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Como é a vida pós-reality?

Personagens de diferentes programas contam como foi enfrentar a realidade após o programa

Por Heloísa Bianchi, Isabela Lemos e Matheus Zilio

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“O importante lá dentro não era cozinhar bem, mas sim ser um bom personagem. Na segunda prova, eu entendi que aquilo era um jogo. Lá, eu entendi que era para fazer TV para se dar bem”, conta Monique Gabiatti, chef de cozinha renomada e ex-participante da segunda edição do MasterChef Profissionais. Tudo mudou para ela quando finalmente entendeu que o reality show não era um programa de gastronomia, e sim um reality de gastronomia.

Mundialmente conhecido, o reality show se fundamenta na premissa de que é algo “real”, como já sugere o nome. A grande questão que o diferencia de qualquer outro programa ou novela é que se parte do pressuposto de que as pessoas ali estariam sendo elas mesmas e não agindo sob um script. Ser vigiado pelas câmeras, ter sua imagem repercutida por milhões de pessoas, pressionar-se a encenar uma persona que, às vezes, nem é a sua - e quando ela aparece, a audiência aumenta. Essa é a receita para o sucesso de um reality.

Monique conta que a rotina de gravação era bem cansativa, apesar dos participantes não ficarem confinados em uma casa, eles chegavam às 8 horas e saiam entre às 21 e 22 horas. Ao chegarem no estúdio, já estavam sem seus celulares pessoais, perdendo contato com o mundo. Em uma sala pequena, sem televisão ou rádio, os participantes esperavam ser chamados. “O mais difícil nesse processo é você ter que criar uma intimidade com pessoas que nunca viu na vida”, relata.

A chef de cozinha explica que estipulou uma meta para si mesma: chegar ao top cinco do programa. Por já ter um nome no meio gastronômico antes de ser chamada para participar do MasterChef Profissionais, sair sendo extremamente criticada pelos jurados, ou muito cedo do programa, poderia afetar negativamente a sua imagem.

Atualmente, dona do restaurante Cozinha, Monique consegue enxergar o impacto positivo do programa em sua vida. Ela afirma que a experiência televisiva apenas somou ao seu currículo, e que seu público é dividido quase que igualmente tanto em pessoas que admiravam seu trabalho anteriormente quanto em pessoas que passaram a acompanhá-la devido ao MasterChef.

Heloísa Bianchi

Monique Gabiatti preparando a famosa paella em

Gabbiano Ristorante, na Barra da Tijuca (RJ).

Em 2017, na categoria de programas e séries, o Big Brother Brasil (BBB) foi o termo mais procurado no Google, seguido por A Fazenda. Mesmo entrando em sua 20ª edição, o BBB não perde relevância - muito menos os outros realities. Em 2018, o site SEMrush.com divulgou que o MasterChef, programa de disputa culinária exibido às terças- -feiras na Band, tornou-se o reality mais buscado pelos internautas em fevereiro, acumulando mais de 733,5 mil pesquisas, seguido por A Fazenda, com 673 mil e Big Brother Brasil, com 200 mil pesquisas.

A jornalista, doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora na área de Televisão Maura Martins explica que o brasileiro já é um grande amante da televisão e que, pelo reality parecer um escape à representação, ele acaba atraindo os espectadores. “Nós somos apaixonados pelo autêntico e por aquilo que foge das mídias. Dentro do telejornalismo, por exemplo, há uma quantidade de câmeras de celular que aparecem em uma tela, câmeras de vigilância, e por que isso é tão atraente à população? Porque ali parece que estamos vendo o real fora do controle do próprio jornalismo”, afirma.

