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Consumo

“... A profissão atrai, não estamos na defensiva, estamos na afirmação do que fazemos...”, Hugo Desnoyer, um dos cortadores mais famosos de Paris.

"...a maior rede de supermercados do mundo, decidiu interromper o corte de carne nas própria lojas e, dessa forma, passou a vender carne exclusivamente embalada..."

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Na passagem do século, a Walmart

Inc., empresa multinacional americana de comércio alimentar que dirige uma gigantesca rede de hipermercados, com sede em Bentoville, Arkansas, adotou uma posição de negócio que mais tarde seria acompanhada por outras grandes empresas de distribuição, em todo o globo.

A maior rede de supermercados do mundo, decidiu interromper o corte de carne nas própria lojas e, dessa forma, passou a vender carne exclusivamente embalada. Uma prática que podemos ver em Portugal no Lidl, Mercadona e Aldi, por exemplo.

Esta alteração parece, à priori, quase ingénua mas, mudou quase tudo em termos de consumo, inclusive, a relação da grande distribuição com a industria de carnes e criou um novo tipo de negocio: o case-ready, o produto pronto para consumo.

Este transformação mostra, inequivocamente, que apesar do cliente não ser mais o mesmo, existe um pano de fundo que colora o comportamento do novo consumidor. Independentemente da sua dimensão, do seu nicho de mercado, entender a sua persona (ou publico-alvo) torna-se fundamental. Isto, porque as pessoas esperam relações mais coerentes.

Mas isto é um incongruência, dirá o leitor. Mas, por incrível que pareça, os produtos pré-embalados oferecem uma relação mais coerente, para além disso, os produtos pré-embalados oferecem uma solução conveniente para o balcão e oferece mais opções para o consumidor, enquanto reduz o trabalho e o desperdicio.

Algumas cadeias de distribuição chegaram rapidamente ao case-ready como forma de não ter rupturas de stocks, eliminar a sala de desmancha e os desperdícios, já para não falar no investimento de equipamento e na sua manutenção. Por outro lado, outros, mantém uma estratégia mais conservadora, embora a tendência seja diminuir, paulatinamente, os seus balcões de venda de carne.

mas como é Que um Produto case-ready Pode criar relações mais coerentes? Antes de continuarmos, permita-me fazer um breve panorama sobre o consumo do século XX: apesar da comunicação (em sentido publicitário) ser idealizada como antiga, afinal de contas, mesmo na antiguidade já era necessário trabalhar o marketing pessoal e a difusão de ideias, de facto, as formas de consumo que conhecemos surgiram à pouco tempo. Foi no inicio do século XX, depois da revolução industrial, que o homem de facto teve condições de gerir as suas escolhas e hábitos. Até então, percorremos um longo caminho de nomadismo para a agricultura, passando por uma triste era de exploração de mão-deobra humana (escravatura), chegando a um ponto extremamente sensível. Hoje, o homem concentra-se nos centros urbanos, onde tem mais contactos com outras pessoas e diversos estilos de vida. Além disso, teoricamente, não precisa de mais de que um trabalho para garantir a sua sobrevivência.

No inicio de século XX, a extração de petróleo e o uso desse combustível fóssil no lugar do carvão impulsionou a ociosidade. O homem não precisava de viver exclusivamente para garantir a sua sobrevivência. Deste forma, surge: • Uma observação consciente da cultura; • O desejo de imitar os hábitos de outras pessoas, o que acontece através dos bens como vestuário, mobiliário, viagens e comida; • A percepção de que existe um universo que vai além das necessidades básicas. »

estimulo de desejo Além dos produtos novos não pararem de aparecer, ao longo do século XX surgiu uma nova procura: o consumo de uma forma como tal a conhecemos hoje: as pessoas passaram a sentir a necessidade de ter coisas.

