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Segurando as pontas

No Brasil, 5,5 milhões de crianças não têm o nome do pai no registro.

“Uma mãe é obrigada pela sociedade a amar seu filho desde quando ele ainda é um grão no útero. Uma mãe não pode reclamar que está cansada porque ‘é mole só cuidar de uma criança. Quem rala mesmo é o pai para sustentar vocês’.” Giovana conta que sofreu do quadro clínico de depressão pós-parto, e que ouvia constantemente das pessoas que aquilo era normal e que se tratava apenas de cansaço, algo comum para uma mãe de primeira viagem. “Uma mãe é uma mulher feliz e realizada, de acordo com a sociedade. Não podemos reclamar por termos a bênção da vida — mesmo que tenha sido algo indesejado. É o famoso ‘Fez? Agora aguenta. Agora cuida’.”

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O filho de Giovana tem 1 ano, e ela conta que apesar de sempre ter se preocupado e sentido a necessidade de o proteger, não o amava nos primeiros meses. “Não conseguia olhar para ele e sentir aquele amor incondicional de mãe que eu tanto ouvi falar durante a minha vida, e eu me sentia mal por isso, afinal, é esperado que uma mãe ame seu filho, né?.” Hoje, ela o ama de maneira incondicional, segundo ela, mais do que a si mesma, mas que talvez não tivesse conseguido sentir aquilo. “A culpa é da sociedade que espera demais de uma mãe e, por consequência, uma mãe espera demais dela mesma.”

Segundo levantamento do PNAD 2015, 84% das crianças são criadas primariamente pela mãe — somada à jornada dupla, a pesquisa indicou que as mães empregadas empreendem 18 horas semanais com cuidados com a casa, enquanto pais desempregados dedicam apenas 12 horas. Essa realidade vem mudando de forma lenta e gradual. Os canais de Youtube, livros sobre maternidade, e até mesmo conversas com a futura avó, mostram uma realidade que não se canta nas cantigas.

Daniela* conta que tinha em mente diversas idealizações sobre o pós-parto do filho enquanto ele ainda estava na barriga. Que tudo era lindo e maravilhoso, e que ela saberia exatamente o que fazer, além de o amar incondicionalmente — afinal, era mãe. Para ela, tudo mudou bem cedo, logo no segundo dia de vida do bebê: ele teve icterícia neonatal precoce. A bilirrubina — substância encontrada no sangue que quando em alta quantidade pode diagnosticar problemas no fígado — chegou a 22. “Ele só chorava e eu não sabia o que fazer, só chorava também. Ficava pensando por que eu inventei aquela história de ter bebê, onde eu fui me meter.”

As dificuldades vieram logo no começo e foi preciso tempo para que se ajustassem um com o outro. “Eu morria de medo de ficar sozinha com ele, entrava em pânico mesmo, então sempre ficava alguém comigo ou minha mãe ou minha vó, o que por um lado foi bom, mas por outro foi péssimo, muitas interferências e muitos pitacos.”

A relação com o pai também foi problemática. O divórcio veio antes do quarto aniversário. Daniela conta que as atividades desempenhadas pelo pai pouco mudaram desde quando eram casados. “A participação dele consiste em pagar a pensão e pegar o menino “Ficava pensando por que eu inventei aquela história de ter bebê.”

- Daniela*

uma vez ao mês pra passar o fim de semana.” Porém, a maternidade ainda é vista como algo maravilhoso. “A verdade é que a maternidade é muito cansativa e solitária, muito mais emocionalmente do que fisicamente. Ser mãe é uma luta diária, não existe comercial de margarina.” Esse é o lado da maternidade que não se conta no chá de bebê.

*O nome das mães foi alterado para preservar as identidades de cada uma. Ao todo, 32 mães aceitaram dar depoimentos sobre os problemas que tiveram — e ainda têm — durante a maternidade.

Depressão pós-parto? Lucas Grassi

Depressão pós-parto não é sinônimo de não gostar de ser mãe. Esse estado, que não incomumente afeta famílias depois do nascimento de uma criança, pode estar relacionado a inúmeros fatores, tanto emocionais quanto físicos.

O que se entende hoje é que existem situações que podem ajudar a provocar o quadro - ou piorá-lo. Entre eles, estão a falta do apoio familiar, privação de sono, vício em drogas, alimentação inadequada, desequilíbrio hormonal.

