi um sucesso. Ela dramatizou uma poesia para homenagear as mães e apresentou praticamente sozinha. Como aluna, era muito dedicada e participativa. Nós fazíamos parte do mesmo grupo. Vivíamos e vivemos como irmãs, nosso contato é eterno”, conta Neide. As duas amigas também deram os primeiros passos no Magistério juntas. Prestes a concluir o curso, Prazeres e Neide tiveram que cumprir um estágio obrigatório, de 365 horas, na Escola Professor Vicente Monteiro, em Caruaru. “Naquela época não é como hoje, onde o pessoal faz de conta que fez um estágio. Nós éramos acompanhadas o ano inteiro e fizemos calo nos pés porque tínhamos que ir a todos os eventos que houvesse na cidade para complementar essa carga horária. O estágio era com turmas de primário e lá Prazeres aproveitava para fazer teatro, música, coral, enfim, pintava o sete”, diz a professora. O vestido de casamento, usado por Prazeres, foi produzido com 112


Capítulo 6 - Amores e poesia rendas e pequenas partes de godê entrelaçadas à parte fixa da roupa. O modelo foi pensado pela própria noiva que contou com a parceria de dona Nova, mãe de Neide, na confecção. “Era à la Romeu e Julieta, a manga pegando na pele, renda fofa nos ombros, calda e um tule enorme para a entrada na igreja, exatamente como eu sonhei”, lembra Prazeres. Os adereços de flores, capela e o sapato (uma sandália de plataforma grande, bastante usada naqueles tempos) também foram presentes de dona Nova. A cerimônia de casamento de José Antonio de Melo e Maria dos Prazeres Barbosa aconteceu no dia 04 de janeiro de 1975, na Primeira Igreja Batista de Caruaru. O matrimônio foi celebrado pelo pastor Elias Teodoro. Prazeres, que após o casamento aderiu o sobrenome do marido, passou a assinar Maria dos Prazeres Barbosa de Melo. Um detalhe curioso é que no registro de nascimento, o seu nome foi lavrado Maria dos Praseres Barbósa, erro que somente depois foi observado. Todos os seus documentos são assinados desta forma. Artisticamente, no entanto, ela utiliza o nome grafado com a letra ‘z’. Como testemunhas, Prazeres convidou sua irmã Maria da Glória, acompanhada do esposo, Armando Albuquerque, e o casal de amigos Neide Mota e Valdomiro Araújo. A sobrinha, Glorinha, entrou com as alianças. O coral de vozes da igreja (do qual Prazeres fazia parte) cantou neste dia em homenagem a sua integrante. “Eu tinha pouco mais de 30 quilos quando casei, era uma ‘esperança’. Foi tudo lindo, a realização de um sonho”, destaca. Nessa época ela ainda morava com a família na Praça Coronel Porto. Lá, reuniu os familiares e amigos para comemorar o seu casamento. “Não houve festa, pois eu não podia oferecer”, acrescenta. Em seguida, o casal foi morar na casa que pertence à família, na Rua Martin Afonso. O imóvel nunca fora vendido e ficava à disposição do filho mais necessitado. Naquela mesma noite, Prazeres Barbosa voltou para a casa onde passou boa parte da infância. Lá mesmo, aconteceu a sua lua de mel. Um episódio decepcionante. Antonio foi o primeiro namorado de Prazeres. A relação mantida durante os cinco anos de namoro não havia extrapolado nenhum limite. Prazeres casou aos 25 anos, virgem e sem saber o que iria encontrar 113


Prazer em Conhecer na noite de núpcias. “Eu não sabia a que ia e quando me deparei com a situação, quase morri. Foi um verdadeiro trauma na minha vida. Isso fez com que o meu casamento não perdurasse. Eu nunca tinha visto um homem nu, nem em revista, porque não tínhamos curiosidade e nem acesso a isso”, explica. A educação pudica e tradicional que recebeu na infância traçou alguns aspectos da personalidade de Prazeres, que refletiram em suas relações. Ela não costuma se tocar nem para fazer o exame de mamas. Nunca vai ao médico sozinha e treme sob a maca quando precisa ser examinada. “Essa história de que as mulheres se masturbam, eu nunca fiz isso. Nunca me toquei. Na verdade eu não quero me fazer de ingênua nesse campo, eu sou”, confidencia. A experiência constrangedora da noite de núpcias aliada a fatores como a ausência de harmonia no relacionamento e à disparidade de personalidades fizeram com que o casamento não decolasse. Faltava à convivência as características que contribuem para a permanência de um casal. Mesmo assim, continuaram juntos até 1981. Os anos em que dividiram o mesmo teto, porém, foram marcados por várias crises. Prazeres trabalhava o dia inteiro e sempre foi mantenedora da própria casa. Antonio era funcionário de uma loja de móveis no centro de Caruaru. O salário que ganhava servia apenas para alimentar os próprios vícios. Em casa, dizia sempre que o patrão não havia pago a sua remuneração e costumava esconder o dinheiro na meia. Quando ia lavar a roupa suja, Prazeres encontrava. Antonio tornou-se alcoólatra e Prazeres, que não costumava ingerir nenhuma bebida alcoólica, sentia-se incomodada com o comportamento do marido. Desde cedo, ela aprendeu a se virar sozinha em casa. O exemplo deixado pela mãe, ainda na infância, fez com que ela aprendesse a superar o fato dúbio e incomum de ser casada e ao mesmo tempo não poder contar com o marido para garantir o próprio sustento. Dona Antonina criou os filhos praticamente sozinha. Assim que a família foi morar na cidade, o pai, Antonio Inácio, quis se desfazer dos poucos objetos que tinham em casa. Vendeu a mesa em que a mulher e as filhas cortavam tecidos, em se114


Capítulo 6 - Amores e poesia guida dona Antonina comprou de volta. Depois, vendeu o rádio onde as mulheres ouviam as novelas, diariamente, enquanto costuravam. O comprador foi o vizinho, dono da mercearia, que devolveu o objeto a dona Antonia e permitiu que ela pagasse o valor em prestações. Na época em que moravam na Rua Martin Afonso, o pai quis vender a única garantia que a família possuía: a própria casa. Seu Antonio chegou com um comprador e o episódio terminou em separação. - Antonina, vendi a casa. - Mas o que?, reagiu a mãe. - Vendi a casa. - Olha Antonio, você fez de tudo e eu não disse nada. Mas eu tenho uma ‘fieira’ de gente, como é que você vai vender a minha casa? - Ele já vendeu, disse o comprador. - Tá “desvendida”, determinou dona Antonina. Essa foi a primeira de uma série de separações. Dona Antonina tinha em mente que o casamento devia durar até que a morte separasse o casal e motivos fúteis não deviam pôr fim a relações matrimoniais. Ela sempre procurava maneiras de amenizar as situações. No dia em que seu Antonio Inácio disse que ia embora de casa, ela sofreu muito com a situação. Bernardo chorou copiosamente e pediu que o pai não os abandonasse. A mulher disse que a mesma porta pela qual ele estava saindo, estaria aberta no dia em que quisesse retornar. Maria das Mercês diz que ela e os irmãos nunca presenciaram brigas entre os pais. “Meu pai era um homem conquistador. Não foi pela vontade de minha mãe (que ele saiu de casa), mas pela vida boêmia que levava. Minha mãe soube suportar. Até a hora de morrer, ela deu lição de vida para nós. Meu pai, apesar de ser boêmio, não era violento. Ele era insensível às situações. Os pais, naquela época, eram mais rígidos. Bastava que olhassem e sabíamos que estavam nos repreendendo. Ele não era grosseiro, mas minha mãe sofria e nós sofríamos juntos”, conta. Na época em que Prazeres e Antonio se casaram, as casas populares das Cohabs I e II, em Caruaru, começaram a ser vendidas. Como queria conquistar o direito da moradia própria, Prazeres passou três dias e três 115


Prazer em Conhecer noites enfrentando uma fila enorme de pessoas. Alguns levavam tamboretes, outros se deitavam no chão, como ocorrem em filas do INSS. Enquanto ela suportava o frio, o marido ficava em casa dormindo. Ela conseguiu a casa, mas de nada adiantou o esforço. Na tentativa de agradar ao marido, cedeu o espaço para os pais dele, que não tinham casa própria. “Eu fiz tudo para viver com ele”, diz Prazeres, que chegou a vender o primeiro carro que conquistou porque o marido se sentia enciumado. O fusquinha cinza azulado, carro super popular à época, foi comprado com muito esforço e antes de ser vendido, fez a sua dona derramar algumas lágrimas. Prazeres aprendeu a dirigir com Elias Teodoro, o pastor da Igreja Batista que realizou o seu casamento. Naquela época, o pouco que ganhava não possibilitava ir a uma auto-escola. A hipótese de aprender a dirigir com familiares ela também dispensava. “Parente não ensina, ele briga com você e lhe critica, principalmente se for marido”, revela. Em 1977, Prazeres estava prestes a concluir o curso de Letras e trabalhava como coordenadora do Colégio Sete de Setembro. Sua graduação havia sido custeada pelo crédito educativo (atual Fies), que oportuniza ao estudante a formação superior financiada pelo Governo Federal. Somente dois anos após a conclusão do curso, o aluno começa a devolver o valor de forma parcelada. Como trabalhava desde cedo, Prazeres passou todo o período de estudos juntando o dinheiro que recebia. No final, percebeu que a reserva dava para adquirir um transporte. Quando comprou o primeiro carro, embora já soubesse dirigir, ela não tinha confiança para sair com ele. Na casa da Praça Coronel Porto, havia um enorme quintal com muitas árvores frutíferas. Algumas pessoas utilizavam o espaço como estacionamento e pagavam uma quantia à família. Só havia, no entanto, um espaço coberto e era lá que Prazeres guardava o fusquinha. Numa certa manhã, ela saiu para trabalhar. Preferiu ir a pé, pois tinha medo de sofrer algum acidente. Prazeres estava na secretaria da escola quando foi surpreendida pela professora Maria Eunice Tabosa. Dide, como era conhecida, foi uma das pessoas que guardavam os seus veículos 116


Capítulo 6 - Amores e poesia na casa da família Barbosa. Entristecida com o que havia terminado de ver, ela contou para a amiga. - Mas Prazeres, eu fiquei tão triste, tu acredita? O telhado da garagem da tua casa caiu, mas graças a Deus que só tinha um carro lá. - Como é Dide? - Caiu agora de manhã e foi a maior “zuada”. - Que cor era o carro que estava lá?, perguntou Prazeres. - Era um fusquinha, respondeu Dide. Prazeres chorou muito e explicou para a amiga que aquele era o seu carro. O fusquinha cinza azulado que ela não costumava dirigir para não bater e que agora estava totalmente comprometido. Rapidamente, chamaram o professor Rubem de Lima Barros, diretor do educandário. Explicaram o que havia acontecido para ele e, em seguida, foi com Dide e Prazeres até o local. Dona Antonina os recebeu desesperada. O pastor Elias também estava lá. O professor Rubem mandou então que Prazeres se acalmasse e se propôs a pagar o conserto e depois descontar parceladamente de seu salário. Assim que recebeu o carro pronto, Prazeres passou a dirigir todos os dias. Para qualquer lugar que fosse, ia sempre acompanhada de seu fusquinha. A alegria durou pouco. Percebendo que o marido sentia-se mal com o fato de o carro ser uma conquista da mulher, ela foi ao centro da cidade e o vendeu. Ao chegar em casa, comentou a decisão que havia tomado. -Pronto, se o problema da gente era o carro, ele não existe mais. - Você vendeu?, indagou Antonio. - Vendi. Eu só quero que a gente viva bem. Nem mesmo o fato de abrir mão de um dos poucos bens de valor que possuía fez com que Prazeres evitasse a frieza da relação conjugal. Restava apenas uma última cartada e ela não hesitou. O nascimento de um filho poderia mudar de vez aquela situação e Prazeres se deixou engravidar. Foi com o marido a um hospital, passaram por uma série de exames para atestar a boa saúde de ambos. Logo depois, ela interrompeu o anticoncepcional. Prazeres queria e sabia que a partir daquele momento corria o risco de engravidar a qualquer momento. Quando a notícia foi confirmada, ela 117


Prazer em Conhecer passou por um dos momentos de maior desespero enfrentados ao longo da vida. “Nós mulheres só acreditamos que estamos grávidas quando estamos com um exame nas mãos. Quando eu recebi o resultado me deu um desespero enorme, não pelo filho, mas pelo medo de o menino nascer. Cheguei em casa chorando e minha mãe dizia que todas as pessoas nasceram de alguém e que ninguém surgiu de um pipoco”, conta Prazeres. À medida que a barriga crescia, ela começou a aceitar a ideia de ser mãe. Dr. João Farias, o médico responsável pelo parto, costumava dizer que sua paciente deveria se chamar Maria das Dores e não Maria dos Prazeres. Numa das consultas de pré-natal, o médico disse que apesar de ser pequena, ela teria chances de conceber a criança através de parto normal. Mas, se isso não fosse possível, a submeteria a uma cesariana. Como insistia em não sentir dores, Prazeres acabou fechando um acordo com o médico. Antes de completar os nove meses, ela iria ao hospital onde ele estaria de plantão. Lá, fingiria estar sentindo fortes dores e seria preparada para o procedimento cirúrgico. Foi exatamente isso que aconteceu. No dia 1º de junho de 1978, às 10h15min, Prazeres, que durante a gravidez chegou a pesar 60 quilos, deu à luz o pequeno Vergílio Barbosa de Melo. A criança nasceu com 3,75 quilos e medindo 45 centímetros. O parto aconteceu no Hospital Jesus Nazareno (Fusam), em Caruaru. “Não tive leite para amamentar, coisa que se houvesse estímulo não teria acontecido, mas ninguém me orientou para isso”, recorda. Todo o período em que passou no hospital, quatro ou cinco dias, Prazeres não deu uma palavra. “Para não pegar gases”, justifica. As enfermeiras pensavam que ela era muda, pois se comunicava através de gestos. Somente no dia em que recebeu alta, ela decidiu falar. Ao perceber que a paciente conversava com o médico, uma das enfermeiras questionou: “ah, ela fala?”. “Por quê?”, disse o médico. “Porque até hoje essa mulher não deu uma palavra aqui”, continuou. “É que Dr. João disse que pegava gases”, resmungou Prazeres, provocando risos. A nova mãe retornou para casa com motivos de sobra para acreditar que as coisas finalmente iriam mudar. Nessa época, Prazeres e Antonio frequentavam a igreja evangélica e apresentaram o filho em um culto 118


Capítulo 6 - Amores e poesia dominical. Nos primeiros meses, a dedicação era total. Prazeres passava os dias cuidando de Vergílio. Quando voltou a trabalhar, contava com o apoio da mãe e da irmã, Maria das Neves, para auxiliar na criação dele. Vergílio foi uma criança diferente das demais e, desde cedo, precisou lidar com a ausência da mãe professora e, anos mais tarde, atriz. “É muito difícil para uma criança ter a dimensão exata do que é ter uma mãe atriz, uma vez que eu nem entendia ao certo o que era ser artista. Contudo, não me custou muito perceber a presença de uma professora em casa! As demandas de sucesso acadêmico eram implacáveis e eu as cumpria à risca. Talvez a minha única percepção de ter tido uma mãe atriz na infância tenha sido a ausência dela, devido às viagens”, lembra. O jovem explica ter a consciência de que a qualquer momento teria que passar uns dias na casa da avó ou tias. “Eu sempre fazia xixi na cama delas”, diz. “Enquanto os meus colegas queriam saber onde estava a bola, eu queria saber quem era, de onde vim e para onde iria. Gostava de sentar à mesa com a minha avó, mãe e tias para tomarmos chá e recusar todos os tipos de biscoitos ofertados pela minha avó. Gostava do mundo dos adultos”, acrescenta. O menino seguiu os passos da mãe. Aos 18 anos, viajou para o Canadá e especializou-se na língua inglesa. Hoje, é professor do idioma universal. Também é um exímio e talentoso pianista. Ele não descarta a possibilidade de haver sido influenciado pela mãe ao abraçar a profissão. “Passei quase toda a minha adolescência tentando achar em mim o que era diferente dela. Até me enganei, achando que éramos o oposto um do outro. Hoje, não só vejo que sou ela de calças, mas também que metade dela sou eu. Nossas atitudes, valores morais, posicionamentos, são mesclados. Temos uma relação de parceria. Nunca fomos muito carinhosos, pois eu sempre fui muito frio e seco nas relações. Trocamos muito e confiamos na opinião um do outro. Somos mais amigos do que parentes. Isso é perfeito!”, acredita. Prazeres diz que gostaria de ter sido mais presente, entretanto, sua ausência era algo extremamente necessário. “Sempre fui mantenedora da casa e precisava trabalhar os três expedientes. As dificuldades vividas fizeram do meu filho o ‘brilhante’ que toda mulher gostaria de ter. Sou realizadíssima 119


Prazer em Conhecer como mãe e ele diz que sou a mãe que ele queria ter. Somos amigos, companheiros e acima de tudo, confidentes e cúmplices”, comenta a mãe. Embora o filho tenha trazido muitas alegrias para o lar do casal Antonio e Prazeres, não foi suficiente para reverter a instabilidade da relação. Aos três anos e meio, o pequeno Vergílio viu o seu pai abandonar a família e o lar. Prazeres fez tudo o que era possível a uma mulher para que o casamento desse certo. Nada disso, porém, foi suficiente. “Eu disse para ele: o que você quer que eu faça para que o casamento da gente não acabe? E ele me disse: não, você não precisa fazer mais nada. Mas não dá mais certo”, recorda Prazeres. O fim do casamento abalou profundamente a jovem mãe solteira. Uma atmosfera sombria de reclusão, tristeza e decepção se instalou em sua mente. Nessas horas, as consequências da perda parecem muito mais psicológicas do que reais e as mudanças de comportamento foram percebidas por seus alunos. Na época, ela ensinava também no turno da noite e acabava se tornando confidente dos estudantes. Um deles, Genilson, notou que algo estava errado. - Dona Prazeres, a senhora tá bem? - Estou, por quê? - É que a senhora não tá dizendo coisa com coisa. - Eu não acredito! - É. - Foi bom você ter me avisado, eu realmente estou passando por uma fase danada. A partir desse episódio, ela percebeu que precisava de ajuda. Acompanhada pela mãe, procurou ajuda médica. A recomendação feita pelo Dr. Luiz Carlos, a dona Antonina, foi decisiva: “ou a senhora junta esse casal ou separe, porque sua filha vai ficar doente”. Em seguida, ela procurou Antonio e ouviu algumas justificativas acerca da separação. “A sua filha é perfeita, mas eu não gosto mais dela. Ela quer ser a mulher mais limpa do mundo e eu não aguento”, disse ele. “Então fique tranquilo que eu vou separar vocês dois”, prometeu a mãe. Atendendo a recomendação do psiquiatra, Prazeres foi levada a um 120


Capítulo 6 - Amores e poesia lugar distante de toda aquela agitação. Junto com a mãe, passou um mês numa casa que pertencia ao irmão, Bernardo Barbosa, na praia de Maragogi, litoral pernambucano. Enquanto tomava a medicação, Prazeres que sempre foi muito habilidosa com trabalhos manuais começou a fazer artesanato com conchas e seixos do mar. Lá, manteve contato com umas freiras que a ensinaram a produzir diversas peças artesanais. Todos os dias andava com dona Antonina pela areia do mar, apanhando as conchas e levando para casa. Passado aquele período de recuperação, elas voltaram a Caruaru. Imediatamente, Prazeres procurou o marido. - Já vai começar o sermão?, perguntou Antonio. - Não, o sermão só tem dez minutos e eu resolvo, disse Prazeres. - Hoje é oito de setembro (de 1981). Eu pedi para você me amar e você não me amou; pedi para me matar e não matou; pedi para me querer e você não me quis... Então, eu estou saindo. A casa é de mamãe, você sabe. Enquanto você se organiza, fique aí. Depois entregue a chave para ela. Os dois se despediram, Prazeres deu as costas e foi embora com o filho. Nesse período eles moravam na casa da Rua Martin Afonso e ela voltou a viver com a mãe, na casa nº 390, da Rua Imperatriz Leopoldina, no bairro Indianópolis. Antonio quis tirar os pais da casa que Prazeres havia conseguido na Cohab II, mas ela não permitiu. “Você deixou de ser meu marido, mas seu pai e sua mãe não deixaram de ser meus sogros. Os dois só saem de lá mortos”, afirmou. Antonio passou alguns meses ocupando a casa da família Barbosa no bairro São Francisco. No dia 31 de dezembro de 1981, três meses após a separação, ele ligou para a esposa dizendo que precisava conversar com ela. Dona Antonina, porém, não permitiu que ela fosse até lá. Prazeres então mandou que ele viesse à sua casa. Quando chegou, foi direto ao assunto. Comunicou que estava desocupando o imóvel e queria o divórcio. A mulher quis dividir os poucos bens que tinha, mas ele não fez questão de nada, pois reconhecia a pouca – ou nenhuma - colaboração. Pouco tempo antes da separação, Prazeres ganhara do irmão Bernardo um terreno na Rua Barreiros, no bairro Caiucá. Quando voltou da 121


Prazer em Conhecer praia, onde passou um mês se recuperando, ela expôs na Casa de Cultura José Condé os artesanatos que havia fabricado. Com os vinte e três cruzeiros que recebeu, deu início às obras de construção de sua nova casa. As pessoas mais próximas zombavam dela, afinal, era um ínfimo dinheiro. Esperta, ela fez o alicerce. Do seu salário de professora, restava o suficiente para pagar dois dias ao pedreiro. Seu Chico, o profissional contratado por ela, trabalhava dois sábados por mês em sua casa. Prazeres ainda auxiliava o pedreiro na construção. Passou dois anos para que as obras fossem concluídas. O marido, que ainda estava com ela nessa época, nunca foi sequer checar como era o terreno. Com muito sacrifício e contando com a ajuda e doações de amigos mais próximos, terminou a casa. Seis meses após a separação, decidiu morar sozinha com o filho. Ainda abalada, ela chorava muito e aquela situação preocupava dona Antonina, que não queria ver a filha ir embora. Com um berço comprado de segunda mão e o filho pequeno, Prazeres foi morar na casa onde viveu até a mudança para o Rio de Janeiro, em 2007. Somente algum tempo depois ela descobriu o real motivo da separação. Antonio tinha outra pessoa e foi morar com ela. “Eu casei com um homem que ninguém apostava nele. Mas casei por amor e acho que ele também. O tempo foi passando e eu dentro da minha pureza, acho que isso não agrada aos homens. Eu não era uma mulher como os homens querem que sejamos. Ele bebia, fumava, gostava de jogos de azar. Enquanto eu vislumbrava o mundo lá na frente, ele não vislumbrava nada”, resume Prazeres. A atriz conta que essa foi a grande disparidade. “Eu fiz tudo que era possível uma mulher fazer para viver, mas ele foi se afastando, se desgostando de mim. Achava que o mundo se desmoronaria se eu viesse a me separar e quase enlouqueci, porque casei por amor. A gente ama várias vezes, eu tenho experiência. Ama-se várias vezes e ama-se intensamente. Eu o amava tanto que quando pensava nele, estremecia o coração. Era um amor incontrolável e eu pedi a Deus que tirasse esse sentimento de mim”, acrescenta. Com a morte dos sogros, Prazeres vendeu a casa da Cohab. Ela acreditava que Vergílio seria médico e o espaço serviria como clínica no futuro. Mas a vida lhe mostrou outros rumos e, com o dinheiro da venda, 122


Capítulo 6 - Amores e poesia adquiriu um piano para o filho, além de construir um quarto na parte superior da casa, para que ele tivesse o seu próprio espaço no lar. Além das crises na vida conjugal, Prazeres lidou com um desgaste em sua relação com a Igreja. Detentora de uma personalidade forte, ela é do tipo que não costuma levar desaforo para casa. Tudo o que não lhe agradava, era dito aos líderes da congregação. A relação com o pastor era de confidentes (tal qual a de um católico que se confessa com um padre, porém com algumas diferenças). Prazeres dividiu com ele o momento ruim que passava no casamento. Num culto dominical, ela chegou à Igreja e recebeu um bilhete de um dos membros, aconselhando-a a ter paciência e afirmando que estaria orando por ela. Aquilo a irritou profundamente. “Ora, eu não falei com o irmão, mas ele sabia do fato. Peguei o bilhetinho, fui lá e mostrei ao pastor. Disse que ele havia me traído e que não voltaria mais para lá”, conta. Recém separada e sem esperanças, ela decidiu declarar guerra aos homens e fazer o que sempre quis: enveredar pelo teatro. O início reservou para Prazeres o preconceito de familiares e amigos. Precisou lidar também com as críticas de seus companheiros de religião, que a acusavam de haver se “extraviado” e se entregue ao demônio. A Igreja não aceitava o fato de ela fazer teatro fora do âmbito religioso e começou a escanteá-la de suas programações. Por outro lado, o contato com o movimento teatral ajudou a projetá-la nacionalmente. No grupo do Sesc, Prazeres teve ainda a felicidade de encontrar um novo amor. José Francisco de Freitas Torres começou a fazer teatro em 1979, na Escola Nossa Senhora de Fátima, em Caruaru e tinha como colega o jovem Severino Florêncio, que no ano seguinte criou o Grupo de Teatro do Sesc. Em 1981, Severino o convidou para integrar a equipe, estreando no ano seguinte o espetáculo Hoje a Banda Não Sai. Magra, com cabelos curtos e aspecto triste, pouco tempo depois Prazeres passou a fazer parte do grupo. Interessada em desbravar na profissão, acompanhava-os em todas as apresentações que faziam. Francisco sempre brincava, dizendo que ela acabaria interpretando o delegado, devido à quantidade de vezes em que assistiu à peça. Assim 123


Prazer em Conhecer como a colega de teatro, ele estava com o seu casamento fracassado (embora continuasse vivendo sob o mesmo teto que a esposa). Os encontros nas oficinas e durante as apresentações permitiram que os dois se envolvessem. No início, Prazeres hesitou. Já repudiada por estar fazendo teatro, temia o que as pessoas iriam comentar a seu respeito se soubessem que ela havia se envolvido com um homem casado. O relacionamento causou forte impacto no seio da família Barbosa, que não aceitava a relação. Prazeres, até então, era o supra-sumo da honestidade e isso a unia ainda mais a dona Antonina, que sempre fora uma mulher de integridade intocável. Os irmãos também ficaram chocados com a notícia. No lar de Francisco, a situação não fora diferente. Afinal, sua esposa estava grávida e não se conformava com a separação. Mais uma vez, o coração falou mais alto e Prazeres decidiu dar uma chance a si própria. O romance foi importante para que ela voltasse a acreditar no amor. “É uma coisa inexplicável. Não houve aquele impulso de querer namorá-la. As coisas começaram a acontecer pela beleza interior que ela jogava para fora, pela simplicidade dela, porque eu sempre fui uma pessoa simples e tímida. Então, começamos a ser amigos sem nenhuma intenção e as coisas foram acontecendo”, comenta Francisco, que é funcionário aposentado pela Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa). Se até então Prazeres ainda podia contar com a amizade de algumas pessoas, após a notícia de que namorava um homem casado todos se afastaram definitivamente dela. A relação também anulou os laços com a família, que desaprovava o seu romance. Nesse período, Francisco era aluno da graduação em História, pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru. Socorro Barbosa fazia parte do corpo docente da instituição e isso gerava certo desconforto. A separação provocou um grande trauma na família de Francisco. Ciumenta, desde a entrada dele no grupo do Sesc, a esposa (que não simpatizava com teatro) o acusava de sair de casa para “arranjar outras mulheres”. Grávida da terceira filha, ela soube que o marido havia engatado um novo romance. Prazeres e Francisco passaram a andar juntos e aos poucos a relação foi se tornando de conhecimento público. 124


Capítulo 6 - Amores e poesia “O meu casamento estava totalmente desgastado e eu não estava no teatro e nem no mundo atrás de mulheres. Estava fazendo algo que gostava e as coisas começaram a acontecer. Fomos ficando cada vez mais íntimos e essa amizade foi tão bonita que se transformou num relacionamento de marido e mulher. Começamos a ver o mundo de outra forma. Eu tinha três filhos, uma que estava acabando de nascer. Nós vivíamos uma vida de tormentos. Quando ia para o teatro me sentia inteiro e, nessa verdade, começou a surgir um amor”, revela Francisco. Prazeres também se preocupava com o filho. Vergílio tinha apenas cinco anos quando conheceu Francisco e ela temia o que a criança iria pensar daquilo tudo depois que crescesse. Temendo que outros fizessem intriga com os alunos que participavam do teatro, abriu o jogo com todos eles. “As pessoas vão dizer que eu estou namorando um homem casado e que sou uma puta, pois eu estou mesmo. Mas Francisco não está mais vivendo junto com a mulher dele e se alguém vier fofocar, digam que vocês já sabem”, alertava a professora. Em 26 de fevereiro de 1984, o casal selou a união numa lua de mel na praia de Porto de Galinhas (PE). A partir dali, passaram a ser marido e mulher (sem, no entanto, se casarem oficialmente). Francisco permaneceu morando em casa com a esposa e os filhos por um longo tempo. Com exceção do período em que estão vivendo no Rio de Janeiro, Prazeres e Francisco nunca dividiram o mesmo lar. Em Caruaru, passavam o dia juntos, mas dormiam em casas separadas. “Ele via isso com a maior naturalidade. Eu pagava minhas contas e ele as dele”, explica Prazeres. A atriz sempre quis ter o seu próprio lugar. Em casa, o comando é dela e “na casa dos outros eu não podia fazer isso”, conta. Para que Francisco finalmente se desvinculasse da esposa, ela o ajudou a construir uma casa no bairro das Rendeiras, em Caruaru. O imóvel pertence aos dois, mas sempre serviu de moradia para ele. Atualmente, a residência é ocupada, temporariamente, pela filha caçula de Francisco. “Não vivíamos na mesma casa, mas não éramos separados. Uma vida a dois em todos os sentidos. Essa foi uma fase que passou, agora estamos vivendo uma nova vida”, ressalta Francisco. 125


Prazer em Conhecer O casal atuou junto em todos os espetáculos promovidos pelo Grupo do Sesc. Com exceção de Avatar, em que ele participou da equipe técnica, e dos espetáculos montados no Recife (A Feira e NegroRei), a parceria entre os dois durou até a última peça estrelada pela atriz, Whisk pra Guiomar. Fizeram também alguns filmes juntos. O convívio maior foi, sem dúvidas, nas atividades desenvolvidas pela Companhia Prazeres Barbosa, coordenada por ele e supervisionada por ela. Da convivência de vinte e cinco anos, ele fala com propriedade sobre a personalidade da mulher. “A querida é uma pessoa muito determinada e algumas vezes eu digo para ela ter um pouquinho de calma porque ela é imediatista. Prazeres é muito elétrica e muitas vezes nós erramos por causa dessa vontade de querer que as coisas aconteçam rápido demais. Se ela tiver algo para fazer agora, não deixa para fazer mais tarde. É uma pessoa que não fica parada. Em casa, às vezes eu digo: ‘minha filha, pelo amor de Deus, pare! ’. Quando para um pouco pra ver televisão ou descansar, ela reclama que está roubando o próprio tempo”, confessa. Francisco Torres, que é separado judicialmente, assim como Prazeres, diz que já pensou em casar com a mulher, embora seja adepto do conceito de que casamento é apenas sinônimo de boa convivência. Assume que é ciumento, mas ressalta que a confiança é um dos ingredientes mais importantes para o longo relacionamento. “Quem disser que não tem ciúme está faltando com a verdade”, define. O ator garante ainda que o sucesso de Prazeres nunca o incomodou. A convivência entre ambos, todavia, não foi pacífica o tempo inteiro. Como ocorre com a maioria absoluta dos casais, Prazeres e Francisco enfrentaram várias crises ao longo dos anos de relacionamento. Algumas, entretanto, resultaram em dolorosa separação. Prazeres sempre foi independente e garantiu o sustento da própria casa. Era assim na época em que se casou e permanece durante os anos em que vive com Francisco. No início dos anos 2000, preocupada com o avançar da idade, ela sugeriu que Francisco pagasse o seu plano de saúde, mas ele se recusou. Alguns anos depois, quando decidiu criar o próprio teatro para servir como sede de sua Companhia, ela o convidou para tornar-se parceiro na 126


Capítulo 6 - Amores e poesia concretização de mais um sonho, “mas ele não aceitou e eu fiquei muito decepcionada com isso”, revela. A partir daí, as coisas começaram a mudar. Embora continuassem juntos, as afinidades já não eram mais as mesmas. Prazeres começou a se desgostar e o chamou para conversar. Explicou que as coisas não estavam corretas daquela maneira, mas o esforço pouco adiantou. “Essas coisas muito me machucaram, o fato de as pessoas não me assumirem, não compartilharem do ‘ter’ comigo. Parece que tenho um estigma em relação a isso, talvez porque eu gosto de ser independente, de comandar. E se você está pagando, o comando é seu. A ficha começou a cair, a coisa foi ficando monótona e eu dicidi virar o jogo”, conta. Em 2005, Prazeres foi selecionada para participar da microssérie A Pedra do Reino e passou três meses fora de casa. A distância separou ainda mais os dois. Quando retornou a Caruaru, passou pouco tempo e foi convidada para participar da novela Duas Caras. A mudança para o Rio de Janeiro pôs um ponto final (ou quase) na relação com Francisco. “Você não se sente gente quando o outro não compartilha aquilo que é tão bobo. Mas eu demorei muito para sentir isso, porque quando amo é com muita intensidade. E quando amamos com intensidade, ficamos cegas. Foi quando decidi dar um basta”, comenta. A chegada à Globo mudou radicalmente a vida da atriz, sobretudo no campo emocional. Como as relações acabam ou clamam renovação, faltava-lhe naquele momento um novo amor e a vida tratou de lhe proporcionar. Ela, porém, não fez nenhum sacrifício para que as coisas acontecessem. A grande responsável pelo novo romance foi uma ferramenta moderna, da qual a atriz é fã e utiliza diariamente: a Internet. Aos 58 anos, Prazeres Barbosa viu uma louca paixão ‘virtual’ materializar-se no mundo real, das emoções e do amor. O relacionamento representaria um vendaval, um mar de polêmicas.