Boa parte dos produtos que surgiam eram completamente novos e o publico precisava de ser educado no que concerne ao seu uso, assim como hoje entendemos o marketing de conteúdo. Imagine que objetos simples como uma panela de pressão precisavam de um passo-a-passo, um manual que ajudasse as pessoas a descobrir como a usar. Era muito importante que todas as dúvidas face á sua utilização fossem sanadas antes da aquisição, semelhante às estratégias que surgiram com a transformação digital.

desenVolVimento da Pirâmide de maslow Neste contexto, o psicólogo norte-americano Abraham Maslow desenvolveu a teoria das necessidades – popularmente conhecida pela Pirâmide de Maslow. Dedicado à psicologia humanista, Maslow descobriu que o comportamento humano desencadeia principalmente pela motivação de satisfazer determinadas necessidades:

E logo na base da pirâmide surgem as necessidade Fisiológicas: as urgências básicas como alimentação, água, sono e abrigo;

segurança - muito usada como gatilho mental (uma das técnicas de neuromarketing), a segurança está relacionada não só às condições de proteção física da família, mas também quanto à estabilidade de emprego, garantia de saúde, de recursos e bens;

social - nesta parte da pirâmide, a pessoa já conquistou as condições adequadas para as necessidade fisiológicas e básicas de segurança. Agora o interesse está voltado para a qualidade das relações e a um sentimento de propriedade, por isso, o foco está na procura de amigos, construção de família e participação em comunidades de ideais comuns;

estima - este estágio está relacionado obviamente com a autoestima quanto ao status social do individuo. Aqui se concentram os requisitos para uma pessoa se sentir competente, capaz. Além disso, também inclui a relação de respeito mútuo entre indivíduos; Realização pessoal - o topo da pirâmide já está ligado ao autodesenvolvimento. A pessoa já atingiu as necessidades básicas e tem um forte espírito de partilha de ajuda ao próximo. O objetivo centra-se na superação de desafios, destacando-se atividades ligadas à criatividade, resolução, de conflitos e problemas, identificação e superação de preconceitos e desenvolvimento pessoal (competências, valências, carreira).

consumidores mais conscientes Hoje, as pessoas compram aquilo que procuram e no momento que querem. Mesmo com o consumismo em alta e o uso de variadas técnicas de marketing para persuadir o consumidor, cada vez mais, está na sua mão decidir a compra ou não.

Neste cenário as técnicas de vendas precisaram de se reinventar para se adaptar a este novo consumidor. Curiosamente, até surgiram técnicas como inbound sales, no qual o vendedor apresenta-se mais como um consultor do que como vendedor. A ideia é descobrir o problema que o lead enfrenta e apresentar a melhor solução mesmo que às vezes isso signifique a perda da própria venda. »

Assim surge a tendência de relacionamento e fidelização da empresa com o publico.

Voltando À Pergunta Que ficou algumas linHas atrás: mas como é Que um Produto case-ready Pode criar relações mais Pessoais e coerentes? A resposta pode ser dada com um exercício muito simples: num linear de legumes embalados, numa grande superfície, e experimente observar por alguns minutos o comportamento do consumidor.

A relação de confiança com o produto é extraordinária. Não há hesitações, parece que o consumidor (na maior parte senhoras) está na sua horta, a colher aquilo que a própria semeou ou plantou. A frescura, a cor, o toque de mão, a conveniência, a declaração nutricional "...existe o consumidor responsável, preocupado com a saúde, com consciência ambiental, que inclui a carne na sua dieta, sem qualquer preconceito..." As iscas finíssimas da Salsicharia Estremocense são um excelente exemplo do produto de livreserviço. A embalagem contém 500 g de iscas, uma embalagem de banha e uma embalagem da característica e tradicional marinada. Desta forma, fácil e pratica, o consumidor autoincentiva-se a confeccionar uma alternativa gastronómica rica em ferro e vitamina A, que de outra forma, seria pouco provável. Além disso, a memória gustativa tem um poder involuntário que nos faz ter uma consciência de sabor que remete ao passado...os bons momentos gastronómicos da casa dos avós, por exemplo. discutir o seu sabor, a sua textura, o seu perfume, a sua tenrura. De uma maneira ou de outra, o consumo de carne diminui nas grandes cidades, embora, globalmente, o consumo de aumente consideravelmente. Neste contexto, a carne acondicionada numa embalagem atrativa vai ao encontro do consumidor da cidade. O cliente urbano, aprecia carne sem querer entender que um Cortador passe os seus dias com os dedos mergulhados em carne crua. É um ponto de vista. Há cerca de três anos, quando tive o prazer de conhecer Hugo Desnoyer, um dos talhantes mais famosos de Paris, disse-me (muito importante) e toda a informação “ lavado e pronto a consumir” cria uma ponte entre os factos e as ideias. Isto é coerência.

