QUENTIN TARANTINO
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Cães de aluguel Robert Hilferty
Cães de aluguel, primeiro longa-metragem de Quentin Tarantino, filme dinâmico sobre um bando de criminosos que fracassam na tentativa de assaltar uma joalheria, não é nem um pouco inocente. Esse filme inteligente – uma espécie de sátira pós-moderna de filmes B – mostra o tema do “subtexto” na cena de abertura, que fornece simultaneamente a chave para decifrar a cena que se segue. Quando os membros do elenco totalmente masculino discutem a canção de Madonna, Like A Virgin, o verdadeiro significado da canção – seu subtexto – é apresentado pelo personagem interpretado pelo diretor do filme. Tarantino diz que é uma canção sobre uma garota – de forma alguma uma virgem – que prefere “paus grandes” (aparentemente porque eles a machucam, o que a faz lembrar-se da primeira vez). Esse prelúdio – cheio daquela inquietação masculina tradicional com o tamanho do pênis – vai sugerir, em retrospecto, que o filme, como a música, tem um sentido “oculto” e que esse “sentido” pode ter algo a ver com “pau”, isto é, com sexualidade masculina, com “rapazes com armas”. Linguagem violenta e atos violentos definem a política vigorosa da sexualidade masculina, e Cães de aluguel é um ensaio quase tragicômico sobre essa política. O homoerotismo se insinua por meio de ambiguidades visuais e elipses narrativas e, eventualmente, ilumina a relação central do filme. O homossexualismo subjacente está principalmente na relação entre Mr. White (Harvey Keitel) e Mr. Orange (Tim Roth), o policial infiltrado, cuja história secreta é a de amor cego e traição. Longe de ser sobre um assalto a uma joalheria – esse evento nem mesmo é exibido –, a história de Tarantino se concentra nas relações entre os assaltantes e em como lidam com a descoberta, após o trabalho malsucedido, de que um deles é um alcaguete. A estratégia narrativa de Cães de aluguel consiste em empregar uma série de flashbacks – cada um dedicado a um dos membros da gangue –, que fornecem as peças que faltam para a resolução do quebra-cabeça. Esses satélites narrativos sempre conduzem ao campo de batalha central, o “esconderijo” – um depósito onde os diversos “confrontos” são encenados depois