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Prazer em Conhecer

REI MORTO, REI POSTO: RÉVEILLON EM COPACABANA

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e porte médio, cabelos pretos, lisos, moreno, com um sorriso permanente, mas sutil; o jovem Chrystian de Arruda Silva tinha 26 anos, em outubro de 2007, quando se preparava para passar o carnaval do ano seguinte na cidade de Salvador (BA). A essa altura, já havia providenciado passagens e abadá para desfilar no bloco da cantora Cláudia Leitte. Contente ao ver uma conterrânea estrear numa novela das oito, produzida pela Rede Globo, o rapaz encontrou o perfil da atriz no site de relacionamentos Orkut e em seguida enviou-lhe uma mensagem, parabenizando-a pela atuação em Duas Caras. Atenciosa, Prazeres faz questão de responder a todas as mensagens que recebe e com Chrystian não foi diferente. A resposta continha um agradecimento e a afirmação de que sentia saudades de sua terra. O rapaz teve então a ideia de lhe enviar um vídeo do cantor de forró Flávio José, a fim de que ela pudesse “matar” um pouco a saudade. “Até então, eu não tinha nenhum interesse, estava apenas seguindo o modismo da galera (de estar enviando recados). Então ela respondeu novamente dizendo que eu estava intimado a ficar enviando notícias de sua terra para ela”, conta Chrystian. O rapaz chegou a pedir o endereço de e-mail da atriz e o seu contato no MSN (ferramenta de bate-papo). Prazeres explicou que não costumava utilizar o recurso, mas no dia em que ela estivesse online, os dois conversariam. Outro dia, acabaram acessando o programa no mesmo horário e conversaram rapidamente. Adiante, as conversas começaram a ser constantes e os dois passavam longas horas na frente do computador. “A coisa foi tomando um embalo, começou uma empolgação minha e dela, a ponto de nos acostumarmos a ficar conversando”, revela Chrystian. “Muitas vezes eu chegava tarde em casa, da faculdade, e ela estava me esperando. Já passamos mais de cinco horas teclando pela Internet. Éramos dois adolescentes. O domingo era nosso no Skype (programa que permite aos usuários conversar em tempo real, com recursos de áudio e imagem). Mas ela saía para os lugares que queria, eu também. Nunca fica128


Capítulo 6 - Amores e poesia mos um no pé do outro. Combinamos para viver o hoje sem nos preocuparmos com o amanhã”, complementa. Os contatos mantidos pelo celular fizeram com que o rapaz mudasse totalmente os seus planos. Com passagem comprada para Salvador, decidiu cancelar o vôo e agendar um novo, desta vez para o Rio de Janeiro. “Eu até brinquei com ela e disse que deixei de ver a Cláudia Leitte para vêla. Nesse período ficamos nos comunicando e ela precisava resolver os seus problemas pessoais para podermos ficar juntos”, conta Chrystian. Como se aproximava o período natalino, ele começou a pensar no presente que iria mandar para a mais nova “amiga”. A distância fez com que o rapaz tivesse a ideia de criar algo que agradasse e ao mesmo tempo não fosse necessário transportar de um Estado para outro. Mais uma vez, a Internet foi a solução. Chrystian elaborou um arrojado projeto para a construção de um blog em homenagem a Prazeres, o apresentou e afirmou que caso ela autorizasse, ele publicaria. A atriz aprovou de imediato. “Ela disse que estava perfeito e que ficaria fornecendo para mim o material. No dia que eu quisesse acabar, poderia, sem problemas. Mas que estava adorando, porque ninguém havia feito algo do tipo para ela”, destaca. Nessa fase, a Cultura Inglesa de Caruaru promoveu uma homenagem a Prazeres Barbosa em sua sede. Reuniram parte do acervo da atriz em uma exposição aberta para visitação ao público. Chrystian compareceu ao evento. Fotografou tudo para que ela pudesse conferir em seguida. Até então, ele jamais havia assistido a uma peça de Prazeres, e sabia pouco a respeito da carreira profissional dela. No início dos anos 2000, o jovem trabalhava num shopping em Caruaru e costumava vê-la transitar pelo local. Nessa época, a atriz já chamava a atenção do rapaz. As colegas de trabalho o alertavam quando ela chegava ao centro de compras: “olha a baixinha ali, passando”. Imediatamente, ele corria para vê-la. “Eu já olhava para ela há algum tempo, mas não nos conhecíamos”, diz. No período em que se comunicavam pela Internet, Prazeres e Chrystian usavam a webcam para se ver. A oportunidade de se conhecerem 129


Prazer em Conhecer pessoalmente aconteceu em fevereiro de 2008, quando ele trocou o carnaval baiano por dias mais sossegados na Barra da Tijuca (RJ). “Falamo-nos muitas vezes e as nossas conversas eram muito soltas, porque as pessoas se inibem ao conversar com ela e eu nunca tive esse problema. Talvez eu fosse uma companhia, mesmo distante, que fazia bem para ela”, acredita. A nova paixão serviu para aflorar ainda mais um lado pouco conhecido de Prazeres Barbosa: o seu amor pela poesia. Os escritos introspectivos retratam cada momento vivido por ela. A maioria de seus poemas fala de amor, “porque eu sempre fui uma pessoa inteira no amor, sempre vivi meus momentos intensamente”, explica Prazeres. Embora entenda pouco de música, acabou solfejando algumas notas. Compunha também na época em que era professora, mas quase nada ficou registrado. Em 2003, quando montou A Feira, Prazeres compôs a canção Os Prazeres de Caruaru, gravada depois pelo cantor Israel Filho, que alterou a letra, passando a dividir a autoria da canção com a atriz. Mas, ela gosta mesmo de fazer paródias. Uma de suas preferidas foi elaborada com base na letra da música Aconchego. Contudo, a sua inspiração é mesmo para o lado poético. “Tenho poesias que dá para publicar um livro”, revela. De fato, na década de 1990 ela selecionou os seus escritos favoritos para publicá-los. O título chegou inclusive a ser definido. Prazeres comentou em entrevistas que pensava em publicar Essência, o seu primeiro livro de poesias. Por coincidência, publicaram um livro com o mesmo título em Caruaru. O projeto está arquivado e ela pensa em resgatá-lo algum dia. A forma inusitada como iniciou o romance com Chrystian inspirou um poema. O texto fala sobre a influência que a Internet exerce na vida das pessoas e expressa a opinião de sua autora sobre a possibilidade de acontecer algo mais além da tela de um computador. À medida que os dias se passavam, os dois foram se aproximando ainda mais, a ponto de decidirem passar o carnaval carioca juntos. Prazeres ainda não havia comunicado a Francisco que estava apaixonada por outro homem. Percebendo a determinação dela em querer pôr fim à relação “estável” com Francisco Torres, Chrystian agendou o vôo. Em dezembro de 130


Capítulo 6 - Amores e poesia 2007, dois meses antes de ele embarcar, Prazeres recebeu uma visita inesperada. Na tentativa de reverter aquela situação, Francisco foi ao Rio de Janeiro. Mas ela estava decidida e abriu o jogo. “Foi uma tragédia e eu não abri mão. Nós chorávamos muito, mas eu disse que estava apaixonada por um rapaz e que havia terminado tudo entre a gente”, diz. Prazeres contava os dias para que chegasse o momento de encontrar Chrystian pela primeira vez. No carnaval do ano seguinte, ele foi ao encontro dela. A viagem representou uma verdadeira maratona. O vôo estava marcado para as cinco e meia da manhã e, para chegar a tempo, o rapaz foi um dia antes para Recife. Chegou às vinte e uma horas e passou a noite inteira no aeroporto esperando o momento do vôo. A ansiedade aumentava a cada minuto. Chrystian chegou ao Rio de Janeiro por volta das dez horas do dia seguinte. No saguão do aeroporto do Galeão, Prazeres Barbosa o esperava, vestida de azul, com uma faixa da mesma cor na cabeça. “Foi um momento ímpar. O sorriso dela, os olhos dela brilhavam, eu nunca tinha visto uma pessoa com aquela reação para mim. Foi recíproco também, porque quando eu a vi percebi que era exatamente do jeito que eu imaginava. Ela estava muito cheirosa. Parecia que nos conhecíamos há séculos, foi uma sintonia incrível, fora do comum”, define. Nessa fase, Prazeres estava morando na Barra da Tijuca, num apartamento cedido pela Globo. Lá, passaram juntos quinze dias. “O carnaval foi maravilhoso, era uma novidade para mim. Tudo era um encanto porque o Rio de Janeiro é um encanto na verdade. E eu estava com ela num cenário perfeito. Não fomos ver as escolas de samba, mas fizemos passeios turísticos. E era novidade para ela também, que estava há pouco tempo lá”, diz Chrystian. Os dias foram regados a passeios, hambúrguer, Milk shake e até banho de chuva. O rapaz só não conseguiu levá-la para tomar banho de praia, pois Prazeres não entra no mar. Na quarta-feira de cinzas, foram a Copacabana ver o encerramento do carnaval, com o encontro dos blocos. De repente, começou a cair uma chuva muito forte e ela quis se esconder. “Eu não vou tomar banho de chuva”, disse. “Vai tomar sim”, determinou 131


Prazer em Conhecer Chrystian. Os dois voltaram para casa ensopados. “Fomos para o Cristo Redentor, tiramos muitas fotos lá. Nós deitávamos no chão para fotografar um ao outro. A gente vê muito isso em novela, né? Aquela diversão, aquele cenário perfeito, passeio na praia, chocolate. Assistimos muito ao DVD de Fábio Junior. Houve momentos só nossos; eu, ela e Fábio Junior. A música Alma Gêmea foi a que mais marcou” relembra Chrystian. Após esse período, ele retornou a Caruaru. Continuaram mantendo contato e um mês depois Chrystian acabou voltando à Cidade Maravilhosa. No final de março de 2008, durante a Semana Santa, Vergílio Barbosa, filho de Prazeres, ligou dizendo que estava indo para o Rio e perguntou se ele gostaria de ir. O rapaz disse que havia ido há um mês e não dava para retornar, por questões financeiras. Vergílio, que estava indo para lá definitivamente, acabou o convencendo a ir junto. O apoio do filho foi fundamental para que Prazeres apostasse num relacionamento com uma pessoa muitos anos mais jovem que ela. Para receber o namorado, preparou um jantar à luz de velas. “Chegamos às duas da madrugada – eu e o filho dela – e estava tudo preparado. Foi fantástico, ela impressionava com coisas simples. O relacionamento da gente foi assim, um chamando a atenção do outro sempre”, afirma Chrystian. Desta vez, ele passaria apenas oito dias no Rio. Nesse período, Prazeres estava no pique de gravações da novela. Geralmente, ia pela manhã ao Projac, algumas vezes à tarde. A atriz chegava ao condomínio sempre maquiada. “E eu brincava com ela dizendo que estava com duas mulheres, a Prazeres e a Shirley”, sorri. Diferente da primeira vez, quando passaram os dias visitando pontos turísticos do Rio, decidiram curtir o cenário da Barra. “Era praia, piscina, e eu não consegui colocá-la no mar, pois ela não gosta e tem medo”, entrega Chrystian. Durante o dia, dedicavam algumas horas à prática de exercícios na academia do condomínio. Atleta de competição e com uma boa base em hidroginástica, adquirida durante os poucos períodos do curso de educação física (interrompido pela metade), Chrystian motivava Prazeres a nadar. Ela chegou a comprar um “macarrão” para as aulas. “Nós ocupamos 132


Capítulo 6 - Amores e poesia muito tempo com isso, exercícios físicos, caminhadas, esteira, bicicleta, piscina e natação”, resume. Em julho de 2008, Prazeres foi a Caruaru. A atriz quis viajar um mês antes, para aproveitar o São João em sua cidade, mas as gravações não lhe permitiram chegar a tempo. A viagem foi motivada, sobretudo, pela decisão que ela havia tomado. Prazeres procurou Francisco e abriu o seu coração. Reafirmou que estava apaixonada por um homem mais jovem que ela e que a relação dos dois não dava mais certo. Disse ainda que estava “jogando tudo para o alto” em nome desse amor e que cada um passasse a viver sua própria vida. A atriz passou menos de um mês em sua cidade. Durante o período, circulou por vários lugares de Caruaru com o novo namorado. Um dos points prediletos era a praça de alimentação do Polo Comercial. Os encontros eram discretos e ela estava sempre rodeada de amigos, especialmente os integrantes de sua Companhia teatral, que embora mantivessem laços de amizade com Francisco, apoiaram-na em sua decisão. Quando voltou ao Rio, ela permaneceu mantendo contato com Chrystian. Os dois estavam cada vez mais íntimos. “Foi uma paixão avassaladora, de ambas as partes. Alguma coisa maior do que você possa imaginar. Você não domina. Por mais que queira disfarçar, não consegue. Fugiu da minha ética”, descreve Prazeres. A relação despertou em ambos alguns sentimentos que resultaram na melhora da auto-estima. “As pessoas gostam de falar, então eu precisava ter uma profissão legal e ser uma pessoa que as outras vissem com bons olhos e não como alguém que queria se promover ao lado dela. Eu tinha essa preocupação e ela me incentivou a cursar Matemática, que era o curso que eu gostaria de fazer. O apoio de Prazeres foi fundamental para que hoje eu pudesse estar onde estou”, confessa Chrystian, que atualmente leciona num colégio particular de Caruaru. Segundo Prazeres, uma nova paixão nessa fase da vida ajudou a despertar o seu lado feminino. “Eu me mantive a vida inteira, decidia tudo dentro de casa, no teatro, na escola. Isso faz com que a gente assuma o lugar do homem. Houve períodos na vida em que eu nem sabia mais se 133


Prazer em Conhecer era mulher. Podia ir para onde quisesse, conversar com quem quisesse e Chrystian despertou em mim esse lado que estava adormecido há muito tempo. Esse foi o ponto-chave dessa paixão enlouquecedora”, define Prazeres, que passou inclusive a adotar um estilo de roupa mais jovem, por sugestão do rapaz. No segundo semestre de 2008, os dois começaram a fazer planos para o réveillon. Assim que o período letivo acabasse, Chrystian viajaria pela terceira vez ao Rio de Janeiro para encontrar sua namorada. Mesmo separados, Prazeres e Francisco continuaram mantendo contato. Ele permaneceu à frente da Companhia e das obras do teatro que ela estava construindo. Prazeres, no entanto, não escondia isso de Chrystian. “O contato existia, às vezes me incomodava, mas não tanto, porque ela me dava segurança. Ela largou tudo para ficar comigo sem pensar nas consequências. Poucas mulheres fariam isso”, reconhece o rapaz. Inconformado, Francisco voltou ao Rio em setembro do mesmo ano. A situação estava cada vez mais difícil. O fato de não aceitar o fim do relacionamento o deixou quase depressivo. Ao mesmo tempo em que insistia em reatar a relação, Prazeres estava cada vez mais decidida daquilo que queria para si. Em 26 de dezembro de 2008, assim que terminaram as reuniões do colégio, Chrystian pegou um avião com destino ao Rio. O rapaz viajou sob forte ansiedade, afinal, iria passar o réveillon ao lado de Prazeres, no perfeito cenário da praia de Copacabana, onde acontece a queima de fogos. Chrystian chegou ao aeroporto no período da tarde. Em seguida, o casal foi ao centro da cidade comprar os utensílios para a virada do ano. Embora fosse dezembro, o Rio de Janeiro já estava em ritmo de carnaval. Chovia bastante na cidade. Prazeres e Chrystian foram a uma loja de adereços e tiraram muitas fotos. “Foi a maior diversão. Nós saíamos de uma loja, entrávamos em outra. Fomos para o Saara (o point do comércio popular no Rio) e compramos roupa branca”, lembra. Às 17h do dia 31 de dezembro, eles pegaram um ônibus rumo a Copacabana. Prazeres já havia mudado para Jacarepaguá, onde mora atualmente. Acostumada com o ritmo das gravações, a atriz estava ansiosa por 134


Capítulo 6 - Amores e poesia não ter nenhuma previsão de trabalho quando a novela chegou ao fim. “Eu conversei e disse que ela estava muito ansiosa, se cobrando demais. E ela me disse que não estava feliz assim, que gostava de trabalhar e que o trabalho era a vida dela”, diz Chrystian. Mesmo assim, Prazeres estava muito empolgada para o réveillon, que era algo novo para ela. Em 2007, a atriz acompanhou a passagem do ano no Rio, acompanhada pelo filho. Ficaram no apartamento da Barra da Tijuca. Desta vez, não importaria o que acontecesse, o casal iria curtir a festa em Copacabana. Nem mesmo o trânsito congestionado foi capaz de afastar a animação. Depois de toda a agonia para sair de casa, indecisões acerca da roupa, do que calçar, por voltas das 20h Prazeres e Chrystian chegaram a Copacabana, que estava lotada. Ao som do grupo de pagode Revelação, o casal passou um de seus melhores momentos naquela noite. “Ficamos encantados. O nosso ápice foi ali”, define o rapaz. A noite foi vivida em clima de romance. Eles levaram uma canga, jogaram na areia e ficaram sentados por um bom tempo. Um helicóptero sobrevoava o local e Prazeres acenava. As poucas vezes em que se desgrudaram foi apenas para comprar o que comer. Beberam muitas garrafas de Smirnoff Ice (a bebida que estava presente em todas as farras do casal, preparada com Vodca, suco de limão e água com gás). Na franquia do Bob’s, comeram hambúrguer e Milk Shake. Churrasco, Ice e muito beijo na boca marcaram aquela noite. Assim que as luzes apagaram, Chrystian se jogou na água. Mais uma vez não conseguiu levar a namorada até o mar. Viram a queima de fogos e ele filmou tudo para registrar aqueles momentos. Para proteger os cabelos e as “lagartinhas” (como chamava carinhosamente as sobrancelhas de Prazeres), o casal levou uma capa de chuva. “Eu tinha muito cuidado nela”, confidencia o professor de Matemática. Exaustos, às cinco da manhã chegaram em casa. Nos dias que se seguiriam, o clima de romance e paixão não perduraria. O Ano Novo trouxe consigo “um desencantamento”, como a atriz define, que pôs um ponto final na relação entre os dois. Chrystian iria 135


Prazer em Conhecer retornar apenas no dia 1º de fevereiro de 2009, mas acabou voltando a Caruaru muito antes do previsto. “Após o réveillon, começou um desconforto entre a gente. Se aconteceu alguma coisa específica eu não sei, mas começou um mal estar. Eu achei que ela mudou e consequentemente eu também mudei. Nós sentamos, conversamos, ela disse que estava descontente e que não era aquilo que queria”, explica. Ele diz que até hoje não entende o motivo da separação, mas acredita que prevaleceu a insistência do ex-marido. “Ela não se conformava ao ver aquela pessoa naquele estado. Prazeres se sentia culpada por ele (Francisco) estar daquele jeito e a única solução que ela tinha era ficar a seu lado. Não tem outra alternativa. Eu tenho certeza de que o motivo foi esse. Ela disse que teve um desencantamento, mas como isso é possível se nós continuamos amigos?”, questiona. Chrystian voltou a Caruaru no dia 6 de janeiro consciente de que o relacionamento com Prazeres havia chegado ao fim. O rapaz esperava que pudesse reatar o namoro. Pensava que adiante os dois conversariam e fariam as pazes. “Nós tínhamos planos, eu pretendia terminar os meus estudos lá, nós iríamos morar juntos. A minha ideia era pegar uma bagagem maior no meu trabalho e depois ir para lá. Isso está acontecendo agora, mas a única diferença é que eu estou sem ela”, analisa. No período em que ficaram juntos, os dois enfrentaram algumas crises, sobretudo pela dificuldade que Prazeres encontrava para se distanciar do ex-marido. Chegaram a dar um tempo, passaram um mês sem se falar, mas nada disso foi capaz de impedir o romance. Quando Chrystian deixou o Rio, cerca de vinte dias depois Francisco foi para lá. Ao saber que Prazeres havia terminado a relação, ele decidiu apostar tudo para salvar o seu casamento. Prometeu esquecer o que havia se passado e rever as coisas que fez de errado ao longo dos anos. Os dois conversaram e, em seguida, retomaram o relacionamento. Algum tempo depois, Chrystian recebeu uma ligação de Prazeres comunicando que estava voltando para Francisco. “Ela disse que iria ficar com ele porque era a pessoa que a entendia. Eu a amo, de verdade mesmo, mas acho que não vamos mais ficar juntos. Ela fez a escolha dela e quando decide algo não 136


Capítulo 6 - Amores e poesia costuma voltar atrás”, revela. Do período em que conviveu com Prazeres Barbosa, ele guarda na memória traços da personalidade marcante que poucas pessoas conhecem. “Prazeres é a pessoa mais simples do mundo. Se tiver um ovo, ela come um ovo, se tiver filé mignon, ela come filé mignon. Pela pessoa que ela é hoje, pela carreira que construiu, poderia até ser uma pessoa esnobe, mas continua simples”, diz. O rapaz teve oportunidade de constatar essa simplicidade no diaa-dia, inclusive fora de casa. “Estávamos no centro do Rio e paramos no McDonald’s, próximo ao Teatro Municipal, para tomarmos um sorvete. Ela gosta muito de sorvete de chocolate, com creme de chocolate e calda de chocolate. Havia um garotinho de uns oito anos, com a mãe, querendo comprar um sorvete e estava em dúvida sobre qual sabor escolher. Nenhuma pessoa faria aquilo, mas ela cedeu o próprio sorvete para ele provar. Eu achei até estranho, jamais faria aquilo”, afirma. As lembranças deste período ainda são recordadas com certa dificuldade pelas pessoas mais próximas do casal. “Como amigos, ficávamos em cima do muro, mas não éramos contra nenhum dos dois. Éramos a favor da felicidade de ambos. Acredito que foi a fase mais difícil da vida deles”, define Benício Júnior. “Eu não gosto de lembrar, porque mexe mesmo. Passávamos horas conversando com os dois ao mesmo tempo; ele no telefone e ela na Internet”, diz Sheila Tavares, com olhar emocionado. Neide Mota temia que a amizade entre elas pudesse ser abalada. “Eu disse para Prazeres que não iria contar ao meu marido. Sinto que ela achava que eu estivesse mais moderna e ele também, mas homem nunca é moderno para essas coisas. Pensei que fosse surgir um preconceito maior, mas quando Francisco contou para ele, percebi que não se importou. Dei graças a Deus, pois a minha preocupação era de que houvesse uma separação entre nós duas”, confessa. Atualmente, Prazeres e Francisco vivem juntos no Rio de Janeiro. Após um longo período de crises, decidiram reatar o casamento de vinte e cinco anos. A atriz afirma, porém, que jamais esquecerá o período vivido com Chrystian. “Foi uma fase que eu vivi intensamente e que não me arre137


Prazer em Conhecer pendo. Conhecemos-nos pela Internet e essa paixão foi criando alicerces. Como o meu casamento já estava fragilizado, meu coração estava completamente aberto e eu me deixei abrir e nós vivemos um amor bonito e que eu não vou esquecer nunca”, conclui.

