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Capa - Mobilidade da ferrugem-asiática

Viajante do mal

Como modelos numéricos podem auxiliar a quantificar a movimentação de esporos do fungo Phakopsora pachyrhizi, causador da ferrugem-asiática, entre as regiões produtoras de soja. Resultados possibilitam estabelecer o início de epidemias e explicar a mobilidade de populações resistentes a fungicidas

Ofungo Phakopsora pachyrhizi, causador da ferrugem-asiática da soja, é protagonista nas lavouras de soja do Brasil há alguns anos. A cada nova safra, produtores e pesquisadores não medem esforços para “lutar” contra esse visitante indesejado. Mas afinal, qual o peso das variá

veis agrometeorológicas na epidemia? Qual o peso do inóculo vindo da soja voluntária? Qual o peso do inóculo vindo de regiões vizinhas? A resposta pode estar em modelos matemáticos. Os modelos são um conjunto de expressões que tem como objetivo representar a realidade em números. Previsão do

Marcelo Madalosso/ Phytus Club

tempo, aterrissagem e decolagem de aviões, entre outros, são modelos matemáticos que traduzem a realidade.

É de conhecimento público que os esporos são principalmente disseminados pelo vento e podem percorrer longas distâncias (Isard et al, 2005) e a dispersão é o fator-chave

Figura 1 - Direção e velocidade do vento em frente fria no dia 25 de outubro de 2018

Phytus Group

A determinação do potencial produtivo da soja depende de diversos fatores

para o desenvolvimento da doença ao nível epidêmico. Da mesma forma, os esporos podem também ser transportados por longas distâncias dentro da América do Sul, não por furacões, mas por frentes frias.

Nesse contexto, o objetivo do estudo foi desenvolver modelos numéricos que quantificam a movimentação de esporos de P. pachyrhizi entre regiões produtoras de soja. Fator importante para estabelecer o início de epidemias e também para explicar a mobilidade de populações de P. pachyrhizi re

sistentes aos fungicidas.

DESENVOLVIMENTO DOS MODELOS DE SIMULAÇÃO Para simular o transporte de urediniósporos de P. pachyrhizi foram adotados modelos de dinâmica de fluidos. Parâmetros como tamanho e formato dos esporos, direção e velocidade dos ventos, entre outros, foram utilizados nos modelos.

Como exemplo, geralmente a direção do vento no estado do Paraná ocorre de Leste para Oeste. Contudo, quando há a ocorrência de frente fria, a direção

Fungo Phakopsora pachyrhizi é um velho conhecido nas lavouras de soja

Esporos do fungo se disseminam pelo vento e podem percorrer longas distâncias

predominante dos ventos ocorre de Oeste para Leste (Figura 1). Essa mudança na direção, somada ao aumento da velocidade, que pode ultrapassar 100km/h, permite que esporos de fungos sejam disseminados a longas distâncias.

A direção e a velocidade do vento na América do Sul foram exploradas no período entre outubro de 2018 e novembro de 2019. As informações estão disponíveis em http:// tempo.cptec.inpe.br/boletimtecnico/pt, fornecidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Dados sobre o patógeno foram consultadas na literatura.

A validação, isto é, a confirmação de que o modelo matemático condiz com a realidade, foi realizada através do levantamento do número de casos de ocorrência de ferrugem- -asiática no estado do Paraná informados pelo portal do Consórcio Antiferrugem (disponível em http:// www.consorcioantiferrugem.net/).

RESULTADOS A presença de áreas de soja com semeadura antecipada, neste caso em países vizinhos, foi considerada como fonte de inóculo inicial (Figura 2A). O inóculo foi representado como frequência, variando de 0% a 100%. No período de outubro a

dezembro de 2018, quatro frentes frias incidiram no estado do Paraná. As frentes frias ocorreram em 25 e 27 de outubro (Figuras 2B e 2C), 1° e 11 de novembro (Figuras 2D e 2E). A direção e a velocidade do vento em cada frente fria variaram.

A primeira frente fria (25 de outubro) transportou esporos nas regiões de Foz do Iguaçu, São Miguel do Iguaçu, Medianeira e Toledo (Figura 2B). Dois dias após, a segunda frente fria avançou a dispersão para a região de Cascavel. Cerca de nove dias após a segunda frente fria, o primeiro caso de ferrugem-asiática da soja foi observado na cidade de Ubiratã. Na sequência, casos da doença foram observados na região de disseminação do patógeno aos dez dias e 12 dias após a segunda frente fria. Braga et al (2020) observaram período latente, tempo entre a deposição dos esporos nas folhas e início da reprodução através da produção de esporos para populações coletadas entre Foz do Iguaçu e Campo Mourão na safra 2017/18, entre nove e 13 dias.

As demais frentes frias foram responsáveis pela disseminação do fungo para a região central do Paraná, nas regiões de Maringá e Londrina. Os resultados apresentados pelos modelos matemáticos sugerem que os fungos podem ser transportados para o Paraná de regiões vizinhas, com soja semeada antecipadamente, via frentes frias, e que esses esporos transportados ainda permanecem viáveis para infecção.

Os modelos podem ser úteis para prever transporte de esporos de outras regiões por meio de frentes frias. Comprovando-se sua eficácia, podem evoluir para um sistema de previsão da chegada de esporos. Estes modelos matemáticos também podem ser usados em estudos para entender como se dá a disseminação de esporos resistentes aos fungicidas. Normalmente a resistência aos fungicidas é selecionada em uma determinada região. Os modelos numéricos têm a capacidade de auxiliar a entender em qual velocidade e tempo estes mutantes podem chegar em outras regiões. C

Lucas Henrique Fantin, Eduardo Oliveira Belinelli, Karla Braga, Paulo Laerte Natti e Marcelo Giovanetti Canteri, Universidade Estadual de Londrina

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