“Me surpreende que, ano após ano, ainda tenham pessoas que estejam realmente apostando alto para na repercussão que esse programa pode dar à sua vida.” Monique Gabiatti, ex-Mastercheff

O BBB está chegando à sua 20ª edição com o mesmo modelo de programa instaurado nos anos 2000. Ainda assim, possui uma legião de fãs pelo país inteiro. Segundo Maura, isso acontece porque, por mais que o formato seja o mesmo, os programas e narrativas se renovam a cada temporada. “O Big Brother conta com uma narrativa que, às vezes, dá certo e outras vezes, não. A edição deste ano, por exemplo, foi muito criticada justamente por ter uma narrativa excessivamente leve, pois todos estavam preocupados com Para Maura, a edição busca por estereótipos de personas, tais como a loira, o fortão, a pessoa mais pobre - e ela espera que cada um desempenhe o personagem designado de acordo com sua narrativa. Ela não acredita que haja edição no sentido de distorção, mas sim no sentido de que o programa é levado ao ar através de uma narrativa condizente com que a emissora espera e que, por isso, o programa acaba criando a narrativa de quem é herói, vilão, etc.

“Me surpreende que, ano após ano, ainda tenham pessoas que estejam realmente apostando alto para a repercussão que esse programa pode dar à sua vida. Ainda que pareça que os efeitos sejam muito nocivos, visto que há uma perda de privacidade, estigma que se cria da pessoa para sempre, temos vários relatos de pessoas que queriam ser artistas e sempre ficaram associadas à brecha de um reality. Isso reflete um valor da cultura que enxerga a celebridade enquanto valor máximo”, opina a jornalista.

O Big Brother Brasil, é um exemplo de reality que muitas pessoas buscam com a expectativa de lançar uma carreira nos holofotes. Porém casos como o da atriz Grazi Massafera, que participou da edição do programa em 2005, não são tão comuns. Com a modernidade e diversidade de plataformas para se promover, muitos buscam alternativas para se manter no comentário público.

A youtuber Clara Aguilar, que participou da 14ª edição do BBB, é um exemplo disso, após o programa abriu um canal, o qual se conecta com um público diversificado, essa é a sua profissão hoje. A ex BBB ao se lembrar de sua experiência dentro do reality, conta foi mais tranquila do que esperava, ela não teve dificuldades em se adaptar ao programa. “Tem muita gente que faz coisas que não gostamos, mas eu sabia que aquilo ali não ia ser para sempre. Toda semana eu achava que ia sair, então eu fui vivendo um dia após o outro.”

A youtuber explica que, apesar de o programa ter proporcionado diversas

oportunidades de trabalho, a exposição veio junto. Porém, como ela gosta de se expor e já lidava com críticas antes de entrar no Big Brother, ela soube trabalhar bem com a exposição. “Eu acho que quando as pessoas que você ama e estão perto de você gostam de você e do jeito que você é, então não tem que se importar com pessoas que nem convivem com você, que só ficam atrás da tela de um computador te julgando, por coisas que eles nem sabem”, conclui Clara. “Hoje em dia, confesso que o De Férias com o Ex não teve impacto negativo na minha vida, muitos positivos inclusive. Me conheci muito como pessoa, e aprendi a trabalhar todos os defeitos em mim que percebi dentro da casa.”, diz o participante.

Outro programa de reality show que se tornou bastante popular é o De Férias com Ex da emissora MTV, que está indo para sua quinta temporada. O seu modelo reúne dez pessoas em um destino paradisíaco, sendo cinco homens e cinco mulheres, dentro de uma casa por um mês. O intuito é literalmente “causar”, já que a proposta do programa é trazer um ex de um dos participantes a cada semana para dividirem essas “férias”, visando criar caos e brigas dentro da casa. Durante o período de confinamento, eles não têm contato com o mundo fora da casa.

O ex-participante Claudinho, da segunda temporada do reality, explica que ao ser convidado pelo Instagram para participar do programa, ele enxergou o convite como uma oportunidade de ganhar visibilidade. Sua sensação é que ele estava prestes a entrar em “um hospício mesmo”, pois a primeira temporada foi marcada por barracos e discussões bastante intensas. personalidade fortes, temperamentos complexos de mais e com gostos e características muito diferentes.” Ele conta que mesmo assim a experiência foi ótima, e que fala com muitas pessoas da casa até hoje, seu único pesar é que pelo programa ser editado, muito conteúdo foi cortado para caber nos 11 episódios do reality.

