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Figura 3 - Xilogravura sem nome

O bom de trabalhar em arte é que vamos procurando uma outra lógica, outro tipo de associação, e que tem que ter algumas regras, só que essas regras ninguém nos dá, o que temos são exemplos de outras pessoas que seguiram essas regras. (...) Acho que o discurso que interessa é o discurso da conjunção: arte seria então essa capacidade de criar ligações entre coisas, conjunções essas que nós dão sentido. Quando você liga uma coisa com outra, acontece um fenômeno de radiação, uma coisa que está num sentido e outra num outro, ao se juntarem, produzem um terceiro sentido. E é a partir desse terceiro sentido que devemos começar a pensar.

Tunga

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3. A Confecção do Trabalho

O capítulo que segue surge para descrever como aconteceu a criação das gravuras deste trabalho e o processo artístico e mental que se seguiram para a confecção plástica da ideia de um contradispositivo.

3.1. A revelação da imagem

Figura 3: Xilogravura sem nome confeccionada durante a Oficina Gráfica: Xilogravura

Logo após as questões que geraram o desejo de criação do trabalho, surgiu a necessidade da elaboração de uma imagem exclusiva para o mesmo e posterior lançamento ao público das ideias e estampas discutindo plasticamente sobre o limite da gravura original e do objeto artístico.

Isso significa que a estratégia que devemos adotar no nosso corpo a corpo com os dispositivos não pode ser simples, já que se trata de libertar o que foi capturado e separado por meio dos dispositivos e restituí-los a um possível uso comum. (AGAMBEN, 2009, p. 44)

Conforme mostrado no último parágrafo do capítulo anterior e em forma de tópicos, eu havia criado um contradispositivo que serviria como um método na execução do trabalho. Tal atitude é na realidade um ato de profanação conforme

colocado por Giorgio Agamben na parte oito de seu ensaio, pois o conceito de dispositivo acaba se encontrando entre uma esfera religiosa e uma de direito romano (AGAMBEN, 2009, p. 44). É importante ressaltar que durante o ensaio O que é dispositivo?, Giorgio Agamben utiliza a palavra em grego oikonomia para designar a profundidade de seu conceito de dispositivo e sua correlação com a história da teologia. Explica o significado dessa palavra em grego como “a administração do oikos, da casa, e mais geralmente, gestão, management” (AGAMBEN, 2009, p. 35). Segue exemplificando como tal significado foi importante na história da Igreja para a resolução (administração) de alguns problemas teológicos que surgiram e como se tornou assim um dispositivo regulador que acabou deixando uma herança à cultura ocidental:

[...] a fratura que os teólogos procuram deste modo evitar e remover em Deus sob o plano do ser reaparece na forma de uma cesura que separa em Deus ser e ação, ontologia e práxis. A ação (a economia, mas também a política) não tem nenhum fundamento no ser: esta é a esquizofrenia que a doutrina teológica da oikonomia deixa como herança à cultura ocidental. (AGAMBEN, 2009, p.37)

O desenrolar dos acontecimentos históricos citados por Agamben no seu ensaio segue para mostrar o desenvolvimento do termo em outros de igual natureza regulatória. Esses subsequentes procuravam governar e guiar os seres para um caminho de retidão. Tal conjunto acabou por ser traduzido por padres latinos como dispositio. O significado foucaultiano para o termo carrega consigo essa herança teológica que divide o divino entre o ser e a práxis, a essência e a forma como essa age (AGAMBEN, 2009, p. 38).

Comum a todos esses termos é a referência a uma oikonomia, isto é, a um conjunto de práxis, de saberes, de medidas, de instituições cujo objetivo é gerir, governar, controlar e orientar, num sentido que se supõe útil, os gestos e os pensamentos dos homens. (AGAMBEN, 2009, p.39)

Como exposto anteriormente segundo uma compreensão própria para este trabalho, o dispositivo benjaminiano capturava, orientava, determinava, modelava e controlava, dentro do pensamento desse pensador e daqueles que o seguem, o caminho das obras de arte e a qualidade de um objeto artístico similarmente ao ato

religioso que purifica, separa, consagra, santifica alguma coisa ou pessoa. Esta é a principal similaridade e proximidade do ato benjaminiano com a teoria de dispositivo de Giorgio Agamben e o motivo de considerar como dispositivo a atitude de Walter Benjamin e também a do mercado de arte ao denominar uma gravura como original, como um objeto com algum valor, um real objeto de arte. A diferença principal entre o meu dispositivo e o dispositivo benjaminiano está assim, na profanação própria do meu contradispositivo. Com o meu contradispositivo (não numerar, não editar, não assinar e não definir em momento algum que já se alcançou o número de cópias necessárias) eu procuro instigar o pensamento e estimular a atenção ao reconhecimento dessa série de dispositivos que capturaram e separaram nossas ideias e julgamentos de objetos e experiências artísticas. Sobre o que tem ou não algum valor, do que possui ou não alguma aura. Não cabe a mim – minha subjetividade – determinar se algum objeto tem valor, mas sim ao personagem que entrar em contato com o trabalho. Foi justamente no momento em que eu pensava intuitivamente sobre o desejo de elaboração desse trabalho, e isso ocorreu por volta do ano de 2013, que iniciei uma nova etapa de aprendizado na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Iniciava a oficina de serigrafia com a Professora e artista Evany Cardoso. As técnicas serigráficas já me atraíam pela sua maior velocidade e pelos seus mecanismos utilizados para a multiplicação de imagens previamente criadas em várias cópias. Quando iniciei meus estudos nessa técnica acabei optando por ela para a execução do projeto anteriormente pensado justamente por tais peculiaridades. A velocidade de reprodução serigrafica foi pessoalmente ligada a ideia de Walter Benjamin sobre a reprodução serial própria dos movimentos de massa que faziam as coisas ficarem mais próximas e que foi desenvolvida logo após a sua definição do que é a aura:

Graças a essa definição, é fácil identificar os fatores sociais específicos que condicionam o declínio atual da aura. Ele deriva de duas circunstâncias, estreitamente ligadas à crescente difusão e intensidade dos movimentos de massas. Fazer as coisas “ficarem mais próximas” é uma preocupação tão apaixonada das massas modernas como sua tendência a superar o caráter único de todos os fatos através da sua reprodutibilidade. (BENJAMIN, 1996, p. 170)

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