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Da distopia de Aldous Huxley a um clássico sobre os mercados

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Ben Ritchie

Ben Ritchie

Duas sugestões de leitura numa altura de recolhimento. Um livro sobre distopias, com refl exões muito válidas para o momento que vivemos, e outro sobre tempos passados nos mercados fi nanceiros.

oje em dia, a presença crescente do estado é H tolerada ou mesmo exigida por muitos para resolver problemas em nome do chamado bem comum. Pelo caminho sacrifi cam-se direitos até então vistos como inalienáveis. Neste contexto, o romance distópico de Aldous Huley, lido hoje, quase 100 anos após a sua publicação, soa a mau agoiro, um aviso sério para aqueles que prezam a liberdade.

Por sua vez, a crescente digitalização das atividades humanas retirou o glamour de outros tempos, mesmo nos mercados financeiros. É neste contexto que as entrevistas de Jack Schwaeger a investidores de sucesso do tempo em que a tecnologia não era tão preponderante são verdadeiros clássicos.

O Admirável Mundo Novo

Aldous Huxley

Oromance distópico de Aldous Huxley, escrito há quase 100 anos, contém elementos com os quais podemos construir analogias com a sociedade do nosso tempo. Numa carta dirigida a George Orwell, autor de 1984, o autor do Admirável Mundo Novo analisou a evolução da sociedade desde a publicação destes dois ensaios distópicos, designadamente em que medida uma ou outra distopia estavam a concretizar-se no mundo real. Para Huxley corríamos um risco maior de vermos concretizadas as profecias do Admirável Mundo Novo do que as de 1984. Huxley argumentou que embora a efi cácia dos métodos totalitários, como por exemplo a vigilância permanente através do Big Brother, fossem efi cazes a curto prazo, era inverosímil que essa efi cácia fosse sustentável a longo prazo quando apli-

Jack Schwager é um analista de mercados que fi cou conhecido pelos seus livros da série The Market Wizards, especialmente o primeiro The Market Wizards – interviews with top traders, publicado em 1989.

O fascínio do livro, sobre o qual de vez em quando passo os olhos para uma releitura rápida, decorre, em primeiro lugar, de um sentimento nostálgico sobre um mundo que acabou, designadamente o cada sobre a maioria da população. Por conseguinte, uma sociedade do tipo do Admirável Mundo Novo, asséptica, anestesiada, condicionada no pensamento livre e, sobretudo, com provisões certas de felicidade para as várias castas, seria uma sociedade mansa, pouco dada a rupturas sociais e, por isso, mais concretizável e duradoura.

Na verdade, nas sociedades ocidentais do nosso tempo os elementos das duas distopias surgem interligados numa espécie de síntese diabólica. Hoje é possível assistirmos a um caminho para a violência intrusiva do estado ao estilo do livro de Orwell, embora aquilo que sustenta essa intrusão no longo prazo seja o facto desta se aplicar sobretudo sobre uma parte da população, em benefício de curto prazo da outra parte. Para que tal resulte, o ambiente cultural e o condicionamento do mundo fi ccionado por Huxley têm de veicular mensagens, via governo e comunicação social, que mais não são do que doses de soma, a droga que nos mantém num estado letárgico e que nos afasta das agruras da infelicidade, do risco, do desamor e da dúvida. A droga que, de tanto nos condicionar, nos destrói a liberdade em nome da segurança e da boa cidadania.

mundo dos velhos pits das bolsas de futuros. Em segundo lugar, o livro é, talvez involuntariamente, um ensaio sobre a natureza humana, a sorte ou o azar, os erros ou os acertos, o plano ou a ausência dele, o talento ou a inépcia.

O formato é original dentro do género fi nanceiro. Trata-se de entrevistas a um conjunto de investidores que tiveram extremo sucesso nas décadas anteriores à publicação do livro (a década de 70, caracterizada por níveis nunca mais vistos de infl ação nos países desenvolvidos, e a década de 80, em que houve mais um choque petrolífero e um crash monumental em outubro de 1987).

No meio de tanta diversidade de experiências, o livro tem vários méritos e destinatários a quem pode ser útil a leitura. Para o jovem interessado nos mercados, trata-se de uma espécie de torrente de dicas, conselhos e mesmo, aqui e ali, mini-aulas de funcionamento dos mercados, com uma sofi sticação que obriga a leituras adicionais. Já para o profi ssional ou investidor experiente, trata-se de um clássico. Deve ser guardado, acarinhado e revisitado de vez em quando.