Este conceito da falada coerência pode-se aplicar ao comércio local de carnes? Existe algo de contraditório ou incoerente nesta coerência? É possível um talho beneficiar desta coerência sem vender a sua carne embalada? Afinal de contas, um talho deve ser onde um artesão trabalha as suas carnes, dando forma aos seus produtos de forma manual e com a ajuda das suas ferramentas: as facas. Curiosamente, a ferramenta mais antiga do mundo, primeiro a partir de pedra lascada para cortar, raspar e bater o alimento, depois passaram a utilizar o bronze, ou o ferro. As primeiras facas apareceram 3000 anos antes da nossa Era. que “a sensação tátil da seda, da volúpia e da delicadeza da carne, é o lado sensual e sensitivo da nossa profissão”. Há quase quatro décadas a editar a revista Carne, nunca tinha ouvido um talhante descrever a sua profissão de forma tão sensível, quase poética. Assisti à mestria com que desossou metodicamente meia carcaça de novilho: a separação cuidada das peças, a precisão de separação entre ossos e carne (para não desperdiçar), o “descascar” para limpar as gorduras mais duras, o esmero do corte que segue sempre o contorno do músculo e a direção das fibras (caso contrário, a peça desintegra-se no prato), o revestimento “O Talhante não é um homem de bigode com o avental cheio de sangue”.

As cidades modificam-se, alteram-se e ganham novos hábitos e filosofias de vida. É nas grandes urbes que surge a diversificação onde tem crescido muitíssimos conceitos de alimentares, inclusive, o de comer menos carne, em prol de uma alimentação sofisticada mas também “mais saudável e amiga do ambiente”.

Por outro lado, existe o consumidor responsável, preocupado com a saúde, com consciência ambiental, que inclui a carne na sua dieta, sem qualquer preconceito. Outros, fazem o culto da carne, por raça, por peça, maturada ou não, comem carne como quem

bebe um bom vinho e criam tertúlias para e a amarração das peças para assar o mais uniforme possível.

De seguida provamos deliciosa e mal passada, como rezam os “cânones”. Hugo Desnoyer, alerta-nos a nota amadeirada na costeleta de vitela, e um trago suave a noz no bife de alcatra. Percebi o que é um momento de culto, onde a experiência de comer carne atinge um patamar de excelência e todos os sentidos são elevados ao “Nirvana”.

“O talhante não é um homem de bigode com um avental cheio de sangue”, refere Hugo Desnoyer. “É um trabalho de grande exigência, meticuloso, às vezes até bastante chato »

mas, ao mesmo tempo, artístico”, referia o cortador ao mesmo tempo que atendia uma chamada da Associação de Talhantes de Paris que o alertava para a possibilidade do seu estabelecimento ser alvo de ataques de ativistas veganos radicais.

A gastronomia exigente cresceu e os talhantes desenvolveram um know-how baseado no conhecimento preciso da anatomia do animal. “Nenhuma máquina consegue fazer o que nós fazemos”. Frequentemente, os profissionais de carnes comparam o seu metier à de um ourives ou de um marceneiro “transformamos matéria-prima numa peça excepcional”, refere com orgulho.

Dei comigo a perguntar para os meus botões: como é que um talho assim pode ter os dias contados? Como é que a qualidade tem os dias contados?

Na presença de Hugo Desnoyer, um dos mais famosos precursores do chamado coupe parisien, aliás, copiado em todo o mundo, não podia perder a oportunidade de lhe perguntar: os talhos de rua têm os dias contados?

