FEVEREIRO 2021 VIVADOURO
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Entrevista
E considera que o nosso Estado nacional, está bem tal como está, ou precisaria literalmente de um novo Estado? E de que forma e à luz de que modelo acha que deveria ser? Não precisamos de um novo «Estado novo» de maneira nenhuma: que ideia! Não existe modelo perfeito. Mas desde que haja liberdade e a opção de mudar quem nos dirige, já não é mau. Entre algumas das condecorações oficiais pelo Estado Português, é também Dama Comandante da Ordem do Império Britânico. Esta distinção acabou por pesar mais, pelo facto de ter fixado residência em Londres, onde vive? Não é uma questão de peso. Tenho passaporte Britânico desde 1959, mas isso foi sinal de que fui aceite, que fazia parte da vida de cá. E é extraordinário. Em 2007, foi homenageada pela «Bienal do Douro», região onde também teve algumas vezes obras expostas, inclusive em Chaves, no ano 2020. Se tivesse de descrever, pintando, o que é o Douro em si e para si, qual seria o resultado? Já tive exposições maravilhosas no
Norte. Serralves (Porto), por exemplo, é um museu espetacular. Até agora, a única obra que eu pintei sobre a região do Douro foi «Os Bombeiros de Alijó». Tinha passado uns dias, com o meu marido e os meus pais, numa pousada em Alijó. Quando nos levantámos tinha nevado e houve uma procissão de homens a dançar, vestidos com casacos de palha e sem sapatos nos pés. A Tate – Museu Nacional de Arte Moderna do Reino Unido – comprou essa pintura. Sente uma forte ligação ao Douro, mesmo que espiritual, tendo em conta a tradição do vinho do Porto e respetiva relação histórica com os ingleses? E é normal o consumo deste vinho em festas britânicas? Há quem goste muito do vinho do Porto na Inglaterra. Era tradição beber sempre um pouco, depois do jantar, mas não tanto na nossa casa. Eu prefiro o vinho verde. Entre os 177 e os 382 milhões encontra-se o «top3» dos quadros mais caros alguma vez vendidos, de L. Da Vinci, W. Kooning e J. Pollock, respetivamente. Daria todo esse dinheiro para obter obras-primas de mestres mundiais como esses ou outros que se encontram no «top10» (Cézanne, Gauguin, Picasso, Rembrandt, etc.)? Se eu tivesse esse dinheiro todo comprava um Picasso. Era um génio! Mas fica melhor pendurado num museu, para todos o verem.
Foto: DR
Para nós, era a repressão e a falta de liberdade emocional e intelectual. Para outros, era a tortura e a fome. Londres deu-me a liberdade de olhar para o meu país. Nunca o deixei-completamente. Trazia Portugal para Londres e pintava-o lá.
> The Firemen of Alijo
Ou acha que a área comercial e leiloeira nem sempre respeita a essência dum quadro? Só o nome do artista e o estilo fá-lo ser mais ou menos dispendioso? E, nesta análise, que opinião tem sobre ter tido um quadro seu vendido em leilão por 1.614.795 euros? (o mais alto em obras suas) Com os leilões nunca se sabe o que vai acontecer. Até me espanta, porque eu vendi esse quadro, há muito tempo, e por muito menos.
Foto: DR
Muitas das suas obras têm / tiveram uma imersão na literatura clássica e no folclore tradicional. Qual o livro e o motivo que lhe marcou mais, desde a sua leitura até à conceção artística com maior impacto na sua pintura? Os contos tradicionais nunca perdem o poder. Também a misoginia no mundo das artes a marcou e contra a qual se debateu. Sente que essa luta resultou ou ainda é saliente o desprezo, o preconceito e a exclusão feminina? Menos que em tempos passados. A Josefa D’Óbidos, cujo trabalho eu sempre apreciei, deve ter tido bastante dificuldade. Através do documentário sobre si, do seu filho Nick, para a BBC, soubemos da sua batalha contra a depressão. É uma batalha vencida? Nem por isso. O meu pai também sofria de depressão. Agora ando bem, apesar da maçada com esta vida do vírus. E dado que se trata dum tema tão
difícil e recorrente atualmente, que conselhos dá a quem possa estar a vivê-la? Se puder, trabalhe. E evitar beber demasiado vinho do Porto. A nível da política europeia-mundial sente que se vive já os efeitos, amenos ou drásticos, do «Brexit»? Concorda com esta saída da UE? Sempre pensei que era má ideia, muitíssima má. Já que a Inglaterra faz parte da Europa. Se tivesse de fazer um registo autobiográfico, considera que o seu movimento estético veio trazer novos conceitos e performances ao modernismo e à arte contemporânea? Eu não tenho um estilo nem um movimento. Eu faço o que posso. Pressupondo que continua a pintar – e tendo em conta que Nadir Afonso, cujo centenário estamos a celebrar, pintou até aos 92 anos –, qual a nova história na qual se tenta apropriar e recriar, com ela mesma? Pois não sei, como é que eu posso saber? O que me interessa, de momento, é pintar a Nossa Senhora, na qual estou à volta, com uma pintura da Sagrada Família. Por fim, e como é habitual neste jornal, solicito à pessoa entrevistada uma mensagem final e motivacional, de carácter positivo e alento face aos tempos pandémicos que vivemos. O que lhe inspira dizer a quem nos lê? Confiança, isto vai passar! Entretanto, esperemos. ▪