The Market Wizards

Jack Schwager

ESPLENDOR No país é possível apreciar paisagens compostas pelas cores avermelhadas das dunas, pelo branco do sal ou por árvores que secaram há centenas de anos.

NAMÍBIA

O ESPLENDOR DO DESERTO

Natureza, paisagens infi nitas, céus de cores pouco convencionais e uma linha do horizonte que se torna eternamente inalcançável... Para quem nunca explorou o sul do continente africano, a Namíbia é uma boa forma de começar.

Quando fui desafi ado por uma grande amiga para visitar a Namíbia, sabia muito pouco sobre este país africano e esta viagem não constava da minha lista de preferências. Contudo, não costumo deixar este tipo de desafi o sem resposta. Como o meu pai gosta de afi rmar, eu estou sempre pronto para viajar - ainda por cima, nessa altura estava a viver mesmo ali ao lado, na África do Sul. Como dizer que não?

As minhas expectativas eram baixas. O meu desconhecimento e crenças, faziam-me acreditar que um país essencialmente constituído por enormes desertos iria revelar-se pouco interessante. Felizmente, fui surpreendido desde o primeiro momento. Comprovei com os cinco sentidos que a beleza da natureza revelava-se, muitas vezes, fora de pré-conceitos.

Comecei em Windhoek, capital do país e cidade mais populosa. Guardo na memória de outras viagens por países

africanos, que as capitais são normalmente o que de menos interessante há para visitar. Talvez seja a perceção de um citadino, mas África fascina-me sobretudo pela natureza, paisagens infi nitas, por céus de cores pouco convencionais, e por uma linha do horizonte que se torna eternamente inalcançável.

EM BUSCA DA AVENTURA

Escolhemos um jipe para nos deslocarmos e apetrechados de água e mantimentos, fi zemos a primeira etapa de 400 km até Sossusvlei. Apesar da sua enorme extensão, a Namíbia tem poucas estradas alcatroadas, sendo a maioria dos pisos cobertos de gravilha e de sal (junto à costa). Apesar de tudo são estradas com boas condições. Este primeiro contacto com o deserto, foi-se revelando surpreendente a cada quilómetro que palmilhava. A sensação de conduzir numa estrada só minha por longas horas, tendo como cenário uma planície infi nita e despida de vida, revelou-se tranquilizante. Sossusvlei foi a região que mais gostei de visitar na Namíbia. Um dos sítios a visitar é Deadvlei (traduzido de Afrikaans signifi ca charco morto) onde é possível apreciar paisagens compostas por cores avermelhadas das dunas (devido à concentração de ferro na composição da areia), pelo branco do sal, em áreas onde outrora houve água, árvores que secaram há algumas centenas de anos e se mantêm erguidas, tudo coberto por um céu azul de perder de vista. Qualquer foto é sempre digna de um postal. Vale também a pena visitar e escalar as dunas que nos foram apresentadas como as maiores do mundo.

Deixando o deserto vermelho para trás, fomos em direção a norte. Mais uma pequena viagem de centenas de quilómetros, tendo com destino fi nal a cidade costeira de Swakopmund. Ao percorrê-la é demasiado evidente a infl uência alemã na arquitetura da cidade. Vale a pena explorar os recantos! Aqui aproveitei para experimentar sanboarding e quad bikes nas dunas. Diversão garantida! Skeleton Coast Road é uma estrada de sal e porventura uma das mais impressionantes que já percorri. A Costa do Esqueleto recebe este nome devido a enormes ossadas de baleia que outrora ocupavam os areais. Presentemente é apenas possível encontrar destroços de navios naufragados, que de certa forma também parecem esqueletos. Chegados a Cape Cross encontramos um padrão em pedra, com uma cruz no topo. Deixado ali no fi m do mundo por Diogo Cão em 1486, para marcar o ponto mais meridional alcançado pelos europeus em África. Como se isso não fosse sufi ciente para me levar até lá, é também casa da maior colónia de focas do mundo.

Para quem nunca explorou o sul do continente africano, a Namíbia é uma boa forma de começar. Para além do deserto, é possível equacionar uma visita ao Parque Natural de Etosha, para um contacto direto com a vida selvagem, incontornável no imaginário de quem quer conhecer África.

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