EM BUSCA DO EQUILÍBRIO

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iz a astrologia que a personalidade dos librianos é regida por uma balança que sobe e desce alternada e indiscriminadamente, o que torna muito difícil compreendê-los. São pessoas sentimentais e sonhadoras, que vivem em função do amor. Prazeres Barbosa é assim: muito determinada, mas de coração muito frágil, como um cristal. “É uma dicotomia, ser muito brava, rigorosa e ao mesmo tempo ser tão sensível. Esses pontos são minha libra. Essa balança é eterna em mim”. O peso tão forte de um lado e, do outro a fragilidade, favorecem o equilíbrio – ou, pelo menos, a tentativa de viver de forma equilibrada. “Muitas vezes peso muito para um lado, depois para outro. Mas sempre mantenho esse equilíbrio. Eu sou consciente, por exemplo, quando extrapolo nas minhas exigências. Tenho esse lado; se errei, pode bater. Mas se não errei, sai da frente. Eu não abro mão”. Quando questionada sobre o fato de ser ou não uma pessoa feliz, ela responde um pouco duvidosa, que sim. Sempre foi feliz e saudável. Aos 60 anos, afirma possuir uma saúde de ferro e mostra-se satisfeita por haver conquistado reconhecimento como professora, atriz e como mãe, os três patamares mais importantes de sua vida. Ser mãe não lhe causou problemas, afinal, ela descreve o filho como uma “pérola”. Ao passo em que ser professora é uma tarefa difícil, também é muito gratificante. E ser atriz, para ela, é prazeroso. “Eu tenho uma vida feliz, sim. Quantas pessoas nascem, crescem, envelhecem, morrem e ninguém sabe que existiu? Eu fiz história de vida”, diz, com propriedade. É no palco que Prazeres se sente totalmente feliz, inteira, completa. “Fazendo teatro, tiramos de dentro de nós pessoas que não somos e gostaríamos de ser. Só o teatro nos dá essa possibilidade de soltarmos os nossos deuses e demônios”. A felicidade maior, a seu ver, consiste no fato de não ter do que se arrepender. “Eu fiz tudo aquilo que deveria ter sido feito. E 138


Capítulo 6 - Amores e poesia se eu viver muito tempo, vou fazer muito mais. Estou aberta ao mundo e à vida. Não fechei o meu ciclo. Enquanto meu coração estiver batendo, vou continuar sonhando e realizando. E muito despreocupada do que as pessoas pensam de mim”, afirma. Seus olhos brilham ao citar que as pessoas mais importantes de sua vida são: o filho, Vergílio; a mãe, Antonina e o irmão, Bernardo. “Essas pessoas foram o meu esteio”. O filho, aliás, é para ela o que de mais importante a vida lhe ofertou, embora tenha se submetido a um processo cirúrgico para não mais engravidar. “Vergílio é um ser humano tão completo, como profissional e como filho, que não quis experimentar outras emoções”, justifica. As dificuldades ensinaram-na a nunca gastar tudo o que ganha. Em relação ao estilo de roupas, ela prefere “as mais comportadas”. Prazeres não é fanática por futebol, mas aprendeu a gostar e torcer pelo São Paulo Futebol Clube. “Hoje, eu quero que o São Paulo sempre ganhe, apenas por questão de afinidade. Chrystian me ensinou a gostar do time dele. Mas, na verdade, gosto de ver o Brasil jogar e ganhar. Quando perde, eu fico triste”, revela. Ela não bebe, nem fuma. “Não tenho nenhum vício”, adianta. Também não é supersticiosa. Adora perder tempo navegando na Internet, acompanhar noticiários online e interagir com as pessoas. “Acesso todos os dias”, conta. A atriz encara a arte como uma ferramenta de transformação social e diz que jamais abriria mão de sua carreira artística, embora já tenha desanimado ao longo da jornada. Define o teatro como uma profissão que possibilita a multiplicidade de vidas e afirma querer findar os seus dias no palco. Ao ver-se na telinha, a sensação maior é provocada pela consciência de que lutou para estar ali e que valeu a pena cada degrau conquistado. “Às vezes acho que estou sonhando”. Como atriz, teve o privilégio de somar vitórias e realizar tudo o que almejou. A experiência no teatro, cinema e, agora, na televisão permite-lhe analisar que a mudança na atuação corresponde ao foco de cada área. No entanto, reconhece que a liberdade exacerbada do teatro é castrada na TV e anulada no cinema. Prazeres conta que é uma delícia dedicar-se às três esferas, embora sua veia artística teatral seja muito forte. “Eu sou muito intensa, gesticulo muito, sou teatral e o prazer do teatro é instantâneo e lhe faz muito feliz. Apesar de ser meteórico, é o que dá prazer”. Citando sua referências no meio artístico, o primeiro nome que 139


Prazer em Conhecer vem à memória é o da atriz Fernanda Montenegro, com quem seu irmão Bernardo costuma fazer um engraçado trocadilho. “Ele diz assim: ‘lá é Fernanda Montenegro e aqui é Prazeres casaco preto’ (risos). Eu acho que Fernanda Montenegro é espetacular”, comenta a atriz. Sua admiração também é intensa pelo ator Paulo Autran. Outros nomes como Renata Sorrah, Lília Cabral, Letícia Spiller, Susana Vieira, Antonio Fagundes, Stênio Garcia e Ary Fontoura também figuram na lista dos seus artistas prediletos. O fato de ser a única atriz caruaruense a chegar a uma grande emissora nacional e os rumos que sua carreira tomou nos últimos anos, não modificaram sua personalidade. “Sou a mesma pessoa, com os mesmos pensamentos, o mesmo amor, a mesma dedicação. Meu salto não aumentou nenhum centímetro”, admite. “Hoje as pessoas me olham com olhar diferente, pedem para tirar foto e eu fico muito feliz, mas dentro de mim eu digo: ‘estive aqui o tempo todo’. Porque as pessoas precisam que o outro aconteça nacionalmente para valorizar”. A ida definitiva de Prazeres para o Rio de Janeiro foi motivada, sobretudo, pela projeção que a sua carreira artística obteve através das produções cinematográficas. De curta metragem no interior de Pernambuco, a longas de visibilidade nacional, a atriz caruaruense encontrou no cinema o caminho que a conduziu ao lugar onde dez em cada dez atores sonham chegar: a Rede Globo de Televisão.

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Capítulo 7

Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia

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Prazer em Conhecer

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estreia de Prazeres Barbosa no cinema aconteceu em 1992, num curta metragem filmado em Pernambuco. As Videntes de Cimbres, dirigido pelo cineasta Alberto Sales, é um filme baseado num fato místico: a suposta aparição, em 1936, de Nossa Senhora das Graças a duas garotas, na vila de Cimbres, distante cerca de quinze quilômetros do centro de Pesqueira (PE). O elenco, formado por dezoito atores, viajou diversas vezes à vila, durante seis meses. Algumas cenas foram gravadas na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru (Fafica). No curta As Videntes de Cimbres, rodado e editado em super VHS, Prazeres Barbosa interpretou uma madre superiora. Além de atuar, ela foi convidada por Alberto Sales para fazer direção de elenco. O lançamento aconteceu no dia 5 de dezembro de 1992, no salão de convenções do Hotel São Vicente de Paula, em Caruaru. Pelo forte caráter religioso contido em seu roteiro, a produção acabou sendo exibida nas telas de cinema de vários lugares do Brasil e entidades religiosas na Alemanha demonstraram interesse em conhecer o filme. Em 1995, a atriz recebeu vários convites para participar de produções no cinema e na televisão. O primeiro foi para integrar o elenco de América au Poivre, um curta metragem de Sergio Oliveira e Nelson Caldas Filho. Gravado em Betacam, o vídeo de apenas vinte e sete minutos era bastante ousado para os padrões da época, se tratando de produções fora do eixo cinematográfico nacional. A produção durou cerca de um ano para ser concluída. Por ser um filme de ficção, cada detalhe foi trabalhado exaustivamente. O protagonista da história era o cantor Otto Maximiliano, vocalista de A Banda, que interpretava um expatriado do leste europeu, recém-chegado à terra brasilis, refazendo um percurso ancestral em meio a personagens e situações hilariantes, entre eles a “perua” vivida por Prazeres. O filme contava ainda com a participação do artista pernambucano Tavares da Gaita. As locações incluíram Vila Velha e o Parque das Esculturas, em Fazenda Nova (PE) e o filme teve sua pré-estreia no dia 9 de agosto de 1995, no Recife. Em América au Poivre, todos os atores falavam francês. Para compor sua personagem, Prazeres contou com a ajuda da professora Gley142


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia des Cardim, cuja colaboração foi fundamental para que a atriz aperfeiçoasse o sotaque. Gleydes era uma velha conhecida de Prazeres. Foi sua professora na época da graduação e, durante a adolescência da atriz, marcou época em Caruaru apresentando o programa Sociedade, na extinta Rádio Difusora local. O resultado agradou ao público e à crítica. América au Poivre foi exibido no XIX Guarnicê de Cine e Vídeo, realizado entre os dias 12 e 16 de junho de 1996, na cidade de São Luís (MA), um dos maiores festivais de cinema do Brasil. Embora fizesse “ponta” no filme, Prazeres recebeu prêmio de melhor atriz por sua atuação no curta metragem. O troféu Guarnicê é um dos mais cobiçados prêmios de cinema, somente superado pelo Festival de Gramado (RS). A atriz ficou sabendo da notícia através de um jornal. Lucivanda Leite, sua sobrinha, estava ao lado dela no momento. Surpresa com o resultado, Prazeres pediu que ela lesse para confirmar se era verdade. Em seguida, ligou imediatamente para Sergio Oliveira, diretor do filme, e marcou para pegar a homenagem. “É um troféu muito lindo, em formato de boi. O boi de São Luís do Maranhão; eu tenho o maior orgulho desse prêmio, porque é filho único no cinema”, explica Prazeres. O ano de 1995 reservou outras surpresas para a atriz caruaruense, que foi convidada para participar das filmagens de O Baile Perfumado, o primeiro longa metragem da carreira. O filme surgiu num momento em que o cinema pernambucano precisava dar uma guinada em suas produções. O Estado havia produzido o seu último longa metragem dezoito anos antes. A partir daí, o diretor Lírio Ferreira decidiu apostar na produção. A escolha de Prazeres Barbosa foi feita diretamente pelo diretor de casting, Rutílio Ferreira, depois de demorada pesquisa de campo, a partir de material publicado sobre ela pela imprensa. O Baile Perfumado é um filme de cangaço, que enfoca o bando de Lampião e tem em seu elenco atores como Tereza Seiblitz, Patrícia França, Claudio Mamberti, Jofre Soares, Aramis Trindade, Chico Accioly e Geninha da Rosa Borges. Prazeres recebeu o convite em dois de fevereiro de 1995 e, no dia seguinte, viajou a Recife para participar de uma entrevista com a 143


Prazer em Conhecer direção. A única exigência foi para que levasse consigo uma foto, já que o seu currículo era por demais conhecido, como afirmaram os diretores. A atriz quase ficou fora da produção, mas o interesse da direção em tê-la no elenco prevaleceu. Nesse período, ela estava na fase final de montagem do espetáculo Valsa nº 6, que iria estrear em 1º de abril. As filmagens começariam em 15 de março e Prazeres não teria como conciliar a atuação nos palcos com as gravações. Os diretores, no entanto, informaram que ela teria toda liberdade para ausentar-se do set de filmagens sempre que suas apresentações exigissem. No Baile Perfumado, a atriz deu vida à camponesa Lurdinha. Ao todo, cerca de 400 pessoas estavam envolvidas na produção do longa, que teve a maioria de suas cenas rodadas em Pernambuco e trilha sonora de Chico Science e Fred Zero Quatro. A essa altura, Prazeres já era uma artista conhecida do público por seus trabalhos em teatro e pelos muitos comerciais veiculados na TV com a sua imagem. Os filmes exibidos em circuito comercial e com forte apoio de mídia, no entanto, contribuíram ainda mais para a divulgação de seu trabalho artístico em nível nacional. Ainda em 1995, Prazeres filmou o vídeo-documentário O Dia em que Roberto Faltou, escrito por Marinita Alves e Cacá Teixeira. Com o objetivo de educar e despertar o interesse de organizações nas comunidades rurais, o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), contratou a TV Viva (PE), sob a direção de Newton Pereira, para filmar na comunidade Pintada, a 12 quilômetros de Afogados da Ingazeira (PE), este vídeo especial. Enfocando a participação da mulher, Prazeres Barbosa interpretava Severina, uma liderança feminina que arregaça as mangas e parte para comercializar diretamente o tomate, na falta de Roberto, um líder jovem interpretado pelo ator Cláudio Ferrário. “Esse trabalho foi muito interessante porque ele veio em consequência de as pessoas me conhecerem no teatro. Isso é resquício de Sebastiana (personagem interpretada por ela no espetáculo A Promessa). Eu não tinha tanta experiência e acho que ficou meio forçado, mas é assim, as coisas vão acontecendo e vamos crescendo a cada trabalho”, analisa Prazeres. 144


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia O ano de 1995 foi encerrado com chave de ouro para a carreira da atriz caruaruense. Mais uma vez, Prazeres foi escalada para compor o elenco de um longa metragem. Dirigido por Aníbal Massaíne Neto, a nova versão do filme O Cangaceiro (um remake do clássico de 1953), tinha ares de super produção, por contar com a parceria da Paris Filmes, ter um orçamento alto e um elenco composto por atores como Luisa Tomé, Paulo Gorgulho e Ingra Liberato. Para participar do filme, Prazeres se submeteu a vários testes (realizados pela equipe também na cidade de Caruaru) e acabou sendo aprovada para viver a hilária Velha das Cabras. O set de gravações de O Cangaceiro foi a localidade de Venturosa, próxima ao município de Pesqueira (PE), cujo cenário natural é sempre disputado para filmagens do gênero. A produção contava ainda com a participação do ator, transformista e aderecista Waldemar Filho. Em março de 1996, os povoados de Couro Dantas e Beira-Mar, na zona rural de Pesqueira, Agreste Setentrional pernambucano, voltaram a ser cenário de gravações cinematográficas televisivas. O local foi escolhido por uma equipe da Rede Globo Nordeste, para as filmagens do especial Caminhos de Monte Santo, em alusão à Semana Santa. Escrito pelo diretor Valdir Oliveira, o vídeo foi dirigido por Jota Raposo, responsável pelo elenco e por cerca de 35 figurantes, escolhidos entre os moradores da cidade. A equipe passou oito dias no local e Prazeres Barbosa foi escolhida pela direção do especial para compor o elenco. Caminhos de Monte Santo foi exibido no dia cinco de abril de 1996 para todo o Nordeste brasileiro. “Valdir Oliveira é autor e diretor pernambucano e quando foi fazer esse especial, se lembrou de mim e me convidou. Ele conhecia o meu trabalho através da divulgação por parte da imprensa”, ressalta Prazeres. A atriz faz questão de destacar a importância que os veículos de comunicação impressos, televisivos e radiofônicos possuem na ascensão de sua trajetória artística. “Você tem obrigação moral de reconhecer as pessoas e entidades que lhe deram a mão. Nenhum órgão de imprensa de Caruaru e do Estado pode ficar fora desse meu registro de agradecimento. Como eu devo a essa imprensa maravilhosa! Eu sempre estive na mídia, 145


Prazer em Conhecer sem pagar um centavo”, afirma. Do diretor e artista plástico Marco Hanois, Chega de Cangaço, curta baseado na sátira aos filmes desse gênero, foi filmado em 1998. Após o êxito registrado com as filmagens de O Cangaceiro (1995), Prazeres foi convidada para participar desta produção. “O filme é, na verdade, uma comédia. Cangaceiros de mentira chegam à cidade e as pessoas pensam que são de verdade. Fiz uma participação ótima, com Aramis Trindade e Walmir Chagas. É muito gostoso, você morre de rir”, destaca a atriz. Em 2001, após um curto período afastada das produções cinematográficas, Prazeres Barbosa assinou contrato para participar de mais um filme cujo cenário era o Sertão pernambucano. A produção apresentava algumas particularidades que merecem destaque. Além de contar com atores de renome no elenco, As Três Marias foi o primeiro longa de projeção verdadeiramente nacional do qual a atriz participou (embora os trabalhos anteriores tenham sido exibidos em vários lugares do país). A produção marcou um novo momento em sua carreira artística. As Três Marias, de Aluízio Abranches, tinha um núcleo formado por grandes nomes da televisão brasileira, como: Marieta Severo, Carlos Vereza, Júlia Lemmertz, Maria Luísa Mendonça, Tuca Andrada, Wagner Moura e Lázaro Ramos. O filme teve cenas rodadas nas cidades de Pesqueira e Recife (PE). “Nessa época, eu ainda não tinha a visibilidade de alguém olhar para mim e dizer que me viu na TV, como acontece hoje. Eu caí de pára-quedas nessas produções”, acredita Prazeres. A contratação da atriz para a produção do longa foi motivada principalmente por sua atuação nos filmes O Cangaceiro, de Aníbal Massaíne e América au Poivre, de Sergio Oliveira. Na trama, ela viveu a governanta Adalgiza, que serve como contraponto na trágica narrativa da morte do pai, filhos e irmãos assassinados barbaramente por encomenda. As Três Marias foi exibido durante o VI Festival de Cinema do Recife, em maio de 2002, no Centro de Convenções, em Olinda (PE). A produção havia estreado um mês antes no 51º Festival Internacional de Cinema de Berlim, na Alemanha, um dos mais importantes eventos cinematográficos da Europa e do Mundo. Na ocasião, Prazeres teve a oportu146


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia nidade de ser vista pela primeira vez no exterior. Ainda no ano 2001, a atriz foi escalada para outra grande produção de caráter nacional: Espelho D’água – uma viagem ao Rio São Francisco, filme de Marcus Vinicius Cezar, produzido por Carla Camurati. O filme foi realizado com recursos aportados através dos incentivos previstos na lei federal, pelas empresas Petrobras e Eletrobrás. Um elenco de peso ajudou a dar vida ao roteiro. Entre eles, Fábio Assunção, Carla Regina, Regina Dourado, Francisco Carvalho e Charles Paraventi. No filme, Prazeres interpretava a misteriosa Almerinda, uma mulher que naufraga durante uma viagem numa canoa. A personagem é salva por Henrique (Fábio Assunção), que em seguida desaparece. No desenrolar da trama, quem ajuda a encontrá-lo é a própria Almerinda. A atriz conta que manteve boa relação com o ator durante as gravações. “O cara é espetacular. Ele é de uma relação maravilhosa e se torna íntimo de você”, define Prazeres. Ela diz que Fábio estava no set de gravações e disse que queria conhecer “sua” Almerinda. “Quando disseram que era eu, estávamos numa distância enorme, ele veio ao meu encontro, me abraçou, colocou-me no braço e rodopiou”, relembra. Outra lembrança inesquecível foram os elogios recebidos do diretor de fotografia do filme, José Tadeu Ribeiro. Admirado com a desenvoltura de Prazeres Barbosa em cena, ele afirmou diante da equipe de gravações: “Essa mulher é uma medéia”. Para gravar as cenas de naufrágio, que ocorreram num trecho do São Francisco, na cidade de Penedo (AL), Prazeres fez aulas de natação em Caruaru. Os treinos aconteceram na casa de uma amiga dos tempos de escola, Salete Menezes. O espaço amplo, com piscina, serviu durante alguns anos como cenário para as festas de confraternização da Companhia Prazeres Barbosa. No período de preparação para o filme, a atriz passou um mês aprendendo a nadar com Salete. As cenas no rio foram longas e cansativas. A produção criou um clima de muita chuva e vento artificiais, transformando o lugar num ambiente de impetuosa tempestade. “Eu estava um pouco insegura, porque sempre tive medo de água. Aprendi o possível e depois gravamos. No 147


Prazer em Conhecer momento em que eu já estava cansada, disse que não aguentava mais. A produção pôs uma bóia em mim, para que eu ficasse na superfície, pois a correnteza estava agitada. Entramos no rio entre seis e sete horas da noite e saímos três horas da manhã”, lembra a atriz. O resultado agradou a Prazeres, que diz gostar de ver o filme. “Fiquei muito feliz na época, porque quando assisto eu gosto. Quando nós fazemos as coisas somente em Pernambuco, sabemos do dinamismo que acontece, mas também sabemos da restrição. O contrário ocorre quando você parte para uma produção com pessoas que estão na mídia”, relata. O final do século XX reservou ainda para a atriz uma homenagem marcante na cidade de Limoeiro (PE). No final do ano 2000, a Consultoria de Ações Culturais, que tem como superintendente o arte-educador Fábio André, com apoio do governo local, inaugurou o Galpão das Artes, espaço cultural com capacidade para 150 pessoas. Prazeres Barbosa, “imortalizada” nos idos de 1992, quando teve seu nome escolhido para identificar uma sala de aula na Escola Gianete Silva, e, em 1995, quando lhe foi conferida uma placa no Hotel Centenário, hoje Plazza, ambos em Caruaru, foi o nome apontado por unanimidade pelos poderes Executivo e Legislativo e também pela classe artística limoeirense para dar nome ao camarim existente no Galpão das Artes. A solenidade aconteceu em meio a muita emoção e um discurso eloquente da homenageada. A identificação da população limoeirense com a atriz é destacada pelo produtor cultural Fábio André. “Prazeres Barbosa apresentou vários espetáculos em Limoeiro; além disso, ela contribuiu para o processo de formação de atores na cidade. Se eu pudesse defini-la em uma palavra, seria generosidade. Ela tem o dom de envolver a todos e de ver o ser humano que está por trás do artista. A carreira dela serve como inspiração para aqueles que estão na mesma caminhada”, avalia. Em 2003, Lírio Ferreira, autor do filme O Baile Perfumado (1995), do qual Prazeres havia participado, convocou a atriz para o elenco de sua mais nova produção: Árido Movie, que tratava da falta d’água no Brasil. “É Árido Movie porque é um filme seco, de corte seco”, definiu o autor em entrevista ao jornal paulistano Folha Ilustrada, de 17 de novembro daquele 148


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia ano. O diretor comemorou o fato de “estrelas” da dramaturgia brasileira apostarem em seu projeto – o que significa dizer que eles aceitaram receber bem menos do que estão acostumados a ganhar. Além de Prazeres Barbosa, o elenco era formado, entre outros, por Selton Mello, Giulia Gam, Matheus Nachtergaele, Renata Sorrah e Gustavo Falcão. Havia ainda a participação especial do grupo musical Renato e Seus Blue Caps. Prazeres gravou cenas na cidade de Cabaceiras (PB) e afirma gostar bastante de sua participação, embora tenha feito apenas uma breve “ponta”. “Parece mentira, mas aquele frio que você sente para entrar no palco – e até hoje eu sinto – é o mesmo quando vou assistir a algum filme de que participei e outras pessoas estão vendo. É incrível, mas não passa. E quando assisto, fico me cobrando. Sempre acho que poderia ter feito melhor”, destaca. Sua ligação com o teatro vai além do mero fato de atuar e ser reconhecida pelo talento do qual é detentora. Prazeres Barbosa acredita no fazer teatral que transforma, informa e revoluciona. Sua preocupação maior é fazer com que as pessoas saiam preenchidas do teatro após assistirem aos seus espetáculos. “Nunca quis que as pessoas saíssem do teatro e me esquecessem. Teatro tem que ir além da portaria”, acredita. No dia dois de maio de 2004, o longa Espelho D’água estreou no Centro de Convenções de Pernambuco. Toda a equipe do filme estava presente. O evento contou ainda com participação da imprensa e de cineastas brasileiros. Um deles, João Falcão, diretor do seriado de TV Sexo Frágil, ficou impressionado com a atuação de Prazeres Barbosa. A atriz sequer poderia imaginar, mas naquele dia a visibilidade alcançada através de seu trabalho iria alterar de vez os rumos de sua carreira artística. Dez dias após a exibição, uma equipe de produção entrou em contato com a atriz sondando o seu interesse em participar de um teste para o longa metragem A Máquina. Prazeres havia sido indicada pelo próprio diretor do filme, conforme atestou Cibele Santa Cruz, a produtora que entrou em contato com a atriz. Convite aceito, Prazeres recebeu um texto (o mesmo lido pelo ator Paulo Autran na abertura do longa) e, no dia 18 de maio, submeteu-se à seleção com mais de 120 pessoas. 149


Prazer em Conhecer Por questões financeiras, a atriz correu o risco de não participar dos testes. Na data da seleção, a produtora ligou para confirmar a sua ida ao Recife. Prazeres comunicou que estava sem dinheiro para custear a viagem. - Eu não acredito, respondeu Cibele. - É, eu não tenho como ir, disse. - Então daqui a pouco eu te ligo novamente. Poucos instantes depois, Cibele retornou a ligação. Mandou que Prazeres arranjasse o dinheiro emprestado e a produção lhe reembolsaria após os testes. “O diretor queria mesmo que eu fosse”, revela a atriz. Prazeres estudou minuciosamente o texto, fez suas próprias pontuações (como de costume) e compareceu à Rec Produções, no bairro da Madalena, no Recife, que estava lotada. Durante os testes, perguntaram se ela sabia cantar. De forma descontraída, Prazeres disse que era cantora de banheiro. “Cante pelo menos Atirei o Pau no Gato. João quer saber apenas se você tem entonação”, recomendou Cibele. A atriz então lembrou de sua música favorita, A Natureza das Coisas. Em frente à câmera, cantou os versos que tem na ponta da língua ao acordar todas as manhãs. “Nossa, que coisa linda. João vai ficar muito feliz”, afirmou a produtora. Em seguida, levaram-na até a rodoviária, para que voltasse a Caruaru. Também lhe entregaram o dinheiro, conforme haviam prometido. Quatorze dias após o teste, Prazeres recebeu a confirmação de sua aprovação e, por coincidência – ou não –, sua personagem iria se chamar Prazeres. A surpresa maior veio com a notícia de que a trilha sonora do filme seria exatamente a música cantada por ela durante a seleção e com um detalhe: a gravação foi feita na voz da própria atriz. Antes de embarcar para o Rio de Janeiro, Prazeres recebeu uma visita ilustre em sua casa. A atriz Mariana Ximenes, protagonista do filme A Máquina, viajou a Pernambuco para fazer laboratório visando à composição de sua personagem, que era nordestina. A cidade de Caruaru foi uma das escolhidas pela atriz, por sua riqueza cultural e, sobretudo, por abrigar uma das feiras mais conhecidas do mundo. Certa manhã, Mariana estava na Feira de Artesanato de Caruaru, 150


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia quando Giselly Amorim, integrante da Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa, muito levada, abordou-a: “só por que é atriz não vai tomar o meu caldinho?”, perguntou a menina. Mariana Ximenes achou aquela situação engraçada e ao mesmo tempo interessante. Naquele momento, ela pensou estar diante da pessoa ideal em quem poderia se espelhar. Enquanto Mariana tomava o caldinho, Giselly aproveitou para dizer que também era atriz e que uma amiga sua iria participar de um filme no Rio de Janeiro. Curiosa, Mariana quis saber de quem se tratava. Ao ouvir que a amiga se chamava Prazeres Barbosa e que ambas iriam gravar o mesmo filme, a atriz não se conteve e pediu para que a levassem ao seu encontro. Giselly ligou imediatamente para Prazeres, a quem chama carinhosamente de “mãe” e disse que tinha alguém na linha querendo falar com ela. - Alô. É Mariana Ximenes. - Sim, respondeu Prazeres (que havia entendido Cláudia Gimenez). - Você é Prazeres Barbosa? - Sou. - Olha, eu vou fazer um filme com você e estou aqui em Caruaru, na Feira. Eu posso ir até aí? - Claro que pode. Cerca de dez minutos depois, Mariana Ximenes chegou à casa de Prazeres Barbosa, no bairro Caiucá, acompanhada pelos atores Gustavo Falcão (com quem fez par romântico no filme) e Milena (uma atriz do Recife que acompanhou o casal). Giselly foi junto. Ao passo em que os atores ficaram impressionados com todo o acervo que viram no espaço, Prazeres ficou encantada por ver em sua casa a atriz Mariana Ximenes, de quem era fã desde a época da novela Chocolate com Pimenta. “A gente se gostou logo de cara”, conta Prazeres, que estava à beira do fogão, vestida com traje de dona-de-casa. Após um longo bate papo, Mariana pediu a Prazeres uma sugestão de hotel onde eles pudessem ficar hospedados. Adiantou que poderia ser algo simples, uma vez que estavam ali por conta própria. Prazeres explicou que em Caruaru havia bons hotéis, uns mais baratos e outros mais caros. Mas, se eles não fizessem questão, poderiam ficar em sua própria casa. 151


Prazer em Conhecer “Mas não é muito incômodo?”, perguntou Mariana. “De jeito nenhum, é um prazer”, respondeu a atriz. O quarto de Vergílio estava desocupado e, quando eles viram a cama de casal “fizeram a festa”, diz Prazeres. Os atores ficaram três dias no lugar. Era junho e a cidade de Caruaru estava em clima de São João. Prazeres levou Mariana Ximenes para a Festa da Pamonha Gigante e também para o Pátio de Eventos Luiz Gonzaga, o principal pólo da festa junina na cidade. “Foi o São João de Mariana”, define a atriz. No dia cinco de julho de 2004, Prazeres viajou para o Rio de Janeiro, onde ocorreram as gravações do filme. A Máquina é uma história que tem como pano de fundo a pequena cidade interiorana de Nordestina, onde nada acontece de extraordinário, exceto a história de Antônio, personagem de Paulo Autran, que é remetida ao ano de 2050. O longa questiona a ação de Deus na criação do mundo, especificamente do tempo (que é a grande máquina), ironizando sutilmente as invenções do criador, e foi rodado no Polo de Cinema do Rio. “Deus inventou o tempo para então ter tempo de inventar o resto... inventou o céu que era para ter onde morar... e como o céu tinha que ficar em cima de alguma coisa, criou a terra... aí Ele foi e colocou o inferno debaixo da terra... oxente, agora que tem terra, eu tenho que inventar gente para morar lá...”, dizia um fragmento do texto de abertura, o mesmo lido por Prazeres em seu teste. A atriz ficou perplexa com sua personagem, que, segundo ela, tinha tudo a ver consigo mesma. Como se estivesse se materializando em sua vida a Teoria das Coincidências Felizes, do psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, ela interpretou Prazeres, uma senhora que mora na rua principal de Nordestina e tem atividades diversificadas. É uma mulher ativa, alegre e serelepe. Uma profissional em costura, mas faz de tudo um pouco, até confeita bolo e canta para animar as festas da cidade. A sua casa é um atelier de roupas antigas, fantasias, máscaras e adereços para festas. Prazeres é uma senhora prestativa e confidente dos apaixonados, capaz de guardar segredos a sete chaves, para não separar, e revelar para juntar. Numa de suas cenas, a Festa dos Mascarados, ela can152


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia tou A Natureza das Coisas, a mesma canção que escolheu durante os testes ocorridos no Recife. “Em determinada passagem do texto mencionam até o nome de Caruaru. Fiquei muito feliz com tantas coincidências”, revela. As gravações marcaram profundamente a vida da atriz. Ela conta que apesar de ter participado de diversos filmes, nunca foi tão requisitada e tão bem tratada como fora pela produção de A Máquina (o sétimo longa da carreira e o filme que lhe garantiu maior tempo em cena até aqui). “Recebi tratamento VIP, em todos os sentidos”, afirma. Prazeres ouviu do diretor que o seu trabalho havia ido além de todas as suas expectativas e que ele não a iria perder de vista. Alguns acontecimentos inesquecíveis ocorreram na fase das gravações. Quando chegou ao set de filmagens, Prazeres já estava mais ou menos familiarizada com a equipe, sobretudo pela iniciativa da atriz Mariana Ximenes, que espalhou para todos a calorosa receptividade que recebera da atriz quando esteve em Caruaru. A Máquina tinha em seu elenco atores nordestinos e de renome no cenário nacional, como Vladimir Brichta, Lázaro Ramos, Wagner Moura, Aramis Trindade, Fabiana Karla e Paulo Autran, um dos ídolos da atriz. Trabalhar com Paulo Autran e conviver com ele durante os dias em que passou no Rio de Janeiro foi um dos melhores acontecimentos proporcionados pela produção a Prazeres Barbosa. A emoção foi completada quando, certo dia, no horário de almoço, enquanto a equipe levava o ator para um local reservado, onde iria fazer sua refeição, foi interrompida por um pedido do próprio Autran. “Onde está a Prazeres Barbosa? Eu quero almoçar com ela”. Em seguida, foram chamá-la. “Eu me belisquei para ver se estava sonhando”, confessa Prazeres. Outro momento marcante foi a gravação da música tema do filme, que aconteceu no estúdio de Robertinho do Recife. Prazeres dividiu os vocais com o conjunto JPG. “Foi uma emoção ímpar. Além do mais, no momento da Festa dos Mascarados, houve a participação de 250 figurantes, com figurinos da cidade de Bezerros (PE). O melhor de tudo foi saber que no CD com a trilha sonora do filme constaria a música A Natureza das Coisas, com a minha voz”, resume Prazeres. 153


Prazer em Conhecer A Máquina foi produzido pela Globo Filmes. A maioria dos profissionais envolvidos na produção estava ligada à emissora. Em 22 de julho, na reta final das gravações, um dos diretores de elenco da emissora sugeriu que Prazeres Barbosa fizesse um cadastro no sistema de atores da empresa. O convite foi feito através de Cibele Santa Cruz, a mesma produtora que manteve contato com a atriz desde o início dos testes. As emoções haviam chegado ao ponto máximo. Fazer um cadastro na TV Globo era o maior sonho de Prazeres, que já havia gravado um texto anos antes, em 1991, na cidade de São José do Rio Preto (SP), mas que não lhe trouxera nenhum resultado. Assim, ela enxergou naquele convite a oportunidade de finalmente ver o seu projeto se concretizar. “Era tudo o que eu queria, porque as pessoas pensam que é fácil fazer um cadastro na emissora, mas não é tanto assim. Eles precisam avaliar se valerá à pena. Além disso, você precisa ter DRT, o que implica ser profissional”, destaca. Nessa época, estava no ar a novela Celebridade, de Gilberto Braga, e a produtora Juliana Silveira entregou a Prazeres um texto retirado do roteiro da trama das oito, protagonizada por Malu Mader e Cláudia Abreu. A atriz teve todos os seus dados anotados, respondeu várias questões sobre vida pessoal e profissional, por fim, gravou o texto. Para efetuar o cadastro, Prazeres contou com o apoio do diretor João Falcão, que a liberou das gravações. Estava plantada a semente. Restava à atriz aguardar as consequências e foi isso que ela fez. Prazeres foi para o Rio de Janeiro no intuito de passar apenas seis dias, mas terminou ficando por lá 12 dias. Ao retornar a seu Estado, a atriz recebeu mais uma grande homenagem. A Federação de Teatro de Pernambuco (Feteape), indicou o seu nome como a grande homenageada do evento Todos Verão Teatro 2004, que aconteceu de 06 a 20 de agosto, no Recife. No hall de entrada do Teatro do Parque, foi montado um painel com o acervo particular da atriz, onde o público pôde constatar a razão da homenagem. No ano seguinte, a atriz foi escalada para o filme, Canta Maria, baseado no romance Os Desvalidos, de Francisco Dantas. O título é uma 154


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia referência à letra de uma canção composta por Daniela Mercury e Gabriel Povoas. Do diretor Francisco Ramalho Jr, Canta Maria foi rodado na cidade de Cabaceiras (PB), cujas ruas asfaltadas foram cobertas com terra, pela produção, seguindo a temática definida para o filme, que tinha em seu elenco José Wilker, Vanessa Giácomo, Marco Ricca, Tião D’Ávila e Neusa Maria Faro. Prazeres fez uma rápida participação, como a “mulher 1”. “Até hoje não vi o filme. Nem lembro bem o que fiz”, conta.