Quando se discute essa condição, existe uma preocupação natural com a dinâmica mãe-bebê. Instintivamente, preocupa-se, em primeiro lugar, com o estado da criança em relação à situação depressiva da mãe. A provedora da vida, nesse caso – e em muitos outros – toma o segundo (ou vigésimo) plano. Para se desmistificar a situação, é interessante se atentar ao fato de que não apenas mulheres desenvolvem um estado depressivo pós-nascimento. Homens, geralmente pais, também são diagnosticados com depressão pós- -parto.

Na realidade, a depressão do homem em relação à paternidade se associa, de acordo com publicação do Ministério da Saúde, à preocupação em torno da própria capacidade em educar um recém-nascido. A ansiedade, somada ao aumento das responsabilidades, está entre as causas do problema.

Voltando para as mulheres: manifestações de irritabilidade, choro com frequência, diminuição de energia e motivação podem ser sinais de depressão pós-parto. Se não tratada, a doença pode se desenvolver e chegar a um estado crônico conhecido como psicose pós-parto.

Nesses casos, é importante que haja completa atenção com a mulher e o recém-nascido. Entre os sintomas estão: desconexão com o bebê e pessoas ao redor, vontade extrema de fazer mal ao bebê e/ou pessoas ao redor, pensamentos delirantes e irreais, sono perturbado.

No processo de tratamento, o Ministério da Saúde recomenda que sejam feitas sessões de terapia hormonal e exercícios para fortalecer o laço emocional entre mãe e filho(a). Todo o acompanhamento psiquiátrico e psicoterápico é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

“SEGURANDO AS PONTAS”

Anelise Wickert Gabriel Domingos

Mariane Pereira

Anelise Wickert

Embora estejam aposentados, idosos continuam no mercado de trabalho. O sustento da família e a vontade de contribuir com a sociedade são as principais motivações

Foram nove anos trabalhando informalmente, fazendo “bicos” em vários lugares para pagar as contas e continuar contribuindo com o carnê do INSS. Lauro Ososki, 65 anos, aposentado há três, era técnico mecanográfico, ou seja, trabalhava consertando máquinas de escrever, faxes e calculadoras. As novas tecnologias fizeram com que ele fosse demitido em 2006.

E assim foi, segurando as pontas, até não conseguir mais. Com 62 anos de idade e 35 anos de contribuição, ele decidiu que estava na hora de se aposentar. Embora não tenha tido grandes complicações durante o processo, as cifras do salário mínimo se mostraram insuficientes para se manter. Como resultado, Lauro e sua esposa, Carmem Milani, 63 anos, que também está aposentada, resolveram trocar de profissão e voltar a trabalhar.

“O mercado de trabalho te vê de uma forma ruim depois de uma certa idade. Tem gente que já falou para mim: quem se aposentou tem que parar de trabalhar, tem que dar chances para os outros. Mas eu tenho que pagar as contas. Uma das minhas filhas já se vira bem, mas a outra ainda está meio travada. Sempre pede dinheiro emprestado”, conta Lauro.

Hoje, ele trabalha meio período em um depósito de materiais recicláveis. Lá, ele desmonta peças de eletrodomésticos, separa quilos de ferro e alumínio e ajuda a descascar pedaços de cobre. O aposentado, mesmo gostando dos colegas e do ambiente de trabalho, confessa que a principal motivação é a complementação de renda.

Assim como Lauro, os idosos adiam cada vez mais a saída do mercado de trabalho. Seja por necessidade, ou por vontade, o percentual de idosos que permanecem no mercado de trabalho tem aumentado, saindo de 5,9%, em 2012, para 7,2% no ano passado.

Além disso, a necessidade se faz presente na escolha por continuar trabalhando: 63% dos idosos que trabalham declararam ser os chefes de família. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra em Domicílio Contínua (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O médico veterinário Darar William Zraik de 74 anos mesmo aposentado desde 2013, ainda permanece ativo no mercado de trabalho. Ele conta que se aposentou por ter a idade permitida, e também pelo direito de aposentadoria, mas segundo ele, um salário mínimo não é suficiente para manter o mesmo nível de vida que tinha trabalhando na área em que é formado.

De acordo com o médico, o processo para se aposentar foi muito rápido com toda a documentação sendo acertada em um único dia. Apesar disso, ele conta que continua trabalhando como corretor, assessor na compra de cavalos e faz eventuais atendimentos veterinários, sempre como autônomo.