Clara Aguilar finalista do BBB 2014, hoje trabalha com o Youtube.

A maior dificuldade que o ex-participante conta ter passado dentro do programa foi a convivência. “São pessoas com personalidades muito distintas, para realmente acontecer brigas, então são participantes com

Quando observado de perto, um reality show pode se tornar muito mais do que uma maneira de entretenimento. É de lá que a cultura de um país é colocada a prova, afinal os personagens apesar, de na maioria das vezes, serem padrões, suas atitudes são comuns e inerentes à sociedade. Portanto, além de uma maneira de promoção de personalidades, pode servir como reflexão do que ainda pode ser feito, do que pode ser melhorado.

A ARTE SEM MÁSCARAS

O artista é aquele que busca, através do seu local de fala, ajudar, de certa forma, transformar, inovar, trazer

Sam Alves vencedor do The Voice

Brasil em 2013, hoje mora nos Estados Unidos.

novas tendências e quebrar costumes. No Brasil, são diversas as possibilidades de encontrar uma voz através da arte, e mesmo que poucos escutem, o artista persiste.

Vencedor da segunda temporada do The Voice Brasil com quase 30 milhões de votos e dono de uma das performances mais relembradas ano após ano (ao lado de Marcela Bueno), Sam Alves conta que teve a oportunidade de trabalhar com grandes mestres na indústria da música devido ao programa. “Aprendi muito sobre os bastidores desses realities e pude ver o tanto de trabalho que é para todos os envolvidos”.

O cearense educado nos EUA chegou a fazer audição às cegas ao The Voice USA, mas acabou não tendo nenhuma cadeira virada. Ele conta que, no reality norte-americano, ficou confinado num hotel por quase dois meses antes mesmo das audições às cegas. Não era permitido postar nada nas redes sociais e nem sair do hotel se não fosse numa van, em grupo e agendado para locais previamente autorizados. “Havia pessoas da equipe do programa que se infiltravam no hotel para ouvir

Reprodução TV Globo

As experiências nos dois realities foram totalmente diferentes: nos EUA, viveu confinado em hotel e no programa não teve nenhuma cadeira virada. Já no Brasil, além de ter vencido o programa com grande aclamação do público, não havia nenhum tipo de confinamento. Cada um ficava na sua casa e só viajava para o Rio quando tinha gravações ou o programa ao vivo para filmar.

Para Alves, o lado negativo da experiência foi sua vida pessoal virar foco das atenções. Ele explica que, alguns meses antes de vencer, ninguém sabia quem ele era e depois queriam saber cada detalhe de sua vida pessoal - e ainda não se acostumou sobre. “Eu não gosto de ser o centro das atenções quando estou fora do palco. Eu gosto de ser o centro das atenções quando canto. Quando estou no palco, eu me sinto livre, não me sinto julgado e nem pressionado a ser algo”.

Um outro lado negativo citado pelo vencedor da segunda temporada do gera ter que viver de uma imagem da qual não queria viver. A sua equipe o pressionava para que não falasse, agisse, ou até se comportasse de uma forma que fosse contrária à imagem que queriam vender. “Com o tempo, fui lutando contra isso, lutando pela minha liberdade artística e pessoal para ser quem eu realmente era”.

Atualmente, o cantor afirma que o Sam antes do The Voice Brasil era simplesmente alguém que estava se descobrindo, e ainda continua se descobrindo mais a cada dia. Ele era mais reservado com a forma que se apresentava para as pessoas, mas hoje já gosta de mostrar sua verdadeira essência. “A verdade é que as pessoas só estão me enxergando de verdade mais agora do que antes. Sem máscaras. E pretendo mostrar mais e mais através da minha arte”.

Recentemente, os tablóides reportaram seu relacionamento com o modelo Leo Moreira. Ele enxerga que esse tipo de notícia possa dar forças à comunidade LGBTQ e a aqueles que se sentem perdidos ou até frustrados com a sua própria sexualidade.

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