O INÍCIO NA GLOBO

F

azer um cadastro no sistema de atores da Rede Globo de Televisão não representa nenhuma garantia imediata para o artista. As coisas, na maioria das vezes, acontecem de forma vagarosa. Para alguns, sequer acontecem. Quando gravou um texto, em 2004, Prazeres ficou entusiasmada, porém, conteve a expectativa de que algo iria acontecer. “Pensei que fosse mais uma, até porque já havia feito outro que não surtiu nenhum resultado”, diz. Em setembro de 2005, um ano após as gravações de A Máquina, Prazeres Barbosa recebeu uma importante ligação. Era a Rede Globo sondando o interesse da atriz em fazer uma participação no seriado A Diarista, que ia ao ar todas as terças-feiras, às 22h30min, após o humorístico Casseta e Planeta. O seu corpo estremeceu. As emoções tornaram-se incontroláveis naquele momento. Aos 55 anos (sendo 23 deles dedicados ao teatro), finalmente, Prazeres Barbosa teria a oportunidade de ter o seu trabalho visto nas telas do Brasil inteiro e, acima de tudo, na emissora considerada a maior e mais importante cadeia televisiva do País. Imediatamente, a produção reservou a passagem aérea, enviou o texto por e-mail e marcou a data da gravação. Prazeres embarcou no dia seis de setembro de 2005 para o Rio de Janeiro. Assim que chegou ao aeroporto, um motorista estava a sua espera, segurando uma placa com seu nome, para facilitar a identificação. Em seguida, foi levada até o Projac (localizado em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro e considerado o maior núcleo televisivo da América Latina). 155


Prazer em Conhecer Ao adentrar o camarim, Prazeres foi recebida com estusiasmo pelas atrizes Cláudia Rodrigues, Dira Paes, Helena Fernandes e Cláudia Mello, protagonistas do seriado. A boa receptividade deixou-a super descontraída. Prazeres, que nessa época usava cabelos longos e cacheados, brincou com a cabeleireira no momento de arrumar as madeixas de acordo com o figurino. O ator Sérgio Loroza também foi muito gentil com a atriz, chamando-a de “sogra de Marinete”. Prazeres viajou com o texto inteiramente decorado. Quando começaram a gravar as primeiras cenas, o diretor José Alvarenga Júnior gritou: “corta, corta, esquece texto e vamos improvisar que ela tem o tempo da comédia”. Prazeres estava totalmente desinibida e procurou dar o melhor de si. As gravações fluíram naturalmente, de forma que as seis tomadas de cenas foram gravadas no mesmo dia. “Foi a maior alegria da minha vida, um momento ímpar”, disse à imprensa, na época. Em agosto do mesmo ano, a atriz havia sido sondada para participar do seriado Carga Pesada, mas ao ver seu desempenho no texto cômico, o diretor José Alvarenga decidiu que ela merecia uma participação mais significativa. No episódio, Prazeres interpretou Neucete, mãe de Ozinaldo, namorado de Marinete. O casal está em clima de amor quando chega a sogra, uma senhora mandona, chata, implicante e inconveniente, para acabar com a paz entre eles. No final, ela muda completamente quando conhece Figueirinha, por quem se apaixona. O episódio Trago a Diarista Amada em Três Dias foi exibido pela Globo no dia 27 de setembro de 2005. A TV Asa Branca, afiliada da emissora em Caruaru, esteve na casa da atriz, no dia em que as gravações foram ao ar, e mostrou a ansiedade e a alegria de Prazeres, ao lado dos integrantes de sua Companhia Teatral. “A repercussão foi extraordinária. Sinto que todos vibraram comigo”, afirma a atriz. Prazeres teve todas as despesas pagas pela emissora e recebeu um modesto cachê. Em entrevista ao Jornal Vanguarda de Caruaru, de 17 de setembro daquele ano, a atriz disse estar satisfeitíssima com a experiência e que se nada mais viesse a lhe acontecer, já estaria muitíssimo grata e feliz, e completou: “só vou acreditar que é mesmo verdade quando vir na telinha”. 156


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia Durante a estada no Rio, ela foi acolhida pela amiga Fabiana Karla, do seriado Zorra Total, e aproveitou para conhecer alguns pontos turísticos da cidade, antes de retornar a Caruaru. O ano de 2005 foi marcado também pela estreia do espetáculo Whisk pra Guiomar, interrompido antes do previsto pelos trabalhos que foram se sucedendo após a participação no seriado A Diarista. A trajetória na televisão começaria a ganhar novos rumos no ano seguinte. Antes disso, todavia, Prazeres Barbosa aceitou um convite para participar de um curta metragem produzido em Pernambuco. Em 2006, o jovem Eduardo Morotó, natural de Frei Miguelinho (PE), foi selecionado para participar de um projeto do Ministério da Cultura intitulado Revelando os Brasis. O concurso tem como meta possibilitar a gravação de histórias, com até 15 minutos de duração, em municípios brasileiros que possuam no máximo 20 mil habitantes. Eduardo foi ao Rio de Janeiro, onde participou de oficinas e desenvolveu o roteiro do filme. Quando voltou a Pernambuco, ele tinha apenas dois meses para produzir e rodar as imagens. O jovem diretor já conhecia o trabalho de Prazeres no cinema e também em teatro. Ao escrever o roteiro, Eduardo pensou na atriz para criar uma das personagens da trama. Ele entrou em contato com Prazeres e, em seguida, foi até a sua casa para apresentar a proposta. A atriz recebeu o material e algum tempo depois ligou para o diretor confirmando sua participação. “A partir daí ela foi super amorosa e atenciosa. Aprendi muita coisa com ela”, diz Eduardo, que é estudante de cinema da Universidade Estácio de Sá (RJ). As ideias de Eduardo Morotó foram transformadas no curta metragem Agreste Adentro. O filme conta a história de um garoto que vai todos os dias à mesma estrada esperar pelo pai que já morreu. Ele acredita que o pai foi embora, esqueceu de levá-lo e voltará para buscá-lo. Prazeres interpretava Maria, a avó do garoto que sai em busca do pai. “Quando eu visualizava essa personagem, já pensava nela fazendo, porque eu gostei muito do trabalho dela em A Máquina. Foi o meu primeiro contato com cinema”, ressalta Eduardo Morotó. As gravações aconteceram em julho de 2006, na cidade de Frei 157


Prazer em Conhecer Miguelinho. O projeto do Ministério da Cultura custeou a produção e os equipamentos. Nenhum dos atores recebeu cachê, inclusive Prazeres. “Quando eu fui até a casa dela, disse que não tinha remuneração e que a verba era para custos de produção e equipamentos. Prazeres me falou que não costumava mais trabalhar dessa forma e eu até achei que ela não fosse fazer. Depois ela leu o roteiro e topou”, revela o diretor. Agreste Adentro estreou em outubro de 2006 na Cinelândia (RJ). O filme foi exibido também no CinePE; no Festival de Cinema de Belém (PA); no Curta Canoa Quebrada, que acontece no estado do Ceará e outros lugares do Brasil. No mesmo ano, Prazeres Barbosa foi aprovada nos testes de mais uma produção exibida pela TV Globo, a microssérie A Pedra do Reino. Baseada na obra O Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, de Ariano Suassuna, a série de quatro capítulos foi dirigida por Luiz Fernando Carvalho e exibida pela Globo entre os dias 12 e 16 de junho de 2007. A complexidade do texto e o elenco composto apenas por atores nordestinos contribuíram para o fracasso de audiência registrado pela emissora no horário em que A Pedra do Reino foi exibida. Embora tenha sido submetida a alguns testes para integrar o elenco da microssérie, Prazeres Barbosa foi previamente indicada pela diretora de elenco Márcia Andrade, admiradora do trabalho da atriz. Quando a equipe chegou ao Recife, onde realizou uma etapa da seleção, ligou para Prazeres informando acerca dos testes e pedindo indicação de outros atores que pudessem ser encaixados na produção. Terminaram fazendo mais uma seleção em Caruaru. As gravações da série ocorreram na cidade de Taperoá (PB) e duraram cerca de três meses. O elenco ficou hospedado em casas alugadas e trabalhava o dia inteiro. Paravam apenas para comer e dormir. Os horários vagos eram ocupados com atividades afins, como oficinas, exibição de filmes e até aulas de dança do ventre. Poucos atores chegaram a Taperoá com um personagem definido. A Pedra do Reino é um texto essencialmente masculino, com poucas personagens femininas em sua história original, o que dificultava ainda 158


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia mais a definição de personagens. No dia em que se apresentou ao diretor Luiz Fernando Carvalho, Prazeres ouviu um comentário desanimador. Com a mão sob a cabeça da atriz, ele afirmou: “eu não tenho um personagem para você, quer ficar?”. - Olha, eu fiz o teste, fui aprovada, você reaprovou, mandou me chamar e eu estou aqui. Então, vou ficar. - Mesmo sem personagem?, insistiu o diretor. - Mesmo sem personagem. À medida que os dias iam se sucedendo, os atores foram recebendo seus personagens e trabalhando para enriquecê-los. Prazeres participava das oficinas preparatórias e estava envolvida em todas as atividades paralelas, mesmo sem haver recebido qualquer promessa de trabalho. Os colegas de profissão ficavam impressionados com a determinação da atriz. Um deles, o ator pernambucano Walmir Chagas, o “véio mangaba”, ficava contrariado com a paciência da colega. Walmir estava escalado para interpretar dois importantes personagens da história, os irmãos gêmeos Basílio Monteiro e Eusébio Monturo. Aborrecido com a falta de precisão na definição dos trabalhos e também na marcação correta dos horários de gravação, Walmir deixou inclusive de frequentar com assiduidade as oficinas. Depois de desmarcarem três vezes seguidas as filmagens de suas cenas, ele escreveu um bilhete para o diretor dizendo que não tinha tempo a perder e que estava indo embora. A produção ficou desesperada, pois iria rodar as cenas no dia seguinte e não havia quem o substituísse. A persistência de Prazeres Barbosa já durava mais de dois meses. Todos comentavam a sua disposição em permanecer na cidade sem ao menos saber se iria participar daquele trabalho. No dia em que Walmir Chagas foi embora de Taperoá, às 23h a atriz estava na casa em que ficara hospedada, assistindo a um filme, quando alguém bateu à porta, dizendo que Maria Clara mandara chamá-la. Maria Clara era uma das produtoras da microssérie e, geralmente, quando um ator era chamado à sua sala, recebia alguma bronca. Prazeres ficou amedrontada e perguntou para si própria o que havia feito de errado. 159


Prazer em Conhecer Quando foi ao encontro da produtora, a atriz foi recebida com um abraço, o que aliviou a péssima sensação de que iria receber alguma punição. - Olha, aconteceu um fato ruim, o ator Walmir foi embora, a gente precisa gravar amanhã e Luiz Fernando está “louco”. Eu disse para ele que havia uma pessoa que daria conta dos personagens e essa pessoa era Prazeres Barbosa. Ele receou por você ser mulher, mas disse que eu aprontasse. Prazeres não conteve as lágrimas. “Eu acredito em você, tenho lhe observado todo esse tempo e você tem um potencial incrível”, completou a produtora. Poucos instantes depois, a atriz estava vestida com o figurino do primeiro personagem. “Ele (Basílio Monteiro) usa bengala, fuma charuto e usa chapéu”, disse Prazeres para o diretor Luiz Fernando Carvalho, com roupas folgadas e calçando botas tamanho 42 (oito números a mais que o seu normal). A cena provocou muitos risos. Depois, o diretor mandou que ela trocasse o outro personagem. “Ele usa óculos, tem sempre um jornal à mão e é revolucionário”, descreveu, acerca do irmão Euzébio Monturo, antes de apresentar sua performance. Após as apresentações, Luiz Fernando determinou que Prazeres Barbosa iria interpretar os dois personagens. A atriz não havia recebido nenhum texto e no dia seguinte gravaria a primeira cena. Prazeres deixou o camarim perplexa, não apenas com a boa notícia que havia recebido, mas por outra decisão tomada por Luiz Fernando. O diretor enchera as mãos com os longos cachos da atriz e ordenara a Vavá (um dos mais requisitados maquiadores da Globo): “corta”. Dois minutos depois, Prazeres Barbosa estava praticamente sem cabelos. Mas a felicidade de interpretar dois personagens masculinos ocultou o impacto sentido ao perder a cabeleira que ela havia preservado durante muitos anos. “Eu adorava meus cachinhos e liguei na madrugada para Francisco contando que estava sem eles”, lembra Prazeres. Hoje, a atriz mantém cabelos curtos e sempre escovados. “Meu cabelo era macio e sedoso, mas eu não percebia o quanto envelhecia com ele. Meu filho sempre me dizia isso, mas não me conformava. Sempre que ia fazer alguma coisa na Globo eles escovavam e eu me sentia ridícula. Fabiana Karla dizia que se um dia eu fosse morar no Rio teria que tirar o cabelo 160


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia de pobre (risos). Dito e feito. Hoje estou completamente adaptada a isso e adoro passar a mão no meu cabelo lisinho”, confessa. No dia seguinte, todo o elenco estava reunido na praça principal da cidade cenográfica para gravar a cena da chegada do Comendador Basílio, acompanhado por uma banda musical. Prazeres espelhou-se na fanfarra dos grandes homens e entrou dando fortes baforadas em seu charuto. A cena desconcentrou toda a equipe, que caiu na risada, afinal, todos esperavam a entrada de Walmir Chagas. “Pronto, pronto, é Prazeres Barbosa. Volta tudo novamente e concentração”, determinou o diretor. Em seguida, Prazeres recebeu mais duas personagens, uma velha senhora fanática do Sebastianismo e uma engraçada prostituta. “A partir dali, os olhares para mim eram outros”, revela a atriz. “Eu fui perseverante até o fim, ligava para Francisco dizendo que estava desesperada, mas que iria permanecer”, completa. Para dar vida aos irmãos gêmeos, a atriz fez apenas um pedido ao diretor. Prazeres explicou que não iria mudar radicalmente a sua voz, mas prometia ter a alma masculina ao interpretá-los. Quando terminaram as gravações, Luiz Fernando, que é uma pessoa bastante reservada, colocou a mão sobre o ombro da atriz e saíram caminhando pela cidade. “Olha, eu estou muito satisfeito com você e lhe digo: você é um macho dos colhões roxos”, afirmou ele, na ocasião, justificando a perfeição com que ela compôs os personagens e a forma natural como agiu numa cena em que um dos irmãos seduzia uma mulher. O ano seguinte foi decisivo para a mudança de foco na trajetória artística de Prazeres. Após 25 anos de carreira nos palcos caruaruenses e com uma história marcante no cinema, a atriz foi convidada para compor o elenco fixo de uma telenovela na Globo e acabou trocando sua cidade natal pelo Rio de Janeiro. Em 2007, Prazeres teve ainda a oportunidade de gravar mais uma participação no seriado A Diarista. Quando filmou a primeira participação no programa, em 2005, Prazeres Barbosa agradeceu o convite ao diretor José Alvarenga Júnior e ouviu dele que aquela não seria a última, mas a primeira de outras participações. “Você é ótima! Acho que não vai demorar para a gente se ver 161


Prazer em Conhecer de novo”, disse, ao se despedir da atriz. O reencontro ocorreu dois anos depois, quando ela foi convidada para interpretar mais uma sogra da personagem Marinete. O episódio Aquele do Engarrafamento foi rodado nos dias 20 e 21 de junho, em externa, com locação no Parque de Diversões Terra Encantada (RJ). Prazeres deu vida à Cleumira, uma mulher com sotaque nordestino, um pouco mais refinada que a primeira sogra interpretada por ela e com visual conservador. Aproveitando a temática dos Jogos Panamericanos que aconteciam na cidade, os autores resolveram recriar várias situações em meio ao trânsito caótico. Num determinado momento, Marinete e Cleumira se encontram, batem boca e nas cenas seguintes acabam se dando conta de quem é quem. A confusão está armada. Prazeres já estava familiarizada com a equipe do programa e, nos bastidores, recebeu um incentivo importante da atriz Dira Paes (que interpretava a engraçada Solineuza). “Prazeres, esquece que tem tua idade, imagina que tem 16 anos e vem embora para o Rio de Janeiro”, orientou Dira, que é natural de Abaetetuba (PA). O episódio foi transmitido em julho de 2007 e, no dia 24 do mês seguinte, a atriz recebeu uma ligação definitiva da emissora. Já passava da meia-noite quando a diretora de elenco, Márcia Andrade, ligou para Prazeres, em Caruaru. A ligação veio acompanhada com um convite muito especial. Dois anos após colocar os pés pela primeira vez no Projac, Prazeres Barbosa retornaria ao centro de produções, mas com uma pequena diferença: desta vez seria para ficar. A diretora pediu que a atriz enviasse à emissora um DVD contendo trechos de suas participações no cinema. Prazeres passou horas selecionando o material e enviou no dia seguinte à Globo. As cenas foram vistas pelo diretor Wolf Maya, que gostou do resultado e ligou para o autor Aguinaldo Silva informando que havia encontrado a pessoa certa para dar vida à Shirley, uma das empregadas do elenco da novela Duas Caras, exibida no horário das 21h. Em seguida, as equipes de figurino e contrato colheram todos os dados e informações pessoais sobre a atriz, que viajou para o Rio de Janeiro no dia 15 de setembro 162


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia daquele ano. A primeira pousada de Prazeres na Cidade Maravilhosa foi o apartamento de Eduardo Morotó, com quem havia trabalhado no curta-metragem Agreste Adentro. “Isso eu não esqueço, porque ele deu a cama para eu dormir e dormia no chão, ao meu lado”, lembra Prazeres, que ficou cerca de duas semanas dividindo moradia com o amigo, até que a emissora colocou à sua disposição um apartamento na Avenida General Guedes da Fontoura, na Barra de Tijuca, de frente para o mar. O primeiro dos 210 capítulos da novela Duas Caras foi exibido no dia 1º de outubro de 2007. Prazeres Barbosa apareceu na trama pela primeira vez no segundo capítulo, veiculado no dia dois. A data deixou marcas profundas de eternas lembranças em sua vida, decorrentes dos momentos antagônicos experimentados naquele dia. Ao passo em que estreava sua primeira novela, em cena com a atriz Letícia Spiller, Prazeres completava naquele dia 58 anos de vida e precisou voltar às pressas a Caruaru. Em dois de outubro de 2007, a atriz perdia uma das pessoas mais importantes de sua vida, não apenas por havê-la criado e educado, mas por ter desempenhado um papel importantíssimo ao longo dos anos que viveram juntas. Aos 90 anos, Antonina Barbosa deixava o mundo dos viventes e tornava órfã a filha que a tinha como mãe, amiga e confidente. Morreu adepta da religião evangélica, que nunca abandonou mesmo com a pressão do esposo, ao ameaçar deixá-la caso se convertesse ao protestantismo. Da Paz e Neves estavam com a mãe no momento de seu falecimento. Prazeres soube da notícia através do sobrinho, Júlio Filho, que telefonou para ela no Rio. “Fiquei imensamente triste e desnorteada. A produção da novela soube e me mandou imediatamente para Caruaru. Senti o esteio da nossa casa desmoronar, mas sei que mamãe não morreu, ela foi ao encontro de Deus”, afirma Prazeres. “Mamãe morreu louvando ao Senhor. Pedia perdão a Deus. Ela se preparou para partir”, externa Neves, que cuidou da mãe nos últimos três anos de vida. Dona Antonina foi apaziguadora, em todas as situações. Morreu tentando unir a família. Queria ver a paz entre todas as filhas, mas não conseguiu. Apesar das dificuldades de relacionamento com o marido, ela 163


Prazer em Conhecer sempre zelou por ele, do primeiro ao último dia, mesmo separados. “Minha mãe era muito crítica. Ela tinha todas as qualidades, sempre falou com o olhar”, resume Mercês. “Era uma abençoada que morreu sem nenhuma doença. Balbuciou o hino Segura na Mão de Deus e Vai até os últimos instantes de vida. Morreu sorrindo. Não gemeu e nem chorou. Morreu como um anjo”, descreve Maria da Paz. Seu Antonio Inácio fumou praticamente a vida inteira. Nos últimos meses de vida ele adoeceu. Como havia dito anos atrás, quando o marido abandonou a família, dona Antonina cumpriu sua palavra. Antonio Inácio tinha um casal de filhos extraconjugais, Antonio e Maria Luiza, e estava vivendo na casa da Rua Martin Afonso com o rapaz, após separar-se da segunda mulher. Ela então mandou que Bernardo o trouxesse de volta para casa. Maria da Paz, Neves, Mercês e Socorro cuidaram do pai. No dia de sua morte, Antonio Inácio, aos 93 anos, porém, sem doenças aparentes, acordou, tomou banho, café, almoçou e jantou. Sentou-se numa cadeira de balanço e, por volta das 20h, foi, aos poucos, perdendo a respiração. Socorro Barbosa pôs a mão em seu coração e percebeu que os batimentos do pai foram parando até que ele expirou. Retiraram o corpo e o encaminharam ao Instituto de Medicina Legal. Dona Antonina o viu apenas no dia seguinte, já no velório. A casa em que a família morou, na Praça Coronel Porto, era espaçosa, mas desgastada. Havia muitas goteiras e Bernardo prometeu à mãe que, quando melhorasse de vida, compraria um espaço melhor para ela viver. À medida que foi se firmando, iniciou a construção de um imóvel na Rua Imperatriz Leopoldina, bairro Indianópolis, em Caruaru. Na época, ele estava noivo e as irmãs pensavam que a casa seria para seu uso. Porém, quando a construção foi concluída, ele cedeu para a mãe viver. Lá, faleceram seu Antonio Inácio e dona Antonina. Bernardo manteve os pais até os últimos instantes de vida. A maioria dos irmãos é enfática ao reconhecer sua contribuição. Além dele, Socorro Barbosa também é lembrada quando o assunto é solidariedade. “O esteio da nossa família foi Socorro, que se doou financeira e intelectualmente a todos os irmãos, para que eles vivessem bem, inclusive ajudando a 164


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia educar os sobrinhos e, Bernardo, por ter o melhor poder aquisitivo. Num período em que enfrentei dificuldades, já casada, fui morar em Feira de Santana (BA). Minha filha, Lucivanda, ficou com mamãe e as minhas irmãs. Socorro foi uma mãe para ela”, externa Maria da Paz.

DUAS CARAS: A PRIMEIRA NOVELA

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m Duas Caras, novela de Aguinaldo Silva, com direção geral de Wolf Maya, Prazeres foi escalada para o núcleo cômico da trama, formado ainda pelos atores Letícia Spiller (Maria Eva), Oscar Magrine (Gabriel), Sérgio Vieira (Petrus) e Marcela Barroso (Ramona). Apesar da boa sintonia entre eles em cena e da personagem vivida por Prazeres ter popularizado o bordão “arrasou meu bem”, Shirley não deslanchou. A atriz acredita que o principal motivo da não ascensão foi o fato de ela não ter vida própria dentro da história. “Naquele momento em que ela foi morar na Favela da Portelinha eu pensei que Shirley fosse crescer na trama, mas não aconteceu. Então, acho que fui incompetente, porque se eu tivesse sido competente o autor teria escrito para mim. Eu me mantive o tempo todo quieta no meu lugar, talvez essa inibição tenha atrapalhado um pouco. Mas Wolf Maya me disse que a primeira novela era sempre assim e que eu ficasse tranquila”, explica. Prazeres teve oportunidade de contracenar com grandes artistas em sua primeira novela, a exemplo de Renata Sorrah, Débora Falabella, Bárbara Borges, Lázaro Ramos, Fafy Siqueira e Antonio Fagundes. Duas Caras foi exibida pela última vez em 31 de maio de 2008. O encerramento aconteceu no Shopping Downtown, na Barra da Tijuca. “Quando eu assistia em casa, sempre sonhava em participar de uma festa como aquela. Parecia mentira. Tudo o que eu via na televisão, porque eu adoro o Vídeo Show, aconteceu naquele dia”, resume a atriz. Prazeres, aliás, teve oportunidade de ser entrevistada pelo seu programa favorito na época da novela. A atriz foi destaque no quadro Caras Novas, que a apresentou como “Prazeres Barbosa, de Caruaru para o Rio de Janeiro e do Rio de Janeiro para o Mundo”. À medida que a atriz fala165


Prazer em Conhecer va, a reportagem transmitia cenas de seus trabalhos e destacava a atuação nos palcos e no cinema. Fizeram questão de dizer que ela “veio para ficar”. “Uma coisa que eu gosto de registrar é que sou uma atriz brasileira, pernambucana e caruaruense, porque tenho um orgulho e um carinho muito grande pela minha cidade. Eu não desconhecerei isso nunca, porque esse foi o meu berço de formação”, destaca. Assim que terminaram as gravações da novela, Prazeres foi convidada para mais uma produção global, o seriado Por Toda Minha Vida, que presta homenagens póstumas a artistas que marcaram época no Brasil. A atriz viveu dona Aurélia, mãe do apresentador Chacrinha (homenageado da série), na fase de seus 19 anos. O programa, dirigido pelo jovem Pedro Vasconcelos, foi exibido em agosto de 2008. Na reta final da novela A Favorita, de João Emanuel Carneiro (um dos grandes sucessos da emissora no horário nobre, protagonizado por Cláudia Raia e Patrícia Pillar), Prazeres foi convidada para interpretar a Tia Raimunda, uma mulher nordestina que precisa fazer o parto de sua parente mais próxima, a personagem Céu (Déborah Secco). As gravações aconteceram em janeiro de 2009. Além de reencontrar o ator pernambucano Zé Ramos, com quem atuou no espetáculo NegroRei (1997), Prazeres Barbosa foi recebida com festa pela atriz Mariana Ximenes, que interpretava a rebelde e radical Lara. “Quando ela me viu, foi logo me chamando de ‘mainha’. Disse a todos os atores que ela foi à minha casa e ficou três dias por lá”, relembra Prazeres, que teve ainda a oportunidade de conhecer a atriz Glória Menezes. Dias antes, Prazeres Barbosa havia ido até o Teatro Leblon, acompanhada pelo ator pernambucano Lucas Neves, para assistir ao espetáculo Ensina-me a Viver, estrelado por Glória Menezes. O ingresso custava R$ 80,00 e como não aceitaram meia-entrada, acabaram voltando sem assistir. Quando almoçava com a equipe da novela no Projac, Prazeres recebeu da própria atriz um convite para assistir à peça. “O par romântico dela era um rapaz de 16 anos e eu queria muito ver esse espetáculo”, conta Prazeres, que na época estava namorando o jovem Chrystian e se identificou com a história. 166