Maria do Carmo Silveira Jayme tem 70 anos e conta que antes de se aposentar trabalhava como auxiliar de escritório e se aposentou há dez anos por idade. Para o processo de aposentadoria, ela teve ajuda de um advogado especialista e demorou pouco menos de um mês para concluir o trâmite e conseguir a aposentadoria. O que foi um alívio, porque, conta ela, alguns colegas demoraram muito para conseguir o direito.

Sobre o porquê de ter retomado o trabalho depois de aposentada, Maria do Carmo comenta que se sentia sozinha e nervosa em casa. “Precisei voltar a trabalhar porque me sentia muito nervosa e sozinha dentro de casa, estava me incomodando ficar só em casa. Fiz um concurso de agente comunitária, passei e comecei a trabalhar em uma unidade de saúde que fica no bairro Orleans.”

“Precisei voltar a trabalhar porque me sentia muito nervosa e sozinha dentro de casa, estava me incomodando ficar só.”

Maria do Carmo Silveira, agente comunitária

Além da necessidade de trabalhar, a vontade também era grande e ainda é hoje, “Eu gosto muito de trabalhar lá, e faço visita nas residências, para hipertensos, diabéticos, gestantes, crianças menores de 2 anos e é um serviço muito gostoso de fazer, já faz 15 anos que eu estou nessa área e não pretendo parar tão cedo.”

Em relação às atividades realizadas pelos idosos 45% é o porcentual de trabalhadores atuando por conta própria, enquanto 27% atua com carteira assinada. Ao todo, de acordo com a pesquisa PNAD, 8% é o total de idosos que empreende como atividade profissional e nesse grupo 91% já possui o próprio negócio há dois anos ou mais. E também são mais homens, 70%, atuando na exploração do seu próprio empreendimento. A reforma da Previdência é um assunto que gera muitas dúvidas para os aposentados ou quem vai se aposentar. Para o professor de Direito Previdenciário e Direito do Trabalho Marco Serau Júnior a reforma traz várias alterações no texto. O docente explica que, atualmente, as aposentadorias podem ser adquiridas por tempo de contribuição ou por idade. Na nova regra, uma idade mínima é fixada (passa a ser 65 anos para os homens e 62 anos para as mulheres).

Serau ainda conta que quem já está aposentado não perde o benefício. O professor também afirma que, segundo a proposta de lei, as pessoas que já deram entrada no processo de aposentadoria também se encaixam na regra antiga. “Porém, aqueles que ainda não preencheram os pré-requisitos devem continuar trabalhando e recolhendo a contribuição previdenciária”, acrescenta ele.

O professor de Direito do Trabalho e advogado trabalhista Marco Guimarães afirma que a Constituição Federal garante o acesso ao mercado de trabalho sem nenhum tipo de discriminação. Ele explica que o artigo é claro em dizer que não pode existir diferença de salário, diferença de função ou outros critérios de admissão por motivos de sexo, cor, estado civil e inclusive idade. Além disso, há uma regra dentro do estatuto do idoso que prevê o acesso deste trabalhador ao mercado de trabalho e o respeito às suas condições físicas, intelectuais e psíquicas.

Segundo Guimarães, o que precisa ser melhorado é a inserção do idoso no mercado de trabalho. “As políticas públicas que faltam são as de profissionalização do idoso, de preparar quem tem mais de 60 anos para um mercado que está diferente do tempo em que ele trabalhou. São pouquíssimos cursos, por exemplo, de informática que são direcionado para os idosos”, conta o docente.

O advogado ainda explica que o Estatuto do Idoso proíbe que o trabalho de pessoas com mais de 60 anos seja penoso, insalubre ou que tenha sobre jornada, ou seja, horas extras. “Muitas vezes, o idoso é o responsável pelo sustento da família. Infelizmente, ele acaba se sujeitando a toda e qualquer situação para manter o trabalho e garantir a complementação de renda.”

Para ele, é necessário ter em mente que a grande maioria dos aposentados recebe o salário mínimo, que é um valor insuficiente. O professor afirma que os benefícios previdenciários são insuficientes e que os idosos precisam ser inseridos em campos de trabalho qualificado e não apenas um trabalho qualquer apenas para a empresa cumprir exigências.

“Tem gente que já falou para mim: quem se aposentou tem que parar de trabalhar, tem que dar chances para os outros. Mas eu tenho que pagar as contas.” Lauro Ososki, auxíliar de serviços gerais

Anelise Wickert

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