FRITZ LANG: O HORROR ESTÁ NO HORIZONTE

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Metrópolis descoberto Fernando Martín Peña

Publicado originalmente em <www.fipresci.org/ undercurrent/issue_0609/ pena_metropolis.htm>. Trata-se de um excerto do livro Metrópolis (Buenos Aires: Fan Ediciones, 2011), publicado por ocasião do 23o Festival Internacional de Cine de Mar del Plata, Argentina. O artigo foi escrito em 2008, antes, portanto, da reconstrução que deu origem à cópia de Metrópolis disponível hoje, que circula desde 2010 em festivais. Traduzido do inglês por Guilherme Semionato. (N.E.)

Para Homero Alsina Thevenet Jorge Miguel Couselo Salvador Sammaritano Três padrinhos Há uma história, provavelmente apócrifa, ligada à descoberta do filme The Unknown [O desconhecido], obra-prima de Tod Browning estrelando Lon Chaney. O filme era considerado perdido por décadas, mesmo havendo uma cópia em bom estado num arquivo francês durante todo este tempo. As latas do filme estavam perfeitamente etiquetadas e bem preservadas, mas o título deixou impossível que fossem diferenciadas de outras latas contendo material “desconhecido”, isto é, não identificado. O filme finalmente foi descoberto por um homem persistente, que insistiu em ter as latas abertas para que examinasse o que continham. A descoberta da versão original de Metrópolis (Metropolis, 1927), de Fritz Lang, no Museo del Cine Pablo Ducrós Hicken ocorreu de forma semelhante. Ela esteve armazenada com seu título e número de inventário em dois arquivos públicos consecutivos por quarenta anos, mas ninguém ao menos tentou checar se era a versão original. Aqueles responsáveis pelos arquivos não devem ser culpados por este longo atraso, o qual deve ser atribuído às catastróficas condições de preservação de materiais audiovisuais na Argentina, e à falta de políticas públicas há muito nesta área. Prelúdio A première mundial do “maior filme de todos os tempos” ocorreu em 10 de janeiro de 1927, no cinema Ufa-Palast am Zoo em Berlim, com música original de Gottfried Huppertz e 4.189 metros de filme.1 Os críticos alemães receberam Metrópolis com críticas pouco entusiasmadas, especialmente porque o filme sofreu o impacto da má publicidade por seu enorme orçamento ter gerado problemas financeiros para a indústria cinematográfica alemã. O filme foi, em parte, financiado por produtoras norte-americanas como a Paramount e a Metro-Goldwyn-Mayer. A UFA,2 além de

1  Esta primeira versão de Metrópolis tem 151 minutos (em 24 quadros por segundo), mas deve-se levar em consideração que a duração em minutos de um filme mudo só pode ser estimada relativamente, uma vez que até o surgimento do cinema sonoro não havia uma velocidade de projeção padrão, e a maioria dos

pegar empréstimos significativos com ambas as produtoras, concordou em distribuir filmes da Paramount e da MGM na Europa em troca da distribuição de suas produções nos Estados Unidos e no mundo todo. Contudo, enquanto a UFA havia concordado em não alterar os filmes norte-americanos, a Paramount e a MGM tinham a prerrogativa de fazer quaisquer mudanças que julgassem necessárias nos filmes alemães para assegurar o retorno financeiro. Estes acordos foram levados a cabo quando do surgimento da Paraufamet, uma nova multinacional que combinava os nomes das três produtoras originais, e que ficou a cargo de todos os diversos cortes e mutilações que Metrópolis sofreu. O filme se transformou na empreitada artística mais dispendiosa da história da UFA, um produto cujo sucesso ou fracasso teria efeitos decisivos na saúde financeira da produtora. Assim, ele logo ficou preso numa teia de interesses conflituosos. A princípio, a Paraufamet achou o filme longo e complicado demais, e contratou o dramaturgo norte-americano Channing Pollock para escrever uma versão mais curta e simples. Após assistir à versão completa, Pollock diminuiu o enredo, alterou a estrutura dramática e modificou os intertítulos. Ele resolveu eliminar todas as referências a Hel, a mulher pela qual Frederson (o mestre da cidade futurista de Metrópolis) e Rotwang (um brilhante inventor) competiram no passado. A razão era que o nome dela se parecia muito com o termo vulgar “hell” [inferno]. O personagem havia sumido, assim como a razão de Rotwang para construir um ser artificial e dotá-lo com as formas de uma mulher, e também os motivos dele para odiar Fredersen e seu filho, Freder. Rotwang não era mais um alquimista torturado por seu passado; ele se tornou o cientista maligno estereotipado, que simplesmente se comportava de modo irracional. Quanto a Fredersen, seus esforços perderam toda a complexidade: enquanto na versão original ele usou a falsa Maria para incitar os trabalhadores à violência, com a intenção de subjugá-los mais facilmente, na versão de Pollock ele apenas quer que a falsa Maria os sujeite. Como consequência disso, há uma longa cena que perdeu seu significado original e que ficou completamente incoerente: por meio de um interfone com vídeo, Fredersen

filmes mudos era rodada com velocidades entre 16 e 20 quadros por segundo. (N.A.) 2  Os estúdios Universum Film Aktiengesellschaft (UFA) foram criados no decurso da Primeira Guerra Mundial por indicação do alto-comando alemão com o objetivo de produzir filmes de propaganda e obras de

arte que permitissem promover a imagem da Alemanha no exterior. Além de Metrópolis, são da produtora O gabinete do Dr. Caligari (Das Cabinet des Dr. Caligari, 1920), Nosferatu (1922) e A última gargalhada (Der letzte Mann, 1924). (N.T.)

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