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia A atriz ressalta que nunca sofreu qualquer tipo de discriminação na emissora pelo fato de ser nordestina. “Eu costumo dizer que não gosto de me espelhar naqueles que não chegaram lá, mas naqueles que chegaram, como Fabiana Karla, Wagner Moura, Lázaro Ramos, Arlete Salles, porque são pessoas que saíram do Nordeste e estão provando que o artista nordestino também brilha. Eu sempre quero focar a minha vida, minhas ilusões e meus sonhos em pessoas que venceram”, confessa. O contrário não se pode afirmar dos profissionais de sua própria região. Prazeres sempre quis participar do espetáculo da Paixão de Cristo, em Fazenda Nova (PE), onde existe o maior teatro ao ar livre do mundo, mas foi literalmente barrada por um dos diretores do evento. “Ouvi ele dizer para mim que precisavam de mulheres altas, bonitas e jovens. Nunca mais disse sequer que tinha vontade”, afirma, em tom de desânimo. Do relacionamento mantido com os colegas de profissão, na Globo, Prazeres garante que tem apenas boas situações para comentar. “Deborah Secco, Cauã Reymond e Iran Malfitano, são meninos carinhosos, amigos. Por exemplo, Wolf Maya quando me viu, disse: ‘poxa, você é uma atriz da porra, pena que está fazendo esse papel sem vida, mas você é arretada menina’. Ouvir isso de um Wolf Maya? Também vi Renata Sorrah dizer ao diretor: ‘você não imagina o monstro que é essa menina’. Eu começo a ter consciência de que não sou uma atriz medíocre, mas sei que ainda não estou no patamar das grandes estrelas”, diz. Apesar de ter realizado o sonho de trabalhar na televisão somente aos 55 anos, em plena maturidade, Prazeres acredita que o reconhecimento não tardou. “Acho que as coisas acontecem no seu tempo. Nada é tarde, nada é cedo, apenas acontece no momento em que tem que acontecer”, justifica. “O tempo chegou e tenho feito várias coisas para a Globo. Na TV o artista começa a ser mais valorizado. Hoje, as pessoas me abraçam como se eu fosse diferente, mas na verdade somos todos iguais. Artistas são pessoas comuns, que choram, têm problemas de saúde e de família”, completa. A felicidade de estar onde sempre quis ainda a torna um pouco cética, diante dos acontecimentos que vêm se sucedendo. “Quando me vejo dentro do Projac, aquela monstruosidade de lugar, agradeço a Deus e muitas vezes 167


Prazer em Conhecer duvido de que realmente estou lá. A cada trabalho sinto que vou adquirindo um milésimo de experiência, porque estou num ambiente completamente desconhecido. Era tudo o que eu sempre quis”, afirma Prazeres. Sobre o fato de interpretar personagens nordestinos e serviçais nas novelas e seriados até aqui, a atriz diz não enxergar as oportunidades como estigma, mas algo natural e decorrente da natureza específica de cada trabalho. “Televisão e cinema trabalham com perfil. No teatro eu posso interpretar uma menina de 15 anos, na TV não. Quando eles procuram o perfil de uma mulher nordestina, a partir de 50 anos, aparecem na tela uma infinidade de atrizes. E eu tenho tido muita sorte, porque o meu rosto e o meu jeito são de nordestinos e casa bem com o que eles querem. Fico muito vaidosa em relação a isso, pois não fui indicada por ninguém”, ressalta. Outro fato importante nesse novo momento da carreira artística de Prazeres Barbosa é que os trabalhos vão surgindo sem que ela corra atrás de nenhuma oportunidade. “Alguns colegas sempre dizem para eu telefonar para diretores e produtores, mas nunca liguei. A única vez que entrei em contato foi quando mudei definitivamente para o Rio e enviei e-mail para todos eles informando”, revela. Alguns meses após o término da novela Duas Caras, Prazeres foi submetida a um processo cirúrgico que mudou radicalmente o seu visual. O face lifiting (cirurgia de face e do pescoço), foi feito na Clínica Ivo Pitanguy, no bairro de Botafogo (RJ), pela Dra. Natale Ferreira Gontijo de Amorim. A médica conheceu Prazeres de uma forma inusitada e deixou a atriz intrigada ao lhe oferecer a cirurgia plástica. Em 2007, quando foi ao Rio gravar sua participação no seriado A Diarista, Prazeres aguardava o vôo para retornar a Caruaru, quando foi abordada pela fiscalização do Aeroporto do Galeão para que pagasse a quantia de R$ 15,00 a fim de garantir a segurança de sua bagagem. Irritada, ela reagiu. “Como garantir a minha bagagem? Eu estou viajando, pagando a passagem e ainda preciso de segurança para a minha bagagem. Não meu bem, isso é um assalto”, disse, naquele momento. Em seguida, a atriz sentou-se ao lado de uma jovem senhora e perguntou para ela se também havia sido abordada. Ela respondeu que não. 168


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia Acostumada à correria da ponte aérea Rio - São Paulo - Minas Gerais, a Dra. Natale jamais havia conversado com alguém num aeroporto, mas logo se identificou com a comunicativa senhora, aparentemente irritada. As duas iniciaram uma conversa e Prazeres explicou que esteve no Rio gravando um trabalho para a Globo e agora estava voltando a Caruaru. A médica observava atentamente cada detalhe da atriz. Assim que chegou a hora de embarcar, as duas se despediram. - Gostei muito de você. Você é uma pessoa muito boa, disse a médica. - Ah, a gente nem se conhece, mas é que eu gosto de fazer amizades, respondeu Prazeres. - Eu gostaria de lhe dar um presente, afirmou a Dra. Natale - Como assim, você nem me conhece?, resistiu. - Eu vejo que você é uma boa atriz, mas acho que quando a gente lida com a imagem, precisa sempre melhorar e eu gostaria de lhe oferecer um rejuvenescimento. Naquela hora, Prazeres imaginou que a jovem mulher estivesse lhe oferecendo algum tipo de produto de beleza e respondeu que sempre usava cremes para não envelhecer a pele. A médica perguntou se ela aceitava o presente. Um pouco desconfiada, respondeu que sim. Antes de partir, ela entregou um cartão a Prazeres. “Quando eu olhei, estava escrito que ela trabalhava na Clínica Ivo Pitanguy. Fiquei surpresa e ela me disse que era cirurgiã plástica. Eu disse que nunca pensei em fazer uma cirurgia e quase não acreditei. No final, trocamos telefone e e-mail e ela foi embora”, lembra. Quando chegou a Caruaru, Prazeres contou às pessoas o que havia acontecido. A atriz achou aquela situação cômica e pensou que fosse “um conto de fadas”. Dois meses depois, quando recebeu o convite para a novela Duas Caras, ela resolveu escrever um e-mail para a médica, informando que estava indo para o Rio de Janeiro. Para sua surpresa, a Dra. Natale lhe respondeu, dizendo que queria encontrá-la. As duas passaram um dia juntas em Ipanema. “Ela me levou ao Gula Gula, que é o local onde existe a melhor comida do lugar. Passeamos à beira-mar, tomamos água de coco e trocamos ideias. Outra vez ela al169


Prazer em Conhecer moçou comigo e eu fiz a comida do Nordeste. Nos tornamos amigas e ela me levou para conhecer o seu esposo, o Dr. Charles Sá. Eles me levaram para o cinema, para a pizzaria e eu me sentindo uma criança nas mãos deles. Depois, combinamos para fazer a cirurgia quando acabasse a novela”, conta Prazeres. Assim que terminaram as gravações, em maio de 2008, a atriz enfrentava aquele período conturbado em sua relação com Francisco Torres e a médica incentivou-a a resolver os problemas para ficar calma. A atriz fez todos os exames no Rio e, em seguida, foi para Caruaru comunicar ao marido a separação. De lá, escreveu um novo e-mail para a médica informando a data que retornaria. A resposta foi imediata e continha o dia da cirurgia: seis de julho. Já no Rio, a atriz passou por uma perícia e teve os seus exames avaliados. A médica perguntou o que a incomodava e ela respondeu que o seu pescoço a deixava com a aparência envelhecida. Dra. Natale sugeriu uma “levantada” geral. Prazeres concordou, afinal, estava recebendo um presente. Marcada a cirurgia, a atriz chegou à clínica acompanhada pelo filho, Vergílio Barbosa. Toda a equipe já estava preparada para recebê-la. O médico cardiologista a cumprimentou e mandou que ela tomasse um comprimido. Demorou alguns instantes e ela disse para o filho que não estava sentindo nenhuma reação. Em seguida, “apagou”. Prazeres entrou na sala de cirurgia às oito horas da manhã e acordou às nove da noite, com a cabeça totalmente enfaixada. Quando abriu os olhos, ela perguntou a Vergílio se os médicos haviam terminado a cirurgia. “Já mamãe, a senhora está toda cirurgiada”, respondeu o filho. Quando ele informou a hora, ela demorou a acreditar. Prazeres ficou internada na clínica durante dois dias, ingerindo apenas líquidos e depois recebeu alta. A médica afirmou que o período de recuperação iria durar seis meses. A atriz não sentiu nenhuma dor no pós-operatório e se recuperou rapidamente. “Dormi um mês com a cabeça mais alta que o corpo, para que nada ficasse deformado. Dra. Natale achou incrível, pois com um mês eu já estava praticamente sem inchaço. Depois eu agradeci, dizendo que tinha apenas a minha amizade para oferecer e ela 170


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia respondeu que aquilo lhe bastava”, relembra. Prazeres continuou indo ao consultório até ser liberada definitivamente. “Quando fui tirar as fotos para vermos o antes e o depois, as pessoas não acreditavam que era eu mesma. Estava completamente diferente. Acho que rejuvenesci mais de 10 anos. Isso é um conto de fadas e eu disse à Dra. Natale que ficava constrangida, afinal não se costuma oferecer vaidade de presente para ninguém”, confessa a atriz, que decidiu emagrecer nesse período, fazendo dieta e caminhada. “Ela ficou muito feliz com essa cirurgia. O cansaço físico dela estava marcado na face”, analisa a irmã, Maria da Glória. No Rio de Janeiro, Prazeres retomou as origens e tem feito várias oficinas de teatro no Sesc Copacabana, com renomados professores. Numa delas, a atriz participou da leitura dramatizada do clássico Édipo Rei, ministrada pelos professores Eduardo Wotzik e Gustavo Gasparini, com participação de um elenco de peso composto por Renata Sorrah, Amir Haddad, Pedro Paulo Rangel e Nelson Xavier. Nessas oficinas, a atriz recebeu um convite para integrar o elenco do espetáculo O Ruído das Teresas. Johnny Luz, um dos diretores que estava no Sesc, explicou para ela que havia iniciado a montagem de um espetáculo e uma das atrizes abandonara o projeto para fazer um trabalho para o Governo de Pernambuco. “Ele disse que me achou interessante e perguntou se eu aceitaria participar da peça. Tudo o que eu queria era fazer teatro no Rio, pois é complicado para mim, que estou iniciando agora, estrear um espetáculo na cidade”, afirma. A autora do texto, a atriz Mary Ellen Aquino, conferiu o material de Prazeres disponível na internet e aprovou a indicação. “Nós passamos o texto e eu adorei”, destaca. O Ruído das Teresas é um musical de humor mórbido sobre a desordem entre fantasia e realidade. A peça diverte ao passo que leva o espectador a sonhar, trazendo várias reflexões sobre o universo feminino, remetendo a temas como amor, sexualidade, fama, inveja, esquizofrenia e loucura. O espetáculo seria encenado por Prazeres Barbosa e pela atriz Ângela Valério. Os ensaios ocorreram no apartamento de Ângela, pela dificuldade que existe em encontrar espaço disponível nos teatros do Rio de 171


Prazer em Conhecer Janeiro. “A ideia era que a peça viajasse o Brasil inteiro e eu queria que minha cidade fosse presenteada, pois seria uma forma de matar a saudade dos palcos caruaruenses e de as pessoas verem o meu trabalho”, diz Prazeres. Por falta de patrocínio, o espetáculo não chegou a acontecer. Esse novo momento vivido por Prazeres, entretanto, tem lhe permitido a rara oportunidade de, aos 60 anos, conseguir sobreviver da própria arte. Atualmente, ela é contratada pela Rede Globo de Televisão e tem trabalhado para se firmar no mundo das produções televisivas no Brasil. “Prazeres acredita no seu potencial, por isso, aos 60 anos, enquanto muitas se aposentam, ela encontra seu lugar num mundo de estrelas. Prazeres conquista mais que sucesso: amor dos seus, respeito dos colegas e admiração de quem só pode vê-la nas telas pequenas e grandes da vida”, comenta Lucivanda Leite, sobrinha da atriz. Para o diretor José Manoel Sobrinho, Prazeres é uma atriz de projeto e uma referência por suas habilidades criativas, mas também por sua capacidade de dirigir a própria carreira. “Estive com ela no Rio de Janeiro e vi como tem sido difícil, como a luta é perene. Impressiona-me a capacidade de continuar decidindo sobre a sua trajetória, disputando num mercado insalubre e saturado. Acredito que Prazeres Barbosa está a procura de mais uma infinidade de grandes personagens para continuar construindo uma das histórias mais bonitas do teatro pernambucano”, expressa José Manoel.

UM ESPAÇO PARA VIVER ARTE

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eralmente, o artista que trabalha em produções cinematográficas recebe um cachê determinado no momento em que assina o contrato. Quando gravou A Máquina, Prazeres Barbosa recebia por dias trabalhados. A atriz gravou cenas durante doze dias e o dinheiro conquistado possibilitou o início de um antigo projeto. Do valor recebido, ela destinou sete mil reais para a construção do seu próprio teatro. A ideia da atriz, ao criar o Teatro Prazeres Barbosa, além de manter a sua Companhia num local fixo (eles nunca tiveram uma sede oficial e sempre utilizaram o prédio da Casa de Cultura José Condé), era trabalhar 172


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia os diversos segmentos artísticos com as comunidades de bairros periféricos em Caruaru. “A arte leva a tudo”, defende Prazeres. O espaço seria uma forma de superar outra grande dificuldade enfrentada pelos artistas de Caruaru: a ausência de um Teatro Municipal. Na cidade, existem apenas quatro teatros, o João Lyra Filho, o Teatro do Sesc (privado), Teatro Lícius Neves (criado pelo Tea), além do Teatro Difusora, que é, na verdade, um grande auditório. “Isso é lamentável, algo deplorável. Caruaru tem mais de 150 anos e o que a cidade tem oferecido a esse berço de artistas? Todos os que passaram pela administração têm uma parcela de culpa. Eu não sou ninguém e fiz um teatro que comporta entre 130 e 150 pessoas”, critica Prazeres. Desde os tempos da Escola Elisete Lopes, quando desenvolvia atividades artísticas nos finais de semana, ela mantinha o desejo de permanecer contribuindo para o desenvolvimento pessoal de pessoas que necessitam de oportunidades. “Queria desenvolver teatro, música, artes plásticas, dança, reunião para a terceira idade, enfim, trabalhos que promovessem o crescimento pessoal e intelectual do indivíduo. Esse foi o meu grande objetivo ao construir o meu teatro, não pela vaidade de tê-lo, mas pela necessidade de formar e ajudar pessoas”, analisa. Na mesma rua onde viveu, no bairro Caiucá, a atriz possuía um terreno e começou a traçar o projeto por conta própria. Adiante, chamou um pedreiro, fez o orçamento, mandou limpar o espaço e, no outro dia começaram a construção. Era 25 de julho de 2006, quando Prazeres e seu Expedito, o pedreiro contratado, iniciaram o alicerce do prédio. Exatamente como ocorrera no período em que estava construindo a sua casa, ela começou as obras com poucos recursos. A conclusão foi possível graças à ajuda que recebeu de amigos decididos a compartilhar do seu sonho. “Contei com o apoio de muitas pessoas queridas, por isso prefiro não citar nomes para não correr o risco de esquecer ninguém”, afirma. Um presente recebido por ela, na concepção do teatro, porém, merece ser registrado. No período em que iniciou a construção, Prazeres estava gravando o curta Agreste Adentro, onde contracenava com o artista plástico Caxiado, um ícone das artes no Estado de Pernambuco. 173


Prazer em Conhecer Interessada em ter uma obra sua no hall de entrada do teatro, a atriz contou para Caxiado sobre a iniciativa. “Disse para ele que não poderia pagar o preço que uma obra sua merecia”, diz Prazeres. Quando terminaram as gravações, Caxiado foi até a casa da amiga e pegou algumas fotografias dela. Alguns dias depois, ele iniciou a criação de sua obra. Um grandioso painel de cimento em alto relevo, com a imagem de Prazeres Barbosa ao lado de elementos da cultura pernambucana e de alguns de seus personagens. Abaixo da imagem, está escrita uma frase sugerida pela própria atriz e que descreve sua real intenção ao pensar na criação do espaço: “Aqui plantarei esperanças e serei feliz”. O resultado deixou-a muito contente. “Eu quase não acreditei. Só existe outro trabalho daquele no Museu do Barro, no Espaço Cultural de Caruaru. A obra de Caxiado é o que existe de maior valor em meu teatro, vale mais do que o próprio prédio. Ele fez com o maior amor e quando o procurei para acertar as contas, ele me disse que era um presente”, recorda. A parte superior do teatro, construída em formato de moradia, para abrigar camarins, figurinos e parte de seu acervo, foi pensada propositalmente pela atriz. “Como não sei o que a velhice maior me espera, se algum dia tiver que voltar a Caruaru, vou morar lá. Viverei em cima e farei teatro embaixo”, explica. Quando as obras completaram um ano e já estavam quase prontas, Prazeres fez um bolo para comemorar junto com os pedreiros. “Em 2008, eu terminei definitivamente”, destaca. No Rio de Janeiro, a atriz comprou 150 cadeiras para instalar no espaço. Em junho de 2009, quando esteve em sua terra, viabilizou o fornecimento de energia elétrica e água para o espaço. Prazeres pretendia inaugurar o teatro assim que ficasse pronto, mas sua ida para o Rio de Janeiro a impediu de concretizar o projeto. Junto com Francisco Torres, ela chegou a confeccionar os troféus que iria distribuir a cada um dos parceiros que a ajudaram. “Mas ‘amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada’ e houve esse desvio. Eu não me arrependo de nada, amanhã posso voltar e começar tudo novamente. Se não voltar, outros farão”, afirma. A Fundação de Cultura e Turismo de Caruaru demonstrou interesse em ocupar o prédio para desenvolver atividades culturais com a ju174


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia ventude. O contrato está em fase de andamento. “Não tenho pensamentos imediatos, mas espero algum dia inaugurá-lo com meu nome. Ainda preciso regularizá-lo. Quero envelhecer fazendo teatro e gostaria inclusive de construir um túmulo lá, mas fiquei sabendo que não é possível”, revela. “Esse teatro não é apenas do interesse da Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa ou de uma atriz, é a possibilidade de um espaço para formação, fruição e circulação da produção de teatro em Pernambuco e Caruaru. Sem dúvidas, vai representar para a comunidade uma transformação real de pensamento, principalmente de crianças e adolescentes. É um teatro de Caruaru”, analisa Romualdo Freitas. A mudança da atriz para o Rio também contribuiu para que os trabalhos da Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa parassem definitivamente. Nesse período, o grupo teve dois espetáculos aprovados pelo Prêmio Miriam Muniz, promovido pela Funarte, com patrocínio da Petrobrás. Com A Feira, fizeram 10 apresentações no Teatro João Lyra Filho. Como Prazeres já estava no Rio, acabou sendo substituída por outra atriz, selecionada para interpretar a velha Filó. Os Brincantes do Boi Estrelado, texto de Benício Júnior, foi apresentado em comunidades de Caruaru. A ida definitiva de Francisco para o Rio de Janeiro, no início de 2009, representou o fim dos trabalhos realizados pela Companhia Prazeres Barbosa ao longo de 17 anos. “Hoje ela está parada. O nosso último trabalho foi no São João de 2008, com a parte de dança. Já que estamos definitivamente no Rio, decidimos parar”, explica Francisco.

PROJETOS E DESAFIOS

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iferente do teatro, quando o ator tem liberdade para montar os seus próprios espetáculos, na televisão os convites vão surgindo de forma inesperada. “A Globo é uma caixa de surpresas. Por exemplo, todos me perguntam sempre qual a próxima novela, o que vou fazer em seguida e, verdadeiramente, eu não sei. Quando estou gravando, eles vão me buscar em casa, me levam para o estúdio, produzem, separam figurino e fico esperando a hora de gravar. O Projac é um lugar muito silencioso e de um 175


Prazer em Conhecer profissionalismo tremendo”, comenta Prazeres. Em 2009, a atriz recebeu outros importantes convites para emplacar trabalhos na televisão e no cinema. Em abril, gravou uma participação especial no longa americano The Expendables (Os Mercenários), ao lado de Sylvester Stalonne. No mês seguinte, foi convocada pela Globo para gravar cenas de dois capítulos do seriado Malhação, exibido diariamente às 17h. Prazeres interpretou dona Lourdes, empregada de confiança do Dr. Lemgruber, que morreu de enfarto e deixou o filho, Caio, órfão de pai. A mãe do menino só pensava em dinheiro e abriu mão da guarda do filho pela módica quantia de três milhões de reais. Nas gravações, Prazeres reencontrou a atriz Helena Fernandes, com que atuara nos dois episódios de A Diarista. Ela interpretou a mãe do personagem Caio, vivido pelo jovem ator Humberto Carrão. Ao constatar o novo visual da atriz, após a cirurgia plástica, os produtores trataram logo de renovar o seu cadastro na emissora. Enviaram um texto por e-mail para que Prazeres decorasse e, alguns dias depois, marcaram a gravação. “Eles acharam que eu fiquei ótima e me disseram que com esse perfil eu teria mais chances de conseguir outros trabalhos”, lembra. A experiência rendeu bons resultados. Em agosto do ano passado, Prazeres foi convidada para fazer uma participação na novela das seis, Cama de Gato, escrita por Thelma Guedes e Duca Rachid, com direção de Ricardo Waddington. A atriz gravou cenas no Portal da Chapada das Mesas, na cidade de Imperatriz (MA) e interpretou Maria, uma mulher da roça que acolhe Gustavo Brandão (Marcos Palmeira) em sua humilde casa. As imagens foram ao ar no capítulo seis. Quando retornou ao Rio de Janeiro, no dia 4, após as gravações no Maranhão, Prazeres recebeu mais um convite, desta vez para participar de uma produção cinematográfica: Chico Xavier, dirigido por Daniel Filho. O filme, lançado este ano, marcou o centenário de nascimento do mais famoso médium brasileiro. O convite partiu da co-diretora do longa, Cris D’Amato, que conheceu Prazeres durante as gravações de A Máquina, em 2004. A notícia surpreendeu a atriz. “Logo que cheguei de Imperatriz, no 176


Capítulo 7 - Do cinema à tela da TV: a revelação de uma atriz multimídia Maranhão, quando fui gravar cenas de Cama de Gato, recebi telefonema da estagiária de direção Natália Soutto convidando-me para participar do filme. Ela informou que fui indicada por Cris D’Amato e Cibele Santa Cruz, que também trabalharam no filme A Máquina, de João Falcão. Fiquei impressionada por elas não terem me esquecido, apesar de tanto tempo que nos encontramos”, afirma Prazeres. No filme (adaptado da biografia As Vidas de Chico Xavier, escrita por Marcel Souto Maior), Prazeres interpreta Glaucia Macedo, uma senhora que vai pedir ajuda ao médium, no entendimento de uma carta psicografada pelo Dr. Bezerra de Menezes. “É uma cena recheada de emoção”, garante a atriz. O longa foi rodado nos estúdios da Herbert Richers, em Usina (RJ). A produção é de Lebery Produções, com co-produção da Globo Filmes. O ator Nelson Xavier foi o escolhido para interpretar Chico, pela notável semelhança com o homenageado, a começar pelo sobrenome. A produção foi lançada no dia dois de abril de 2010, dia do nascimento do mineiro Francisco Cândido Xavier, o Chico Xavier. No elenco, estão ainda Rosy Campos, Cininha de Paula, Christiane Torloni, Tony Ramos e Cássia Kiss. Prazeres Barbosa se define uma pessoa feliz e explica que tem vivido intensamente esse novo momento. A atriz garante que não alimenta a ilusão de que as coisas devam acontecer exatamente como esperamos, mas tem trabalhado em prol de suas realizações. Seu último trabalho na televisão foi a personagem Rondônia, do elenco de apoio da novela Tempos Modernos, que acabou em julho desse ano. Em março, a atriz gravou cenas para outro importante filme de projeção nacional que será lançado ainda este ano: Tropa de Elite 2. O longa, produzido pela Zazen Produções Audiovisuais, tem um roteiro de Braulio Montovane com direção de José Padilha. O elenco é praticamente composto por homens; além de Prazeres, apenas três outras atrizes participam da segunda versão do filme. As gravações aconteceram entre os dias 18 de janeiro e 31 de março de 2010. Para interpretar a Dona Olga, uma senhora que se envolve com a 177


Prazer em Conhecer máfia do morro e termina assassinada, Prazeres Barbosa participou de uma trajetória de testes, além de fazer preparação com a produtora Fátima Toledo. Sonhando e juntando pacientemente e de forma criativa as peças do quebra-cabeça de sua própria vida, ela prossegue com a mesma pertinácia com a qual iniciou a carreira vitoriosa nos palcos pernambucanos. Prazeres tem a alma de uma artista nata. Há artistas que são construídos e há pessoas que nascem artistas. Nascem para brilhar. Como esta mulher. Uma mulher chamada Prazeres. Prazeres de Caruaru. Prazeres de Pernambuco. Prazeres do Brasil e do Mundo. Simplesmente Prazeres. Estrela do teatro brasileiro. Uma mulher cujo futuro é sempre uma incógnita. Mas com uma certeza já revelada ao longo do tempo: uma estrela que nasceu para brilhar no imenso e surpreendente palco da vida.

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Capítulo 8

Prazeres por Prazeres

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Prazer em Conhecer

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onheça os sonhos, as paixões, os gostos, manias e muitas das ideias de Prazeres Barbosa; ícone do teatro pernambucano que agora desponta para todo o Brasil Nome: Maria dos Prazeres Barbosa de Melo Data e local de nascimento: 02/10/49, no Sítio Pau Santo, distrito de Caruaru Signo: Libra Peso: 55k Altura: 1.45m Número que calça: 34 Manequim: 42 Estado civil: Casada Apelido de infância: Pamonha pura (não sei o porquê) Virtude: Transparência Defeito: Não me impor diante de algumas situações Característica mais importante em um homem: Integridade Ideia de felicidade: Viver o momento como se fosse o último Se não fosse quem sou, gostaria de ser: Meu irmão, Bernardo Barbosa Lugar onde gostaria de viver: Onde estou vivendo, o Rio de Janeiro Cor favorita: Preto Desenho animado: Os Simpsons Escritores favoritos: Meu foco é teatro. Continuo lendo textos de autores diversos Cantores: Roberto Carlos, Caetano Veloso, Jorge Vercilo, Fábio Jr, Ivete Sangalo, Cássia Eller e curto de montão os forrós de Flávio José Personagem de ficção favorito: Padre Elias, da peça Nó de 4 Pernas Um lema: “...se avexe não...” Irrito-me quando: Alguém coloca palavras em minha boca Sou feliz intensamente por: Estar no palco e saber que sou amada Meu maior sonho é: Solidificar, minha carreira de atriz, na Rede Globo Dons que gostaria de possuir: Tocar um instrumento e ser cantora Morte: Não tenho medo, afinal é a única coisa, garantida, da vida! 180


Capítulo 8 - Prazeres por Prazeres Lema de vida: Trabalhar, trabalhar, trabalhar... enquanto trabalho, cumpro metas Viagem inesquecível: Circuito Nacional de Teatro, pelo Sesc Caruaru Saudade: Da minha mamãe, Antonina Barbosa Teatro onde gostaria de me apresentar: Teatro Municipal do Rio de Janeiro Com quem gostaria de contracenar: Ney Latorraca Se pudesse salvar apenas um objeto de um incêndio, seria: Aprendi que na vida a única coisa de valor sou eu, portanto queime-se tudo! Ocupação preferida: Gravar, filmar, ensaiar teatro... A primeira coisa que diria a Deus, caso o encontrasse, seria: Cheguei! Pois Ele já estava a minha espera Animal de estimação: Não possuo, gosto de plantas Atividade física: Não curto Parte do corpo de que mais gosto: Meus olhos. Eles dizem o que meu coração sente Alguma coisa no corpo que incomoda: A barriguinha! (risos) Prato que sei cozinhar: Não sou prendada na cozinha. Só sei fazer doces! Comida preferida: Toda gastronomia nordestina Uma invenção tecnológica sem a qual não vivo: Internet Gasto mais dinheiro com: Assistindo espetáculos, conhecendo o Rio de Janeiro, tomando Milk Shake... Uma inabilidade: Cozinhar O que não faria em nome da vaidade: Não sou vaidosa, pessoalmente; com meus trabalhos, sim Uma mania: Ser muito exigente O primeiro beijo: “...Nem sempre o primeiro amor é o primeiro namorado...” Xampu: Que atenda as necessidades do meu cabelo Condicionador: Da mesma marca do xampu Sabonete: Que ofereça o máximo em hidratação Perfume: Bem feminino, suave e doce Roupa: A mais básica possível Maquiagem: Só me maquio para festas. No dia-a-dia uso creme hidratante Se não fosse atriz, seria: Cantriz, cantora e atriz (risos) 181


Prazer em Conhecer Frutas de que mais gosto: Pinha e graviola Lugar preferido da casa: Meu quarto Sucesso: Só com merecimento Inveja: Não tenho, de nada nem de ninguém! Ciúme: De quem amo (o que chamo de zelo) Beleza: Valorizo a interior Alegria: Quando sou premiada Tristeza: Ter-me desencantado com aquilo pelo que me encantei Frustração: Não poder oferecer o que o outro espera Motivo de orgulho: Minha carreira de professora e atriz Vitória: Ter chegado à Rede Globo, como atriz Medo: De baratas Decepção: A recusa de uma oferta; a maior que pude oferecer! Motivo de arrependimento: Nenhum. Fiz tudo o que achava que devia fazer Política: Prefiro não comentar Fama: Massageia o ego Dinheiro: O suficiente para sobreviver e beneficiar os menos favorecidos Um susto: Quando recebi um exame médico trocado Um brasileiro admirável: O Presidente Lula Dou muitas risadas quando: Escuto piadas ingênuas. Adoro! Choro ao ver: A impotência diante da fome mundial Fico com raiva quando: Discordam do óbvio Perco a pose: Se me faltarem com o respeito Música: Alma Gêmea, cantada por Fábio Jr. Filme: Alguém tem que ceder Livro: Ah, se eu soubesse de Richard Edller e Mulheres que correm com os lobos, de Clarissa Pinkola Estés Ator: Ary Fontoura Atriz: Arlete Salles Novela: Por Amor Programa de TV: Vídeo Show Jamais vejo na televisão: Programas policiais Mulher bonita: Ana Paula Arósio 182


