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As duas caras de um crude disparado

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Richard Colwell

Richard Colwell

AS DUAS CARAS DO CRUDE DISPARADO

Numa classe de ativos tão heterogénea como a dos emergentes, há vencedores e derrotados da subida das matérias primas. Porque não é apenas o petróleo que está a disparar, há outras commodities relacionadas com a agricultura que também estão a acusar pressão.

Os elevados preços das matérias primas já se fazem sentir nos mercados emergentes. Patrick Zweifel, economista chefe da Pictet AM, fez as contas. Relativamente ao consumo líquido de petróleo, o seu indicador de vulnerabilidade do crescimento do PIB para um aumento de 25% dos preços do crude, mostra maior impacto negativo na Ásia. Em países como a Tailândia, calcula que retirará cerca de 1,2% do seu PIB. Em Taiwan, Índia, Coreia e África do Sul, o decréscimo será de cerca de 1%.

Para além disso, o seu indicador de vulnerabilidade à inflação, por causa dos preços do petróleo e alimentos, mostra maior efeito no México (7,2% do aumento de inflação anual), Colômbia (6,7%), Peru (4,7%), Polónia (5,5%) e Hungria (5,4%).

Marco Mencini, gestor sénior da Plenisfer Investments SGR (parte da Generali Investments), coloca o foco noutras regiões. “A Turquia ou a Índia (cujos 70% das contas correntes depende das importações de petróleo) estão destinados a sofrer subidas. O mesmo acontece com a China, muito dependente da energia e com uma baixa produção interna, o que está a provocar o aumento dos seus programas nucleares”.

Também sofrem os emergentes com baixas reservas de divisas. “No Sri Lanka, o Governo luta para financiar em dólares norte-americanos as suas faturas de combustível mais elevadas devido ao facto das suas reservas monetárias estarem agora em níveis prévios aos da pandemia”, conta Claudia Calich, gestora do M&G (Lux) Emerging Markets Bond Fund.

Mas como em todas as crises, há duas caras de uma mesma moeda. Na verdade, já o vemos refletido em alguns índices. Richard Bernstein, CEO e fundador da RBA, dá os dados: desde o início do ano que o Brasil sobe cerca de 13%; o Chile, cerca de 12%; a Indonésia, cerca de 5%. Em comparação, o índice ACWI cai cerca de 13%. “Um crude e outras matérias primas mais elevadas também deveriam ajudar os emergentes exportadores como o Gulf Cooperation Council (GCC) e a América Latina”, explica Aneeka Gupta, diretora de Análise Macro da Wisdom Tree. Como assinala, há países com preços breakeven muito baixos. Por exemplo, para o México está tudo bem em ter o petróleo a 50 dólares. De todas as respostas que nos aportaram as gestoras, destaca-se uma região como clara beneficiária: a América Latina. E dentro dela o Brasil.

“Não só foi o único país da América do Sul que pôde aumentar a sua produção do crude em 2020, como também em 2021 a corporação estatal Petrobras impulsionou novos projetos petrolíferos e destinou 68.000 milhões de dólares para a expansão da produção”, conta Dillon Jaghory, analista da Global X. Sopram ventos a favor para o país. Os Estados Unidos agora estão a procurar fontes alternativas de petróleo, e inclusive têm dado o passo de abrir o diálogo com a Venezuela. O Brasil é fácil de

NÚMERO 44 MAIO E JUNHO 2022 .

ENTREVISTAS BIN SHI, UBS AM JOSH DUITZ, ABRDN LEGISLAÇÃO AS SOCIEDADES GESTORAS DE PEQUENA DIMENSÃO PLANIFICAÇÃO OS INVESTIDORES E A CRISE

COM ESTILO UM CONTRABAIXO A INVESTIR A GRANDE DESCONEXÃO

SELECIONADORES FAVORITOS À NUVEM NEGRA DA PANDEMIA, QUE AINDA PAIROU DURANTE O ÚLTIMO AS NUVENS NO HORIZONTE Olhar paraANO, JUNTARAM-SE OUTRAS COMO A DA INFLAÇÃO E A DA GUERRA. OBSTÁCULOS QUE DIFICULTARAM, MAS NÃO IMPEDIRAM OS SELECIONADORES o futuro DE FUNDOS NACIONAIS DE FAZER UM TRABALHO NOTÁVEL.investindo

em saúde

AB International Health Care Portfolio

O RALLY NO PETRÓLEO...

