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O peso da vida
from CDM 58
Anorexia e bulimia nervosa estão entre os principais transtornos alimentares que atingem adolescentes. Jovens contam suas histórias de batalha contra a distorção de imagem
Alerta de gatilho: transtorno alimentar
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Beatriz Tsutsumi Camila Acordi Maria Vitória Bruzamolin Sarah Guilhermo
Otranstorno alimentar é como uma doença invisível. Inúmeras pessoas carregam essa angústia com comida de forma imperceptível aos familiares e amigos da pessoa enferma. A história de Anna Ulson, 18 anos, foi assim. Ela se considerava uma pessoa extrovertida antes de desenvolver anorexia na pré-adolescência, quando se isolou de tudo. “Eu me via gorda, mas conseguia sentir meus ossos”, desabafou a estudante, que ficou internada no começo de 2019. “Não queria admitir que tinha essa doença, é muito ruim saber que você está se enganando. Em quem vou confiar se não em mim mesma?”.
O transtorno é como tentar encaixar as peças erradas de um quebra-cabeça. Anna foi internada no meio do ensino médio. Ela conta que seu coração batia muito devagar. A jovem passou por situações absurdas com os médicos durante o evento. “Tive médicos que prescreviam muita comida para mim e eu dizia: ‘Meu estômago não aguenta’, e eles respondiam, ‘Ou você come, ou eu te coloco numa sonda”.
Anna se lembra do que a médica disse para sua mãe quando seus órgãos começaram a falhar: “Não tem mais o que fazer, essa menina vai desligar”. O sentimento de Anna foi neutro. “Foi o momento mais estranho da minha vida. Eu não conseguia sentir nada, não não fiquei triste, não entrei em desespero”. Então, voltou a viver como se nada tivesse acontecido.
Ela diz como não queria ficar na cama e com isso realizou o sonho de fazer dança. Certo dia após a aula de zumba, chegou em casa sentindo fome e se juntou à mãe na mesa de café. Voltou a ganhar peso e a tratar a obsessão. Essa jornada fez com que Anna melhorasse muito, mas ela nunca relaxou o suficiente por medo de ter recaídas. “Hoje em dia, me vejo 100% melhor do que era, mas sei que preciso me cuidar.”
E existe algo sombrio sobre autocontrole que a comunidade de transtornos alimentares compartilha entre si. “Eu não gostava de sentir a doença, eu não gostava que ela fizesse parte da minha vida mais do que já fazia”, conta Lucas*, estudante de Direito, 20 anos. A história do jovem com a anorexia começou aos 15 anos, quando na puberdade ele cresceu e sua figura se tornou mais esguia. “As pessoas achavam bonito, e eu também achei’’, disse o estudante. “Fui inconscientemente tomando modos não saudáveis e perdi a mão.” Sua família notou que havia algo errado no momento em que ele estava abaixo do peso e não se alimentava mais.
Arquivo pessoal
Antes e depois de Anna Ulson.
*Lucas, estudante
O choque aconteceu durante uma viagem de fim de semana, na qual Lucas e sua família foram a um restaurante e ele, em suas palavras, “comeu como se não houvesse amanhã”. A solução do jovem foi tomar um laxante. Seu estômago entrou em colapso, resultando no jovem vomitando durante a viagem de volta. Assim que chegaram a sua cidade, foram direto ao hospital, onde ficou internado por quatro dias.
“Foi uma fase complicada para todos nós”, conta. Após a internação, o estudante passou a morar com sua avó, pois em sua antiga cidade o tratamento não era eficaz.
Lucas chegou a pesar 36 quilos. O jovem conta que perdeu sua adolescência e sua rotina se baseava nos estudos: “Eu não tinha a rotina de um colega que era sair depois da escola, eu ficava na escola estudando ou ia para casa”, desabafou.
Em 2018, no terceiro ano do ensino médio, Lucas já estava bem melhor. Nesse mesmo ano, fez um intercâmbio para Londres, viagem essencial para sua recuperação final. Hoje Lucas voltou a ser um jovem saudável e divertido.Apesar do período trágico em sua vida, ele conta essa história com firmeza e superação. Muitos adolescentes e jovens adultos se enxergam acima do peso ao se olharem no espelho. Tais pensamentos muitas vezes se caracterizam como parte de algum transtorno alimentar, por exemplo, a anorexia e bulimia nervosa. Conhecida como anorexia nervosa, mas sem levar ao pé da letra o significado da primeira palavra - que em sua origem grega se traduz por “falta de apetite” -, esse transtorno se caracteriza como uma síndrome gerada pelo déficit de ingestão alimentar baseado no objetivo de não ganhar peso, e não por uma simples falta de apetite. Segundo a endocrinologista Sheila Montano, geralmente tal desejo se funda no sonho de um corpo extremamente magro e não saudável, considerado algo bonito pela pessoa. Pacientes com esse distúrbio costumam ter uma distorção da própria imagem e muitas vezes não percebem a seriedade do caso.
Já a bulimia nervosa é guiada por impulsos, nos quais o paciente não consegue controlar seu próprio corpo. Comem compulsivamente em um curto espaço de tempo. Após as crises, o paciente se vê banhado por desespero e em um ato de compensação, acredita em soluções nada saudáveis para eliminar o que acaba de ingerir. Segundo Montano, vômitos autoinduzidos, utilização de laxantes, diuréticos, jejuns prolongados e exercícios físicos muito intensos estão entre os principais métodos utilizados.