Capítulo 8 - Prazeres por Prazeres Homem bonito: Antonio Fagundes Projetos: Interpretar grandes personagens na TV e estrear meu espetáculo no Rio Paixão: Pela vida Vício: Trabalhar o tempo todo e todo o tempo Ambição: Não tenho ambição, tenho sonhos! Futuro: Continuo apostando nele e somente nele Uma frase: Aposte no seu sonho, porque no sonho do outro você é sujeito inexistente Local preferido para namorar: Tantos. Dependendo da companhia... Quando quero relaxar: Tomo chá de camomila, me deito e ouço música Presente mais esquisito que já ganhei: Não recordo Bebida preferida: Licores Melhor trabalho: O que lhe dá prazer em executar Pior trabalho: Doméstico. É um trabalho sem fim O que mais admiro nas pessoas é: Simplicidade O que não suporto nelas: Prepotência A pior mentira que já preguei foi: Não costumo mentir, na pior das hipóteses, omito fatos Lugar que gostaria de conhecer: Portugal Deixaria em uma ilha deserta: Ninguém! Jogaria um ovo em: Ninguém! No supermercado, a primeira coisa que compro é: leite O que não pode faltar em minha geladeira: iogurte Lugares de que mais gosto, em Caruaru e no Rio de Janeiro: Em Caruaru: Polo Comercial, Feira de Artesanato e Alto do Moura. No Rio: Centro Cultural Banco do Brasil, Caixa Econômica Cultural, Museus, Orla de Copacabana e Lapa Filosofia de vida: Manter a mente sempre ocupada O que mais amo na vida: Meu filho, Vergílio Barbosa, meu orgulho! Afinal, quem é Prazeres Barbosa? Sou o que sou, pois o que sou é o que todos conhecem. 183


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Capítulo 9

Olhares sobre Prazeres

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FAMÍLIA

A minha mãe sempre lidou com as conquistas com o mesmo entusiasmo. Eu creio que ela tem aproveitado cada momento dessa carreira. É uma líder com um poder de persuasão inegável; frágil como um bebê chorão e forte o suficiente para carregar a Terra nas costas. O que mais admiro nela é a sua determinação em tudo o que faz, seja um bolo, criar um filho ou atuar. Seria coerente reconhecer que a mudança para o Rio de Janeiro é um dos mais importantes marcos nas nossas vidas. Eu fico muito feliz por ela, pois sempre batalhou muito para alcançar este nível. Não considero a chegada à Globo um crescimento profissional. Ela há de concordar comigo. O que existe é maior visibilidade. A capacidade profissional dela é infinitamente maior do que tem mostrado nas telas. Creio que ela tem mais a ensinar do que a aprender na Rede Globo. Pelo que observo, ela está sendo mais ‘experimentada’ a cada dia que passa. Os convites chegam e ninguém vai atrás de nada. Isso é a prova da experimentação. Minha mãe, você me estimulou a ser autêntico e esse foi o maior presente que já recebi na minha vida. Você foi, é e sempre será uma inspiração para mim.” Vergílio Barbosa, filho

A determinação é a principal característica de Prazeres Barbosa. Nunca é vencida por dificuldades, porque há muitas pessoas que desanimam no meio do caminho e, nas vezes em que foi desafiada, Prazeres sempre foi determinada. Essa determinação talvez seja a sua qualidade principal e que fez com que ela chegasse aonde chegou. Há pouco tempo ela se transferiu para o Rio de Janeiro para realizar um projeto de morar num centro onde pudessem surgir as oportunidades, para que ela mostrasse o seu valor, e isso aconteceu. Para uma menina do interior, que nasceu num sítio e ingressou na atividade teatral com mais de 30 anos, não dispõe da beleza que garante o sucesso das atrizes no mercado atual e chegar aonde chegou, só tem uma palavra: determinação. Quando ela sonha com algo, abraça aquilo e só se satisfaz quando acontece. Eu me orgulho muito dela!” Bernardo Barbosa, irmão 186


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres

Três palavras ajudam a entender Prazeres: talento, disciplina e confiança. Do talento, nem precisaria falar. Mas me vejo no dever de registrar que desde muito nova ela transitava com segurança na praia das recitações e declamações, das cantatas e dos esquetes. Para tornar esse talento natural em jóia única, ela se valeu da disciplina e da constância, aspectos bem fortes de sua personalidade. Quem a conhece de perto sabe que ela não dorme antes de deixar tudo em ordem, não senta antes de ter tudo em seu devido lugar, não relaxa antes de decorar todo o texto. Mas, o que dá a ela o ‘algo mais’ é que tudo isso vem temperado com uma força, uma fé, uma confiança, em si e na vida, de impressionar! Ela acredita, vai à luta, faz a sua hora e não espera acontecer. É por ser assim, tão humana e tão especial, que não deixa de impressionar o sucesso alcançado por Prazeres Barbosa.” Lucivanda Leite, sobrinha

Eu a acho fora do comum, extraordinária. Não sabia que uma pessoa tão pequena fosse tão forte. Quando quer uma coisa, ela vai em frente. Em Caruaru, fazia muito teatro e abraçou isso de corpo e alma. Eu desejo todo o tempo de vida possível, porque ela merece. Não tenho Prazeres como irmã, mas como uma filha. Na época em que mamãe adoeceu, ela encarregou cada um dos filhos mais velhos para cuidar dos mais novos. E ela foi minha filha. Tínhamos a responsabilidade de passar roupa, costurar, dar banho, fazer tudo. Tenho muitas saudades dela. Meu amor por ela não vai acabar nunca. Quero que ela seja bem sucedida e que aproveite até o seu último dia de vida. Ela merece tudo de bom.” Maria da Glória, irmã

Na minha infância, dos cinco aos 10 anos, a sua trajetória foi acompanhada bem de perto, pois nos jograis feitos nos Autos de Natal, na época da Igreja Batista, eu seguia a tomada de sua leitura nas apresentações. Ela me incentivou a escrever, a gostar de cinema, dança e artesanato, através do qual batalhou para poder ter sua casa própria. Como pessoa, ajudou a minha mãe a acompanhar-me. Nos domingos, quando saíamos da igreja, ela me levava para assistir as matinês. Em seguida, tornei-me admiradora de sua trajetória; vi filmes e algumas peças. Hoje, não tenho mais tanto 187


Prazer em Conhecer contato com ela, mas gostaria de dizer que a vida nos dá muitos desafios para que a gente possa vencê-los e é necessário enfrentá-los sem culpa, para aperfeiçoarmos aquilo que temos de melhor.” Glória Filha, sobrinha

Prazeres é uma pessoa determinada, que busca sempre um ideal, com certeza da capacidade que tem. Ela é e sempre foi uma pessoa disciplinada. Hoje existe o amadurecimento e isso faz com que a coisa (em cena) seja cada vez mais verdadeira e feita com amor. Prazeres nasceu uma atriz verdadeira. Digo e afirmo que ela é uma atriz nata e outra igual a ela é difícil encontrar. A crítica também diz isso. Se houver reencarnação, ela vem de uma atriz que construiu uma história muito forte em outra época. Em casa ela não para um instante, é uma pessoa muito elétrica e acho que essa energia, essa vontade, com a minha calma, foi o tempero certo.” Francisco Torres, esposo

Prazeres era uma menina sistemática, como toda criança. Sempre foi muito dinâmica em tudo o que fez na vida. Minha mãe e minhas irmãs costuravam. Prazeres começou a confeccionar camisas. Era um sucesso. Também fez bastante artesanato. Se ela tivesse tido oportunidades na infância, teria estourado há mais tempo. Mas ela é o máximo. Acho o trabalho dela magnífico, porque ela faz o que gosta, se entrega. Tudo o que faz é perfeito. Quando assisti uma peça dela pela primeira vez, em Caruaru, não acreditei. Chorei muito. Era época de Natal. Daí por diante, comecei a admirar o teatro. Todas as vezes que a vi em cena, desmoronei. Estar na Globo significa capacidade, competência. Nunca tive a oportunidade de dizer isso para ela pessoalmente, mas quero parabenizá-la por tudo o que vem acontecendo e dizer que a amo, aconteça o que acontecer, onde quer que eu esteja. Hoje, ela está no Rio e eu em São Paulo, mas sempre mantemos contato. Isso significa carinho, cuidado.” Fernando Barbosa, irmão

Ela tem o dom de ser professora, é muito disciplinada e sempre foi muito prendada. Fazia uma camisa social tal qual a que vemos na loja. Cos-

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Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres turava divinamente. Ela, Socorro, Glória e Da Paz eram as mais prendadas na costura. Acho que ela deve estar realizada. Primeiro, Prazeres se educou, ensinou e se aposentou. O teatro estava aliado ao seu trabalho e isso fez com que ela se completasse. Ela alcançou os próprios sonhos. Queria dizer para ela que o maior patrimônio do sujeito é a família. Ninguém se engane com fama, prestígio e poder, porque todos os nossos sonhos perecem quando a vida acaba.” Maria das Mercês, irmã

Mamãe tinha artimanhas descentes para conquistar o seu espaço. Acredito que ela herdou essa veia artística dela. Prazeres era uma professora altamente compenetrada, doada ao trabalho. Uma professora elevada ao quadrado. Caruaru perdeu uma pessoa de alto nível na área de educação. Prazeres, você nasceu para ser estrela em qualquer coisa que fizer.” Maria da Paz, irmã

Vibro ao ler seu nome em informativos de grande circulação. Acredito que quando estavas para nascer, Deus enviou a ti todos os atributos necessários para que foste uma mulher batalhadora e feliz. Poucos dias antes de casar, você cantou para mim... ‘Se avexe não...’. ‘Se avexe não’ é seu lema porque foi e é assim que você está onde está. Sem pressa, curtindo a vida, fazendo de cada oportunidade um motivo de ir mais além. A perseverança tem semelhança com teu nome, são prazeres e prazeres de vida que te fazem bem. Você abriu mão de todas as expectativas, foi, viu e aconteceu. Que tua vida continue sendo um eterno teatro que incendeia tua alma e te traz responsabilidades tremendas por estar representando nossa Caruaru. Você tomou a decisão de ser feliz, isso é bom porque você e sua alegria sempre formarão um exército invencível contra qualquer dificuldade que possa aparecer. Esteja sempre com Deus.” Karina Barbosa, sobrinha

Nós a chamávamos de ‘çulinha’ (por ser a filha caçula). Havia uma fraldinha que ela ficava cheirando e ninguém tomava dela. Chupava dedo e desde criança sempre foi muito criativa e fazia as coisas com capricho. 189


Prazer em Conhecer Também era muito caseira e querida por todos. Prazeres é uma guerreira, esforçada, estudiosa, uma professora fora do comum. Tudo o que ela coloca na cabeça, realiza. Ela trabalhou muito, foi suor e sangue. É uma criatura muito inteligente! Em cena, ela é maravilhosa, perfeita, sabe trabalhar. Quando a vi em cena pela primeira vez, eu chorei. Chorei e ainda choro. De tristeza, porque ela poderia ter vencido de outra maneira, servindo ao Senhor e, de alegria, pela capacidade de ela fazer aquilo tão bem. Desejo que Deus a abençoe e que ela não esqueça que a palavra de Deus diz que os seus verdadeiros adoradores o adorarão em espírito e em verdade. Parabenizo-a por todas as suas conquistas!” Maria das Neves, irmã

Lembro-me bem dos momentos de infância em que meu pai chamava toda a família para assistir à nova peça teatral de tia Prazeres. Mesmo sem entender direito os diálogos complexos e às vezes simples, o que me fascinava era o seu tamanho talento, que me custava a reconhecê-la no palco, onde por vezes duvidei intimamente e com a inocência da época, se aquele ‘homem’ no palco era a minha tia. A mesma sensação que tive no passado foi revivida quando a vi na adaptação d’A Pedra do Reino para a TV... era ela mesmo? Era sim! E com aquele mesmo talento que a acompanha há muito tempo e que me encanta desde a infância. Prazeres não mede esforços para levar a cultura e o nome de Caruaru para todo o Brasil, sem esquecer suas origens. O melhor exemplo disso é o teatro construído a sangue, suor, lágrimas e com o apoio de grandes amigos, no bairro do Caiucá, longe dos holofotes, mas perto do povo, que vive no paradoxo de ser um grande berço cultural, mas ao mesmo tempo viver tão longe dela. Essa é tia Prazeres: talento puro, de alma pura e coração cheio de Caruaru.” Bernardo Filho, sobrinho

O carinho e o amor que eu sinto por você é muito grande. Os anos em que vi o seu crescimento, mesmo com todas as adversidades, são um estímulo para mim. Quisera ter sua obstinação, sua organização, sua vontade de ser alguém, sua humildade e serenidade para esperar o momento certo pra fazer a coisa certa. Você é aquela pessoa que está dentro da gente. A dis190


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres tância não provoca saudade, nem esquecimento. Basta precisar e a gente se entende e resolve. Tenho muito orgulho de ser seu sobrinho e uma grande felicidade de lhe ter como amiga. Minha tia, minha fã, meu ídolo, minha amiga de todas as horas. Te amo.” Júlio Filho, sobrinho

Em casa, não deixávamos a peteca cair. O nosso lema era: ‘Se for fazer, faça o melhor; se não souber, desista’. Montamos uma escolinha em casa, eu ficava com uma turma, ela e Mercês com outra. Prazeres era uma professora altamente preparada e responsável. Ela lutou a vida inteira por um ideal. Hoje, está morando no Rio, tentando sacramentar aquilo por que sempre lutou. E está conseguindo. Ela é maravilhosa como atriz, não tem outra igual. É inesquecível em cena, sabe como fazer e o que fazer. Todos sabem a qualidade de atriz que ela possui. Acredito que muitas oportunidades ainda virão.” Socorro Barbosa, irmã

Prazeres faz parte da história natural dos meus sentidos. Personagem vivo e inspirador para mim pessoalmente e para o trabalho que desenvolvo em Comunicação. Não raro utilizo como referências suas falas e ‘tiradas’. Moro atualmente em São Paulo e sou consumidora voraz da cultura miscigenada que se vê por aqui, pelas calçadas, parques, museus, teatros e cinema. Já vi shows e superproduções teatrais de tirar o fôlego, mas, confesso, ver Prazeres em uma super tela de cinema no Bistrol cantando ‘Não se avexe não!’ me levou às lágrimas. Saí da sessão renovada, crente na costura divina do tempo e no arrebatamento emocional que só a arte nos dá. Amo a arte. Prazeres é arte. Amo minha querida tia, que, como se não bastasse, ensinou-me a desenhar o meu nome e a gostar de ler.” Lane Leite, sobrinha

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Prazer em Conhecer

AMIGOS

Conheci a Prazeres no aeroporto do Galeão em plena crise aérea, completo caos nos vôos e horas de espera. Estava sentada, esperando meu vôo e bastante chateada com o atraso, quando uma pessoa muito simpática sentou-se ao meu lado e começou a falar dos problemas que teve no ‘check in’. Eu sou meio calada e não estava com muita vontade de conversar, ainda mais com toda aquela confusão, mas por educação, iniciei minha conversa com ela. Conversa vai, conversa vem, ela me disse que era atriz há muitos anos. Perguntei se ela não tinha vontade de fazer uma novela na Globo e ela disse que sim, mas que seria muito difícil. Disse que ela deveria tentar, ainda mais com todo o talento que ela parecia ter e ainda acrescentei que nada é impossível, basta a gente batalhar pelos nossos sonhos e ter fé; vai acontecer! Ela então ficou sabendo que eu era cirurgiã plástica e me disse que o sonho dela era fazer uma cirurgia para rejuvenescimento facial. Disse, então, que se ela viesse para o Rio, daria a ela uma cirurgia de face. Concluindo, um mês depois o Wolf Maia convidou-a para fazer uma novela (parecia que eu estava adivinhando). Quando a novela acabou, fizemos a cirurgia, que foi um sucesso. A partir daí nos tornamos amigas. Prazeres é uma pessoa maravilhosa, batalhadora e talentosa. Admiro seu trabalho e tenho certeza de que ela ainda vai brilhar muito. Natale Gontijo de Amorim, cirurgiã plástica e pesquisadora-chefe do Instituto Ivo Pitanguy

Ser ousada e lutar por sonhos e desejos, quando muitos sequer tentariam. Aceitar o novo ou o desconhecido, simplesmente por ter um sentimento que se sobressai acima de qualquer outro: o amor. Possuir o dom de fazer rir ou de fazer chorar, encantando aos que a ela assistem, mesmo que em seu íntimo o riso esteja permeado de choro ou o choro permeado de riso. Não é simples traduzir em palavras o espírito de uma mulher guer192


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres reira, o agir de uma sonhadora, o sentimento acalentador de alguém que faz explodir de seu íntimo o mais forte significado da palavra mãe. Prazeres Barbosa, quanto PRAZER a vida concedeu-me ao permitir-me fazer parte daqueles que têm o privilégio de estar sempre em seus pensamentos e sentimentos, com um lugar guardado em seu coração; afinal não é a presença física que fortalece as amizades, mas sim os laços construídos que serão perpetuados.” Alexandre César, professor universitário

Prazeres é uma pessoa de personalidade fortíssima e uma boa amiga. Assim como foi uma excelente professora, é também uma excelente atriz. Todos os meninos da Companhia de Teatro a chamam de mãe, porque ela não ensinava apenas arte, mas também os educava. Prazeres encara o teatro como uma forma de tornar a sociedade melhor e mais justa. É um ser humano, uma professora e uma atriz por excelência. Tudo o que fez foi com dedicação e dignidade. Houve um momento em que ela pensou em desistir, mas hoje está atuando e vive de sua própria arte. Caruaru precisa valorizar os seus artistas e Prazeres é a pessoa que vai dar essa luz à cidade. Ela tem o poder do sonho e isso é a essência de sua vida. São poucas as pessoas que dividem o seu “norte” com as outras e Prazeres faz isso. Desejo que ela continue sendo quem é, sonhando sempre e tendo em seus sonhos a essência do poder.” Fátima Almeida, psicopedagoga

Falar sobre Prazeres Barbosa é um verdadeiro exercício de prazer e honra, pois ela é daquelas mulheres que por onde passam cantam e encantam, com sua ternura, solidariedade e competência. Ao tempo em que fui diretora da Escola Profª. Gianete Silva, homenageei-a dando seu nome a uma de nossas salas de aula. Também tivemos a oportunidade, enquanto presidente do Neme (Núcleo Especial da Mulher Executiva de Caruaru) de indicá-la, junto ao Sebrae, ao Prêmio Mulher Empreendedora, versão 2007. Quando a pequena grande Prazeres foi convidada a compor o cast da Globo, fiquei um pouco triste, porém, logo me recuperei porque uma imensa alegria invadiu meu coração. Sabia que minha amiga brilharia muito mais do que já brilhava. Prazeres, mulher, mãe, menina moleca, grande dama do teatro brasilei193


Prazer em Conhecer ro, companheira e amiga, que um turbilhão de venturas invada tua preciosa existência, hoje e sempre.” Lucimary Passos, advogada

Costumo dizer que é um prazer poder contar com Prazeres no meu ciclo de amizades. Inteligência, talento e integridade estão entre as características que a fazem ser admirada por todos que têm a oportunidade de conviver ao seu lado. Fruto de um matrimônio de pessoas simples e de poucos recursos, desde cedo ela mostrou para que veio e driblou o destino de uma menina humilde. Assim, o dom de ensinar a ler e a escrever deu um novo rumo a sua vida. Foi nos caminhos dessa vida que Prazeres aprendeu muito e, principalmente, espalhou sentimentos raros nos dias atuais, que a tornam exemplo para jovens e adultos. Mulher de compromisso sócio-cultural, não deixa dúvidas. Acredito que tenha sido fruto da fusão de mestra e atriz. Mesmo aposentada, Prazeres continua fazendo, diariamente, o que mais gosta: ensinar. É assim nos palcos, no cinema, na TV e na vida. Por mais que a conheça, ela continua e continuará sempre me surpreendendo.” Jaciara Fernandes, jornalista

Prazeres Barbosa é energia, alma incansável, irrequieta em busca de seus ideais. Apaixonada pela arte de representar, dedica tudo em prol deste objetivo (e isto de maneira bem abrangente, não só na frente das câmeras, mas nas mais diversas atividades do mundo da dramaturgia: dirigir, formar elenco, criar figurinos, concepções e construção de sala de espetáculo. É admirável!). Como dito, não se limita, não se interrompe em barreiras. É generosa em bondade e talento, portanto destinada ao sucesso. Grande mãe, grande conselheira, amiga, amada, respeitada e admirada.” Fernando Teixeira, pianista

Prazeres Barbosa representa o que há de mais talentoso no teatro caruaruense e hoje nacional. Não é mania de grandeza, é apenas dar valor a quem se dedica de corpo e alma a nossa cultura. O que falta em tamanho sobra no talento. Como caruaruense da gema, tenho orgulho em falar des194


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres sa atriz que honra o nosso povo e o teatro brasileiro.” Ivan Feitosa, diretor executivo da Rádio Liberdade de Caruaru

Falar sobre Prazeres Barbosa é muito recompensador. É a oportunidade de eternizar o meu agradecimento, a quem eu considero a maior estrela atual da cultura caruaruense. Prazeres Barbosa é uma artista completa. Canta, dança e atua, do drama à comédia com a mesma magnitude de uma grande atriz. Fora dos palcos, ela representa a mulher guerreira, nordestina, perseverante, humana e linda, somatório de beleza, singeleza e humildade. Eu, particularmente, agradeço a Deus por ter-me dado a honra de reconhecer publicamente com o Troféu Jornal Extra de Pernambuco - Prêmio Mestre Vitalino, à sua grande contribuição a nossa cultura.” Alexandre Ferraz, diretor-presidente do Jornal Extra de PE

A primeira entrevista que Prazeres concedeu ao rádio foi em meu programa na Rádio Difusora, na época em que ela era professora da Elisete Lopes. Depois, ela nos levou para comer pizza em sua casa. Prazeres é uma pessoa que não se abala com nada. Começou a galgar na profissão já experiente, é muito perseverante e não se nega a qualquer papel que lhe seja entregue. Sua grande virtude está nos monólogos. Assisti duas vezes a uma peça em que ela interpretava três mulheres no palco, totalmente diferentes uma da outra, era incrível. Uma de suas grandes mágoas é nunca ter sido chamada para participar da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém, mas agora chegou a um lugar superior, que é a Globo, embora ache que ela deveria ter um papel maior, pelo que ela é. Considero-a de uma simplicidade digna de respeito.” Ivan Bulhões, radialista

Prazeres consegue sempre contagiar-nos pela sua paixão pela arte em suas múltiplas expressões. Ela fala de modo convincente de que precisamos nos apresentar ao mundo com soltura, segurança de si mesmo e com expressões corporais que se originem no interior humano. A arte de interpretar para ela manifesta-se com simplicidade e como algo muito familiar, compaginada ao cotidiano, ao jeito de ser de cada pessoa e de cada cultura. 195


Prazer em Conhecer Prazeres assessorou os seminaristas, por certo tempo, atinente à comunicação e expressão, tendo o corpo como matriz principal do nosso ser e do nosso apresentar-nos no mundo. Suas contribuições foram significativas, propiciando, sem dúvida, melhor harmonia entre corpo e fala, sentimentos e expressões, imaginário e representação. Deste modo, atestamos publicamente a nossa admiração e apreço à pessoa e aos talentos artísticos de Prazeres Barbosa, cuja biografia e atributos ampliam os cordões estéticos que Caruaru traz em seu útero materno de 153 anos de existência.” Padre Everaldo Fernandes da Silva, diretor da Fafica

Prazeres Barbosa é um ser especial. Particularmente sou sua fã, independente do afeto amigo que nos une. Ela é uma daquelas pessoas que nasceram para vencer. É um ser humano que não desiste de seus sonhos e, com certeza, já realizou muitos deles. Sempre muito determinada, Prazeres realiza grandes feitos e conquista um espaço cada vez maior. Hoje, nós, seus fiéis amigos, juntamente com seu consagrado público, comemoramos a consolidada carreira dessa grande mulher, que faz o que faz com propriedade e profissionalismo. Sabemos que o céu é o limite para Prazeres Barbosa. E apesar de seus voos nos distanciarem de forma física, orgulho-me e me alegro com seu sucesso. À minha querida amiga: saúde, sucesso e proteção divina sempre. Abraço fraterno em seu coração.” Renilda Cardoso, cantora

Prazeres marcou muito no desempenho de suas funções e ganhou para o Sesc prêmios de melhor atriz. Ela foi uma das pessoas que passou e marcou. É interessante porque é uma pessoa dinâmica, que soube buscar aquilo que queria e conseguiu com a sua tenacidade, enfrentando os desafios com muita coragem, disponibilidade e muito amor. Quando sei que Prazeres vai aparecer na televisão, minha família se reúne para assisti-la. É muito bom a gente ver uma pessoa que começou como uma simples atriz e hoje é de uma projeção muito grande. Quero deixar consignada a minha admiração por Prazeres e dizer que ela continue assim: com competência e honestidade, desenvolvendo 196


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres seu trabalho sem que a fama chegue até a cabeça. Que continue aquela pessoa simples, amiga, de boa convivência, que soube fazer e cultivar amizades, e que ela cresça nesse trabalho que iniciou com tanta garra. Desejo muito sucesso e que a sua vida seja de muita projeção.” Sônia Raposo, exdiretora do Sesc Caruaru

Ela é a música do trio pé-de-serra; ela é a poesia dos cordelistas e a viola dos cantadores. Ela é a dança e a essência do nosso folclore. Ela é dezenas de personagens que enriquecem o teatro e o cinema. Ela é a própria arte, representando o talento de Vitalino, a sagacidade do cangaço, a resistência do mandacaru e, a dureza da pedra. Ela é tudo isso, além de guerreira dos palcos da vida brilhando qual diamante a nos encantar. Ela é a musa da minha obra, retratando a cultura de antes e de agora. Ela é uma dádiva dos céus, derramando emoções e luz. Ela é: Prazeres Barbosa, orgulho de Caruaru e de todos nós. Eis o que escrevi a respeito de Prazeres, ao concluir um painel em alto-relevo na parede da entrada do seu teatro. Acrescentaria, apenas, que além de grande artista, é uma pessoa maravilhosa; como ser humano é simples e amiga.” José Caxiado, artista plástico

Prazeres é transparente demais, um pouco radical. Ela é coração e nada de razão, age naquele momento e depois não volta atrás. Ela é inconstante, insegura, tem sempre uma verdade. Nunca me chateei e até dizia que para estar com ela era preciso gostar primeiro dos seus defeitos. O pessoal do teatro cuidava da gente, preocupava-se, pedia que não ficássemos expostos. Hoje não temos muito contato e nem devemos ter. Mas, sempre que tem alguma novidade sobre sua carreira, ela me liga, pergunta sobre a minha vida profissional, incentiva-me a não desistir. Ficou a saudade. Ela não deixou marcas, ela deixou saudades.” Chrystian Arruda, ex-namorado

Conheci Prazeres Barbosa há 15 anos, através do contato na Rádio Cultura do Nordeste. É uma pessoa extremamente sincera, espontânea e autêntica. A sua versatilidade é muito grande e, apesar de na mídia na197


Prazer em Conhecer cional ter um espaço ainda restrito a personagens nordestinos, o trabalho de teatro que ela desenvolve passa muita emoção. Qualquer papel que ela executa, encarna bem o personagem.” Junior Almeida, gerente da Rádio Cultura do Nordeste

Conheci Prazeres Barbosa assistindo aos espetáculos dela. Percebi que era uma grande atriz. Há um tempo, ela me procurou e pediu ajuda para desenvolver o projeto de construção do seu teatro. Mas a ideia não foi à frente. Depois, ela me ligou dizendo que o teatro já estava bem encaminhado e achei muito corajoso da parte dela. Havia alguns problemas e fiz uns ajustes no projeto, que não é meu, mas dela. Mesmo com todos os problemas, conseguimos melhorá-lo. Conversando e lendo algumas entrevistas, descobri que ela era professora e depois de certa idade, decidiu fazer teatro e começou a se realizar. É perseverante e competente, uma pessoa extremamente batalhadora, que acredita naquilo que faz. Ela é um exemplo de vida!” Haroldo Bernardino, arquiteto

Pessoas como Prazeres Barbosa, que já nascem com a tendência de serem artistas, quando encontram o caminho que ela encontrou, resulta nisto: uma grande atriz, que encontra possibilidades para expandir o que pode fazer. Ela se sai muito bem, seja qual for o papel. Já mostrou que é capaz de fazer tudo. É uma pessoa dotada de recursos que poucas pessoas dispõem. Prazeres é uma grande representante das artes cênicas em Caruaru.” Onildo Almeida, cantor e compositor

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Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres

AMIGOS PROFESSORES

A cultura de Prazeres Barbosa é indescritível, porque ela abrange diversos segmentos. Em português ela é excelente. Corrigi várias poesias suas e disse que ela não publicasse seu livro sem que eu corrigisse. Ela foi ótima professora, desempenhando integralmente o seu papel, mas sua vocação maior foi de atriz. É inteligente e ousada. Prazeres é muito corajosa e enfrenta a tudo reconhecendo os vários dons que Deus lhe deu. Assisti a várias peças suas e sempre a vejo na televisão. Sou assídua a toda manifestação artística e cultural que ela desenvolve. Posso afirmar que Prazeres é uma professora-artista de visão larga. Sinto-me orgulhosa e gratificada por ter compartilhado de todo o seu tirocínio de cultura, que é vasto, augurando-lhe pleno êxito em toda sua vida cultural. O que puder dizer de Prazeres é pouco. Não há palavras que descrevam a cultura nata de que ela é possuidora. Sinto-me gratificada por ter sido sua professora.” Maria do Carmo Queiroz Cabral

Prazeres tem uma coisa que é fundamental na vida de qualquer profissional, mas do ator principalmente, que é a disciplina. Ela tem foco, não faz as coisas aleatoriamente, sabe o que quer, vai em busca daquilo e se reveste de uma disciplina que vi em poucas pessoas. A sua carreira não é frágil, é algo que foi solidificado exatamente por essa disciplina e pela seriedade com que realiza as coisas. E é um rigor tão forte na busca que por vezes ela chega a ser incompreendida. Prazeres tem alguns problemas de relacionamento porque algumas pessoas não suportam essa rigidez toda. Quando a vejo na telinha, fico com uma saudade enorme de vê-la no palco. Não tenho a menor dúvida de que a qualquer momento ela vai se tornar uma das grandes atrizes conhecidas deste país, porque grande atriz ela já é, mas vai se tornar conhecida como são todos aqueles que foram bafejados pela Globo.” Edson Tavares