BRENT ($/barril) WTI ($/barril) PREÇO MÉDIO A 5 ANOS

Preço do barril Brent (dólar/barril)

140

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3/2017 3/2018 3/2019 3/2020 2/2021

3/2021 2/2022

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Fonte: estimativa do Credit Suisse

...E NOUTROS RECURSOS NATURAIS

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0%

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Óleo de aquecimento (Petróleo) Brent (Petróleo) WTI Trigo EUA Gás Natural Milho EUA Algodão EUA Açúçar Londres Prata Paládio Cobre

Rentabilidade 2022 (YTD a 22 de março) de futuros das matérias primas. Fonte: Investing.

Ouro Café EUA

abordar e existe a possibilidade de cooperação para assegurar o fornecimento.

Na América do Sul, Carlos de Sousa, estratega de Obrigações Emergentes da Vontobel AM, também destacaria a Colômbia. “É um caso interessante, porque não só vende para fora petróleo, como também é um dos maiores exportadores de carvão do mundo. Recordemos que os preços deste mineral aumentaram muito devido ao facto da Rússia ser o terceiro produtor”, conta.

Entre as posições que William Scholes, diretor de Investimentos da abrdn, sobrepondera, o México é a maior. “Resulta ser um exportador líquido de petróleo, e no país estamos expostos à banca, consumo e aeroportos”, explica.

OUTRAS MATÉRIAS PRIMAS

A América Latina também beneficia de um ponto de vista técnico. Como assinalam da Eurizon, dado que a Rússia já não faz parte do MSCI EM, estes países converteram-se nos maiores beneficiários num contexto de preços elevados das matérias primas. Isto porque os dois setores com maior peso dos recursos naturais (energia e materiais) constituem entre 20% e 45% da capitalização bolsista destes mercados.

Mais além da América Latina, Rob Drijkoningen, corresponsável de Dívida de Mercados Emergentes da Neuberger Berman, calcula que em nações como o Omã e a Nigéria, a conta corrente passará de um deficit a um superavit devido ao recente aumento do preço do petróleo.

Como mencionávamos, outros recursos naturais também estão em alta. E isto é chave na análise dos mercados emergentes. Porque como bem menciona Edgardo Sternberg, gestor de dívida de mercados emergentes da Loomis Sayles (afiliada da Natixis IM), há países que, ainda sem serem grandes produtores de hidrocarbonetos, não se veem tão afetados face aos que produzem esses outros recursos naturais cujos preços também subiram de forma acelerada. “Por exemplo, a África do Sul, que importa todas as suas necessidades de petróleo e gás, produz paládio, platina, ferro e ouro, minerais com grande procura devido ao encerramento das exportações russas. O caso mais triste é o da Argentina, que deverá beneficiar dos seus recursos naturais (petróleo, gás, lítio, potássio, trigo, soja, milho), mas que por erradas políticas económicas não consegue os investimentos e a produção ideais para aproveitar a conjuntura de preços”, analisa Sternberg.

Esta análise de beneficiários e sofredores também se pode elevar ao plano setorial. Por exemplo, Diliana Deltcheva, responsável da equipa de Obrigações de Mercados Emergentes e Nikolay Menteshashvili, analista sénior de Crédito, da Candriam, acreditam que as indústrias de energia, metais, produtores de fertilizantes e energias renováveis estão bem posicionadas.

Pelo contrário, prevê efeitos negativos no transporte, utilities e imobiliário. “São setores com elevada sensibilidade aos preços da energia e materiais”, explicam. Também estão cautelosos no consumo e industriais por causa do efeito da inflação nas matérias primas. Em geral, estão enfocados em empresas com capacidade para transferir a subida de preços nos materiais aos seus clientes.

Também há setores mais imunes. Wim-Hein Pals, responsável de Mercados Emergentes da Robeco, cita as tecnologias da informação, o software e o setor de internet em geral, e o financeiro (bancos seguradoras). Concretamente, nas carteiras core emergentes da Robeco o especialista está sobreponderado em TI e financeiras.