Hugo Desnoyer, rejeita completamente que os talhantes sejam o “último dos moicanos” e argumenta: “a profissão atrai, não estamos na defensiva, estamos na afirmação do que fazemos. Na região de Paris, a nossa profissão não sabe o que é desemprego e o número de aprendizes passou de 5000, em 2009, para mais de 10.000 em 2019. Na região de Paris, um jovem talhante começa com um ordenado de 2500 Euros mais prémios de objetivos”, conclui.

Em Portugal, com as devidas distâncias, a filosofia não é muito diferente do que na cidade da Torre Eiffel. Os profissionais podem olhar com otimismo para o futuro desde que apostem na diferenciação, na qualidade. Concorrer com os preços das grandes superfícies é um erro crasso.

De França, onde a “guerra” entre a grande distribuição é feroz, chega-nos o exemplo“ Para resistir, temos que diversificar. Muito de nós, transformamo-nos em Bouchercharcutier-traiteur (Profissional Delicatessen especialista em carne pré-confecionada e pronta-a-cozinhar). A partir da crise da encefalopatia espongiforme bovina a nossa aposta foi na diferenciação, na carne com certificado de origem e na rastreabilidade”.

O tema rastreabilidade continua na ordem do dia mas, o bem-estar animal e a origem dos animais e a sustentabilidade são fatores

Para os consumidores, a vida útil do produto traduz-se em frescura prolongada. De facto mais de 40% dos consumidores acredita que as carnes embaladas prontas-a-cozinhar oferecem mais garantia de segurança. Outra vantagem do case-ready é o aumento da

levados em conte pelo consumidor. Há trinta anos, o consumidor preocupava-se em comprar carne, massa muscular, hoje, o consumidor bem informado, consome menos carne, preocupa-se com a qualidade, saúde, ambiente, sustentabilidade, bem-estar animal e com o prazer que pode retirar de uma carne de qualidade bem confecionada. E esta atitude é uma mais-valia para o talhante que aposta em satisfazer todas as exigências do consumidor.

Outro conceito que a pouco-e-pouco ganha terreno nos países do centro da Europa são os talhos-livre-serviço. Normalmente, pertencem a grandes empresas da industria de carnes que aproveitam a sua estrutura para apoiar estas lojas de livre-serviço, exclusivamente, de carnes. Também funciona com pequenos empreendedores que fazem parcerias com as industrias. Estas lojas não requerem profissionais consumidor.

De facto, as carnes embaladas permitem que os comerciantes aumentem a variedade sem desperdício. Nenhum talho consegue eliminar o risco de criar resíduos durante o corte e porcionamento. Por outro lado, as embalagens já incluem o preço, data de validade, declaração nutritiva, origem, receitas e outras informações que contribuem para seduzir o consumidor, além disso, o produto chega em caixas mais leves, facilitando a arrumação. A praticabilidade e a economia de tempo permite ao funcionário da loja realocar mais tempo para o cliente. Além disso, um estudo inglês da Livestock revela que 65% que o consumidor consegue uma gestão mais equilibrada quando compra carne embalada, quer pela quantidade, quer pelos pesos individuais, tornando-se mais fácil definir as quantidades para o seu agregado familiar.

especializados, e tem boa aceitação do vida útil do produto.

Para os consumidores, a vida útil do produto traduz-se em frescura prolongada. De facto mais de 40% dos consumidores acredita que as carnes embaladas prontas-a-cozinhar oferecem mais garantia de segurança alimentar do que as embaladas na loja, segundo o relatório Power of Meat 2018 da Food Industry Association.

Neste período nefasto de pandemia, a capacidade de oferecer embalagens prontas para congelar é especialmente importante. Os dados indicam que os consumidores cozinham mais refeições em casa e compram mais alimentos nos pontos de venda, quer presencialmente, quer online. Mais de 60% dos consumidores que compram carne disseram que agora congelam mais carne mais do que antes da pandemia, segundo o estudo de 2020 da Midan Marketing.

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