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Prazer em Conhecer

Prazeres é firme, forte, dominadora, ela é autêntica; sobressai-se entre qualquer criatura que estiver ao redor dela. Ela é muito corajosa. O mais importante nela é esse temperamento forte, mas que agrada. Ela só faz aquilo que está com vontade de fazer, embora, depois mude de ideia. Isso é inerente a Prazeres, uma amiga especial e para todas as horas. Vejo sua carreira como algo evoluído, porque muitas pessoas gostariam de estar no seu lugar. Seu trabalho é brilhante, chegaram inclusive a dizer que ela era a Fernanda Montenegro do Nordeste.” Neide Mota

O teatro está no sangue de Prazeres. A partir das aulas de Educação Artística ela foi desenvolvendo nos alunos o gosto pelas artes. Isso foi o seu grande marco. Ela não entrava na sala apenas para dar aula, queria deixar uma marca na vida de seus alunos. Prazeres é muito perfeccionista, observa os mínimos detalhes e quer tudo no seu devido lugar. Acompanhei a sua carreira artística passo a passo. Hoje, não é mais Prazeres Barbosa, é Prazeres Barbosa de Caruaru. Como ela sempre levou a sério tudo o que fazia nesse campo, projetou-se. E não fazia as coisas para mostrar quem era, ela ama o teatro e faz com que a gente sinta isso. Prazeres, seu nome é luta e glória. Você é um exemplo de vitória para a juventude pós-moderna.” Carminha Anunciação

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Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres

EX-DIRETORAS

Prazeres foi uma das melhores professoras que tivemos na Escola Elisete Lopes e sempre se destacou. Eu lembro perfeitamente que ela era muito dinâmica, tinha uma facilidade imensa de manter a disciplina em sala de aula, sempre foi uma professora exemplar. Ensinava Português e Educação Artística, que foi a matéria que fez com que ela entrasse nesse ramo de teatro. Acredito que quando você se dedica a algo e tem fé, chega lá. Nesse caso, além de ser dinâmico, precisa ter o perfil. E Prazeres tinha o perfil. Hoje, quando ligo a televisão, sem esperar eu a vejo. Realmente foi um sonho, ela foi em busca e teve mérito para conseguir. Prazeres, continue com fé em tudo o que você almeja. Não sei se você busca algo mais, porque tendo saído de um teatrinho de escola e havendo chegado aonde chegou, você já ultrapassou todos os limites. Permaneça firme e forte na luta em relação aos seus sonhos e você vencerá todos eles.” Diva Galvão Cavalcanti

Prazeres Barbosa é um personagem corajoso na vida e que dotada pelo amor à arte, conseguiu fazer dos seus personagens uma mistura de arte e de vida. Ela não precisa representar, ela é o que é. Gravitou na órbita do saber enquanto professora dos pequenos na Escola Professora Elisete Lopes de Lima Pires e permitiu que nada a impedisse de ser uma profissional respeitada, paralelamente a sua ascensão às artes. Começou a entender pessoas ao seu entorno que precisavam representar para serem conhecidas, ao passo que ela com sua naturalidade e simplicidade dava brilho às coisas que fazia, tirando, às vezes, o brilho do que reluzia a sua volta. Eu como uma eterna apaixonada pelo belo, defino a querida Prazeres Barbosa como uma atriz do teatro da existência humana.” Leila Gorayeb

Prazeres era aquela professora entusiasmada com o que fazia; uma profissional responsável e grande incentivadora dos alunos. Quando estava 201


Prazer em Conhecer ensaiando alguma peça e a escola estava ocupada com outras atividades, ela levava os meninos para sua casa, batalhava pelos figurinos, buscava recursos. Ela foi um baluarte de teatro na época do colégio. Era muito organizada e mesmo ensinando em uma escola pública, buscava fazer o melhor. Prazeres sempre lutou por aquilo que quis, então, todas as honras que hoje recebe, ela fez por merecer. É um exemplo em todos os aspectos e vive a vida que escolheu. Quando acreditamos nos sonhos, eles acontecem, Prazeres é prova disso. Desejo muita paz, saúde e que ela continue sendo a pessoa humilde e humana que é, sempre com os pés no chão. É motivo de alegria e orgulho ter trabalhado com Prazeres Barbosa.” Maria Helena Vila Nova

Prazeres é uma líder nata e chama a atenção em tudo o que faz. Ela era diferenciada e as outras colegas a viam como uma pessoa ditadora e prepotente, mas não era nada disso. Tudo o que ela fazia era com a alma, com o coração, era uma coisa impressionante. Ela é testemunha de que fui a primeira pessoa a acreditar que ela chegaria à Globo. Eu sempre dizia e ela ficava rindo. Na primeira vez em que apareceu na televisão, ela me ligou para lembrar essa passagem. Vibro muito com o seu sucesso e por onde passei fiz questão de lembrá-la. Prazeres é uma estrela iluminada e tudo o que ela faz é por inteiro. Acredito que vai ainda brilhar por muito tempo.” Doralice Feliciano

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Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres

AMIGOS DE TEATRO E CINEMA

Conheci Prazeres em 1998. Desde então ficamos muito amigos e pude conhecer bem de perto a grande mulher, mãe, atriz que ela é. Em 2006, quando presidente da Federação de Teatro de Pernambuco – Feteape, fiz uma homenagem a ela, uma de nossas mais ilustres filiadas, no festival Todos Verão Teatro. Na ocasião houve apresentação de ‘A Feira’ e durante um mês mantivemos uma exposição no hall do Teatro do Parque no Recife, onde foi possível mostrar para os recifenses, a trajetória de Prazeres. Depois ela foi embora de Caruaru, foi alçar vôos mais altos e merecidos; o sucesso de Prazeres é merecidíssimo e ela nunca teve pressa nem dúvida, pois sabia que ele chegaria. Lembro-me como se fosse hoje, quando, em uma homenagem, na Assembleia Legislativa de Pernambuco, ela cantou ‘Se Avexe Não’, e essa música tem tudo a ver com ela.” Roberto Carlos, presidente da Confederação Brasileira de Teatro

Falar sobre a Prazeres é falar sobre o amor. A imensidão desta atriz, desta mulher, deste ser humano, é proporcional à dimensão deste sentimento. Primeiramente, tive o prazer de conhecer a atriz, sua verdade, através de seus personagens. Em seguida, fui abençoada com sua amizade, a força em todos os momentos, e as palavras certas, em todas as horas. Que o nosso Pai continue te guiando e fazendo de ti esta pessoa linda que és. Parabéns por tua história!!! Amor, brilho, luz, verdade, garra e profissionalismo são algumas palavras sinônimas da PRAZERES BARBOSA.” Eliane Luna, atriz

Quando me inseri no teatro profissional do Recife, já sabia dos vários talentos que existiam em Caruaru, sendo Prazeres Barbosa um grande destaque. Assisti-a pela primeira vez em Fiel Espelho Meu, e claro que ver aquela mulher tão baixinha, tornar-se ‘grande’ no palco, foi uma ótima experiência. Como jornalista, pude divulgar algumas de suas peças, mas nunca dividimos a cena como atores. No entanto, minha admiração por 203


Prazer em Conhecer Prazeres é sempre crescente. Tanto que tenho uma lembrança carinhosa: em 2004 estive em Caruaru com o musical Versos do Nós, de Jomard Muniz de Britto, sob direção de Claudio Lira, e, ao final da apresentação, quando eu, vestido como uma Santa/Diva tinha que buscar alguém da plateia para coroálo(a) como ‘estrela’, não tive dúvidas, trouxe Prazeres para ser a ‘diva’ daquele momento. E, pelo visto, ela continuará sendo por muito mais tempo. Evoé, Prazeres!”Leidson Ferraz, ator, jornalista e pesquisador do teatro

Diante dela sentimos um certo ‘não saber o que dizer’, nosso olhar busca enxergar algo que não conseguimos definir previamente o que seja, e nossas mãos inquietas ficam indefinidamente ondulares. Talvez porque seu vigor e seu talento mais vigoroso vá além de suas belas atuações na arte de representar. Talvez porque sua história real seja mais empolgante que as da ficção. Talvez porque seu exemplo seja mais insurgente que suas palavras. Ou mesmo talvez porque reúne algo que inexplicavelmente encanta, desperta paixões e fascínio. Prazeres Barbosa é assim...” Williams Sant`Anna, ex-presidente da Feteape

Conheci Prazeres em 1995, quando fiz um curso de interpretação com ela e Francisco. Então, fui convidado a integrar a Cia. Prazeres Barbosa, com o espetáculo Casamento Suspeitoso. Logo que a conheci, tive a nítida impressão que se tratava de uma mulher forte e exigente. Aprendi muito com ela, em relação aos ensinamentos da diretora de elenco maravilhosa que Prazeres é também. É uma pessoa com personalidade muito forte, sempre fala o que pensa. Ao mesmo tempo, é uma grande mãe que defende os seus a todo custo. Prazeres é um misto de sentimentos. Alegre, altiva, por vezes autoritária, passional e sempre amiga, daquelas que se preocupa com a vida pessoal dos integrantes do grupo. Sempre teve o sonho de chegar às grandes telas. Para mim e tantos outros atores do Nordeste, é um exemplo. Afinal, ela não precisou sair da sua cidade para ser notada. Prazeres é uma pessoa rara, daquelas que nos fazem lembrar o quanto é importante manter o sonho vivo dentro de cada um.” Wagnner Sales, ator e jornalista 204


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres

Prazeres Barbosa é um dos semideuses do Olimpo caruaruense. Nesse Olimpo, nomes comuns aos ouvidos do povo brasileiro, como Austregésilo, Vitalino, os irmãos Condé e Onildo Almeida, entre outros, inclusive contemporâneos, emprestaram suas raízes no solo sagrado de Caruaru à força das suas artes e que o Brasil encantou-se. Neste panteão, a história contará que num passado nunca distante, uma mulher ousada e avançada quebrou barreiras e viveu a vitória de cada dia, iluminando o céu de nosso horizonte com uma estrela que nunca para de brilhar. As portas do cenário cultural de nossa região sempre estiveram abertas, mas só os obstinados e talentosos atravessam a estreita ponte da competência. Prazeres Barbosa já é mais que um nome. É um símbolo.” Claudio Soares, produtor cultural

Prazeres é uma pessoa trabalhadora e guerreira, que vai à luta sem medir esforços e que tem sido bem sucedida. Desejo que continue a ser como é, na batalha, valorizando a função de atriz, pesquisando, estudando e inserindo na carreira outras habilidades para melhorar cada vez mais a atriz maravilhosa que é.” Ivonete Melo, presidente do Sindicato dos Artistas de Pernambuco

O aluno de Prazeres Barbosa tinha que estudar mesmo, ela não privilegiava ninguém, sempre soube separar tudo. Se você errasse a palavra banana num ditado, ela lhe deixava em recuperação. Com Prazeres, para o aluno passar de ano, tinha que ser fera e eu nunca fui bom aluno. Mas, depois, comecei a conhecê-la, vi um lado diferente dela e nos tornamos grandes amigos. Ela me indicou a Severino Florêncio para entrar no Grupo de Teatro do Sesc e fizemos vários trabalhos juntos. É lamentável que Prazeres tenha começado a fazer teatro um pouco tarde. Como pessoa, é daquelas que partem o bolo, divide e não pega a melhor fatia. É uma excelente atriz, melhor ainda como diretora. Pontual como ninguém, disciplina é com ela mesma. Estar na Globo é um sonho que ela está realizando, mas que ainda não foi realizado completamente. Acho que ela está a um passo disso e é algo que merecia, aliás, ela merece.” Ednilson Leite, ator

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Prazer em Conhecer

Quando conheci Prazeres não gostei dela. Eu me relacionava bem com Francisco, mas tinha medo dela, que cobrava e exigia muito de nós. A vi no palco pela primeira vez na época do espetáculo Fiel Espelho Meu. Gosto muito de teatro, mas não tenho muito talento e eles sempre me queriam em cena. Hoje, ela é minha amiga, mãe e confidente. Prazeres é uma pessoa maravilhosa. A cada dia está mais jovem. Por trabalhar em hospital, sempre que está doente eu a oriento. Ela costuma dizer que sou seu enfermeiro e que a ajudo, mas ela me ajuda muito mais. Eu sou muito grato por ser amigo dela.” Cabeto Pereira, ator

Eu gosto do trabalho de Prazeres, a acho versátil, de muito talento e foi bom esse vôo que ela deu, porque profissionalmente aqui não se consegue nada. Quem quer ser profissional de teatro tem que sair de Caruaru. As oportunidades são difíceis de aparecer. É preciso ter um talento muito grande para poder ser aproveitado. Tivemos problemas em relação ao teatro, mas pessoalmente e socialmente não. Assisti aos seus espetáculos e gostei muito da estreia dela no Sesc, em que fazia a Marieta. Não havia comparação com outro texto e acho que foi o melhor trabalho que ela fez.” Arary Marrocos, atriz

Eu acho o trabalho de Prazeres Barbosa bom. No Rio de Janeiro a concorrência é muito grande e acho bom eles ficarem lá, porque se ela voltar para Caruaru vai perder a oportunidade.” Argemiro Pascoal, teatrólogo

Eu a acho sensacional e aprendi muito com ela nas filmagens de Agreste Adentro. É uma atriz que não precisa de muito ensaio, que entende o personagem pelo texto. E como pessoa é muito bacana. Prazeres é de um caráter super reto, simples, fácil de lidar, que se apega às pessoas. Nas filmagens ela me tratava como uma mãe. Foi muito bacana essa relação que nós criamos. O fato de estar no Rio de Janeiro e ter feito filmes e participações na Globo, que é uma coisa muito fechada, é uma grande vitória. Lá, todo mundo quer ser ator e atriz, e a quantidade de pessoas que vai para a porta da emissora levar material e pedir trabalho é algo que você não faz ideia. Então, o fato de Prazeres ter ido através de um convite é sensacional. Fi206


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres cando lá, ela tende a trilhar um bom caminho.” Eduardo Morotó, cineasta

Para mim é muito fácil falar de Prazeres, porque além de minha amiga, de uma excelente profissional, ela é uma mãe para mim. Mesmo ela estando no Rio de Janeiro, estamos sempre em contato. Como mulher, eu me espelho muito nela, tanto no profissional, como em casa também. Prazeres é espetacular, ela nos deu lições de vida muito marcantes. É uma pessoa ímpar e falo com muito amor e carinho porque é uma pessoa muito marcante, tanto que as minhas duas filhas a chamam de vovó Prazeres. Eu a chamo de mãe e não é para puxar saco, é fruto do verdadeiro amor que sentimos por ela.” Sheila Tavares, atriz

Prazeres é um exemplo de vida, de conquista, perseverança, de acreditar no sonho, em todos os sentidos. Quem não a conhece pode ter uma má impressão, porque ela é muito disciplinada e geralmente quando as pessoas sabem o que querem da vida e como comandar as coisas, outras não gostam, acham careta. Mas, quando se conhece Prazeres profundamente, ela se torna uma pessoa fantástica. Somos amigos íntimos de Prazeres e não apenas pessoas que participaram da Companhia de teatro dela. O tempo fez com que a gente estreitasse cada vez mais a relação, pela pessoa maravilhosa que ela é. Existem os sonhos, mas Prazeres é muito pé no chão. Então, tudo o que ela conquistou e vem conquistando até hoje é justamente por causa disso. Por ser pé no chão e acreditar nos sonhos, as coisas vão acontecendo.” Benício júnior, ator, diretor e arte-educador

Prazeres nunca mudou, ela melhorou. A cada espetáculo, foi crescendo. Eu admirava a sua responsabilidade, nós a tínhamos como exemplo. Ela era muito disciplinada, por isso, chegou onde chegou. Ela batalhou muito por isso e é um exemplo para quem quer crescer. Como protagonista, nos dava segurança. Ela tinha o poder de ‘segurar’ o espetáculo. Ela tem a facilidade de ‘pegar’ o personagem, estuda muito, se dedica, entrega a alma. Muitas vezes, me deu toques para que eu desenvolvesse bem o meu personagem. Houve um período em que eu estava fazendo 207


Prazer em Conhecer Magistério e na época do estágio ela também me ajudou muito. Prazeres é dedicação e é merecedora de onde está. Há pessoas que apenas sonham; ela sonhou e realizou. Prazeres, você é um exemplo!” Cleonice Matias, atriz

Prazeres Barbosa é uma pessoa altamente determinada. A conheci em 1985, quando era professora da Escola Elisete Lopes. Naquela época, ela já se destacava na área cultural e educacional na comunidade. Depois, iniciou seu trabalho como atriz, no Sesc, com Severino Florêncio. Fez vários espetáculos, se destacando por sua dedicação e disciplina. Fiz O Cangaceiro com ela e Espelho D’água, que participei como mamulengueiro. Prazeres sempre foi uma pessoa de destaque e, por estar onde está hoje, ela deve agradecer primeiramente a Deus e depois a ela própria, que é uma pessoa determinada, disciplinada e tem o privilégio de poucos profissionais da arte do representar.” Sebastião Alves, ator

Conhecemos-nos em 1987, numa capacitação oferecida pelo Estado, no Recife, sobre carnaval. Lá, nos descobrimos como pessoas de teatro; trocamos figurinhas sobre o universo cultural e, a partir daí, criou-se um laço muito forte, a ponto de Limoeiro ir a Caruaru e Caruaru vir a Limoeiro, através dos seus espetáculos. Além disso, Prazeres Barbosa ministrou oficinas para o processo de formação de atores, isso em um momento bom, porque aqueles que estavam pretendendo subir ao palco já tinham uma cadência boa de informações a partir do que ela fornecia. Prazeres não é somente uma atriz, ela tem um toque do coletivo, de envolver a todos e ver o ser humano por trás do artista. É uma atriz disciplinadíssima, que lê, pesquisa, é contestadora e muito convincente. A terceira lei de Newton diz que ‘toda ação gera uma reação’. Acredito que Prazeres está colhendo aquilo que plantou. Quero dizer que ela é sempre motivo de inspiração para as pessoas começarem um trabalho. Que Deus sempre a ilumine e enquanto estiver nessa terra, que ela possa encaminhar mais pessoas para entenderem o que é a arte.” Fábio André, arte-educador e produtor cultural

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Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres

Fiz alguns trabalhos com Prazeres no São João e participei, na década de 1990, do espetáculo Paixão de Cristo que ela promovia em igrejas e na Avenida Agamenon Magalhães, em Caruaru. Gostava muito de trabalhar com ela, porque é uma pessoa muito exigente e pontual. Eu estava no início da carreira e ela sempre me deu muitas dicas, principalmente para eu não dirigir e atuar ao mesmo tempo, pois isso proporciona uma visão melhor do espetáculo. É uma pessoa super batalhadora, que vai em busca de seus interesses e lutou por tudo o que queria. Prazeres não ficou de braços cruzados e hoje está na mídia. Desejo que ela continue sendo a pessoa que sempre foi e nunca desista de seus sonhos.” Walter Reis, ator e diretor de teatro

Prazeres é uma mulher destemida, que sempre se atreveu a sonhar sem limites e de olhos abertos. Para dar conta da ousadia de seus vôos, desde menina aprendeu a manter-se inteira, com os pés seguros do que fazer sobre o chão. E foi no trânsito entre chãos de barro, cimento e madeira que essa atriz forte e iluminada revelou-se incomum, como uma árvore que, por amor à aventura da existência, descolou-se da terra, atreveu-se a fazer isso. O teatro lhe mostrou como. E ela largou-se do - amado - solo Agreste. Saiu andando com suas raízes que, não tardou, viraram asas. Quero bem a Prazeres e tenho orgulho da mulher que ela fez em si mesma, desavergonhadamente, impregnada por sua herança nordestina, grande atriz por quem torço desde sempre para que continue realizando cada sonho ilimitado.” Luiz Felipe Botelho, ator, autor e diretor de teatro

Conhecemo-nos no Grupo de Teatro do Sesc e nosso primeiro trabalho juntas foi A Promessa, um espetáculo de grande projeção e que revelou Prazeres como atriz nacionalmente. Depois, fizemos Nó de 4 Pernas e Avatar. Participamos de vários festivais nacionais e fomos premiadas juntas. Prazeres é uma pessoa que sonha e corre atrás. A vejo como alguém que sempre esteve em busca de oportunidades. Ela não é medrosa e isso é primordial para um ator. No momento está tentando conquistar um espaço na televisão. 209


Prazer em Conhecer Nada a barrou. O estereótipo nordestino nunca a impediu de ir em busca dos seus objetivos. Torço muito por Prazeres. Ela é de cavar oportunidades e agarrá-las. Uma das coisas que mais gosto é contracenar com bons atores, porque essa energia é repassada no palco. Isso aconteceu conosco em Avatar. É uma atriz extremamente disciplinada, perfeccionista, que confere tudo antes de entrar em cena. Prazeres Barbosa, enquanto companheira de teatro, faz parte da minha história.” Maria Alves, atriz e arte-educadora

Acompanhei os primeiros momentos da carreira de Prazeres, quando ela lecionava na Elisete Lopes. O Feteag estava no auge, mobilizando professores e estudantes. Foi quando ela começou a se destacar. Prazeres sempre foi aquilo que é hoje: uma atriz capacitada, com muita responsabilidade, amiga, parceira. Chegamos a viajar juntos para festivais nacionais. Ela conseguiu conquistar a sociedade por conta do seu talento. Começou a carreira um pouco mais tarde e ultrapassou todas as barreiras e preconceitos. É uma atriz de talento insuperável e tenho muito orgulho dela. Nunca perdemos o contato. Prazeres é a única atriz da história do teatro caruaruense que conseguiu chegar à Globo. É destaque também no cinema nacional. Ela precisava voar e abraçar essa oportunidade, pois é o sonho de todos os artistas. A idade, a estatura não tiram seu brilho. O brilho está dentro dela. Prazeres é uma estrela!” Jorge Souza, ator, diretor e professor de artes plásticas

Sou de Vitória de Santo Antão, cursei Artes Cênicas no Recife e, em 2004, fui aprovado numa seleção para trabalhar no Sesc Caruaru. Antes de vir para cá, já ouvia falar de Prazeres como uma atriz referencial. Lembro-me do nosso primeiro contato: ela estava assistindo a uma peça no Teatro do Sesc e fui cumprimentá-la. Depois, vi dois espetáculos da sua Companhia: Apocalipse e A Feira (sem Prazeres no elenco). Fizemos testes para A Pedra do Reino, fomos aprovados e tivemos uma convivência como atores. Ouvi os produtores Maria Clara Fernandes e Manoel Constantino afirmarem que ela foi uma das grandes revelações da minissérie. Prazeres 210


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres interpretou um personagem masculino cuja composição era perfeita. Nesse período, ela me acolheu e deu vários toques, porque era meu primeiro grande trabalho. Foi quando tive a oportunidade de conhecer o seu lado pessoa. Vi alguns filmes, como Espelho D’água, A Máquina e Agreste Adentro, que salientam o seu trabalho para o vídeo. Recentemente, vi o Chico Xavier. São trabalhos maravilhosos e ali tive a convicção da grande atriz que ela é.” Moisés Gonçalves, ator e diretor de teatro

Nos diversos personagens vividos em sua trajetória, diversidades temáticas e perfis psicológicos variados, Prazeres Barbosa apesar do indefinível campo aberto à criação, parece-me que já atingiu todas as etapas, transitando pelos mais variados meios de difusão de sua grande arte de interpretar. Se julgarmos ser tão simples assim, absolutamente não é o seu caso. De sua estreia como atriz no antigo espaço cênico do Sesc, quando funcionava na Rua Mestre Pedro (na ocasião, encontrava-me compondo a comissão de avaliação dos espetáculos), até a parceria como cenógrafo no espetáculo Fiel Espelho Meu e num comentário emocionado escrito sobre sua personagem Sebastiana, da peça A Promessa, eu diria que, a partir daí, ficou inegável qualquer especulação ou questionamento sobre seu talento e poder interpretativo, levado além dos palcos para as telas do cinema até chegar com maestria à televisão.” Marcos Bezerra, artista plástico

Falar sobre Prazeres Barbosa para mim é muito gratificante, pois acompanhei a sua trajetória artística desde o início, quando ainda era professora. Tive a oportunidade de fazer alguns trabalhos coreográficos para ela e para a Companhia que leva o seu nome. Todos nós, artistas, sabíamos de sua potencialidade para o teatro e que mais tarde Caruaru se tornaria pequena para a veia artística que pulsa em seu corpo, pequeno, mas de uma grandiosa expressão para a arte. Prazeres é, para mim, e acredito para Caruaru e região, um ícone na cena pernambucana, que leva e eleva o nome de Caruaru para os quatro cantos desse imenso Brasil.” Janduy Mota, coreógrafo

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Prazer em Conhecer

Prazeres é a imagem da mulher guerreira. Começou a fazer teatro no Grupo do Sesc e conciliava com a carreira de professora. Quando se aposentou, abriu espaços para as artes. Ela corre atrás daquilo que quer e sempre diz que o máximo que pode ouvir é um NÃO! Tem bom gosto para montar espetáculos, escolher elenco e se preocupa com a arte. Às vezes as pessoas pensam que ela é rude, mas Prazeres é um doce, basta saber se aproximar. Ela faz do seu grupo uma família, tem um ar maternal muito forte, um carinho muito grande com as pessoas. Mas é uma pessoa que também se impõe, luta até o fim, não volta atrás em suas opiniões. Sempre nos comunicamos. Eu digo para ela que sou seu fã e ela diz que é minha fã.” Gabriel Sá, ator e diretor de teatro

Conheci Prazeres assim que ela apareceu; pequena no tamanho e se tornou grande, fazendo com que todos a respeitassem. Hoje, ela está no Sudeste, para onde muitos artistas vão, não conseguem nada e depois voltam. É importante trabalhar na própria terra, mas os que querem desbravar precisam ir para fora. Prazeres teve essa coragem. É uma articuladora e consegue tudo o que quer. Ela se aposentou como professora e veio pronta para ser atriz. Não precisou da arte para sobreviver. É uma pessoa batalhadora e isso merece o nosso reconhecimento. Sua carreira é um sucesso, os seus trabalhos sempre tiveram bons resultados e ela conseguia levar um bom público ao teatro, numa cidade onde as pessoas não têm esse costume. Hoje, todos conhecem Prazeres Barbosa, porque ela não fez apenas arte, mas também construiu um nome. Ela conseguiu esse estrelato e é a única atriz caruaruense que foi para longe e permanece lá.” Nildo Garbo, ator e diretor de teatro

Prazeres começou a fazer teatro depois que saí de Caruaru, mas uma coisa que acho importante nela é a perseverança e o amor que tem pelo teatro, a consciência da profissão, de se entregar, acreditar nesses valores e ir em busca disso. Gosto muito do trabalho dela como atriz. Vi uma peça sua aqui em Recife e assisti A Pedra do Reino. Acredito muito nesses valores que ela tem; o amor, o carinho, a coragem de sobreviver e enfrentar a difícil tarefa de fazer teatro num país com tantos analfabetos.” Vital Santos, teatrólogo 212


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres

Prazeres Barbosa é um das mulheres mais encantadoras que tive o privilégio de conhecer no percurso da minha carreira, com quem tive a honra de dividir a cena no especial da Rede Globo Nordeste, Caminhos de Monte Santo. Sua trajetória artística está totalmente consolidada. A Wikipédia – Enciclopédia Livre - faz citação de uma série de obras relevantes nas quais teve destacada atuação: trabalhos no teatro, no cinema e mais recentemente (entre 2005 e 2010) uma sólida carreira na televisão, com nada menos que nove trabalhos numa sequência ininterrupta. Com sua capacidade única e inesgotável de criar e transmutar-se, Prazeres Barbosa tem o glamour das grandes estrelas. Que este talento genuíno continue brilhando na Vênus Platinada, no Sul Maravilhosa para que possamos dizer com orgulho e uma pontinha de bairrismo: é daqui, é de Pernambuco!” Feliciano Félix, ator, produtor cultural e presidente do Conselho de Grupos da Artepe

Prazeres é uma daquelas atrizes que abraçaram o ofício com grande determinação, como poucas aqui do Nordeste. Seu talento foi reconhecido e merecidamente. Embora seu lado histriônico seja mais forte e sua personalidade ali está, estampada, em diversas participações seja na TV, cinema e principalmente no teatro, onde a encontramos inteira e plena em seu talento, essa quase obstinação em aparecer, quase ofusca o seu jeito natural de interpretar. Afirmo ser um seu admirador pela franqueza que ela demonstra no seu comportamento e nas suas declarações. Prazeres enche-nos de orgulho e engrandece as artes cênicas de Caruaru, ao firmar seu nome na galeria daqueles artistas da terra que foram à luta e conseguiram realizar o seu sonho: ser global sem deixar suas raízes nordestinas, plantadas na terra do mestre do barro.” Gilberto Brito, ator e diretor de teatro

Escrever sobre Prazeres Barbosa se torna uma tarefa difícil pelo medo em cair na tentação dos clichês, repetir em palavras a sua grandiosidade nos palcos é impossível. Então, resta-nos enaltecer a grande mulher, guerreira na arte e na labuta do fazer teatral, incansável na busca do seu lugar ao sol entre as coxias e os refletores! Prazeres é referência! Uma mulher que 213


Prazer em Conhecer não deixa a vida passar em branco! Daquelas pessoas que aplaudimos de pé.” Kelly Moura, jornalista e produtora cultural