“O setor do petróleo e gás é um claro vencedor, embora com algumas nuances”, pontualiza Andrew Lake, responsável de Obrigações Globais na Mirabaud AM. “Os setores que consomem grandes quantidades de derivados do petróleo, como parte dos seus processos de produção, verão reduzidas as suas margens se não puderem repercutir os custos, como acontece com o setor químico”, explica.

Mas investir em emergentes tem mais zonas cinzentas do que simplesmente analisar os balanços. “Do ponto de vista das ações, os emergentes podem beber do rally no value, mas, por outro lado, em tempos de elevada incerteza e política monetária restritiva, tendem a sentir o vento contrário por causa de uma maior aversão ao risco”, sublinham da Allianz Global Investors.

Para além disso, outro ponto que os investidores não podem esquecer são as valorizações. Tanto nas ações como nas obrigações. É um ponto destacado por Alejandro Arévalo, responsável da Dívida de Mercados Emergentes na Jupiter AM. Para países com dívida investment grade de elevada qualidade muito ajustadas (pensemos no Qatar), o espaço para uma compressão adicional poderá ser limitado. No entanto, os países com dívida high yield mais pequenos (Iraque, Omã e Angola) poderão beneficiar mais do aumento dos preços.

Neste âmbito das obrigações, Yerlan Syzdykov, diretor global de Mercados Emergentes da Amundi, especifica. O especialista optaria por dívida em divisa forte num contexto de preços elevados do petróleo. Porque uma perspetiva mais incerta para o crescimento e para a inflação penaliza a dívida local, pelo que a seleção é primordial. “Continuamos a ter uma inclinação para os títulos de elevada qualidade face aos de baixa qualidade”, acrescenta.

FATORES TÉCNICOS

Também haverá ramificações secundárias. Irina Topa-Serry, economista sénior de Mercados Emergentes na AXA IM, calcula que o impacto económico nos países emergentes virá principalmente de três canais. A esse choque inicial por causa dos preços da energia somaria um repensar da política monetária e da resiliência da procura global.

Tom Wilson, responsável de Ações Emergentes da Schroders, coincide neste último ponto: “Nos emergentes de rendimentos mais baixos, a energia e os alimentos costumam representar uma maior proporção do IPC. Isto afetará o consumo nestes mercados”. Um país vulnerável na sua opinião é a Índia. Para além de ser um importador líquido de petróleo, os alimentos representam mais de 50% do seu cabaz de IPC. E em muitos emergentes representa entre 20% e 30%.

Kunjal Gala, gestor de Mercados Emergentes da Federated Hermes, recorda outra questão: a tendência estrutural na energia. “É provável que as grandes economias impulsionem as energias sustentáveis, o que acelerará a transição de combustíveis fósseis no médio-longo prazo”, comenta.

A OPINIÃO DE

ÁLVARO ANTÓN Responsável de Negócio para a Península Ibérica, abrdn

CRÉDITO INVESTMENT GRADE: É FUNDAMENTAL SER SELETIVO

As perspetivas económicas a curto prazo para as obrigações corporativas de grau de investimento (IG) são bastante desfavoráveis no momento, devido ao ambiente de abrandamento do crescimento mundial, inflação elevada e perspetivas menos favoráveis em termos de política monetária. A este cenário junta-se o conflito na Ucrânia. Contudo, acreditamos que há fatores importantes que contrariam esta situação e que, pelo menos, suportam um ponto de vista globalmente neutro em relação a esta classe de ativos. Uma alteração importante é que o rendimento total e, por conseguinte, o nível inicial esperado de receitas que se pode obter da detenção de obrigações de IG, aumentou significativamente. Este maior nível de rendimento reflete essencialmente o aumento da rentabilidade necessário para compensar os fatores negativos. Ainda assim, o nível de rendimentos disponível aumentou significativamente e pode representar um ponto de entrada mais atrativo para os investidores a longo prazo. É importante destacar que, apesar de existirem variações setoriais e regionais significativas, no seu conjunto, os fundamentais das obrigações corporativas de IG continuam a ser sólidos, o que sugere um risco de crédito contido. Ainda que o aumento dos rendimentos e a solidez dos fundamentais possam ajudar a compensar outros fatores externos menos favoráveis, no contexto atual, a diferenciação dentro do mercado global de IG será mais relevante do que nunca.

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