Falar de Prazeres é sempre um grande Prazer! Trocadilho inevitável. Estamos falando da Dama do Agreste, a atriz nordestina que veste várias facetas e inebria a todos com seu sorriso e talento. Lance um desafio e lá estará ela! Resolver problemas é com ela mesma! Vou contar um segredo: Ela é a ‘Senhora’ que tem a chave do labirinto! Sabe desenrolar qualquer carretel. Dona de um coração tão puro... Tem a delicadeza e a doçura de uma criança. Sua casa é uma FÁBRICA DE SONHOS onde ela cria seus adereços e figurinos que guarda com todo cuidado (não mexa sem permissão que ela vira uma onça! [risos]), e no meio deles ela se esquece do tempo... Aliás, tempo esse que pra ela não passa nunca! Sua jovialidade é uma marca. Guerreira como uma das ‘Mulheres de Tejucupapo’, vira um furacão para defender as coisas que acredita e seus amores. Os olhos miúdos e brilhantes carregam por trás deles uma alma grandiosa e cheia de desejos. Não tem medo de ousar, de se lançar... É ‘mais macho que muito homem’! E mais fêmea que qualquer mulher que se preze! Mãe extremosa, colega dedicada e generosa, artista sensível como poucas... Estou falando da MINHA AMIGA, da querida Prazeres Barbosa.” Fabiana Karla, atriz

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Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres

DIRETORES DE TEATRO

Prazeres desafiou o tempo, o medo, os traumas, toda a negatividade e procurou construir uma base onde pudesse sentir-se forte. Ela era muito esperta, atenta, crítica, sempre cobrando muito de si mesma, que é uma questão importante. O crescimento profissional de Prazeres é algo natural, consequente do trabalho, do esforço, da dedicação, da disciplina, do cuidado, da vontade de fazer e de se manter fazendo. Ela nunca abriu mão do fazer teatral, nunca deixou de investir, de divulgar o próprio trabalho. Tudo isso é fruto da disciplina, da coragem e do trabalho dela, apoiada por várias pessoas, em cada tempo. Essa oportunidade de ir para o Rio surgiu na hora certa, ela está experimentando esse momento, vivenciando coisas novas e acho bom. Prazeres é uma segurança para o diretor. Acredito que a perseverança é um marco específico dela. O teatro foi uma porta que se abriu para a liberdade, a felicidade de conhecer a vida com menos medo, com mais alegria, tranquilidade, sonhando mais e vivendo melhor. Foi esse grito de liberdade para Prazeres.” Severino Florêncio

Indiscutivelmente o que salta aos olhos no processo de trabalho com Prazeres é a sua disciplina, capacidade de concentração e objetividade. Vejo-a como uma atriz que sempre quer mais. Prazeres é uma referência por suas habilidades criativas, mas também pela sua capacidade de dirigir a própria carreira. O seu maior mérito é olhar ao redor, buscar informações na própria natureza humana, no cotidiano, nas coisas mais elementares da vida. Associada a sua disciplina, perspicácia e, principalmente, ao seu rigor e padrão de exigências, está a busca pelo conhecimento. Ela é uma atriz que reeduca o olhar a cada nova situação. Tenho alguns desafios para ela. Quero vê-la em cena construindo “A Mãe Coragem”, de Bertold Brechet, “A Mãe”, de Gorki e quero dar muitas risadas como as que dei com a Sebastiana, de A Promessa. Acompanho toda a sua trajetória, vi todos os seus espetáculos, todos os seus filmes e suas participações em televisão. Há humanidade nas personagens dela e, 215


Prazer em Conhecer por isso, ela carrega esta marca de boa atriz.” José Manoel Sobrinho

Continue perseguindo o seu sonho, minha linda e iluminada atriz, sendo sempre verdadeira nas suas relações e nas suas interpretações. Se entregue sem medo ao seu exercício de atuar, pois somos pessoas especiais que precisam agir de um modo especial nesse mundo totalmente imediatista, onde os salamaleques são a essência de tudo. Para nós, a essência sempre foi, é e será a verdade e a busca de novos tempos, de novos tons, de novos registros onde uma única verdade não existe... existem todas.” Didha Pereira

Prazeres é uma pessoa terna e branda com os que merecem, mas também sabe ser grossa quando é necessário. Quando se predispõe a fazer algo, se prepara. A sua carreira artística é um sucesso merecido, produzido passo a passo. Ela batalhou, buscou oportunidades e procurou estar junto das pessoas que podiam fazer com que crescesse. Queria que todos os atores que passassem por mim fossem iguais a ela; primeiro, porque já trazia consigo um talento nato; segundo, porque o que não estava em sua genética, ela não tinha problemas para buscar. Posso afirmar que a carreira da Prazeres é uma constante escalada, algo vertiginoso e que não vai parar tão cedo. Desejo que ela busque crescer muito e quanto mais cresça para o exterior, cresça também na raiz de seu umbigo, em Caruaru, cuja comunidade artística ficou órfã de Prazeres Barbosa. E espero que voltemos a trabalhar juntos algum dia.” Romualdo Freitas

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Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres

COLUNISTAS SOCIAIS

O teatro pernambucano se orgulha de poder contar com a caruaruense Prazeres Barbosa. Sua terra natal ficou pequena para seu talento, que é reconhecido nacionalmente através de sua atuação no cinema brasileiro, que passa por excelente fase. Além dos palcos, a nossa ‘diva’ do teatro está tendo a oportunidade de mostrar seu talento em todos os lares das famílias brasileiras, através da Rede Globo. Falar sobre Prazeres Barbosa é fácil. Um velho adágio popular se encaixa bem com essa pessoa humana e inteligente de que estou falando: ‘são nos pequenos frascos onde encontramos as melhores essências’. Amiga, é um grande prazer fazer parte de seu ciclo de amizades. Que seu talento seja um aprendizado para muitas gerações de artistas.” Cervanttes

Desde que ela começou acompanho o seu trabalho, sempre crescente. Tudo o que ela faz é com excelência. Como ser humano é maravilhosa e sempre atenciosa com a imprensa. Todos os papéis que faz no teatro, interpreta-os dando mais vida. Agora, Prazeres está conquistando um espaço que sempre foi reservado a ela.” Jotta Lagos

Prazeres Barbosa é um referencial das artes cênicas na Cidade. Acompanho seu trabalho desde que começou nos palcos como atriz, ministrando oficinas e montando espetáculos. Muitos artistas estão no palco hoje e começaram com ela. Fico feliz em ver uma caruaruense brilhando lá fora, pois sabemos como é difícil conseguir um espaço nesta vida. Prazeres na TV ou cinema é Caruaru em evidência. Ela é um patrimônio da nossa cultura e de nossos valores.” Marcolino Junior

Quantos exemplos ouvimos falar todos os dias de personalidades que superaram dificuldades, acreditaram no que muitos achavam impossí217


Prazer em Conhecer vel e provaram com a determinação que através do trabalho e da vontade de vencer, é que se pode superar as próprias barreiras, e principalmente aquelas impostas pelas circunstâncias. Prazeres Barbosa vem a cada ano provando para ela mesma que é possível sempre escrever em algum lugar do universo social a nossa história com o que chamamos de sucesso: a marca do nosso trabalho.” Paulo Magrinny

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Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres AUTORIDADES QUE ACOMPANHARAM SUA TRAJETÓRIA

Prazeres Barbosa faz parte de um conjunto de valores do teatro de Caruaru, destacando-se por seu talento, o que lhe assegurou um importante papel nas artes cênicas, coroado pelo convite da TV Globo. Prazeres está entre os artistas que engrandecem o nome de Caruaru por onde quer que passe, pois seu brilho se destaca onde sua arte estiver. A força e a garra desta artista caruaruense é uma das marcas mais concretas da personalidade de mulher nordestina. Sua desenvoltura no meio cultural a faz uma das estrelas premiadas no mundo das artes do país. A multifacetada Prazeres Barbosa é daquelas figuras de encanto nato. Sua expressividade, seja nos palcos, nas telas ou mesmo na vida real, é a marca maior da artista que sempre habitou em seu interior. É um orgulho para Caruaru ter Prazeres Barbosa no rol das figuras inteligentes e dos nossos profissionais exemplares.” José Queiroz de Lima, prefeito de Caruaru

Prazeres Barbosa é uma das mais talentosas atrizes do nosso Estado, que nasceu para brilhar nos mais diversos palcos do nosso Brasil.” Miriam Lacerda, deputada estadual

Prazeres Barbosa é o maior talento do teatro caruaruense a serviço do teatro brasileiro. É uma estrela de brilho constante, que quando está em cena, os sistemas de iluminação dos mais diversos teatros são ofuscados por sua luminosidade.” Tony Gel, vereador

Prazeres é uma das maiores revelações do teatro em Caruaru. Durante o período em que acompanho as artes cênicas na cidade, tivemos grandes nomes como Lício Neves, Vital Santos e a própria Prazeres, uma pessoa que tem enriquecido nossa cidade com seu trabalho e dedicação. Hoje, ela tem se projetado e ao mesmo tempo projeta Caruaru nacionalmente. Como pessoa é fora do sério, a acho excelente, uma gentleman, super edu219


Prazer em Conhecer cada, preparada e amiga.” Leonardo Chaves, vereador

Sem dúvida, Prazeres Barbosa pode ser considerada a grande diva do teatro pernambucano. Destaque no cenário artístico caruaruense, ela conseguiu levar o nome de nossa terra para todo o país, graças ao êxito conquistado depois de muitos anos de luta. Sua chegada a uma grande emissora nacional representa a valorização da nossa cultura e, acima de tudo, demonstra a importância de batalhar pelos sonhos de forma ética e profissional, sempre esperando a oportunidade de mostrar o próprio potencial. Além de tudo, Prazeres ainda contribui de forma intensiva para o surgimento de muitos artistas locais por meio de sua Companhia de Produções Artísticas, e, futuramente, com o seu teatro, que vem construindo com muito esforço e, certamente, será mais um patrimônio da cultura caruaruense. Por esses e outros motivos, declaro aqui minha admiração e respeito por essa grande artista, digna de todas as homenagens e demonstrações de carinho que lhes sejam rendidas.” Laura Gomes, vereadora

A gente que acompanha Prazeres Barbosa desde seus primeiros passos e até hoje, percebe uma marca importante, além do talento que ela tem, e que a fez caminhar nessa longa e importante estrada da arte: é que ela mantém a mesma simplicidade dos tempos iniciais de sua carreira, o que, para mim, é uma marca importante de uma grande atriz.” Jorge Gomes, vice-prefeito de Caruaru

Prazeres Barbosa é daquelas mulheres que fazem a diferença, independente de onde estão. Sinônimo de garra, de luta, de transparência, mostrando não só com palavras, mas com ação, a que veio. Para mim, é uma heroína que rompeu barreiras como atriz, como mulher e, acima de tudo, como ser humano.” Edileuza Portela, advogada, professora e poetisa

Disciplina e paixão sempre moveram a trajetória de Prazeres e certamente a acompanharão por toda a vida, como aliados da sua desenvoltura em cena e responsáveis pela consolidação da sua carreira. 220


Capítulo 9 - Olhares sobre Prazeres É exemplar sua entrega ao palco e à vida, a quem ela fez espelho um do outro, na busca incessante do conhecimento e do reconhecimento profissionais. A vida vem impondo-lhe papéis que ela vai desdobrando, um a um, como atriz e mulher de coragem admirável, sempre pronta para o próximo desafio.” Walmiré Dimeron, consultor cultural e historiador

Prazeres mantém uma longa tradição de Pernambuco de apresentar grandes atrizes aos palcos do Brasil. São as divas que levam a nossa cultura, o nosso sotaque ao cinema, à TV, ao rádio. Com sua simpatia, sua simplicidade e sua autenticidade, Prazeres vem mostrando nos últimos anos por que é uma das nossas artistas mais premiadas. Prazeres Barbosa é um orgulho para nós pernambucanos, em especial para o povo de Caruaru, que tem uma das cenas culturais mais ricas do nosso Estado. Sou fã da teledramaturgia brasileira. Só não acompanho mais por causa das minhas responsabilidades políticas, que, muitas vezes, entram pela noite adentro. Outra virtude de Prazeres é a determinação, que a fez lutar para conquistar seu espaço num mercado tão disputado como esse. É um exemplo de profissionalismo.” Jarbas Vasconcelos, senador (PE)

Acompanho a brilhante trajetória da atriz Prazeres Barbosa de há muito. Conheço seu profissionalismo e sei que somente com muita abnegação foi possível o sucesso alcançado. No entanto, continua uma figura excepcionalmente simples, extremamente atenciosa com todos. É uma excelente atriz, solidária com a família, uma invejável amiga. Por isso merece meu respeito, minha admiração e meu permanente incentivo. Por tudo isso, pela vibração que consegue imprimir em tudo que faz, pelo brilhantismo de suas ações em todos os setores de sua vida, é exemplo de força e de coragem.” José Pereira, presidente da Fundação de Cultura e Turismo de Caruaru

Prazeres Barbosa é uma das maiores revelações do teatro, em Caruaru, que ultrapassou fronteiras, chegando a fazer parte do cast de uma das maiores emissoras do País. É uma prova de que Caruaru é um grande celeiro de revelações em todas as áreas da cultura.” Anastácio Rodrigues, 221


Prazer em Conhecer presidente do Instituto Histórico de Caruaru

Em uma citação sobre a atriz Prazeres Barbosa, sempre aparecem as palavras talento e sucesso. Ela transformou o sonho de estar no palco em personagens marcantes, prêmios importantes e reconhecimento do público e dos colegas de profissão. Hoje, tem seu nome inscrito na galeria dos principais artistas de Caruaru e ainda ganhou espaço nacional, em um período da vida em que a maioria das pessoas desiste de lutar por seus ideais. Esta parece ser sua maior contribuição: ensinar aos novos artistas que determinação e confiança em seu próprio potencial são atributos valiosos e fundamentais.” João Lyra Neto, vice-governador do Estado de Pernambuco

O que chama a atenção na presença de Prazeres Barbosa, no palco, é a sua energia e capacidade de divertir, emocionar e fazer refletir. É uma mulher que construiu uma trajetória de sucesso – que extrapolou as fronteiras locais - à custa de trabalho e dedicação. Tudo isso, temperado com muito talento para construir personagens marcantes, faz dela um patrimônio de Caruaru e referência obrigatória para jovens de toda a região que desejam ingressar no universo do teatro, do cinema e da televisão.” Mércia Lyra, empresária

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Meus Introspectos Prazeres Barbosa

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Prazer em Conhecer

AMOR Acaso Você chegou na minha vida Como quem não quer nada Sentou-se na calçada Pra me ver passar Você, tão menino e tão puro Tão homem maduro Amando ao olhar, Sem se achegar. E eu, que nem te conhecia Vivia vazia na vida a vagar Então, com a tua ousadia Quebraste a vidraça No peito e na raça Fazendo estilhaço Pra me conquistar. A vida tem dessas surpresas Sentada à mesa do computador O mundo se joga a teus pés Sem saber quem tu és Fervilhante de amor. E assim, nesse encontro maduro Seguro misturo nossas emoções Amando, beijando e babando De amor derramando Grandes sensações. 224


Meus Introspectos E nesse fascínio da vida Segue agitando o meu coração Que dança, balança, flutua E no claro da lua Amamos no chão.

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Prazer em Conhecer

O Alerta do Amor Foi você que me encheu de ternura Mostrou-me a brancura Do amanhecer Foi você que olhando o horizonte Mostrou-me a ponte Que me liga a você. Foi você que com esse jeitinho Tão manso e tão terno Que nunca se viu Alertou-me que alguém só acerta Quando não usa a fecha Da qual se feriu. Daí, então, me senti forte Como se um suporte Me erguesse aos céus Ressurgindo, feliz e sorrindo Como se estivesse Nos braços de Deus Ressurgindo, feliz e sorrindo Como se estivesse Nos braços de Deus.

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Meus Introspectos

Tua Volta, Meu Prazer Que bom saber que sempre voltas Na ânsia de ter tudo aquilo que é teu Sentir teus toques tão alucinantes Deixando o meu ser tão marcante Certeza de ser sempre teu Queria que esse momento parasse Pra gente viver mais profundo esse amor Saber que não mais partirias E que ficarias somente Pra te deleitar no prazer Mas sei que isso é quase impossível A vida é sempre de amor e dever Mas partes deixando o meu peito a sorrir Sabendo que feliz te fiz E certa que depois virás Eu sei que o nosso amor é um sim E a vida da gente é sempre um não Mas sabe que estou aqui sempre e só sua Para despojada e nua Sentir o prazer de amar.

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Prazer em Conhecer

CARUARU Os Prazeres de Caruaru Tapioca de coco, nego-bom Mel de engenho, de abelha e uruçu Cocada, rapadura e beira-seca Tem a Feira de Caruaru. A sulanca tem saia, tem vestido Pra vestir a menina mais faceira. Há também artesão e costureira, Vendedor, pipoqueiro e serralheiro, Coquista, aboiador e violeiro Tudo isso se encontra lá na feira, E a minha cidade também tem Amendoim e azeite de dendê, Suspiro, raspadinha e cajuína Se encontram nas ruas pra vender. Tem quartinha, pavio e candeeiro, Os bonecos e bois de Vitalino, Mamulengo pra alegrar o menino, Raspa-coco, xerém, muito forró. Teatro, vela preta e catimbó Reunindo todo mundo num só ninho.

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Meus Introspectos

Plano de Doença O que é que você me diz De um “plano de saúde” Que promete céus e terras Pagando até ataúde Que transporta de helicóptero Ambulância e até de bugre? Pra vender tem mais de 100, Pra servir, quase nenhum. Quando você tem uma dor Começa o zum-zum-zum. Você grita, estrebucha e chora Morre e não aparece um. E quando você imagina Que tem direito a um médico, Corre urgente ao hospital, Na esperança de um remédio, Toma “um chá” de duas horas, Sentada em cima de um ferro. Depois de muito esperar Pelo único doutor, A fila, com mais de vinte, Gemendo e sentindo dor, Ele diz que não é mágico Pra curar seu mau-humor. E olhe que o meu plano É do tipo especial! Que garante ter de tudo 229


Prazer em Conhecer UTI e coisa e tal, Imagine se ele fosse Daqueles que é tudo igual? Diga-me, caro colega, O que há de se fazer? Se pago não dão direito, Se não pago vou morrer, Vivo nesse puxa-encolhe Sem ter pra onde correr.

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Meus Introspectos

Morro do Bom Jesus Encontro-me no ponto Mais alto da cidade de Caruaru. Contemplo-a! Lembro-me da minha adolescência Quando, aos domingos, Era o lugar preferido Dos enamorados, Crianças e adultos. Era uma festa só! Pipoca, pitomba, sorvete... Hoje, cincoenta anos depois Volto ao mesmo lugar e... Como cresceu minha cidade! E quanto abandono ao meu querido Morro do Bom Jesus! Que risco estou correndo! Li em algum lugar: “Uma cidade é o lugar onde seus habitantes habitam. Triste da cidade que não consegue Dar conta de sua única finalidade”. Descubro então Por que “o poeta é o ponto alto Da sensibilidade humana.”

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Prazer em Conhecer

FÉ E RELIGIOSIDADE Destino da Fé Há uns que têm muita fé. Em outros, há pouco menos Sem saberem o que é fé Começam a valer menos Conseguindo arrancar O pouco ou nada que temos. Se tinha alguma esperança Num Santo que me agradava, Vem de lado um e cochicha Que aquilo não vale nada, E até o quadro de Deus Outro quebrou na pancada. Um diz que Jesus já veio, Outro diz que vai chegar, Um outro diz que é besteira Esse modo de pensar. E eu fico doida entre eles Sem ter em quem confiar. Um bate no peito – Estou salvo! Mais um rebate – Mentira! O terceiro – Que blasfêmia! E outro – Hipocrisia! E entre eles eu viro Um pobre cego de guia. 232


Meus Introspectos Valei-me, Senhor meu Deus Dessas pragas de urubu! Querem queimar minha alma. Roubaram-me, e eu fiquei nu. E o pouco de fé que eu tinha Foi pro rabo do tatu.

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Prazer em Conhecer

Criação do Mundo Faça-se o homem! Foi ordem do Criador. Haja vida nesta terra! Ordenou cheio de amor. E hoje o que observamos: Um universo de terror! O homem a quem Deus o fez Sua imagem e semelhança, Se mostrou um vil tirano, Plantando a desesperança, Fingindo a humanidade Que tem alma de criança. Não sei como lá do alto, Contempla Deus sua obra: É filho matando pai Como veneno de cobra, Irmão entregando irmão, Num joguete de manobra. Oh! Meu Deus, que tudo pode, Olha por nós, os mortais, Afasta das nossas vidas Ações prejudiciais, Plantando nos corações Teu amor transcendental. Sonho um dia contemplar Tua face resplandecente, E abrindo Teus largos braços 234


Meus Introspectos Me acolhendo ternamente, Compartilhando a emoção De poder Te ter presente.

Meu Anjo da Guarda Existe em nós um Ser Angelical Que o cognominaram “Anjo da Guarda” Nos guiando em todos os momentos, Protegendo e indicando a estrada. Nos momentos felizes ou melancólicos É presença vital de corpo e alma. Quando quer nos dizer alguma coisa, Utiliza de nós a consciência Aquele sentimento inexplicável, Que nos faz refletir com veemência. Alertando quando somos desumanos Instigando de nós a complacência. Como é bom esse cuidado generoso Que os braços deste Ser sempre me envolve. Gosto de sentir que de mim cuida, Se faz sol, escurece ou até chove, Eu sinto que a sua proteção É o ciclo do Universo que se move. Portanto, eis-me aqui, meu Anjo Bom. Usa-me naquilo que convém. Guia-me com sentimentos nobres Que não possam ofender nunca a ninguém. A união entre os homens tem sentido Quando juntos compactuam com o bem. 235


Prazer em Conhecer

POLÍTICA A Corrida pelo Poder Eu muito me preocupo quando vejo amigo meu, Pessoa de boa índole que em intriga não se meteu, Que dorme e acorda sonhando com lugar que não é seu. É mesmo impressionante como o poder o atrai Mesmo sabendo que em tudo nenhuma virtude traz Pra ele importa a mídia e não o pouco que faz. Pra início da corrida, funda uma Associação, Assumindo a presidência burlando qualquer ação, Eleito Vereador pensa logo em promoção. Pra si não importa a ética, respeito e honestidade, Falcatruas, malandragem, inimigo ou falsidade. O que vale é o poder de governar a cidade. O inconformismo é tanto que tenta ser Federal, Com os olhos só voltados pro valor do capital, Senador agora é pouco faz manobra e coisa e tal. Depois desse patamar que já não palita os dentes Costuram os interesses se fazendo de decente Num conluio que faz medo querendo ser Presidente! Aonde será, meu Jesus, que esse povo quer chegar? Querendo só venha a nós, chutando o povo pra lá. Acho que de Deus o lugar querem eles ocupar!

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Meus Introspectos

Curso de Formação para Candidatos O que é formar político Alguém pode me explicar? Que tal de curso é esse Que andam a alardear? Prometendo “formação” Ao político que for lá. Eu nunca ouvi falar nisso, Essa é a primeira vez. Pra mim, ser político bastava Ser sério e ter honradez, Honesto, leal, competente... E falar com fluidez. Aí eu fico pensando No que eles vão ensinar! Como se deve mentir A receita pra enganar, Ou justificar o salário Que nos cargos vão ganhar. Será que é a perfeição Na maneira de driblar? Ou a forma convincente Do eleitorado manobrar? Talvez vão tirar o diploma Próprio do parlamentar! É meu amigo, é dureza! Ter que ver, ouvir e calar. Pois se vejo me furam os olhos. 237


Prazer em Conhecer Se ouço, vão me espancar, E pra sair dessa ileso (a) Prefiro não mais falar.

A Quem Couber As perguntas me chegam a cada instante, E, às vezes, não sei como explicar O motivo que os homens da política Comem tanto e não conseguem saciar A fome do poder e da ganância, Onde o verbo predileto é SUGAR. Há aqueles que chegam sorrateiros, Dizendo que não querem, mas só querendo, Inventando que o povo o conclama Pra tirar a cidade do perrengue. Na verdade são todos marreteiros Que prometem dar mais e só dão menos. É um disse-me-disse que faz medo A nós, pobres míseros mortais, Que de longe observam o lenga-lenga A ganância deles todos que querem mais Enganando muitas vezes a si mesmos E até se fingindo que são capazes. A política, meu amigo, é um perigo Para aqueles que vêm de mala e cuia, Atropelando tudo a sua frente Mandando todos nós para as cucuias, Sem medir as consequências dos seus atos Enrolando a todos no papo, brincando e jogando puia. 238


Meus Introspectos Não entendo qual a mágica que eles usam, Ou nós é que somos idiotas, Que a cada quatro anos que passam, Conseguem driblar fatos em fofocas. Novamente caímos na armadilha E bestamente nos sentimos patriotas. Acredito em quem fala minha língua, Que olha nos meus olhos sem soslaio. Ponho fé nos que comem o que como, Porque sabem o que carrego no balaio, Balaio que hoje é cesta e até pacote Que varia de acordo com o salário. Precisamos vigiar e ter cuidado Com aqueles que se chamam marajás! Que arrotam poder e sapiência, Sem saber de onde vêm, pra onde vão, Desconhecem o que é viver sem nada Já que a operação que praticam é a do MAIS! Não estou cobrando deles todos Uma cidade fantasiosa das revistas. Quero apenas viver dignamente Com saúde e educação às nossas vistas. Segurança, emprego e água potável Ingredientes indispensáveis à boa vida! Já estamos fartos de vocês! Com promessas que nunca hão de cumprir. Esgotamos de vez a paciência Pois nem cuspo há mais para engolir. É vocês enganando o tempo todo 239


Prazer em Conhecer E induzindo a nós todos a mentir! Por que será que apesar de sabermos tanto Continuamos a colocá-los no poder? Será que perdemos a vergonha, Ou estamos nos dispondo a nos vender? No entanto, continuo alertando-os Quando eles ganham fazem questão de não os ver! SERVIR é dever do governante. AJUDAR é o verbo mais usado. PROJETAR é o discurso incessante. MENTIR é o verbo praticado. Não sei se com esses predicados, Ele ainda é capaz de ser votado. Se alguns nos chamam de Mané, Borra-botas ou coisa parecida, Advirto que com esse tratamento, Temos força que até meu Deus duvida. A força poderosa do voto Transformando de vez a sua vida. Ainda não perdi a esperança De poder gritar a toda altura, Que apesar de sermos pobres e pacatos, Há limites nas nossas estruturas, Limites de aguentar as frustrações Daqueles que maquiam a cultura.

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Prazeres em Imagens

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Prazer em Conhecer

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Fotos

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Prazer em Conhecer

Dona Antonina - Mãe Seu Antonio - Pai

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Fotos

Formatura do Pedagógico, no Colégio Estadual de Caruaru (1973)

245 A pequena Prazeres, na quarta-série do Grupo Escolar Augusto Tabosa, em Caruaru


Prazer em Conhecer

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Fotos

A professora Prazeres Barbosa, em desfile cívico

247 Com aluna, na Escola Elisete Lopes


Prazer em Conhecer

Em sua estreia, no espetáculo A Pena e a Lei (1984)

248 O Recado do Verde, de Erenice Lisboa


Fotos

Padre Elias, do Nó de 4 Pernas

249 Encarnando a Madre, do complexo espetáculo Avatar


Prazer em Conhecer

Arrancando risos com a engraçada Sebastiana, de A Promessa

250 Fotografia do Jornal Diário da Região, de São José do Rio Preto (SP), em 1991


Fotos

Companhia de Produções Artísticas Prazeres Barbosa

251 A Feira, encenado no Rio de Janeiro (1996)


Prazer em Conhecer

Valsa nº 6

252 NegroRei, montado no Recife (1997)


A Pedra do Reino Fotos

253 Verônica, de Fiel Espelho Meu, o primeiro monólogo encenado por Prazeres


Prazer em Conhecer

Cena do filme A Máquina, que lhe abriu portas na TV Globo

254 Espetáculo A Feira, montado por sua Companhia, em 2003


Fotos

Whisk pra Guiomar

255 Após premiação numa das edições do Feteag


Prazer em Conhecer

Prazeres e seu filho, Vergílio Barbosa

256 Com o primeiro esposo, Antonio de Melo


Fotos

Tradicional fotografia de casamento (1975)

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Prazer em Conhecer

Dona Antonina recebe o carinho da filha caçula

258 Prazeres em família


Fotos

A atriz e seu segundo esposo, o ator Francisco Torres

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Prazer em Conhecer

América au Poivre

260 Agreste Adentro


Fotos

Chega de Cangaço

261 O Dia em que Roberto Faltou


Prazer em Conhecer

Por Toda Minha Vida

Malhação

262 A Favorita


Fotos

Com Dira Paes, em sua segunda participação no seriado A Diarista (2007)

A Diarista: primeiro trabalho na Globo (2005)

263 Duas caras


Prazer em Conhecer

A Pedra do Reino

Cama de Gato

264 Tempos Modernos


Fotos

Com o diretor Aguinaldo Silva

Abraçando Fernanda Montenegro

Prazeres, Antonio Fagundes e o diretor de fotografia José Tadeu Ribeiro

265 Com sua amiga, Fabiana Karla


Prazer em Conhecer

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Fotos

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Prazer em Conhecer

Sobre o Autor

Fernandino Neto é jornalista e pós-graduando em Assessoria de Imprensa pela Faculdade do Vale do Ipojuca (FAVIP). Concluiu o bacharelado em Comunicação Social – Jornalismo, recebendo os títulos de orador da turma e aluno laureado do curso. Atuou como assessor de imprensa da Câmara Municipal de Caruaru no biênio 2007-2008 e, atualmente, é repórter do Jornal Vanguarda de Caruaru.

Contatos: fernandino360@gmail.com

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Mídia Consultada

Jornais Diário da Borborema (Campina Grande – PB) Diário da Região (São José do Rio Preto – SP) Diário de Pernambuco Feira Hoje (Feira de Santana – BA) Folha de Pernambuco Folha de Santa Fé (SP) Folha de São Paulo Folha Ilustrada (SP) Jornal A Defesa (Caruaru) Jornal da Manhã (Ponta Grossa – PR) Jornal da Paraíba Jornal de Sergipe Jornal do Commercio Jornal Extra de Pernambuco Jornal Vanguarda de Caruaru Tribuna do Ceará

Sites Blog pessoal da atriz (www.atrizprazeresbarbosa.blogspot.com) Globo.com Youtube.com

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